Descobrindo o Senhor no silêncio da liturgia : Sensus fidei

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Descobrindo o Senhor no silêncio da liturgia
“Deus é silêncio, e este silêncio divino reside dentro de um ser humano… Eu
não tenho medo de afirmar que ser um filho de Deus é ser um filho do
silêncio… Recusar-se a este silêncio cheio de temor e adoração confiante, é
negar a Deus a liberdade de capturar-nos com Seu amor e Sua presença”
Rorate Caeli – Adelante la Fe | Tradução Sensus fidei: Mais uma vez, o Cardeal Robert
Sarah abençoou os fiéis com outra entrevista, que pode ser encontrada em inglês
em Catholic World Report sobre a beleza, a sacralidade e a perene importância da
sagrada liturgia. Os fiéis fariam bem em ouvir atentamente o que Sarah disse a respeito
da liturgia, porque não se pode enfatizar o suficiente, que devemos mudar a nossa atual
práxis litúrgica, retornando a uma liturgia adequadamente celebrada no centro de nossa
vida cristã, se é que queremos ver o êxito de outra missão dentro da Igreja.
RELACIONADOS
Cardeal Robert Sarah: “A reforma da reforma será feita; nisto está o futuro da Igreja”
“O católico reconhece a sua Missa”
Como Igreja, falamos da nova evangelização, dos esforços realizados na justiça social,
bem como de todas as tentativas para a paz, mas essas iniciativas nunca parecem ir
muito longe. Enquanto todas essas atividades dependem exclusivamente da graça de
Deus, podemos dizer que a sagrada liturgia é necessária para receber esta graça, a qual
nos ajudará a levar o Evangelho a outras pessoas. Desta forma, acima de tudo,
deveríamos estar atentos às palavras do Cardeal Sarah — como fazem eco aos
pensamentos sobre a liturgia de nosso anterior pontífice, o Papa emérito Bento — para
que possamos refletir sobre a nossa experiência com a liturgia e a maneira como a
celebramos hoje. Especificamente, eu gostaria de iluminar três pontos-chave da
entrevista do Cardeal Sarah: a centralidade de Cristo, a importância do silêncio, e o
papel dos fiéis na liturgia.
O Cardeal Sarah diz: “É tempo de redescobrir a verdadeira ordem de prioridades. É
tempo de colocar Deus de volta no centro de nossas preocupações, de nossas coisas, no
centro de nossas ações e de nossas vidas: o único lugar que Ele deveria ocupar”. Apesar
de não mencionar especificamente a liturgia aqui, sabemos que a liturgia, como a
representação do sacrifício de Cristo na cruz é o ato definitivo que coloca Deus no
centro de tudo.
O propósito da liturgia é levar-nos a uma união mais profunda com Deus por meio de
um encontro íntimo com Ele. Na liturgia somos levados aos reinos celestiais e
experimentamos — por um tão breve momento — a liturgia celeste, enquanto ainda
estamos aqui na terra. Cantamos a canção dos anjos — “Sanctus, Sanctus, Sanctus” —
quando participamos na sagrada liturgia. É por isso que a liturgia não pode estar focada
sobre o homem e, em particular, não pode estar fixada sobre o sacerdote específico que
celebra essa liturgia. O Cardeal Sarah tem falado repetidamente sobre celebrar a liturgia
ad orientem, voltados para o Leste, porque celebrar a liturgia com tal orientação é bem
mais do que “o sacerdote de costas para o povo.”
A realidade mais profunda da celebração ad orientem é que os fiéis estão rezando junto
com o sacerdote, que atua in persona Christi, e em oferecer a Deus, junto com ele, a
Vítima Divina (ver Lumen Gentium, art. 11). Às vezes, na práxis moderna da liturgia,
focamos demais sobre a personalidade do padre ou demasiado sobre pessoas da
comunidade. Tal ênfase excessiva remove Deus do centro da liturgia, quando todo o
enfoque deveria ser, em última instância, sobre Ele, uma vez que a liturgia é a maneira
pela qual glorificamos a Deus, acima de tudo, e não glorificamos a nós mesmos.
