em PDF - Pós-graduação em Linguística

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A COMPOSICIONALIDADE ASPECTUAL REVISITADA
Waniston Coelho Celeri
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação em Lingüística da Universidade Federal do Rio
de Janeiro como quesito para a obtenção do Título de
Mestre em Lingüística
Orientador: Prof. Doutor Celso Vieira Novaes
Rio de Janeiro
Dezembro de 2008
2
Celeri, Waniston Coelho.
A composicionalidade aspectual revisitada.
/ Waniston Coelho Celeri. Rio de Janeiro: UFRJ/FL, 2008.
Waniston Coelho Celeri
Dissertação – Universidade Federal do Rio de Janeiro, FL.
1. Sintaxe. 2. Aspecto. 3. Tese (Mestrado – UFRJ/FL) I. Título
A composiectual revisitada
3
A composicionalidade aspectual revisitada
Waniston Coelho Celeri
Orientador: Celso Vieira Novaes
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Lingüística da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do título de Mestre em Lingüística.
Examinada por:
_________________________________________________
Presidente, Prof. Doutor Celso Vieira Novaes
_________________________________________________
Profa. Doutora Márcia Maria Dâmaso Vieira - UFRJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold – UFRJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Lilian Vieira Ferrari – PPG Lingüística – UFRJ, Suplente
_________________________________________________
Profa. Doutora Márcia Atalla Pietroluongo – UFRJ, Suplente
Rio de Janeiro
Dezembro de 2008
4
Dedico esta dissertação aos meus pais.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, aos meus pais, à minha família, aos meus amigos, a quem me quer e
me faz bem, ao meu orientador e ao Grupo de Estudos Biologia da Linguagem.
6
“Life is never that easy.”
Noan Chomsky
7
CELERI, Waniston Coelho. A composicionalidade aspectual revisitada. Rio de Janeiro: UFRJ,
Faculdade de Letras, 2008, 98 fls. Dissertação de Mestrado em Lingüística.
RESUMO
O objetivo principal desta dissertação foi contribuir para a compreensão de
como está representada a noção de aspecto na mente humana por meio da investigação da
proposta da composicionalidade aspectual.
A proposta de Verkuyl (2003) de que um verbo de caráter mais eventivo
associado a um complemento de cardinalidade mais especificada engendraria um
enunciado de leitura mais terminativa foi a base de nosso estudo.
Partindo de resultados obtidos em experimentos anteriores, elaboramos um
experimento no qual acrescentamos a presença do adjunto como variável a ser
investigada. Tal experimento consistiu de um teste de relacionamento de figura-sentença
respondido por 16 informantes nativos do português do Brasil.
A partir dos resultados obtidos, foi possível afirmar que: a) o adjunto adverbial
tem um papel fundamental na composição aspectual de uma sentença e b) a proposta de
Verkuyl (op. cit.) é falha ao considerar que apenas o verbo e seu complemento são o
bastante para compor o aspecto de uma sentença.
8
CELERI, Waniston Coelho. A composicionalidade aspectual revisitada. Rio de Janeiro: UFRJ,
Faculdade de Letras, 2008, 98 fls. Dissertação de Mestrado em Lingüística.
ABSTRACT
The main goal of this dissertation was contributing to the understanding of how
the notion of aspect is represented in the human mind by investigating the aspectual
compositionality approach.
According to Verkuyl (2003), a non-stative verb plus a complement of specified
cardinality would result in a sentence with a terminative reading. This assumption was the
base to our study.
Having as background the results from previous studies, we elaborated an
experiment in wich we added the presense of an adverbial as a variable to be investigated.
This experiment consisted in an picture-sentence relationing test which was answered by
16 individuals, native speakers of Brazilian Portuguese.
Based on the results we have gotten, it was possible for us to assume that: a) a
adverbial plays a fundamental role in the aspectual composicion of a sentence and b) the
proposal made by Verkuyl (op. cit.) has a flaw since according to it, the verb and its
complement would be enough to compose the aspect of a sentense.
9
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
A
Sentença alvo
ADD TO Traço de eventividade de um verbo
Adj
Adjunto
Adv
Advérbio
AdvP
Sintagma adverbial
Agr
Concordância
AgrP
Sintagma de concordância
AP
Sintagma adjetival
AspP
Sintagma aspectual
Aux
Auxiliar
CE
Conjunto experimental
COMP
Complementizador
D
Sentença distratora
FF
Forma fonológica
FL
Faculdade de Linguagem / Forma lógica
FLB
Faculdade da Linguagem no sentido amplo
FLN
Faculdade da Linguagem no sentido estrito
GU
Gramática Universal
I
Flexão
Im
Morfologia de imperfectivo
INFL
Flexão
IP
Sintagma flexional
NEG
Negação
NEGP
Sintagma de negação
10
NP
Sintagma nominal
NPext
Sintagma nominal externo a VP
NPint
Sintagma nominal interno a VP
PASS
Passado
Pe
Morfologia de perfectivo
PM
Programa Minimalista
PP
Sintagma preposicional
Quant
Quantificador
SPEC
Especificador
SQA
Quantidade especificada
TP
Sintagma de tempo
VP
Sintagma verbal
11
LISTA DE SÍMBOLOS
+
Marcação positiva para um dado parâmetro
–
Marcação negativa para um dado parâmetro
○
Parâmetro inválido ou não relevante
1
Primeira conjugação verbal
2
Segunda conjugação verbal
3
Terceira conjugação verbal
4
Sentença composta por quatro (4) elementos
7
Sentença composta por sete (7) elementos
12
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - A Faculdade da Linguagem
Figura 2 - Representação arbórea da estrutura sintagmática
Figura 3 - Representação arbórea de sentença
Figura 4 - Representação arbórea de sentença
Figura 5 - Árvore sintática após a cisão do nódulo flexional
Figura 6 - A Faculdade da Linguagem e os sistemas de desempenho
Figura 7 - Diagrama de oposições aspectuais segundo Comrie
Figura 8 - Classificação verbal verkuyliana
Figura 9 - A Composicionalidade Aspectual
Figura 10 - Exemplo de conjunto experimental alvo
Figura 11 - Exemplo de conjunto experimental distrator
Figura 12 - A Composicionalidade Aspectual – Representação modificada
Gráfico 1 - Relação sentença-figura interna aos conjuntos experimentais alvo (CE)
Gráfico 2 - Relação sentença-figura versus nível de escolaridade
Gráfico 3 - Relação sentença-figura versus faixa etária
Gráfico 4 - Relação sentença-figura
Tabela 1 - Classificação verbal vendleriana
Tabela 2 - Distribuição de informantes no experimento
Tabela 3 - Verbos utilizados no experimento
13
SUMÁRIO
|
| INTRODUÇÃO .................................................................................................. 15
| 1 | TEMPO E ASPECTO NA TEORIA DA GRAMÁTICA GERATIVA ...... 16
| 1.1 | A FACULDADE DA LINGUAGEM ............................................................................ 16
| 1.2 | A S PRIMEIRAS VERSÕES DA T EORIA
DA
GRAMÁTICA GERATIVA ....................... 19
| 1.3 | O SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO SINTÁTICA E A TEORIA X-BARRA .................... 20
| 1.4 | A CISÃO DO NÓDULO FLEXIONAL ......................................................................... 22
| 1.5 | O PM E A ELIMINAÇÃO DE A GR P DA ÁRVORE SINTÁTICA .................................. 24
| 1.6 | A ENTRADA DE A SP P NA ÁRVORE SINTÁCIA ........................................................ 27
| 2 | ASPECTO ............................................................................................................ 29
| 2.1 | TEMPO VERSUS A SPECTO ...................................................................................... 29
| 2.2 | A SPECTO G RAMATICAL VERSUS A SPECTO LEXICAL ............................................ 30
| 2.3 | A SPECTO G RAMATICAL ......................................................................................... 31
|2.3.1| Aspecto perfectivo versus aspecto imperfectivo ............................................................... 32
|2.3.2| Aspecto Neutro......................................................................................................... 33
| 2.4 | A SPECTO LEXICAL ................................................................................................. 34
|2.4.1| A classificação vendleriana......................................................................................... 34
|2.4.2| A classificação verkuyliana ........................................................................................ 36
| 3 | A NOÇÃO DE COMPOSICIONALIDADE ASPECTUAL ....................... 38
| 3.1 | V ERBOS E A COMPOSICIONALIDADE ASPECTUA L ................................................ 41
|3.1.1| O princípio-mais ....................................................................................................... 41
| 4 | DADOS ................................................................................................................. 46
| 4.1 | INFORMANTES ........................................................................................................ 46
| 4.2 | DESENHO DO TESTE .............................................................................................. 47
|4.2.1| As sentenças ............................................................................................................. 47
14
|4.2.2| Os verbos.................................................................................................................. 49
|4.2.3|As figuras.................................................................................................................. 49
|4.2.4|Organização e procedimento......................................................................................... 50
| 4.3 | R ESULTADOS .......................................................................................................... 52
| 5 | PROPOSTA DE ANÁLISE .............................................................................. 56
| 6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 60
|
| REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................ 62
|
| ANEXO A............................................................................................................. 64
|
| ANEXO B ............................................................................................................ 68
|
| ANEXO C ............................................................................................................ 98
15
INTRODUÇÃO
O fato é que falamos. Comunicamos. Externamos. Introjetamos. Fazemos uso
consciente ou não de algo a que costumamos chamar linguagem, muitas vezes sem fazer
qualquer reflexão sobre os mecanismos envolvidos nesse processo. Desde a infância,
tendemos a não atentar para coisas simples, ou nem tanto, que nos cercam
cotidianamente.
É bem provável que a maioria de nós já tenha visto uma criança brincando com
aqueles pequenos blocos coloridos, outrora, de madeira, hoje em dia, de plástico, que se
espalham pelo chão e as entretêm por horas. As crianças montam, desmontam, remontam
formas maiores ou menores, mais ou menos elaboradas, não se preocupando com o
processo, mas com o resultado final de sua empreitada.
Temos nos entretido com algo bastante semelhante ao jogo das crianças, menos
lúdico, igualmente prazeroso, talvez um pouco mais complexo: temos investigado como
blocos maiores ou menores se unem para formar diferentes estruturas lingüísticas. Mais
especificamente, como traços, feixes de traços, palavras ou grupos de palavras se unem
para formar a nuance aspectual de uma sentença.
Nesta dissertação, dividida em seis capítulos, falamos um pouco desse
fascinante jogo chamado linguagem. No capítulo um, falamos sobre como a linguagem é
vista sob a perspectiva da Gramática Gerativa, dando especial atenção às noções de
tempo e aspecto. A seguir, no capítulo dois, focamo-nos em Aspecto, para no capítulo
três falar com mais detalhes da questão da Composicionalidade Aspectual, apresentando
alguns estudos sobre delimitação, uma idéia indispensável à discussão proposta nesta
dissertação. No capítulo quatro, apresentamos dados obtidos em um estudo que fizemos
para dar conta da proposta que fazemos no capítulo cinco. Por fim, no capítulo seis,
fazemos algumas considerações finais.
