A Biocinese do Ombro e suas Patologias Ivana Amaral da Silva1 Poliana Pedrinha de Lima2 Resumo Este artigo tem por objetivo esclarecer a anatomia funcional e a biomecânica do ombro, assim como as patologias mais freqüentes como luxações, entorses, bursites e fraturas, enfatizando a síndrome do impacto que é uma patologia de natureza microtraumática e degenerativa. Além disso, iremos ressaltar sua etiopatogenia, o seu diagnóstico cinético-funcional e possíveis condutas fisioterápicas. Daremos uma ênfase maior na patologia Síndrome do impacto por ser causada devido movimentos repetitivos da vida diária, principalmente a elevação anterior do ombro, freqüente nos esportes ou quando a profissão obriga o indivíduo a realizá-los. 1. Introdução A primeira descrição de uma ruptura do manguito rotador do ombro é atribuída a Monro em 1788, contudo Neer quem individualizou a patologia “Impingement Syndrome” em 1972, descrevendo-a e seguindo de uma proposta terapêutica. No Brasil, a tradução “Síndrome do impacto” foi induzida pelo Prof. Dr. Arnaldo Amado Ferreira Filho, a partir de 1986, sendo hoje aceita pela maioria dos estudiosos das patologias do ombro. Apesar de possuir vários fatores etiológicos esta patologia caracteriza-se por ser uma síndrome dolorosa do ombro, geralmente acompanhada por microtraumatismos e degeneração, além de perda de forças com tendinite do manguito rotador. 1 2 Acadêmica do 3o ano do curso de Fisioterapia da UNAMA; Monitora da disciplina Biocinese vespertino Acadêmica do 3o ano do curso de Fisioterapia da UNAMA; Monitora da disciplina Biocinese matutino 2. Função KYSNER & COLBY (1992), ressaltam que a anatomia da cintura escapular permite mobilidade ao membro superior. Como resultado, a mão pode ser colocada quase em todo lugar dentro de uma esfera de movimento, sendo limitada primariamente pelo comprimento do braço e o espaço tomado pelo corpo. 3. Revisão Anatômica RASCH (1991), descreve que os componentes esqueléticos do cíngulo do membro superior incluem duas clavículas, duas escápulas e o esterno, e o complexo do ombro consiste numa cabeça do úmero quase hemisférica e numa cavidade glenóide relativamente rasa na margem lateral da escápula. Segundo ANDREWS (2000), a região do ombro é formada por três articulações, sendo elas a articulação esterno – clavicular, a acrômio clavicular e a glenoumeral. E uma articulação fisiológica que é a articulação escapulotorácica. A articulação esterno-clavicular é uma articulação em sela modificada com uma cápsula articular, três ligamentos importantes, o ligamento esternoclavicular, o ligamento interclavicular, além de um disco articular. A articulação acromioclavicular é classificada como uma articulação plana e o ligamento coracoclavicular, sendo que o ligamento coracoclavicular é composto pelos ligamentos conóide e trapezóide. Esses ligamentos são importantes, pois mantém a integridade articular em relação a configuração óssea da articulação. A articulação glenoumeral é a mais móvel e a menos estável de todas as articulações do corpo humano. É formada pela grande cabeça do úmero e pela fossa glenóide rasa constituindo uma articulação do tipo sinovial esferóide. É constituída por uma cápsula articular frouxa e ligamentos que possibilitam maior estabilidade para a articulação, são eles: o ligamento coracoumeral e os ligamentos glenoumerais superior, médio e inferior, onde os mesmos formam um “z” sobre a cápsula articular. Além destas estruturas a articulação glenoumeral é composta por bursas (subacromial e subdeltóidea) localizadas ao redor da mesma. A articulação escapulotorácica não é uma articulação anatômica verdadeira, pois não possui nenhuma das características habituais, de uma articulação, como uma cápsula articular. Entretanto, trata-se de uma articulação fisiológica que flutua livremente sem quaisquer contenções ligamentares, exceto onde gira ao redor da articulação acrômio-clavicular. Essas articulações, juntamente com os ligamentos, o manguito rotador músculo tendinoso (supra-espinhal, infra-espinhal, redondo menor e subescapular) e a musculatura que constitui os motores primários da extremidade superior devem trabalhar em uníssono para produzir as várias amplitudes de movimento possíveis na articulação do ombro. 4. Biomecânica da Articulação Glenoumeral De acordo com ANDREWS (2000), a articulação glenoumeral é capaz de quatro movimentos combinados: flexão e extensão, abdução e adução, abdução e adução na horizontal e rotação externa e interna. 