Nota taquigráfica 08.05.14

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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
Versão para registro histórico
Não passível de alteração
COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA
EVENTO: Audiência Pública
REUNIÃO Nº: 0549/14
DATA: 08/05/2014
LOCAL: Plenário 7
INÍCIO: 09h44min
TÉRMINO: 13h04min
PÁGINAS: 64
das Comissões
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
ELISA ARGIA BASILE CATTAPPAN - Coordenadora-Geral de Hepatites Virais do Ministério da
Saúde.
EVALDO STANISLAU AFFONSO DE ARAÚJO - Diretor Técnico do Grupo Esperança de São
Paulo.
HOEL SETTE JÚNIOR - Gastroenterologista de São Paulo - SP.
SUMÁRIO
Conveniência de mobilização de autoridades governamentais e representantes de
organizações civis brasileiras pela quebra de patente de medicamentos considerados
fundamentais para o tratamento de portadores do vírus da hepatite C.
OBSERVAÇÕES
Houve exibição de imagens.
Houve intervenções fora do microfone. Inaudíveis.
Há oradores não identificados em breves intervenções.
Há palavras ou expressões ininteligíveis.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Amauri Teixeira) - Bom dia. Declaro aberta a
presente reunião.
Informo aos Srs. Parlamentares que esta reunião está sendo transmitida ao
vivo pela Internet, no site da Câmara. As imagens e o áudio estarão disponíveis para
serem baixados na página desta Comissão logo após o encerramento dos trabalhos.
As fotos do evento serão disponibilizadas no banco de imagens da Agência Câmara,
na página da Câmara. As filmagens da TV Câmara poderão ser solicitadas à
Secretaria desta Comissão.
Esta
reunião de audiência pública foi convocada,
nos termos do
Requerimento nº 530, de 2014, do Deputado Geraldo Thadeu, aprovado por esta
Comissão, para debater as hepatites virais no Brasil.
Convido para compor a Mesa o Sr. Deputado Federal Darcísio Perondi,
Presidente da Frente Parlamentar da Saúde; a Sra. Elisa Argia Basile Cattappan,
Coordenadora-Geral de Hepatites Virais do Ministério da Saúde; o Sr. Evaldo
Stanislau Affonso de Araújo, Diretor Técnico do Grupo Esperança - SP; e, por fim, o
Dr. Hoel Sette Júnior, Gastroenterologista de São Paulo - SP.
Eu comunico aos membros desta Comissão que cada convidado terá o prazo
de 15 minutos para a sua exposição inicial, prorrogáveis a juízo desta Presidência,
período no qual não poderão ser aparteados; os Deputados inscritos para interpelar
os convidados poderão fazê-lo estritamente sob o assunto da exposição, pelo prazo
de 3 minutos, tendo o interpelado igual prazo para a resposta, facultadas a réplica e
a tréplica pelo mesmo prazo; não é permitido ao orador interpelar nenhum dos
presentes.
É tradição desta Comissão que o requerente presida a reunião de audiência
pública. Então, eu convido o requerente, Deputado Geraldo Thadeu, para, a partir de
agora, assumir a condução dos trabalhos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Eu quero cumprimentar a
todas e todos os presentes, em especial aos componentes da Mesa, e agradecer ao
Deputado Amauri Teixeira pela abertura dos trabalhos desta audiência pública.
Agradeço também à equipe da Comissão de Seguridade Social e Família.
É uma alegria muito grande aqui estar com os amigos e amigas que fazem
parte desta Mesa, como o Deputado Darcísio Perondi, Presidente da Frente
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Parlamentar da Saúde, grande amigo e companheiro, que luta muito em defesa do
SUS, da saúde pública em nosso País.
Agradeço a presença à Dra. Elisa Argia Basile Cattappan, CoordenadoraGeral de Hepatites Virais do Ministério da Saúde, e aproveito para justificar a
ausência do Dr. Fábio Mesquita, que tinha um compromisso no Rio de Janeiro,
agendado anteriormente. Está aqui a Dra. Elisa, representando o Ministério da
Saúde.
Agradeço também a presença ao Dr. Evaldo Stanislau Affonso de Araújo,
Diretor Técnico no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP,
profundo conhecedor das hepatites e que, tenho certeza, dará uma grande
contribuição a esta audiência pública.
Agradeço ainda a presença ao Dr. Hoel Sette Júnior, Gastroenterologista em
São Paulo, grande cientista, que trabalha há décadas com da hepatite, meu médico
particular, que me acompanha. Eu tive a felicidade de negativar o vírus. Estamos
nesta luta, juntos, há muito tempo.
E quero salientar a presença de ONGs, que fazem um importantíssimo
trabalho nesta luta. Elas reivindicam, acompanham tudo. Tiveram papel fundamental
em todas as conquistas nesta área.
Dando início a esta audiência pública, eu vou passar a palavra à Dra. Elisa
Argia Basile Cattappan, para que faça a sua explanação com tranquilidade.
A SRA. ELISA ARGIA BASILE CATTAPPAN - Bom dia a todos.
Eu agradeço aos senhores, em especial ao Dr. Geraldo Thadeu, que nos
convidou para esta audiência. Agradeço a todos pela presença. Eu vim no lugar do
Dr. Fábio Mesquita, Coordenador do Departamento de DST, AIDS e Hepatites
Virais, que está representando o Ministro no Rio de Janeiro.
Antes de dizer qualquer coisa mais, eu vou contar minha breve história. Sou
médica há 37 anos, aposentada há 2 anos. Sou portadora do vírus da hepatite C.