16
| 1 | TEMPO E ASPECTO NA TEORIA DA GRAMÁTICA GERATIVA
| 1.1 | A FACULDADE DA LINGUAGEM
Sentimo-nos tão à vontade com este portentoso sistema alcunhado de linguagem,
que talvez nos passam desapercebidas questões como: estaria este sistema, dispositivo,
mecanismo, disponível somente para os humanos ou para todas as espécies? Esteve este
sistema sempre disponível para nossa espécie? Evoluiu? Como evoluiu? Ou talvez uma
pergunta mais básica (ou muito mais complexa): o que é este sistema? Ainda não temos
respostas definitivas – ainda bem, se assim fosse, não evoluiria a ciência – para tais
perguntas, mas temos estudos bastante profícuos a este respeito.
Não há evidências de que outras espécies possuam um sistema de linguagem
parecido com o nosso, nem mesmos os primatas, com os quais compartilhamos tamanha
similaridade genética. Os animais que apresentam o sistema que mais se aproxima do
nosso, e isso não significa dizer que é semelhante, são os pássaros. O que poderia
surpreender a algumas pessoas, haja vista a não proximidade na cadeia de evolução
filogenética com nossos companheiros plumados. Essas e outras considerações têm
levado estudiosos a refletirem sobre questões tais como as seguintes: haveria algo
exclusivamente humano e algo compartilhado por outras espécies nesse sistema
conhecido como linguagem? O que seria este algo exclusivo/compartilhado?
Hauser et al. (2002) propõe um sistema dividido em duas instâncias: Faculty of
Language in a Narrow sense (FLN) e Faculty of Language in a Broad sense (FLB), Faculdade da
Linguagem em um sentido restrito e Faculdade da Linguagem em um sentido amplo,
respectivamente. A FLN seria uma instância na qual estariam abrigadas informações
especificamente lingüísticas. Já a FLB, seria uma instância na qual um sistema
computacional, capaz de se comunicar com o sistema da FLN interagiria com outros
17
sistemas, dentre os quais, o sistema sensório-motor e o sistema conceitual-intencional.
Abaixo, uma reprodução simplificada do esquema proposto em Hauser et al (2002):
Ambiente
externo
Ambiente interno ao organismo
Memória
Digestão
FLB
Conceitualintencional
Ecológico
FLB
Outros
sistemas
Físico
FLN
Recursividade
Itens Lexicais
Cultural
FLB
Sensório-motor
Social
Respiraçao
Circulação
Figura 1 – A Faculdade da Linguagem
O pano de fundo para esse esquema é uma visão adotada por Chomsky em seus
estudos sobre a linguagem há mais de meio século: a visão modularista de mente. Um dos
pressupostos para o estudo da linguagem nesses moldes é tomar por verdadeira a
assunção básica de que existe uma faculdade da linguagem, o que significa dizer que existe
alguma parte de mente/cérebro dedicada ao conhecimento e uso da linguagem. Essa seria
uma função particular do corpo; um tipo de órgão, poderíamos dizer, análogo ao sistema
visual, que como qualquer órgão, também é dedicado a uma tarefa exclusiva, conforme
diz Chomsky (1996), que ainda acrescenta ser essa, por hora, uma assunção, mas que há
boa evidência de que essa proposição seja verdadeira.
18
Dessa forma, a faculdade da linguagem deveria ser estudada não apenas em sua
relação com outros sistemas, mas também independentemente destes, a fim de que
pudessem ser vistas também suas especificidades. Chomsky (1988) afirma que ao
investigar tal sistema, deparamo-nos com uma série de questões, dentre as quais:
1)
O que é o sistema de conhecimento?/O que há na mente/cérebro do
falante de inglês, ou espanhol, ou japonês?
2)
Como esse sistema de conhecimento surge na mente/cérebro?
3)
Como tal conhecimento é posto em uso na fala?
4)
Quais são os mecanismos físicos que servem de base material para o
sistema de conhecimento e para o uso desse conhecimento?
A observação, mesmo rápida, de tais questões permite notar que há pelo menos
duas instâncias passíveis de investigação: uma instância física e uma instância abstrata.
Chomsky em seus estudos investiga a linguagem em um nível de análise mental, tendendo
à abstração do nível físico sem, contudo, desconsiderá-lo. 1
Em alinhamento com Chomsky, propusemo-nos a conduzir este trabalho
olhando para a instância mental. É, portanto, fundamental a observância de uma
importante distinção feita por Chomsky (op. cit.) que tangencia de alguma forma a
primeira questão apresentada acima. É proposta a distinção entre desempenho e
competência lingüísticos. Esta diria respeito a certos princípios inatos à mente/cérebro,
compartilhados por todos os indivíduos. 2 Tais princípios seriam responsáveis, por
exemplo, pela aquisição da língua à qual o indivíduo é exposto. A noção de desempenho,
por outro lado, estaria relacionada à atuação de tais princípios inatos na produção
1
Para maiores detalhes, cf. Chomsky 1993.
A este conjunto inato de princípios operativos de atividades lingüísticas, compartilhado por todos os seres
humanos, chamou-se Gramática Universal – GU.
2
19
lingüística. Nas próximas páginas, olhamos com mais atenção para o tratamento desses
princípios na teoria lingüística.
| 1.2 | A S PRIMEIRAS VERSÕES DA T EORIA
DA
GRAMÁTICA GERATIVA
Nos primeiros momentos do modelo de estudo que ficou conhecido como a
Teoria da Gramática Gerativa, Chomsky fala da faculdade da linguagem como um sistema
de regras, de dois tipos de regras: regras transformacionais e regras de reescrita categorial.
Estas derivariam a “estrutura profunda”, uma espécie de sentença intermediária, sobre as
quais atuariam as regras transformacionais, produzindo a “estrutura superficial”, que
representaria a manifestação física, sonora da sentença (cf. Raposo, 1992). Este modelo
ficou conhecido dentro dos estudos gerativos como a Teoria Padrão e recebeu destaque
com a publicação de Chomsky (1965).
Algum tempo depois, no início da década seguinte, um novo modelo da teoria é
proposto, no qual aspectos gerais, comuns a regras particulares eram abstraídos e
rotulados como princípios universais, atribuídos à Gramática Universal (GU). Essa teoria
ficou conhecida como Teoria Padrão Estendida.3
Em uma nova versão da Teoria Padrão Estendida, as regras foram eliminadas,
ficando o modelo composto apenas por princípios: princípios rígidos, invariáveis, comuns
a qualquer língua, e princípios abertos, que seriam “marcados”, teriam seu valor
estipulado apenas quando do processo de aquisição. Esses princípios “abertos” foram
chamados de parâmetros, daí o nome: Teoria de Princípios e Parâmetros, proposta por
Chomsky no início da década de 80.
3
Neste momento é proposta também a teoria X-barra, sobre a qual falaremos mais detalhadamente adiante.
20
| 1.3 | O SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO SINTÁTICA E A TEORIA X-BARRA
A introdução da Teoria X-barra nos estudos da Teoria da Gramática Gerativa se
deu quando da proposição da Teoria Padrão Estendida. Foi através da Teoria X-barra que
Chomsky conseguiu reduzir drasticamente o número de regras categoriais de reescrita a
um número bastante pequeno de opções. (cf. Raposo, 1992).
Vale lembrar que a representação de sentenças nos moldes da teoria gerativa
pode ser feita de forma arbórea ou por meio de colchetes (parentetização etiquetada,
como chama Raposo (op. cit.)). Independentemente da representação escolhida, o ponto
fundamental é que essas representações são feitas com base nos constituintes
sintagmáticos das sentenças. Cada um destes constituintes é nucleado por um elemento
que vai determinar lexicalmente a categoria sintática do constituinte sintagmático a que
ele pertence. Em outras palavras, o constituinte sintagmático VP (sintagma verbal) tem
como núcleo um verbo, o NP (sintagma nominal) tem por núcleo um nome, o AP
(sintagma adjetival) tem por núcleo um adjetivo, o PP (sintagma preposicional) é nucleado
por uma preposição e o AdvP (sintagma adverbial) é nucleado por um advérbio.
O sistema proposto pela Teoria X-barra, conforme a descrição de Haegeman
(1991), está resumidamente exposto abaixo, em uma representação arbórea da estrutura
sintagmática e também de forma esquemática, na próxima página.
XP
Spec
X’
X’
X
YP
YP
Figura 2 – Representação arbórea da estrutura sintagmática
21
XP → Spec; X’
X’ → X’; YP
X’ → X; YP
Das representações expostas na página anterior e acima, lê-se que:
complemento se une a X para formar a projeção X’; adjunto se une a X’ para formar outra
projeção X’; o especificador se une à projeção X’ mais elevada para formar a projeção
máxima XP.
Tentou-se olhar para a estrutura sentencial sob o mesmo prisma com o qual se
via a estrutura sintagmática. O resultado foi uma representação que não refletia os
princípios da teoria X-barra, como mostra o exemplo de Haegeman (1991), transcrito
abaixo.
S’
Comp
S
NP Aux VP
whether Poirot will abandon the investigation
Figura 3 – Representação arbórea de sentença
Para que a representação fosse adequada, S’ deveria ser a projeção máxima de
um nódulo terminal, mas não o é, S não é nucleado por S. Além disso, S teria três
constituintes, dois sintagmáticos e um auxiliar, quando um modelo no qual figurassem
apenas dois elementos nessa instância era preconizado. Há também o fato de que nem
todas as sentenças têm um auxiliar, muitas tem apenas uma marcação morfológica
anexada ao verbo. Pensou-se então em substituir Aux por INFL na estrutura representada
22
acima, que abrigaria, então, traços de tempo e concordância, e daria conta também de
sentenças infinitivas. Dessa forma, S passou a ser a projeção de I, sendo rotulado então
de I’, estando abaixo da projeção S’, que passou então a ser rotulada de IP. A
representação foi então revista e pode ser conferida no exemplo, também de Haegeman
(1991), transcrito abaixo.
IP
NP
I’
VP
I
V’
V
Poirot
NP
will abandon the investigation
-ed
to
Figura 4 – Representação arbórea de sentença
| 1.4 | A CISÃO DO NÓDULO FLEXIONAL
Entende-se que do modelo de representação exposto acima resultou uma árvore
sintática composta de duas camadas: uma lexical e uma flexional. Um importante estudo a
respeito dessa última camada foi o de Pollock (1989), no qual o autor propõe uma
mudança no sistema de representação. Olhando para dados do francês e do inglês, a partir
23
do estudo de Emonds (1976), o autor faz uma proposta relacionada à questão da posição
do verbo em relação ao advérbio, a partícula de negação e o quantificador nessas línguas.
No que diz respeito à posição do verbo em relação à partícula de negação, o
autor apresenta dados de ambas as línguas, indicando que no francês todos os verbos
finitos aparecem à esquerda da partícula de negação; no inglês, por outro lado, apenas os
auxiliares be (ser/estar) e have (ter) apareceriam nessa posição.
Quanto aos verbos não-finitos, em ambas as línguas os verbos lexicais aparecem
à direita da partícula de negação, mas os verbos auxiliares não finitos tanto no francês,
quanto no inglês, podem aparecer à direita ou à esquerda da negação.
No que tange à posição do verbo em relação ao advérbio e ao quantificador,
Pollock sugere que todos os verbos finitos no francês aparecem à esquerda do
advérbio/quantificador; já no inglês, apenas os verbos auxiliares be (ser/estar) e have (ter)
poderiam aparecer à esquerda destes elementos.