Por esta razão, continua o Cardeal Sarah: “Não nos enganemos… o que a Igreja mais
necessita hoje não é de uma reforma administrativa, de outro programa pastoral, ou uma
mudança estrutural. O programa já existe: é o que sempre tivemos, tirado do Evangelho
e da Tradição viva”. O Cardeal Sarah está falando sobre a sagrada liturgia como o
“programa” já dentro da catequese dos fiéis. Em vez disso, devemos retornar a uma
celebração completa e adequada da sagrada liturgia, que nos foi entregue pela Tradição.
(NB: Não estou defendendo uma liturgia como um meio para a evangelização dos nãocatequizados.)
A sagrada liturgia, que pertence propriamente à Noiva de Cristo, a Igreja universal, tem
sido sempre o caminho central dos fiéis para encontrar a Deus. As pessoas não precisam
de um novo programa nem a Igreja precisa mudar a sua estrutura — mas algo melhor,
o que as pessoas precisam é de uma liturgia que esteja focada totalmente em Deus, não
no homem. Este problema de focar a liturgia nas pessoas em vez de Deus tem sido um
problema constante desde o tempo do Concílio Vaticano II. O Cardeal Sarah deseja que
vejamos que a nossa liturgia católica, tão rica em tradição e beleza, se temos olhos para
enxergar isso, deve ter o seu foco voltado novamente para Deus (como sempre deveria
ser) para que as pessoas possam chegar a conhecê-lo mais profunda e interiormente.
O segundo ponto na entrevista com o Cardeal Sarah que investigaremos é a sua ênfase
no silêncio, e este é o ponto principal da entrevista. Sobre o silêncio, ele assegura: “Deus
é silêncio, e este silêncio divino reside dentro de um ser humano… Eu não tenho medo
de afirmar que ser um filho de Deus é ser um filho do silêncio.” Na verdade, isto é um
mistério profundo quando o Cardeal Sarah diz que Deus é silêncio. Talvez possamos
entender isso melhor em comparação com o que ele diz sobre o demônio. Ele diz: “Deus
é silencioso e o demônio é barulhento. Desde o princípio satanás tem procurado
mascarar suas mentiras sob uma agitação ressonante e enganosa”. O demônio está
constantemente tentando distrair-nos de Deus, tratando de manter-nos afastados de
esperar o Noivo, como diz a parábola das dez virgens. (Ver Mateus 25: 1-13).
Enquanto Deus espera pacientemente para que regressemos a Ele, satanás está
constantemente tentando fazer-nos fugir do chamado de Deus. O demônio enche nossas
mentes, especialmente nossa imaginação, com tentações, imagens e agita-nos para que
não demos espaço para Deus e nos esqueçamos de Sua presença constante dentro de
nós. O Cardeal Sarah escreve que “nossa era ocupada, ultra tecnológica nos tornou mais
doentes. “Satanás pode muito facilmente usar a tecnologia em seu próprio propósito,
porque ele pode usá-la como uma constante distração da presença de Deus. Se estamos
constantemente consultando nossos e-mails ou páginas de mídias sociais em nossos
celulares, estamos pensando em Deus? Pensamos em Deus quando temos esses
momentos livres, ou nos concentramos em nossa tecnologia? Todos devemos fazer-nos
esta pergunta honestamente.
De maneira particular, podemos experimentar, adentrar e aprender o silêncio
participando na liturgia sagrada, sempre e quando a liturgia não esteja focada no próprio
homem, mas em Deus. Na sagrada liturgia, nós nos encontramos com a majestade de
Deus e tal encontro demanda o silêncio, porque não somos nada em comparação com a
grandeza de Deus. Não temos nada a dizer que pudesse acrescentar algo à Sua grandeza.
Como disse o Cardeal Sarah:
Recusar-se a este silêncio cheio de temor e adoração confiante, é negar a
Deus a liberdade de capturar-nos com Seu amor e Sua presença. O
silêncio sagrado é, portanto, tanto o lugar onde podemos encontrar a Deus;
porque vamos até Ele com a atitude apropriada de um ser humano que
treme e detém-se à distância, enquanto espera confiantemente”.
