carandiru: análise da coerção no sistema prisional

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Universidade Vale do Rio Doce
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais
Curso de Psicologia
CARANDIRU: ANÁLISE DA COERÇÃO NO
SISTEMA PRISIONAL
Rafaella Ribeiro Teixeira
Orientador: João Carlos Muniz Martinelli
Governador Valadares
2008
RAFAELLA RIBEIRO TEIXEIRA
CARANDIRU: ANÁLISE DA COERÇÃO NO
SISTEMA PRISIONAL
Monografia para obtenção do grau de
bacharel em Psicologia, apresentada à
Faculdade de Ciências Humanas e
Sociais da Universidade Vale do Rio
Doce.
Orientador: João Carlos Muniz Martinelli.
Governador Valadares
2008
RAFAELLA RIBEIRO TEIXEIRA
CARANDIRU: ANÁLISE DA COERÇÃO NO SISTEMA PRISIONAL
Monografia apresentada como requisito
para obtenção do grau de bacharel em
Psicologia pela Faculdade de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Vale
do Rio Doce
Governador Valadares, ____ de ____________ de _____.
Banca Examinadora:
__________________________________________
Prof: Dr. João Carlos Muniz Martinelli - Orientador
Universidade Vale do Rio Doce
__________________________________________
Prof. Dr. Marco Antônio Amaral Chequer
Universidade Vale do Rio Doce
__________________________________________
Prof. Dra. Tatiana Amaral Nunes
Universidade Vale do Rio Doce
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por ter iluminado meu caminho, aos meus pais, por
terem investido nos meus sonhos. Muito obrigado pai, por ter acreditado. Se não fosse
por sua força não teria alcançado meu objetivo.
A minha mãe por ter ouvido meus desabafos e as minhas irmãs que apesar da
distância sempre estiveram no meu coração.
As minhas amigas da cotonete (Emiliana, Priscila, Noely, Edna e Fátima). Vivemos
muitos bons e importantes momentos juntas.
Ao meu namorado que sempre esteve ao meu lado em todos os momentos felizes e
difíceis ao longo dessa caminhada, me ajudando com seu carinho, amor e dedicação.
Ao meu orientador Prof. João Carlos Muniz Martinelli pela dedicação e paciência.
Aos demais familiares, amigos e todos que contribuíram para essa conquista.
Amo muito todos vocês.
“Costuma-se dizer que ninguém conhece
verdadeiramente uma nação até que tenha
estado dentro de suas prisões. Uma nação não
deve ser julgada pelo modo como trata seus
cidadãos mais elevados, mas sim pelo modo
como trata seus cidadãos mais baixos”.
NELSON MANDELA
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
08
1.1. CONCEITO
1.2. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DA COERÇÃO
1.2.1. ALGUMAS EVIDÊNCIAS EXPERIMENTAIS
1.2.2. PRINCÍPIOS DE ANÁLISE DO COMPORTAMENTO
1.3. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A COERÇÃO
12
13
13
18
21
2. COMPORTAMENTO SOCIAL E PRÁTICAS CULTURAIS
34
3. AGÊNCIAS CONTROLADORAS E FORMAS DE CONTROLE SOCIAL
61
4-ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL:
79
OBJETIVO
94
GERAL:
ESPECÍFICOS:
94
94
MÉTODO
95
FONTE:
PROCEDIMENTO/PLANO DE ANÁLISE DOS DADOS:
95
95
RESULTADO
98
CONCLUSÃO
123
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
132
TEIXEIRA, Rafaella Ribeiro. Carandiru: Análise da coerção no sistema prisional.
Trabalho de conclusão do curso de psicologia da Universidade Vale do Rio DoceUnivale, 2008. Orientador: João Carlos Muniz Martinelli.
Resumo
A análise da coerção baseada na análise do comportamento pode ser um dos meios
empregados para o estudo da violência em diversos ambientes. O presente estudo teve
como objetivo analisar o uso de práticas coercitivas no sistema prisional dentro da
perspectiva da análise do comportamento, baseado da obra literária “Estação
Carandiru”. Método: foi realizada uma pesquisa qualitativa de asserções retiradas do
livro estação Carandiru, organizando a descrição em unidades de análise conforme,
assim distribuídas: grupo (G), categoria (C), subcategoria (S), definição da
categoria/subcategoria (D); asserções (A) e análise (AN). Resultados: Foi possível
identificar asserções representativas de todas as categorias/subcategorias propostas
para análise. Verificou-se que no ambiente prisional analisado não há correspondência
entre o que descreve a lei sobre e o que se pratica no cotidiano da instituição; os
presos se organizam, estabelecem práticas de convivência e formas de consequencia
para os comportamentos emitidos naquele ambiente; práticas de controle coercitivo,
rotas de fuga-esquiva e desistência são aparentes e comuns entre os relatos, inclusive
entre funcionários; que a estrutura e funcionalidade do sistema prisional torna-se um
ambiente propício a emergência de regras entre os presos como estratégia de
sobrevivência, sendo que tendem a repetir parte das práticas já observadas no
cotidiano dos presos antes de ingressarem no ambiente prisional. Conclusão: a
definição de coerção, categorias e subcategorias de análise mostraram-se úteis para a
análise proposta. O ambiente prisional, da forma como se apresenta no texto analisado,
é descritivo do uso generalizado de práticas coercitivas entre presos e entre presos e
funcionários da instituição. Observaram-se dificuldades em buscar meios alternativos à
prática punitiva, acarretando poucas oportunidades aos detentos em alterar os
comportamentos delituosos. Há reforço às práticas de manutenção de comportamentos
coercitivos, possivelmente dando pouca oportunidade de modificação do padrão de
respostas que tenha levado ao aprisionamento.
Palavras-chave: coerção, análise do comportamento, prisão.
8
1 APRESENTAÇÃO
O interesse pelo estudo do sistema prisional surge com a constatação do
tratamento desumano conferido aos presos dentro das unidades prisionais, que chama
a atenção de órgãos responsáveis pelos direitos humanos e de profissionais
envolvidos direta e indiretamente com as questões psicossociais da execução da pena
privativa de liberdade.
A Casa de Detenção Carandiru foi por muito tempo o maior complexo
penitenciário do Brasil, sendo ainda um dos maiores da América Latina. Como ocorre,
via de regra, nas unidades prisionais brasileiras, um dos grandes problemas
enfrentados na Casa de Detenção era a superlotação. Os números totalizavam 7000
homens que cumpriam pena nas dependências do presídio no início da década de 90.
Diante dessa realidade, o pessoal responsável pela administração da casa acabava
delegando suas funções de controle dos presos aos próprios detentos (OYAMA, 2000)
Os detentos responsáveis pelo controle do presídio possuíam um perfil de
liderança e eram pessoas dotadas com habilidades políticas, pois necessitam conseguir
administrar habilidosamente os conflitos entre presidiários e ainda ter a capacidade de
argumentar com os funcionários da administração. Os detentos que se encaixavam
nesse perfil eram conhecidos como “os faxinas”. Eles compunham a espinha dorsal do
presídio, além de se constituírem em uma espécie de elite do grupo (OYAMA, 2000).
Para exercerem o controle, os faxinas, Utilizava-se de um código de regras
bastante rígido e primitivo. Algumas vezes prezando valores da sociedade externa à
casa de detenção, como por exemplo, quando se referem às regras que proíbem os
presos de assediarem as mulheres uns dos outros, ou ainda faltar com respeito a
parentes do sexo feminino como irmãs ou mães. Algumas vezes, chegando ao extremo,
que vai contra esses valores, sendo exemplo a decisão de torturar e em casos
considerados extremos, de matar estupradores e presos que fazem dívidas de drogas e
não pagam (OYAMA, 2000).
Os faxinas são os juízes encarregados de decidir sobre as punições daqueles
que não obedecem às leis dos presos. Além disso, trabalhavam na limpeza e na
9
organização do local. Eles possuíam o respeito de todos os detentos existentes no
presídio e eram escolhidos criteriosamente para comporem esse grupo (OYAMA, 2000).
Além da superlotação e das regras rígidas impostas ao grupo, a Casa de
Detenção também enfrentava outros problemas graves. É o que demonstra o trabalho
do Doutor Drauzio Varella, médico brasileiro especializado em oncologia e imunologia.
Ao realizar, um trabalho de prevenção da AIDS no presídio, o médico constatou que
para cada 1000 presos, 137 eram infectados pelo vírus HIV. Os que ainda não estavam
contaminados possuíam todas as oportunidades de adquiri-lo devido a práticas sexuais
estabelecidas naquele local e ao uso de drogas injetáveis. Somados a isso, a falta de
remédio e tratamento adequado acabavam por agravar as condições dos doentes que
chegavam em sua maioria ao óbito (FRANÇA, 1996).
As experiências de Varella com o trabalho de prevenção da AIDS fez com que
escrevesse o livro chamado Estação Carandiru (1999) o qual possui, dentre suas
principais importâncias, o fato de chamar a atenção para os graves problemas
enfrentados pelos sistemas prisionais brasileiros ( AMARAL, 1999)
Ao escrever Carandiru, Varella buscou narrar histórias reais dos detentos
existentes no presídio sem fazer-lhes qualquer julgamento moral. Porém, denuncia
através dos diálogos entre eles, a rotina de condições subumanas as quais os presos
eram submetidos, como também as condições de trabalho a qual se encontravam os
carcereiros e agentes penitenciários (AMARAL, 1999).
Essa rotina subumana agravada pela superlotação é denunciada pela revista
VEJA (SOUZA, 1998). De acordo Souza a superlotação e a falta de funcionários
fomentavam a violência, pois fazia com que os presos assumissem o controle do
presídio e resolvessem suas desavenças com a morte. Muitos que são jurados de
morte e conseguem escapar vão parar no amarelo. Esse local é composto por
cubículos fétidos e imundos que lembram uma masmorra e são superlotados, e
chegava a abrigar até quinze presos que perderam o direito de transitar livremente
entre os outros detentos.
10
A situação dos que não perderam o direito de conviver uns com os outros
também não é muito cômoda devido à rigidez dos códigos criados pelos presos, pelo
tráfico e o uso de drogas, a ociosidade e o suicídio.
Violência é sinônimo de coerção. De acordo com Sidman (1995) ela é comum e
predominante em todas as formas de interação que os indivíduos estabelecem entre si
e com a natureza, fazendo com que o referente modo de controle seja tomado, pela
sociedade, como algo natural.
Nos cárceres, a coerção é administrada com a retirada de reforçadores positivos
ou com a apresentação de reforçadores negativos, e pela punição. Ocorre que a
técnica de controle aversivo tendem a gerar a emergência de comportamentos
adaptativos a ela, como é o caso da fuga esquiva e da agressividade, além de
subprodutos emocionais, como ansiedade, medo, rigidez intelectual dentre outros e que
acabam, como diz Sidman, por envenenar as relações sociais e ameaçar a
sobrevivência dos indivíduos (SIDMAN, 1995).
Existem alternativas para a coerção. A principal delas é o controle por
reforçamento positivo, porém ele cai em descrédito por ser mal compreendido
(confundido com chantagem, por exemplo) e por estabelecer um controle em longo
prazo não afetando de maneira imediata o responder como no caso da coerção. Porém,
o reforçamento positivo garante uma aprendizagem eficaz de comportamentos devido à
ausência dos efeitos colaterais aversivos originados, decorrentes do uso das técnicas
coercitivas (SIDMAN, 1995). Diante do exposto, a presente pesquisa pretende fazer
uma análise da coerção no sistema prisional a partir do livro Estação Carandiru (1999).
Para tanto, o primeiro capítulo apresenta a análise da coerção feita por Sidman
destacando os principais pontos levantados pelo autor concernentes a coerção e seus
efeitos. O segundo capítulo descreve o comportamento social e a relevância das
práticas culturais para a sobrevivência da espécie enfatizando a sobrevivência como
valor social. O terceiro capítulo aborda sobre agências controladoras, enfatizando as
leis e o governo, assim como relacionar suas formas predominantes de controle que
fomentam a violência por parte dos indivíduos controlados, e como uma forma de
contracontrolar tais ações. Por fim, o quarto e último capítulo apresenta considerações
11
breves sobre o atual sistema prisional brasileiro, partindo da história do surgimento das
prisões no Brasil, de suas principais mudanças, até chegar à situação atual em que o
sistema se encontra.
Segue a exposição do método com a análise qualitativa de asserções retiradas
do livro Carandiru as quais expressam as formas de fuga esquiva da coerção
aprontadas por Andery e Serio (1997) a partir de análises feitas por Sidman sobre a
coerção e suas implicações.
12
1. Coerção: conceito, princípios e considerações gerais.
1.1.
Conceito
Sidman considera que a sociedade utiliza de coerção para conseguir que seus
membros se comportem exatamente de acordo com o esperado, e neste sentido, “... a
sociedade, como uma regra geral, tenta manter nossas consciências utilizando meios
coercitivos...” (SIDMAN,1995, p.63).
As pessoas obedecem às leis, chegam cedo ao trabalho, dentre outros
comportamentos, não por alguém ter-lhes ensinado pura e simplesmente que isso é o
correto a fazer, mas principalmente porque agir de outra maneira lhes custaria
conseqüências desagradáveis para suas vidas. Isso significa dizer que as pessoas
agem sob a ameaça de serem punidas, passando assim, a fugir ou evitar situações que
são aversivas, ao invés de agir por se sentirem recompensadas ou acrescentadas por
tais atitudes (SIDMAN, 1995).
De acordo com Sidman coerção refere-se a:
O uso da punição e da ameaça da punição para conseguir que os outros ajam
como nós gostaríamos e à nossa prática de recompensar a pessoas deixandoas escapar de nossas punições e ameaças (...). (SIDMAN, 1995, pág.17).
Segundo Sidman (1995), as interações sociais ocorrem quase totalmente através
do uso da coerção. Como afirma, “a principal razão é controlar outras pessoas... ”
(SIDMAN, 1995: 80).
O controle pela punição pode ocorrer por diferentes razões:
Punimos pessoas baseados na crença de que as levaremos a agir
diferentemente. Usualmente queremos parar ou evitar ações particulares.
13
Punimos alguém cuja conduta consideramos má para a comunidade, má para
algum outro indivíduo, ou mesmo má para a própria pessoa. Queremos colocar
um fim à conduta indesejável (SIDMAN, 1995, pp.80-81).
Administramos todos os tipos de punição de forma a controlar outras pessoas a
fim de parar ou impedir quaisquer de suas ações que nos machucam, privam,
insultam ou desagradam. Por sua vez, outros usam a punição para nos controlar,
a fim de parar ou impedir quaisquer de nossas ações que os machucam, privam,
insultam ou desagradam (SIDMAN, 1995, p.81).
Para o autor, na linguagem cotidiana ser coagido refere-se a ser compelido sob
julgo ou ameaça de realizar algo “contra a vontade”. Entretanto, todo o comportamento
é controlado, e assim é necessário observar que contingências estão em operação
quando se descreve a coerção:
“Se quisermos entender ou influenciar processos complexos como motivação,
memória, aprendizagem, percepção, interação social, desenvolvimento da
personalidade, cognição e linguagem, um primeiro passo é identificar
contingências de reforçamento que são fundamentais para cada um deles. Ao
fazer isso, descobriremos vários tipos de contingências de reforçamento e eles
fornecerão a base para uma definição formal de coerção. Conseqüências não
são os únicos tipos de eventos que influenciam a conduta, mas sua classificação
nos permite separar influências coercitivas de influências não coercitivas.”
(SIDMAN, 1995, p.55).
1.2.
Análise do comportamento da coerção
1.2.1. Algumas evidências experimentais
Os avanços nas pesquisas sobre punição são pouco divulgados, dando margem
para distorções sobre a questão. Isso parece ser um dos eventos que facilitam a facilitar
a aceitação da coerção como único modo de controle possível. Efeitos nocivos da
coerção implicam, por exemplo, que os indivíduos tenham dificuldade em enxergar
alternativas mais saudáveis de interação.
14
Para Sidman (1995), as pessoas desconhecem os efeitos da punição e sua falta
de efetividade na eliminação da conduta indesejável. Muitas vezes, para o autor, elas
colocam em “xeque” até mesmo a existência do controle do comportamento. Há
pessoas que acreditam ser a punição a única forma de conseguir com que alguém se
comporte “corretamente”. Passam a criticar alternativas como aquelas que descrevem o
emprego de reforçamento positivo, que pode ser útil para ensinar maneiras de agir de
forma mais saudáveis para o individuo e suas relações sociais.
Tais condutas tendem a dificultar a utilização dos conhecimentos científicos
disponíveis. Os efeitos disso é sentido como um comprometimento do avanço para
novas tecnologias de controle de comportamento. Outro resultado aponta dificuldades
que incluem o próprio desenvolvimento das pesquisas sobre os efeitos dessas
alternativas.
(...) se realmente entendêssemos que nossa aceitação geral da coerção como
meio de controlar outros produz e perpetua a desconfiança, o medo, a agressão e
a infelicidade geral, que caracterizam tantas relações sociais e individuais, então
embora pudéssemos não abandonar a punição, nós a usaríamos uns com os
outros parcamente. Mais precisamente, seríamos capazes de tornar o mundo
muito mais seguro, menos ameaçador, menos gerador de estresse e um lugar
mais prazeroso para viver do que ele é hoje para milhões de pessoas. (SIDMAN,
1995, p.30).
Diante das circunstâncias atuais, pode-se perceber a importância da pesquisa
em análise do comportamento sobre os efeitos da coerção. De acordo com Sidman:
O laboratório nos permite alterar o ambiente de um sujeito e então retorná-lo a
seu estado original. Tal controle sobre as condições experimentais torna possível
descobrir se um efeito particular faz um individuo agir diferentemente (...). A
possibilidade de estabelecer relações causais é uma vantagem fundamental de
experimentos controlados; estudos que não são de laboratório deixam ambos,
ambiente e comportamento, livres para mudar incontrolavelmente (SIDMAN,
1995, pág.71).
15
Assim, uma vantagem do laboratório se encontra no fato de poder se observar
através do manejo de variáveis dependentes e independentes, como contingências
simples permitem identificar os diversos processos que podem estar ocorrendo quando
um sujeito experimental se comporta. Quando este tem seu comportamento punido em
situação experimental, pode observar esses processos, como no caso em que ao invés
de ser reforçado positivamente, emite comportamentos que cientista deseja suprimir do
repertório (SIDMAN, 1995).
Sidman (1995, p. 82) aponta que a resposta sobre o funcionamento e eficácia da
punição é complexa, e merece diversas considerações. Expõe o próprio cotidiano em
sua argumentação: por um lado, “ninguém gosta de ser punido e alguns descobrem
desprazer em aplicar punição...”, e aqueles que dizem ser a punição desejável e
necessária sustentam suas posições apelando à religião, moralidade, decência comum
e mesmo senso comum. De outro lado, dados e análises científicas são necessários
para a verificação dos efeitos da punição para propósitos sociais e no controle
individual. Afirma:
Certamente, a punição capital elimina comportamentos – faz isto bastante
diretamente, exterminando aquele que se comporta. O assassinato pela
sociedade realmente reduz o assassinato por indivíduos? Colocar pessoas na
prisão também pode eliminar comportamentos – é mais difícil, embora
certamente não impossível cometer assassinato, roubo, fraude ou estupro atrás
das grades. O encarceramento impede pessoas de cometer esses crimes depois
que elas saem? Penalidades financeiras podem acabar com o lucro de
sonegadores. Confiscos ocasionais os mantêm honestos entre auditorias ou
elimina a evasão de impostos por outros que têm mais a ganhar? (SIDMAN,
1995, P.82).
Há razões, portanto, para a investigação científica acerca da punição. Sidman
(1995) descreve como dados de laboratório podem ser úteis na investigação dos efeitos
da punição, oferecendo alternativas de análise que venham a discutir esse modo de
controle além de seu efeito imediato.
Um primeiro efeito observado pelo autor é a manutenção do responder mesmo
após a introdução de conseqüências aversivas, quando se espera apenas uma
16
supressão do responder. Quando se relaciona reforço e punição (a cada responder),
sucessivamente, um período inicial de supressão da resposta pela introdução de
conseqüência aversiva é observado, após esse efeito inicial há uma recuperação
gradual da atividade, retornando a níveis anteriores. Nesse caso se observa o efeito
temporário da punição, e assim:
(...) Qualquer coisa que afastasse o animal de seu trabalho apenas o deixaria
mais faminto. As duas conseqüências de pressionar a barra – alimento e choque
– estavam, portanto, em competição direta... quanto mais tempo o animal parou,
mais faminto se tornou... pressionar a barra tornou-se mais poderoso que a
punição. O animal retornou a sua atividade “ilegal” porque aquela era a sua única
maneira de obter alimento (SIDMAN, 1995, p.86).
Ao descrever o achado experimental, Sidman analisa o que chama de
“mecanismo
simples”
que
produz
criminalidade
reincidente,
embora
fatores
complicadores alterem esse quadro simples:
(...) Jovens são libertados de reformatórios e adultos de prisões com repertórios
de comportamentos não mais aceitáveis para a sociedade do que os atos
delinqüentes que os levaram ao encarceramento. De que outro modo eles irão
obter seus reforçadores?(...) (SIDMAN, 1995, p. 86).
Outro procedimento discutido por Sidman (1995) consiste em aumentar a
intensidade da punição. Neste caso, observa-se um efeito poderoso: supressão
originando períodos mais longos entre atividades; e quando a punição for muito intensa
(e.g., choque intenso), a atividade não se recupera, e não podendo encontrar outro
meio para se alimentar, o organismo (no caso, o animal experimental) presumivelmente
morreria de fome. E diz,
(...) Mas, se a punição for suficientemente forte, pode até mesmo por um fim à
produção de reforçadores positivos que sustentam a vida. E assim, vemos uma
17
base aparentemente interminável da luta entre aqueles que baniriam punições
cruéis e não-usuais e aqueles que insistem que apenas medidas severas podem
conter a ilegalidade. (SIDMAN, 1995, p. 87).
Para o autor, o comportamento inadequado pode persistir a despeito da punição,
pois também é reforçado. Há aquele cujo comportamento indesejado ocorre tão
fortemente que acaba por impedir a emissão de respostas em outras direções. Pode-se
sentir que a punição é o único recurso, quando se deseja, por exemplo, fazer parar um
ato inadequado para criar uma oportunidade de reforçamento de outro comportamento,
por meio de punição suave. Nesse sentido,
(...) a menos que tenhamos deliberada e habilidosamente usado o efeito
supressivo inicial da punição suave para instalar a conduta que queremos, nada
garante que a substituição será desejável. (SIDMAN, 1995, p.88).
Outra condição experimental que aponta novos aspectos da punição implica em
tornar a punição (estímulo aversivo) como pré-condição necessária para a obtenção do
reforçador. Neste caso, “(...) o resultado de tal transformação será uma pessoa que
busca a punição (...)” (SIDMAN, 1995, p.88). Com o aumento gradual da intensidade da
punição, passo a passo, vê-se outro efeito, o animal pode vir a pressionar a barra até
ao ponto do estímulo aversivo derrubá-lo (e.g., choque intenso), e ainda assim
continuar respondendo, e, assim, “(...) o próprio choque terá se tornado, agora, um
reforçador positivo(...)” (ibidem, p.88).
As questões originadas por essas investigações apontam, então, dificuldades
novas no campo social, quando se passa a analisar o uso da punição e seus efeitos
sobre os padrões de comportamento social, e nos efeitos combinados de punição e
reforçamento positivo sobre esses comportamentos.
18
As pessoas freqüentemente trabalham por choques? Todos conhecemos
indivíduos que parecem desabrochar seu próprio sofrimento, que parecem
sempre trazer sobre si mesmos a ira de seus colegas de trabalho, famílias,
professores ou “autoridades”. Usando a punição de modo tal a convertê-la em
reforçamento positivo, uma comunidade coercitiva subverte sua própria
racionalidade por recorrer à punição em primeiro lugar. Um resultado pode ser a
conduta patológica. Psiquiatras há muito estão conscientes das tendências
autodestrutivas que caracterizam muitos de seus pacientes (e mesmo de
pessoas que não são pacientes) (...) (ibidem, p.89).
Evidência mais direta pode ser encontrada no comportamento de auto-injúria de
algumas pessoas institucionalizadas (...) administrar dor a si mesmas como o
único meio de obter atenção (...) (ibidem, p.89).
Para o autor, o uso da punição produz efeitos indesejáveis, justificando o seu
não uso como prática de controle social. Resume sua posição quando afirma:
O objetivo mais razoável do uso da punição é parar comportamento indesejável,
impedir pessoas de fazer coisas que são perigosas, assustadoras ou que
consideramos inadequadas, desvantajosas, imorais ou anormais. Vimos dois
modos de usar a punição que parecem atender a esse objetivo. Um é administrar
punições muito fortes (...) o outro é administrar punições suaves para fazer a
1
pessoa parar de se comportar (...) [e daí ] ensinar-lhe o modo correto de agir
(ibidem, p.90).
E ainda,
Mas estas duas maneiras de usar a punição não são recomendações (...) Além
de suprimir conduta indesejada, a punição faz muitas outras coisas (...) [e esses
2
conhecimentos ] levam inevitavelmente à conclusão de que a punição é o método
mais sem sentido, indesejável e mais fundamentalmente destrutivo de controle de
conduta (ibidem, p.90-91).
1.2.2. Princípios de análise do comportamento
1
2
Grifo nosso.
Grifo nosso.
19
Sidman (1995) descreve que o comportamento não ocorre no vácuo; eventos
antecedem e se seguem a cada uma das ações, e o que ocorre como conseqüência
tende a controlar o comportamento, tornando-o mais provável em ocasião futura,
determinando, assim, o que alguém poderá vir a fazer mais tarde. O comportamento é
sensível às conseqüências que o segue.
Segundo Skinner (2003), um comportamento que tem o tipo de conseqüência
chamada reforço, terá maior probabilidade de ocorrer novamente. Um reforçador
positivo fortalece qualquer comportamento que o produza. Quando um comportamento
é seguido por um reforçador negativo, fortalece qualquer comportamento que o reduza
ou o faça cessar.
O processo suplementa a seleção natural, quando se analisa a seleção
filogenética, que descreve processos evolutivos que produzem a herança genética da
espécie. Dessa forma suplementar, conseqüências importantes do comportamento que
não poderiam desempenhar um papel na evolução porque não há traços biológicos
suficientemente estáveis, coloca ao indivíduo a questão de como vai sobreviver em um
ambiente em que a forma de se comportar também produz o mundo em que viverá?
Seleção pelas conseqüências, em nível operante. Então, por evolução filogenética a
espécie passa a ser capaz de “aprender” com o efeito de sua ação, possibilitando a
adaptação ao ambiente. Também se aprende a emitir comportamentos que mesmo sob
possíveis conseqüências em longo prazo nocivas, sem mantém em alto padrão devido
ao efeito da imediaticidade das conseqüências. Outros processos se dão.
Três tipos de relações entre conduta e conseqüências são mencionados como
controles do comportamento na análise do comportamento: reforçamento positivo,
reforçamento negativo e punição. O controle por reforçamento positivo caracteriza-se
por ser não coercitivo, enquanto os demais o são.
Reforçamento pode ser expresso como uma relação funcional “se... então”, o
que descreve uma contingência, ou contingência de reforçamento, supondo que ao
emitir uma conduta particular uma conseqüência se seguirá, será contingente a; o
mesmo não ocorrerá na mesma ocasião para outra conduta que não foi reforçada.
Condutas emitidas e conseqüências produzidas em determinado ambiente fazem com
20
que o próprio ambiente passe a sinalizar conseqüências diante de emissão de
comportamentos novos, em ambientes semelhantes ou com propriedades de estímulo
associados.
Os reforçadores (estímulos conseqüentes) possuem características definidoras:
devem seguir uma ação e fazer com que essa ação se repita ou ocorra com mais
freqüência. O primeiro elemento (seguir a ação) descreve a sua relevância temporal (a
conseqüência deve seguir imediatamente ao responder) e o segundo, sua
funcionalidade, aponta a repetição do comportamento como produto da interação prévia
(condicionamento). O estímulo reforçador, por sua vez, tem sua função devido a história
biológica da espécie (reforçador primário) ou decorrente da história de aprendizagem
(reforçador secundário)3. Associa-se geralmente a idéia de que todo estímulo reforçador
é reforçador por produzir prazer, sentimentos agradáveis, porém, ainda que esses
sentimentos possam ser observados, eles não descrevem satisfatoriamente o principal
efeito do reforçamento, o de fortalecimento. Assim, um estímulo que aparentemente
poderia não ser considerado reforçador, como a dor, pode mostrar-se reforçador sob
certas contingências de reforçamento, e isso pode ser mais freqüente que o esperado.
Nem sempre prazer e reforçamento mantêm correspondência. Outro aspecto a
considerar é que sentimentos como prazer possa seguir-se ao reforçamento positivo,
por exemplo, mas seu principal efeito ainda corresponde ao aumento de probabilidade
de emissão de respostas semelhantes no futuro.
O efeito de prazer e de fortalecimento. Eles ocorrem em diferentes momentos e
são sentidos como coisas diferentes. Quando nós sentimos prazer, nós não
estamos necessariamente sentindo uma maior inclinação para agir da mesma
fora. (...) Por outro lado, quando nós repetimos o comportamento que foi
reforçado, nós não sentimos o efeito de prazer que nós tínhamos sentido no
momento em que o reforçamento ocorreu” (SKINNER, 1985a/1987, p.17, citado
em MICHELETTO & SÉRIO, 1993).
3
Segundo Sidman (1995, p.54), “Reforçadores específicos não são assim predefinidos; nós os descobrimos...”.
21
Os sentimentos observados com a exposição às contingências são também
importantes.
O reforçamento positivo descreve que a ação é seguida pela adição, produção
ou surgimento de algo novo, enquanto que no reforçamento negativo, vê-se a
subtração, remoção ou eliminação de algo, mas ainda a aprendizagem de outros
comportamentos que cessam, param ou eliminam as fontes de estímulo aversivo; neste
caso vê-se implicados os processos comportamentos denominados de fuga e esquiva..
1.3.
Considerações gerais sobre a coerção
A punição está presente em todos os relacionamentos humanos, faz parte do
cotidiano das pessoas, que agem punindo e sofrem o efeito da punição.
Sidman (1995) descreve que o uso da punição não apenas é um método
freqüente utilizado no controle pessoal, mas ocupa lugar de destaque nas práticas de
controle social. E neste sentido,
A aplicação de formas não coercitivas de controle tem sido insignificante em
comparação com o recurso habitual da humanidade à coerção. (SIDMAN, 1995,
P.18).
A consciência humana se constrói em decorrência dessas contingências. Sobre
coerção
espera-se
que
as
pessoas
aprendam
noções
de
certo
e
errado
(comportamento ético), quando apenas estão aprendendo o que é errado e como fugir
das conseqüências ruins de fazer algo considerado errado na cultura atual
(comportamento moral). Nessas condições, a noção de certo contrapõe a noção de
22
errado; por meio de punição se aprende, somente, o que não se deve fazer, o que é
considerado “errado” (SIDMAN, 1995).
Uma das conseqüências a respeito do modo como a coerção mantêm-se
presente de forma tão disseminada na sociedade atual, está no fato de tornar o
ambiente social e individual cada vez mais restritos, fomentando uma necessidade de
maior liberdade entre os indivíduos (SIDMAN, 1995).
Sidman cita Skinner quando aborda a questão da liberdade e a ameaça da
liberdade imposta pelo controle coercitivo:
Se nunca tivéssemos escravizados uns aos outros, o ideal de liberdade da
servidão não teria sido necessário (...) se não tentássemos controlar uns aos
outros por ameaça da punição, privação, restrição e perda, todos teríamos sido
livres sem que jamais o conceito de liberdade tivesse surgido (SIDMAN, 1995,
p.42-43).
Para o autor, evidências dadas pela análise do comportamento dizem que
mesmo que a coerção atinja seu objetivo imediato, ela está sujeita ao fracasso. O
principal problema está nos efeitos observados, tanto sobre o comportamento punido
como para o repertório de comportamentos das pessoas:
(...) Sim, podemos levar pessoas a fazer o que queremos por meio da punição ou
da ameaça de puni-las por fazer qualquer outra coisa, mas quando o fazemos,
plantamos as sementes do desengajamento pessoal, do isolamento da
sociedade, da neurose, da rigidez intelectual, da hostilidade e da rebelião
(SIDMAN, 1995, p.18).
Visto que a coerção participa das relações sociais de maneira generalizada,
Sidman (1995) considera que os indivíduos tenham aprendido a controlar uns aos
outros através de interações coercitivas com o ambiente. Chama a atenção para o
ambiente hostil e a comunidade hostil. Sob um ambiente hostil, “a própria natureza dá o
exemplo”, as ameaças do mundo físico fazem parte da vida das pessoas, e ações
23
preventivas parecem necessárias para quem não quer ser pego de surpresa,
entretanto, a natureza não fala do que deve ser feito para evitar essas ameaças.