A análise da posição dos verbos não finitos em relação ao advérbio e ao
quantificador foi decisiva no estudo de Pollock. Segundo o autor, em inglês, os verbos
lexicais não finitos, à exceção dos auxiliares be (ser/estar) e have (ter), sempre aparecem à
direita do advérbio/quantificador. Já no Francês, os verbos não finitos podem aparecer à
direita ou à esquerda do advérbio/quantificador.
Uma modificação no sistema representacional é então proposta e pode ser
explicada em termos de movimento de constituintes. Em francês, os verbos finitos não
lexicais apareceriam à esquerda do advérbio, o que indicaria um movimento em direção a
IP. Entretanto, tais verbos não apareceriam à esquerda da partícula de negação. Pollock
postula então um sítio para a aterrissagem do verbo entre a partícula de negação e o
advérbio/quantificador. Este sítio seria o nódulo AgrP, que abrigaria as informações
24
sobre concordância verbal. O outro nódulo flexional, IP, abrigaria, portanto, as
informações referentes a tempo e passou a ser chamado de TP.
A respeito desse movimento para Agr, nomeado de Movimento curto do verbo,
estaria licenciado para o francês por apresentar Agr “forte”. Já o inglês, que conta com
uma morfologia pobre, teria Agr “opaco” à transmissão de papel temático, restringindo
tal movimento aos auxiliares. A seguir, apresentamos um modelo de como a árvore
sintática passou então a ser representada.
TP
NP
T’
T
NegP
Neg’
Neg
AgrP
Agr’
Agr
Adv/
quant
VP
V
Figura 5 – Árvore sintática após a cisão do nódulo flexional
| 1.5 | O PM E A ELIMINAÇÃO DE A GR P DA ÁRVORE SINTÁTICA
É no início da década de noventa que Chomsky apresenta uma nova versão da
Teoria Gerativa, mais ou menos nos moldes do modelo apresentado à página 17, essa
25
nova versão ficou conhecida como Programa Minimalista (PM). A Faculdade da
Linguagem (FL) passa a ser concebida como um sistema inserido em uma estrutura de
sistemas que interagem com ela, chamados de sistemas de desempenho. Na representação
proposta por Chomsky em 1992, publicada em 1995, seriam os sistemas articulatórioperceptual e conceitual-intencional.
Esses sistemas interagiriam com as representações produzidas pela linguagem,
que seria composta por dois componentes básicos: o léxico e um sistema computacional.
No léxico estariam armazenados itens/entradas lexicais, como verbetes de um dicionário.
Nessas entradas, estariam especificadas características de ordem não apenas semântica,
mas fonéticas e sintáticas. A essas informações, também chamadas de traços, são
atribuídas as diferenças específicas às línguas individuais. O que diferiria nas línguas
seriam as propriedades, os traços, presentes nas entradas lexicais, sendo as propriedades
do sistema computacional universais a todas as línguas.
O sistema computacional, em suas operações, chamadas de computações ou
derivações, utilizaria as informações disponíveis no léxico segundo princípios de
economia e condições de legibilidade. Os princípios de economia dizem respeito à
complexidade das derivações, que devem envolver o menor número de operações
possível, a fim de que sejam ótimas.
Lembremos que falamos da interação de sistemas, logo as operações devem
resultar em algo que possa ser interpretado, lido, por diferentes interfaces. Para que esse
objetivo seja alcançado, devem ser satisfeitas as condições de legibilidade. Essas
condições seriam responsáveis, por exemplo, pela eliminação de elementos supérfluos nas
representações, a fim de que estas possam ser lidas pelos sistemas de desempenho. Os
níveis que fazem interface com os sistemas de desempenho são a forma fonológica (FF) e
a forma lógica (FL). Na próxima página, reproduzimos uma representação esquemática da
faculdade de linguagem e dos sistemas de desempenho.
26
FL
spell-out
Léxico
sintaxe
aberta
FF
FL
sistema
articulatórioperceptual
sistema
conceitualintencional
Figura 6 – A Faculdade da Linguagem e os sistemas de
desempenho
Dois tipos de operações são apresentados no sistema, a operação de concatenação
e de movimento. Aquela é responsável pela concatenação de elementos lingüísticos na
composição de objetos lingüísticos; esta, por checar traços presentes nas entradas lexicais
nas línguas. Por exemplo: no sistema proposto por Pollock (1989), o movimento do
verbo era necessário para que ao radical deste fossem incorporados afixos; já na proposta
do PM, o movimento seria apenas para checar os traços já existentes na entrada lexical do
verbo. Esses traços poderiam ser fortes, sendo assim não-interpretáveis nos sistemas de
interface, ou fracos, sendo interpretáveis nas interfaces.
Retomando a noção de legibilidade e economia do sistema, Chomsky (1995)
propõe que os traços não interpretáveis devem ser eliminados na sintaxe aberta. Um dos
traços tidos como não-interpretável é o traço de concordância, que apresentaria
informação não motivada conceitualmente, logo, irrelevante para a interpretação de um
dado verbo.
27
Dessa forma, só estariam presentes na representação sintática as categorias
compostas por traços conceitualmente motivados, mais interpretáveis. O nódulo AgrP
seria, então, eliminado da árvore sintática. Retomemos, contudo, a proposta de Pollock
(1989) da necessidade de dois nódulos flexionais na estrutura das línguas. Dessa situação,
estudos surgiram tentando dar conta deste nódulo tornado “esvaziado” pela proposta do
PM.
| 1.6 | A ENTRADA DE A SP P NA ÁRVORE SINTÁTICA
A eliminação de AgrP da árvore sintática, ao mesmo tempo em que otimizou o
sistema representacional em termos de processamento, criou outro problema: Pollock já
havia demonstrado a necessidade de dois nódulos flexionais para dar conta da posição do
verbo em relação ao advérbio e a negação em francês e inglês; sendo o nódulo AgrP
eliminado, qual nódulo seria o sítio de aterrissagem para o movimento curto do verbo?
Bok-Benemma (2001) propõe que um nódulo contendo informação aspectual
seja inserido na árvore. Olhando para a posição do verbo em ralação ao advérbio do
francês e do espanhol, a autora propõe a existência de um nódulo funcional (F1), sítio de
aterrissagem para o movimento longo do verbo, bem como de um nódulo funcional (F2),
sítio de aterrissagem do movimento curto do verbo.
A autora propõe que F1 seja um nódulo contendo as informações de tempo:
[±tempo], como Pollock (op. cit.), sendo essa marcação decorrente de uma diferença
paramétrica entre as línguas. F2 seria um nódulo contendo as noções de aspecto e,
embora sempre abaixo de F1, poderia ser anexado antes ou depois de alguns tipos de
advérbio. Este nódulo seria caracterizado como [±perfectivo]. Desde então, alguns
estudos têm apresentado evidência empírica em favor da proposta descrita acima, ou seja,
a existência de um nódulo aspectual na representação sintática.
28
Novaes
e
Braga
(2005)
investigaram
a
questão
aplicando
testes
de
preenchimento de lacuna a uma paciente descrita como afásica de Broca. Nos testes, a
paciente deveria empregar formas verbais em aspecto perfectivo e imperfectivo. Os dados
revelaram uma dissociação na produção dos dois tipos de aspecto: a paciente tinha mais
dificuldade na produção de verbos no aspecto imperfectivo do que no aspecto perfectivo.
Da mesma forma, a paciente apresentou problemas com aspecto, mas não com tempo e
concordância, o que parece endossar a proposição de que Asp poderia substituir Agr na
árvore sintática.
Na próxima sessão, tratamos com mais detalhes da noção de aspecto.
29
| 2 | ASPECTO
| 2.1 | TEMPO VERSUS A SPECTO
Ao estudar as noções de tempo e aspecto, é importante que seja observada uma
distinção básica entre elas. Ambas dizem respeito à noção de temporalidade de eventos,
mas relacionam-se a esta sob diferentes perspectivas. Enquanto tempo é uma categoria
gramatical, dêitica, aspecto não o é. Tempo situa o evento do qual se fala em relação a
uma outra referência temporal, presente passado ou futuro. Aspecto, por outro lado, diz
respeito a uma visão sob o evento descrito em si mesmo, não o relacionando a uma outra
referência temporal, sendo dessa forma uma categoria não-dêitica. Segundo Comrie
(1976), pode-se dizer que “aspectos são as diferentes maneiras de se ver a constituição
temporal interna de uma situação”. 4 Para exemplificar, vejamos os exemplos abaixo:
a) Pedro está brincando.
b) Pedro estava brincando.
c) Pedro brincou.
Se contrapusermos a) e b), observamos uma diferença quanto ao tempo, a
referência é dêitica, o evento é apresentado em relação à outra referência temporal.
Entretanto, se compararmos b) e c), a diferença observada diz respeito a aspecto, à forma
como olhamos para o processo descrito pelo enunciado.
4
Tal definição tem base na definição proposta por Holt (1943:6, apud Comrie, 1976): les manières diverse de concevoir
l’écoulement du procès même – as diferentes maneiras de se conceber o fluxo do processo em si mesmo.
30
| 2.2 | ASPECTO GRAMTICAL VERSUS APSECTO LEXICAL
Vários estudos têm apontado para a existência de dois tipos de aspecto nas
línguas: gramatical e lexical. O aspecto gramatical, também chamado de viewpoint aspect
(aspecto relacionado ao modo de observação) em Smith (1991), estaria relacionado a
distinções semânticas decorrentes da utilização de mecanismos lingüísticos tais como
morfemas flexionais, verbos auxiliares etc. Para exemplificar: a distinção progressivo
versus não-progressivo ou perfectivo versus não-perfectivo é uma distinção que diz respeito
ao aspecto gramatical.
Há, por outro lado, o aspecto lexical, também chamado de situation type (tipo de
situação) por Smith (op. cit.) e semantic aspect (aspecto semântico) por Comrie (1976). Como
a nomenclatura sugere, esse tipo de aspecto diz respeito a propriedades representadas na
entrada lexical do verbo, sendo inerentes a este, e independentes de quaisquer outras
marcações morfológicas.
Os aspectos gramatical e lexical são independentes entre si. A seguir, um
conjunto de alguns exemplos:
a) Carlos passeou ontem.
b) Carlos escreveu uma carta.
c) Carlos está escrevendo uma carta.
Ao compararmos a) e b), vemos que o aspecto gramatical empregado na
construção de ambas as sentenças é o mesmo: aspecto perfectivo. Entretanto, no que diz
respeito ao aspecto lexical, a sentença a) é provida do aspecto lexical atividade, enquanto a
sentença b) apresenta o aspecto lexical accomplishment (atividade com final inerente).
Quando a comparação é feita entre b) e c), vemos que ambas compartilham o
mesmo aspecto lexical (accomplishment), mas diferem no que tange ao aspecto gramatical.
31
Em b) o aspecto gramatical empregado é o perfectivo, enquanto em c) o aspecto observado
é o imperfectivo.
| 2.3 | A SPECTO G RAMATICAL
Lembremos que a noção de aspecto gramatical conforme proposta por Comrie
(1976) está relacionada às diferentes formas de se ver a estrutura interna de uma situação.
Sua classificação para a noção de aspecto gramatical é uma das mais aceitas. Em
alinhamento com outros estudos já anteriormente apresentados, o autor propõe que a
oposição aspectual básica nas línguas é a oposição perfectivo versus imperfectivo, este por sua
vez, abrigaria outras noções aspectuais como habitual e progressivo. A seguir, o diagrama
proposto por Comrie para ilustrar as oposições aspectuais nas línguas.