Descobri isso há 17 anos. Tratei duas vezes e não sarei. Então o destino cruzou o
meu caminho e eu fui parar no Ministério da Saúde, no Departamento de DST, AIDS
e Hepatites Virais, com o firme objetivo de ajudar a resolver esse problema que
aflige tantos brasileiros, e alguns até nem sabem.
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Estima-se que devam existir mais ou menos 3 milhões de pessoas infectadas
sem saber. Por quê? Porque a hepatite C é uma doença infecciosa silenciosa e
sorrateira. Ela só manifesta seus sintomas quando a situação já está muito ruim para
o paciente, com fibrose, hepatocarcinoma... Então, todo o nosso empenho é em
diagnosticar e tratar a doença.
Para que isso seja possível, a gente tem que saber quantas pessoas são
portadoras do vírus. Mesmo que medicação nova não esteja ainda disponível, o
tempo de espera pode se dar de dois jeitos. Um, a pessoa tendo uma vida saudável
e tomando atitudes, decisões e escolhas para viver bem. Porque a primeira coisa
que alguém que tenha o diagnóstico de hepatite não deve mais fazer é beber. E é
preciso ter uma alimentação saudável e praticar atividade física, porque, mesmo
com o vírus da hepatite presente, circulante, com carga viral alta ou baixa, tanto faz,
a atividade física preserva o fígado do paciente. Isso vale para qualquer patologia.
Então, isso foi o que me motivou a estar aqui.
Eu queria agora apresentar um apanhado geral das hepatites no Brasil, ou
melhor, um apanhado das ações do Ministério da Saúde no trato das hepatites.
(Segue-se exibição de imagens.)
O Departamento foi criado em 2002. Nesse período, ele se associou a outro,
depois se desassociou. O Dr. Fábio Mesquita foi convidado para assumir o
Departamento de DST, AIDS e Hepatites Virais no mês de junho. Já no mês de
setembro foi feita a flexibilização do PCDT — Protocolo Clínico e Diretrizes
Terapêuticas. Até então existiam os novos inibidores da protease — IPs, mas a
distribuição e a liberação da medicação era algo muito complexo. Com a
flexibilização do PCDT, com o Suplemento 2, a distribuição dos IPs ficou muito
melhor, tanto que aumentou muito o número de pacientes tratados.
O que tem feito o Ministério? E quando eu falo em Ministério, refiro-me ao
Departamento de DST/AIDS. Nós temos feito reuniões com a sociedade civil, com
todos os grupos envolvidos, com todos os grupos foco, com exceção do grupo que é
o portador da hepatite C e não sabe. Eu tento fazer da minha voz a voz de um
monte de pacientes que não sabem ter a doença, e nisto eu me empenho de corpo e
alma.
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Têm sido feitos fóruns de consultas públicas, que começaram no ano passado
e se encerraram este ano, para ouvir todas as sugestões e encaminhamentos da
sociedade civil, porque ela é o termômetro das ações do Ministério.
Estes são os fóruns. O último foi feito agora, em Sergipe. Nós sempre
atuamos em conjunto com as ONGs.
Falando especificamente das hepatites, no período de 2009 a 2012 foram
notificados 138.305 casos de hepatite A, com 867 óbitos. A hepatite A é aquela que
todo mundo relaciona ao nome “hepatite”, é aquela que dá o amarelão. Essa
hepatite é ligada ao saneamento básico e pode ser muito bem controlada se
cuidarmos de botar cal na fossa, de deixar a fossa longe de onde está a fonte de
água, de clorar a água, de lavar bem os alimentos, de higienizar aquilo que a gente
ingere.
Hepatite B: 120.343 casos, com 9.659 óbitos.
E hepatite C, que é sempre subdiagnosticada, porque em geral é diagnóstica
em casos extremos, ou por obra do acaso, teve 82.041 casos, com 30.931 óbitos.
Isto significa 37% de óbito dos pacientes que tiveram o diagnóstico, o que é um
número muito grande. Em 10 anos, esses pacientes evoluíram para óbito.
A hepatite D está mais ligada à Região Amazônica — o paciente tem que ter
tido a hepatite B também. Foram diagnosticados 2.197 casos, com 437 óbitos.
E a hepatite E teve 967 casos diagnosticados, com 86 óbitos. A hepatite E
segue o padrão da hepatite A.
Com relação à hepatite B no Brasil, a gente percebe nas Regiões Sul e
Sudeste, que têm a maior população, também a maior incidência.
Esta é a curva de distribuição, equivalente do outro mapa, do outro eslaide.
Aqui, o coeficiente de mortalidade. Observa-se que aumentou um bocadinho
o número de óbitos por hepatite B, principalmente no sexo masculino.
A Região Sudeste é a que mais apresenta casos de hepatite C, o que não
significa que a Região tenha o maior número de infectados. Mas, provavelmente, ela
tem o maior número de postos de atendimentos — até 2013, havia pelo menos 52
locais de atendimento, o que facilita muito o atendimento ao paciente e o diagnóstico
—, e com uma rede de saúde talvez mais bem estruturada.
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Aqui, a distribuição entre os sexos, masculino e feminino, e a faixa etária.
Percebe-se que a incidência da doença é maior na faixa etária acima dos 35 anos.
Dos 40 anos em diante aumentam muito os casos de hepatite C. Por quê? Vários
fatores concorreram para que a hepatite C ficasse mais latente e aparecesse nesta
população específica.