Como tal, devemos dar a Deus o silêncio que lhe é devido, Deus está livre no silêncio
da liturgia, para trabalhar em nossos corações, para nos trazer à Sua vontade em nós e
a Sua vontade para a Igreja Universal. Isto é verdadeiramente um encontro
surpreendente e misterioso. Como pode um ser divino, Onipotente, Todo Perfeito,
desejar trabalhar em nossas vidas, nós que somos miseráveis, pecaminosos e criaturas
mortais? A sagrada liturgia, continua o Cardeal Sarah, é o lugar apropriado para que
encontremos a Deus no silêncio. Quantos de nós experimentamos uma liturgia que é
cheia de silêncio e provedora de uma atmosfera na qual podemos verdadeiramente
encontrar a Deus? A sorte diz que isto não é uma ocorrência normal na maioria das
paróquias.
Cardeal Sarah indica o seguinte, que é de grande significado, se queremos entender a
liturgia celebrada como se deve: “O silêncio nos ensina uma regra fundamental da vida
espiritual: a familiaridade não leva à intimidade, mas, sim, o contrário; uma distância
apropriada é uma condição para a comunhão. É através da adoração que a humanidade
caminha para o amor.” A liturgia, portanto, não pode ser meramente uma familiaridade,
nem pode converter-se na compreensão de cada ato e de cada palavra. A liturgia não
pode simplesmente converter-se em um ponto da banalidade: em nossa era moderna,
quase nos dá medo encontrar-nos com o misterioso poder de Deus no silêncio. Assim,
somos tentados a formar a liturgia parecida com qualquer outra coisa que fazemos.
A música vem das canções conhecidas, familiares (e, às vezes, utiliza os mesmos
instrumentos da música popular, como por exemplo uma guitarra, ou ousadamente,
baterias), e as palavras são as mesmas que nossas palavras comuns, e o sacerdote atua
exatamente como nós. Se não há uma “distância apropriada” entre nós e a sagrada
liturgia esta se torna como nós e, de tal modo, que já não podemos ser transformados
por ela. Como continua o Cardeal Sarah: “Sob o pretexto da pedagogia, alguns padres
permitem comentários sem fim que não têm substância e são mundanos. Estes pastores
estão temerosos de que o silêncio na presença do Altíssimo poderia desconcertar os
fiéis?” Sério, deveríamos ser constrangidos pelo silêncio, deveríamos sentir que há algo
mais profundo, algo mais profundo do que nós mesmos na liturgia.
No silêncio da liturgia, supõe-se que devemos ser atraídos para fora de nós mesmos a
Deus, para que haja um encontro íntimo, porque nos encontramos com o Deus que
tomou forma, carne humana no não familiar da sagrada liturgia. Cardeal Sarah disse
com ênfase: “Muitas vezes deixamos nossas liturgias barulhentas e superficiais sem
nelas termos nos encontrado com Deus nem com a paz interior que Ele quer oferecernos”.
Isto nos leva ao terceiro e último ponto que gostaria de enfatizar da entrevista com o
Cardeal Sarah: Como se supõe que os fiéis devemos nos aproximar e participar na
liturgia? Aqui, o Cardeal Sarah retorna ao conceito da liturgia celebrada ad orientem,
que inclui mais do que uma orientação física, senão, também, uma orientação interna.
Resumindo do que ele disse sobre o silêncio: “Sempre que nos aproximamos da liturgia
com um coração barulhento, ela terá uma aparência superficial, humana. O silêncio
litúrgico é uma disposição radical e essencial; é uma conversão do coração. Agora,
converter-se, etimologicamente, é regressar, voltar-se para Deus”.
Assim, pois, a liturgia demanda conversão por parte dos fiéis, o que significa voltar-se
para o Senhor. A conversão através da liturgia significa esquecer as distrações deste
mundo — esquecer-se completamente delas, para que já não tenhamos um coração
dividido — e dar, entregar tudo ao Senhor. Isto exigirá uma conversão dentro de nossas
práticas litúrgicas. As liturgias, como já explicado, não deveriam ser marcadas por
ruídos e distrações, essas liturgias só enfastiarão, impedirão nossa conversão a Deus.