Figura 7 – Diagrama de oposições aspectuais segundo Comrie
32
|2.3.1| Aspecto perfectivo versus aspecto imperfectivo
De acordo com Comrie (1976), o aspecto perfectivo “vê a situação
externamente, sem distinguir necessariamente nenhuma das estruturas internas da
situação”, estando a perfectividade relacionada à ausência de referência explícita à
constituição temporal interna da situação. A classificação proposta por Smith (1991) para
o aspecto perfectivo se aproxima da de Comrie, podendo ser o emprego desse aspecto
relacionado a uma forma de descrever uma situação como um todo, como algo “fechado”,
que apresenta o início e o fim de uma dada situação.
Além da noção de completude, da visão do evento como um todo, fechado,
apresentadas acima, o perfectivo pode ser também empregado se o falante quiser enfatizar
o término, a completude de um dado evento. (Cf. Smith, op. cit.). Abaixo, alguns exemplos:
a) Henrique comeu um croissant.
b) Henrique estava comendo um croissant.
Enquanto em a) o aspecto perfectivo propicia uma visão da situação como um
todo, vista em seu início e seu fim, o aspecto imperfectivo em b) permite uma leitura na
qual a ênfase não é a completude do processo, e sim o processo em si. Dessa forma, o
imperfectivo seria um aspecto que descreveria a situação internamente, estando
diretamente relacionado à estrutura interna da situação, seguindo as palavras de Comrie
(op. cit.).
O emprego do aspecto imperfectivo confere uma noção de incompletude ao
enunciado, uma vez que o foco não está na situação como um todo, tendo início e fim
delimitados, mas sim no processo em si, ou em algum estágio do processo. Vejamos o
exemplo a seguir proposto por Smith (op. cit.) para exemplificar a noção de “focar em
algum estágio do processo”:
33
Maria estava vencendo a corrida.
Consideremos que “vencer a corrida” refere-se ao exato momento em que a
linha de chegada é transposta, esse seria, portanto, um enunciado com um verbo do tipo
achievement, e representaria um evento instantâneo. Entretanto, segundo a autora, quando
o aspecto imperfectivo é empregado com esse tipo de verbo, a informação depreendida
do enunciado refere-se a momentos anteriores ou posteriores ao evento, mas nunca ao
evento como um todo. Sendo assim, no que diz respeito ao exemplo no final da página
anterior, sabemos que Maria estava próxima da vitória, mas não saberemos se ela, de fato,
venceu a corrida. O ponto final referente ao evento descrito foi apagado pelo aspecto
imperfectivo.
|2.3.2| Aspecto neutro
Smith (1991) acrescenta à proposta de Comrie (1976) uma outra nuance
aspectual, a qual ela chama de aspecto neutro. Segundo a autora, as sentenças com
aspecto indeterminado 5 pertenceriam a uma categoria de aspecto neutro. Tais sentenças
apresentariam duas leituras possíveis, uma aberta e outra fechada, havendo sempre uma
leitura preferencial. Segundo a autora, não haveria ocorrências desse aspecto em inglês,
mas no francês sim.
Castilho (1967) (apud. Finger, 2000), diz haver representação desse aspecto no
português do Brasil. Segundo o autor, tal aspecto estaria presente em sentenças do tipo:
A Terra gira em torno do sol.
Ao usar esse tipo de sentença, o falante expressa sua intenção de apresentar o
fato denotado pelo verbo, sem fazer qualquer referência à sua duração ou completude.
5
O termo empregado pela autora é aspectually vague sentences.
34
| 2.4 | A SPECTO LEXICAL
Retomemos
aqui
a
noção
de
aspecto
lexical
exposta
anteriormente.
Diferentemente do aspecto gramatical, que seria manifestado nas línguas por meio de
afixações ou pelo uso de outros mecanismos lingüísticos como o emprego de auxiliares,
por exemplo, o aspecto lexical estaria relacionado a um conjunto de propriedades
inerentes ao verbo, especificadas em sua entrada lexical. Vejamos as classificações mais
conhecidas...
|2.4.1| A classificação vendleriana
Um sistema de classificação do aspecto lexical dos verbos amplamente
conhecido e aceito atualmente é aquele proposto por Vendler (1967). Segundo esse
sistema, os sintagmas verbais poderiam ser alocados em quatro categorias distintas de
acordo com o tipo de situação que expressam, conforme a tabela abaixo:
EVENTOS
Categoria
Exemplos
Estados
Atividades
Processos com
fim inerente
Eventos
instantâneos
amar
desenhar
desenhar um
círculo
começar
desejar
escrever
escrever uma
carta
morrer
saber
nadar
ler um romance
nascer
Tabela 1 - Classificação verbal Vendleriana
35
Uma primeira divisão pode ser feita entre os verbos que expressam estados e os
verbos que expressam eventos. Um verbo que expressa estado dá conta de uma situação
na qual durante algum período de tempo não há mudança na condição de certa entidade.
Um verbo que expressa um evento, ao contrário, dá conta de uma situação na qual
podemos observar alguma mudança num período de tempo.
A classe de verbos que são usados para descrever eventos pode ser divida em
três subclasses. Uma dessas subclasses é a classe de verbos que são empregados para
descrever atividades. Tomemos o verbo nadar em a), abaixo:
a) João está nadando.
b) João nada mil metros.
c) Pedro venceu a maratona.
Quando lemos ou ouvimos uma sentença como a expressa em a), pensamos na
atividade que está se desenvolvendo ao longo do tempo, sem levarmos em conta o fim de
tal atividade. Mas, se a sentença é b), temos, então, um exemplo de outra subclasse, que
comporta os verbos que dão conta de situações com um fim inerente. Ao pensarmos em
“João nada mil metros”, temos a perfeita noção de que um processo se desenvolve
durante algum tempo, mas possui um fim inerente.
Há ainda uma subclasse na qual se alocam os verbos que representam eventos
instantâneos como nascer ou morrer. Há uma mudança de estado, mas ela se dá num
período de tempo muito curto, instantaneamente, como em c), em que o processo que
levou Pedro a vencer a maratona pode ter sido longo, mas o evento vencer é instantâneo e
se dá nos segundos em que o vencedor cruza a linha de chegada.
36
|2.4.2| A classificação verkuyliana
Em oposição à classificação apresentada anteriormente, encontra-se aquela
proposta por Verkuyl (2003). Segundo o autor, os verbos poderiam ser agrupados em
apenas três grupos, de acordo com um diagrama de traços reproduzido a seguir.
NP
[±
±SQA]
Estados
V
[-SQA]
[+SQA]
Processos
Eventos
[-ADD TO]
[+ADD TO]
Figura 8 – Classificação verbal Verkuyliana
Na classificação apresentada acima, a classe Processos estaria relacionada à classe
Atividades, proposta por Verkuyl. Já as classes Processos com fim inerente e Eventos instantâneos
estão aqui representadas na classe Eventos. Segundo Verkuyl, os verbos agrupados nas
duas últimas classes da classificação vendleriana são igualmente eventos, sendo a
diferença na extensão do evento (se instantâneo ou alongado temporalmente) um dado
não relevante lingüística, senão extralingüisticamente.
Mas a classificação de Verkuyl difere da de Vendler não apenas pela quantidade
de grupamentos, mas pelos critérios através dos quais estes são compostos. Vendler
propõe uma classificação com base em traços inerentes ao verbo. Verkuyl, entretanto,
conjuga traços verbais com traços dos argumentos internos dos verbos para definir a
quais classes os verbos pertenceriam. No diagrama acima, o traço [±ADD TO] diz
37
respeito à natureza do verbo: se ele é um verbo estativo, possui o traço [-ADD TO]; se
não, possui o traço [+ADD TO]. O traço [±SQA] diz respeito à cardinalidade do
complemento verbal; se este é de cardinalidade especificada, possui o traço [+SQA]; se a
cardinalidade do complemento for não especificada, o traço é –[SQA].
A organização tripartida desse sistema de classificação verbal contrasta com o
esquema apresentado por Vendler (1976), por exemplo. A classificação vendleriana é
composta por quatro (4) classes: State, Activity, Accomplishment e Achievement. Essas duas
últimas foram colapsadas na classe Evento por Verkuyl. Para Vendler (1976),
Accomplishments envolvem um processo que conduza a uma mudança de estado, enquanto
Achievements não trazem essa noção de processo estendido, mas antes a idéia de uma
transformação instantânea. Verkuyl argumenta em favor de sua classificação dizendo que
a extensão do processo é consideração extralingüística, não tendo, portanto,
conseqüências lingüísticas.
O sistema de classificação apresentado por Verkuyl (2003) se insere em um
modelo de estudo chamado de Composicionalidade Aspectual, a respeito do qual falamos com
mais detalhes no próximo capítulo.
38
| 3 | A NOÇÃO DE COMPOSICIONALIDADE ASPECTUAL
A noção de composicionalidade traz em si uma idéia bastante simples e que está
longe de ser nova: estruturas menores se unem na composição de estruturas maiores. Tal
idéia já figurava há algum tempo em outros domínios do saber como a filosofia ou físicoquímica. Para exemplificar, parece-nos válida a noção de que moléculas são estruturas
complexas formadas por átomos, e estes por componentes ainda menores e que cada um
destes componentes tem especificidades e desempenham papéis singulares nessa
composição.
A idéia de composicionalidade na lingüística surge, então, propondo que a
construção do sentido de sintagmas e frases seja vista a partir da união de seus
componentes menores. No que se refere a aspecto, a idéia apresentada por Frege no
início do século XX foi amplamente aceita e encontrou eco especialmente no campo de
estudos da semântica. Verkuyl (2003) destaca que a noção de informação aspectual não
atômica, já demonstrada por Poutsma e Jacobsohn (apud Verkuyl, op. cit.) no início do
século, ganha novos ares nos anos 50.
A noção de estrutura sintagmática/arbórea, disponibilizada em meados do
século foi fundamental para uma mudança de foco, ou talvez para um melhor ajuste deste,
nos estudos sobre composicionalidade aspectual. Segundo Verkuyl (op. cit.), a noção de
recursividade proposta por Chomsky tem origem na mesma tradição lógica de adjungir
estruturas menores para formar estruturas maiores. Entretanto, somente a partir da noção
de estrutura sintagmática proposta por Chomsky, foi possível ver que os estudos sobre a
composicionalidade deveriam ser conduzidos de modo a analisar a junção dos verbos com
seus argumentos na formação de unidades maiores.
Segundo a proposta da composicionalidade aspectual, a noção de aspecto seria
entendida como uma propriedade não exclusiva ao verbo em si, mas composta a partir da
39
relação entre o verbo e seu argumento. Slabakova (1997) demonstra essa relação nos
exemplos do inglês transcritos abaixo:
a) Claire ate an apple.
Claire
ate
the
apple.
Claire
comerPASS uma maçã
‘Claire comeu/comia uma maçã.’
b) Claire ate three apples.
Claire
ate
three apples.
Claire
comerPASS três maçãs
‘Claire comeu/comia três maçãs.’
c) Claire ate the apple.
Claire
ate
the
Claire
comerPASS a
‘Claire comeu/comia a maçã.’
apple.
maçã
d) Claire ate a piece of cake.