A partir de 1993, foi feito o controle dos bancos de sangue. Até então, todo
mundo que recebia sangue corria um grande risco de se contaminar sem saber.
Então, muita gente que recebeu sangue está tranquilo, acha que não tem nada, mas
essa população que recebeu sangue antes de 1993 deveria, obrigatoriamente,
procurar a rede e fazer um teste para detecção do vírus da hepatite C. Naquela
época não se conhecia a hepatite C. Não havia meios de controle tão adequados,
nem o padrão de excelência que se tem hoje.
Aqui, a hepatite D. O paciente precisa ter a hepatite B para a hepatite D se
desenvolver, porque ela usa parte do vírus da hepatite B para se proliferar.
E a hepatite E tem o mesmo perfil da hepatite A, cuja contaminação ocorre
pela água.
Outra coisa extremamente importante é o custo dessa doença silenciosa e o
número de óbitos que ela causa.
Por exemplo: no ano de 2013 foram feitos 1.726 transplantes de fígado.
Desses 1.726 transplantes, as hepatites C ou B foram responsáveis por 31,5% dos
casos. Mas eu acredito que, nesta distribuição de diagnóstico, talvez haja muito mais
hepatite C, porque ela é catalogada com a primeira CID, e não com as CIDs
secundárias e terciárias. Quando formos analisar melhor isso, futuramente, e
fizermos o cruzamento das CIDs secundárias e terciárias, provavelmente as
hepatites virais serão responsáveis por um número muito maior do que 31%. Mesmo
assim, esse já é um número bastante alto. E, considerando-se o custo de um
transplante de fígado, não só o custo imediato do transplante, mas todo o custo póstransplante, há de se ter um alto valor, e a vida do paciente que faz o transplante fica
muito complicada. O melhor seria investirmos sempre no diagnóstico, na elucidação
da doença. Agora, com o advento das novas terapias, com certeza isso tudo vai
mudar.
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Para resolver o problema no Brasil, em todos os Estados, foi criada uma rede
para fazer carga viral, detecção e genotipagem. A rede foi distribuída da seguinte
forma: todos os Estados do Brasil têm pelo menos um laboratório de carga viral, um
de genotipagem, um de carga de B e um de C — alguns Estados apresentam muito
mais laboratórios, é lógico.
A partir de 2011 se começou a usar o teste rápido para triagem. Os Estados
Unidos têm usado um sistema, que aqui ainda não é totalmente adotado, que
consiste em se fazer um teste rápido com a carga viral e encaminhar o paciente para
tratamento. Isto, segundo informação do pessoal do CDC — Centro de Controle e
Prevenção de Doenças. Em 2011 foram feitos 30 mil testes e no ano passado nós
distribuímos mais de 2 milhões e 100 mil testes.
Aqui está a distribuição até o ano passado dos locais, dos SAEs — Serviços
de Assistência Especializada que fazem o tratamento da hepatite C. Há muitos mais
do que estes que tratam a hepatite B, mas estes são os SAEs distribuídos por
Estado até o fim do ano passado. Do fim do ano passado para cá, já foram abertos
pelo menos mais 20 em todo o Brasil, que tratam com o IP.
Estes aqui são os números do gerenciamento logístico dos pacientes de
hepatite B e C, tratados com Interferon, de uma forma geral. No ano passado,
33.138 pacientes. E nestes pacientes estão incluídos os tratados com os inibidores
de protease.
Este gráfico só mostra que, até antes da flexibilização do protocolo de
tratamento, com o lançamento do Suplemento 2, em setembro do ano passado, o
número de pacientes tratados era bem baixo. Com a flexibilização do tratamento e a
ampliação do acesso, foram tratados no ano passado 1.963 pacientes. E, este ano,
em 3 meses apenas, já iniciaram o tratamento 1.418 pacientes. Isto significa que, se
seguirmos esta progressão, conseguiremos tratar pelo menos 5.000 pacientes este
ano. É o que esperamos.
Quais são os desafios do Departamento? O maior deles, como eu disse
anteriormente, é dimensionar quantas pessoas são portadoras de hepatites virais,
tanto B quanto C. Por quê? Porque, quando a gente consegue dimensionar o
número de pacientes, o que só é feito a partir do diagnóstico, a gente consegue se
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organizar e estruturar melhor o sistema de saúde para o atendimento dessa
população.
A ampliação do sistema de vigilância e informação estratégica também é
fundamental. O Departamento realizou uma simplificação da ficha de notificação,
para cobrir todas as necessidades, mas também para tirar todos os obstáculos e
dificuldades.
Aumentar o número de pessoas tratadas e testadas é fundamental, porque,
da mesma forma como o Ministério se preocupou em tratar o HIV, é objetivo do
Departamento, do Ministério, tratar a hepatite com a mesma visibilidade e com o
mesmo empenho.
Temos advogado as práticas seguras, tanto para os funcionários da área de
saúde quanto para as populações-chave, como os indígenas. Estamos investindo
em treinamento de equipes de redução de danos para usuários de drogas,
profissionais do sexo e os baby boomers, ou seja, aquela população portadora
silenciosa do vírus da hepatite C.
O SR. DEPUTADO AMAURI TEIXEIRA - Elisa, permita-me. Eu gostaria de
justificar minha saída. Sou Presidente da Comissão Especial que discute a Medida
Provisória nº 634, de 2013, e nós temos agora uma reunião no Senado, então peço
licença e desculpas. É comum nesta Casa nós termos atividades paralelas. Eu peço
desculpas, mas terei que me ausentar.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós agradecemos a
presença ao Deputado Amauri Teixeira, Parlamentar muito solícito, muito amigo,
muito preocupado com as questões de saúde do povo brasileiro, e que deu uma
grande contribuição para que esta audiência pública fosse realizada.