(...) Nossa conduta segue leis gerais que são independentes do caráter pessoal
ou impessoal daquele e da intenção ou falta de intenção daquele que coage.
Reagimos a sinais de alerta do ambiente inanimado exatamente como fazemos
com relação à coerção imposta por nossos companheiros; tendemos a
personificar a natureza, ainda que apenas em nossa linguagem (SIDMAN, 1995,
p. 35).
Justifica-se isso quando se vê um individuo que, utilizando-se de estratégias para
lidar com constantes ameaças, age como se algo ruim viesse a acontecer caso não
tome os cuidados necessários, sente algo que nem sempre consegue explicar.
As chuvas, o calor, a neve, epidemias e as catástrofes naturais podem ser
exemplos dessas ameaças no ambiente físico. Em locais onde há esses eventos as
pessoas tendem a ficar a espreita diante de certas mudanças ambientais. Informações
sobre possíveis eventos que coloquem em risco a si mesmo e aos próximos, deixam as
pessoas amedrontadas diante eventos em curso e apreensivas diante de sinais pouco
claros, e podem vir a fugir quando venham a sentir não haver mais controle sobre o
ambiente, sentem que fizeram o que deveria ter feito. Nota-se com isso, que há formas
de coerção que vêm do ambiente físico e maneiras de se comportar são aprendidas na
relação com ele, sendo estendidas e generalizadas para o ambiente social, e a
premissa continua sendo a mesma, contingências sociais mantém comportamentos
sociais.
Como as relações estabelecidas com a natureza são as pioneiras na modelagem
do comportamento humano, sendo, por conseguinte estendidas às interações com o
ambiente social, as pessoas tendem a achar que o controle coercitivo é algo natural e
inerente ao ser humano. A naturalidade com que a coerção é encarada pode ser
demonstrada nas várias instâncias da sociedade em que é utilizada: educação,
legislação, família, e até mesmo, erroneamente, em alguns processos terapêuticos.
24
Assim, a punição também faz parte das práticas engendradas por instituições,
como uma das formas de controle social. Observam-se efeitos adversos nesses
ambientes institucionais, quando a punição é prática comum.
Realmente podemos levar crianças a aprender punindo-as por não aprender.
Esta é a prática padrão. Mas muitas crianças a quem ensinamos deste modo
crescem menosprezando professores, odiando a escola e evitando o trabalho de
aprender... Práticas coercitivas na educação formal e no lar continuam de
geração em geração, tornando-se enraizadas no treino de professores e aceitas
pela comunidade (SIDMAN, 1995, p.18).
Com relação à instituição da justiça, Sidman (1995) descreve que há leis e
costumes sociais que descrevem o emprego de punição de uma maneira aceitável, e a
comunidade passa a controlar dessa forma as ações, mas há efeitos a observar,
Um sistema de justiça que é baseado apenas na punição por transgredir a lei
realmente mantêm muitas pessoas no caminho certo e provê satisfação para
aqueles que buscam revanche sobre os transgressores. Um código legal
coercitivo também gera, para muitos que estão sujeitos ao sistema, subterfúgio e
desobediência e, para muitos que administram e fazem cumprir o sistema,
brutalidade (SIDMAN, 1995, p.20).
E ainda,
A maioria das nações, incluindo as superpotências, afirma estar buscando a paz
e armando-se somente para a defesa. Uma política nacional de manter um “pulso
forte” – a ser usada, naturalmente, só em retaliação contra agressão – pode,
realmente, manter alinhados economicamente e militarmente outros países. Tal
coerção também gera ciúmes, animosidades e eventual contracontrole: o
moderno terrorismo é um exemplo extremo (SIDMAN, 1995, p.20).
Sidman (1995) observa ainda que o ambiente interno, ou seja, o organismo
humano, em sua interação com o ambiente externo pode dar origem a várias situações
que levem ao adoecimento e à morte, algumas dessas situações são imensamente
prazerosas, mas deveriam ser evitadas pelos prejuízos que causam. Exemplos disto
são a má alimentação e o consumo de drogas. O envelhecimento também pode ser
25
citado como algo ameaçador devido às complicações que surgem com o passar do
tempo. Nesse sentido, o comportamento humano se constitui e é modelado
coercitivamente tanto pelo ambiente externo quanto pelo ambiente interno.
Considera que apesar de a maioria de nossos comportamentos serem
controlados por conseqüências coercitivas (SIDMAN, 1995), não são todas as formas
de controle existentes que são caracterizadas como coerção; nesse sentido se faz
necessário entender que a coerção é somente uma subcategoria de controle e que
existem alternativas menos nocivas, a saber, o reforçamento positivo. O autor explica
que o comportamento é controlado por conseqüências que, dependendo de quais
sejam, o tornam mais ou menos provável de ocorrer. As conseqüências referem-se ao
que acontece posteriormente ao comportamento e influenciam sobre sua repetição de
forma bastante significativa no futuro. Esse modo de interação entre os organismos e
ambiente garantiu a adaptação às constantes mudanças às quais o ambiente veio
sofrendo com o passar dos séculos.
Apesar das situações cotidianas envolverem contingências muito mais
complexas de controle do comportamento do que as ocorridas em laboratórios, às
construídas neste ambiente podem ser testadas em sua capacidade de descrever os
comportamentos cotidianos, servindo de uma base para o entendimento deles. No
exemplo de comportamento ilegal, generalizado para o comportamento criminoso, o
comportamento que venha a ser punido talvez possa não cessar, devido ao fato desse
indivíduo não ter aprendido novos comportamentos durante o período da punição, os
quais lhe permitiriam agir de modo mais aceitável socialmente. Isso significa dizer que,
sem novas maneiras de garantir o ganho de seus reforçadores, o sujeito reincide, pois
por mais que seja desagradável a punição, esta perde sua efetividade diante da
impossibilidade do sujeito continuar sobrevivendo, por exemplo. O efeito temporário da
punição, devido a sua competição com reforçadores positivos, auxilia a entender
porque punição capital, a saber, as prisões, não eliminam os comportamentos
criminosos (SIDMAN, 1995). No caso, se as únicas formas aprendidas de acesso e uso
dos bens sociais e essenciais à sobrevivência forem baseadas no uso da coerção, não
haverá saída devido à perpetuação das contingências relacionadas na interação com
ambiente. Estas passam a manter o comportamento de quem pune e quem é punido,
26
um impedindo e o outro sendo impedido de variar ações em outras direções.
A
ausência de repertório mantido por contingências alternativas e adquirido de forma a
contra-controlar eficientemente o ambiente coercitivo, são antecedentes que parecem
contribuir para perpetuar o uso da coerção.
Outro efeito da punição a ser considerado, consiste na utilização de punição
severa para a eliminação do comportamento. Nesse caso, a punição mostra-se
bastante eficaz; no laboratório se observa que o animal pára de se comportar, e se não
tiver outros meios de obter comida, ele acaba morrendo de fome. Porém, a
administração de punição severa faz com que o individuo não consiga mais enxergar
outro modo de obter reforçadores na vida, fazendo com que simplesmente ele desista
dela (SIDMAN, 1995).
Todavia, alguns comportamentos indesejáveis persistem mesmo com a utilização
de reforçadores positivos, justificando a permanência de tais comportamentos ao fato
de produzirem reforçadores mais eficientes do que as novas possibilidades de
reforçamento apresentadas. Nesse caso, Sidman (1995) descreve o uso da punição
suave, que quando administrada de modo que leve, em consideração a aspectos
relativos ao tempo e intensidade da aplicação da técnica punitiva, pode aproveitar
devidamente
da
supressão
temporária
para
reforçar
positivamente
outros
comportamentos. Esses cuidados na aplicação das técnicas tornam mais provável a
ampliação do repertório, afastando a probabilidade de efeitos adversos que
comprometam a efetividade.
Há, entretanto, o desafio de sempre buscar meios alternativos para o controle
comportamental que não seja a coerção. Sidman (1995) adverte que apesar de ser
possível a aplicação de punição suave em algumas circunstâncias, a punição é uma
técnica que produz efeitos colaterais, muitas vezes desconhecidos, com conseqüências
prejudiciais ao individuo que, por si só justificam a necessidade de descobrir
alternativas para seu uso. De acordo com o autor:
(...) Alternativas estão disponíveis, mas elas são não-tradicionais, não-familiares,
mesmo para a maioria dos psicólogos. Também alguns métodos não - coercitivos
não são tão fáceis de aplicar ou tão rápidos em sua ação, como uma precisa
intensa punição ou um reforçador negativo. O que os torna necessários, ainda
27
que eles sejam não familiares e algumas vezes difíceis de aplicar, é o vasto
catalogo de efeitos colaterais da punição (...) (SIDMAN, 1995, p.93).
Um dos primeiros efeitos colaterais a ser observado é o que se produz com o
uso de punição condicionada. Diferentemente do que ocorre no ambiente experimental,
as interações entre as pessoas ocorrem de maneira complexa em ambientes físicos e
sociais circunstanciais, e por esses razões também complexos. Ocorre que, nesses
ambientes há sinais que indicam a ocorrência de determinados eventos, e se estes
eventos trarão prazer, desconforto ou dor. Com o passar do tempo, esses sinais podem
vir a associar-se a propriedades de reforçadores positivos, negativos ou punidores, pois
se tornaram condicionadores dos ambientes os quais estão dispostos. A simples
possibilidade
de
entrar
em
contato
com
estes
ambientes
já
desencadeia
comportamentos característicos do contato com estímulos condicionados antecedentes
na história do individuo. A partir disso, entende-se que os ambientes que sinalizam a
presença de punidores tornam-se ambientes punidores condicionados. A sociedade
atual é quase que totalmente uma sociedade punitiva, em razão disso, reforça em seus
componentes comportamentos de fuga esquiva, na maioria das vezes sob controle dos
produtos individuais de uma história social de punição condicionada (SIDMAN, 1995).
Compreendem-se como fuga os comportamentos que são emitidos em presença
dos punidores e reforçadores negativos.
Existem dois modos de fuga, ou rotas de
fuga: desligar-se ou desistir. Ao desligar-se de algo que o incomoda, o individuo pode
assumir três posturas principais: a primeira delas é fingir que os problemas não existem,
passando a enfrentá-los somente quando estes se instalam e demandam todo o uso da
habilidade e atenção disponíveis para resolvê-lo, provocando um desgaste que não
necessariamente ocorreria com a prevenção. A segunda postura refere-se ao fato de
delegar a responsabilidade da solução de problemas a terceiros, os quais são vistos
como mais capazes de resolvê-los, fugindo assim da culpa de não conseguir solucionálos. Por fim, não fazer nada e fingir que o problema não existe, pois aliviaria o individuo
das preocupações com problemas que parecem não possuir uma solução (SIDMAN,
1995).
28
No que diz respeito aos comportamentos de desistência, estes ocorrem quando
em contato com os reforçadores negativos condicionados, o individuo desiste de ser
participativo em suas instâncias mais relevantes, tais como: educação, família,
comunidade, religião, cidadania, dentre outros. A não participação do individuo na
sociedade e em seus problemas, torna a sua vida tosca e sem significado, pois ele
perde a capacidade de se adaptar às demandas e exigências dela (SIDMAN, 1995).
O suicídio pode ser considerado exemplo extremo de desistência:
No caso extremo uma pessoa literalmente desiste da vida. Suicídio é a fuga
ultima das garras de necessidade e coação, repentinamente esmagadoras, ou de
uma vida dominada de reforçamento negativo e punição (...). Suicídio, não
importa a sua forma é um problema especial; uma vez que ele jamais pode
acontecer mais que uma vez, suas conseqüências não podem preencher a
definição de um reforçador (SIDMAN, 1995, p.132).
Pode-se, de outra forma, supor alguns aspectos que levam um indivíduo a um
comportamento extremo como é o caso do suicídio, bem como sentimentos que
possam acompanhar as contingências de reforçamento na história do suicida. Dentre
eles, estão presentes os sentimentos de culpa e indignidade que se originam dos
excessos de demanda presentes. Por exemplo, na família, por não corresponder a tais
expectativas o individuo não consegue ter seus comportamentos reforçados
positivamente, fazendo com que seus próprios comportamentos se tornem reforçadores
negativos condicionados, tornando o suicídio uma opção possível de fuga. Outro
aspecto relevante do comportamento suicida se caracteriza pelo fato de ser ele mesmo
uma forma de coerção, quando o suicida consiga, por meio de chantagem, aquilo que
deseja de outros, chamando a atenção para si. Como também o suicídio pode se tornar
uma forma de punição contra aqueles que coagiram o individuo de maneira insuportável
(SIDMAN, 1995).
Sidman (1995) refere-se à esquiva como um produto secundário da fuga. Isso se
explica porque um indivíduo passa a evitar o contato com reforçadores negativos
somente porque já experenciou seus efeitos desagradáveis, e teme, tendendo a
responder ao menor sinal de que possa entrar em contato com esses reforçadores
29
novamente. Apesar de a esquiva relacionar-se a comportamentos orientados para algo
que possa acontecer de indesejado no futuro, a experiência torna-se referência para
evitar o que pode vir a acontecer. De acordo com o autor:
(...) Pressionamos a barra não porque choques não virão no futuro, mas porque já
experienciamos choques no passado e porque pressionar a barra provoca um
menor número de choques agora (...). (SIDMAN, 1995, p.138).
Inferem-se com isso suas causas, que são baseadas nos acontecimentos do
passado e nas condutas do presente, as quais julga-se poderia ter diminuído a
freqüência dos eventos ruins acontecidos em ocasiões passadas.
Nesse sentido, Sidman (1995) considera que a esquiva é um comportamento
adaptativo à punição, sendo “melhor” do que a fuga, pois ela evita que o individuo entre
em contato com uma experiência ruim novamente. Pelo fato de evitar as situações
antes que elas ocorram torna-se difícil identificar, muitas vezes, quais contingências
estão controlando este comportamento, o que dificulta a explicação da esquiva, ficando
sua análise passível de algumas distorções. A primeira delas atribui erroneamente às
expectativas de um individuo em relação a uma possível situação desagradável a causa
do comportamento de esquiva, pois seriam as mesmas experiências ruins as
responsáveis por criar tanto as expectativas quanto tais comportamentos, assim, todos
são produtos de contingências advindos de uma mesma interação. No segundo caso,
acredita-se que as causas da esquiva estejam nos sentimentos de medo e ansiedade.
Ambos seguem a mesma lógica, referente às expectativas no sentido de serem, assim
como a esquiva, produtos de interações com contingências coercitivas.
É relevante observar tais distorções no intuito de entender realmente as relações
presentes no comportamento de esquiva. Sabendo identificá-las, os profissionais teriam
condições de intervir de maneira mais adequada nos comportamentos não-adaptativos
observados, sob controle de contingências aversivas. Dessa maneira, algumas das
formas de ansiedade que acompanham o comportamento de esquiva, e algumas
formas não muito claras desse comportamento em alguns indivíduos que assumem
30
características patológicas podem ser evidentes, ainda que não se possa ao certo
saber do que essas pessoas estão se esquivando (SIDMAN, 1995).
Como exposto anteriormente, as causas da esquiva estão nas interações que os
indivíduos estabelecem com contingências coercitivas. Tais interações interferem no
modo como os indivíduos aprendem a se comportar no mundo, de tal forma que suas
condutas são sempre moldadas por esquivar-se de algo ou de alguém que os ameace.
Mas essas práticas estão bem disseminadas nas condutas diárias. Como observa
Sidman:
Usamos extensivamente contingências de esquiva para estabelecer e manter
habilidades acadêmicas, interações familiares, práticas sexuais, relações sociais,
costumes grupais, obediências às leis, afiliações políticas, valores morais,
associações de negócios e alianças internacionais (...) (SIDMAN, 1995, p.148).
É relevante observar que pelo fato da conduta individual se constituir através das
contingências de esquiva, os indivíduos podem experimentar algumas conseqüências
que podem ser bastante prejudiciais. Primeiramente, a esquiva apontaria para a
conseqüência de comportamentos que estão freqüentemente sendo expostos à
punição. Nestes casos, os repertórios comportamentais tornam-se restritos, pois só se
ousaria experimentar comportamentos que livrem a ameaça da punição, deixando de
explorar e aprender com o ambiente, se limitando a fazer o que passa a ser
considerado seguro e previsível, diminuindo sobremaneira a variabilidade. Os
indivíduos que aprenderam a se comportar por meio de esquiva tendem a se tornarem
rígidos e inflexíveis, queixarem-se de ansiedade, pois ter que enfrentar e comportar-se
fora de certo padrão implicaria em correr risco de vivenciar novamente os efeitos
desagradáveis da punição.
Sidman (1995) considera que a consciência é uma espécie de esquiva da
punição. De acordo com ele, a consciência forma-se através da coerção, quando os
indivíduos, diante da punição ou de sua simples ameaça, passam a discriminar entre os
comportamentos considerados certos e errados, formando a chamada consciência ética
e moral.
31
As punições e suas ameaças são administradas por outros membros da
comunidade. Na medida em que os indivíduos em fase de desenvolvimento vão se
comportando, alguns desses comportamentos são punidos e classificados como
errados em detrimento de outros considerados certos ou socialmente aceitáveis. Com o
tempo, os indivíduos passam a comportar-se se esquivando das conseqüências de um
comportamento errado. Costuma-se dizer que alguém internalizou as regras ensinadas
durante sua infância onde estas, por sua vez, passam a conduzir suas ações,
entretanto, deve-se considerar que o contexto de coerção presente na infância é
esquecido, restando as predisposições emocionais para se comportar geradas pela
técnica (SIDMAN, 1995).
É justamente aí que Sidman (1995) considera estar o fracasso da técnica na
formação da consciência humana, a saber, em seu efeito de gerar predisposições
emocionais ou sensações desagradáveis provocadas pela coerção. Elas são
consideradas efeitos colaterais, como, por exemplo, a rigidez intelectual, dificuldade de
ser criativo e adaptar-se a mudanças de contingências no ambiente e, em indivíduos
que se esquivam constantemente podem apresentar neuroses e distúrbios de
personalidade.
Para Sidman (1995) outro tipo de predisposição emocional para se comportar
característica da esquiva da coerção é a agressão ou o contra-ataque. O autor afirma
que coerção gera agressão. No laboratório: “(...) se aplicarmos um choque em apenas
um dos dois sujeitos, este atacará o outro. A agressão não é nem ritualística nem
momentânea: Se não separarmos os dois, o ataque terminará em um assassinato”.
(SIDMAN, 1995, p.220). Talvez isso possa levar a um entendimento da criminalidade,
no
sentido
de
que
pessoas
agredidas
socialmente
tendem
a
atacar
não
necessariamente quem os esteja agredindo. Uma vez punido, o sujeito experimental,
por exemplo, atacará qualquer outro sujeito que estiver ao seu alcance.
Sidman (1995) entende que a criminalidade e os comportamentos transgressores
da lei oferecem uma noção do quanto a consciência formada por coerção é frágil. Os
indivíduos que burlam a lei ao atacarem os outros ou ao agirem em desacordo com o
código moral descobrem que isso pode ser mais reforçador do que seguir tais regras,
32
ou seja, eles ganham burlando a lei e ainda aprendem maneiras mais sofisticadas de se
esquivar das punições. Isso é o que ocorre com pessoas que cometem grandes crimes
e possuem poder aquisitivo alto. Suas esquivas são geradas pela possibilidade de
pagar bons advogados que acham brechas na lei capazes de livrá-los da punição.
Em contrapartida, ao se dar conta de tal situação, as camadas mais baixas da
população aumentam o ódio e atacam a outros cometendo crimes, ao mesmo tempo
em que entram na briga por seus reforçadores, fazendo com que tudo vire um
verdadeiro caos. Tendo em vista que a privação é outro modo de administrar punição
que
acaba
provocando
agressão.
(SIDMAN,
1995).Têm-se
então
múltiplas
contingências punitivas interagindo conjuntamente, mesmo que apenas em sua
distribuição temporal, quando conseqüências aversivas agem simultaneamente..
Um dos meios encontrados pelas autoridades em segurança pública a fim de
conter o caos formado é somente mais repressão e o aumento do controle coercitivo,
porém o que ocorre é que:
A longo prazo, o controle coercitivo continua a funcionar somente se o
controlador tiver uma população cativa. Mas, mesmos se os punidos forem
confinados ou restringidos fisicamente e não puderem escapar, a coerção
inevitavelmente produz um de seus mais proeminentes efeitos colaterais:
Contracontrole (...).(SIDMAN, 1995, p.224)
Em razão do exposto, Sidman (1995) acredita que a sociedade necessita de um
substituto para a consciência. Na verdade, ele propõe alternativas para o controle
coercitivo em todas as formas de interação social existentes. Essas alternativas
baseiam-se no emprego de controle por reforçamento positivo.
O reforçamento positivo é pouco utilizado porque não controla o responder de
forma imediata como ocorre com a coerção, tende a reforçar de forma atrasada, e, por
conseguinte com menos efetividade, quem o administra. Todavia, a técnica ensina e
mantêm comportamento eficaz sem acarretar efeitos colaterais indesejados como no
caso dos citados como ocorridos em decorrência do uso da coerção. Para que o
33
comportamento desejado ocorra, se faz necessário somente aplicar corretamente a
técnica.
No caso da educação, muitos pais e professores cometem equívocos aplicando
a técnica de maneira equivocada, frustrando-se e passando a questioná-la. Sidman
(1995) explica que, os reforços oferecidos às crianças precisam extrapolar a mera
recompensa imediata por algo feito de modo correto, estes precisam ser ganhos que as
façam sentirem-se amadas e reconhecidas, gerando um ambiente seguro para se
comportarem.
Nesse sentido, pode-se usar de extinção, ignorando-as, quando elas se
comportam de maneira considerada errada, como também se pode reforçar
positivamente com nossa atenção e aprovação quando estiverem fazendo algo
considerado correto. Isso evita que sejam somente reforçadas e, o que é pior,
negativamente, quando se comportam de maneira incorreta, como acontece
usualmente como muitos pais que só dão devida atenção aos seus filhos diante das
falhas cometidas por eles (SIDMAN, 1995).
No caso das instituições fechadas, a saber, escolas para retardados mentais,
hospícios e prisões, os profissionais costumam equivocar-se na aplicação do controle
positivo, pois costumam administrá-lo com privação tornando-o um reforçador negativo,
acarretando os mesmos subprodutos indesejáveis da técnica punitiva. Como antes
considerado, a privação como forma de punição também gera a agressão e não pode
ser usada para obter comportamento desejado.
34
2. Comportamento social e práticas culturais
Skinner
(2003,
p.326)
define
o
comportamento
social
como:
“(...)
O
comportamento de duas ou mais pessoas em relação a uma outra ou em conjunto em
relação ao ambiente comum (...)”. No sentido da afirmação, pode-se entender o
comportamento social como o comportamento das pessoas quando estão juntas em um
grupo, o que de certo modo pressupõe os comportamentos emergidos da interação
entre os indivíduos e dentre tais indivíduos compartilhando o mesmo território.
Baum (2006) partindo do pressuposto de que interação refere-se à relação, no
sentido de que uma relação consiste em interações, confere uma explicação sobre o
termo. De acordo com o autor, para que seja considerada uma relação, a interação
entre indivíduos precisa ser analisada de acordo com a freqüência com que ocorre.
Quanto maior for à freqüência com que interagem ou se reforçam, pode-se dizer que
entre eles formou-se uma relação.
Nota-se com isso que a quantidade de interações ocorridas entre duas ou mais
pessoas é significativamente determinante no processo do estabelecimento da relação,
em razão disso faz-se necessário compreender que uma interação nada mais é do que
o reforço mútuo entre dois ou mais indivíduos. Por serem reforços característicos da
interação de um individuo com outro, estes são chamados reforçadores sociais e
determinam um episódio social. Podendo ser este um episódio verbal ou coercivo
(BAUM, 2006).
Skinner (2003) explica que muitos antropólogos e cientistas sociais procuram
explicar o comportamento do grupo através de abstrações denominadas ‘forças sociais’
ou ‘situações sociais’ que se diferenciam de explicações sobre o individuo fora do
grupo. Segundo o autor, através da percepção de que o grupo é formado por
indivíduos, pode-se analisar o comportamento do grupo pela análise dos mesmos
processos e princípios referentes ao comportamento individual. Assim sendo: “(...) O
comportamento do individuo explica o fenômeno do grupo (...)”(SKINNER, B, F, 2003,
35
p.326), pois como exposto anteriormente, o grupo forma-se em virtude do
comportamento de seus membros. Desse modo, não existe nenhuma explicação
plausível para distinguir uma coisa da outra. O princípio que explica o comportamento
social é o reforço, porém é um reforço chamado de reforço social.
Skinner (2003), e posteriormente Baum (2006), reconhece o reforço social e a
importância da interação entre dois indivíduos para que o reforço ocorra, no entanto,
Baum (2006) muda somente o termo chamando a interação de mediação entre dois
organismos. De acordo com ele, a mediação ocorre através do comportamento verbal.
O comportamento verbal é importante porque possui propriedades que controlam o
comportamento de forma generalizada. Uma vez condicionadas, toda vez que o
estimulo discriminativo verbal é apresentado em outras situações semelhantes à
situação em que o condicionamento ocorreu, a resposta acontece sobre o controle do
referente estimulo. As propriedades dos estímulos discriminativos verbais compõem os
reforços positivos, como: Afeição, aprovação e atenção. E também compõe os reforços
negativos tais como: desaprovação, desprezo, insulto e ridículo.
É importante destacar que o comportamento verbal define pequenas diferenças,
quase que imperceptíveis, entre o comportamento social e o comportamento mecânico.
Sobre a afirmativa, Skinner (2003) exemplifica explicando que o ato de dar de mamar
não faz parte de um comportamento social, todavia apresentar o leite materno a criança
já o é. Outra importante diferença reside no fato de as interações verbais envolvidas
nos comportamentos sociais concernirem em uma relação onde o controlado depende
do controlador. Por essa razão, o comportamento social é mais extenso e flexível. Ele
pode apresentar uma variação de respostas que se adaptam às variações de reforço
apresentadas pelo controlador. Skinner discute essa questão quando aborda sobre
esquemas de reforçamento, para ele:
(...) os esquemas de reforço que se ajustam a freqüência do comportamento
reforçado não ocorrem com freqüência na natureza inorgânica. Um agente
reforçador que modifique as contingências do comportamento deve ser
sensível e complexo (...). (SKINNER, 2003, p.329)
36
O que significa dizer que as interações de um ambiente social exigem um
esquema de reforço no qual somente um organismo sensível a essas interações seja
capaz de alterá-lo.
Skinner (2006) propõe que o comportamento social tenha sido modelado e
mantido por condicionamento operante através de um processo chamado de imitação.
Por exemplo: Um animal, ao fugir de um predador natural com sucesso, passa a ter seu
comportamento imitado por outros animais, que ao conseguirem o mesmo êxito, tem
esse comportamento operante reforçado pelas conseqüências, passando a se
comportarem do mesmo modo em ocasiões futuras. O autor ainda propõe que os
processos de modelagem do comportamento operante viabilizados pela imitação, e
logo após, pelo reforçamento, tenham sido necessários para a sobrevivência da
espécie e perpetuação da cultura.
Os processos de comportamentos em grupos de seres humanos obedecem à
mesma lógica, visto que tais comportamentos também são produtos relacionados
intimamente com a seleção natural. Portanto, através do processo de imitação, os
indivíduos no grupo experimentam contingências de reforçamento mais poderosas do
que fora dele, tendo em vista o fato de que é no grupo que o individuo tende a maiores
possibilidades de conseguir seus reforços, tornando, portanto, a ação do reforço mais
eficaz. Por extensão, os reforçadores poderosos do grupo também tornam provável a
aquisição de um amplo e complexo repertorio comportamental, o que não seria possível
em um ambiente não-social (SKINNER, 2006).
Skinner (2006) menciona a importância do comportamento verbal na aquisição
de
repertórios
comportamentais
complexos.
Além
de
referir-se
ao
fato
do
comportamento verbal ter sido o fator determinante de diferenças existentes entre
grupos de seres humanos e outras espécies de animais, ele explica as origens desse
comportamento nos parâmetros dos processos evolutivos concernentes a seleção
natural. Segundo o autor, o comportamento verbal originou-se quando a musculatura
vocal de antigos ancestrais foi modelada por comportamento operante. Em decorrência
disso os homens puderam dar um passo à frente da demonstração passando a dizer ou
ensinar o que os outros deveriam fazer.
37
Baum (2006) também faz referências a diferenças existentes entre grupos de
seres humanos e outras espécies de animais. Para o autor, outros animais se
comportam obedecendo a um padrão rígido, os comportamentos concernentes a
grupos de uma cultura, são aprendidos através de conseqüências programadas por
seus membros. É nesse sentido que a cultura se diferencia de agrupamentos sociais de
outras espécies. Os membros da cultura humana possuem a capacidade de transmitir
seus traços culturais, enquanto outros animais respondem ao ambiente de um modo
grosseiro que lembra o comportamento reflexo. Isso significa dizer que somente os
seres humanos podem transmitir traços de uma cultura verbal para membros de
gerações futuras.
A sensibilidade às conseqüências, ou seja, a aptidão para aprender com os
outros faz com que os indivíduos pertencentes a uma cultura possam alcançar mais
facilmente os benefícios e evitar os riscos presentes nesse ambiente. Pois a fórmula já
foi inventada pelos antigos ancestrais e transmitida às novas gerações. Segundo Baum
(2006 p.263): “(...) A transmissão cultural evita que tenhamos de reinventar a roda (...)”.
O que significa dizer que evita que se tenha que ficar sempre criando formas de
interação mais adaptativas ao ambiente cultural, sempre como se estivesse
estabelecendo um primeiro contato com ele. A transmissibilidade dos traços mais
adaptativos evita esse desconforto e potencializa a possibilidade de aprendizagem mais
eficaz.
Baum (2006) cita a imitação como um dos processos de aprendizagem cultural.
Segundo o autor, o processo de imitação garante uma aprendizagem mais eficaz em
relação aos comportamentos aprendidos em interação com o ambiente físico. Através
da imitação, pode-se pular a etapa de uma aprendizagem em ambiente natural direto
para a aprendizagem de uma ação mais eficaz no grupo, sendo assim, mais eficaz para
a sua sobrevivência. Contudo são os comportamentos aprendidos como efeito dos
reforços sociais que confere o grande diferencial de uma cultura. Em razão disso o
autor ressalva que: “(...) Podemos denominar esse conjunto de traços transmitidos por
imitação de cultura só por imitação. Embora ela tenha muitos elementos em comum
com a cultura humana, o elemento educação, ensino ou treino está faltando
(...)”.(BAUM, 2006, p.266). Pois é a educação que define uma cultura de grupo a partir
38
do momento em que é através dela que os indivíduos dispensam os reforços
necessários e, em razão desses reforços eles conseguem passar os traços e
características do grupo aos membros mais novos. A educação que os pais dispensam
aos filhos serve como exemplo para essa afirmativa.
Neste ponto da discussão faz-se necessário abrir um parêntese no qual se infere
a afirmação de Skinner (2003) sobre a origem do reforço social. Para o autor, o estimulo
social é o responsável pelos reforços dispensados por indivíduos em grupo. Os
estímulos sociais explicam porque uma pessoa é reforçadora por outra, ou porque
existem diferentes padrões para a mesma reposta, como é o caso do sorriso. Os vários
padrões de respostas referentes ao sorriso e o fato de algumas pessoas serem
reforçadoras pelas outras e algumas pessoas não o sejam, se explica pelas
contingências que tornam a ação de alguns estímulos reforçadora para alguns
comportamentos de alguns indivíduos, mas não para outros. Desse modo o Skinner
afirma que:
As expressões que agrupamos ‘juntas’ e chamamos ‘sorriso’ são importantes
porque são ocasiões em que certas espécies de comportamento social
recebem certo reforço (...). Um estimulo social como qualquer outro estimulo,
torna-se importante no controle do comportamento por causa das
contingências em que se encaixa os tipos de reforços (...) são determinados
pela cultura e por história particular (...) (SKINNER, 2003, p.330).