Claire
ate
a
piece of cake.
Claire
comerPASS um
pedaço de torta
‘Claire comeu/comia um pedaço de torta.’
e) Claire ate apples.
Claire
ate
apples.
Claire
comerPASS maçãs
‘Claire comeu/comia maçãs.’
f) Claire ate cake.
Claire
ate
cake.
Claire
comerPASS bolo
‘Claire comeu/comia bolo.’
Segundo a autora, as sentenças de a) a d) são terminativas, enquanto as demais
são durativas. Uma vez que a forma verbal ate é a mesma, a diferença aspectual deve ser
atribuída à diferença entre os sintagmas nominais que servem de argumento interno ao
verbo. Estaríamos, então, presenciando a interação entre propriedades atemporais dos
sintagmas nominais e propriedades temporal-aspectuais dos sintagmas verbais e frases.
40
Para dar conta da interação de tais propriedades, as quais chama de informação
semântica, Verkuyl (2003) postula dois traços, um relacionado à natureza do complemento
e outro à natureza do verbo. O primeiro traço, [±Specified Quantity of A] ([± Quantidade
especificada de A]) ou [±SQA], está relacionado à cardinalidade do sintagma nominal. Se
este denota algo que pode ser exaustivamente contado ou medido, trata-se de um
sintagma de cardinalidade especificada como uma maçã, três maçãs, etc, diferentemente de
maçãs, bolo, etc, que pertencem ao grupo de elementos de cardinalidade não especificada.
O segundo traço proposto por Verkuyl (op. cit.), [±ADD TO], visa à distinção
entre verbos estativos como querer, por exemplo, de verbos eventivos como comer. A
propriedade [+ADD TO] do verbo expressaria um progresso dinâmico, mudança, nãoestatividade ou qualquer outro termo que o distinga de um verbo estativo, que teria um
valor negativo para tal propriedade.
A Figura 9 representa esquematicamente o sistema da composicionalidade
aspectual proposto por Verkuyl (op. cit.). Sua idéia geral é que o verbo (V), especificado
com um valor positivo ou negativo para uma dada propriedade semântica, [±ADD TO],
une-se ao argumento interno (NPint ), também especificado com um valor positivo ou
negativo para uma propriedade semântica, formando um sintagma verbal (VP) em um
nível no qual um objeto semântico complexo é formado ([±T VP ]). Este objeto semântico
complexo se une ao argumento externo (NPext ), gerando uma sentença sem marcação de
tempo (S), que possuiria a informação aspectual complexa ([±TS ]), engendrada nos níveis
mais baixos, representada por meio de um traço aspectual complexo. Este processo
estaria então terminado e a sentença passaria a um domínio superior, nos quais outros
princípios atuariam. Para marcar a transição entre esses dois domínios, o autor propõe a
distinção entre aspectualidade interna e externa (Inner – Outer aspectuality).
41
S’
...
Outer aspectuality
Inner aspectuality
S [±TS]
NPext [±SQA] VP [±TVP]
V [±ADD TO] NPint [±SQA]
Figura 9 – A Composicionalidade Aspectual
A composicionalidade desses traços na produção de uma leitura durativa ou
terminativa é governada pelo Princípio-MAIS (PLUS-Principle), sobre o qual falaremos
mais detalhadamente na próxima seção, comentando também sua relação com a noção de
constância do sentido dos verbos.
| 3.1 | V ERBOS E A COMPOSICIONALIDADE ASPECTUAL
|3.1.1| O princípio-mais
Como
vimos
na
seção
anterior,
é
fundamental
para
a
teoria
da
composicionalidade aspectual a relação entre o verbo (V) e seu argumento interno (NPint).
Essas duas variáveis podem ser assinaladas com um valor positivo ou negativo para os
traços [±ADD TO] e [±SQA], respectivamente, e é a partir da combinação dos valores
42
dessas variáveis que será produzida uma leitura terminativa ou durativa6 de uma dada
sentença. Verkuyl (2003) exemplifica a proposta ao mesmo tempo em que chama a
atenção para a constância do sentido do verbo:
a) Mary walked three miles.
Mary walked
three
miles.
Mary andarPASS
três
milhas
‘Mary andou/andava três milhas.’
b) Mary walked miles.
Mary walked
miles.
Mary andarPASS
milhas
‘Mary andou/andava milhas.’
As sentenças poderiam ser representadas, em termos de traços, da seguinte
maneira:
a) V [+ADD TO] +NP int[+SQA] → [+TVP ]
b) V [+ADD TO] +NP int[-SQA] → [-T VP ]
Em ambas as sentenças, o valor referente ao verbo foi mantido. Entretanto, a
modificação do valor referente ao complemento foi o bastante para a produção de duas
leituras, uma terminativa a) e uma durativa b). No diagrama reproduzido na próxima
página, Verkuyl apresenta outros exemplos das combinações dessas variáveis e as leituras
produzidas, exemplificando a atuação do Princípio-MAIS em dois níveis: verbo mais
argumento externo e verbo mais argumento interno. Neste trabalho, olharemos com mais
atenção para a segunda relação.
6
Utilizamos a nomenclatura proposta por Verkuyl, segundo a qual terminativo faz referência à descrição de um evento
compreendido em um espaço de tempo delimitado, enquanto durativo refere-se à descrição de um evento em um
intervalo temporal aberto.
43
a) [S Mary
[VP walk
three miles]]
[+T S [+SQA] [+T VP [+ADD TO] [+SQA]]]
→
terminativa
b) [S Mary
[VP walk
[-TS [+SQA] [-T VP [+ADD TO]
→
durativa
[VP walk
three miles]]
[+T VP [+ADD TO] [+SQA]]]
→
durativa
c) [S Children
[-T S [-SQA]
d) [S Mary
[VP save
[-T S [+SQA] [-T VP [-ADD TO]
miles]]
[-SQA]]]
three miles]]
[+SQA]]]
→
durativa
Os exemplos acima foram utilizados para exemplificar a formulação do que
Verkuyl chamou de Princípio-MAIS, segundo o qual, para a obtenção de uma leitura
terminativa, é necessário que tanto o verbo quanto seus argumentos estejam marcados
positivamente [+ADD TO] e [+SQA], respectivamente. Em outras palavras, apenas uma
marcação negativa [-], para qualquer um dos fatores, verbo ou argumento, seria o
suficiente para gerar um [-T] no topo da representação apresentada na Figura 9.
Smollet (2006), entretanto, argumenta que, com a devida contextualização,
expressões compostas por um verbo do tipo [+ADD TO] e um complemento do tipo
[+SQA] podem receber uma leitura télica ou atélica. A seguir, alguns exemplos:
a) Thomas mixed the batter
for 5 minutes.
in 5 minutes.
Thomas
mixed
the
batter
Thomas
mexerPASS a
massa
‘Thomas mexeu a massa por 5 minutos.’
for
por
5
5
minutes.
minutos
Thomas
mixed
the
batter
Thomas
mexerPASS a
massa
‘Thomas mexeu a massa em 5 minutos.’
in
em
5
5
minutes.
minutos
44
b) Anne Marie polished the countertop
for 15 minutes.
in 15 minutes.
Anne Marie polished
the
countertop
Anne Marie lustrarPASS o
balcão
‘Anne Marie poliu o balcão por 15 minutes.’
for
por
15
minutes.
15 minutes
Anne Marie polished
the
countertop
Anne Marie lustrarPASS o
balcão
‘Anne Marie lustrou o balcão em 15 minutes.’
in
em
15
minutes.
15 minutes
Em ambos os exemplos, as duas interpretações são possíveis. Segundo Smollet
(2006), a relação entre o verbo e seu complemento não seria o suficiente para estabelecer
um télos nesses enunciados. Acrescenta, ainda, que há outros elementos que podem ser
considerados “verdadeiros delimitadores” tais como resultativos ou certas partículas, e
apresenta outros exemplos do inglês:
c) Anne Marie polished the countertop smooth.
(resultativo)
Anne Marie polished
the
countertop
smooth.
Anne Marie lustrarPASS o
balcão
liso/homogêneo
‘Anne Marie lustrou o balcão até que ele estivesse com um aspecto
homogêneo.’
d) Anne Marie polished up the countertop.
(partícula)
Anne Marie polished
up
the
countertop.
Anne Marie lustrarPASS PARTÍCULA o
balcão
‘Anne Marie lustrou o balcão.’
Estes seriam meios de expressar finitude em uma língua que não marca finitude
morfologicamente. Tenny (1994, apud Smollet, op. cit.) sugere que mesmo o julgamento de
verbos individualmente varia de falante para falante e atribui essa “confusão” ao fato de o
inglês não possuir marcação morfológica para finitude.
Em um estudo conduzido em português do Brasil, Celeri (2007) investigou
como falantes dessa língua lidam com a noção de terminatividade. Foram elaborados oito
testes nos quais as variáveis morfologia verbal e quantificação do complemento figuravam
em contextos mais ou menos terminativos. Um pequeno texto servia de contextualização
45
para a sentença alvo. Ao final do texto, era perguntado ao informante se algo lhe soava
mal. Os resultados revelaram um elevado grau de aceitação de combinações que
contradizem as previsões de Verkuyl, como por exemplo: um complemento de
cardinalidade menos especificada associado a um verbo de caráter mais eventivo em um
contexto mais terminativo. Segundo o “princípio-mais” a combinação descrita acima
engendraria, necessariamente uma leitura menos terminativa.
Outro estudo, este conduzido em espanhol da Argentina, apresentou resultados
que corroboram os descritos acima. Nesse estudo, Celeri (2008) utilizou um programa de
conversas instantâneas para investigar as variáveis apresentadas acima. A cada informante
eram expostas as oito condições experimentais. Novamente, o alto índice de aceitação das
combinações, em princípio, impossíveis para Verkuyl, aponta para o fato de que um verbo
eventivo [+ADD TO] acompanhado de complemento de cardinalidade especificada
[+SQA], não engendra, necessariamente, uma interpretação télica.
Tendo em vista o norte apontado pelos experimentos descritos, sentimo-nos
compelidos à realização de um novo experimento, no qual investigamos a relação entre a
presença de um adjunto e terminatividade de um enunciado. Nas próximas páginas,
descrevemos esse experimento, apresentando também os resultados e algumas
considerações.
46
| 4 | DADOS
Na feitura desse experimento, buscamos um modelo experimental no qual as
sentenças pudessem ser analisadas de maneira mais precisa, em outras palavras, tentamos reduzir
o contexto textual apresentado anteriormente. Em vez da contextualização lingüística, optamos
pelo emprego de figuras, como será explicado detalhadamente mais adiante.
| 4.1 | INFORMANTES
Foram selecionados para participação neste experimento 19 (dezenove) falantes
nativos do Português do Brasil. Com o objetivo de evitar possíveis interferências por efeito de
variação diatópica, controlamos também a naturalidade dos informantes: todos eram cariocas e
residentes no Rio de Janeiro. Os informantes foram alocados em diferentes grupos de acordo
com os seguintes critérios: faixa etária, nível de escolaridade e sexo.
Foram estabelecidas duas faixas etárias. A faixa etária I abrigou indivíduos de dezoito
(18) a vinte e oito (28) anos, já na faixa etária II foram abrigados os informantes com idades ente
vinte e nove (29) e trinta e nove (39) anos. A idade média na primeira faixa etária foi de vinte e
quatro (24) anos e na segunda de trinta e um (31) anos de idade.
