Sexualidade e Dependência Química

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Sexualidade e Dependência Química
Alessandro Alves
“Seja qual for o tema o que te importa é sexo
Seja alegria, angústia, choro, encanto ou dor
Seja de ausência, sonho, tara ou por complexo
Seja na cama, palco, escada, elevador
Está no leite fluido que escorreu do ralo
Está no olhar de sal de Jack, o Estripador
E vem do fundo da garrafa pro gargalo
Está no riso obrigatório e no pavor
É o olhar de sal de Jack, o Estripador (...)”
“Sexo”, de Osvaldo Montenegro
Já tentou digitar a palavra “sexo” no site de buscas Google? Aparecem
aproximadamente 308.000.000 resultados. Acima do triplo do que aparece ao
digitarmos a palavra “drogas” (aproximadamente 74.300.000 resultados) e
pouco mais que para a palavra “Deus” (aproximadamente 138.000.000
resultados).
Pode pensar no que isso significa?
Freud já tinha demonstrado interesse pela vida sexual de seus pacientes,
valorizando a energia sexual como o polo mais importante da estruturação da
personalidade e da identidade do sujeito. Assim, saúde sexual é um dos
aspectos mais relevantes da vida de todos os seres humanos.
Sabedores desse fato, vários estudiosos do mundo todo, motivados pelo
pioneirismo do biólogo norte‑americano Alfred Kinsey, na década de 1950,
vêm se dedicando a compreender as diversas facetas e multiplicidades de
questões que envolvem a sexualidade.
Aqueles que estudam o comportamento humano em qualquer das suas esferas
de conhecimento devem mostrar interesse pelos estudos sobre sexualidade.
Aos estudiosos da Dependência Química, esse estudo tem valor agregado às
possibilidades de tratamento. Em um contexto mais amplo, é possível
considerar que a sexualidade permeie todas as fases do desenvolvimento
humano, desde o nascimento até a morte, sendo influenciada fortemente por
fatores orgânicos, culturais, sociais e psicológicos. Observem que a própria
etiologia da doença passa pelo prazer, e que as alterações cerebrais
acontecem no cérebro, nas áreas de prazer e recompensa. É possível observar
que as drogas, ao longo da evolução da doença, contribuem sobre maneira
para um aumento das sensações prazerosas, passando pela perversão da
maneira de se buscar prazer e culminando com a interrupção da capacidade
de experimentar o mesmo, em muitos casos. O uso de substâncias psicoativas
como afrodisíaco é algo comum na história. A expectativa sobre o efeito da
substância em causar desinibição e facilitar a aproximação e o encontro
sexual, ou aumentar o desejo e o prazer, faz parte do imaginário popular.
SEXUALIDADE – Definição
Sexualidade humana pode ser definida como uma forma de energia que motiva
a procurar a satisfação de um desejo ou de um impulso sexual por meio do
contato, do toque, de carícias, de beijos, de prazer, da automanipulação, do
bem‑estar, do orgasmo, da expressão do afeto, de intimidade, do ser e estar
sexual. Isso influencia tanto os pensamentos quanto a saúde física e mental dos
indivíduos. Assim, a prática da sexualidade é tão vital para a saúde quanto
comer, dormir e fazer exercícios, sendo um indicador de qualidade de vida.
Percebe‑se, portanto, que ela deve ser compreendida a partir de um enfoque
abrangente, se manifestando em todas as fases da vida do ser humano e, ao
contrário do imaginário popular, tem na genitalidade apenas um de seus
aspectos, talvez nem mesmo o mais importante. Em um contexto mais amplo, é
possível considerar que a sexualidade permeie todas as fases do
desenvolvimento humano, desde o nascimento até a morte, sendo influenciada
fortemente por fatores orgânicos, culturais, sociais e psicológicos.
Drogas e seus efeitos na sexualidade
ÁLCOOL: é presença quase obrigatória em contextos sociais, sendo conhecido
por seu efeito desinibidor, seja para tomar coragem para se aproximar de
alguém, seja para relaxar ou “baixar a guarda”. Em doses baixas pode
aumentar o desejo sexual, porém se o consumo for alto, há prejuízo da ereção e
da ejaculação. Nas mulheres, o álcool pode interferir na lubrificação vaginal e
na capacidade de atingir o orgasmo. A ação depressora do álcool também
pode causar sonolência e diminuir o desejo sexual.
ECSTASY: Popularmente conhecido como “bala” ou “E”, o ecstasy invadiu o
cenário das baladas mundiais de música eletrônica nos anos 1980, com a
promessa de ser a “pílula do amor”, capaz de aumentar o interesse sexual,
assim como a sensação de proximidade e intimidade com terceiros. Muitos
usuários de ecstasy dizem que sentem muita vontade de tocar, abraçar as
pessoas, e que o efeito da droga é mais sensorial do que sexual.
