Cliente: Anefac Data: 21/05/04/2014 Mídia/Veiculo: Web/Gazeta do Povo Inserção/Editoria: Matéria/ Dinheiro Entrevistado: Finanças Administração Contabilidade Eventos Anefac Campinas Anefac Rio de Janeiro Troféu Transparência Congresso Anefac Profissional do Ano Colaboração Institucional DINHEIRO Crédito subsidiado passa quase ileso pela alta dos juros Enquanto empréstimos direcionados crescem a ritmo chinês, crédito livre, que financia o consumidor, sofre efeitos da política monetária mais austera Publicado em 21/05/2014 | CRISTINA RIOS Apesar do aperto monetário implantado pelo governo federal, existe um setor do crédito que continua a crescer mesmo com os juros mais elevados. É o chamado crédito direcionado (financiamento imobiliário, crédito rural e empréstimos do BNDES), cuja carteira avança em ritmo chinês. Nos últimos 12 meses, o aumento dessa linha chegou a 23,7% e atingiu R$ 1,256 trilhão, segundo dados do Banco Central (BC). INFOGRÁFICO: Veja como está a situação do crédito 1,5% foi o recuo no saldo da carteira de financiamento veicular no último ano, passando para R$ 189,9 bilhões, segundo o Banco Central. A venda de veículos é um dos setores que ajudou a puxar a desaceleração do crédito no país. Estagnação Juros mais elevados atingem em cheio o financiamento ao consumo A carteira de crédito livre para pessoas físicas praticamente não cresceu no primeiro trimestre do ano, com avanço de apenas 0,7% sobre os últimos meses do ano passado. No período, esse saldo foi de R$ 750 bilhões. X No acumulado dos últimos 12 meses, o saldo está positivo em 7,1%, mas o ritmo é bem menor do que o verificado nos últimos anos, quando chegou a avançar entre 18% e 20%. “Esse aumento é nominal. Se descontarmos a inflação no período, vemos que esse tipo de crédito livre para pessoa física parou de crescer no último ano”, diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian. A acomodação do crédito livre já era esperada porque é mais sensível ao ritmo da taxa de juros. As sucessivas elevações do custo do crediário, o menor grau de confiança dos consumidores e a aceleração da inflação vêm impactando a disposição dos consumidores em ampliar o endividamento. Fábio Tadeu Araújo, professor da PUCPR, acredita que o principal fator para inibir o crédito é a combinação da conjuntura econômica, de baixo crescimento com inflação alta. “Quando olhamos a performance do crédito quando os juros estavam mais baixos, vemos que o crescimento já estava menor. Nesse caso, a conjuntura tem peso maior do que as taxas praticadas”, diz. Para ele, o crédito não vai avançar nas mesmas proporções dos últimos anos. “Crescer 20% ao ano é fácil quando o crédito representa 20% do PIB. Crescer nesse nível com 55% do PIB é bem mais complicado”. Opinião Dimensão do crédito direcionado no Brasil é um problema Guido Orgis, editor executivo de Economia O Brasil foi longe demais no crédito direcionado. É evidente que nenhuma economia normal funciona com o Estado dizendo onde deve ser investida metade dos recursos disponíveis. O mercado financeiro é uma invenção que está na base do funcionamento das economias de mercado. Permite que as pessoas com contas a pagar no futuro economizem e sejam remuneradas por quem tem uma necessidade no presente. Esse sistema funciona melhor quando todos concorrem ao mesmo tempo por esse dinheiro – na média, todos pagam menos, com risco menor. Como o mercado não é totalmente eficiente – ele pode deixar de fora áreas importantes, como empresas altamente inovadoras, mas sem garantias físicas, por exemplo –, é natural que haja políticas de direcionamento de recursos. Todos os países fazem isso de alguma forma. O problema no Brasil é a dimensão. Temos hoje o maior banco de fomento do mundo, o BNDES, que empresta a taxas abaixo do pago na captação feita pelo Tesouro Nacional. Chegamos ao absurdo de ouvir o setor agrícola reclamando de uma taxa de 6,5% ao ano, que mal cobre a inflação. Pagamos três vezes por essa política: com os impostos que subsidiam essas taxas, com os juros mais altos cobrados pela outra