Diante do que foi exposto acima se pode perceber a importância das
contingências na determinação do controle que os estímulos exercem sobre o
comportamento dos organismos. No caso, estes estímulos só tornam-se reforçadores
de algumas respostas, se as contingências forem favoráveis a isso. Por essa razão dizse que existem certos limites na ação desses estímulos, ou seja, dependendo da
ocasião alguns estímulos estarão mais susceptíveis ao controle do comportamento do
que outros. A susceptibilidade depende do quanto se pode aprender com o que é
passado pelos outros, ou seja, depende intimamente da sensibilidade que certos
indivíduos possuem em relação aos reforçadores dispensados por outros indivíduos. A
eficácia do reforço social foi adquirida através da aprendizagem operante, onde
39
estímulos sutis presentes no ambiente mecânico foram tornando-se reforçadores
através de suas conseqüências. Os reforçadores facilitam a aprendizagem da criança e,
por sua vez, aumentam a aptidão para responder a certos estímulos sociais. Pode-se
então concluir que a aprendizagem através dos reforçadores aumenta cada vez mais a
sensibilidade para responder aos estímulos dispostos pelos outros (BAUM, 2006).
Skinner (2003) reconhece a importância da cultura no que se refere à ação dos
estímulos sociais. Segundo o autor, é a ação da cultura que promove mudanças e
variações nos padrões de respostas dos indivíduos pertencentes a ela.
De acordo com Baum (2006, p. 267) “Os tipos de traços que viemos discutindo –
limites de estímulos, imitação e reforçadores sociais – não só produzem cultura, mas
também permitem mudanças culturais (...)”. Portanto, a cultura que emerge da interação
destes três aspectos determinantes no comportamento do individuo no grupo, também
possibilitam a modificação dos traços culturais. A cultura é, portanto, o que marca a
diferença mais significativa entre o ser humano e outras espécies.
É importante salientar que Baum (2006) sugere que as sociedades surgem antes
da cultura e explica sobre a existência de sociedades em outras espécies de animais.
Paralelamente ao que ocorre com as populações de genes que se agrupam formando
uma máquina de sobrevivência, os animais também o fazem visando à sobrevivência
que se garante de modo mais eficaz quando estão reunidos em grupos. Isso ocorre
porque em um grupo todos cooperam para o beneficio de todos, ao invés de cada um
separadamente comporta-se em beneficio próprio.
Ainda no tocante ao comportamento dos animais em sociedades, esses
possuem a característica de serem comportamentos altruístas. Os comportamentos
altruístas fazem com que os animais se empenhem a favor do grupo em detrimento de
ações que favoreçam somente a si. Por essa razão: “O altruísmo é a marca registrada
de uma sociedade. Quando um grupo vive junto em uma associação estável e seus
membros se comportam altruisticamente uns com os outros, isso é uma sociedade
(...)”.(BAUM, 2006, p.260). Apesar dessas características os animais não possuem
cultura, pois não podem, como já foi visto, transmitir os seus traços culturais através da
educação. Somente os homens possuem a capacidade de transmiti-los e modificá-los.
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Segundo Skinner (2003) a cultura torna-se o ambiente social dos homens, pois
parte deste ambiente é o produto da conformação dos indivíduos aos padrões éticos,
assim como da contribuição desses padrões para a formação dos usos e costumes
característicos de cada grupo. Como também consiste no produto do controle que
agencias e subagências controladoras exercem nos indivíduos. Diante desses
aspectos, a cultura torna o ambiente social, algo extremamente complexo. A educação
age para conformar o individuo a subordinação dos padrões, educação esta que é
ministrada pelas agências controladoras a serviço que se responsabilizam por passar
esses padrões às novas gerações.
Antes de se buscar entender os processos concernentes especificamente a
cultura no que tocante à sua evolução e suas práticas, se faz necessário compreender
melhor a questão do controle, tendo em vista que falar de reforçamento é falar de
controle do comportamento. Já foi visto que as pessoas se comportam juntas, porque
desse modo, conseguem ser reforçadas mais eficazmente, ou seja, através da imitação
podem conseguir ter contato com reforços positivos e, por sua vez, evitar ou fugir de
reforçadores negativos. Skinner considera que:
Ao comporta-se de uma maneira que altera o comportamento de B por causa
das conseqüências que o comportamento de B tem para A (...) quase todos
controlamos algumas variáveis relevantes, independente de papéis como os
mencionados, que podem ser empregadas em beneficio próprio. A isso se
pode chamar de controle pessoal (...). (SKINNER, 2003, p. 343).
As conseqüências ou o reforçamento é também o responsável pelo controle que
uma pessoa exerce sobre outra. Existem pessoas que se beneficiam da possibilidade
desse controle a fim de tirar proveito da situação de poder controlar a outros. O controle
pessoal significa justamente o poder de manipular algumas variáveis reforçadoras para
o comportamento de alguém visando benefícios e o máximo de proveito. Certas
habilidades pessoais facilitam o controle pessoal, principalmente quando se age em
benefício de si mesmo, como é o caso da beleza, e o que se denomina como talento e
dom. Porém, são significativamente inferiores ao poder de controle exercido pelas
41
instituições. Estas se utilizam de técnicas como, por exemplo, o uso da força através de
restrições físicas (SKINNER, 2003).
As técnicas de controle que se utilizam da força para controlar alguns indivíduos
são, via de regra, bastante violentas, e no geral visam somente atender o interesse de
quem controla. Por essa razão, acabam desencadeando fortes indisposições
emocionais para contra–atacar; não restringe todas as formas de comportamento e não
é eficaz para combater comportamento encoberto. O cárcere é um exemplo de uso da
força e da restrição física com a finalidade de controlar o comportamento. Como conclui
Skinner:
O uso da força física como um tipo de controle tem desvantagens óbvias.
Geralmente requer atenção contínua do controlador (...) por todas essas
razões, o controle através da restrição física não é uma possibilidade tão
promissora quanto pode parecer a primeira vista (SKINNER, 2003, p.345).
O controle pessoal do comportamento também ocorre através da manipulação
de estímulos condicionados e incondicionados. A manipulação desses estímulos pode
colocar determinados comportamentos sobre o controle de uma dada contingência ou
pode gerar respostas incompatíveis com ela. O dinheiro é um exemplo de reforçador
que pode ser manipulado nos moldes do que foi explicado acima, pois ele é um
reforçador condicionado imediato. Ele pode ser usado como gratificação ou suborno,
dependendo da contingência que estabelece o controle.
Existe ainda o controle através de estimulação aversiva e de punição. Conseguese estabelecer o controle através da estimulação aversiva, pelo reforçamento da
resposta que ele mina o estimulo. Já o controle exercido pela punição ocorre pela
apresentação de um estimulo aversivo ou pela retirada de um estimulo positivo. Não
deve ser confundida com o uso da força, pois é a contingência que determina se trata
ou não de punição. Todavia a punição gera os mesmos subprodutos emocionais
indesejáveis que ocorrem na restrição física, desse modo ela não é de maneira alguma
recomendada (SKINNER, 2003).
42
Ainda há o controle através da privação e da saciação. Pode-se controlar o
comportamento de alguém privando-o de algo até que a resposta que se deseja obter
seja reforçadora o bastante para ocorrer na apresentação desse algo. Na saciação
pode-se conseguir que alguém elimine um comportamento indesejado deixando se
comportar com uma freqüência que irá deixá-lo saciado desse reforçador. Um exemplo
que se assemelha ao controle por privação consiste no comportamento de usar drogas,
como no controle feito por uso de álcool, ficar sem ela (privação) que aumenta a
probabilidade de emissão de comportamentos que implicam no uso. A privação além de
possuir efeitos parecidos com os efeitos da punição, também gera fortes predisposições
emocionais (SKINNER, 2003).
Outro importante modo de controle é exercido pelo grupo. O grupo pode assumir
o controle a partir das ações de alguns indivíduos que se tornam aversivas para os
demais. Criam-se então padrões verbais de controle, esses padrões classificam-se em
‘bom’ e ‘mau’ e as ações dos indivíduos passam a ser reforçadas ou punidas de acordo
com esses padrões estabelecidos pelo grupo. Todavia, esses padrões tendem a
conflitar devido ao fato de diferentes membros do grupo podem não estar em comum
acordo sobre o que é bom ou o que é mau. Isso significa dizer que o que é ruim para
alguns pode vir a ser bom para outros. Também há reforçadores que são bons em curto
prazo e ruins em um prazo maior, fazendo com que estejam susceptíveis a
reclassificações (SKINNER, 2003).
Os membros de um grupo podem vir a responder aos padrões de
comportamento que causam estimulação aversiva condicionada. A estimulação
aversiva gera predisposições emocionais como é o caso da vergonha. O sentimento de
vergonha é um estimulo condicionado que mantêm o comportamento em conformidade
com os padrões estabelecidos pelo grupo. Infelizmente, o controle realizado por
estimulação aversiva e punição é o mais comum em um grupo. Esses modos de
controle não geram somente vergonha, mas outras predisposições mais exacerbadas,
como é o caso da predisposição para contra–atacar.
Manter-se sobre o controle do grupo, em principio, representa uma ação
desvantajosa para o individuo, pois implica em deixar de ser controlado por
43
reforçadores individuais. Sobre isso Skinner (2003, p. 357) expõe que: “(...) restringiu-se
o comportamento egoísta, e o altruísmo é encorajado. Mas o individuo lucra com esses
procedimentos porque é parte do grupo controlador com respeito a cada outro individuo
(...)’’. Ou seja, o individuo obtém reforços quando tem a possibilidade de controlar
alguém do mesmo modo em que é controlado. Sendo assim estabiliza vantagens e
desvantagens no seu comportamento em relação ao grupo, o que acaba por
compensar o abandono do comportamento egoísta em detrimento do comportamento
de estar a serviço das práticas grupais.
Ainda no que concernem às questões sobre o controle, é relevante destacar as
considerações de Skinner (2003) sobre a figura do líder. Segundo o autor, o líder possui
uma habilidade especial para controlar o grupo. Essa habilidade foi desenvolvida por
sua sensibilidade às contingências do ambiente natural, o que significa dizer que o líder
é alguém com a capacidade de discriminar os reforços presentes no ambiente (estar
sobre o controle desses reforços) e conduzir os liderados com o objetivo de fazer com
que também mantenham-se sobre o controle dos mesmos reforços. Portanto, descrevese a interação entre ambos em um sistema de conduzir e seguir. As contingências
complexas presentes no ambiente social necessitam de alguém que possua as
habilidades de um líder, pois somente ele é capaz de conduzir as contingências que
discriminou no ambiente como sendo necessário à resolução de certas atividades, e por
sua vez fazer com que os outros o sigam respondendo apropriadamente às
contingências. É importante observar que o líder possui apenas certa independência do
liderado, e que esta se deve em razão das contingências. Porém, na execução do
comportamento, o líder mantém-se dependente de seus liderados.
Sobre o papel do grupo na formação do líder Skinner afirma que:
(...) a maioria das culturas produz algumas pessoas cujo comportamento é
controlado principalmente pelas exigências de uma dada situação. As mesmas
culturas produzem pessoas cujo comportamento é controlado principalmente
pelo comportamento de outros (...) (SKINNER, 2003, p. 335)
Nota-se, com o que foi exposto, as influências da cultura na formação dos lideres
e dos liderados. No entanto, a cultura é importante não somente por esse aspecto, mas
por muitos outros que são fundamentalmente relevantes para o entendimento de
44
vicissitudes do comportamento dos homens em grupo. Como já foi considerado, a
cultura diferencia o ambiente social dos seres humanos do ambiente social de outras
espécies de animais, porque se constitui através da capacidade que seus membros
possuem de compartilhar seus costumes, como também de transmiti-los verbalmente
para as gerações seguintes. Nesse sentido, entende-se a cultura como um conjunto de
práticas compartilhadas pelos indivíduos no grupo. Essas práticas sofrem variações de
um grupo para outro, ou dentro do mesmo grupo. Baum enfatiza que processo de
evolução cultural ocorreu sobre o mesmo viés dos processos de seleção natural,
responsável pela evolução das espécies:
De modo semelhante, o problema de explicar a diversidade de culturas coincide
com o problema de explicar mudanças nas culturas. Em uma teoria da evolução
cultural, poder-se-ia imaginar uma cultura ancestral carregada por um grupo
que se dividiu em dois. A partir dos costumes ancestrais, novos costumes
poderiam surgir através de modificações, até que a cultura dos dois
praticamente não apresentasse semelhanças (...) (BAUM, 2006. p.258).
A consideração exposta sobre as possíveis causas das modificações sofridas
pelas práticas culturais no período dos ancestrais pode ajudar a realçar a idéia
conferida às explicações sobre a evolução da cultural através do prisma da seleção
natural. Na Evolução cultural, os traços que são transmitidos sofrem variações
acarretando em variações nas práticas. Essas práticas são selecionadas em razão de
serem mais reforçadoras para o grupo. Um exemplo são as práticas educativas. A
educação possibilita a transmissão das práticas mais eficazes à cultura do grupo. É
pela educação, por exemplo, que os pais podem dispensar reforçadores que ensinam
aos filhos os traços culturais e as formas de comportamento características do grupo ao
qual pertencem. Pode-se inferir que o processo educacional tornou possível a
transmissão seletiva da variação. Visto que a seleção das práticas ocorre devido ao seu
efeito reforçador, para que assim possa ser transmitida (BAUM, 2006)
Baum explica que de maneira semelhante ao que ocorre na seleção genética, às
culturas possuem ‘replicadores culturais’:
(...) Um replicador cultural é uma ação desempenhada e transmitida pelo grupo,
que possui determinada função, resulta em determinado efeito ou produz um
certo resultado. Em outras palavras, um replicador cultural realiza uma
determinada tarefa (...) (BAUM, 2006, p. 268).
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Os replicadores culturais nada mais são do que as atividades próprias de um
grupo, haja vista que essas atividades derivam de usos e costumes fazendo com que
possa se entender a relação existente entre os termos replicadores e atividades. Baum
(2006) cita Skinner com a finalidade de explicar que Skinner prefere chamar os
replicadores culturais de práticas culturais. Na verdade, as práticas culturais podem ser
entendidas como replicadores porque sofrem variações na freqüência com que são
utilizadas ao longo dos anos. A medida exata da variação dessas freqüências deve ser
obtida considerando o comportamento dos membros do grupo em dado período de
tempo. Assim, evitam-se conclusões interpretativas e imprecisas sobre as origens e
mudanças que ocorrem em uma cultura, baseada em teorias que se pautam em
crenças e valorações.
As práticas culturais são algo natural, no sentido de serem selecionadas pelo
grupo através de reforçamento e punição. Isso significa dizer que com o comportamento
verbal, os grupos puderam construir regras pautadas em padrões morais e éticos, e a
partir destes padrões essas regras foram sendo selecionadas e modeladas através do
reforço ou punição, em razão disso as regras formam a base do grupo, como também
marcam as diferenças existentes entre as culturas. Desse modo, o conhecimento de
uma cultura é possibilitado pelo conhecimento de suas relações de reforço e punição.
Essas relações descartam a possibilidade de uma cultura só por imitação, como
também uma cultura de não-humanos, a partir do momento em que infere-se que mais
relevante do que considerar a quantidade de indivíduos que se comportam da mesma
maneira, seria considerar as relações de reforço entre os membros de uma mesma
cultura (BAUM, 2006), e neste sentido o critério de análise é funcional, uma vez que o
foco recai sobre contingências comuns para os membros de um mesmo grupo,
fortalecendo ações no grupo ou diminuindo a sua freqüência.
Skinner (2003) também confere uma explicação sobre a origem das práticas
culturais pelo viés dos padrões éticos e morais, além de explicar as origens de tais
padrões. No entanto, o autor refere-se a tais práticas de acordo com usos e costumes
comuns em uma cultura. De acordo com Skinner, os usos e costumes são repertórios
46
que se originam sobre o prisma de padrões éticos, por sua vez esses padrões se
constituem de reforço ou punição administrados pela comunidade. O reforço desses
padrões está relacionado, em principio, com contingências incidentais presentes no
ambiente não-social. Essas contingências passam a controlar o comportamento em
razão do seu efeito, tornando este efeito mais importante do que a origem dela, pois
este efeito controla o que será punido ou reforçado no futuro, ou seja, que ações sobre
o ambiente serão mais eficazes, e que por sua vez permaneceram na constituição dos
usos e costumes. Desse modo, a educação atuaria selecionando as práticas mais
eficazes daquele grupo, aprovando ou desaprovando determinados comportamentos,
formando assim o estilo do grupo. De acordo com o autor:
Não importando como explicamos em última instância a ação do grupo ao
estender a classificação ética de ‘certo’ e ‘errado’ para usos e costumes, há
bases sólidas para observar as contingências em virtude das quais o
comportamento característico de um grupo particular se mantém. A medida que
cada indivíduo vem se conformar com os padrões de conduta, também vêm a
apoiar o padrão ao aplicar uma classificação semelhante ao comportamento de
outros. Além disso, seu próprio comportamento conformado contribui para o
padrão com o qual o comportamento de outros será comparado. Uma vez
originado, um uso, costume ou estilo, portanto o sistema social que o observa
parece ser razoavelmente automantenedor (SKINNER, 2003, p.455).
A afirmativa citada acima conduz, portanto, à compreensão de que, mais
importante que observar as origens dos padrões de certo e errado, seria a
compreensão de que eles atrelam-se firmemente aos usos e costumes característicos
de cada grupo para que assim encontrem sustentação suficiente para se manter. Essa
sustentação ocorre quando os membros do grupo aceitam a subordinação a tais
padrões. Além disso, o indivíduo contribui para a transmissão quando tem a
possibilidade de aplicar tais padrões ao comportamento de outros. Nesse sentido é que
os comportamentos típicos se originam e podem se automanter a partir da ação dos
próprios membros do grupo (SKINNER, 2003).
Skinner (1972) também se refere à cultura, ou mais precisamente aos costumes
como sendo um produto das contingências de reforço social. O autor entende os
47
costumes como hábitos comuns a uma dada cultura, hábitos estes que dependem da
genética e de contingências tanto naturais como sociais presentes no ambiente de cada
grupo. Por essa razão, os costumes considerados bons em uma cultura podem não ser
considerados bons em outras, fazendo com que os costumes variem de um grupo para
outro. Skinner (2003) diz que esses costumes costumam conflitar, por possuírem essas
diferenças e por não controlarem de maneira exclusiva o comportamento do individuo,
que desse modo acaba experimentando várias culturas ao longo da vida. Ressalta-se
que diferenças são percebidas mesmo dentro de uma mesma cultura.
As contingências naturais e sociais que auxiliam na construção dos costumes
podem sofrer modificações ao longo do tempo, muito embora permaneçam estáveis
durante certo período. As contingências naturais modificam-se em razão das
modificações sofridas na natureza pela ação do homem. Por sua vez, as contingências
sociais se modificam devido às modificações na forma dos indivíduos relacionarem-se
entre si ou com outros grupos, por mudanças ocorridas no controle exercido pelas
agencias controladoras, pelo contra-controle ou por novas formas de fuga e esquiva.
As modificações sofridas nas contingências naturais e culturais podem ser
entendidas como sinônimo de evolução cultural. A evolução das praticas culturais
podem fazer com que a cultura possa ou não sobreviver. Nesse sentido, as praticas
precisam evoluir na direção da sobrevivência da cultura. Skinner explica que isso pode
ocorrer do seguinte modo:
(...) As práticas de uma cultura, como as características de uma espécie, são
transmitidas por seus membros, que as passam a diante. Em geral, quanto
maior for o numero de indivíduos a dar continuidade a uma espécie ou cultura,
maior será a chance de sobrevivência da mesma. (SKINNER, 1972, p. 98).
Desse modo, a sobrevivência da cultura esta intimamente relacionada ao
comportamento de seus membros, assim como, paralelamente, a evolução das
espécies depende das características genéticas transmitidas por seus membros. Existe
uma relação entre as duas formas de evolução, pois ambas necessitam garantir ações
que sejam eficazes na adaptação às mudanças. Por sua vez, as mudanças precisam
garantir a sobrevivência da cultura, e para que isso ocorra é primordial que as práticas
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reforcem seus membros a trabalhar na elaboração e ação de contingências que
garantam sua continuidade. Nesse sentido, se a sobrevivência da cultura depende do
comportamento de seus membros, por sua vez tais comportamentos dependem da
ação do efeito da cultura atual sobre eles. No entanto, mais importante do que conhecer
as razões que levam algumas pessoas a trabalharem pela eficiência das práticas de
sua cultura, seria mais razoável perceber se as mesmas garantem a sobrevivência,
tendo em vista que a os indivíduos trabalham a favor de práticas que se identifiquem
com as de sua cultura. (SKINNER, 1972).
Skinner (1972) ainda, ao discutir sobre a necessidade de estimular nos membros
de uma cultura a execução de práticas que garantam sua sobrevivência, discorre sobre
a importância das instituições controladoras no controle dessas ações. Segundo o que
diz o autor, as instituições normalmente exercem um controle fundamental sobre os
membros de sua cultura, colocando-os sobre efeito de reforçadores em longo prazo
através da demonstração da obtenção de benefícios que os controlados podem usufruir
ao atender suas exigências. Isso significa dizer que o segredo do controle exercido por
essas instituições se explica em fortalecer as contingências que demonstram vantagens
em longo prazo. A justificativa para o exercício de tal controle se pauta no fato da
possibilidade de recusa, por parte dos controlados, em deixar de responder a
reforçadores que possuam efeitos imediatos, ou ainda, ter de responder a reforçadores
que talvez só possuam efeitos previstos para as gerações futuras.
Contudo, torna-se mais difícil ainda fazer com que os membros da humanidade
invistam em práticas que formem uma cultura única, no sentido de desenvolver práticas
que sejam eficazes para a solução dos problemas originados por práticas atuais.
Skinner (1972) explica que os problemas existentes na humanidade são globais, ou
seja, são problemas comuns encontrados em diferentes culturas. Por essa razão, faz-se
necessário não apenas demonstrar as conseqüências futuras de tais problemas, como
também fortalecer as contingências que reforcem ações mais eficazes por parte dos
membros da humanidade, na direção da mobilização de práticas mais eficazes que se
expandam por todo o mundo.
49
O autor acrescenta ainda que muitas pessoas temem a generalização das
práticas, por acreditarem que isso possa levar a uma estagnação das culturas. O autor
acredita que este temor torna-se desnecessário quando se entende que os costumes
de uma cultura, assim como as mutações genéticas, sempre estarão sujeitos a
modificações. Todavia, ações eficazes para a sobrevivência e evolução da cultura
podem conviver com esses costumes, agregando forças para a continuidade da
evolução, sem o temor de uma prática anular a outra. Para que isso ocorra, o autor
sugere que as contingências que determinam os estágios de evolução da cultura sejam
manipuladas, permitindo sua mudança, evitando assim que se estabeleça um padrão
fixo de práticas.
Em que pese à relevância das ações dos membros da cultura para a
perpetuação da mesma, o mais importante valor considerado por Skinner (1972) como
visto, é o valor de sobrevivência. Isso significa dizer que as práticas culturais precisam
estar empenhadas em garantir a sobrevivência. Durante um longo período, as praticas
culturais foram entendidas pelo viés de idéias tradicionais vinculadas a valores também
tradicionais. O autor chama a atenção para o que se vê realmente quando se observa
uma cultura, e infere que ao invés de valores observa-se o modo como às pessoas se
comportam juntas e quais são os seus costumes.
De acordo com Skinner, quando analisa o que se denomina valores de uma
cultura,
Do ponto de vista pré – científico (e o termo não é necessariamente pejorativo),
o comportamento de uma pessoa é, até certo ponto, uma realização pessoal. O
individuo é livre para discutir, decidir e agir, possivelmente de forma original,
podendo ser reconhecido pelos seus sucessos e responsabilizado pelos seus
fracassos. Do ponto de vista cientifico (e o termo não é necessariamente
honroso), o comportamento de uma pessoa é determinado por uma herança
genética reconstituível a partir da história da evolução das espécies, e pelas
circunstancias ambientais as quais esteve exposta. (SKINNER, 1972, p. 79).
Como expõe a citação acima, durante um período compreendido por Skinner
como pré – cientifico, buscou-se entendeu-se o comportamento humano a partir de
subsídios valorativos que geraram a idéia de um homem livre, capaz de escolher e, por
essa razão, tornar-se responsável por suas escolhas. Todavia, aceitar a suposta
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‘liberdade’ do homem seria o mesmo que negar os fatos científicos que evidenciam a
importância dos efeitos do ambiente sobre o comportamento humano. Esses efeitos
atribuem ao ambiente a responsabilidade pelo comportamento humano, ou seja, os
comportamentos surgem a partir da interação entre o organismo (genética) e o
ambiente. Nesse sentido é correto afirmar que essa relação determina o
comportamento. Falar de determinismo, ao contrário do que muitos pensam, é o que
possibilita a modificação do comportamento, pois permite a alteração das contingências
que controlam esse comportamento. Por conseguinte, a noção existente de um homem
livre e autônomo, por si só, esgota a possibilidade de mudança, no sentido de que
homens livres não sofrem a influência de nada que possa alterar suas concepções já
cristalizadas em uma personalidade.
Skinner (1972) aponta para a influência que os juízos de valor exercem nas
idéias que o indivíduo possui sobre sua vida e os fatos que a permeiam. Segundo o
autor, as indagações que levam a essas concepções sempre consideram a questão de
como o individuo se sente em relação às questões de sua vida. Por essa razão, as
pessoas acreditam que a modificação dos valores, ou seja, de como se sentem ou
percebem o mundo, é o que gera progresso, como se os valores oferecessem um
direcionamento eficaz na questão das escolhas fazendo com que a modificação destes
gere também ações melhores e mais produtivas para a cultura.
As decisões da ciência também são contaminadas pelos juízos de valor que se
originam da sabedoria compartilhada com as demais pessoas e sem nenhum respaldo
cientifico. Ocorre que a ciência do comportamento ousou buscar respostas cientificas
para explicar o modo como às pessoas sentem ou mesmo o que isso significa em nível
de resultado científico. Pode-se analisar cientificamente o que as pessoas entendem
por valor através da compreensão de suas razões para desejarem modificar o mundo a
fim de torná-lo melhor. Essas razões se explicam pelas conseqüências que trazem
benefícios e, por isso, são valorizadas pelo grupo. Skinner expõe, portanto, o ponto de
vista da ciência do comportamento sobre essas questões:
Do nosso ponto de vista, coisas boas significam reforçadores positivos.
Alimentos de bom paladar nos reforçam quando os experimentamos (...).
Quando afirmamos que um juízo de valor é uma questão não de fato, mas de
51
como alguém se sente em relação a ele, simplesmente estamos distinguindo
entre um objeto e seu efeito reforçador (...). (SKINNER, 1983, p.81).
Isso significa dizer que o juízo de valor pode ser entendido em termos de objeto
que causa efeito sobre os indivíduos na cultura, ou seja, esses valores são reforçadores
por causa de suas conseqüências para esses indivíduos. Possivelmente esses valores
tornaram-se reforçadores porque foram selecionados durante a evolução cultural.
Durante a evolução cultural, alguns comportamentos foram selecionados como ‘bons’ e
outros como ‘maus’. Essas classificações são o que se compreende por juízo de valor,
contudo para Skinner (1972) elas são as classificações dos efeitos do reforço. É
importante destacar que o autor ressalva que os efeitos reforçadores são mais
importantes do que suas classificações, pois esses efeitos são responsáveis pelo
comportamento de cada individuo.
Skinner (1972) confere uma explicação sobre o que seriam os sentimentos do
homem autônomo, visto que estes estão atrelados às razões (causas) pelas quais os
homens se comportam na concepção mentalista. De acordo com o autor, os
sentimentos são sensações produzidas pelos estímulos reforçadores. Estas sensações
podem ser externas ou internas dependendo da ação dos estímulos que as produzem.
Ocorre que as sensações internas são mais sutis, sendo muito difícil por vezes
discriminá-las. Desse modo, a localização das sensações marca uma diferença
significativa entre elas. As sensações externas podem ser sentidas nitidamente, já as
internas não são ativadas com a mesma facilidade. No entanto:
Uma diferença mais importante ainda reside na forma pela qual aprendemos a
sentir as coisas. Uma criança só aprende a distinguir cores, tons, odores,
gostos, temperaturas diferentes e, assim sucessivamente, quando estes se
enquadram nas contingências de reforçamento (...) Em geral, a comunidade
verbal não pode estipular as contingências sutis necessárias ao ensino das
distinções tênues entre estímulos que lhes são inacessíveis (SKINNER, 1972,
p.82).
No sentido do exposto, entende-se que o comportamento verbal possibilitaria, a
produção de estímulos condicionados que dispensam a discriminação de sensações
52
corporais externas. Por sua vez, os sentimentos que correspondem às sensações
internas são tão sutis e imprecisos que o comportamento verbal não consegue ainda
dispor de estímulos discriminativos verbais que dêem conta de estabelecer distinções
entre esses estímulos sentidos internamente. Desse modo, a aprendizagem dessas
sensações se da pelo viés de metáforas, ou seja, o individuo, aprende a discriminar o
que sente comparando essas sensações aos estados de coisas e objetos presentes no
ambiente físico. Skinner (1972) afirma que isso ocorre justamente pela falta de precisão
existente na linguagem da emoção.
Ainda no que concerne à questão dos sentimentos Skinner considera que:
(...) O importante não é o sentimento, mas o objeto percebido (...) os homens
generalizam os sentimentos produzidos pelas coisas boas, nomeando-os de
prazer, e os produzidos pelas coisas ruins nomeando-os de dor; Porém não
damos a ninguém prazer ou dor, apenas coisas que sentem como agradáveis
ou dolorosas (...) o que se aumenta ao máximo ou se reduz ao mínimo, o que,
em última instância é bom ou mau, são as coisas e não os sentimentos, os
homens trabalham pra obtê-las ou para evitá-las não pelo que sentem em
relação a elas, mas por serem reforçadores positivos ou negativos. (SKINNER,
1972, p. 83).
Skinner (1972) chama a atenção para a importância do efeito reforçador dos
objetos. Segundo o autor, as pessoas tendem a atribuir importância demasiada ao que
sentem, porém o que sentem é o produto da ação dos fatos e objetos dispostos por
outras pessoas. Diante dessa conclusão, torna-se claro que as emoções são apenas
subprodutos secundários desses objetos, e que tais objetos são o foco principal, tendo
em vista que são eles os responsáveis pelos efeitos prazerosos ou não, que por vezes
são ‘sentidos’ pelas pessoas.
Visto que os fatos e objetos reforçadores são dispostos por outras pessoas, fazse necessário compreender as razões pelas quais as pessoas agem pelo bem de
outras. De acordo com Skinner (1972) as pessoas se comportam assim porque outras
que possuem o poder necessário controlam-nas através de controle aversivo. O
controlador utiliza-se da técnica, por exercer controle imediato sobre quem esta sendo
controlado. Já o controle por reforçamento positivo, obtêm resultados em longo prazo,
53
por isso não é muito utilizada. Portanto, as pessoas que agem pelo bem do próximo
não o fazem por causa de sentimentos de amor ou obrigação, mas se comportam
desse modo devido ao modo como são reforçados socialmente por fazê-lo. Isso
significa que:
(...) O valor se encontra nas contingências sociais mantidas com a finalidade de
controle (...), contudo, provavelmente recorremos a alguma virtude interior para
explicarmos porque uma pessoa procede bem em relação a seus semelhantes,
mas não o faz porque estes lhe transmitiram uma noção de responsabilidade ou
obrigação, ou de lealdade ou de respeito pelos outros, mas porque fornecem
contingências sociais eficazes (SKINNER, 1972, p.85).
Diante dessa afirmação, entende-se que Skinner (1983) considera que o único
valor existente encontra–se nas contingências sociais, pois são as contingências que
controlam o comportamento das pessoas e não os sentimentos, que como visto, é
apenas subproduto. Em razão disso, a identificação das contingências que controlam o
comportamento são fundamentais para distinguirem-se os sentimentos dos objetos e
fatos contingentes de seus efeitos.
Skinner (2003) considera a questão dos juízos de valor na perspectiva do
planejador cultural. Para o autor o modo como o planejador cultural ‘deve’ agir se
explica pelas conseqüências reforçadoras. Muitas pessoas acreditam que a palavra
‘deve’ corresponde a avaliações feitas por valores morais que determinam como as
pessoas devem ou não agir. A ciência do comportamento explica que o fato de dever
fazer algo não se origina desses valores, mais sim das conseqüências das ações sobre
a cultura. O mesmo ocorre com o planejador cultural que planeja suas práticas, (embora
não saiba exatamente), devido aos efeitos reforçadores provocados por elas, e não por
que deve fazê-lo.
Apesar dessas constatações, muitos planejadores culturais ainda atrelam a
modificação de suas práticas a valores tradicionais, como liberdade, felicidade e
segurança. Isso ocorre porque as conseqüências correspondentes às práticas, muitas
vezes, não são fáceis de serem observadas. Por sua vez, as explicações pautadas em
valores disponibilizam reforçadores mais imediatos no sentido de conferirem ‘alguma’
54
interpretação sobre uma determinada prática inferindo algumas possibilidades de
modificação através da modificação destes valores (SKINNER, 2003).