COCAÍNA: É comum o relato de que o consumo de cocaína, assim como o de
ecstasy, aumenta o desejo sexual. Há relatos de aumento da autoestima e do
bem‑estar. As pessoas sentem‑se mais atraentes e atraídas, sensuais, sem
que necessariamente o objetivo seja a relação sexual ou melhorar o
desempenho (pois muitas vezes o consumo dessas substâncias impede a
ereção e o orgasmo). Em relação à cocaína, os efeitos na atividade sexual são
dose‑dependente e podem tanto acarretar aumento do prazer e da intensidade
do orgasmo quanto também piorar o desempenho sexual. Existe uma
associação entre uso compulsivo de crack e troca de favores sexuais pela
droga, em que os usuários, motivados pela fissura ou pela urgência para
consumir a substância, “vendem” o corpo para a obtenção da droga.Muitas
vezes, o usuário, “desesperado” para usar a droga, aumenta o número de
parcerias sexuais e aceita manter relação sexual sem o uso de preservativos,
ou por pagamentos irrisórios, contribuindo para a repetição desse
comportamento.
MACONHA: Há também a crença de que a substância aumente o prazer. Em
um estudo que avaliou uma amostra de 8.650 pessoas, a maconha esteve
implicada no aumento do número de parcerias sexuais e na dificuldade de
atingir o orgasmo como desejado pelos homens.
HEROÍNA: Observamos que, durante o período de uso crônico, a frequência de
relações sexuais, masturbação e poluções noturnas ficam diminuídas. Além
disso, tanto a qualidade quanto a frequência de orgasmo estão reduzidas.
METANFETAMINA (crystal, meth): Altamente associado à atividade sexual,
sendo bastante popular nas festas do circuito gay, em que grande número de
homossexuais festeja, dança e também busca parcerias sexuais. O apelo de
aumento da sensação de prazer sexual gerado por essa droga talvez seja o
mote para sua popularização entre aqueles que desejam esse efeito da
metanfetamina. O uso dessa droga também está associado ao rico maior de
contrair o vírus HIV, uma vez que aumenta a chance de intercurso anal
desprotegido.
GHB (ácido gama-hidróxibutirato): Apesar de ser bastante comum nos Estados
Unidos e na Europa, é ainda uma substância relativamente nova no Brasil.
Também pode ser encontrado nas danceterias das grandes cidades com o
apelo de “ecstasy líquido”, em uma analogia ao ecstasy, como uma estratégia
de marketing que pretende conquistar o mesmo público da “pílula do amor”,
embora as drogas não produzam efeitos semelhantes, uma vez que o GHB é
depressor do sistema nervoso central (SNC), enquanto o ecstasy é um
estimulante. O GHB foi inicialmente destinado a aumentar massa muscular,
bem como a libido. Essa substância também está entre as “date rape drugs”
(drogas de estupro).
Fases da Resposta Sexual Humana
DESEJO: fase subjetiva em que há resposta a um estímulo, caracterizando‑se
por apetência sexual.
EXCITAÇÃO: resposta fisiológica (ereção no homem e tumescência e
lubrificação na mulher).
ORGASMO: contrações musculares reflexas e sensação de clímax do prazer
sexual.
RELAXAMENTO: retorno progressivo do organismo às condições basais, com
relaxamento muscular e descongestão sanguínea.
Comportamento sexual de risco
“Risco” pode ter diferentes significados e várias consequências. Qualquer que
seja a maneira como se olhe ou se perceba, o risco contém algum grau de
“incerteza”. Considerando o conceito de risco como a existência de ameaças à
vida, à saúde e também à qualidade de vida, vários tipos de comportamentos
são “de risco”, como, entre as práticas sexuais, sexo (oral, anal ou vaginal)
desprotegido e sem uso de método contraceptivo e maior número de parcerias
sexuais, por exemplo. A associação do uso de substâncias psicoativas ao
comportamento sexual pode conferir um risco ainda maior, e essa combinação
não é difícil de acontecer, tendo em vista que o consumo de álcool e outras
drogas não é incomuns e que a grande maioria das pessoas faz sexo.
As substâncias alteram a percepção, o julgamento e o comportamento, os
quais podem deixar as pessoas mais suscetíveis a incorrer em
comportamentos de risco e vulneráveis a se tornarem vítimas de agressões (no
geral) e violência sexual, pois a capacidade de se defender e de perceber
situações de risco também fica prejudicada.