Muito obrigado pela presença e pelo trabalho. Sucesso lá na Comissão.
Nós já estamos no limite.
A SRA. ELISA ARGIA BASILE CATTAPPAN - O que é mais importante de
tudo é o seguinte: para tratar a hepatite C, há antiviral, há os inibidores da protease
agora e vai haver novas medicações. Porém, para a hepatite B, o único jeito é não
se ter a doença. Para isso, além de usar preservativo, estar vigilante, é necessária a
vacinação sistemática. A hepatite B pode ser erradicada com projetos de vacinação
sistemática de todos os recém-nascidos, de todos os adolescentes e com a
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determinação de toda a sociedade de divulgar a necessidade de se vacinar, porque,
para a prevenção da hepatite B, a única coisa que adianta é a vacina, que está
liberada para pessoas de zero a 49 anos, mas também para quem mais a quiser
tomar, inclusive todos os grupos de risco.
Eu acho que com isso dá para a gente ter uma visão geral, embora todo
mundo que está aqui, provavelmente, conheça isso de trás para frente.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Muito obrigado, Dra.
Elisa, pela explanação.
Agora nós vamos passar a palavra ao Dr. Evaldo Stanislau Affonso de Araújo,
que também é um grande conhecedor do processo das hepatites, defende a causa
com muita força e, realmente, tenho certeza de que vai contribuir muito com nossa
audiência pública.
Dr. Evaldo, eu passo a palavra ao senhor, para sua explanação.
O SR. EVALDO STANISLAU AFFONSO DE ARAÚJO - Eu queria
cumprimentar todos, desejando-lhes um bom dia.
Vou fazer uma apresentação de cunho um pouco mais técnico, mas,
inicialmente, eu queria agradecer, em nome do Grupo Esperança, o convite para
estar aqui — fizeram um híbrido e me apresentaram como Diretor Técnico do
Hospital das Clínicas, mas, na verdade, eu sou médico do Hospital das Clínicas e
Diretor Técnico e fundador do Grupo Esperança, uma ONG de Santos de combate
às hepatites.
Aqui eu represento o Grupo Esperança, que trabalha em parceria com a OSF
— Open Society Foundations, a quem agradeço por ter viabilizado a vinda de todos
os parceiros, as ONGs, e por vir estruturando essas atividades que se iniciaram no
ano passado com uma reunião científica com o Dr. Fábio Mesquita e as ONGs e
onde a gente começou este debate. Houve outra atividade recentemente, no início
de abril, no Rio de Janeiro, e hoje estamos aqui, nesta audiência pública que pode
fazer história — e eu tenho certeza de que fará —, graças ao apoio decisivo do
Deputado Geraldo Thadeu e desta Casa.
Então, eu queria agradecer à OSF; queria agradecer, sobremaneira, ao
Deputado Geraldo Thadeu, que também é um militante de longa data desta causa;
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queria cumprimentar o Deputado Darcísio Perondi e o Deputado Amauri Teixeira e
agradecer a presença de ambos; e também queria saudar a Deputada Maria Lucia
Prandi, que é também uma guerreira, uma lutadora e uma militante da causa das
hepatites desde a sua atividade na Assembleia Legislativa de São Paulo.
Quero ainda ressaltar, antes de passar para a minha apresentação, que se
nada mais do que eu disser ficar na memória de cada um — e eu queria dizer isso
especialmente para os Deputados —, o mais importante é que nós estamos vivendo
um momento ímpar em que o Ministério da Saúde, a sociedade civil, os médicos
aqui representados, inclusive, pela Sociedade Brasileira de Hepatologia, com o seu
Presidente, Dr. Edison Parise, e esta Casa de Leis podem fazer história.
Não há precedente no que está acontecendo em relação à hepatite C no
momento. Talvez um precedente seja o que ocorreu no enfrentamento da epidemia
do HIV. A AIDS era uma doença mortal e hoje é uma doença crônica, graças à
decisão desta Casa de Leis de aprovar uma lei que obrigou o tratamento de todos os
pacientes e da decisão do Governo brasileiro de enfrentar esse problema. Esse é o
precedente. Mas é diferente, porque, na hepatite C, nós podemos falar da mudança
de uma doença crônica que se cura pouco, para uma doença que seja 100% curável
e, por que não dizer, erradicável.
Eu tenho certeza de que esta audiência pública marca o início do fim da
hepatite C no Brasil, porque o Ministério da Saúde vem trabalhando nesse sentido, a
sociedade civil organizada e a sociedade científica vêm trabalhando nesse sentido.
E tenho certeza de que, a partir desta audiência pública, ganharemos o apoio desta
Casa de Leis, dos Deputados, para que, junto ao Governo brasileiro e a todos os
que têm trabalhado nessa área, erradiquemos a hepatite C no Brasil.
Feito isso, eu peço licença para fazer uma apresentação de cunho um pouco
mais científico, mas que se conclui com um pouco do que eu estou falando. Peço
desculpas antecipadamente, porque alguns diapositivos estão em inglês, mas eu
vou lê-los. Eles são muito mais para apoiar a nossa fala do que essencialmente para
transmitir uma mensagem integral.
(Segue-se exibição de imagens.)