Com relação ao nível de escolaridade, também foram criados dois grupos. Em um
deles, foram alocados os indivíduos com no mínimo o ensino superior completo. Esse grupo foi
chamado de grupo com alta escolaridade. No outro grupo, foram alocados os indivíduos com no
máximo o ensino médio completo. Esse grupo foi chamado de grupo com escolaridade média.
No que diz respeito ao sexo, foram formados dois grupos, um com oito (8) indivíduos
do sexo feminino e outro com oito (8) indivíduos do sexo masculino.
A fim de que houvesse maior sistematização quanto ao número de indivíduos em cada
grupo, foram descartados aleatoriamente, dentro de seus respectivos grupos, os formulários de
47
três (3) informantes. A distribuição de informantes segundo os critérios já expostos pode ser
sistematizada conforme segue.
Faixa etária I
(entre 18 e 28 anos)
Faixa etária II
(entre 29 e 39 anos)
2 homens
2 homens
2 mulheres
2 mulheres
2 homens
2 homens
2 mulheres
2 mulheres
Alta
escolaridade
Média
escolaridade
Tabela 2 – Distribuição de informantes no experimento
| 4.2 | DESENHO DO TESTE
Nosso intento nesse teste foi investigar a relação entre a noção de terminatividade e o
sintagma verbal, bem como, a possibilidade de essa relação ser alterada pela presença de locuções
adverbiais. Para tanto, foram elaboradas sentenças que julgamos ter caráter mais terminativo e
sentenças com caráter menos terminativo. Como dito anteriormente, buscamos reduzir o
contexto lingüístico nesse experimento. Dessa forma, a verificação dessas sentenças foi feita por
meio de figuras representativas de ações em desenvolvimento e de ações já terminadas.
|4.2.1| As sentenças
Foram elaboradas para o experimento quarenta e oito (48) sentenças, das quais metade
eram sentenças alvo e metade, sentenças distratoras. Dentre as sentenças alvo, doze (12) eram
compostas por quatro (4) palavras (sujeito, verbo e objeto direto) e as demais eram compostas
48
por sete (7) palavras (sujeito, verbo, objeto direto e locução adverbial). O mesmo número de
palavras foi respeitado para as sentenças distratoras.
Locuções adverbiais foram empregadas em metade das sentenças alvo para conferir às
sentenças um caráter mais ou menos terminativo. Sendo assim, como sentenças alvo, figuraram
no experimento: sentenças de quatro (4) palavras, ensejando leituras mais e menos terminativas, e
sentenças de sete (7) palavras, com um adjunto adverbial, também ensejando leituras mais e
menos terminativas.
As sentenças distratoras diferiam das sentenças alvo, em princípio, pelo tipo de verbo,
que era mais eventivo nestas e menos eventivo naquelas. Além disso, o tipo de adjunto
empregado nas sentenças distratoras não implicava em uma mudança de leitura quanto à
terminatividade. A tarefa dos informantes nos conjuntos experimentais distratores era semelhante
à tarefa nos conjuntos experimentais alvo. Entretanto, o conhecimento subjacente à resposta ao
experimento não era de caráter aspectual, mas lexical, uma vez que o informante tinha de
relacionar à sentença a figura que apresentasse um objeto, gesto ou idéia que o remetesse à idéia
expressa na sentença.
Sendo assim, os grupos experimentais distratores serviriam primordialmente para criar
a demanda por outros mecanismos de pensamento e evitar que o informante percebesse o que
estava sendo investigado no experimento. Entretanto, alguns grupos experimentais distratores
foram selecionados e constituídos de elementos verificadores. Três (3) grupos localizados no
início, no meio e no fim do experimento foram analisados a fim de verificar o grau de atenção do
informante. Se o informante relacionasse, por exemplo, a sentença “Maria sentiu muita alegria
durante sua vida.” à figura de uma mulher triste e a sentença “Maria sentiu muita tristeza.” à
figura de uma mulher sorrindo, é muito provável que o indivíduo estivesse respondendo ao
experimento aleatoriamente7. Nesse caso, o formulário desse informante seria descartado. Todas
as sentenças utilizadas no experimento estão disponíveis no ANEXO.
7
Tal comportamento não foi verificado entre os informantes.
49
|4.2.2| Os verbos
Foram escolhidos para a elaboração das sentenças alvo verbos de caráter mais
eventivo8, uma vez que um verbo de caráter mais estativo não serviria ao propósito de investigar
ações terminadas ou em andamento. Verbos estativos foram empregados nas sentenças
distratoras. Em ambos os casos, foi escolhido um verbo de cada conjugação, conforme exposto
abaixo. Além da questão das terminações verbais, atentamos também para o fato de que em
português dispomos de uma rica morfologia, a qual está bastante associada à idéia de
terminatividade. Sendo assim, das vinte e quatro (24) sentenças alvo e distratoras, em doze (12)
figurava morfologia verbal normalmente associada ao imperfectivo (como em cantava) e em doze
(12) figurava morfologia verbal normalmente associada ao perfectivo (como em cantou).
Tipo de sentença
Tipo de verbo
1a Conjugação
2a Conjugação
3a Conjugação
Alvo
[+] eventivo
recortar
comer
corrigir
Distratora
[–] eventivo
amar
saber
sentir
Tabela 3 – Verbos utilizados no experimento
|4.2.3| As figuras
Foram feitas quarenta e oito (48) figuras que estavam diretamente relacionadas às
sentenças elaboradas para o experimento. No caso das figuras que se referiam a sentenças alvo,
uma figura apresentava uma ação em desenvolvimento e sua correspondente, a ação já terminada.
Quanto às figuras referentes a sentenças distratoras, elas traziam algo, uma expressão facial, um
objeto, que de alguma forma era representativo do exposto nas sentenças a elas relacionadas.
8
Conforme descrito no capítulo 2, à pagina 36.
50
|4.2.4|Organização e procedimento
As sentenças e figuras foram agrupadas em vinte e quatro (24) conjuntos
experimentais, dos quais doze (12) eram conjuntos experimentais alvo e doze (12) eram conjuntos
experimentais distratores. Em cada página do experimento foram dispostas duas (2) figuras e (2)
sentenças que estavam relacionadas entre si, conforme mostram as Figuras 11 e 12. A ordem para
a disposição dos conjuntos experimentais, bem como das figuras e das sentenças foi aleatória,
para dificultar que o informante formulasse qualquer tipo de “esquema” para resposta ao
experimento com base na seqüência dos elementos apresentados.
Ao informante eram apresentadas as instruções da forma escrita na primeira página do
experimento. Uma página de treinamento seguia a página de instruções. Nesse momento,
instruções verbais eram dadas e quaisquer dúvidas quanto à resposta ao experimento eram
sanadas. Seguindo a página de treinamento, uma página exibia a pergunta: “Podemos iniciar o
experimento?”. Após doze (12) conjuntos experimentais, era perguntado ao informante se ele
gostaria de parar por alguns minutos ou se era possível seguir com o experimento. O objetivo era
permitir algum descanso aos informantes, em caso de eles se sentirem cansados, para que o
cansaço não interferisse nos resultados.
Aos informantes era dito que em cada página do experimento eles veriam duas
sentenças e duas figuras. Sua tarefa seria ler as sentenças, observar as figuras e dizer as relações
entre as sentenças e as figuras, que deveriam ser expressas em frases do tipo: “A sentença ‘x’
corresponde à figura ‘y’” ou similares.
51
Figura 10 – Exemplo de conjunto experimental alvo
Figura 11 – Exemplo de conjunto experimental distrator
52
| 4.3 | R ESULTADOS
Esperávamos que os resultados desse experimento se alinhassem com os resultados
obtidos por CELERI (2006, 2007). O que significa dizer que: esperávamos que com a devida
contextualização, independentemente da natureza do complemento (se de cardinalidade
especificada ou não), ou da morfologia empregada (se perfectivo ou imperfectivo), uma frase
poderia receber uma leitura mais ou menos terminativa. Os resultados, expostos a seguir em
diferentes análises, parecem apontar que nossa expectativa estava correta.
Gráfico 1 – Relação sentença-figura interna aos conjuntos experimentais alvo (CE)
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
CE2
CE3
CE5
CE8
CE9
CE11 CE13 CE14 CE17 CE18 CE20 CE21
No gráfico acima está representado o número de informantes que fez a relação
sentença-figura conforme havíamos previsto: a sentença de leitura menos terminativa associada à
figura representativa de uma ação em desenvolvimento e a sentença com leitura mais terminativa
associada à figura representativa da ação completada. Essas combinações foram feitas pelos
informantes nas seguintes proporções: nos conjuntos experimentais 5, 8 e 9 tal associação foi
feita por cem por cento (100%) dos informantes. Nos conjuntos 3, 11 e 21, noventa e três vírgula
setenta e cinco por cento (93,75%) dos informantes fizeram a associação supracitada. Para os
conjuntos 2, 14, 17 e 18, o índice foi de oitenta e sete vírgula cinco por cento (87,5%) e para os
53
conjuntos 13 e 20, o índice foi de oitenta e um vírgula vinte e cinco por cento (81,25%). Os
resultados mostram que a associação ora descrita aconteceu em grande escala, o que nos leva a
crer que tal relação deve ser tratada com atenção.
Gráfico 2 – Relação sentença-figura versus nível de escolaridade
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Alta escolaridade
Média escolaridade
O gráfico acima nos mostra que os informantes com mais anos de escolaridade
fizeram mais freqüentemente a associação entre uma sentença menos terminativa e uma figura
representativa de uma ação em desenvolvimento, mais precisamente, tal associação foi feita por
esse grupo em noventa e um vírgula sessenta e seis por cento (91,66%) dos casos. Entretanto, a
diferença entre as duas faixas de escolaridade não se mostrou relevante: dois por cento (2%).
O Gráfico 3, representativo da relação sentença-figura de acordo com a faixa etária
dos informantes, nos mostra resultados que corroboram os anteriores, não comprometendo a
análise proposta, mas tráz um dado novo que pode apontar para um possível estudo de caráter
sociolingüístico.
54
Gráfico 3 – Relação sentença-figura versus faixa etária
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
29-39 anos de idade
18-28 anos de idade
Em ambos os grupos, o nível de relacionamento entre sentença terminativa e figura de
ação já concluída foi bastante elevado. Note-se que enquanto os indivíduos no grupo de maior
idade associaram figuras e sentenças terminativas e vice-versa em noventa e oito vírgula noventa e
seis por cento (98,96) dos casos, o grupo de menor idade fez tal associação em oitenta e dois
vírgula três por cento (82,3%), um valor também alto, mas representativo de uma diferença de
dezesseis vírgula sessenta e seis por cento (16,66). Falando em termos absolutos, no grupo de
maior idade em apenas um grupo experimental observou-se a associação sentença mais
terminativa e figura representativa de ação em desenvolvimento.
No gráfico a seguir, apresentamos a análise geral dos dados obtidos, ou seja, o número
total de informantes versus o número total de grupos experimentais. Os resultados mostram que a
relação que esperávamos que acontecesse, de fato, aconteceu – e em número expressivo. Em
noventa vírgula sessenta e dois por cento (90,62%) dos casos, a associação feita foi de uma
sentença de caráter menos terminativo a uma figura representativa de uma ação em
desenvolvimento e de uma figura de caráter mais terminativo a uma figura de uma ação já
completada. Em apenas nove vírgula trinta e oito por cento (9,38%) dos casos a associação
contrária foi feita.