As práticas culturais podem ser avaliadas pelo critério de sobrevivência do grupo,
como já abordado acima. Os aspectos da cultura sobrevivem através de processos
onde as melhores práticas são selecionadas e por sua vez, são perpetuadas de uma
geração para outra. A seleção das práticas pressupõe competição entre elas, o que por
sua vez não garante culturas que sobrevivam por muito tempo, tampouco garante a
sobrevivência de práticas mais adequadas. Na verdade, a única garantia existente é a
modificação. Esse fato assusta as pessoas e conflita com os referidos valores
tradicionais, pois, ao contrário do que tais valores afirmam, o critério de sobrevivência
não possui meios para afirmar que as pessoas felizes pratiquem ações mais eficazes
para o desenvolvimento da cultura. Pelo contrário, muitas vezes as ações mais eficazes
são provenientes dos indivíduos infelizes (SKINNER, 2003).
Skinner (2003) afirma que outra das dificuldades em aceitar a sobrevivência
como critério de avaliação da evolução cultural esteja no fato da evolução pressupor
não somente competição, mas competição agressiva entre os grupos. Desse modo a
luta pela sobrevivência é encarada de maneira aversiva fazendo com que valores
tradicionais sejam aceitos mais facilmente como explicação. Porém, a sobrevivência
não é uma questão de escolha e sim um fato. Não nos comportamos a partir de
escolhas feitas baseadas em valores e ideais, mas sim porque alguns comportamentos
foram selecionados pelas conseqüências, por serem mais bem –sucedidos na garantia
da sobrevivência da espécie.
Atualmente muitos membros da cultura ocupam-se do planejamento e da
modificação das praticas culturais com o objetivo de torná-las boas ou melhores do que
são atualmente. Para Skinner (1972, p.111), bom é sinônimo de reforçador. Ao invés de
utilizar-se da palavra melhor a fim de julgar as praticas como boas ou não, o importante
é considerar as conseqüências de várias práticas em vários tipos de cultura. No
entanto, o termo melhor pode auxiliar a compreender que: “(...) É possível propor
maneiras melhores do que as que dispomos no momento e sustentá-las com o auxílio
de prognósticos e eventuais demonstrações de resultados mais reforçadores (...)”.
55
Nesse sentido, pode-se vislumbrar a possibilidade de testar práticas culturais mais
adequadas e eficazes e, por conseguinte, mais reforçadoras para a cultura. Para tanto,
a análise do comportamento pode utilizar-se de suas técnicas a fim de definir e sugerir
meios de realizar tais mudanças. Em razão disso, a análise do comportamento é
extremamente importante para o planejamento de uma cultura.
De maneira semelhante às considerações feitas por Skinner (2003), Skinner
(1972) afirma que as pessoas recorrem a sentimentos e estados de espírito para
explicar o comportamento humano na contemporaneidade. Porém Skinner aborda a
questão afirmando que interpretações baseadas em sentimentos não são capazes de
sugerir mudanças relevantes devido ao fato de desconhecerem as contingências e sua
capacidade de modificação. O autor explica ainda que, as contingências não podem ser
analisadas por um observador ao acaso (como ocorre em interpretações mentalistas),
ou seja, sem um conhecimento prévio de um experimentador. Somente uma análise
experimental do comportamento possui meios para concluir eficazmente o que ocorre
com as contingências, substituindo com precisão os chamados processos mentais. É
importante destacar que a ciência do comportamento não substitui apenas os termos,
mas adiciona seu conhecimento sobre as contingências de reforçamento buscando
transcender interpretações com a finalidade de propor ações práticas e eficientemente
direcionadas.
Portanto, para Skinner (1972), o único valor implicado na mudança das praticas
culturais é o valor de sobrevivência. Este valor vai além das modificações simples de
alguns costumes, ele visa à mudança de uma série de práticas atuais para outras que
possam vir a colaborar para a sobrevivência.
Segundo Baum, as mudanças culturais ocorrem através da variação, seleção e
transmissão. De acordo com ele:
Tendo reconhecido que as culturas mudam por meio de um processo evolutivo
que é o resultado de variação, transmissão e seleção deveríamos então ser
capazes de agir para melhorar essa evolução, aperfeiçoando todos esses três
aspectos. Poderíamos aumentar e orientar a variação, testando
deliberadamente novas práticas (...) (BAUM, 2006, p. 283).
56
Nota-se a partir da consideração feita acima por Baum, a possibilidade de
melhora da evolução cultural quando oportunizada pela experimentação criteriosa de
novas práticas. Os critérios de transmissão, variação e seleção podem ser manipulados
a fim de alcançar mudanças mais satisfatórias, todavia para que isso ocorra é relevante
realizar uma avaliação das práticas utilizadas atualmente. Baum (2006) explica que se
pode, inclusive, selecionar criteriosamente tais práticas. De certo modo, essas práticas
são recorrentes em alguns governos e podem ser exemplificadas através das medidas
preventivas que o governo adota em razão de, por exemplo, doenças ou criminalidade.
Vê-se na atualidade a oferta de ações preventivas em diversos níveis de organização
social e grupos sociais, o que representa a necessidade de geração e emprego de
metodologias de investigação, avaliação e intervenção a populações cada vez mais
variadas; inclusive há uma urgência na produção de conhecimentos sobre intervenções
e resultados. Os estudos atuais sobre prevenção têm sido suficientemente variados
para agruparem uma diversidade de contribuições, versam desde atividades voltadas
para uma unidade específica (p.e., tabagismo; alcoolismo; atividade física entre
residentes; práticas parentais, grupos de adolescentes) até unidades mais amplas
como o próprio planeta, em suas diferentes dimensões comportamentais e sociais, mas
também geográficas, econômicas, climáticas entre outras.
Considerando-se
que
todo
planejamento
exige
avaliação
e
que
a
experimentação exige um planejamento Baum (2006, p. 287) explica que:
“planejamento cultural explica apenas que devemos fazer mais experimentação e fazêla mais cuidadosamente – isto é, com planejamento e avaliação (...)’’. A necessidade de
planejamento decorre do fato de como as mudanças ocorrem. Essas mudanças são
ocasionais e variam de pessoa a pessoa, e/ou de grupo a grupo, sendo necessária uma
avaliação de dados calculados referentes à freqüência de mudanças ocasionadas por
tais práticas, sobre o que mudam, mantém ou alteram considerando conseqüências
advindas das ações planejadas. O critério o qual se baseia a análise é o critério de
sobrevivência, tendo em vista que essas práticas tendem a modificar-se com o tempo, e
o valor para a sobrevivência do grupo ser o bem maior a ser atingido quando se propõe
qualquer mudança planejada nas práticas.
57
Isso significa dizer que para Baum (2006) uma cultura modifica-se visando sua
sobrevivência. Para sobreviver, as culturas precisam adaptar-se às mudanças
ambientais como também devem ser capazes de observar outras culturas. Pois o
mundo possui uma grande diversidade cultural que, por essa razão torna-se
naturalmente conflitivo. A mudança decorre da competição entre essas culturas. Nesse
sentido, a cultura que se adequa as novas práticas tornando-se mais flexível e sensível
às mudanças possui maiores chances de sobreviver.
O conflito entre as culturas é gerado por uma interdependência das várias
praticas existentes. A interdependência faz com que uma cultura seja reforçadora o
bastante para penetrar em outras provocando a modificação. O aumento do potencial
reforçador depende do quanto uma determinada pratica torna-se eficiente no
enfrentamento de novos desafios. Quando as mesmas são eficientes nessas questões,
elas competem com antigas praticas, podendo até mesmo substituir totalmente uma
antiga cultura. Porém, a sobrevivência de uma determinada cultura depende
principalmente de como seus membros são reforçados a trabalhar por ações que sejam
favoráveis a que isso ocorra (BAUM, 2006).
Skinner (2003) discute a respeito do fato de se negligenciar o valor de
sobrevivência e as contribuições da analise do comportamento para a evolução da
cultura. Segundo o autor, os reforçadores imediatos, a saber, os valores como
liberdade, dignidade e felicidade, quando são aceitos como explicação sobre o
surgimento da cultura, assim como solução viável para os seus problemas acarreta
efeitos negativos e desvantajosos para a cultura, efeitos estes que podem ser
comparados aos efeitos da punição. Por sua vez, as conclusões sobre o valor de
sobrevivência conferem soluções relevantes para os problemas enfrentados pela
cultura. A partir do momento em que o individuo reconhece esse valor pode utilizá-lo
como um critério, e com a manipulação das contingências, consiga obter um melhor
planejamento cultural, empenhando-se em comportamentos de planejar de modo mais
eficiente.
Sobre o comportamento do planejador cultural, Skinner afirma que:
58
(...) o comportamento de fazer uma sugestão construtiva acerca da prática
cultural não acarreta uma escolha de valor. Uma longa história biológica e
cultural produziu o individuo que age de modo particular com respeito às
condições culturais. (SKINNER, 2003, p.471)
O que significa dizer que o comportamento do planejador cultural, assim como os
demais comportamentos sociais, é um produto das contingências presentes em seu
ambiente. Dessa forma, o planejador como membro de uma cultura tem seus
comportamentos modelados e mantidos pelos mesmos princípios que originam aquilo
que analisam e que leva ao planejamento, então suas decisões são também produtos
de contingências culturais e regras estabelecidas pelo grupo, mas também de sua
história biológica e pessoal. Ações de planejamento sofrem do mesmo modo
conseqüências no ambiente imediato e em longo prazo, fortalecendo ou diminuindo em
freqüência a ação em determinadas direções ou diante de determinadas decisões.
Para Baum (2006), é possível modelar o comportamento do planejador cultural
colocando-o sobre o efeito de reforçadores em longo prazo. Isso se justifica porque as
culturas desenvolvidas sobre o controle de reforçadores em curto prazo, como ocorre
atualmente, podem levar seus membros a uma armadilha de reforço. Ocorre que na
armadilha de reforço, os reforçadores em curto prazo tornam-se aversivos em longo
prazo, pois sempre acarretam alguns prejuízos. Como por exemplo: “(...) em curto
prazo, sacolas plásticas se tornaram muito populares entre os norte–americanos porque
são convenientes e baratas; a longo prazo acabam em terrenos baldios e poluem o
ambiente (...)”. (2006 p.288). No entanto, esses problemas tornam-se apenas previsões
ou
possibilidades.
Nesse
sentido
não
conseguem
controlar
eficazmente
o
comportamento de alguém, pois seus efeitos ocorrem muito posteriormente e vão se
acumulando à medida que o tempo passa.
Mesmo diante dessas constatações, Baum (2006) afirma que existem meios para
colocar o comportamento dos membros de uma cultura sobre o controle de
contingências em longo prazo. Basta oferecer reforçadores que estimulem o planejador
cultural a fazer com que os controlados respondam aos reforçadores de longo prazo.
Esses reforçadores surgem através de experimentação de novas práticas. Os
59
experimentadores geram novos reforçadores e os passam para os controladores que
por sua vez utilizam-nos a fim de controlar os membros de sua cultura.
As novas práticas administradas pelo planejador cultural agem, de acordo com
Baum, “(...) Substituindo as antigas e resolvendo os problemas por elas gerados, têm
dois efeitos: Asseguram a sobrevivência da cultura e promovem a longo prazo o
sucesso reprodutivo dos membros da sociedade (...)” (2006, p.289). Torna-se, então,
evidente a importância da experimentação de novas práticas para a garantia da
sobrevivência da cultura. Ao citar Skinner, Baum (2006) defende a necessidade
constante da experimentação dessas praticas, pois a experimentação permite a
reavaliação de práticas mais antigas que tenham efeitos negativos para a cultura com a
finalidade de substituí-las por práticas mais eficazes. O mesmo raciocínio volta-se para
práticas positivas, que podem vir a ser fortalecidas e mantidas. Tais ações podem evitar
a destruição do ambiente no qual se vive, e por essa razão o planejador cultural que
trabalhe nessa perspectiva poderá desenvolver ações mais favoráveis a sua cultura.
A eficiência de uma determinada prática, ou seja, a percepção de que ela
funciona, pode ser notada pelo fato de tornar as pessoas mais felizes. A felicidade é
entendida, no sentido dessa discussão, como a ausência de controle aversivo ou
coerção, somada às possibilidades de escolha dentre vários reforçadores positivos que
possam vir a controlar o comportamento. No entanto, esses reforçadores sempre
devem controlar o comportamento em longo prazo, visto que são tais reforçadores os
responsáveis pela possibilidade de sobrevivência (BAUM, 2006).
Skinner (1972), tal como posteriormente Baum (2006), afirma que a cultura
necessita de pessoas que sejam reforçadas a trabalhar pelo bem-estar de seus
membros. Isso significa dizer que as pessoas precisam deixar de serem controladas
visando apenas reforçadores pessoais. De acordo com Skinner:
(...) se o planejador for um individualista, planejará um mundo onde estará o
mínimo possível sob o controle aversivo e aceitará os benefícios pessoais como
os valores últimos. Se esteve exposto a um ambiente social adequado,
planejará o bem dos outros, possivelmente em detrimento dos benefícios
pessoais. Se, antes de mais nada, está preocupado com o valor de
sobrevivência,
planejará
uma
cultura
tendo
em
vista
o
seu
funcionamento.(SKINNER, 1972, p.115).
60
A visão de Skinner (1972) sobre o comportamento do planejador pressupõe a
importância da ação do ambiente na modelagem desse comportamento. Somente
individuo pertencente a um ambiente que reforce as ações de planejar pode comportase de maneira favorável á sobrevivência de seus semelhantes.
No entanto, para colocar seu comportamento de planejar a favor da
sobrevivência da cultura, o planejador deve ser capaz de prever futuras dificuldades
que possam vir a surgir durante o seu planejamento, para que assim possa conseguir
modificar as práticas. A modificação das práticas deve ter em vista a solução para
alguns problemas globais enfrentados atualmente. São eles: superpopulação, poluição
e o armamento nuclear. Visa-se com isso a modificação das contingências que mantêm
essas práticas para as contingências que as combatem. Pois não se pode perder de
vista que: “(...) uma cultura depende do comportamento de seus membros (...)”.
(SKINNER, 1972, p.116)
61
3. Agências controladoras e formas de controle social:
Skinner (2003) acredita que qualquer pessoa implicada na questão do
planejamento cultural deve conhecer os problemas relacionados aos controles
exercidos pelas agências controladoras. Algumas delas operam restringindo o poder de
controlar de outras agências. Por exemplo, o governo é uma agência que limita outras
agências para obter a paz no grupo. A fim de conseguir o controle, ele exercita seu
poder através da força; muitas vezes esse poder pode ser utilizado para servir aos
interesses do governo fugindo do objetivo principal. No entanto, faz-se relevante
observar que o poder do controlador depende do comportamento do controlado. A partir
dessa consideração, agências controladoras, como por exemplo, o governo cria
condições de transpor valores mentalistas, a saber, felicidade e liberdade. Pois a partir
do reconhecimento da existência do controle assim como da relevância de planejar a
cultura de acordo com perspectivas de sobrevivência, os governos evitam a alienação
no poder que possuem (autocontrole), passando a usá-lo de modo mais eficaz para um
bom planejamento cultural.
Skinner (2003) discute sobre a relevância de as agências, como por exemplo, o
governo, conhecerem os benefícios gerados por um planejamento visando o critério de
sobrevivência, para que assim possam abandonar as concepções mentalistas (valores).
Segundo o autor, os valores éticos e morais seguidos pelo governo seguem os mesmos
padrões éticos e morais produzidos pela cultura. O governo e as demais agências criam
contramedidas a membros do grupo que agem em desacordo com tais padrões e,
desse modo exercem o poder de controle e planejam suas ações. O valor de
sobrevivência inferido pela análise do comportamento permite que as agências
reconheçam os efeitos de seus procedimentos controladores no grupo, como também
se tais procedimentos garantirão a sobrevivência de seus membros.
Portanto, as considerações feitas por Skinner (2003) sobre o controle exercido
pelas agências controladoras, como no exemplo do governo, permitem o conhecimento
dos efeitos desse controle nas expectativas de sobrevivência do grupo.
A
sobrevivência, por sua vez gera a possibilidade da criação de um novo padrão de
62
valores morais com tendência a serem mais facilmente aceitos, tornando-se um divisor
de águas entre as antigas concepções e os novos valores traduzidos pela possibilidade
de um planejamento que garanta a sobrevivência da cultura.
Mas como as agências controladoras exercem controle sobre os membros de
uma cultura?
Skinner (1991) em referência ao modo como antigos filósofos descreviam a
relação entre falante e ouvinte, sugere que sobre a perspectiva deles, o falante
consegueria transformar em palavras aquilo que capta de sinais no ambiente, o que
significa dizer que transformariam os sinais em representações de acordo com suas
percepções sobre o mundo; já o ouvinte constrói suas próprias percepções de mundo a
partir das percepções de um falante. Para o autor, diferentemente da visão dos
filósofos,
falantes
e
ouvintes
tiveram
seus
comportamentos
modelados
por
contingências de reforçamento presentes no ambiente social, onde cada um foi exposto
a uma história de reforçamento especifica.
De acordo com Baum (2006) o comportamento social é controlado por regras. As
regras podem ser entendidas como enunciados verbais que denotam ordens,
instruções ou conselhos. Para que haja o controle, tais enunciados precisam ser
contingentes em uma relação de reforço entre falante e ouvinte onde, quando descritos,
possam tornar-se estímulos discriminativos verbais para o comportamento de ambos.
Por serem as regras estímulos verbais discriminativos contingentes, elas podem então
ser entendidas como comportamento verbal.
Pelo fato das regras configurarem comportamentos verbais elas se diferenciam
significativamente dos comportamentos controlados pelas contingências naturais que,
por sua vez, dispensam verbalizações de qualquer espécie para ocorrer. Porém, ambos
os modos de controle assemelham-se por acontecerem em uma relação de reforço e
punição, mantendo-se a dependência do ambiente para garantir seu efeito controlador.
É relevante destacar que a maioria dos comportamentos sociais são aprendidos por
regras para depois serem aprimorados por contingências naturais. Isso ocorre, porque
ao receber instruções de como fazer algo ou agir de um modo particular, e ao realizar o
comportamento de acordo com o que foi instruído ou ordenado comportamento do
63
individuo vai sendo construídos estando mais diretamente sobre o controle dessas
contingências; ele vai descobrindo um jeito de se comportar, o que pode ser entendido
como o desenvolvimento de suas habilidades pessoais (BAUM, 2006).
As regras são controladas por uma relação de reforço entre falante e ouvinte.
Segundo Baum:
(...) Relação de reforço é uma relação entre atividade e conseqüência (...). Em
última análise, o estimulo discriminativo para qualquer verbalização que
possamos reconhecer como regra é uma relação de reforço (BAUM, 2006, p.167168).
A relação de reforço ocorre em uma variação de curto e longo prazo. Na relação
de reforço imediato, o reforço ocorre após o comportamento do ouvinte e pode se
apresentar sobre forma de aprovação, por exemplo, por ter seguido a regra. Para o
falante, o reforço vem através do comportamento do ouvinte em acatar o que ele
instruiu ou ordenou. Ambos os comportamentos sendo reforçados, eles se manterão
sobre o efeito de reforçadores em longo prazo, pois esses reforçadores são importantes
porque eles garantem saúde e bem–estar para o individuo.
O controle das regras é então determinado pelos reforços imediatos emitidos em
sua relação como o falante, pelo fato de tanto o ouvinte quanto o falante vivenciarem
rapidamente os ganhos dessa interação, porém são mantidas e se justificam através
dos reforços que virão em um prazo maior, pois, como explica Baum:
A regra sempre explica algo de maior relevância. Isto é, a relação que a regra
indica atua sempre em um prazo relativamente longo, que em geral só se percebe
depois de muito tempo, um tempo talvez até maior do que o tempo de vida da
pessoa. As pessoas são aconselhadas a não fumar devido a uma associação
entre fumar e envelhecer, que apenas aos poucos foi percebida ao longo de
muitas décadas (...) (BAUM, 2006, p. 172).
Por essa razão, as regras precisam ser claras e precisas, pois auxiliariam a
identificar e a manter os comportamentos contingentes a ela, além de necessitarem ser
expostas por muitas relações de curto prazo para serem modeladas (modeladas pelas
64
contingências) e mantidas em relações onde os indivíduos obterão ganhos em um
prazo maior, tendo assim seus comportamentos modelados por regras (BAUM, 2006)
Uma questão importante sobre o modo como ocorre à modelagem do
comportamento por regras se infere por explicações mentalistas que responsabilizam o
referente modo de controle a agências internas como a mente, e costumam dizer que o
indivíduo internaliza tais regras ao longo de seu desenvolvimento. A análise do
comportamento explica que as regras não fazem parte de agências internas, mas são
produtos de interações com o ambiente que se explicam do mesmo modo que os
demais comportamentos, ou seja, através das relações de reforços. O que ocorre aqui
são lacunas entre o tempo em que a ação que passou a ser controlada pela regra
ocorreu em um primeiro momento, e as relações posteriores que ela passa a controlar
através de generalizações. Nas novas situações, a regra já não precisa mais ser
pronunciada por um falante para controlar o comportamento do ouvinte, por isso tem-se
a sensação de que foi internalizada, na verdade somente foi generalizada para outros
contextos (BAUM, 2006).
Faz-se relevante observar que as regras fazem parte e são aprendidas no
contexto cultural ou social dos indivíduos, nesse sentido Baum expõe que:
(...) os membros de uma mesma cultura aprendem regras uns com os outros.
Uma vez que a pessoa tenha formulado a regra e a tenha ensinado a seus
descendentes, parentes e vizinhos, se a regra de fato entrou em contato com a
relação última, porque os membros de uma mesma cultura aprendem regras uns
com os outros. Uma vez que a pessoa tenha formulado a regra e ensinado aos
seus descendentes, parentes e vizinhos, se a regra de fato entrou em contato
com essa relação última, ela se propaga de pessoa a pessoa e de grupo a grupo.
(BAUM, 2006, p. 176).
As pessoas aprendem a agir conforme o que lhes ensinam outras pessoas ao
longo da vida, seus comportamentos são então fortemente influenciados por outros que
julgam, dizem ou ordenam algo na condição de falante das regras. Isso se justifica
pelos inúmeros reforços os quais os ouvintes vão adquirindo ao longo do tempo por se
comportarem de acordo com tais padrões. Com isso pode-se perceber que as regras
possibilitam as interações complexas entre os membros da cultura e que a própria
65
cultura não existiria sem o possível controle de tais interações advindo do
comportamento verbal (BAUM, 2006).
Skinner (2003, p.166) aborda a questão da relevância das regras para o
funcionamento da cultura alegando que com o advento desta propiciado pelo
agrupamento de pessoas, esses grupos começaram a desenvolver inúmeras práticas.
Com a necessidade de gerenciá-las, os indivíduos começaram a classificar os
comportamentos em bons ou ruins certos ou errados e puni-los ou reforçá-los de acordo
com tais padrões, denominados morais. Segundo o autor: “(...) Estabeleceram-se
regras que ajudam uma pessoa a conformar-se com as práticas de sua comunidade e
que ajudam a comunidade a manter tais práticas (...)”. De acordo com o autor, os
comportamentos éticos e morais, são comportamentos que se referem à obediência e
ao seguimento das regras, esses comportamentos são fortemente reforçados pelo
grupo.
Skinner (2003) infere uma questão importante sobre os comportamentos
contingentes a esses determinados padrões estabelecidos por regras sociais, pois o
grupo reforça tais padrões na medida em que considera as atitudes de quem o segue
como atitudes morais que devem ser exercidas para o bem de todos. De acordo com o
autor, a obediência ao governo é uma atitude que vem sendo modelada ao longo de
muitos séculos e que não é suficiente entendê-la em termos de atitudes referentes à
moralidade, mas sim à luz das contingências que modelaram essas atitudes ao longo
de todo esse tempo.
Ao se referir ao principio das práticas realizadas pelos grupos, Skinner define as
leis (código escritos) como:
(...) advertências padronizadas acerca do comportamento considerado mal e que
era conseqüentemente punido, (...) as contingências se tornaram mais poderosas
quando foram codificadas em advertências religiosas e governamentais, em
orientações e instruções chamadas leis. Obedecendo as leis a pessoa evita a
punição. (SKINNER, 2003, p. 107).
As leis governamentais são regras configuradas em ordens que passam por um
processo de escolha realizado por parlamentares com a finalidade de governar a
66
nação. As leis religiosas são utilizadas para controlar indivíduos a partir da
apresentação de contingências punitivas de cunho sobrenatural. Muitas vezes, ambas
são favoráveis a quem controla em detrimento de quem é controlado (SKINNER, 1991).
As leis, o governo, a religião, a psicoterapia, a economia e a educação são
chamadas por Skinner (2003) de agências controladoras. A elas é atribuída a função de
controlar o grupo de maneira mais organizada e eficaz, partindo do pressuposto de que
um grupo venha a funcionar de maneira desarticulada, as agências controladoras agem
sobre o grupo manipulando as variáveis necessárias para exercer a organização.
Sobre a questão do controle exercido pelas agências controladoras, Skinner
considera ainda que:
Órgãos ou instituições organizadas, tais como governos, religiões e sistemas
econômicos e, em menor grau, religiões e psicoterapeutas, exercem um controle
poderoso e muitas vezes modesto. Tal controle é exercido de maneira que
reforça de forma muito eficaz aqueles que o exercem, e infelizmente, isto, via de
regra, significa maneiras que são ou imediatamente adversativas para aqueles
que sejam controlados ou os exploram a longo prazo (SKINNER, 2003, p. 164).
Ao explicar a sobrevivência das agências controladoras, Skinner (2003)
preocupou-se em descrever generalizações que pudessem explicar os efeitos do
controle sobre o grupo controlado, o que normalmente não ocorre com outras ciências
implicadas com essas questões, pois as mesmas não conseguem chegar a um ponto
em comum a todos os fenômenos ocorridos, dada a complexidade das interações entre
todas as agências. De acordo com o autor, entendendo o controlador e o controlado
em termos do efeito do controle sobre o comportamento, pode-se então explicar tais
fenômenos sobre a mesma perspectiva dos princípios da análise comportamental,
chegando assim a um importante denominador comum sobre a questão, o que
possibilitaria as respostas para muitas questões.
O governo possui certas habilidades especiais que o fazem deter o poder de
manipular as variáveis favoráveis ao controle do grupo, tais habilidades estão
relacionadas ao poder de punir. O individuo, para conseguir chegar a deter o poder de
controlar o grupo, em um primeiro momento, utiliza-se do controle ético através das leis
67
(administrando reforçadores e punidores) para persuadir o grupo a delegar-lhe o poder
de governá-lo. Uma vez eleito, o controlador passa a sustentar o poder adquirido,
através do poder de punir, utilizando-se da polícia e dos militares para exercer a
punição (SKINNER, 2003).
As leis são ordens sistematizadas e padronizadas. Elas têm duas características
importantes: especifica um comportamento por parte do individuo que tenha um efeito
aversivo para outro, e a punição supostamente prevista para quem não segue suas
imposições. Pode-se então perceber que a serviço do governo, a lei enfatiza
comportamentos considerados “errados’ como, por exemplo, a ameaça a propriedade
ou a outros membros do grupo e prevê punições para estes comportamentos que são
aplicadas pelo governo que, como dito anteriormente, detêm o poder de punir. Como
explica Skinner :
(...) Um governo que possui apenas o poder de punir pode fortalecer o
comportamento legal somente pela remoção de uma ameaça de punição a ele
contingente. Algumas vezes isso é feito, mas a técnica mais comum é
simplesmente punir as formas ilegais do comportamento. (SKINNER, 2003, p.
367).
Focault (2002) faz uma análise sobre a questão histórica a respeito do poder de
punir adquirido pelas autoridades penais e governamentais. Afirma que a punição
infligida aos condenados, na época medieval, era um modo de controle social onde as
autoridades reafirmavam seu poder e faziam valer suas imposições. Sendo assim, o
corpo do condenado tornava-se apenas um meio de manifestação desse poder o qual
servia de exemplo a quem ousasse desafiar a justiça e a soberania da época.
É
importante entender que os crimes cometidos eram considerados como uma ofensa
pessoal ao rei que se julgava desafiado por quem ousou perturbar a ordem do reino,
nesse contexto, a punição tinha a função política de resgatar a soberania lesada do rei.
O autor explica ainda, que com o advento dos cárceres, as punições passaram a
ocorrer de forma mais velada, mas continuaram servindo ao poder de quem puni.
68
As punições governamentais condicionadas denominadas leis podem punir os
comportamentos considerados ilegais apresentando reforçadores negativos como, por
exemplo, constrangimento, como no caso de ir a delegacia prestar queixa, castigos
corporais, trabalhos forçados, dentre outros, ou retirando reforçadores positivos tais
como penas de multa e encarceramento. Segundo Skinner (2003 p.368): “Na prática,
essas punições são tornadas contingentes a tipos particulares de comportamento
visando reduzir a probabilidade de que o comportamento venha a ocorrer novamente” .
Acredita-se que a punição dos comportamentos ilegais sirva de exemplo para os
demais membros da sociedade no sentido de continuarem seguindo as leis, como já
afirmava Foucault (2002), porém somente isso não seria suficiente para manter o
comportamento do grupo no sentido de continuar obediente a tais regras. As pessoas
normalmente não assistem à prática ilegal no momento em que ocorrem tão pouco as
punições aplicadas, o que impediria de certa forma um controle eficiente baseado
apenas na observação de modelos, outros processos ainda seriam necessários para a
explicação da ação dos membros de uma cultura. Nesse caso, e como exemplo, o
código penal desempenharia o papel importante ao garantir o controle verbal
necessário para que seu uso se perpetue entre os membros da cultura, uma vez que o
código estabelece as regras e as conseqüências por não segui-la. O controle verbal
suplementa o controle já exercido pelo modelo.
Ao citar Skinner (1953), Neto, Alves, Baptista (2007) constatam que as pessoas
aprendem a se comportar de maneira ética e em concordância com padrões legais
estabelecidos pelo código, através do que é passado pelo grupo. Por essa razão, esse
padrões são controlados diretamente pelo grupo representado pela família, escolas e
por amigos. Entretanto, delegar o poder de controle a outros membros do grupo pode
levar a consequenciar a não efetividade do controle desses padrões, pois muitas vezes
em decorrência de razões diversas, eles não são passados em concordância com as
instruções éticas e morais do grupo maior. Outro aspecto a considerar é que quem
controla nem sempre está presente no momento em que o comportamento do
controlado ocorre, o que poderia impedir o estabelecimento do controle efetivo
desejado, sendo, portanto, mais comum o controle exercido pela regras. As regras
substituem a presença dos agentes controladores, e são mantidas pelo grupo
69
(interação falante-ouvinte) em benefício de quem controla e do que deve ser controlado,
porém, como observado, isso não garante que o controle verbal estabelecido pelos
membros do grupo sempre venha a se dirigir à manutenção de códigos ou em benefício
da própria cultura ou de um agente controlador em específico. Ao estar sob controle
dos membros do grupo a aplicação das regras e sua consequenciação, variáveis
individuais ou do próprio grupo podem vir a consequenciar os comportamentos em
outras direções, inclusive com regras destinadas a ações de contra-controle.
De acordo com Skinner (2003) o controle exercido pelo governo também o afeta,
no sentido de seus membros acabarem se destacando, com muitos méritos, na história
da humanidade. Porém, o contracontrole é um efeito de maior relevância a ser
considerado. Como explica o autor, o governo vai se revestindo de um poder cada vez
maior em manipular as variáveis que controlam o grupo e sendo reforçado por deter
esse poder. Desse modo, utiliza-se de força de modo cada vez mais exacerbado, para
coagir seus governados e pode até mesmo explorá-los economicamente com a
finalidade de aumentar suas riquezas, até que os membros do grupo percam totalmente
seus recursos. A exploração pode por sua vez gerar um contracontrole por parte do
controlado, que tende a fugir ou revoltar-se com a situação.
Baum (2006) discute sobre as implicações existentes nas relações de
exploração. De acordo com o autor a exploração consiste em uma relação que dispõe
de reforçadores positivos em curto prazo que vão tornando-se aversivos ao longo do
tempo transformando-se em uma armadilha de reforço. A exploração caracteriza-se
pela trapaça, onde a pessoa só percebe que está sendo enganada ou que caiu em uma
armadilha em um contexto maior, quando entra em contato com estímulos que
discriminam a verdadeira situação. É interessante notar que Baum (2006) afirma que o
próprio governo dispõe de mecanismo que protegem o individuo dessas interações,
como, por exemplo, as leis que protegem a criança do trabalho infantil, e as leis que
determinam condutas a serem seguidas pelos governantes.