Como eu falei, eu sou médico infectologista, assistente-doutor do Hospital das
Clínicas, fundador e diretor técnico do Grupo Esperança, de Santos, sou membro do
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Comitê Assessor de Hepatites do Ministério da Saúde, membro do Comitê
Estratégico de Hepatites da Organização Mundial da Saúde, pertenço ao Comitê de
Hepatites da Sociedade Brasileira de Infectologia e sou Presidente da Comissão
Permanente de Higiene e Saúde da Câmara de Santos.
Esse é um cenário que parece, em um primeiro momento, desalentador, mas
ele mostra toda a pujança e toda a vanguarda do Brasil.
Podemos ver que, desde 2002, o Brasil vem tratando de maneira sistemática
e programática seus pacientes com hepatite C. Inicialmente, em azul, com Interferon
e Ribavirina, e depois, em vermelho, com Interferon Peguilado e Ribavirina.
Podemos ver que, logo no comecinho, após o lançamento do Interferon Peguilado, o
Brasil já o incorporou, e ele rapidamente cresceu, sendo hoje o tratamento-padrão
do nosso programa.
Recentemente, no ano passado, logo após a disponibilização dos primeiros
inibidores de proteases, foram incorporados os inibidores de proteases de primeira
geração, e o Brasil passou a tratar os nossos pacientes com Peguilado, Ribavirina e
inibidor de protease, de novo, dando uma sinalização de que quer acompanhar o
desenvolvimento científico.
O que é bom nisso? O fato de que estamos acompanhando o
desenvolvimento científico. O que é ruim nisso? O fato de termos um subdiagnóstico
tremendo. Absolutamente a maioria esmagadora dos infectados pela hepatite C são
desconhecidos e, dos conhecidos ou infectados, uma minoria absoluta de menos de
1% foi tratada. Então, nós temos um passivo muito grande de pacientes a tratar. E,
infelizmente, por uma série de razões, inclusive genéticas, apenas 30% dos nossos
pacientes em vida real se tratam.
Em uma extrapolação, a partir do DATASUS, se tivermos tratado em torno de
200 mil pacientes até hoje, nós teremos aí pouco mais de 120 mil pacientes que
falharam no tratamento e que já são automaticamente candidatos a um
retratamento, e um número menor teve sucesso. Então, é óbvio e necessário que
tenhamos tratamentos de melhor qualidade.
O que realmente importa? É possível mudar? Eu vou mostrar a vocês um
estudo que eu acho muito importante, já entrando nas novas terapias. Eu queria
chamar a atenção dos Srs. Deputados para o seguinte: nós estamos falando aqui de
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6 semanas de tratamento, apenas com comprimidos que não têm efeitos colaterais,
e de uma população absolutamente difícil de tratar: afrodescendentes; gênero
masculino; genótipo 1A, que é mais resistente; alta carga viral; perfil genético
desfavorável; e grande parte com fibrose avançada.
E por que esse estudo? Porque ele não é um estudo da indústria
farmacêutica, é do National Institutes of Health dos Estados Unidos. Portanto, é um
estudo do governo americano, em parceria com a indústria farmacêutica,
associando, em um braço, dois agentes antivirais modernos e, nos outros dois
braços, os mesmos com um ou outro agente antiviral.
E o que se observou nesse estudo em que se trata o paciente só com
comprimido por 6 a 12 semanas, a maioria por 6? Isto aqui, senhores, uma coisa
inédita. Se observarmos a taxa de sucesso nessa população, veremos que ela
passa de 90% e, em dois braços, bate em 100%. Isso é inédito. Quando a gente vê
alguma coisa nesse sentido, só com comprimido, sem efeito colateral, por 6 a 12
semanas, realmente a coisa mudou.
Este é outro estudo que associa dois novos agentes, o Simeprevir e
Sofosbuvir, com ou sem Ribavirina. Aqui, um período de tratamento que varia de 12
a 24 semanas, população difícil de tratar e, novamente, se os senhores forem olhar,
taxas de sucesso que passam de 90% e batem em 100% em alguns casos.
Por fim, temos aqui outro grupo de comprimidos, com compostos que têm
vários alvos terapêuticos. Esses estão em desenvolvimento pela ABBVIE. Se vocês
repararem, tanto em pacientes virgens como em tratamentos experienciados, aqui
no genótipo 1, nós vamos ver taxas de resposta virológica sustentadas que passam
de 90%, sistematicamente, chegando quase a 100%, com facilidade posológica e
sem efeitos colaterais.
Então, provavelmente, é possível mudar esse cenário de baixa resposta que
temos na vida prática, e precisamos fazer isso aqui.
Vou perder um pouquinho de tempo com esse diapositivo, porque ele dá a
dimensão do que estou falando.
Antes dos anos 90, tínhamos muitos pacientes se infectando com hepatite C e
muitos pacientes se tornando portadores crônicos da infecção. Mas a doença no
fígado ainda estava começando a crescer, porque as infecções eram ainda
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relativamente recentes. A mortalidade era baixa — a gente sabe que a mortalidade
por hepatite C vem numa fase final da doença, então demora 30, 40 anos de
infecção para que a pessoa tenha cirrose e câncer — e sequer se falava em cura.
Nos anos 90, começamos a tratar com Interferon. Continuamos tendo muitos
casos de infecção aguda. Foi quando se começou a fazer a triagem sorológica. E a
infecção crônica começou a aumentar. Continuou aumentando o número de
doenças hepáticas crônica, as mortes começaram a aparecer, e a cura era muito
baixa, da ordem de 6%.