5. Etiopatogenia e Fisiopatogenia O termo síndrome de compressão ou impacto foi popularizado por Neer em 1972. Ele enfatizou que tanto que tanto a inserção do supra espinhal no tubérculo maior quanto o sulco biciptal estão localizados adiante do arco coracobraquial com o ombro na posição neutra, e que, com a flexão anterógrada do ombro, essas estruturas podem passar por de baixo do arco coracoacromial, proporcionando a oportunidade para a compressão ou impacto. A compressão do manguito rotador pode ocorrer em alguns atletas, como jogadores de beisebol, zagueiros do futebol americano, nadadores e outros cujas atividades envolvem o uso repetitivo do braço no mesmo nível e acima de 90º de adução do ombro. A síndrome de compressão é perpetuada pelo efeito cumulativo de muitas passagens do manguito rotador por baixo do arco coracoacromial. Isso resulta em irritação do tendão supra-espinhal e, possivelmente infra-espinhal, assim como em hipertrofia da bursa subacromial que pode torna-se fibrótica, reduzindo assim ainda mais um espaço já comprometido. Além disso, com o passar do tempo e a progressão do desgaste e atrito, podem resultar em microlacerações e lacerações de espessura parcial do manguito rotador. Se essas continuam, podem ocorrer alterações ósseas secundárias (osteófitos) debaixo do arco acromial, propagando as lacereções de espussura total do manguito rotador. 6. Fases Clínicas da Síndrome do Impacto LASMAR citando NEER, descreveu três fases clínicas; Na fase I é característico um quadro de dor aguda que se segue ao esforço prolongado ou exacerbado, no esporte ou profissão, sendo um quadro reversível. Ocorrem edema e hemorragia ao nível da bolsa e tendões, ocorrendo tipicamente na faixa etária abaixo dos 25 anos. Na fase II, observamos um processo inflamatório levando a um quadro de fibrose e espessamento da bolsa, além de tendinite, ocorrendo caracteristicamente entre os 25 e 40 anos. É significativo a dor crônica após, as atividades com elevação do membro superior; dor na rotação interna, como ao vestir-se; e dor noturna, principalmente em decúbito lateral. Por fim, na fase III é característico um quadro clínico de dor constante e perda da força de elevação do membro superior, pois já existe ruptura completa de um ou mais tendões, sendo mais freqüente em pacientes com mais de 40 anos de idade. 7. Diagnóstico Existem vários testes par o diagnóstico da síndrome do impacto, sendo que LASMAR dà ênfase aos testes de identificação da tendinite e os testes de avaliação da integridade dos tendões, especificando os mesmos. Um teste importante para verificar a tendinite é o da manobra de NEER, caracterizando pela elevação passiva do membro acometido do paciente, com extensão do cotovelo e pronação do antebraço, provocando o choque da inserção do supra-espinhal contra a borda ântero-inferior do acrômio. O teste será positivo, caso haja manifestação de dor. Outro teste seria realizado para verificar a integridade dos tendões, chamada de teste de Jobe, que é um teste exclusivo parar avaliação do músculo supra-espinhal. É realizado com o paciente de pé, membros superiores em abdução no plano frontal e anteflexão de 30º, e assim alinhando o eixo longitudinal do braço com o eixo de movimentos da articulação glenoumeral. O fisioterapeuta fará uma força de abaixamento nos membros, simultânea e comparartiva, enquanto o paciente tenta resistir. O autor cita que pode ocorrer um resultado duvidoso em virtude da dor. Por isso, Neer introduziu o teste anestésico, “teste de Neer”, que consiste em injetar-se de 0 à 10 ml de lidocaína subacromial e repetir o exame. Se o teste for negativo, o tendão estará íntegro, mas será positivo se permitir a perda de força com rupturas do tendão. 8. Proposta geral de Condutas fisioterápicas ma Síndrome de Compressão Quadro Clínico I – Dor espontânea e limitação de movimentos Fase Aguda: 0 à 4 dias Objetivos: alívio da dor e prevenção contra rigidez. Recursos: Medidas eletrotermoterápicas para alívio da dor:crioterapia (Preferencialmente); TENS; iontoforese e galvanização. Importante: o paciente deverá estar em posição de repouso articular descrita a seguir. Entre uma sessão e outra o paciente deverá utilizar uma tipóia para relaxar as estruturas moles do ombro. Prevenção da rigidez: mobilização grau I associado a tração, oscilação de pequena amplitude respeitando a dor (KISNER,2002). Paciente em decúbito dorsal e a articulação glenoumeral em posição de repouso articular (abdução de 30ºe 55º de flexão), membro apoiado sobre almofadas. II – Limitação e dor durante os movimentos Fase Subaguda: 1 à 3 semanas Objetivos: alívio da dor, redução do espasmo e melhora da amplitude de movimento. Recursos Medidas eletrotermoterápicas analgésicas: calor superficial (compressas quentes, infravermelho, ondas-curtas e ultra-som), TENS e crioterapia, preferencial durante 20 à 30 minutos. Importante: O paciente durante a aplicação deverá estar sentado em abdução e rotação externa suportável da glenoumeral. Para a melhora da amplitude de movimento: Exercícios ativo assistido de deslizamento sobre a mesa, onde o paciente terá ganho de flexão se o mesmos realizar o movimento de frente para a mesa. O mesmo acontece se o paciente realizar