Pelo fato de se transformar em uma relação que dispõe de reforçadores
negativos em longo prazo, a relação de exploração é altamente coercitiva. Entretanto,
as relações coercivas são mais facilmente descobertas pela pessoa coagida. Por sua
70
vez, as relações de exploração pelo uso de reforçadores positivos são dificilmente
percebidas pelo individuo tornando-os ‘escravos felizes’. Os ‘escravos felizes’ são
pessoas que foram bastante ludibriadas e reforçadas pelo que fazem, e, em razão disso
nada fazem para sair do contexto em que se encontram, o que acarreta em mais
exploração e uma ameaça real à democracia.
De acordo com o exemplo citado por Baum:
Escravos felizes podem existir em muitos e diversos tipos de relação. Pais
podem explorar seus filhos, recompensando-os com cuidados e afetos desde
que trabalhem, peçam esmolas nas ruas ou participem de atos sexuais (...)
(BAUM, 2006, p. 221).
O exemplo acima demonstra os reforços imediatos existentes nas relações de
exploração. Visto que elas dispõem efeitos prejudiciais ao individuo, como os efeitos da
punição e que este individuo cai em uma armadilha de reforço, pois é controlado pelos
reforçadores imediatos, faz-se necessário o exercício do autocontrole, ou seja, da
capacidade de responder aos reforços que surgem apenas em longo prazo,
discriminando as ameaças de punição. Indivíduos que descobrem estar sendo
explorados tardiamente, podem tornar-se indivíduos ressentidos com potencial para se
rebelarem contra o explorador, como ocorre no caso da coerção dirigida ao agente
controlador.
É importante destacar que Baum (2006) afirma que a relação entre instituição
controladora e indivíduos se estabelece do mesmo modo que as relações entre um
indivíduo e outro. Para o autor, as únicas relações possíveis para ambos são as
relações de equidade, onde as pessoas sentem-se felizes por receberem os reforços de
maneira igual quando se comparam a outros grupos sociais.
Para Skinner (1972), as pessoas também se sentem felizes quando estão livres
de controle aversivo, pois de acordo com autor liberdade são sentimentos atrelados a
comportamentos que livram os indivíduos do contato com os estímulos coercitivos. Tais
comportamentos
são
denominados
de
fuga
e
esquiva.
A
origem
desses
comportamentos está no ambiente físico que desde o principio sempre disponibilizou de
71
ameaças constantes a espécie humana, que por sua vez sempre desenvolveu
mecanismos para se livrar de tais ameaças. Entretanto:
Os mecanismos de fuga e esquiva exercem um papel bem mais importante na
luta pela liberdade, quando as condições aversivas são geradas por outras
pessoas (...) de uma forma ou de outra, intencionalmente ou não, o controle
aversivo é o padrão de quase todo o ajustamento social – em ética, na religião,
no governo, na economia, na psicoterapia e na vida familiar. (SKINNER, 1972,
p. 26)
A afirmação acima demonstra que quase todas as relações sociais se dão
através de comportamentos de fuga e esquiva, uma vez que todas essas relações se
desenvolveram por contingências de controle aversivo, incluindo-se ai as instituições
que exercem controle social.
Skinner (1972) aponta a agressão como sendo uma das formas em que se
apresenta o comportamento de fuga. O autor acredita que o comportamento de atacar a
outros faça parte da herança genética dos homens e que de certo modo essa herança
seja favorável às lutas desses homens pela liberdade do controle aversivo. Pois se
observa que os homens agredidos possuem sempre predisposição para agredir, direta
ou indiretamente. Pode-se citar o vandalismo como um comportamento de agressão
indireta onde a pessoa que é agredida passa a atacar outras pessoas mesmo que estas
não tenham sido exatamente seus agressores.
O autor descreve ainda que instituições controladoras, como é o caso do
governo, apelam para o controle por reforçamento positivo quando percebem a ameaça
de agressão ou outros modos de comportamentos que possibilitem a fuga ou a esquiva
por parte dos controlados. Esses reforçadores possuem um efeito em longo prazo e
não controlam imediatamente o responder, fazendo com que as instituições
controladoras utilizem de reforçadores positivos condicionados que se transformam em
reforçadores aversivos ao longo do tempo. .Agindo desse modo, elas conseguem
manter os membros do grupo sobre o seu controle, gerando uma falsa idéia de
liberdade.
Matos (1980/1981) discute sobre suas conclusões a respeito dos efeitos do uso
do controle aversivo, como técnica de controle social. De acordo com a autora, a
72
referente técnica possui efeitos desagradáveis tanto para quem a utiliza quanto para
quem seu uso é destinado, e por essa razão, não existe nenhum fato razoável que
justifique o seu uso, tendo em vista que tudo o que decorre dessas interações provêm
de estímulos nocivos e ameaçadores a sobrevivência da espécie humana. Diante
dessas percepções a autora esclarece que:
Não pretendo realmente falar sobre ética, deixo, esperançosamente, para que
vocês o façam após esta palestra. Não estou aqui nem para convencer, nem
para converter ninguém. O que gostaria mesmo é falar sobre alguns
mecanismos e procedimentos de controle aversivo, estudados e usados,
respectivamente, dentro e fora do laboratório (...). (MATOS, 1980/1981, p.126).
De acordo com o exposto acima, pode-se pressupor que Matos (1980/1981)
considera que a relevância em discutir o controle aversivo é algo que antecede a
importância de discussões sobre as questões éticas, pois a partir do conhecimento das
implicações do controle aversivo para as interações sociais, poder-se-á discutir as
questões éticas que estão atreladas a tais efeitos de maneira mais ‘consciente’,
propondo, talvez, alternativas mais eficazes para os problemas existentes nas
interações atuais.
Para Matos (1980/1981), o principal efeito do controle coercitivo é a supressão. A
supressão gera comportamentos como os de inibição da resposta ou de respostas
incompatíveis com o estimulo aversivo. Os mecanismos que inibem o comportamento a
partir da apresentação do estímulo aversivo geram respostas emocionais chamadas de
ansiedade. A ansiedade torna-se então um comportamento que prejudica as interações
saudáveis do indivíduo com o seu ambiente. Nesse sentido a ansiedade pode ser
compreendida como: “(...) algo que se associa a comportamentos inadequados,
prejudiciais a interação do individuo com o meio (...)” (MATOS,1980/1981, p.128). Os
efeitos da ansiedade podem ainda tornar-se permanentes após certa freqüência a
exposição do individuo aos estímulos aversivos.
Um segundo comportamento gerado pela exposição ao controle coercitivo referese à geração de respostas incompatíveis ao estimulo aversivo apresentado. Essas
respostas podem dominar totalmente o repertório do individuo, eliminando as demais
respostas contingentes a outros estímulos, tornando o comportamento algo ritualístico.
73
É importante destacar que ambos os comportamentos apresentados apresentam sérias
ameaças aos membros da sociedade, e, por conseguinte, a sobrevivência da espécie,
uma vez que se tornam nocivos as relações entre os indivíduos.
Além dos comportamentos mencionados, Matos (1980/1981) considera a
existência de comportamentos alternativos tais como comportamentos de agressão, por
parte dos indivíduos controlados coercitivamente, ao seu ambiente físico e social.
Estudos realizados utilizando choques elétricos em animais demonstram que quando
esses animais recebem choques juntos e com freqüência, eles passam a atacar seu
ambiente assim como outros animais. Situação ainda mais critica é demonstrada por
outro estudo o qual conclui que animais que vivem juntos e recebem choques atacam
de maneira mais exacerbada do que animais que recebem choques isoladamente,
tornando a situação dos animais agredidos e em grupo potencialmente perigosa.
Pode-se perceber essas situações de laboratório estendidas as situações
cotidianas quando pessoas vulneráveis socialmente (e.g., agredidas) atacam outras
pessoas (que podem ou não ser o agressor). Como explica Matos: “(...) estamos
passando por uma época em que moradores de subúrbios de Salvador atacam e
destroem seus meios de transportes, arriscando-se a andar a pé ou a perder seu
emprego por falta (...)” (MATOS, 1980/1981, p.128). O que demonstra que, assim como
no caso dos animais estudados, pessoas agredidas venham a se tornar também
pessoas agressivas.
Partindo-se do pressuposto de que agressão é uma forma de violência, Neto,
Alves e Baptista (2007) ao citarem o dicionário Aurélio (2000) e Sidman (1989/ 1995)
fazem as seguintes observações:
No dicionário Aurélio da língua portuguesa, Violência tem como definições:
constrangimento físico ou moral; uso da força; coação (Ferreira, 2000, p.2076). O
termo coação encontra-se também no mesmo dicionário como sendo um dos
possíveis termos da palavra coerção. (Ferreira, 2000, p.496). A violência poderia
ser assim vista como um sinônimo de coerção. (ALVES; BAPTISTA; NETO, 2007,
p.30).
74
Tomando como base alguns dos processos comportamentais da punição e da
coerção explicados por Sidman (1989/1995) e Catania (1999), Neto, Alves e Baptista
(2007) expõem que a punição é bastante utilizada em nossa cultura devido ao seu
efeito imediato na eliminação de comportamentos indesejados, da mesma forma a
coerção é aceita com naturalidade, o que se justifica no fato de os indivíduos terem
aprendido a se relacionar coercitivamente com o ambiente, fugindo ou se esquivando
de suas ameaças, fomentando a naturalidade com que a punição é encarada. Essa é
uma das razões que explicam o código penal que ao impor punições para
comportamentos que ameaçam os membros da sociedade, exercem controle sobre
eles. Nesse contexto: “As leis fazem parte de um código penal e descrevem
contingências de punição para os comportamentos considerados inadequados ou
nocivos para a boa convivência em grupo”. (NETO ALVES & BAPTISTA, 2007, p.31).
Porém, a despeito da naturalidade com que são encarados, a punição e os demais
modos de coerção provocam contracontrole no individuo controlado por tais
contingências, podendo inclusive exercer o contracontrole sobre agências e seus
membros; protestos e reivindicações podem ser analisados como formas mais
atenuadas de contracontrole nesse sentido, e mortes, agressões físicas e depredações
suas formas mais extremas.
A privação pode se tornar uma condição importante para a aplicação da coerção
permitindo o controle social. Ganha dimensões importantes quando manipulada pela
agência governamental. Biglan (1995 apud MARTINELLI & CHEQUER, 2006), assinala
essa questão quando analisa o papel do poder:
Uma pessoa ou grupo com poder pode controlar o acesso das pessoas a
reforçadores condicionados ou incondicionados. Aqueles com poder podem
coagir no sentido de que eles podem punir comportamentos que eles não
querem, e podem negativamente reforçar comportamentos por retirada da
ameaça contingente à obediência. Este controle por contingência também
mantém complacência, porque a tendência das pessoas se comportarem
consistentemente com regras estabelecidas é uma função das conseqüências de
fazer isto. (BIGLAN (1995) apud MARTINELLI E CHEQUER, 2006, p.119).
As conseqüências de tentar mudar tais práticas também são observadas. E
nesse sentido,
Falhas em considerar o papel do poder na manutenção das práticas culturais,
podem levar a influencia de custos e benefícios determinando escolhas culturais.
Grande número de pessoas está empobrecida e oprimida em muitos sistemas
75
culturais atuais... Entretanto, as pessoas que estão sofrendo sob um sistema
particular não são as pessoas com poder para mudá-lo. E aqueles com poder são
beneficiados com o poder existente. Além disso, embora os custos e benefícios
experimentados pelas massas possam ser desfavoráveis, qualquer movimento
para melhorar sua condição é provável de encontrar conseqüências
desfavoráveis, incluindo aprisionamento e morte (...) (BIGLAN, 1995 apud
MARTINELLI E CHEQUER, 2006, p.119).
Então, privação também é um modo de coerção que pode gerar contracontrole.
Experimentos de laboratório demonstram que pombos privados de alimentos começam
a agredir os seus companheiros de um momento para outro. A agressão é um modo de
contracontrole bastante expressivo em nossa sociedade. Em razão disso os autores
consideram:
O contracontrole é assim um outro elemento a ser considerado numa análise do
fenômeno da violência. Em uma sociedade na qual o controle coercitivo
prevalece, tende-se, então, a esperar que o contracontrole ocorra. Em alguns
lugares mais, em outros menos acentuadamente. De qualquer forma, sua
probabilidade é grandemente aumentada nesse contexto coercitivo. (ALVES;
BAPTISTA; NETO, 2007, p.31).
Com a finalidade de relacionar a violência a estados de privação geradores de
contracontrole sofridos por muitos membros do grupo, Neto, Alves e Baptista (2007)
recorrem aos autores Namo e Banaco (1999) por meio dos quais observam que existe
uma relação entre os índices de criminalidade e as condições econômicas e sociais de
alguns países. Um estudo realizado sobre a crescente violência no estado de são
Paulo, detectou que a cidade em questão sofre com o aumento exagerado da
população e não oferecem condições mínimas de bem-estar social e econômico para
essas pessoas, que são privadas desses reforçadores. No mesmo estudo, foram
constatadas que em países onde o governo aproveitava-se de meios legais para
explorar as populações economicamente, desestabilizando a economia, os índices de
violência aumentaram significativamente, pois as ações do governo tiveram como
conseqüência o empobrecimento de muitas pessoas que participavam ativamente para
o progresso da economia nesses países.
Somados a esses fatores, o uso cada vez
maior da coerção a fim de manter a ordem da sociedade, pode provocar a violência:
76
(...) O controle coercitivo é analisado como gerador de violência que aconteceria
na forma de contra-agressão e por meio de uma espécie de reação em cadeia, na
qual os mais fortes agrediriam os mais fracos, e assim sucessivamente (...)
(ALVES; BAPTISTA; NETO, 2007, p.37).
Lima faz algumas considerações sobre o uso da coerção materializada através
das ações dos agentes responsáveis pela segurança pública no Brasil. De acordo com
o autor:
A segurança Pública seria uma forma desenvolvida pelas sociedades modernas,
baseadas no estado de direitos e na democracia, na racionalidade e na
administração para ajudar a sociedade a conter o fenômeno da violência, ou seja,
do controle aversivo. (...) A segurança pública poderia muito bem ser
caracterizada como mais um tipo ou subtipo de agência controladora dentro do
governo. A polícia são os agentes responsáveis pela manutenção da paz, através
do uso da força (LIMA, 2007, p.2)
Na tentativa de explicar às ações violentas e repressoras da polícia justificadas
no combate a violência, o autor recorre primeiramente ao modo como tais a prática de
tais ações se desenvolveram. Nesse sentido, ele explica que as práticas da policia
utilizando da força, em principio, visavam formar uma barreira humana de proteção
entre as classes dominantes e as classes dominadas, separando-as de acordo com
uma perspectiva dualista entre bons e maus da sociedade.
Oliven (1989), ao referir-se sobre o assunto, demonstra que no período da
revolução industrial, muitos trabalhadores perderam seus empregos no campo e
migraram para as cidades em busca de oportunidade de trabalho. Porém, as indústrias
não conseguiam absorver toda essa mão de obra, pois além de excessiva ela era,
muitas vezes, desqualificada. Esse processo resultou em muitos trabalhadores
marginais que viviam do mercado informal e, eclodiu em violência, o que se justifica
como um modo das camadas populares reclamarem um excedente capital o qual foram
expropriadas. Além desse fator, a política implantada pelo governo referente à
77
segurança e desenvolvimento que visava o acúmulo de capital, fez com que a classe
média se sentisse ameaçada, principalmente pelo aumento da inflação. Diante dessa
possibilidade o governo em “parceria” com a mídia, mudou o olhar das classes médias
para essas questões econômicas, na direção do fenômeno das classes baixas que
viviam da marginalidade e acumulavam-se nas periferias em bolsões de misérias.
Essas figuras marginais foram associadas à criminalidade, e, como ‘bodes expiatórios’,
foram transformados em maus, separados dos bons (classe média e alta) pela forte
repressão policial que se formou contra eles.
Lima (2007) expõe que devido aos fatores que motivaram a prática dos agentes
de segurança pública no Brasil, suas ações se desenvolveram de forma desarticulada,
onde cada policia é responsável por uma classe social e um tipo de crime, tendo em
vista o agravante do estigma de violência e criminalidade atribuído às classes mais
carentes, que consequencia uma atuação de forma mais violenta e punitiva (como, por
exemplo, o encarceramento), ao invés de preventiva, contra a criminalidade existente
nesses ambientes, chamados pelo autor de massas populares. Numa espécie de lei “do
olho por olho e dente por dente”, o autor ressalta de maneira relevante, de acordo com
as conclusões de Andery e Serio (1995), os efeitos perigosos do uso de violência para
combater a violência, seriam eles: O uso da violência acarreta mais violência; faz com
que tudo tome a feição de violência, produz um sujeito impotente diante da violência,
amargo e vivendo uma vida amarga.
Lima (2007) destaca: “A violência produz violência como num processo
epidêmico e de difícil controle”. E cita Andery e Sério (1995) para inferir a seguinte
conclusão:
Buscando destruir, se pudermos as fontes de coerção: Sob controle aversivo
emitimos respostas de fuga/ esquiva, que, quando possível, assumem a forma de
ataque à fonte de coerção. Sob coação, tendemos a atacar aqueles que nos
coagem, tendemos a fazê-lo com toda a intensidade de que somos capazes. Pior
ainda, qualquer estimulação aversiva, ainda que não se dirija diretamente a nós,
pode produzir respostas de agressão. Tendemos a reagir com o ataque,
indiscriminadamente, a tudo aquilo que estiver relacionado à estimulação
aversiva. (ANDERY; SÉRIO, 1995, p.2 a 3)
78
De acordo com o exposto acima, por Lima, sobre os efeitos do uso da técnica de
controle aversivo por parte dos policiais e agentes de segurança pública no combate a
criminalidade, pode-se deduzir que tais ações somente podem gerar contra-controle
mais agressivo, fazendo com que a violência torne-se um fenômeno cíclico, onde uma
ação desencadeie a outra e assim sucessivamente.
Neto; Alves e Baptista (2007) alertam para o fato de muitas pessoas, devido à
ignorância sobre os efeitos danosos da punição concernente às interações sociais, em
especial destaque o contracontrole e a agressão, atribuírem à falta de conscientização
dos padrões de comportamento éticos e morais as causas da punição, porém o que
chamam consciência seria ela mesma um produto de coerção. Um possível caminho
para combater a violência e criminalidade crescente, ou seja, as revoltas e agressões
(contracontrole) por parte do grupo controlado, seria a garantia para obtenção de
reforçadores primários como saúde, emprego e educação e reforçadores secundários
como os bens de consumo. A privação e a exploração são potencialmente geradoras
de contra-agressão.
Porém o que ocorre é bem diferente, como explica Skinner (2003). O grupo
controlador utiliza-se habilidosamente do poder controlador da moral para persuadir o
grupo a deixar-se controlar por ele, para depois utilizar-se do mesmo controle ético a
serviço do poder de punir e coagir o grupo de uma forma excessiva reforçada pela
possibilidade de exploração das riquezas desse mesmo grupo, o qual o poder lhe
confere. Enquanto existir essa violência o efeito contracontrolador existirá e, por
conseguinte, a violência.
79
4-Algumas considerações sobre o sistema Prisional no
Brasil:
Goffman (1996) define as prisões como instituições totais. Para ele estas
instituições são locais isolados da sociedade, tendo como principal característica o
isolamento e a segregação social de seus membros. Os indivíduos pertencentes a elas
desempenham atividades de modo programado, sempre com as mesmas pessoas, e
sob a supervisão de uma equipe que possui a função de direcionar e controlar tais
atividades.
O surgimento das prisões como espaços de segregação social e privação de
liberdade são analisados por Faustino (2008) em um contexto de transformação
macrossocial, a saber, a passagem do modo de produção feudal para o modo de
produção capitalista. Tendo em vista que tais mudanças acarretaram em novas
concepções e paradigmas sociais, esses novos valores influenciaram a passagem da
pena de punição e castigos corporais para a pena de recuperação do individuo
criminoso.
As novas concepções trazidas pelo sistema capitalista visavam o acúmulo de
capital, nesse sentido, os castigos infligidos ao corpo como forma de punição
acabariam por prejudicar uma mão de obra produtiva e necessária a essa finalidade.
Como explica Faustino (2008) ao citar Almeida (2007), a maneira encontrada
para disciplinar essa mão de obra foi privá-la de sua liberdade, considerada um dos
maiores bens do individuo.
Com a privação da liberdade a pena duplica sua função:
(...) começa a nascer, então, a nova prisão moderna, cumprindo uma dupla
função para a sociedade emergente: por um lado segregar aqueles indivíduos
que podiam , seja pela contestação ou pela resistência pacífica, ameaçar a
ordem que se instalava e, por outro, aproveitá-los para o trabalho, necessário à
acumulação de capital. (FAUSTINO, 2008, p.34)
Nota-se diante do exposto que a pena assumiu a função social de segregar os
indivíduos que ameaçavam a sociedade do convívio com seus membros, bem como
80
assumiu a função política de preparar a mão de obra tão necessária à sociedade
capitalista. O acúmulo de capital era tão importante para o novo sistema, que Faustino
(2008) chama à atenção para o surgimento das casas de trabalho que objetivavam a
punição das pessoas que se recusavam a trabalhar nos moldes do sistema vigente.
Apesar dos avanços na forma de sua aplicação, as penas estavam a serviço da
economia capitalista.
Ao citar Capeller (1985), Faustino (2008) esclarece que as
prisões objetivavam a preparação dos infratores para assumir o trabalho nas fábricas.
Portanto, a recuperação significava apenas fazer com que esses indivíduos fossem
aptos para assumir seus postos na sociedade capitalista.
Ademais, tal mão de obra podia ser explorada durante a permanência na prisão,
o que evidencia seu único objetivo de explorar a mão de obra carcerária dentro e fora
do ambiente prisional. Faustino (2008) esclarece que mesmo com a introdução das
idéias humanistas, as prisões continuaram a atender a essa finalidade. As únicas
modificações notadas durante a introdução das referidas idéias foram a concepção de
ressocialização, que traz como propostas de prevenção a punição e recuperação dos
indivíduos que cometiam atos infracionais.
Faustino (2008) refere-se à prisão de Auburn surgida no séc. XIX, para
exemplificar o uso da mão de obra carcerária no trabalho dentro das prisões. Nesse
sistema, era estabelecida uma rotina de trabalho e silêncio diurno e recolhimento para
descanso noturno. A dinâmica estabelecida por essas prisões possuía motivações,
também econômicas, oportunizando a exploração de uma mão de obra bastante
rentável, por estar organizada coletivamente substituindo a produção de grandes
máquinas industriais. Todavia, a pena não possuía somente um caráter econômico.
É importante ressalvar que Faustino (2008) refere-se a Foucault (1987) para
evidenciar a finalidade política da pena no sistema capitalista. Nas prisões, era exercido
um modo de controle coercitivo que além de recuperar os indivíduos para inserção
social através do trabalho, pretendia também discipliná-los a fim de torná-los dóceis e
subjugados aos padrões morais e obedientes as exigências impostas por tal sistema.
Com a disciplina estabelecida e fomentada pelo poder de controle existente nas penas
de prisão, os indivíduos tornar-se-iam aptos a aceitar a dominação e a exploração de
81
modo mais passivo, como se corpo e alma fossem disciplinados dentro do ambiente
prisional.
Nesse sentido Faustino expõe que:
Como se observa, Foucault chama à atenção para o duplo objetivo intento na
disciplina. Por um lado, a utilidade dos corpos no sentido de produzirem mais e
em melhores condições de disciplina/ eficácia, atendendo ao propósito de
acumulação capitalista e, por outro, a docilidade no sentido político, para aceitar
a ordem estabelecida, sustentando, assim a hierarquia social e o comando por
parte da classe dominante (...). (FAUSTINO, 2008, p.36)
Ainda no que concerne à disciplina, faz-se necessário esclarecer que é utilizada
como modo de controle em todas as instituições capitalistas, não ficando restrita
somente às prisões, pois possui mecanismos punitivos que colocam os indivíduos aptos
a participarem das relações de produção. A disciplina e a preparação para o trabalho
faziam, então, parte de um processo de reforma dos infratores vislumbrando seu
retorno à sociedade. No contexto de reforma individual, Faustino (2008, p.37) entende
que o objetivo das prisões era o de: “(...) defender e proteger a sociedade contra
aqueles que violaram o pacto social e, para isso, era necessário efetuar uma reforma
sobre o condenado, tornando-o, assim, apto a retornar a sociedade, obedecendo às
normas sociais instituídas”.
As mudanças que se seguem com a passagem do período humanista para o
criminológico encontram-se apenas no entendimento das motivações individuais para o
cometimento do crime. No período humanista, acreditava-se que o individuo cometia
suas infrações devido as suas escolhas por ser um ser livre e consciente. Já no período
criminológico, devido às fortes influências sofridas pelas escolas positivistas, entendiase que o individuo infrator era possuidor de anomalias psicológicas adquiridas durante a
fase do desenvolvimento de sua personalidade, fazendo com que a recuperação do
condenado assumisse a conotação de cura (FAUSTINO, 2008).
A nova conotação dada à palavra recuperação faz com que as prisões sejam
concebidas como espaços onde o individuo seja tratado para retornar ‘curado’ à
sociedade. Diante desse novo contexto, surge a necessidade da equipe interdisciplinar
de médicos, psicólogos, assistentes sociais para diagnosticar e subsidiar o tratamento
dos indivíduos presos a fim de recuperá-los para o convívio social (Faustino, 2008).
82
Faustino esclarece que:
Seguindo a direção da criminologia tradicional, do século XIX até os dias atuais
a recuperação do condenado, agora recebendo denominações como
ressocialização, reabilitação, reeducação e outras, são sinônimas de uma
reforma moral a ser realizada sobre o indivíduo (...) é isto que está na base do
sistema progressivo de cumprimento de pena que surge no séc. XIX e que é
adotado ainda nos dias atuais no Brasil e em vários outros países (...)
(FAUSTINO, 2008, p.38).
No Brasil, a prisão como espaço de cumprimento da pena privativa de liberdade
se desenvolveu de forma parecida com as do restante da Europa, visto que o Brasil
sofreu grande influência desse continente no que tange a execução de suas penas.
Isso ocorreu principalmente após a vinda da colônia portuguesa para o país. No
entanto, até a adoção do regime progressista vale ressaltar alguns pontos relevantes de
modificação (FAUSTINO, 2008).
É relevante destacar tais questões por que como explica Araújo (2007, p.1): “o
caos das prisões brasileiras não começou a duas ou três décadas atrás. È um processo
de deterioração que nasceu – ironicamente – junto com o sistema prisional do país (...)”,
ou seja, os problemas existentes no sistema prisional atual são o produto do modo
como as prisões se desenvolveram historicamente.
Após a chegada da família real Portuguesa ao Brasil, várias pessoas viram-se
obrigadas a ceder seus espaços para a acomodação das pessoas que foram trazidas
de Portugal junto com eles. Os espaços iam desde algumas residências particulares,
espaços públicos como os da câmara de vereadores, a igreja e a cadeia pública.
Ocorre que com a ocupação das cadeias, os presos que aguardavam suas punições
precisaram ser removidos para outro local. O espaço encontrado para alojar os presos
foi à cadeia de Aljub (Araújo, 2007).
Faustino (2008) cita Carvalho Filho (2002) para explicar que a prisão de Aljub era
um local utilizado para punir religiosos transgressores das normas da igreja. Porém,
com a chegada dos portugueses, este local passou a ser utilizado por todos os
infratores.
83
Araújo (2007) considera que a transferência de presos para Aljub inicia
mudanças significativas no sistema prisional. Em decorrência da chegada dos
portugueses, o número de crimes e de infratores aumentou substancialmente, fora os
escravos que fugiam e eram capturados. Todos esses infratores eram mandados para
Auljub, fazendo com que a cadeia ficasse superlotada e com as piores condições
possíveis de alojar qualquer individuo. Após as constatações das péssimas condições
de vida em que se encontravam os indivíduos presos em Auljub, inicia-se a
preocupação com um modelo que substituísse a referente prisão.
É importante destacar que as prisões brasileiras surgiram durante as ordenações
Filipinas e se manteve com estrutura e dinâmicas referentes às prisões de Aljub, até o
referido modelo prisional começar a sofre influências das idéias iluministas e
humanitárias. Faustino (2008) utiliza Nogueira (2006) para explicar que com a influência
dessas idéias as ordenações Filipinas foram suspensas devido a um processo de
introdução de novas idéias pautadas em preocupações com a situação do preso e da
personificação da pena. Faustino (2008) também descreve que nesse mesmo
processo, surge em 16 de novembro de 1830, sancionada por Dom Pedro I, o Código
Criminal do Império do Brasil e a constituição da pena como privação de liberdade.
Ocorrem, porém, criticas ao novo código. Faustino (2008) cita Costa (2006) para
explicar que as criticas foram atribuídas ao fato do código não estipular ações
diferenciadas a cada infrator (individualização da pena), por priorizar os crimes de
cunho religioso e por manter a pena de morte e outros tipos de penas acessórias.
Apesar disso, havia de se considerar as mudanças significativas no tratamento dos
presos e na estrutura física das prisões.
Faustino (2008) destaca a inclusão do trabalho dentro das prisões como um dos
pontos mais significativos de mudanças ocorridas através da vigência do novo código.
Foram construídas casas de correção onde à execução do trabalho pelos presos
baseava-se no sistema auburniano.
Araújo (2007) explica que as casas de correção foram construídas para atingir as
exigências do novo código, principalmente no que tange a inserção do trabalho dentro
das prisões, pois de acordo com a autora, os estabelecimentos prisionais disponíveis
até então, não ofereciam estrutura e condições necessárias para o cumprimento da
84
pena com o trabalho. Até que as casas de correção fossem construídas, ficou
determinado que as penas cumpridas fossem as penas simples (sem inserção de
trabalho).
No período de implantação do código criminal de 1830 até a construção das
casas de correção, houve inúmeras discussões entre médicos, juízes, senadores,
dentre outras autoridades, sobre o modelo de sistema prisional mais adequado para o
Brasil. A dúvida que se tinha era sobre o propósito da pena, ou seja, se esta deveria
recuperar ou punir o infrator. Foram então analisados os sistemas de Auburn e o
pensilvânico. Ambos baseavam-se no trabalho silencioso e na obediência, porém o
trabalho no sistema pensilvânico se caracterizava por serem manuais e realizados
dentro de celas individuais (ARAÚJO, 2007).
Araújo (2007) conta que a opção feita foi o sistema de Auburn, porém o
cumprimento da pena por escravos demandou que algumas adequações fossem
realizadas. Essas e outras diferenças entre o Brasil e os outros países da Europa
fizeram com que o ministro da justiça da época, Euzébio de Queiroz, não estivesse
muito certo sobre a escolha do atual sistema de Auburn, chegando a afirmar que o
tempo deveria decidir entre este ou o modelo pensilvânico. Realmente, com o tempo
foi decidido através de uma análise feita por uma comissão de autoridades
responsáveis, direta e indiretamente, pela aplicação das penas e pelos espaços
prisionais a elas correspondentes, que o próximo ambiente construído deveria adotar o
modelo pensilvânico.
Outro ponto importante apontado tanto por Faustino (2008) quanto por Araújo
(2007), refere-se ao fato de as casas de correção receberem todos os tipos de
infratores, sendo que não havia separação entre tipos de crime e nem separação entre
os presos maiores e menores de idade. Para Faustino (2008, p.51) isso demonstra: “(...)
características próprias de um país escravista e repressivo.
Araújo (2007) aponta que as primeiras considerações sobre mudanças a serem
feitas no código criminal de 1830 são apontadas pelo médico Luiz Vianna de Almeida
Valle, quando este assume a direção da casa de correção. O médico foi o primeiro a
considerar o infrator como portador de enfermidade concernente a distúrbios de
personalidade. Atreladas as suas concepções médicas estavam fortes idéias
85
humanistas que faziam com que tratasse o preso atendendo necessidades
anteriormente ignoradas. Devido a essas concepções, inaugurou bibliotecas e escolas
para ensinar as primeiras letras aos presos sob sua custódia. A partir de 1876, ele
propôs em um relatório, mudanças concernentes na administração do ambiente
prisional, como também no código criminal.
Faustino (2008) cita Carvalho Filho (2002) para afirmar que o surgimento de um
novo código penal ocorreu em 1890, o qual se baseava em idéias humanistas e
positivistas. No novo código houve a abolição parcial das penas acessórias. Faustino
(2008) também recorre às explicações de Salla (1999) para afirmar que, no mesmo
período, o Brasil sofre grandes influências dos Estados Unidos, passando a atribuir as
causas do crime a fatores biopsicossocias, fazendo com que ciência e razão se
associem para subsidiar o tratamento do infrator nas prisões. Fato que também causa
mudanças significativas no código de 1890.