Nos anos 2000, começamos com o Interferon Peguilado e, se nós formos ver,
o que mudou aqui? Começaram a diminuir um pouquinho os casos agudos, porque
houve medidas de controle, uso de materiais descartáveis, políticas sanitárias,
triagens, principalmente nos bancos de sangue. Então, as infecções agudas
começaram a ficar mais restritas a determinados recortes de paciente social. Mas o
que é digno de nota é a mortalidade aumentando, enquanto a cura não aumentava.
A mortalidade aumentava e continuava crescendo, lamentavelmente.
A partir de 2012, no início da era dos agentes antivirais, continuamos tendo
mortalidade em expansão, doença crônica de fígado em expansão, mas agora com
melhor perspectiva de cura. O grande problema é o acesso ao tratamento.
Se formos olhar num recorte populacional, a grande massa de pessoas que
têm hepatite C é de pessoas que se infectaram porque receberam transfusão de
sangue, expuseram-se de maneira inaparente ao vírus, mas também há um
percentual de pessoas que se injetavam drogas ou que têm pobreza,
compartilhamento de substâncias, como as populações encarceradas de maior
risco.
Conforme os anos e as décadas vão passando, a população geral vai sendo
diagnosticada, tratada ou morrendo por causas naturais ou pela hepatite e vai se
reduzindo o tamanho do problema. Após tratarmos todo o mundo na população
geral, quem é que vai sobrar tendo hepatite C? Exatamente populações
marginalizadas: usuários de drogas, populações de rua e a menor parte da
população geral.
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O que isso tem a ver conosco? Quando será que a nossa sociedade, que, já
com muita dificuldade, hoje, luta para tratar os pacientes com hepatite C, vai querer
se mobilizar para tratar populações socialmente marginais?
Então, nós precisamos — e com esses novos medicamentos podemos fazê-lo
— de uma política abrangente de terapia e temos de fazer isso agora, porque é o
momento.
Eu costumo dizer — e isso é uma verdade — que toda a parte científica do
desenvolvimento das drogas está feita. O que precisamos agora é discutir acesso.
Vejam um editorial do The Lancet dizendo que é necessário que tenhamos
um plano global para fazer uma abordagem da hepatite C e que as lições que
aprendemos com HIV/AIDS devem ser implementadas também para que façamos
uma mobilização da comunidade e que os tratamentos atinjam os que mais
precisam. Ou seja, um editorial do The Lancet, uma das publicações científicas de
mais prestígio, fala exatamente isso que estamos falando sobre a questão do
acesso.
De 1996, quando o tratamento de HIV começou a incorporar os inibidores de
protease, até 2008, foram 12 anos de desenvolvimento para que tivéssemos um
tratamento simplificado e altamente eficaz para infecção com HIV. No caso da
hepatite C, em 2011, quando a primeira geração dos IPs foi disponibilizada, até
2013, quando tivemos os primeiros nucleosídeos análogos, os Sofosbuvir
disponíveis e já os inibidores de protease de segunda geração, foram apenas 2
anos.
Então, essa é uma realidade científica. Vamos ter que ter agilidade de análise
dos novos compostos e criar políticas, a exemplo do que fazemos no combate ao
HIV/AIDS.
E qual é a recompensa? Este aqui é um gráfico que mostra que, conforme a
gente vai tratando os nossos pacientes, a mortalidade por HIV vai caindo. Vejam o
que aconteceu com a AIDS: muita gente morria em 1996 e pouca gente era tratada,
porque não existia tratamento. Na medida em que passamos a tratar os pacientes, a
morte foi caindo, caindo, caindo, e hoje o HIV é uma doença crônica. Só morre de
HIV quem não tem acesso a tratamento. Então, é possível mexer nisso.
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Se nós garantirmos acesso a tratamento para hepatite C, vamos diminuir as
mortes e aumentar a cura. No futuro, com essas drogas, vamos ter infecção aguda
muito restrita a determinados grupos sociais. Com isso, a doença hepática crônica
no fígado vai diminuir, a infecção crônica vai diminuir, a mortalidade vai diminuir, e a
gente vai curar todo o mundo. Vai sobrar a necessidade de vacinar algumas
populações, e isso vai ser alvo de pesquisa. Portanto, nós temos que prover acesso,
mas temos também que simplificar as coisas.
Hoje, como todo o mundo sabe, para se tratar um paciente, faz-se biópsia,
fazem-se exames e escolhem-se os piores pacientes, os que têm maior risco, para
tomar o remédio; ou seja, tratamos a doença. No futuro, em breve, vamos tratar a
infecção. O tratamento vai ser altamente eficaz, sem efeitos colaterais. A pessoa
que tem a hepatite C automaticamente deverá receber o tratamento e simplesmente
se curar.
E precisamos também evoluir na simplificação do modelo assistencial. Os
guias terapêuticos precisam considerar cenários de restrição financeira. Temos que
tornar os meios diagnósticos, tanto sorológicos de biologia molecular quanto de
fibrose, menos invasivos e mais simples e baratos para serem utilizados. E essa é a
grande virada que o Brasil pode fazer com a ajuda dos Srs. Deputados.
Hoje, temos que tratar os pacientes numa estrutura hospitalar complexa, com
retaguarda de emergência, por conta dos efeitos colaterais, mas muito breve vamos
tratar os nossos pacientes em qualquer lugar, em qualquer ambulatório de periferia,
em qualquer cidade de pequeno porte, dando simplesmente uns comprimidinhos
para o paciente, sem efeitos colaterais.