metade que sobra e com a inflação incômoda. Enquanto isso, a carteira de crédito livre (cheque especial, cartão de crédito, financiamento veicular e empréstimo consignado) sofre os efeitos da alta da Selic e vê diminuir o ritmo de crescimento. O saldo anual – incluindo pessoa física e jurídica – avançou apenas 6,5%, para R$ 1,5 trilhão. Os juros do crédito direcionado são pouco sensíveis à alta de juros básicos pelo BC, porque em geral são subsidiados pelo governo. Entre março de 2013 e 2014, eles subiram apenas 0,7 ponto porcentual. Graças ao direcionado, a carteira total de empréstimos bancários no país acumula crescimento de 13,7% em 12 meses, para R$ 2,759 trilhões, segundo o BC. A participação do crédito sobre o PIB passou de 54,1% para 55,9% em um ano. “O que vemos é que o crédito direcionado deve ultrapassar o livre nos próximos anos”, diz Fábio Tadeu Araújo, professor de Economia da PUCPR. Apesar de ser uma linha que depende de políticas de incentivo, o empréstimo subsidiado tem papel importante em desenvolver setores que não teriam condições de crescer sem taxas de juros baixas. “É o caso do setor de infraestrutura e o imobiliário e também o rural, que tem um papel importante na economia”, explica Araújo. Vitamina O crédito direcionado começou a crescer de maneira mais vigorosa após a crise de 2009, quando o governo passou a usar, principalmente, bancos públicos para vitaminar a economia. Hoje, essa linha de financiamento é dominada pelos três bancos públicos federais. O crédito para investimentos das empresas é realizado, em grande parte, por meio de operações diretas e repasses do BNDES. Já os financiamentos habitacionais são, em sua maioria, concedidos pela Caixa Econômica Federal, enquanto o crédito rural tem no Banco do Brasil o seu principal agente financiador. Debate Vantagens e desvantagens da modalidade dirigida dividem economistas O crescimento do crédito direcionado no país é fonte de debate acadêmico há anos. Para economistas mais liberais, como o ex-presidente do Banco Central (BC) e do BNDES Persio Arida, a aposta no crédito direcionado por parte do governo tem um lado perverso do ponto de vista macroeconômico, já que, como é resistente à alta taxa de juros, ele faz com que os ajustes monetários feitos pelo BC para conter a inflação tenham que ser mais fortes. Na opinião de Arida, o país deveria eliminar o crédito direcionado, o que seria um caminho para a queda das taxas de juros. Já uma corrente contrária, que tem entre seus defensores o economista Luiz Gonzaga Belluzo, ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, acredita que o crédito direcionado é importante para manter o equilíbrio de mercado, dar acesso a financiamento a setores estratégicos e também aos que não teriam acesso ao recurso livre. Além disso, segundo ele, o direcionado tem a função de forçar a redução dos lucros dos bancos privados em um mercado bastante concentrado. Para ele, a eliminação do crédito direcionado não apenas não faria cair os juros, como iria aumentá-lo, já que o mercado bancário ainda é oligopolizado. Efeito cascata Bancos repassam juros ainda mais altos ao consumidor final Desde março de 2013, o Banco Central implantou um novo ciclo de alta de juros para conter a inflação. Com isso, a taxa básica (Selic) passou de 7,25% ao ano para 11% ao ano. Os juros futuros subiram e os custos de captação ficaram mais altos para os bancos, que repassaram as novas taxas para o consumidor. Os bancos, em geral, subiram suas taxas acima da própria taxa básica, segundo uma pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Segundo dados da Serasa Experian, a disposição do consumidor de contratar novos empréstimos vem diminuindo. No acumulado dos primeiros quatro meses deste ano, a demanda por crédito mostrou queda de 5,3% diante do mesmo período de 2013. “E esse movimento não deve melhorar nos próximos meses, com a perspectiva de novas rodadas de aumento da Selic após as eleições”, afirma Luiz Rabi, economista da entidade. http://www.gazetadopovo.com.br/economia/conteudo.phtml?id=1470268