Faustino (2008) fala que em 1940, durante a era Vargas, o código sofre mais
uma vez, transformações significativas. A adoção de um novo código baseado em
punições e repressões severas objetivando, principalmente, a retaliação de todos os
inimigos do governo, traz conseqüências bastante caóticas para o sistema prisional da
época. Nas palavras de Faustino (2003) parafraseando Pinto (2006):
(...) a realidade carcerária, nesse momento da história, de acordo com Pinto
(2006, p.1003), constitui-se em um aspecto muito importante devido ao
radicalismo penal imposto pela política criminal desta época (...) em 1975, a
superlotação, as condições precárias de vida nas prisões, entre outros
problemas, levou a instauração de uma comissão parlamentar de inquérito, que
tinha como objetivo avaliar o estado dos presídios brasileiros (...) (FAUSTINO
2003, p. 53).
A partir das apurações feitas por essa comissão, houve a reforma do código
penal, tendo em vista preocupações com os direitos do encarcerado. Porém a mais
significativa reforma do código de 1940 ocorreu em 1984. Faustino (2008) utiliza-se das
palavras de Canto (2000) para destacar que a reforma do código, em 1984, aboliu
totalmente as penas acessórias além de voltar-se para a reabilitação dos presos. Nesse
período também surge a Lei de execuções penais. A lei de execução penal (LEP) é um
86
texto bastante atual que possui leis que garantem os direitos mais importantes do
preso. Ao citar Mirabete (2000) Faustino (2008) afirma que:
A LEP é uma obra extremamente moderna de legislação; reconhece um
respeito saudável aos direitos dos presos e contém várias provisões ordenando
tratamento individualizado, protegendo os direitos substantivos e processuais
dos presos e garantindo assistência médica, jurídica, educacional, social,
religiosa e material. Vista como um todo, o foco dessa lei não é a punição, mas,
ao invés disso, a ‘ressocialização das pessoas condenadas. (MIRABETE (200)
apud FAUSTINO (2008) p. 58).
Como exposto acima, o principal foco da LEP é a ressocialização do condenado.
A partir daí, são criadas várias ações visando à integração social, dentre elas, a
progressão de regime por bom comportamento e individualização da pena. Porém,
apesar das reformas ocorridas no código penal, Araújo (2007) não acredita que a
situação das prisões possa vir a mudar, pois como observa a autora, as prisões
continuam apresentando as mesmas condições caóticas de outrora, a saber, a
superlotação, as más condições de higiene e de saúde.
Esteves (2002) também considera caótica a situação atual do sistema prisional
brasileiro e refere-se a uma incoerência entre o ideal prescrito pela lei e a triste
realidade enfrentada pelo preso dentro das unidades prisionais. Para se constatar essa
realidade é necessária somente uma visita às várias unidades prisionais onde se
podem notar as más condições referentes à falta de espaço físico adequado, além da
falta de condições de preservação da integridade física e moral do preso. Apesar de
isto estar previsto na lei, o que se observa é que:
(...) não raras vezes vemos a utilização de cadeias servindo para o
cumprimento de pena, quando isso não é permitido; assim sendo, diante da
atual crise do sistema penitenciário, caracterizado se apresenta todo o
desvirtuamento da noção de legal e ilegal, não importando os meios a serem
utilizados para efetivar o cumprimento da pena pelo condenado, que é obrigado
a viver em cubículos, sem respeito a qualquer direito que lhe é garantido por lei,
como por exemplo, o de praticar qualquer trabalho que poderia abater sua
pena, na forma da LEP. (ESTEVES, 2002, p.1)
Pode-se perceber, de acordo com a afirmação acima que as únicas mudanças
ocorridas encontram-se na reforma dos textos penais, sendo que, praticamente nada foi
87
alterado em relação à execução dessas penas. É o que demonstram os resultados do
censo penitenciário brasileiro, no ano de 1996, publicado pela revista Veja citado por
Magnabosco (2008, pág.1), o qual demonstra o tratamento desumano recebido pelos
presos, além da ineficácia desse sistema:
•
O país tem hoje 150.000 presos, 15% a mais do que em 1994, data em que fora
realizada a última pesquisa;
•
A massa carcerária cresce ao ritmo de um preso a cada trinta minutos;
•
A AIDS prolifera entre os detentos com a rapidez de uma peste. Cerca de 10% a
20% dos presos estão contaminados. Um número tão assustador que o governo
evita divulgá-lo para não provocar rebeliões;
•
48.4% dos seqüestradores presos estão no Rio de Janeiro - RJ;
•
Os homens representam 95.5% da massa carcerária, e a maioria cumpre pena
por assalto, furto ou tráfico de drogas;
•
Hoje existem 50.000 - homens e mulheres - estão confinados irregularmente em
celas de delegacias e cadeias públicas;
•
Há outro tipo de prisão irregular no Brasil, mas o censo não tabulou, são aquelas
pessoas que já deveriam ser libertadas embora continuem presas;
•
Uma pesquisa realizada em 1964 demonstra-nos que 90% dos ex-detentos
pesquisados procuram trabalho nos 02 primeiros meses, após a conquista da
liberdade. Depois de encontrarem fechadas todas as portas, voltaram a praticar
novos delitos. Estudos mostram que, em média, 70% daqueles que saem das
cadeias, reincidem no crime.
Malaquias (1999) também denuncia a falta de compatibilidade existente entre a
lei e a prática penal no Brasil. De acordo com o autor, a LEP se norteia através de três
pontos principais para direcionar a execução das penas: a punição, a recuperação e a
ressocialização. Porém, como observa o autor, na prática as prisões utilizam-se
somente do castigo e da punição com os presos, ferindo-lhes e violando-os em seus
direitos fundamentais. Outro ponto importante refere-se às condições físicas das
88
prisões, estes são locais fétidos e imundos, assemelhando-se a verdadeiros cativeiros,
onde não possuem condições de abrigar nem mesmo outras espécies de animais.
Rodrigues, Pimentel e Pesente (2008) destacam pontos importantes levantados
por Catania (1999) sobre os efeitos da punição a fim de demonstrar a incoerência
existente em um sistema prisional que se utiliza da punição para instalar
comportamentos adaptativos. Os efeitos considerados foram: a punição gera respostas
emocionais, incompatíveis e contracontrole. A demonstração de tais efeitos sustenta a
lógica de que ao invés de indivíduos ressocializados, o ambiente prisional produz
neuroses, isolamento social, rigidez intelectuais e sujeitos embrutecidos com forte
potencial para contra-agredir.
Ocorre que, por mais que se saiba sobre a atual falência do sistema prisional, a
postura corretiva e punitiva continua em razão da supressão imediata, apesar de não
permanente do comportamento, e a despeito das dificuldades em investir na
investigação de alternativas, como por exemplo, o manejo das várias técnicas de
reforçamento positivo que são mais trabalhosas e possui efeitos que serão sentidos
somente em longo prazo (Rodrigues, Pimentel e Pesente, 2008).
Com o propósito de denunciar as condições atuais sofridas pelos presos nos
cárceres e propor algumas possíveis soluções, foi feito um relatório pela comissão de
direitos humanos e minorias, câmara dos deputados em parceria com a pastoral
carcerária-CNBB (2006), sobre a situação do sistema prisional brasileiro. No relatório,
há inferências sobre o momento de crise vivenciada pelo atual sistema e que culmina
em rebeliões que acabam por extrapolar os muros dessas prisões. Isso ocorre porque
quanto mais são agredidos em seus direitos, mais a população carcerária e as
populações ligadas a eles, acirram seu ódio e rebelam-se para protestar contra os
inúmeros maus–tratos e privações sofridos dentro dos cárceres brasileiros e pelo
tratamento violento e desigual que sofrem da polícia (GREENHALGH, 2006).
De acordo com Greenhalgh (2006) essas são as possíveis causas da rebelião
mobilizada pelo PCC4 no estado de São Paulo no final do maio deste ano. O PCC é um
dos exemplos de organização que se forma entre presos e que consegue mobilizar
4
PCC -
89
rebeliões fora do presídio. Na rebelião de maio, O PCC foi o responsável pela onda de
violência que aconteceu na cidade, a qual deixou mais ou menos 500 mortos.
Seguindo a mesma linha de raciocínio de Greenhalgh (2006), Malaquias (1999)
expõe que a violação de direitos fundamentais dos presos fomenta as organizações
criminosas dentro dos presídios. Somada a essas observações, o autor acrescenta
ainda que, as violações não mobilizam somente organizações criminosas, mas também
fomentam a organização política de grupos de presos que reinvidicam seus direitos de
forma consciente, exercendo pressões saudáveis para a melhoria das condições de
vida do preso.
Porém Malaquias (1999) levanta um ponto importante sobre as rebeliões
comandadas por organizações criminosas dentro das penitenciárias e cadeias
brasileiras. Na opinião do autor, a estratégia militar de colocar presos políticos com
presos comuns, fez com que os presos comuns se identificassem com os presos
políticos no que se refere às suas idéias de coletividade e reinvidicações em grupo,
como também em suas noções de estratégias de guerrilhas urbanas. Os presos
identificados com noções de coletividade e reinvidicações saudáveis tendem a se
agrupar por um viés do diálogo e da conscientização sobre seus problemas. Por sua
vez, presos influenciados pela organização e pelas estratégias de guerrilha, tendem a
formar facções criminosas a fim de conseguir o que desejam junto ao estado. Já para
Rodrigues, Pimentel e Pesente (2008) as rebeliões são apenas mais um dos
comportamentos que surgem em razão dos efeitos colaterais da punição.
Sobre a questão do comportamento do grupo dentro no ambiente social das
prisões, Rodrigues, Pimentel e Pesente (2008) consideram que os presos criam uma
série de comportamentos adaptativos que se tornam reforçadores dentro das prisões,
sendo que tais comportamentos são estratégias de fuga-esquiva ou ataque aos maus
tratos e privações sofridos no ambiente prisional. Desse modo, as rebeliões podem ser
entendidas como forma de contracontrolar agressivamente as agressões sofridas.
Magnabosco (1998) também atribui as causas da rebelião às condições
degradantes à que são submetidos os presos no ambiente prisional. A autora ressalta
que essas más condições geram conflito e revolta por parte dos presos fazendo com
que estes se reúnam para reivindicar melhores condições de vida dentro dos cárceres.
90
Nessas reinvidicações, os presos brigam com carcereiros e com outros presos, fazem
reféns e exigências para soltá-los, dentre outras ações.
Nas considerações de Esteves (2002), o estado de privação e violência sofrida
pelos presos antecede a entrada deles nas prisões. Pertencentes às camadas mais
baixas da população, esses indivíduos são privados de uma série de necessidades
materiais e, por essa razão, passam a viver à margem da sociedade. Sem oportunidade
de alimentação ou acesso à educação, muitos desses indivíduos optam pela
criminalidade, pois não aprendem valores necessários ao convívio em sociedade. A
autora ressalta que nem todas as pessoas pertencentes às classes mais baixas optam
pela criminalidade. Entretanto, a maioria dos indivíduos custodiados pelo sistema
prisional pertence a essa camada da população.
Outro ponto relevante apontado por Esteves (2002) refere-se às motivações
pertencentes aos jovens que optam pela criminalidade. Segundo Esteves, os jovens
infratores se sentem poderosos com os crimes que cometem e não demonstram
intimidação diante da possibilidade de prisão ou cumprimento de pena. Para Velho
(1996) isso ocorre por estes jovens não possuírem condições de suprir suas
necessidades básicas, assim como os bens publicizados pela mídia na sociedade de
consumo (fator que os torna excluídos). Então, esses sentem que possuem um ‘lugar’
na sociedade através do status social que obtêm com o crime. Esse status refere-se à
divulgação do crime pela mídia e ao sucesso com as garotas.
A partir da percepção dos ganhos com a criminalidade, tendo em vista que tais
ganhos tornam a possibilidade de prisão pouco intimidadora para esses jovens, faz-se
necessário considerar uma das primeiras observações feitas por Greenhalgh sobre os
limites do sistema prisional no exercício de sua função:
A premissa inicial na busca de soluções é ter clareza dos limites do papel do
sistema prisional. Ações no ambiente interno desse sistema são necessárias,
mas insuficientes para dar conta do imenso desafio. É preciso investir mais no
enfrentamento das causas e menos nas conseqüências do ato criminal. Sabese que construir uma escola sempre evitará a construção de muitas prisões.
Assim, a perspectiva de construir mais e mais cárceres deve ser substituída
pela decisão de atuar prioritariamente na prevenção do crime e na aplicação de
penas alternativas. (GREENHALGH, 2006, p. 5).
91
Nota-se diante do exposto, que o trabalho de prevenção possui maior eficácia do
que os investimentos na recuperação realizada nas prisões, uma vez que a questão da
criminalidade é muito mais abrangente do que se imagina, entretanto, ganhos viriam em
longo prazo. Sidman (1995) considera, por exemplo, que a falta de acesso aos
reforçadores básicos vivenciados pelas camadas mais baixas da população, dentre eles
a educação, faz com que esses indivíduos desenvolvam um repertório comportamental
empobrecido, sendo incapazes de discriminar entre várias alternativas de conseguir
outros reforçadores que desejam. A única forma que lhes ocorre de conseguirem o que
desejam é tirando de outras pessoas. Nesse sentido, Greenhalgh (2006) afirma que
quem constrói uma escola acaba evitando a construção de muitas prisões.
Todavia, em se tratando daqueles que já estão nas prisões, Greenhalgh (2006,
p.5) acredita que: “a outra premissa é ter o princípio da dignidade humana como
condição indispensável para que o sistema prisional exerça sua função (...)”. Dessa
forma, o objetivo é fazer com que esses indivíduos cumpram suas penas gozando dos
direitos garantidos pela lei de execuções penais, tais como assistência médica, jurídica,
remissão de pena através do trabalho, dentre outros, com a finalidade de gerar
condições para a reintegração social daqueles que se encontrarem na condição de
egresso.
Talvez esses sejam os reforçadores positivos que, de acordo com, Rodrigues,
Pimentel e Pesente (2008) necessitem ser identificados como contingentes aos
comportamentos de indivíduos em situação prisional. De acordo com os autores, as
prisões fracassam, justamente, por possuírem excesso de reforçadores negativos em
detrimento de poucos reforçadores positivos.
Para Malaquias (2008) a falta de aplicação da lei de execuções penais no
tocante às ações direcionadas para a reintegração social acarreta a reincidência
criminal da maioria dos egressos. Estatisticamente falando, os índices de reincidência
ficam em torno de 70 a 85 por cento dos casos.
Rodrigues, Pimentel e Pesente sugerem que tais ações poderiam ser
administradas da seguinte maneira:
(...) a escolha de tarefas que abonem dias de prisão e ainda provêem renda
para a família dos presos; b) realização inicial dos procedimentos de extinção
92
em vez do uso indiscriminado da punição, tendo as respostas inadequadas
ausência de reforçamento no contexto penitenciário; c) reforçar
diferencialmente comportamentos adequados com benefícios diretos e
contingentes sobre tais respostas; e finalmente d) aumentar por um aumento da
densidade de reforços para respostas alternativas – esse procedimento
consiste e não utilizar a extinção, mas reforçar com mais freqüência
comportamentos alternativos e com menos freqüência os indesejáveis (...).
(PESENTE; PIMENTEL; RODRIGUES, 2008, p.7)
Sabe-se que tais ações não estão previstas na LEP de forma direta, entretanto
elas são as possíveis contribuições que a psicologia experimental pode oferecer para a
efetiva ressocialização do preso. Para Rodrigues, Pimentel e Pesente (2008) a
psicologia experimental é uma área que possui pouco conhecimento para intervir na
realidade penal, também sabe-se que a punição faz parte do processo histórico
evolutivo dos indivíduos tornando-a impossível de ser eliminada. Porém, havendo a
necessária experimentação da psicologia nas prisões, pode-se conseguir utilizar o
controle coercitivo de forma adequada, além de utilizar-se de técnicas de controle mais
eficazes na eliminação dos comportamentos socialmente indesejáveis.
Greenhalgh (2006) acredita que enquanto se continuar investindo em soluções
mais repressoras, como é o caso do endurecimento das penas ou da redução da
maioridade penal, ou mesmo das mais variadas formas de castigo cruéis impostas aos
presos se continuará testemunhando o caos prisional como o que ocorre no estado de
São Paulo, que é considerado o estado com a política prisional mais repressora do
Brasil.
Por fim, nesse ponto da discussão fica claro que se faz necessário uma
modificação das práticas de segurança pública no Brasil. É o que afirma Lima (2007)
quando cita Biglan (1995 apud MARTINELLI E CHEQUER, 2006) quando parte do
pressuposto de que a criminalidade é uma prática cultural e que só pode ser combatida
através da criação de meios para a modificação das mesmas. Para tanto, se faz
necessário compreender o contexto de ocorrências, permanência e modificação dessas
práticas, sem deixar de considerar os fatores que determinam o comportamento
individual.
Lima
(2007)
evidencia
ainda
que
a
criminalidade
se
relacione
ao
enfraquecimento dos modos de controles predominantes nas interações sociais, a
93
saber, o controle coercitivo e o controle positivo. Ficando claro, mais uma vez, a
necessidade de mudança.
Nesse sentido é que se faz necessário compreender o comportamento praticado
comumente pelos indivíduos o qual fomenta a criminalidade. De acordo com Lima:
A análise das práticas culturais seria útil não só no estudo do comportamento
criminoso, mas também no estudo do comportamento das vítimas da violência
criminal. Até por que os padrões de comportamento dos criminosos estão
estreitamente ligados aos padrões de comportamento das vítimas (LIMA, 2007,
p.6).
Pode-se concluir diante do exposto que tal análise fomenta ações de cunho
preventivo que, por sua vez, podem levar a diminuição da necessidade de
encarceramento, pois, ações preventivas evitariam muitas situações de criminalidade e
reduziriam os danos causados por ela. Assim explica Lima (2007) ao citar a afirmação
feita por soares (2006), que por mais que o problema não seja sanado devido ao fato
de possuir múltiplos fatores, as medidas preventivas podem oportunizar novas práticas
que levam a redução da criminalidade, pois levam em consideração e buscam soluções
para muitos dos problemas que desencadeiam ações violentas como é o caso do crime.
94
OBJETIVO
Geral:
Analisar o uso de práticas coercitivas no ambiente prisional dentro da perspectiva da
análise do comportamento, baseado da obra literária “Estação Carandiru”.
Específicos:
•
Levantar asserções representativas das práticas coercitivas no ambiente
prisional;
•
Agrupar as asserções a partir das regras para análise da coerção descritas por
Sidman (1995) e abordadas por Andery e Sério (1997);
•
Analisar as asserções a partir das regras propostas.
95
Método
FONTE:
A obra utilizada neste estudo para investigação do sistema prisional e uso da
coerção será “Estação Carandiru”, de Drauzio Varella. O livro foi originalmente
publicado no ano de 1999, sendo utilizada a 16ª edição publicada no ano 2001.
PROCEDIMENTO/PLANO DE ANÁLISE DOS DADOS:
Procedeu-se à leitura do livro, em um primeiro momento, buscando conhecer o
material escrito na íntegra e uma familiarização com o tema.
Foi feita uma segunda leitura, buscando identificar passagens do texto que
retratam o cotidiano e relações ocorridas no ambiente da prisão, tendo asserções
descritas pelo autor como a fonte de dados para agrupamento em categorias e subcategorias pré-definidas, baseadas na análise da coerção proposta por Sidman (1995)
e descritas por Andery e Sério (1997).
As categorias utilizadas na análise foram: difusão da violência, os efeitos da
violência e motivações para o crime. Entende-se como difusão da violência o uso
indiscriminado da coerção nas relações sociais (ambiente social) e nas relações entre
os indivíduos e a natureza (ambiente físico). Entendem-se como os efeitos da violência
os produtos comportamentais gerados pela exposição às contingências aversivas, que
são expressas no presente estudo em forma de regras, sendo elas: “ a violência é muito
freqüente e faz parte do nosso cotidiano; como conseqüência nos acostumamos com
ela”; “o uso da violência acarreta mais violência”; “o uso de violência faz com que tudo
tome a feição de violência”; “uso da violência produz um ser humano impotente diante
dela”; sob controle aversivo, comportamentos supersticiosos tornam-se muito
prováveis”; e, “quando nenhuma forma de fuga-esquiva for possível, só nos restará fugir
de nós mesmos”. Entende-se motivações para o crime, ações praticadas como
conseqüência de exploração e privação social, .Cada uma das categorias foi ainda
dividida em subcategorias, conforme apresentadas no quadro abaixo (quadro 1). Cada
96
uma das categorias e subcategorias descreve regras extraídas de estudos sobre
punição, ou, como no caso das motivações para o crime, que foi acrescentado como
categoria de análise para verificar motivos expostos para a realização do delito que
tenha levado ao aprisionamento, conforme descrição dos detentos descreve regras de
comportamento extraídas de estudos sobre a privação e a exploração.
Ao levantamento das asserções representativas da regras – grupos, categorias e
subcategorias, passaram-se à descrição da definição de cada uma delas e posterior
leitura e comparação com o material selecionado no livro Estação Carandiru
(VARELLA, 1999) (quadro 1). A título de organização da análise descreveu-se as
unidades de análise conforme aquelas apresentadas por Andery e Sério (1997), assim
distribuídas para análise: grupo (G), categoria (C), subcategoria (S), definição da
subcategoria (D); asserções identificadas (A) e análise (An). Foi ainda incluído o grupo
“Motivações para o crime”.
Quadro 1. Categorias e sub-categorias para análise da coerção
GRUPO (G)
CATEGORIAS (C)
1.Difusão da
violência
1.1.“a violência é muito
freqüente e faz parte do
nosso cotidiano; como
conseqüência nos
acostumamos com ela”
2.Os efeitos da
violência
2.1.“o uso da violência
acarreta mais violência”
2.2.“O uso da violência
faz com que tudo tome a
feição de violência”
SUB-CATEGORIAS
(SC)
DEFINIÇÃO (D)
O controle aversivo é predominante nas
relações entre os seres humanos e entre
esses seres e a natureza fazendo com
que acreditem não haver outras formas
possíveis de interação, como
conseqüência existe, atualmente uma
banalização da violência.
Isso ocorre porque o efeito da
estimulação aversiva é temporário, pois
compete com outras conseqüências. Para
que se mantenha é preciso que o
estímulo aversivo seja apresentado
sempre com mais intensidade; Além
disso, ele gera um contracontrole
geralmente aversivo.
O uso freqüente de estimulação aversiva
faz com que o ambiente se transforme em
algo aversivo, devido ao fato de tornar
aversivos os estímulos neutros e
reforçadores positivos que estão
presentes naquele ambiente.
97
2.3.1. “Ignorando
tudo o que acontece”
2.3.“o uso da violência
produz um ser humano
impotente diante da
violência”
2.3.2. “Desistindo do
que está a nossa
volta”
2.3.3. “Buscando
destruir, se
pudermos as fontes
de coerção”
2.4.1. “Sob controle
aversivo, não
podemos deixar de
estar vigilantes”
2.4. “O uso da violência
torna-nos sujeitos
amargos, vivendo uma
vida amarga”
3.Motivações
para o crime
2.4.2. “Sob controle
aversivo, não
exploramos o
mundo”
2.4.3. “Sob controle
aversivo, só
conseguimos dar
conta de uma rotina
pré-estabelecida”
O indivíduo se insenta de participação
política, profissional e social, ou seja, não
participa da vida da comunidade,
tendendo a fugir ou esquiva-se dela.
O individuo tende a fugir de tudo ou todos
que o controlam aversivamente,
O individuo age atacando a fonte de
coerção com a intenção de fugir ou
esquivar-se dela
O individuo assume uma posição onde
seus únicos comportamentos são aqueles
que o possibilitam de fugir ou evitar a
coerção, impedindo-o de aprender
comportamentos que não tenham relação
com o medo.
Sobre o efeito da estimulação aversiva os
indivíduos temem explorar o mundo e
ficam com um repertório comportamental
bastante limitado.
Os indivíduos tornam seus
comportamentos estereotipados e
compulsivos, pois temem variar o
comportamento que os livra do perigo.
2.5. “Sob controle
aversivo,
comportamentos
supersticiosos tornam-se
muito prováveis”
O individuo sujeito a controle aversivo
não emite comportamentos alternativos
as situações ocorridas, como
conseqüência, as contingências
incidentais se fortalecem gerando
comportamentos supersticiosos.
2.6. “Quando nenhuma
forma de fuga-esquiva
for possível só nos
restará fugir de nós
mesmos”
O individuo apela para o suicídio como a
única alternativa de fuga e esquiva que
ainda lhe é possível.
Pessoas privadas de reforçadores
básicos tendem a tentar consegui-los
tirando de outras pessoas. Além disso, a
falta de acesso a diversos reforçadores
gera a revolta e a agressão.(Sidman,
1995)
98
Resultado
Para
todas
as
categorias
listadas
foi
possível
identificar
asserções
correspondentes. Chama a atenção pelas possibilidades de análise quando se tem uma
descrição tão ampla em termos de ambientes e práticas descritas. Verificou-se ainda
um texto que aborda o assunto de forma tão diversa, quando aos diferentes modos
possíveis
de
comportamento
emitidos
e
da
análise
e
entendimento
dos
comportamentos individuais e coletivos, regras e contingências existentes.
Abaixo segue as asserções identificadas por Andery e Sério (1997) que
apresentam duas categorias na análise da coerção. A primeira é descrita como difusão
da violência e a segunda os efeitos da violência. Como retratado abaixo, a primeira
categoria foi subdividida em uma única subcategoria, e a segunda foi subdividida em 7
subcategorias. Seguem abaixo a descrição das asserções, conforme o grupo (G),
categoria (C), subcategoria (S), definição da subcategoria (D); asserções identificadas
(A) e análise (An).
GRUPO 1: Difusão da violência
Categoria 1.1 – C1.1“a violência é muito freqüente e faz parte do nosso cotidiano;
como conseqüência nos acostumamos com ela”.
Definição 1.1 – D1.1 O controle aversivo é predominante nas relações entre os
seres humanos e entre esses seres e a natureza fazendo com que acreditem não
haver outras formas possíveis de interação, como conseqüência existe
atualmente uma banalização da violência.
Asserções – A1.1
- “Como um grupo tão pequeno de homens sem armas consegue controlar um presídio
daquele tamanho é um dos mistérios da cadeia (...) Reduzido à essência, o trabalho
dos carcereiros consiste em dividir a malandragem maquiavelicamente” (...). Pág. 112.
- “Se não for enérgico vira bagunça doutor. Aqui é tudo malandro, a maioria sem
ocupação a não ser ficar de olho numa vantagem. Se der moleza numa noite, na
seguinte o senhor não tranca mais ninguém”. Pág. 49.
99
- “Uma vez, seis detentos, seqüestraram um grupo de carcereiros na lavanderia, junto
ao pavilhão seis, para exigir transferência de presídio, procedimento que se tornou
rotina após o massacre do nove”. Pág.107.
- “O que segura uma cadeia doutor, é pau e bonde, o resto é bobagem. Acerta o cara e
transfere lá para a penitenciária de presidente veceslau, quase na divisa com o mato
grosso, pra ver se ele não volta mansinho”. Pág. 114.
- “Dadas às condições do presídio, é impossível acabar com as agressões, por que o
convívio com os ladrões, alguns funcionários se embrutecem de tal modo que não
enxergam alternativa para impor ordem”. Pág.115.
- O lema era pau e cela, mas existia respeito, de nossa parte e dos funcionários.
Andava sozinho pela cadeia inteira, na moral, todo mundo de mão para trás quando ele
passava, não dava mole pra nós e nem pra justiça, com ele tinha que cumprir a lei dos
dois lados. Pág.114.
- “Está bom, eu não mato o Ricardão filho da puta, mas ele vai ter que pagar com a
mesma moeda que fez na minha mulher. Vou subir nas costas dele!” Pág.162.
- Na época das palestras no cinema, conheci um assaltante e receptor de nome santão,
que uma certa vez se desentendeu com um amigo de infância e o matou por que ele o
chamou de zoreia. De fato, Santão havia nascido sem uma orelha, mas detestava o
apelido e tinha razão para isso. Pág.173.
- Seu nome era Kenedi Baptista dos Santos, porém todos o conheciam como Zé da
casa Verde. As gírias, o cantado da fala paulista, o jeito de parar com o corpo jogado
para trás, a disposição permanente para gozar os companheiros, tudo nele recendia
malandragem (...) Zé era casado com duas mulheres, Valda e Maria Luiza. Pág. 173.
- A Valda tem pele branca como a neve. É de uma família de bem, em Santana, que
nunca aceitou o nosso romance por causa da minha cor. Ele falou dela no baile, da pele
alva que contrastava com o preto da sua e dos filhos misturados que nasceriam lindos
cada um numa cor. Falou e foi esperá-la num fusca, que havia acabado de equipar com
dinheiro roubado. A espera não foi longa. Ela apareceu na janela do carro (...) Pararam
o fusca na porta do sobrado dos pais, em Santana, ela hesitante em fazê-lo entrar, ele
tentando convencê-la da honestidade de seus propósitos. Estavam nessa conversa
quando surgiu o rival na esquina, ainda com o uniforme de futebol disposto a cobrara a
ofensa. Zé não vacilou, desceu do carro e deu três tiros na direção do rapaz. O
zagueiro esquerdo saiu correndo, na pressa perdeu até um pé de chuteira. Zé,
persuasivo virou-se para a amada:
Amanhã, às oito, reúne teus pais e tuas irmãs que eu venho te pedir em casamento.
Esquece esse cara, se ele gostasse de você, enfrentava o perigo. Pág. 227 a 228.
- Surpreendidos furtando, os “ratos de xadrez”, como são chamados, apanham de pau
e faca. Chegam à enfermaria dizendo invariavelmente que caíram da escada,
ensangüentados, cabeça rachada, o corpo marcado de vergões e facadas superficiais,
especialmente na região glútea, castigo imposto quando se decide desmoralizar o
contraventor. Dessa forma, os ladrões tornam explicito que seu código penal é
implacável quando as vitimas são eles próprios.
100
Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão, só que quando agente pega é
problema. Pág. 43.
Análise – AN1.1
Como observado acima, o cotidiano das prisões caracteriza-se pelo uso
exacerbado da violência e de sua banalização. As relações agressivas iniciam-se com
as condições precárias de trabalho dos funcionários que recebem salários baixos e
trabalham desarmados, não conseguem controlar totalmente o presídio sendo
obrigados a delegar suas funções aos presos.
De acordo com Goffman (1996), uma das características das instituições totais
está no controle exercido por uma equipe dirigente que programa e controlam todas as
atividades e regras a serem seguidas por seus internos. No entanto, nas prisões, como
se pode constatar, as equipes dirigentes pouco conseguem fazer nesse sentido.
Apenas organizam os detentos nos pavilhões de acordo com seus crimes a fim de
facilitar o controle exercido pelas lideranças criminosas responsáveis pela ordem e pelo
cumprimento das regras de conduta criadas pelos próprios presos.
Guimaräes (1998) discute que a superlotação e a falta de carcereiros exercendo
somente a função de controlar os presos fazem com que haja um vácuo de poder que
acarreta em toda a sorte de violência que possa ser cometida por presos mais
perigosos contra presos vulneráveis.
Em algumas unidades prisionais, os carcereiros chegam a estar em uma
proporção de três para mais de 100 detentos. Os outros se encontram em atividades
administrativas ou em escoltas de presos que vão ao fórum. Ademais, existe uma
grande quantidade desses profissionais que estão em licença ou tirando férias.
A falta de profissionais faz com que os poucos carcereiros responsáveis pelo
controle dos presos quase não entrem em contato com eles e façam vista grossa aos
abusos e violências ocorridos nas celas e corredores os quais são responsáveis,
fazendo com que o vácuo existente no poder de controlar os presos seja preenchido
pelos próprios presos (GUIMARÃES, 1998).
No Carandiru, o controle exercido pelos presos dispõe de regras de
comportamento bastante rígidas e coercitivas. Elas prevêem punições extremamente
101
violentas que variam de surras e torturas até a morte fazendo com que o código penal
utilizado pelos presos se aproxime do primitivismo.
Dos funcionários aos detentos, todos acreditam que a única forma de combater a
violência é impondo mais respeito e ordem com surras e castigos severos, ou seja, com
mais violência. Constata-se isso com os trechos retirados do livro, onde constam as
afirmações feitas por carcereiros e por um preso antigo que apoiava a rigidez e a
repressão intensa no tratamento que um ex-diretor do presídio dispensava aos detentos
durante sua época. De acordo com eles: “O lema é pau e bonde”.