Nesta foto, eu estou aqui, e aqui está o Stefan, coordenador do grupo da
Organização Mundial da Saúde. A Organização Mundial da Saúde lançou em abril,
no EASL, um guia para o manuseio e o tratamento da hepatite C, recomendando a
utilização do Sofosbuvir e do Simeprevir, que são os dois primeiros agentes que têm
registro globalmente na Europa e nos Estados Unidos — em alguns outros países
do mundo, está em processo de registro.
Entretanto, ela faz essa recomendação enfática, do ponto de vista científico,
mas também faz outra recomendação, de forma igualmente enfática, sugerindo que
todos os meios para se baratear o tratamento e todos os meios para se prover
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acesso a ele sejam utilizados. Essa é uma recomendação científica, mas que não
leva em conta a questão financeira. É o que a OMS diz. A OMS estimula os paísesmembros da Organização, estimula os seus escritórios regionais para que toda e
qualquer política de acesso a tratamento e de redução de preço de medicamentos
seja utilizada.
As entidades científicas da Europa e dos Estados Unidos, os veteranos dos
Estados Unidos fazem recomendações no mesmo sentido que a OMS. Portanto,
lidamos com um novo cenário, que demanda uma decisão sobre o que fazer. Não é
mais uma decisão simples que o médico toma; é uma decisão coletiva. Precisamos
resolver o que fazer. Terapia baseada no Interferon está abandonada. A terapia sem
Interferon vai começar e vai ser muito melhor. Temos que ser um pouco pragmáticos
nessa decisão, porque precisamos tratar os nossos pacientes. Não dá para ficar
olhando tudo isso que está acontecendo e fazer de conta que os pacientes não
estão precisando de tratamento, como também não podemos nos tornar reféns das
indústrias farmacêuticas. O Brasil tem que ter uma política altiva, independente, que
diga como ele quer tratar os seus pacientes.
Por outro lado, podemos usar a história natural da hepatite. Sabemos que
nem todo paciente amanhã já vai descompensar, então dá para ter uma política que,
a exemplo do que já fizemos antes, trate primeiro os com a doença mais avançada
e, depois, simplifiquemos.
Portanto, nós precisamos do Governo, do Ministério da Saúde, da
Organização Mundial da Saúde. É importante enfatizar que o Brasil fez a primeira
resolução da OMS que estimulava a criação dos programas e, agora, em maio, em
Genebra, a segunda resolução sobre hepatites, em que o Brasil, com o endosso de
outros países, recomenda a terapia e as políticas que levem à terapia da hepatite C.
Se isso for aprovado, vai ser uma ferramenta muito grande — e provavelmente será
aprovado. Então, o Brasil tem um papel de protagonismo nisso. Precisamos da
indústria farmacêutica e de diagnóstico como parceiras; da sociedade civil
organizada; do NGO & Advocacy; das sociedades científicas; e da mídia, sem
dúvida nenhuma.
Eu quero lembrar vocês dos genéricos. Muitas vezes, quando falamos de
Interferon, que é um imunobiológico, é preciso lembrar que, para fazer um
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imunobiológico genérico, não basta colocar todos os ingredientes ali; nem sempre o
que sai é Interferon. Às vezes, dá errado. Então, alguém pode querer fazer
Interferon, mas, pela própria composição e maneira de fabricá-lo, não sai Interferon.
É difícil obter um agente genérico, quando estamos falando de um imunobiológico.
Agora, quando falamos de antiviral, exatamente o que esses novos
comprimidos são, aí é fórmula e sempre funciona, não tem erro. Assim, não
precisamos ficar preocupados, porque dá para fazer agentes genéricos antivirais por
um preço justo.
O que aprendemos com o HIV? Que temos que fazer advocacy. A sociedade
civil precisa e deve fazer barulho. E temos que ter na manga a possibilidade de
trabalhar com medicamentos genéricos, porque foi assim que conseguimos muitos
medicamentos para o tratamento de HIV e que nos levaram ao sucesso.
Não precisamos ficar reféns do lucro da indústria farmacêutica, mas, por outro
lado, podemos estabelecer uma parceria. Quem está falando isso? O próprio
National Institutes of Health, do governo americano, que criou um programa de
parceria com a indústria farmacêutica para acelerar o desenvolvimento de
medicamentos que são estratégicos. Então, faz parte também da solução.
O Brasil acaba de publicar, em março, uma portaria que criou um comitê
interinstitucional que envolve a ANVISA, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e
Insumos Estratégicos, através da assistência farmacêutica, e a SVS, através do
Departamento de DST, AIDS e Hepatites Virais, que foi quem propôs essa medida
que tem como objetivo acelerar a incorporação desses novos fármacos e de outros
produtos que sejam de interesse, de maneira estratégica.
Então, nós vamos mudar muito a epidemiologia, vamos mudar muito as
consequências da hepatite. E já vimos isso antes, como eu disse. O HIV, que era
uma doença letal, hoje tem uma cura funcional e se tornou uma doença crônica. A
hepatite C, que é uma doença crônica e potencialmente letal, vai se transformar
numa infecção curável. E vamos atuar numa terapia com dois objetivos: tratar a
infecção e tratar a doença do fígado. Então, não se trata apenas de mudança da
terapia, mas de mudar tudo. Praticamente tudo o que conhecíamos, do ponto de
vista de planejamento para a hepatite, muda daqui para frente.