movimentos de ganho de abdução com elevação e de flexão do tronco sobre a mesa, com o paciente na posição de lado em relação a mesa. Os exercícios pendulares (paciente sentado realizando movimentos de flexão, abdução, e rotação). Exercícios auto assistidos de Codman para ganho de flexão (elevação) e extensão, com o paciente sentado. Com o bastão ou livre para ganho de abdução e elevação. A escada de dedos, recurso mecanoterápico, para ganho de flexão com elevação e abdução. Polia de teto para movimentos ativos auto assistidos, para ganho de flexão e abdução. Com o membro em elevação, drenagem de edema, realizar movimentos isométricos com bolinhas flexíveis e exercícios de depressão do úmero. III – Limitação e dor ao final do movimento com atrofia muscular, déficit de força e fadiga rápida. Fase Crônica: acima de 3 semanas. Objetivos: A dor está presente devido a perda de flexibilidade e o processo cicatricial. Recursos Medidas termoterápicas: aplicação do calor (ultra-som, ondas-curtas, compressas quentes e infravermelho). Exercícios mecanoterápicos: polia de teto, roda de ombro, auto alongamento da cápsula posterior e dos extensores do ombro (deltóide fibras posteriores e rotadores externos), da cápsula anterior com auto alongamento dos adutores, flexores do ombro e rotadores internos e da cápsula inferior com auto alongamento do tríceps braquial. Exercícios ativos resistidos: para flexores e extensores de ombro, rotadores externos e depressores do úmero. Exercícios em cadeia cinética fechada, apoiando o braço contra a parede, proporcionando o fortalecimento do bíceps braquial e rebaixamento da escápula. A thera band e os halteres proporcionam para o paciente o fortalecimento dos flexores e extensores do ombro e também nos depressores do úmero. Na fase final do tratamento, realizar com o paciente movimentos de arremesso (exercícios pliométricos).Os exercícios pliométricos se caracterizam por três fases: uma fase de contração concêntrica de agonista e fase inercial (relaxamento) seguida de um a 3º fase em que em à predomínio de uma contração excêntrica dos antagonistas (RASCH, 1998). O objetivo da realização desses exercícios é a recuperação dos gestos funcionais durante atividades de arremessos. O exercícios pliométricos utilizados durante o tratamento são: polia de duplex com resistência mínima, arremessos de bolas de peso desprezível lentamente e depois com maior velocidade, e arremesso de bolas de maior peso contra a parede e depois para o alto com maior velocidade. Considerações finais Por estas considerações concluímos que a síndrome do impacto é uma patologia de grande importância e que precisa de uma atenção do Fisioterapeuta ao seu tratamento e reabilitação, pois a mesma por ser desencadeada por movimentos repetitivos na prática de esportes ou por atividades da profissão do indivíduo, acaba gerando transtornos e limitações da prática das atividades da vida diária. Primeiramente é indispensável que o profissional tenha o cuidado na avaliação cinético funcional desta patologia, utilizando-se para isso de vários testes específicos, além de elaborar um tratamento para o quadro do paciente, respeitando os limites do mesmo e das fases clínicas, sempre levando em consideração a anatomia e a biomecânica e da articulação. Além disso, é importante ressaltar a reeducação do paciente portador da síndrome do impacto em qualquer das fases que se apresente a patologia, devido as alterações anatômicas e a predisposição tecidual existente. Essa reeducação visa impedir a realização de atividades com o membro superior em elevação anterior acima do nível dos ombros, seja ela nos esportes ou na profissão. Apesar do quadro etiopatogênico, essa patologia possui um bom prognóstico, por isso o Fisioterapeuta tem seu papel fundamental durante a reabilitação de pacientes com o objetivo dos mesmos retornarem as suas atividades diárias. Bibliografia LASMAR, Neylor e et al. Medicina do Esporte. Rio de Janeiro:Revinter, 2002. ANDREWS, M. P e et al. Reabilitação Física das Lesões Desportivas . 2º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000. KISNER, Carolyn. Exercícios Terapêuticos: fundamentos e técnicas . 3º ed. São Paulo: Manole LTDA, 2002. RASCH, Philip J.Cinesiologia e Anatomia Aplicada. 7º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,1991. HIGINO, Nelson. Apostila de sala de in: Fisioterapia nas disfunções do Ombro. UNAMA, 2002 Ac. Ivana Amaral da Silva Endereço: Tv. Quintino Bocaiúva – Vl Elite, 48; Bairro: Nazaré; CEP: 66053-240 Telefone: 241-0684/9992-4662 e-mail: [email protected] e [email protected] Acadêmica do 3o ano do curso de Fisioterapia da UNAMA Ac. Poliana Pedrinha de Lima Endereço: Av. Alcindo Cacela 1177, Edifício Joaquim Amaral, apto. 303; Bairro:Nazaré Telefone: 99888971 e-mail: [email protected] Acadêmica do 3o ano do curso de Fisioterapia da UNAMA