55
Gráfico 4 – Relação sentença-figura
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Sent. [+] Term. - Fig. [+] Term.
Sent. [+] Term. - Fig. [ - ] Term.
56
| 5 | PROPOSTA DE ANÁLISE
Os dados apresentados nos capítulos anteriores se alinham e apontam para uma
mesma direção: na composição da nuance aspectual de uma sentença, há que se atentar para a
relação entre o verbo e seu complemento, mas não apenas.
Em sua proposta, Verkuyl afirma que para a obtenção de uma leitura mais terminativa
em uma sentença bastariam além de um sujeito de cardinalidade especificada, um verbo de caráter
eventivo e um complemento também de cardinalidade especificada. É ignorado, entretanto, o
importante papel que os adjuntos podem desempenhar.
Autoras como Slabakova (2000) e Smollet (2006) pontuaram a questão de que apenas
o verbo e seus argumentos não bastariam para compor o aspecto de um enunciado, usando para
tal, exemplos do inglês no qual figuram partículas chamadas de resultativas, por exemplo. Em
ambos os trabalhos supracitados, bem como em alguns outros, o valor dos adjuntos não foi
considerado.
Ao olharmos para tal questão, investigando dados do português do Brasil, produzimos
um estudo a esse respeito. Os resultados encontrados nos permitiram algumas constatações
bastante interessantes no que tange a essa língua e em última instância à representação mental da
noção de aspecto.
Retomemos agora a noção de composicionalidade aspectual proposta por Verkuyl
(2003), cujo modelo foi reproduzido na página 41 e a seguir para facilidade de consulta. Segundo
tal esquema e de acordo com o Princípio-MAIS, seria necessária apenas uma marcação negativa,
seja no sujeito, no verbo, ou no complemento, para que uma sentença tivesse uma leitura menos
terminativa. Tal proposta nos parece bastante atraente, mas tal qual foi formulada, não prevê a
ocorrência de adjuntos. Sendo assim, somos levados a propor uma análise que dê conta da
inserção do adjunto no modelo de composicionalidade apresentado até então.
57
Poderíamos, então, assumir que o NPint se une ao verbo formando V’ e a este se uniria
o adjunto, formando um complexo VP. Seguindo a análise aqui proposta, o Princípio-MAIS seria,
a priori, invalidado, uma vez que, segundo tal princípio, bastaria uma marcação negativa para que
a interpretação da sentença fosse menos terminativa, mas com a inserção de um adjunto, ainda
que o NPint apresente um valor negativo, é possível obter uma leitura mais terminativa.
Apresentamos abaixo dois exemplos de sentenças retiradas de nosso experimento:
a)
Maria
recortou
algumas fotografias.
NPext [+SQA]
[+ADD TO]
NPint [- SQA]
Leitura: - Terminativa
b)
Maria
recortou
algumas fotografias
NPext [+SQA]
[+ADD TO]
NPint [- SQA]
antes de escrever.
Leitura: + Terminativa
A proposta de Verkuyl dá conta da leitura menos terminativa obtida na sentença
apresentada em a). Tal proposta foi corroborada pelos resultados obtidos em nosso experimento,
em se tratando de sentenças semelhantes a essa. Entretanto, vemos que em b), a despeito da
marcação negativa no argumento interno, a leitura preferida em nosso experimento foi a mais
terminativa.
Dessa forma, os resultados obtidos em nosso experimento apontam para a necessidade
de uma revisão do Princípio-MAIS. Tal princípio, que a priori seria invalidado em face da
sentença b), pode ser, contudo, salvo se assumirmos que:
a) o Princípio-MAIS é operante em sentenças desprovidas de adjuntos; e
b) em sentenças nas quais figuram um adjunto, a informação quanto à terminatividade
fornecida pelo adjunto9 poderia ter primazia sobre a marcação do NPint.
9
A natureza da informação aspectual oferecida pelo adjunto não foi escopo de nosso trabalho. Pesquisas
ulteriores poderão mostrar de que forma o tipo de adjunto se relaciona à informação com a qual ele contribui na
composição do aspecto de uma sentença.
58
A marcação proposta por Verkuyl diz respeito apenas à quantificação do
complemento. Com a adjunção de uma locução adverbial, por exemplo, tal marcação (do
complemento) torna-se irrelevante e o esquema apresentado na Figura 9 teria de ser modificado.
A seguir, reproduzimos a Figura 9 e apresentamos na Figura 12 uma proposta de modificação da
representação do sistema da composicionalidade aspectual na qual é prevista a possibilidade da
adjunção de um elemento que mudaria a marcação desse complexo.
A proposta que fazemos contempla os resultados obtidos em experimentos nos quais
figuravam adjuntos. Dessa forma, julgamos ser o esquema apresentado na Figura 12 mais
adequado para dar conta das expressões lingüísticas do que o esquema proposto por Verkuyl,
uma vez que na representação ora proposta, é prevista a ocorrência de adjuntos e fica patente a
importância do adjunto na composição do aspecto da sentença.
S’
...
S [±TS]
Outer aspectuality
Inner aspectuality
NPext [±SQA] VP [±TVP]
V [±ADD TO] NPint [±SQA]
Figura 9 – A Composicionalidade Aspectual
59
S’
...
Outer aspectuality
Inner aspectuality
S [±TS]
NPext [±SQA] VP [±TVP]
Adj/Adv
V’
V [±ADD TO] NPint[±SQA]
Figura 12 – A Composicionalidade Aspectual – Representação modificada
60
| 6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS
A motivação de nossos estudos tem sido compreender um pouco mais sobre como
esse fascinante sistema ao qual chamamos de linguagem está representado na mente/cérebro do ser
humano. Dessa forma, foi extremamente profícua e prazerosa nossa breve expedição em solos da
questão que tem norteado nossos estudos: a representação mental da noção de tempo e em
especial da noção de aspecto.
Falamos da proposta da visão modularista de mente/cérebro, segundo a qual a
Faculdade da linguagem seria um sistema que interagiria com outros sistemas, chamados de
sistemas de desempenho, como os sistemas sensório-motor e conceitual-intencional.
Falamos ainda de uma forma específica de se investigar a questão da linguagem
humana, olhando para a representação da linguagem em um nível mental. Desta feita, falamos da
Teoria da Gramática Gerativa, mostrando como essa teoria evoluiu desde suas primeiras versões
até o Programa Minimalista, que apresenta hoje um modelo de linguagem como sistema ótimo,
segundo uma abordagem computacional.
Paralelamente à descrição dessa evolução, falamos das diferentes formas de como as
noções de tempo e aspecto foram vistas ao longo dessa trajetória. Focamo-nos, então, na noção
de aspecto, apresentando algumas tendências para o estudo dessa noção. Concentramo-nos na
proposta segundo a qual, tal noção seria engendrada a partir da composição de vários elementos
como o verbo e seus argumentos.
Por fim, com base nos dados obtidos em nossos experimentos, que se alinham com
dados obtidos em outros trabalhos, mostramos que a presença ou ausência do adjunto adverbial é
de extrema relevância na composição do aspecto de uma sentença.
Tal assunção abre caminho para outros estudos a respeito do tema, como por
exemplo, estudos nos quais a questão da quantificação do argumento externo seja investigada.
61
Igualmente, nos parece ser profícua a investigação a respeito de quais tipos de adjunto encerram
traços capazes de engendrar uma leitura mais ou menos terminativa.
Cabe, ainda, destacar que tomamos para estudo e apresentamos evidência em favor de
um modelo no qual se assume que parte da informação aspectual seria engendrada em níveis
baixos da representação arbórea. Tal afirmação pode incitar à discussão a respeito de
pressupostos e modelos consagrados na Teoria Gerativista como, por exemplo, a presença de
informação flexional na camada dita lexical.
Sendo assim, e tendo em vista os achados e possíveis desdobramentos apresentados
neste trabalho, esperamos ter contribuído de alguma forma para fazer avançar os estudos
lingüísticos, tão importantes para a compreensão da mente humana.
62
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Associação Nacional de Pós-graduação em Letras e Lingüística. Rio de Janeiro. Pontifícia
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63
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Verkuyl, H.(2003) Aspectual composition: surveying the ingredients. In: de Swart, van Hout and
Verkuyl (Ed.). Perspectives on Aspect. Dordrecht: Kluwer. 2003.
64
ANEXO A – SENTENÇAS UTILIZADAS NO EXPERIMENTO
Índices das referências das sentenças
[ A|1|4|P|+|+]
a b c d e f
a – Natureza da sentença: Alvo ou Distratora
b – Conjugação do verbo: Primeira, Segunda ou Terceira
c – Número de elementos da sentença: quatro (4) ou sete (7)
d – Morfologia empregada no verbo: Morfologia de Perfectivo ou de Imperfectivo
e – Especificação quanto à quantificação do complemento: Mais ou Menos especificada
f – Leitura esperada, no tangente a terminatividade: Mais ou Menos terminativa
Exemplo:
Sentença 1 - Maria recortou o texto.
Sentença
Alvo
Verbo de primeira
conjugação
[A|1|4|Pe|+|+]
Composta por
4 elementos
[ A | 1 | 4 | Pe | + | + ]
Morfologia de
Perfectivo
Complemento
quantificado
Mais
Terminativa
65
Sentenças na ordem de apresentação do experimento
Sentença 1 -
Maria amava fazer cartões.
[D|1|4| Im |○|○]
Sentença 2 -
Maria amava fazer cartões com papéis coloridos.
[D|1|7| Im |○|○]
Sentença 3 -
Maria comeu alguns biscoitos antes de sair.
[A|2|7|Pe|–|+]
Sentença 4 -
Maria comeu alguns biscoitos.
[A|2|4|Pe|–|–]
Sentença 5 -
Maria recortava uma revista.
[A|1|4| Im |+|+]
Sentença 6 -
Maria recortava uma revista enquanto ouvia notícias.
[A|1|7| Im |+|–]
Sentença 7 -
Maria sabia fazer bananadas.
[D|2|4| Im |○|○]
Sentença 8 -
Maria sabia fazer sobremesas com creme chantili.
[D|2|7| Im |○|○]
Sentença 9 -
Maria corrigiu o exercício.
[A|3|4|Pe|+|+]
Sentença 10 - Maria corrigiu o exercício quase por inteiro.
[A|3|7|Pe|+|–]
Sentença 11 - Maria sentia muita dor.
[D|3|4| Im |○|○]
Sentença 12 - Maria sentia muita alegria ontem à tarde.
[D|3|7| Im |○|○]
Sentença 13 - Maria soube das notícias.
[D|2|4|Pe|○|○]
Sentença 14 - Maria soube das notícias lendo o jornal.
[D|2|7|Pe|○|○]
Sentença 15 - Maria corrigia um teste enquanto ouvia música.
[A|3|7| Im |+|–]
Sentença 16 - Maria corrigia um teste.
[A|3|4| Im |+|+]
Sentença 17 - Maria recortou algumas fotografias.
[A|1|4|Pe|–|–]
Sentença 18 - Maria recortou algumas fotografias antes de escrever.
[A|1|7|Pe|–|+]
Sentença 19 - Maria sentiu muita tristeza.