A afirmação acima demonstra claramente que eles não enxergam alternativas de
controle possível, para eles somente a violência e a crueldade dos castigos impostos
funcionam. Em concordância com a afirmação de Sidman (1995) nota-se que nos
cárceres, a única forma de controle existente consiste na retirada de reforçadores
positivos ou na apresentação de reforçadores negativos.
Sidman (1995) considera que a coerção seja a principal forma de controle
existente em todas as interações sociais. Para o autor, isso ocorre de tal modo a ponto
de fazer com que as pessoas não acreditem em outra forma possível de interação.
De
acordo
com
Sidman
(1995)
as
pessoas
aprendem
a
interagir
indiscriminadamente por meio de coerção devido às ameaças presentes no ambiente
natural, a saber, as catástrofes naturais, mudanças climáticas e outros perigos
existentes. Fato que faz com que considerem como algo natural o controle coercitivo e
não examinem outros modos de exercer controle uns sobre os outros.
Skinner (1972) afirma que durante o período de evolução os indivíduos tiveram
que escapar (fugir) de constantes ameaças naturais de modo que tais comportamentos
foram condicionados por tais ameaças compreendidas como reforço negativo. Em
razão do condicionamento obtido através das conseqüências desse reforço, tais
comportamentos passaram a ser comuns em situações semelhantes às situações
vivenciadas durante o período de evolução, estendendo-se às relações sociais.
Quando as relações sociais se estabelecem em um contexto de privação de
reforçadores básicos e exploração como no caso das populações mais carentes a
violência tende a se banalizar de modo ainda mais significativo, pois além do
contracontrole gerado pelo ódio ou revolta, essas pessoas não desenvolveram
102
repertórios comportamentais (habilidades alternativas) capazes de discriminar entre
outros meios de agir diante dos conflitos. (Sidman, 1995). E o que expressam os
trechos sobre o ladrão que matou o amigo de infância porque este gozou da sua orelha
defeituosa; do Marido traído que queria violentar o Ricardão de sua esposa e do ladrão
que matou seu rival na disputa pelo coração de uma moça que havia se apaixonado.
GRUPO 2: Os efeitos da violência
C. 2.1 O uso da violência acarreta mais violência
D.2.1 Isso ocorre porque o efeito da estimulação aversiva é temporário, pois
compete com outras conseqüências. Para que se mantenha, é preciso que o
estímulo aversivo seja apresentado sempre com mais intensidade; além disso,
ele gera um contracontrole geralmente aversivo.
A.2.1
- “A cadeia perversa a mente do sentenciado num tanto tal, que o cara está levando os
golpes e muitos que não têm nada a ver com a fita pegam carona na desgraça alheia e
soltam a faca também, só de maldade”. Pág.20.
- “Em briga de cadeia, doutor, a coisa passa de certo ponto, desanda, e ai só para
depois que morrer uma meia dúzia de uns três ou quatro”. Pág.282.
- No pavilhão oito, num xadrez coletivo de vinte e sete homens, no fundo, havia um
banheiro com um cano quase encostado à parede, através do qual escorria um fio de
água. Apesar da ginástica a que eram obrigados, ai daquele que não tomasse o banho
diário, mesmo no frio de junho. Os mais velhos cuidavam de impor essa obrigação aos
novatos. Pág. 39.
- Sem o proprietário estar lá você, não entra. Por mais intimidade que teja ou não teja.
É mancada grave! Já vi nego morrer por um pão. O cara tinha muita amizade com o
outro, fumou maconha, ficou com larica e entrou no xadrez enquanto o amigo estava no
fórum. Tinha dois pãezinhos; comeu um. O outro voltou e disse que tinha guardado o
pão para não ter que comer a janta fria. Pronto: De madrugada, matou ele dormindo.
Pág. 42.
- “Antigamente era pior. O calado da noite era quebrado por gritos que ecoavam na
cadeia inteira. Em seguida, o pessoal começava a bater caneca na grade. Já era: Podia
o funça vir buscar que alguém tinha sido estuprado”. Pág. 50.
103
- Certa vez, um estelionatário de bigodinho bateu na esposa durante a visita e os gritos
foram ouvidos nas celas vizinhas. A sorte do agressor foi um funcionário, minutos
depois, escutar três rapazes no pátio organizando um grupo para matar o arruaceiro
assim que terminasse a visita, e providenciar sua imediata transferência para o
amarelo, setor dos jurados de morte. A estratégia funcionou apenas em parte: Nas
primeiras horas da manhã seguinte, em pleno seguro, o valentão tomou duas facadas
(...). Pág.63.
- Cada um com sua faca, três presos do amarelo tinham agarrado o carcereiro:
É o seguinte, chefão: Reagiu morreu! (...) Em volta dos três formou-se uma
aglomeração de calça jeans. Impossível ver detalhes. Quando tudo acalmou, o
funcionário refém, branco como cera, fácies doloroso, saiu carregado pelos colegas,
com o pé direito fraturado de vingança. O mulato e o musculoso cheios de esquimose
foram embolados num carrinho de mão usado para transportar tachos de comida. O
descabelado, camisa em frangalhos, sangue escorrendo na fronte, olho direito fechado
por um inchaço vermelho, incapaz de dar dois passos em linha reta, vinha ao lado do
carrinho. Vendo-o, trôpego, na direção da enfermaria, um funcionário recém-chegado
na divinéia gritou:
Ainda consegue andar ladrão? Os colegas têm coração mole! Pág. 82.
- Uma vez oito passou o dia trancado, por causa de um boato de que estava sendo
cavado um túnel. Na tranca-represália, ninguém serve comida e o mau-humor cresce
no decorrer do dia. No final da tarde, quando seu Jesus, do alto de seus 120 quilos,
cruzou o pátio de um pavilhão, ouviu de uma janela; - Vai morrer se Jesus! - E você
não, malandro? Pág.114.
- De minha parte posso assegurar que a influência do meio está longe de ser
desprezível. Apesar de médico, diversas vezes tive vontade de bater em alguém na
cadeia, não por terem me faltado ao respeito, fato jamais ocorrido, mas pela revolta
diante da perversidade de um preso com o outro. Pág.116.
-Nessas situações, apesar da tensão estabelece-se um acordo de cavalheiros: Os
funcionários rendidos não reagem e os presos não abusam da violência, Para evitar
conseqüências posteriores. Naquele episódio, entretanto, tudo foi diferente, os
amotinados agrediram um dos reféns e roubaram dinheiro dos outros. Havia dois
faxineiros entre os amotinados (...) Nesse momento, com a perspicácia que os anos de
vida trazem para certas pessoas, seu Luiz, homem encorpado de óculos, postou-se
junto a aporta do camburão e dirigiu-se aos colegas cegos de ódio:
É o seguinte pessoal: o que esses caras aprontaram é inadmissível. Vamos quebrar
eles, mas vocês esperam até eu dar à primeira. Eu sou o diretor de disciplina, ninguém
bata antes de mim. Pág.165.
- A cadeia caiu no nosso poder. Digo nosso porque, naquela circunstância, nós está
tudo envolvido. Aí protestamos contra a nossa melhoria, que o ambiente já não vinha
do melhor, muitos manos querendo transferência, cara com a colônia assinada, pena
vencida, as visitas um pinguinho só, e já era. Pág. 284.
104
AN.2.1:
As interações sociais nos presídios são bastante conflituosas. Segundo Esteves
(2002), a situação do sistema prisional brasileiro é considerada caótica. Para se
constatar essa realidade é necessário somente uma visita às várias unidades prisionais
onde se podem notar as más condições referentes à falta de espaço físico adequado,
além da falta de condições de preservação da integridade física e moral do preso.
Além disso, apesar da LEP (Lei de Execuções Penais) prever além de punição,
medidas de recuperação e reintegração social, vê-se que somente a punição é utilizada
e de forma exacerbada. Ocorre que a punição tem efeitos danosos às interações
sociais. Um dos mais significativos é o contracontrole.
Pode-se exemplificar essa afirmação com os trechos destacados acima que
demonstram como ocorrem as brigas na cadeia. De acordo com os trechos: “A cadeia
perversa a mente do sentenciado num tanto tal, que o cara está levando os golpes e
muitos que não têm nada a ver com a fita pegam carona na desgraça alheia e soltam a
faca também, só de maldade. Pág.20”. “Em briga de cadeia, doutor, a coisa passa de
certo ponto, desanda, e ai só para depois que morrer uma meia dúzia de uns três ou
quatro. Pág.282”.
Esses trechos realçam a afirmação de Matos (1982/1981) sobre o aumento
considerável do contracontrole agressivo quando o controle por coerção ocorre com
grupos de indivíduos. Matos aponta um experimento onde foram colocados dois
animais em ambiente experimental. Um deles, ao receber um choque atacou o seu
companheiro sem que este necessariamente tivesse sido o acionador do choque. A
autora afirma diante dessas constatações que o controle aversivo tende a aumentar
consideravelmente a freqüência das respostas de agressão. Os experimentos
exemplificados pela autora também confirmam os trechos destacados acima quando se
verifica que os presos que nada tem a ver com a briga começam a agredir quem esta
apanhando.
Os trechos citados sobre o estupro denunciam o contracontrole provocado pela
privação sexual. O trecho sobre o ladrão que agrediu a esposa e depois apanhou de
outros companheiros supõe que o contracontrole pode vir de quem não foi
105
necessariamente agredido. Os trechos que comentam as considerações de Varella
sobre as influências que o ambiente prisional exerceu sobre ele e das agressões que
dois ladrões sofreriam após uma tentativa de fuga onde os mesmos roubaram e
agrediram um de seus reféns, também parecem que são formas de contracontrole.
Outro efeito observado na coerção que pode ser ilustrado com os trechos citados
acima é o efeito temporário do estimulo aversivo. Sidman (1995) demonstrou, através
de exemplos de experimentos realizados com ratos submetidos a choques em ambiente
experimental, que os efeitos pretendidos com a coerção, ou seja, a eliminação do
comportamento indesejado apesar de ocorrer imediatamente após a apresentação do
estimulo aversivo, necessita que este seja apresentado constantemente para que o
efeito supressor se mantenha. Caso contrário, o individuo passa a se comportar como
antes e com intensidade maior devido ao estado de privação em que se encontrava
durante o período de choque.
Os trechos sobre as ameaças de punição que os mais velhos impunham aos
mais novos caso não tomassem banho, ilustra a afirmação acima: “(...) No pavilhão oito,
num xadrez coletivo de vinte e sete homens, no fundo, havia um banheiro com um cano
quase encostado à parede, através do qual escorria um fio de água. Apesar da
ginástica a que eram obrigados, ai daquele que não tomasse o banho diário, mesmo no
frio de junho. Os mais velhos cuidavam de impor essa obrigação aos novatos. Pág. 39”.
Neto; Alves e Baptista (2007) comentam sobre as forma de controle coercitivo
exercido pelas instituições controladoras no que se refere ao controle da violência. Tais
instituições investem em um código moral punidor das condutas desviantes e se
esquecem que muitos indivíduos agredidos em seus diretos e desprovidos de seus
reforçadores mais básicos tendem a contratacar agressivamente e de forma violenta. É
o que demonstra o trecho exposto a seguir:
A cadeia caiu no nosso poder. Digo nosso porque, naquela circunstância, nós
está tudo envolvido. Aí protestamos contra a nossa melhoria, que o ambiente já não
vinha do melhor, muitos manos querendo transferência, cara com a colônia assinada,
pena vencida, as visitas um pinguinho só, e já era. Pág. 284.
106
C.2.2. ”O uso da violência faz com que tudo tome a feição de violência”.
D.2.2 O uso freqüente de estimulação aversiva faz com que o ambiente se
transforme em algo aversivo, devido ao fato de tornar aversivos os estímulos
neutros e reforçadores positivos que estão presentes naquele ambiente.
A 2.2
- Comigo foram contratados mais de duzentos funcionários. Dez anos depois sobraram
cinco ou seis. Com esse salário baixo, alguns se contaminam com o crime viram
pilantras. Só que a gente nunca sabe quem são. Tem que desconfiar de todos,
lamentavelmente. Pág. 56.
- “A coisa mais difícil numa cadeia é identificar os que estão envolvidos com os
ladrões”. Pág. 56.
- “A cadeia é um lugar povoado de maldade”. Pág.13.
- “Em nenhum dos dois pode pisar no ovo, só que no oito é você mesmo que coloca o
ovo. No nove, são os outros, e ainda espalham sabonete no chão pra escorregar”. Pág.
35.
- Vê como é? As instalações são precárias, falta material, remédio, pessoal, tudo, e
quando alguém tem boa vontade, esbarra no problema disciplinar. Quer um
conselho?Não perde tempo com isso aqui. Pág. 80.
- (...) A realidade é desconcertante numa prisão, o que parece certo muitas vezes está
errado, e aparentes absurdos encontram lógica em função das circunstâncias (...). Pág.
106.
- “Quem anda com porco, come farelo”. Pág. 110.
AN 2.2
Nota-se diante do exposto acima que o ambiente prisional altamente coercitivo
gera a desconfiança e o medo em todos que fazem parte dele.
Estímulos neutros presentes em um ambiente onde se segue constantemente
estímulos adversativos (punidores), tornam-se também estímulos adversativos através
de condicionamento (Skinner, 1990).
Pode-se, então, deduzir que o medo e a
desconfiança nos ambientes prisionais tenham sido gerados através desse processo,
onde os indivíduos passam a sentirem-se sempre ameaçados e inseguros,
interpretando tudo como sinal de que algo ruim possa vir a acontecer.
107
Todos os trechos acima parecem expressar essas constatações. Porém, um
deles destaca-se quando se afirma que: (...) A cadeia é um lugar povoado de maldade.
Pág.13. . Vê-se que esse trecho aponta o caráter generalizado em como se dão as
formas violentas e agressivas de interação social, onde é vivenciado o medo e o
comportamento de desconfiança, além dos sobressaltos constantes.
O condicionamento faz com os estímulos neutros que acompanham os estímulos
punidores desencadeiem respostas emocionais. As respostas de medo e ansiedade
diante dos estímulos condicionados adversativamente descrevem como tais estímulos
funcionam como sinais ou ameaças de perigo, portanto os indivíduos tendem a diminuir
a freqüência ou parar de se comportar diante deles (SKINNER, 1990).
Skinner (2003) afirma que a técnica de associação de estímulos neutros a
estímulos aversivos com a finalidade de tornar os estímulos neutros aversivamente
condicionados, é muito comum no controle exercido por várias instâncias da sociedade
atual. O uso da técnica se justifica pelo aumento em potencial e extensão das respostas
condicionadas de medo e ansiedade, o que enseja um controle aversivo mais eficaz.
Os trechos acima demonstram claramente os sentimentos de medo e,
principalmente, de desconfiança que os presos sentem uns em relação aos outros.
Como expressa um dos trechos, que descreve a generalização da exposição a pares
sob contingências semelhantes: “Quem anda com porcos, come farelo”. Pág. 110
C.2.3. “o uso da violência produz um ser humano impotente diante da violência”
S 2.3.1. “Ignorando tudo o que acontece”
D.2.3.1 O indivíduo se insenta de participação política, profissional e social, ou
seja, não participa da vida da comunidade, tendendo a fugir ou esquiva-se dela.
A.2.3.1
- Na prisão, a violência que explode em ciclos invade a vida dos guardas. Nos acertos
de conta entre a malandragem, quando um grupo decide dar cabo de alguém, os
funcionários têm ordem para não interferir. Morra aquele que tiver que morrer;
paciência, trabalham desarmados. Pág. 115.
108
- Se o senhor pergunta, eles respondem e não esticam o assunto; se não pergunta eles
ficam na deles. Eles não são do crime, são aventureiros do tráfico e não atrasam a vida
do ladrão, são humildes, sangue-bom. A gente enaltece a pessoa deles. Pág. 31
- Seu Jeremias disse que aprendeu com os mais velhos a não participar de rodinhas,
nem andar com os outros presos para não se envolver em problemas alheios. Para ele
solidão é estratégia de sobrevivência.
No oito, cada qual carrega a sua cruz, calado. O sofrimento dos anos de cadeia ensina
o sentenciado a se trancar na própria solidão. É uma escola de sábios. Pág. 33.
AN.2.3.1
Os trechos citados descrevem que alguns presos preferem isolar-se da
participação em qualquer assunto concernente às questões da comunidade prisional.
Preferem o isolamento e a solidão ao invés de se meter em questões de interesse
comum, pois estas são geradoras de conflitos que podem acabar inclusive em morte.
Sidman (1995) explica que alguns indivíduos condicionados aversivamente
tendem a desistir da participação na vida de sua comunidade no que tange a decisões
sobre suas questões mais importantes por medo das pressões existentes quando se
vêem implicados com tais responsabilidades, que no geral são aversivas. A desistência
da participação do individuo nas questões mais relevantes de sua comunidade faz com
que a vida dele torne-se limitada e sem sentido.
A postura de Jeremias dentro da prisão ilustra a explicação de Sidman (1995).
Ele prefere se isolar socialmente a ter que se meter em confusão. Ocorre, que seu
Jeremias acaba vivendo uma vida envolta em solidão.
Sidman (1995) alerta para o perigo gerado pela ignorância das questões sociais,
alegando que isso deixa espaços sociais que passam a ser ocupados por corruptos,
pessoas incompetentes e criminosos. O não fazer nada ou ignorar torna-se então a
permissão para que a exploração aumente constantemente na sociedade atual.
O fato dos carcereiros trabalharem desarmados e, por essa razão, não intervirem
nos conflitos e acertos de conta da comunidade a qual também fazem parte, demonstra
a falta de implicação desses funcionários ou mesmo de preparo para tomar medidas
eficientes no sentido de conter esse tipo de violência entre os presos. Fica claro, que
109
por medo, eles preferem nada fazer ao invés de pensar no que poderiam fazer (achar
soluções).
O não fazer nada ou ignorar a situação realmente facilita a ação desses
criminosos. É do conhecimento de muitos, as mortes recorrentes de presos nas
unidades prisionais.
Sidman (1995) alerta para o fato de a falta de envolvimento com as questões da
comunidade podem levar a um não desenvolvimento intelectual para lidar com suas
demandas e exigências. Analisando os comportamentos dos carcereiros de não se
envolver ou de manter-se ignorantes quanto às questões conflituosas entre os presos,
devido às condições coercitivas em que trabalham, na perspectiva do raciocínio de
Sidman leva a compreensão de que a ignorância do que acontece só leva a mais
dificuldades em aprender a resolver a situação.
Talvez com a busca do preparo por parte dessa equipe, aumento no numerário
de funcionários e qualificação e diversidade de profissionais muitas medidas
preventivas dessas situações poderiam ser tomadas. Greenhalgh (2006) fala sobre a
questão do preparo dos funcionários como uma medida preventiva. Para o autor, o
preparo desses profissionais no sentido de definir claramente o seu papel e suas
responsabilidades, além de oferecer-lhes melhores condições de trabalho e segurança
é um dos pilares para melhorar as condições das prisões.
S.2.3.2 “Desistindo do que está a nossa volta”
D.2.3.2.O individuo tende a fugir de tudo ou todos que o controlam aversivamente
A.2.3.2
- (...) Para agüentar a tensão inerente à atividade e o cansaço das noites, muitos
abusam das bebidas. Alcoolismo e obesidade são doenças prevalentes entre guardas
de presídio. Bebem pra valer, não é fácil acompanhá-los. Pág. 108.
- No meio da noite, o senhor manda um preso para o xadrez. De manhã ele sai e diz
que não fica de jeito nenhum sem explicar por quê. Pode insistir, ameaçar, fazer o que
quiser que ele não volta; tem medo de morrer (...).Pág. 37.
- “O número de habitantes do setor não é inferior a cinqüenta, quatro ou cinco, por
xadrez, trancados o tempo todo para escapar do grito de guerra do crime: Vai morrer!”
Pág. 24.
110
- “Posso morrer de doença, mais assassinado na cadeia não. Acabo a conversa com o
senhor, vou direto para o xadrez e fecho a porta. Não confio em ninguém e não tenho
amigo nenhum. Amigo preso, eu não quero; que é isso!” (...). Pág. 245.
- Na prática, com os crentes sempre tive dificuldade para diferenciar aqueles
convertidos à palavra do senhor, dos que adotaram o mesmo estereótipo para fugir do
acerto de contas com a massa carcerária. Estupradores, justiceiros e usuários de
drogas inadimplentes, delatores e ladrões que trapacearam na divisão do roubo às
vezes fingem se converter para contar com a proteção do grupo religioso (...). Pág.117.
- “Majestade, que havia escapado vivo da rebelião de 1985, convenceu o companheiro
de xadrez a se recolher: Vamos ficar na nossa, até morrer quem tiver que morrer!” Pág.
245.
AN.2.3.2
Os trechos destacados descrevem que muitos presos adotam diversas
estratégias de fuga das situações aversivas em que vivem. Há presos que preferem se
isolar em suas celas, mesmos que superlotadas, não construir vínculos de amizades,
fugir para locais onde se sintam mais seguros ou não se envolver em conflitos e ignorálos, quando estes estão ocorrendo. E o que ilustra o trecho: “Vamos ficar na nossa, até
morrer quem tiver que morrer!”. Um dos trechos acima fala do uso abuso de bebidas
alcoólicas e obesidade entre os funcionários. Formas de entreter-se e desligar-se dos
problemas do trabalho potencialmente agressivo e estressante parecem comuns entre
os funcionários dos presídios.
Sidman (1995) considera a existência de rotas de fuga. Essas rotas
caracterizam-se pela desistência ou o desligar-se. No desligarem-se os indivíduos
tendem a fugir das situações aversivas, ignorando-as no momento em que estão
ocorrendo ou mesmo buscando comportar-se de maneira incompatível com ela como é
o caso de quando se utilizam de entretenimento para desligar-se de situações
estressantes.
Outro modo de desligar-se das situações é esperar que elas atinjam o seu ponto
máximo para poder resolvê-las ou delegá-lo a outras pessoas a fim de se livrar da
frustração de não conseguir enxergar as possibilidades de resolvê-lo sozinho.
Quando a situação torna-se muito aversiva muitos, de acordo com Sidman
(1995) simplesmente optam por desistir. Desistem de toda e qualquer forma de
111
qualquer vinculo participativo com a sociedade e em casos extremos de sua própria
vida.
Skinner (2003) atribui à punição constante a perda de reforçadores positivos que
levam a depressão e a desistência. Sidman (1995) fala que isso e comum em pessoas
que sofreram agressões de toda a ordem durante seu desenvolvimento ou que
simplesmente se decepcionaram com o ambiente social em que vivem. Para o autor a
sociedade perde em vários aspectos quando fomenta comportamentos de desistência.
A religião também é tomada como rota de fuga. Por princípios ou por proteção
parece um dos meios empregados pelos presos para se livrarem dos conflitos que
porventura possam vir a participar, bem como ser uma forma de proteção, dissimulando
o interesse para evitar a violência do presídio, o julgamento e a coerção dos pares.
C.2.4. “O uso da violência torna-nos sujeitos amargos, vivendo uma vida amarga”.
S 2.4.1 “Sob controle aversivo, não podemos deixar de estar vigilantes”.
D.2.4.1 O individuo assume uma posição onde seus únicos comportamentos são
aqueles que o possibilitam de fugir ou evitar a coerção, impedindo-o de aprender
comportamentos que não tenham relação com o medo.
A 2.4.1
- “A imprevisibilidade do ajuste de contas torna a vida do estuprador um sobressalto
permanente. Qualquer movimento fora da rotina pode prenunciar o castigo fatal”. Pág.
147.
- “Aqui, quem tem “mancada” no crime vive em sobressalto”. Pág. 28.
- Uma noite, no pavilhão do cinco, durante a distribuição do segundo numero do vira lata, perguntei através da janelinha de uma cela às escuras quantos moravam ali, para
saber o numero de gibis a entregar. Um negro forte acordou, pulou da cama e avançou
para a porta com uma faca enorme na mão esquerda (pela rapidez com que sacou, ela
só podia estar escondida no travesseiro). Até entender o que se passava ele ficou ali,
imóvel, com olhos de terror, a faca apontada na direção da porta. É pouco provável que
confiasse na firmeza da tranca. Pág. 38.
- “A desconfiança não tinha motivação pessoal. Nada que eu tivesse feito ou dito
poderia justificá-la. Na verdade guardas de presídio não gostam de pessoas estranhas
no ambiente de trabalho” (...). Pág.105
- Sai todo mundo do xadrez e encosta as mãos na parede da galeria. Bebeto estava
para lá do quinto sono quando os três funcionários deram essa ordem. Ficou
112
preocupado, havia chegado na cadeia a apenas três dias, mal conhecia os
companheiros. Os sete saíram em silêncio e os carcereiros vasculharam tudo. Estavam
quase desistindo, quando um deles despregou o fundo de um armário junto à parede e
encontrou duas facas. Bebeto surpreendeu-se: - Eu não tinha noção de que duas
bicudas daquelas cabiam naquele armário. De quem eram, quiseram saber os
funcionários: - Os manos na maior Miguelagem, ó. Vou dizer que não é minha? Uma
que os policiais não vão acreditar outra que eu passo por cagüeta, por que se não é
minha, é deles.- A solidariedade lhe custou trinta dias na isolada. No final, acha que
valeu a pena: - Sai de lá com fama de sangue-bom. Minha caminhada ficou mais fácil
na cadeia. Pág. 152.
- “Na linguagem da cadeia, seu Luiz estava pisando em casca de ovo. Todo cuidado é
pouco, pensou ele: Violência é remédio difícil de dosar”. Pág. 169.
- “Vira e mexe, passava a recolha e me levava de volta para o Asdrúbal Nascimento. Eu
nem ficava triste, aprendia no quadro-negro da vida. Um dia descuidavam e ele fugia de
novo”. Pág. 231.
- “Durante o banho, observei que eles entravam embaixo do cano com as costas quase
encostadas na parede. Comentei o fato com seu Manoel, que explicou: Ladrão nunca
fica de bunda para os outros doutor”. Pág. 127.
AN.2.4.1
Os trechos acima ilustram o comportamento dos presos que vivem sobre a
ameaça de que a qualquer momento ou mesmo qualquer passo em falso acarretará em
algum tipo de agressão contra eles. Uns se comportam apenas dentro de uma rotina
restrita e segura, pois vivem em sobressalto, outros emitem quaisquer comportamentos
que os livre de uma possível represália por parte de outros presos, como no exemplo
do ladrão que assumiu a culpa pelos outros e passou alguns dias na solitária a fim de
evitar qualquer conflito com os companheiros caso não viesse a fazê-lo.
A violência entre presos é bastante expressiva em todas as unidades prisionais
do Brasil. Ocorrem mortes brutais e violentas. A dívida por drogas é o principal motivo.
Porém, existem as punições previstas para quem descumpre outras leis impostas pelos
presos das lideranças. Guimarães (1998) refere-se à morte de três presos que foram
enforcados em suas celas no estado de Manaus. De acordo com ele, um dos presos
comentou que quem desobedece à lei e fala demais acaba morto!
Dadas às considerações feitas, nota-se que o ambiente prisional gera um
ambiente de constantes ameaças gerador de medos e inseguranças.
113
Sidman (1995) explica que experimentos feitos com uso de choques constantes
e aleatórios em animais demonstram que estes animais aprendem a se comportar
esquivando-se e parando qualquer comportamento que estejam emitindo no momento
em que o choque foi aplicado. No caso, se pressionar a barra for o único modo de
anular os choques, o animal o fará a todo o momento a fim de evitar que o perigo
ocorra novamente.
Vale ressaltar que o laboratório permite o manejo de contingência simples,
porém que podem ser generalizadas às situações sociais complexas como as que
ocorrem dentro dos presídios.
Desse modo à afirmação de Sidman (1995), vê-se que os presos emitiam
qualquer comportamento que os livrassem das constantes ameaças em que vivem.
S.2.4.2“Sob controle aversivo, não exploramos o mundo”.
D.2.4.2 Sobre o efeito da estimulação aversiva os indivíduos temem explorar o
mundo e ficam com um repertório comportamental bastante limitado.
A.2.4.2
- Antigamente trancava tantos numa cela que precisava fazer rodízio para dormir.
Metade ficava em pé, quietinho pra não acordar os outros. Na troca de turno é que
aproveitava para urinar. Precisava comer pouco, porque não podia evacuar o intestino
no xadrez. Só quarta e sábado quando destrancava por uma hora para o banho e as
necessidades. Pág. 28.
- O velho Lupércio, maconheiro convicto, conta que no tempo em que havia respeito,
nas refeições estendia-se um cobertor Parahyba no chão do xadrez e sobre ele
colocavam-se os pratos. Então o que estava preso a mais tempo naquela cela escolhia
o seu; o mais novo era o ultimo a se servir. As regras de comportamento no horário da
comida eram rígidas: - Nessa hora não podia usar banheiro, escarrar, tossir e muito
menos chupar dente, que tomava paulada no ato. Pág. 46
- Meus colegas me acham tolerante. Para eles pode ser, mas a família se queixa que
eu mudei. Antes eu era caseiro, tranqüilo, visitava a minha madrinha todo dia,
conversava. Depois de doze horas nesse trabalho, chego em casa com a cabeça
quente, janto quieto e vou dormir. Nem me lembro da madrinha. Pág. 59.
- O pavilhão é para aqueles com nome feito no crime. Geralmente o habitante do oito é
mais velho e não se envolve em confusão. Olha, escuta e fica quieto. Não age, reage: faz igual cascavel, só da o bote quando pisam nele. Pág. 34.
114
AN.2.4.2
De acordo com os trechos acima, pode-se perceber que os presos ficam com
receio de se comportar de uma forma diferente, o que acaba por restringir bastante o
repertório comportamental deles. Exemplos de trechos, como os da visão de seu
Lupércio sobre o que era respeito, imposto pela forte repressão de tempos atrás,
demonstra que até mesmo comportamentos mais simples como os de usar o banheiro
ou tossir, não eram permitidos em alguns momentos do dia.
Outro exemplo bastante significativo de restrição de repertório comportamental
destaca-se no trecho referente aos presos mais antigos do pavilhão oito do Carandiru,
principalmente quando diz que eles olham, escutam e ficam quietos, somente reagem a
presença do perigo.
Os funcionários também passam a se comportar menos devido a agressões no
ambiente em que trabalham. Nota-se isso com o trecho onde um funcionário desabafa
que após doze horas trabalhadas nesse ambiente ele, que antes ficava em casa,
tranqüilo e que ainda visitava sua madrinha, atualmente limita-se somente a jantar,
deitar e dormir.
Sidman (1995) refere-se a um experimento de laboratório onde explica que ao se
comportar somente pressionando a barra, o animal deixa de responder a outros
estímulos presentes naquele ambiente, parando de explorá-lo e de aprender com
conseqüências não aversivas. Desse modo seu repertorio comportamental restringe-se
somente a evitação dos choques, pois considera que tudo mais que possa vir a fazer
correr o risco de ser punido.
Os animais que se comportam desse modo o fazem porque, como os choques
ocorrem constantemente, eles sentem-se o tempo todo ameaçados preferindo
permanecer perto da segurança oferecida pela barra do que afastar-se dela e ir fazer
outras coisas. Esse efeito é uma conseqüência da punição constante e severa.
Nota-se, então que tanto os funcionários quanto os detentos submetidos
constantemente a esse ambiente coercitivo esquivam-se de suas ameaças de tal modo
que acabam por limitar os seus comportamentos de maneira bastante expressiva.
S.2.4.3“Sob controle aversivo, só conseguimos dar conta de uma rotina pré-
115
estabelecida”.
D.2.4.3 Os indivíduos tornam seus comportamentos estereotipados
compulsivos, pois temem variar o comportamento que os livra do perigo.
e
NA.2.4.3
- “Revistar é outro ritual de cadeia”. Pág. 44.
- (...) Em sistema de rodízio cada ocupante era responsável pela faxina diária: após o
café da manhã, ensaboar e escovar o chão, jogar um tacho de água fervente nos dois
sanitários, tirar o pó dos móveis e bater os dois tapetinhos; terminando o almoço, varrer
bem varrido e água fervente nos bois; depois do jantar, água e sabão, lavar tudo de
novo, enxugar e colocar os tachos no fogareiro para a limpeza final, pelando, na
privada. (...) Não teria desculpa para não fazer no maior capricho. Outra também é que
não ia dar certo. Quere bancar o espertinho, entre nós, tudo malandro, ó, nunca tem
final feliz. Pág. 42.
- “Tem que ser na manha. Se acordar cedinho, todo mundo dormindo, se for urinar no
boi e der descarga ou fazer qualquer zuadinha, o senhor tem que mudar de xadrez.
Acordar vagabundo é sem chance”. Pág. 44.