Compulsão Sexual
Os comportamentos sexuais compulsivos e impulsivos incluem atos sexuais
repetitivos e pensamentos sexuais compulsivos, que, devido à alta frequência e
à intensidade com que acontecem, interferem na intimidade interpessoal e
pessoal, bem como no funcionamento profissional. Os dados relativos a esse
comportamento sexual e sua sobreposição com dependência química são
ainda muito limitados. No entanto, parece existir uma associação entre a busca
de drogas que aumentam o funcionamento sexual em indivíduos compulsivos,
sendo uma causa frequente e não reconhecida de recaídas do uso de
substâncias.
Existe tanto evidência clínica quanto científica, de que a atividade sexual
motivada por situações de uso de drogas pode ser um gatilho para recaídas.
Além disso, muitos chegam ao tratamento cheios de sentimentos de culpa e
vergonha relacionados ao comportamento sexual. Soma‑se a isso o fato de que
muitos pacientes têm sobreposição de dependência de substâncias com
dependência de sexo, que, se não trabalhadas em conjunto, também podem
ser outro fator de recaída.
Portanto, é uma excelente oportunidade para conversar a respeito de sexo.
Conhecendo DASA
O texto abaixo foi retirado do prefácio do livro “Dependentes de Amor e Sexo
Anônimos”, o Texto Básico da Irmandade de DASA. Leia atentamente:
“As preferências adictivas de outros dependentes podem parecer
surpreendentes ou ameaçadoras. O alcoólico, por exemplo, pode achar
incompreensível a incapacidade de controle do comedor compulsivo, ou até
mesmo engraçado; o jogador viciado que nunca sente desejo de beber em
demasia porque o álcool o faz sentir-se mal não pode compreender o alcoólico
que bebe até ficar doente, e depois recomeça; o comedor compulsivo que
experimenta um ato de amor e fica satisfeito não compreende os sentimentos
do dependente de amor para o qual nunca nada é suficiente. Cada dependente
solitário, faminto de compartilhamento, e aprisionado na necessidade
compulsiva de uma indulgência específica que cada vez aumenta mais o vazio
interior, tem um tipo de sofrimento que apenas alguém que tenha uma
experiência similar de adicção pode realmente compreender. Uma irmandade
em que possa realmente dizer "Sim, eu compreendo - eu também me sentia
assim" é uma parte vital do que torna possível a recuperação em cada faixa de
adicção. Daí a necessidade de irmandades específicas de Doze Passos para
cada tipo de dependência.”
O que nesse momento precisamos chamar atenção é para a existência de
compulsões sexuais muitas vezes “casadas” com a dependência de drogas, e
como o comportamento sexual parece ser considerado aceitável ou “normal”, o
indivíduo que procura sua abstinência das drogas frequentemente “negocia”
com sua outra compulsão, o que vai levá-lo, cedo ou tarde, invariavelmente à
recaída química.
Conselheiro x Sexo: Vai encarar ou vai correr?
Percebe‑se que a grande maioria dos programas de tratamento para
dependentes químicos não aborda questões relacionadas à sexualidade de
seus pacientes, existindo, ainda, uma grande dificuldade por parte dos
profissionais envolvidos nos cuidados desses indivíduos em falar sobre o
assunto. A sexualidade do dependente químico tende a ser considerada
somente quando o paciente apresenta algum conflito com as normas
estabelecidas pelo programa de atendimento, tais como infecção pelo HIV,
outras infecções sexualmente transmissíveis ou quando ocorre atividade
sexual entre os pacientes que estão em tratamento.
Um programa de tratamento exige uma abordagem mais honesta do
Conselheiro, desprovida de preconceito, usando técnicas da Entrevista
Motivacional e da Terapia Cognitivo Comportamental. Pode se criar um
Programa de Saúde Sexual pode ser realizado com um grupo semanal e
atendimento individual para pacientes com maior risco de recaída associado a
altos níveis de gatilhos ligados a sexo e drogas. O programa pode ser
conduzido por equipe treinada e motivada para essa tarefa, mas não é
necessário ter nível superior ou ser especialista na área da sexualidade. Entre
os temas abordados no programa estão:
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Namoro e relacionamento sexual estando em recuperação
Espiritualidade e sexualidade
Sexo não consensual
Comportamento sexual fora de controle
Motivações para ter atividade sexual depois de adquirida abstinência
Relação com o próprio corpo e barreiras sexuais.
A vida sexual é considerada um dos principais fatores de qualidade de vida.
Ter e dar prazer são preocupações da grande maioria das pessoas. É
importante lembrar que a maioria das pessoas tem uma vida sexual
saudável e satisfatória sem o uso de substâncias. Se o consumo não
prescrito de alguma droga for condição primária para que a aproximação
pessoal e a relação sexual aconteçam, é indicativo da necessidade de
procurar ajuda profissional.
Bibliografia:
Dependência Química – Alessandra Diehl.
Dependentes de Amor e Sexo Anônimos – Texto Básico de DASA
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