[D|3|4|Pe|○|○]
Sentença 20 - Maria sentiu muita alegria durante sua vida.
[D|3|7|Pe|○|○]
Sentença 21 - Maria recortou o texto.
[A|1|4|Pe|+|+]
Sentença 22 - Maria recortou o texto quase por inteiro.
[A|1|7|Pe|+|–]
Sentença 23 - Maria sabia fazer pizza.
[D|2|4| Im |○|○]
Sentença 24 - Maria sabia fazer moquecas com bastante camarão.
[D|2|7| Im |○|○]
66
Sentença 25 - Maria recortava algumas fotos.
[A|1|4| Im |–|–]
Sentença 26 - Maria recortava algumas fotos antes da colagem.
[A|1|7| Im |–|+]
Sentença 27 - Maria corrigiu alguns exercícios.
[A|3|4|Pe|–|–]
Sentença 28 - Maria corrigiu alguns exercícios antes de digitar.
[A|3|7|Pe|–|+]
Sentença 29 - Maria soube fazer café.
[D|2|4|Pe|○|○]
Sentença 30 - Maria soube fazer café com a cafeteira.
[D|2|7|Pe|○|○]
Sentença 31 - Maria sentia muita saudade.
[D|3|4| Im |○|○]
Sentença 32 - Maria sentia muita saudade de sua família.
[D|3|7| Im |○|○]
Sentença 33 - Maria comia uma maçã.
[A|2|4| Im |+|+]
Sentença 34 - Maria comia uma maçã enquanto lia revistas.
[A|2|7| Im |+|–]
Sentença 35 - Maria comia alguns cereais.
[A|2|4| Im |–|–]
Sentença 36 - Maria comia alguns cereais antes do suco.
[A|2|7| Im |–|+]
Sentença 37 - Maria amou os panfletos.
[D|1|4|Pe|○|○]
Sentença 38 - Maria amou as fotografias tiradas na viagem.
[D|1|7|Pe|○|○]
Sentença 39 - Maria corrigia algumas provas.
[A|3|4| Im |–|–]
Sentença 40 - Maria corrigia algumas provas antes da leitura.
[A|3|7| Im |–|+]
Sentença 41 - Maria comeu a maçã.
[A|2|4|Pe|+|+]
Sentença 42 - Maria comeu a maçã por uns segundos.
[A|2|7|Pe|+|–]
Sentença 43 - Maria amou os chocolates.
[D|1|4|Pe|○|○]
Sentença 44 - Maria amou os presentes que recebeu ontem.
[D|1|7|Pe|○|○]
Sentença 45 - Maria sentiu muita pena.
[D|3|4|Pe|○|○]
Sentença 46 - Maria sentiu muita alegria com as notícias.
[D|3|7|Pe|○|○]
Sentença 47 - Maria amava ler livros.
[D|1|4| Im |○|○]
Sentença 48 - Maria amava ler revistas nas horas vagas.
[D|1|7| Im |○|○]
67
Classificação das figuras utilizadas em conjuntos experimentais alvo
Figura 3 -
[–] Terminativa
Figura 4 -
[+] Terminativa
Figura 5 -
[+] Terminativa
Figura 6 -
[–] Terminativa
Figura 9 -
[+] Terminativa
Figura 10 -
[–] Terminativa
Figura 15 -
[+] Terminativa
Figura 16 -
[–] Terminativa
Figura 17 -
[+] Terminativa
Figura 18 -
[–] Terminativa
Figura 21 -
[+] Terminativa
Figura 22 -
[–] Terminativa
Figura 25 -
[+] Terminativa
Figura 26 -
[–] Terminativa
Figura 27 -
[+] Terminativa
Figura 28 -
[–] Terminativa
Figura 33 -
[+] Terminativa
Figura 34 -
[–] Terminativa
Figura 35 -
[–] Terminativa
Figura 36 -
[+] Terminativa
Figura 39 -
[+] Terminativa
Figura 40 -
[–] Terminativa
Figura 41 -
[–] Terminativa
Figura 42 -
[+] Terminativa
68
ANEXO B – CONJUNTOS EXPERIMENTAIS
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras - Centro de Letras e Artes
Programa de Pós-graduação em Lingüística
- EXPERIMENTO -
69
Instruções para o experimento
Em cada página do experimento você verá:
- 2 sentenças
- 2 figuras
- um indicativo numérico de ordem
Sua tarefa é:
- ler as sentenças
- observar as figuras
- dizer a qual figura corresponde cada sentença
A próxima página é apenas um treinamento.
70
Maria falava ao telefone enquanto
corrigia trabalhos.
Sentença 49
Figura 49
Sentença 50
Figura 50
Maria falava ao telefone.
25
71
Podemos iniciar o experimento?
72
Maria amava fazer cartões.
Sentença 1
Figura 1
Maria amava fazer cartões com papéis
coloridos.
Sentença 2
Figura 2
1
73
Maria comeu alguns biscoitos antes de
sair.
Sentença 3
Figura 3
Maria comeu alguns biscoitos.
Sentença 4
Figura 4
2
74
Maria recortava uma revista.
Sentença 5
Figura 5
Maria recortava uma revista enquanto
ouvia notícias.
Sentença 6
Figura 6
3
75
Maria sabia fazer bananadas.
Sentença 7
Figura 7
Maria sabia fazer sobremesas com
creme chantili.
Sentença 8
Figura 8
4
76
Maria corrigiu o exercício.
Sentença 9
Figura 9
Maria corrigiu o exercício quase por
inteiro.
Sentença 10
Figura 10
5
77
Maria sentia muita dor.
Sentença 11
Figura 11
Maria sentia muita alegria ontem à
tarde.
Sentença 12
Figura 12
6
78
Maria soube das notícias.
Sentença 13
Figura 13
Maria soube das notícias lendo o
jornal.
Sentença 14
Figura 14
7
79
Maria corrigia um teste enquanto ouvia
música.
Sentença 15
Figura 15
Sentença 16
Figura 16
Maria corrigia um teste.
8
80
Maria recortou algumas fotografias.
Sentença 17
Figura 17
Maria recortou algumas fotografias
antes de escrever.
Sentença 18
Figura 18
9
81
Maria sentiu muita tristeza.
Sentença 19
Figura 19
Maria sentiu muita alegria durante sua
vida.
Sentença 20
Figura 20
10
82
Maria recortou o texto.
Sentença 21
Figura 21
Maria recortou o texto quase por
inteiro.
Sentença 22
Figura 22
11
83
Maria sabia fazer pizza.
Sentença 23
Figura 23
Maria sabia fazer moquecas com
bastante camarão.
Sentença 24
Figura 24
12
84
Estamos na metade do experimento. Você gostaria de parar
alguns minutos e retomar em seguida
ou podemos continuar?
85
Maria recortava algumas fotos.
Sentença 25
Figura 25
Maria recortava algumas fotos antes da
colagem.
Sentença 26
Figura 26
13
86
Maria corrigiu alguns exercícios.
Sentença 27
Figura 27
Maria corrigiu alguns exercícios antes
de digitar.
Sentença 28
Figura 28
14
87
Maria soube fazer café.
Sentença 29
Figura 29
Maria soube fazer café com a cafeteira.
Sentença 30
Figura 30
15
88
Maria sentia muita saudade.
Sentença 31
Figura 31
Maria sentia muita saudade de sua
família.
Sentença 32
Figura 32
16
89
Maria comia uma maçã.
Sentença 33
Figura 33
Maria comia uma maçã enquanto lia
revistas.
Sentença 34
Figura 34
17
90
Maria comia alguns cereais.
Sentença 35
Figura 35
Maria comia alguns cereais antes do
suco.
Sentença 36
Figura 36
18
91
Maria amou os panfletos.
Sentença 37
Figura 37
Maria amou as fotografias tiradas na
viagem.
Sentença 38
Figura 38
19
92
Maria corrigia algumas provas.
Sentença 39
Figura 39
Maria corrigia algumas provas antes da
leitura.
Sentença 40
Figura 40
20
93
Maria comeu a maçã.
Sentença 41
Figura 41
Maria comeu a maçã por uns
segundos.
Sentença 42
Figura 42
21
94
Maria amou os chocolates.
Sentença 43
Figura 43
Maria amou os presentes que recebeu
ontem.
Sentença 44
Figura 44
22
95
Maria sentiu muita pena.
Sentença 45
Figura 45
Maria sentiu muita alegria com as
notícias.
Sentença 46
Figura 46
23
96
Maria amava ler livros.
Sentença 47
Figura 47
Maria amava ler revistas nas horas
vagas.
Sentença 48
Figura 48
24
97
Muito Obrigado!
98
ANEXO C – FICHA DE CONTROLE DE INFORMANTES E RESPOSTAS
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade de Letras – Centro de Letras e Artes
Programa de Pós-graduação em Lingüística
Controle de informantes e respostas ao experimento
Informante: ___________________________________________________________________
Idade: _______________________________________________________________________
Grau de escolaridade: ___________________________________________________________
Ocupação/Formação: ___________________________________________________________
Naturalidade: __________________________________________________________________
Sentença [ 1 ] - Figura [
]
Sentença [ 25 ] - Figura [
]
Sentença [ 2 ] - Figura [
]
Sentença [ 26 ] - Figura [
]
Sentença [ 3 ] - Figura [
]
Sentença [ 27 ] - Figura [
]
Sentença [ 4 ] - Figura [
]
Sentença [ 28 ] - Figura [
]
Sentença [ 5 ] - Figura [
]
Sentença [ 29 ] - Figura [
]
Sentença [ 6 ] - Figura [
]
Sentença [ 30 ] - Figura [
]
Sentença [ 7 ] - Figura [
]
Sentença [ 31 ] - Figura [
]
Sentença [ 8 ] - Figura [
]
Sentença [ 32 ] - Figura [
]
Sentença [ 9 ] - Figura [
]
Sentença [ 33 ] - Figura [
]
Sentença [ 10 ] - Figura [
]
Sentença [ 34 ] - Figura [
]
Sentença [ 11 ] - Figura [
]
Sentença [ 35 ] - Figura [
]
Sentença [ 12 ] - Figura [
]
Sentença [ 36 ] - Figura [
]
Sentença [ 13 ] - Figura [
]
Sentença [ 37 ] - Figura [
]
Sentença [ 14 ] - Figura [
]
Sentença [ 38 ] - Figura [
]
Sentença [ 15 ] - Figura [
]
Sentença [ 39 ] - Figura [
]
Sentença [ 16 ] - Figura [
]
Sentença [ 40 ] - Figura [
]
Sentença [ 17 ] - Figura [
]
Sentença [ 41 ] - Figura [
]
Sentença [ 18 ] - Figura [
]
Sentença [ 42 ] - Figura [
]
Sentença [ 19 ] - Figura [
]
Sentença [ 43 ] - Figura [
]
Sentença [ 20 ] - Figura [
]
Sentença [ 44 ] - Figura [
]
Sentença [ 21 ] - Figura [
]
Sentença [ 45 ] - Figura [
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Sentença [ 22 ] - Figura [
]
Sentença [ 46 ] - Figura [
]
Sentença [ 23 ] - Figura [
]
Sentença [ 47 ] - Figura [
]
Sentença [ 24 ] - Figura [
]
Sentença [ 48 ] - Figura [
]
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