- A tranca é outro dos rituais de cadeia: A galeria está movimentada, cheia de luzes,
feijão no fogo, as portas abertas com as mulheres peladas voltadas para o lado de fora,
vozerio, pagode no radinho, entra e sai com panelas e roupas. De repente, um
funcionário aparece na gaiola do andar e bate seguidamente um cadeado contra a
grade ou um cano contra o chão: Péim, péim, péim, ritmado sem parar. Corre cada um
para o seu xadrez, porque a tranca impõe respeito. Em pares os carcereiros começam
a fechar (...) Tudo rápido, ninguém pode ficar de fora. Vacilou, na primeira vez tem o
nome anotado; na reincidência, são trinta dias na isolada, inesquecíveis. Pág. 48 a 49.
- Antigamente, no tempo da solitária, vi muito nego entrar bom e sair de lá direto para o
manicômio. Numa dessas celas, na escuridão total, ele passou três meses sozinho.
Para se ocupar, jogava uma bolinha de gude na parede e tateava o chão até encontrála. Chegou a repetir a operação cento e setenta vezes no mesmo dia:
- “Mas, graças a deus, saí de lá com juízo”. Pág. 143.
AN.2.4.3
Pode-se observar nos trechos dispostos acima que a rotina dos presos na casa
de detenção é bastante rígida e com poucas variações, os presos acabam
estabelecendo vários rituais que são seguidos a fim de evitar represálias caso se
comportem de outro modo. No caso particular do trecho que expressa a situação de um
preso na cela de castigo, seu comportamento ritualístico de jogar uma bola de gude
116
várias vezes durante o dia era, para ele, um modo de esquivar-se da loucura que
poderia acontecer caso não se comportasse desse modo e ficasse ocioso.
Existem arranjos de laboratório que demonstram os comportamentos destacados
acima os quais são explicados por Sidman (1995). O autor argumenta que, também em
razão da segurança oferecida pela barra, o animal costuma se comportar somente um
pouco além de pressioná-la. Ele passa no máximo a limpar-se quando necessário e
depois retorna a sua atividade que garante a segurança contra os choques. Desse
modo, os comportamentos emitidos tornam-se um ritual entre o limpar-se e o pressionar
a barra.
Entre os seres humanos, observa-se a existência de pessoas que são rígidas e
inflexíveis e não conseguem se comportar além do esperado com medo das punições e
represálias dos outros. Para estas pessoas, somente o ato de seguir as regras é
seguro. Em razão disso elas não conseguem discriminar outras maneiras de agir que
estão presentes no ambiente, seus comportamentos são sempre os mesmos em
qualquer situação.
S.2.5. “Sob controle aversivo, comportamentos supersticiosos tornam-se muito
prováveis”.
D.2.5. O individuo sujeito a controle aversivo não emite comportamentos
alternativos as situações ocorridas, como conseqüência, as contingências
incidentais se fortalecem gerando comportamentos supersticiosos.
A.2.5
- “Logo percebi que entre os habitantes da cadeia está em moda na crença nos poderes
miraculosos das vitaminas e sais minerais”. Pág. 92.
- Padres, pastores, médiuns, pais e mães-de-santo e até adoradores de satanás
freqüentam o presídio para converter à palavra do senhor as ovelhas desgarradas. A
crença na ajuda divina é para muitos presos a derradeira esperança de conforto
espiritual, única forma de ajudá-los a estabelecer alguma ordem no caos de suas vidas
pessoais. Pág. 117.
- A gente sente Deus operando na existência deles. Aqui tem grade e muralha, não dá
para fugir, mas você olha o céu e vê deus. A presença dele transmite paz e, com o
coração inundado de fé, você hora com devoção para ir embora desse lugar maligno.
Pág. 120.
117
AN.2.5
Nos trechos destacados acima se nota a presença de vários tipos de
comportamentos supersticiosos entre os presos, que vão desde o habito de tomar
vitaminas e sais minerais até submeterem-se as mais variadas crenças religiosas.
Os comportamentos supersticiosos podem ser entendidos como um tipo de
comportamento ritualístico e compulsivo que não se relaciona diretamente com a
contingência aversiva, porém antecede ou precede o comportamento de esquiva
contingente a ela. No exemplo do ambiente experimental, ratos podem emitir um
determinado comportamento antes de pressionar a barra, se conseguir evitar o choque,
eles passam a pressionar a barra sempre com o mesmo comportamento que executou
antes de pressioná-la pela primeira vez, ele não se arrisca a executar outro movimento
e passa a se comportar ritualisticamente temendo variar este comportamento.
Ocorre então uma sobrecarga na bagagem comportamental e um gasto de
energia muito maior com a esquiva. Ao invés de tocar somente a barra a fim de se
esquivar do choque o rato teme não executar, também, os outros movimentos que
realizou na primeira ocasião do choque (SIDMAN, 1995).
S.2.6. “Quando nenhuma forma de fuga-esquiva for possível só nos restará fugir
de nós mesmos”.
D.2.6. O individuo apela para o suicídio como a única alternativa de fuga e esquiva
que ainda lhe é possível.
A.2.6
- Quando a noite caía à alma penada dele vinha me assombrar, na escada, na galeria e
até no xadrez trancado. Tentei me suicidar duas vezes para escapar da perseguição.
O cortinório é de lei, devido que se não, tem gente olhando pra mim o tempo todo. Sabe
lá o que é isso, doutor, entra ano e sai ano, nenhum minuto o senhor pode ficar na sua?
É onde que muito companheiro de mente fraca perde as faculdades e dá cabo da
própria existência. Pág. 39.
- Tarde da noite, andando por esses corredores mal-assombrados, com o silêncio
quebrado por uma tosse anônima, o miado de um gato, a porta que bate ao longe,
entendi por que os suicídios acontecem de manhã, depois de noites de depressão ou
pânicos claustrofóbico, espremidos entre os outros sem poder chorar:
118
Homem que chora na cadeia não merece respeito. Pág. 49.
- Seu Lupércio, criado num orfanato de Poá, vendedor de maconha no varejo que na
mocidade foi massagista do São Paulo, diz que perdeu a conta de quantos se
enforcaram nas grades das janelas (...). Pág. 50.
- Menos de um mês depois, Ferrinhos, torturado pela depressão, enforcou-se com um
lençol na janela do xadrez. No bolso da calça, tinha o retrato de um menino pequeno e
de uma moça de boca pintada. Pág. 209.
AN.2.6
Os trechos acima destacam situações de suicídio dentro do Carandiru. De
acordo com o censo penitenciário brasileiro de 1994, o numero de suicídios ocorridos
nas prisões do Brasil fecha um total de 45. Esse indicador reforça a idéia da
necessidade de medidas preventivas que contenham a violência dentro das prisões.
(GUIMARÃES, 1998).
As medidas preventivas perpassam pela compreensão dos efeitos da coerção,
para que assim se possa investir em praticas mais eficazes e menos danosas para os
presos.
Sidman (1995) considera que o suicídio seja um caso extremo de desistência do
individuo que e submetido à punição severa, ou seja, em ultimo caso ele desiste da sua
vida.
O suicídio é um comportamento de fuga bastante complexo e com reforçadores,
muitas vezes desconhecidos devido ao fato de levar à morte. Ocorre, porém, que a
história de pessoas que sobreviveram ao suicídio revela algumas condições que
levaram ao ato.
Algumas pessoas que se desenvolveram em ambientes onde se sentiram
incapazes de corresponder às suas exigências, sentem-se culpadas e não dignas.
Então o suicídio está relacionado ao que a pessoa sente, e sentir-se mal. Seu próprio
comportamento se transforme em um punidor para ele, e de tal forma insuportável ao
ponto de querer se suicidar. Em contrapartida, se o suicídio fracassa, o indivíduo
recebe reforçadores como carinhos e atenção de pessoas significativas. Porém, após
algum tempo, o ambiente coercitivo retorna e fomenta a necessidade do
comportamento se repetir para ter acesso aos mesmos reforçadores novamente.
119
Nesse sentido, o suicídio pode se tornar coerção, ou seja, um modo de se livrar
de sentimentos e da exposição continuada ao ambiente aversivo, sem aparente
solução. De outro lado, em sua outra versão, observa-se inclusive o suicídio ou sua
tentativa como forma de obter atenção das pessoas que se culpam com a situação e
passam a dar maior atenção ao suicida. O ato também serve como meio de punir
aqueles que coagiram o suicida constantemente e de maneira insuportável.
C.3. Motivações para o crime:
D.3. Pessoas privadas de reforçadores básicos tendem a tentar conseguir seus
reforçadores generalizados tirando de outras pessoas. Além disso, a falta de
acesso a diversos reforçadores gera a revolta e a agressão.
A.3.
- “Seu Chico matou o cunhado tipo à-toa; matou um outro que, que ganhou
consideração na quadrilha com o objetivo precípuo de alcagüetar todos; e um terceiro
que ele nem conta. - Não merecia viver doutor”. Pág. 217.
- Claudiomiro diz que foi preso porque tinha mulher e filho (...) Dois dias mais tarde, vi
na televisão uma tentativa de fuga coletiva no DEPATRI ( departamento de proteção ao
patrimônio). Claudiomiro foi um dos lideres e voltou na mesma noite para a detenção.
Pág. 191.
- Os homens queriam oitocentos contos ou eu voltava para a cadeia. Respondi que já
tinha tirado dez anos, sofrido o pão que o diabo amassou que os velhos dependiam de
mim, e tal e mais a irmã e os sobrinhos, que eles não iam ganhar nada me prendendo
(...). Pág. 178.
- Manga jurava que tinha ido parar na detenção por um erro judiciário. Anos antes, ao
sair da cidade de Sorocaba, sem dinheiro, um amigo emprestou-lhe meio quilo de
maconha. Vendia na rua do estudante, onde morava na Dr.Lundi e na Thomaz
Gonzaga, no bairro da liberdade, centro de São Paulo. Dava para as despesas e
sobrava um pouco: Para comprar roupinha para o nenê que ia nascer uma pizza no
domingo e cuidar da esposa, dar aquele carinho que toda mulher necessita. Pág. 238.
- Com a sabedoria dos seis anos, Neguinho viveu por conta própria na cidade. Dormia
embaixo das marquises dos prédios enrolado num cobertorzinho, com jornal enfiado
por dentro da roupa; batia carteira, vendia bala em saco, chiclete e doce de leite
Embaré e assaltava de arrastam, com os companheiros mais graúdos (...).
- E assim trilhei meu destino de ladrão. Passava um todo bonito e simpático, era dia de
festa, os outros com seus brinquedinhos e eu sem nada. Com isso eu tornei-me tipo a
120
pessoa egoísta, porque queria ter, mas não poderia e nem teria capacidade, justamente
pela falta da mãe e do pai para que acontecesse o dia a dia. Pág. 231 a 232.
AN.3
Os trechos destacados acima exemplificam algumas das razoes pelas quais os
indivíduos cometem crimes. Sidman (1995) considera que uma das motivações para o
crime esteja na privação de reforçadores básicos como, por exemplo, saúde e
educação. A situação de privação é comum nas populações pertencentes às famílias
de baixa renda, onde a carência econômica tira-lhes a oportunidade de ter acesso a
muitos dos reforçadores primários e generalizados que podem estar disponíveis aos
demais na população. Essa contradição baseada na distribuição de renda tende a
acarretar o desafio de como obter tais reforçadores, e comportamentos passíveis de
punição podem vir a ser emitidos para esse fim. É o que descreve o trecho do rapaz
que vendia maconha para comprar roupas para o nenêm e comer pizza no fim de
semana.
No caso, a educação é primordial para que se desenvolvam habilidades
intelectuais necessárias para agir discriminando entre varias situações onde se possa
conseguir ter acesso a outros reforçadores por meio do trabalho e de renda que
possibilite acesso aos alimentos e bens sociais. Um repertório comportamental limitado
tende a diminuir as possibilidades de superação da situação crítica em que se
encontram.
As considerações feitas acima por Sidman (1995), podem ser exemplificadas
através do trecho sobre Claudionor, o ladrão que foi preso porque tinha uma família e
filhos. Subtende-se que Claudionor não enxergou alternativas para fazê-lo que não
fosse roubando. O trecho sobre neguinho ilustra de maneira ainda mais significativa as
questões discutidas, sobre a importância da habilidade intelectual para discriminar
dentre as varias alternativas de se obter reforçadores. Neguinho conta que gostaria de
ter o que os outros tinham, porém não poderia e nem teria capacidade, e sua única
opção era roubar. Alem de tudo ele se revoltava com a situação de não ter o que
gostaria. De acordo com ele tornei-me tipo a pessoa egoísta.
Outra importante conseqüência da privação de reforçadores é que ela fomenta o
ódio e a revolta das pessoas. Neto, Alves e Baptista (2007) argumentam que a violência
121
é uma forma de contracontrole dessas populações que se revoltam por não ter acesso
a maioria dos reforçadores primários e generalizados da sociedade.
O governo é o principal responsável pelo controle exercido na sociedade. Ocorre
que ele tem se utilizado desse poder para explorar as populações ao invés de trabalhar
pela garantia de seus reforçadores, fomentando-lhes a revolta e a agressão.
Nota-se no trecho sobre um criminoso que matou o cunhado matou o cunhado
tipo à toa, sem qualquer justificativa. Matos (1980/1981) aponta, através de exemplos
com experimentos de laboratório que o animal que levou o choque não agredira
necessariamente quem aplicou o choque, mas sim
o outro animal que estivesse
vulnerável no momento. Pode-se, então, deduzir, que as agressões a as explorações
sofridas por essas pessoas os torna sujeitos agressivos e com potencial para contraatacar.
O mesmo trecho chama a atenção para o fato desse mesmo sujeito ter matado
um outro sujeito para conseguir status na quadrilha a qual pertencia. Nas
considerações feitas por Velho (1996), vê-se uma descrição semelhante, quando o
autor diz que muitos indivíduos cometem seus crimes a fim de obter status social e
sucesso com as garotas na comunidade a qual pertencem.
Tendo em vista que o status torna-se um importante reforço social, cometer
esses crimes torna-se mais reforçador do que evitar as punições por não seguir um
código moral e ético da legalidade.
Para Sidman (1995) consciência moral fraca é muitas vezes entendida como
causa para a violência, porém a consciência é um produto de coerção e falha quando,
por exemplo, alguns indivíduos descobrem maneiras eficientes de se esquivar de
punições impostas pela lei através de suas brechas, ao mesmo tempo em que se
beneficiam dos reforçadores obtidos com o crime. E o caso de crimes cometidos por
grandes empresários que possuem a condição de pagar advogados responsáveis por
perceber as referidas brechas da lei e utilizá-las a favor de seus clientes. Os que não
possuem as condições necessárias para usufruir dos recursos da lei revoltam-se com a
situação e entram na briga por seus reforçadores, gerando um verdadeiro problema
social, que por sua vez tenta ser contida com um aumento da repressão e da punição,
ou seja, formas de punição legalizada pelas Leis.
122
Tendo em vista que para Neto, Alves e Baptista (2007) a violência é o produto de
interações coercitivas entre o ambiente e o organismo, ela existirá enquanto as práticas
coercivas de quem detêm o controle social continuar a persistir. Nesse sentido, de nada
adianta investir em práticas cada vez mais repressoras para o controle da violência,
Sidman (1995) acredita que se faz necessário um substituto para consciência, ou seja,
faz-se necessário o substituir as práticas de controle legais e morais que moldam a
consciência humana no sentido de gerar comportamentos adaptativos à coerção, como
no caso da fuga, da esquiva e do contracontrole, por formas de controle que realmente
gerem comportamentos sociais mais eficazes.
123
CONCLUSÃO
Sidman (1995) afirma que a coerção é a principal forma de interação entre os
indivíduos e entre os mesmos e a natureza. A coerção é considerada tão natural que
provoca o descrédito e o desuso de outros meios de controle mais saudáveis, a saber,
o controle exercido através de reforçamento positivo.
As principais justificativas para o uso indiscriminado da coerção em detrimento
de técnicas mais saudáveis de interação se encontram nos efeitos imediatos da referida
técnica sobre a conduta indesejada. Experimentos de laboratório demonstram que a
punição, sua ameaça e o reforçamento negativo suprimem quase que imediatamente a
resposta contingente a eles.
Porém, os mesmos experimentos demonstram que o controle não passa de
momentâneo e supressor da resposta, ou seja, o comportamento para de ocorrer
apenas na presença do estímulo aversivo, necessitando que este seja apresentado
constantemente para que a resposta de supressão ocorra. Punições intensas parecem
produzir efeitos mais duradouros, mais os efeitos colaterais observados não justificam o
seu uso.
Ocorre, assim, que além de conter apenas um efeito supressor, a coerção
também possui subprodutos infelizes que envenenam as relações sociais, são eles as
predisposições emocionais para se comportar como o medo e a ansiedade e os
comportamentos de fuga, esquiva e contracontrole. Todos esses subprodutos causam
um
desajuste
ao
meio,
fomentando
dificuldades
de
aprendizagem,
rigidez
comportamental, insegurança, falta de criatividade, neuroses e problemas de
personalidade e violência.
Apesar de todos esses efeitos, a coerção ainda é utilizada em todas as principais
instâncias que exercem controle social, como a educação, o governo, a família, a
religião e a psicoterapia. Desse modo, a própria consciência moral considerada a
principal mola motriz da vida e parâmetro para o comportamento do individuo em
sociedade, passa a ser ela mesma o produto de esquiva da punição e suas ameaças
(SIDMAN, 1995).
124
Devido ao fato da coerção ser a principal forma de controle do comportamento
social, é necessário entender porque os indivíduos se comportam juntos e como
constroem e passa a ficar sob controle de suas praticas culturais. Para Baum (2006) os
comportamentos em grupo foram selecionados porque foram mais eficazes para a
sobrevivência da espécie. Em grupo, os indivíduos caracterizados pelo altruísmo
praticavam ações como proteger uns aos outros e dividir os alimentos, pois, quando
sozinhos, a eficiência para se proteger das ameaças presentes no ambiente diminuía
muito. Quando se fala da sobrevivência de um indivíduo ou de um grupo, vê-se a
emergência de práticas individuais e culturais que se chocam ou aproximam a interação
com os demais indivíduos ou práticas grupais.
O comportamento social pode então ser entendido como o comportamento das
pessoas no grupo. Por ser assim, os processos que originam tais comportamentos em
nada diferenciam dos processos que explicam os comportamentos do individuo fora
dele. Ou seja, é o reforço que controla essas relações (SKINNER, 2003).
Ocorre que as interações sociais são relações que dependem da freqüência com
que duas pessoas se reforçam, por depender das interações entre duas pessoas o
reforço é então chamado social (BAUM, 2006).
O reforço social depende do comportamento verbal para ocorrer. Ele diferencia o
comportamento entre indivíduos do comportamento de um individuo em ambiente
mecânico. Isso é possibilitado porque esse comportamento origina repertórios
comportamentais complexos e permite que, através da educação, os traços de uma
cultura sejam passados de uma geração para a outra (SKINNER, 2001).
A cultura poder ser entendida como um conjunto de práticas usuais de um
determinado grupo, elas variam de um lugar para outro e sofrem variações ao longo do
tempo.
A capacidade de transmitir traços culturais, ou seja, suas praticas usuais é o que
diferencia uma cultura de seres humanos de uma sociedade de animais. A aptidão para
aprender com os outros possibilita que os traços culturais sejam passados para os
membros sociais e para as gerações futuras. Isso é importante, as gerações futuras
poderão aprender comportamentos que foram selecionados por antigas gerações a fim
de evitar os riscos presentes no ambiente, por exemplo.
125
As práticas culturais são selecionadas por reforço e punição com a finalidade de
estabelecer regras que guiam condutas morais necessárias a sobrevivência do grupo.
Nesse sentido, as regras são entendidas como ações que formam a base do grupo
(BAUM, 2006).
A criação de regras de comportamento faz com que o grupo assuma o controle
sobre o individuo. O controle do grupo se faz necessário a partir do momento em que
as ações de alguns indivíduos tornam-se aversivas para os demais, tornando
necessária a criação desses padrões verbais que controlam essas ações por reforço e
punição (SKINNER, 2003).
Como o controle social exercido normalmente é um controle aversivo ou as
relações de contingências que o estabelecem não são muito claras, a pessoas
preferem acreditar que os homens são livres e que são guiados por valores de
liberdade, felicidade e segurança (SKINNER, 2003).
Skinner (2003) diz que a liberdade se refere aos comportamentos que livram o
individuo da coerção. Para Baum (2006) os indivíduos felizes são aqueles que se
encontram livres de exploração e que estabelecem relações eqüitativas, possuem
acesso aos mesmos reforçadores disponíveis em um grupo de comparação.
Pode-se observar que esses valores e sentimentos de liberdade, felicidade e
segurança são apenas subprodutos dessas contingências e que o valor está em como
essas
contingências
controlam
o
comportamento
dos
indivíduos.
Se
essas
contingências sociais e outras como a lealdade, responsabilidade e respeito pelos
outros forem eficazes, elas podem desencadear ações do grupo que beneficiam a todos
(SKINNER, 2003).
A ação das contingências sugere que o único valor e o valor de sobrevivência é
que as contingências podem ser manipuladas e modificadas em prol da sobrevivência
da espécie. Para Skinner (2003) muitas pessoas estão empenhadas na modificação
das práticas visando sua melhora. Porém, o planejador cultural necessita estar exposto
a contingências que o controlem a trabalhar pelo bem dos outros em detrimento do
beneficio próprio.
Uma vez reforçado a trabalhar pelo bem do próximo, seu planejamento deve
conter ações que promovam mudanças para problemas globais significativos, como a
126
poluição, superpopulação e armamento nuclear, a partir da modificação de
contingências que reforçam tais práticas. Com esse tipo de planejamento, a ações
tornar-se-ão mais eficazes para a sobrevivência da espécie.
Ocorre que, os responsáveis pelo planejamento cultural e o controle social, como
é o caso das agências controladoras como a educação, a religião a psicoterapia e o
governo sedem a reforçadores que os benefíciam de modo imediato e que possuem
fins egoístas. No caso especial do governo, este se utiliza do poder de punir o grupo
controlado para poder explorar-lhes de maneira bastante exacerbada, gerando a revolta
e predisposição para contratar (SKINNER, 2003).
O controle exercido pelo poder de punir do governo ocorre por meio de regras
padronizadas chamadas de leis. Essas regras são organizadas em um código que
possui a função de garantir que esse comportamento verbal se perpetue. Quando,
algum individuo age em desacordo com tais regras, este é punido com a apresentação
de reforçadores negativos, como por exemplo, castigos corporais. Ou com a retirada de
reforçadores positivos, como e o caso da multa ou do encarceramento (SKINNER,
2003).
Matos (1980/1981) afirma que experimentos com grupos de animais submetidos
a choques tendem a agredir potencialmente outros grupos de animais. A autora
relaciona estes grupos a situações de ataques e violência cometidos por alguns grupos
de indivíduos contra ônibus na cidade de Salvador.
Privação também gera agressão. Para Neto, Alves e Baptista (2007) as pessoas
privadas de seus reforçadores primários e generalizados em conseqüência da
exploração e da má administração do governo tendem a agredir com violência.
Por outro, lado os agentes de segurança pública, devido às influências históricas
do desenvolvimento de suas ações de combate à violência investem em estratégias
mais repressivas ao invés de preventivas, como se estas ações se pautassem na lei do
olho por olho e dente por dente. Gerando mais violência e criminalidade ao invés de
combatê-la (LIMA, 2007).
O sistema Prisional Brasileiro também se desenvolveu em um contexto de
punições, repressão intensa e discriminação social e racial. Essas características se
127
desenvolveram sobre a influência das formas de aplicação da pena no restante da
Europa (FAUSTINO, 2008).
Com a passagem do sistema feudal para o sistema capitalista houve mudanças
de valores e paradigmas significativos na sociedade, principalmente com a introdução
das idéias iluministas e humanistas. Essas idéias mudaram a forma de conceber a pena
que passou a ser aplicada como um meio de correção e preparo dos indivíduos para o
mercado de trabalho.
Nesse contexto, as prisões passaram a ser um local onde os indivíduos
poderiam ser tanto corrigidos quanto preparados para o trabalho, além de poder ter
essa mão de obra explorada mesmo dentro da prisão.
No Brasil, a primeira mudança significativa ocorreu com a reforma do código de
1830 sobre forte influência das idéias iluministas, quando as penas se configuraram em
privação de liberdade e as prisões passaram a ser o espaço de cumprimento dessas
penas. Surge nesse contexto às casas de correção no estado do Rio de Janeiro e em
São Paulo.
Em 1890, houve uma nova mudança no código, que sofreu influências de idéias
humanistas e positivistas, onde o crime passou a ser visto com motivações
biopsicossociais e o criminoso passou a ser visto como alguém com necessidade de
cura e não de correção.
Em 1940, durante a era Vargas, o código também passa por modificações
passando a prever forte repressão e punições severas para os que fossem contra as
idéias do governo. Foi considerado um período de verdadeira violência e caos nas
prisões brasileiras.
Com a reforma do código de 1940 que ocorreu em 1984, as penas acessórias
foram abolidas e foi criada a LEP (Lei de Execuções Penais), que possui seu foco
principal na ressocialização do preso. Para tanto, prevê condições necessárias para
que esse processo de ressocialização ocorra como assistência médica, psicológica,
odontológica, jurídica e social.
No entanto existem incoerências entre a lei e a prática da execução penal.
Malaquias (2008) expõe que a lei de execuções penais se pauta em três pilares
principais: punição, recuperação e ressocialização. Porém, somente a punição é
128
potencialmente exercida. Além disso, as condições de habitação nas prisões são as
piores possíveis. As celas são fétidas e imundas.
De acordo com essas condições os presos sofrem os efeitos da punição e
tornam-se predispostos a rebelarem-se e a contratacar. Um exemplo, disso e a onda de
violência comandada pelo PCC no estado de São Paulo.
Atualmente o sistema prisional é considerado uma instituição falida. Devido a sua
estrutura física e funcional, ela não consegue atender aos fins a que se propõe, a
saber, a recuperação e ressocialização dos indivíduos infratores da sociedade. Isso
ocorre devido ao contexto histórico do desenvolvimento da execução das penas no
Brasil, que como observado, se caracteriza pela exclusão, punição e repressão
excessiva de seus infratores.
Estudos realizados sobre a punição e outras formas de coerção demonstram o
fracasso da técnica na aprendizagem eficaz de comportamento. Aqui cabe então uma
pergunta: Qual é a justificativa para manter um sistema prisional que devido a forte
punição e privação (coerção) não ressocializa seus infratores e ainda os devolve a
sociedade com predisposições emocionais para agredir e contra-atacar extremamente
potencializadas? A presente pesquisa buscou analisar o uso de práticas coercitivas no
ambiente prisional dentro da perspectiva da análise do comportamento, baseado da
obra literária “Estação Carandiru” e implicitamente começar a responder a essa
pergunta.
Sidman define a coerção como:
O uso da punição e da ameaça da punição para conseguir que os outros ajam
como nós gostaríamos e à nossa prática de recompensar a pessoas deixandoas escapar de nossas punições e ameaças (...). (SIDMAN, 1995, pág.17).
Foram analisadas duas categorias referentes a difusão e os efeitos da violência
e 7 subcategorias que afirmam que o individuo se acostuma com a violência; que o uso
indiscriminado da Violência gera mais violência; faz com que tudo tome feição de
violência; torna o indivíduo impotente diante da violência, vivendo uma vida amarga;
muitos apresentam comportamentos supersticiosos e, alguns só conseguem fugir
através do desistência de si mesmo (Suicídio). Além dessas categorias foi analisada a
129
categoria sobre as motivações para o crime onde foi definido que ele ocorre por
exploração e privação de reforçadores sociais. Os indivíduos privados de reforçadores e
explorados tendem a obter seus reforços roubando de outras pessoas e na condição de
explorados tendem a contracontrolar agressivamente.
A partir da análise dos resultados pode-se verificar a banalização da violência
ocorrida nos sistemas prisionais brasileiros. Notou-se que isso ocorre devido às
precárias (e por essa razão agressivas) em que trabalham os funcionários e em que
vivem os presos, a saber, a superlotação e as más condições de higiene física e saúde.
Soma-se a esses fatores, a mentalidade que permeia a execução das penas no Brasil.
Essa mentalidade baseia-se na lógica construída ao longo de seu desenvolvimento
histórico, a qual supõe que a punição severa recupera e disciplina os presos, sendo
considerada a prática mais eficaz de controle social.
Porém os resultados da análise confirmam que punição intensa somente pode
gerar efeitos colaterais. Agredidos e violados, os presos tendem a contracontrolar de
forma agressiva. Um exemplo disso são as constantes rebeliões que ocorrem nesses
ambientes.
Outro efeito observado com os resultados é que o ambiente prisional coercitivo
gera predisposições emocionais como o medo e a desconfiança nos indivíduos
pertencentes a ele. Muitos optam pelo isolamento social buscando fugir dos conflitos e
de possíveis represálias geradas por eles. Outros fogem fazendo uso de bebida
alcoólica e outras drogas como forma de desligar-se dos problemas existentes.
O medo e insegurança também fazem com que esses indivíduos deixem de explorar o
ambiente em que vivem, ficando com o repertorio limitado. Eles realmente não saem de
suas rotinas e seguem as regras estabelecidas de maneira rigorosa, pois tem medo de
morrer.
Por fim, os resultados demonstram a existência dos comportamentos
supersticiosos. As asserções analisadas apontam para vários destes comportamentos
que vão desde a crença no efeito de alguns remédios até as mais variadas formas de
devoção espiritual. E alguns vêem apenas no suicídio, uma rota possível de fuga,
principalmente os que são coagidos de forma intensa e constante.
130
A análise dos resultados da categoria motivações para o crime demonstra que a
coerção começa antes que esses indivíduos entrem no sistema prisional. Privados de
seus reforçadores e sujeitos a exploração dos que exercem controle social, eles
cometem os crimes para obterem o que desejam ou por revoltarem-se com a situação
em que vivem.Como ficou clara durante a discussão de alguns autores, a privação de
reforçadores essenciais é uma forma de agressão e violência, e, portanto geradora de
contracontrole, ou seja, mais violência.
Pode-se concluir com os resultados obtidos a predominância de práticas
coercitivas entre os presos e entre eles e os funcionários da instituição, fazendo com
que não enxerguem alternativas mais saudáveis de práticas sociais, acarretando em
pouca probabilidade de mudança do comportamento delituoso quando estes indivíduos
retornarem ao ambiente social o qual pertencem. Além disso, os resultados sugerem
que as práticas coercitivas nas, apesar de serem bem primitivas, são apenas uma
reprodução das praticas coercitivas que predominam no contexto macrossocial.
A coerção controla grande parte do comportamento social e ameaça a
sobrevivência da espécie humana. Os próprios valores defendidos como ideais para
alicerçar relações mais saudáveis e culturas mais duradouras, tais como liberdade,
felicidade e dignidade se constituem através de comportamentos de fuga e esquiva da
coerção. As pessoas sentem-se felizes quando usufruem dos mesmos reforçadores
disponíveis a grupos sociais ou livres quando não são controladas aversivamente em
suas interações sociais.
Diante dessas constatações, parece urgente uma mudança de paradigma
pautada no valor de sobrevivência e capazes de fomentar práticas preventivas e que
garantam um prognóstico mais promissor às gerações futuras. Para tanto, é preciso que
as pessoas sejam preparadas para responder a reforçadores em longo prazo, ao invés
do imediatismo e do egoísmo como se observa nas relações de poder do governo que
explora o povo o qual governa, ou pelo poder econômico que estabelece práticas de
privação para aumentar o valor reforçador de bens materiais.
Mudanças
macrossociais
precisam
influenciar
mudanças
em
espaços
microssocias, como no caso do sistema prisional. A mudança começa pela percepção
131
de que as práticas preventivas são alternativas mais eficazes no combate à
criminalidade do que as práticas de extrema coerção executadas nas prisões.
Para aqueles que já cumprem penas em espaços de privação de liberdade, uma
das possibilidades de se alcançar comportamento eficaz pode ser conseguida através
do uso de técnicas de reforçamento positivo. Sabe-se que o ambiente prisional é
extremamente complexo e que a criminalidade envolve fatores biopsicossociais. Porém,
Sidman (1995) demonstra através de exemplo do uso dessa técnicas em algumas
prisões, que elas obterão resultados bastante favoráveis. Os presos sentiram-se
motivados a estudar e muitos aprenderam uma profissão que poderiam exercer fora dos
estabelecimentos prisionais.
Porém o uso da técnica é apenas uma das alternativas a ser utilizada, esta não é
a solução para o problema prisional. Tendo em vista a complexidade da questão, faz-se
necessário o interesse na busca de muitas outras alternativas que poderiam ser
descobertas com o aumento do número de pesquisas na área. Com o resultado das
pesquisas pode-se direcionar práticas mais eficazes, e de cunho mais preventivo.
132
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