Como disse o Cardeal Sarah de maneira profunda: “Não há verdadeiro silêncio na
liturgia se não estamos com todo o nosso coração voltados, direcionados para o
Senhor.”
Assim, a conversão, em nossos dias modernos, deve ser de duas maneiras. Os fiéis
devem ter uma orientação para o Senhor, um desejo completo em dar-lhe tudo. Ao
mesmo tempo, as nossas celebrações litúrgicas precisam permitir que as pessoas façam
isso, as liturgias mesmas não podem estar cheias de esquisitices e distrações que são
uma contradição com a rica herança litúrgica da Igreja. Parece então, de acordo com o
Cardeal Sarah, que esta dupla conversão é a maneira pela qual colocaremos Deus
novamente no centro das nossas vidas e de nossas liturgias.
Sarah disse especificamente que nossa orientação externa influi sobre a nossa
orientação interna. Por isso é essencial voltar-se fisicamente ad orientem para retomar
uma atitude de silêncio e de reverência na sagrada liturgia. Como explicou Sarah:
“Olhando para o Senhor, ele [o sacerdote] está menos tentado a se tornar um professor
que faz uma leitura durante toda a missa, reduzindo o altar a um palco que não está
centrado na cruz, mas no microfone!”. Isso é tão verdadeiro, tão frequentemente quando
o padre está voltado para as pessoas, entra em um longo diálogo com elas no meio das
orações da Missa. Em vez de aderir-se às orações que poderiam facilitar uma atmosfera
de silêncio, ele sente a necessidade de preencher esse silêncio. Quando o sacerdote já
não está mais voltado para as pessoas, mas sim rezando, rezando com elas, então é
possível que haja silêncio e que os fiéis entrem nesse silêncio.
Em muitas paróquias, estamos, infelizmente, muito longe desta realidade litúrgica de
uma atitude de silêncio e de uma orientação para o Senhor, razão pela qual é tão
importante para nós prestarmos atenção ao que o Cardeal Sarah está dizendo. Os fiéis
devem defender uma liturgia apropriadamente celebrada dentro de suas paróquias,
porque uma liturgia, como tal, não é apenas apropriada para a Igreja, mas também é
necessária se queremos um retorno da reverência e do enfoque em Deus. Se queremos
apagar o espírito de agitação dentro de nossa sociedade, nós, como Igreja, deveríamos
abraçar plenamente a celebração apropriada da liturgia, uma liturgia que
verdadeiramente oriente o homem para o divino, abstraindo-o dele mesmo e de seus
próprios pensamentos.
Como o Cardeal Sarah nos lembrou mais uma vez nesta bela entrevista, a sagrada
liturgia, quando é celebrada orientada para Deus, é o lugar apropriado para encontra-lo
no silêncio. A nossa sociedade, que constantemente está flertando com o barulho e a
distração, está desesperadamente necessitada de uma liturgia que seja totalmente
diferente, uma liturgia que esteja impregnada do silêncio e focada inteiramente em
Deus, o Criador e Sustentador do universo. Faríamos bem em seguir as palavras do
Cardeal Sarah em nossa práxis litúrgica.
Veronica A. Arntz
[Tradução ao espanhol para Adelante la Fe de Tina Scislow. Artigo original]
Publicado originalmente: Rorate Caeli – Adelante la Fe – Descubriendo al Señor en el
silencio de la liturgia
Sensus fidei 28 de outubro de 201625 de março de 2017 Ad Orientem, Atualidades 1 Comentário

← Sagrada Comunhão, penhor da salvação

Atualização “Denzinger-Bergoglio”: 160 estudos comparativos entre o Magistério
perene da Igreja de Cristo e as doutrinas heterodoxas de Jorge Mario Bergoglio →
Uma ideia sobre “Descobrindo o Senhor no silêncio da
liturgia”

cleunice
2 de novembro de 2016 em 19:51
Permalink
Se tirarem o protestantismo da missa moderna, é possível que o silêncio da
Tradição retorne.
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