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Para finalizar, eu queria mostrar a vocês qual é a conjuntura da terapia da
hepatite C hoje. A terapia atual tem: baixa efetividade; muitos efeitos colaterais;
difícil administração do medicamento, o que leva a uma adesão ruim e interrupções
precoces do tratamento por eventos adversos; e custo já estabelecido e que vimos
gerenciando. A terapia futura, a partir de 2014: aumenta a efetividade; é
praticamente isenta de efeitos colaterais; tem fácil ingesta, o que facilita a adesão ao
tratamento; entretanto é extremamente cara e inacessível, ainda.
Mas ela traz outros benefícios, e eu queria aqui me deter principalmente
nessa primeira linha: coinfecção com o HIV. Grande parte das pessoas que tem HIV
hoje tem também a coinfecção com o vírus da hepatite C e morre por complicações
no fígado. E a gente não tem ainda uma boa alternativa para tratar esses pacientes.
Esses novos agentes também vão tratar disso. A coinfecção com HIV não
será mais um limitante, nem um fator que diminui a chance de sucesso do
tratamento. Nós vamos poder tratar pacientes que não podem tomar Interferon,
porque têm plaquetopenia, ou têm uma condição clínica que não permite, e nós
vamos poder tratar essa população hoje marginalizada, pessoas que usam drogas,
pessoas que estão presas e, sobretudo e principalmente, o pré e o pós-transplante
de fígado, população que hoje realmente está morrendo por falta de soluções.
Como é que vamos resolver o problema do custo? Certamente negociando,
fazendo pressão e eliminando essa barreira, talvez a gente consiga um custo que
nos leve a um gasto menor do que o atual, ou igual ao atual, além de minimizarmos,
ou eliminarmos, o impacto financeiro e orçamentário para tentar tratar os nossos
pacientes.
Temos o problema também da ANVISA, que precisa ser tratado como ação
prioritária, uma ação política, mostrando que isso é estratégico para o Brasil. Temos
que lembrar que não é a indústria farmacêutica que está trazendo essa demanda; as
sociedades científicas internacionais já trazem e, sobretudo, a Organização Mundial
da Saúde mostra que este é o caminho a seguir. Mas é necessário que haja um
pacto entre as ONGs, as sociedades científicas, o Legislativo e a indústria
farmacêutica, reconhecer que a gente tem hoje muitos pacientes aguardando
tratamento e todos lutarmos juntos para termos acesso a preço justo, da maneira
correta e também rápida.
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Este é o David Capistrano. Ele foi Prefeito e Secretário de Saúde de Santos e
um formulador do SUS. Ele nos ensinou alguma coisa. A gente hoje sempre faz
duas perguntas: será que é possível? Como é que a gente vai fazer para
implementar isso? Qual é a resposta correta? E David Capistrano falou: “Não é
perguntar se isto é possível ou não é possível, mas como é que a gente vai fazer”.
Tem que fazer, e nós temos que tratar os pacientes com hepatite C. Como é que a
gente vai tratar então? E eu espero que os nossos Deputados junto ao Ministério da
Saúde nos deem essa resposta. Porque o David, em 1996, logo após a Conferência
de Vancouver, que foi tão histórica quanto à ISO, realizada agora, em abril, em
Londres, ele, em Santos, uma cidadezinha do Brasil, não era nem capital, comprou
200 tratamentos, e foi a primeira vez que esses tratamentos contra HIV foram
distribuídos gratuitamente. Foi isso que deflagrou todo um processo no Brasil.
Então, uma vez que a gente escolha a esperança, tudo é possível, como dizia
Christopher Reeve.
Eu queria aqui mostrar o logo do nosso Grupo Esperança, fundado
formalmente em 1999 e que está na luta há muitos anos. Vocês podem ver nesta
foto aqui, mais escura, o Fábio Mesquita, à época Coordenador da COGest, eu, com
muito mais cabelo, mais jovem, mais bonito como sempre, modéstia à parte, falando
aqui numa Mesa... E aqui, quietinho, uma pessoa de que hoje todo mundo sente
muita falta, Jeová. Nosso Jeová está enfrentando um momento muito difícil, não
pôde vir, mas vai superar, vai ser tratado, vai ficar bem e vai, na próxima reunião,
estar aqui com a gente, sem dúvida nenhuma. Eu tenho muita honra e muito orgulho
de estar aqui hoje representando nosso amigo, nosso irmão Jeová.
Tudo é novo, vamos lidar então com a doença, mas vamos modificar também
a epidemiologia tratando a infecção e erradicando a hepatite C. O futuro certamente
é brilhante.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Parabéns, Dr. Evaldo,
pela explanação.
Realmente, é um momento em que a gente fica emocionado. Jeová não está
aqui, mas a sua filha está e todos nós estamos aqui também torcendo por ele, e, se
Deus quiser, logo, logo vai estar de volta.
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Agora, dando sequência, vamos ouvir o Dr. Hoel Sette Júnior, um grande
cientista, um homem que estuda profundamente o processo das hepatites e que
conhece tudo sobre a doença. Ele vai, tenho certeza, fazer uma belíssima
explanação para nós.
Tem a palavra o Dr. Hoel Sette Júnior.
O SR. HOEL SETTE JÚNIOR - Bom dia a todos.
Eu gostaria, inicialmente, de cumprimentar o Presidente da Mesa, Deputado
Geraldo Thadeu, um lutador de longa data. Geraldo Thadeu é responsável,
seguramente, por todo esse movimento que vem se fazendo na Câmara há muitos
anos.
Gostaria também de agradecer à Maria Lucia Prandi, representante do Dr.
Fábio Mesquita, Diretor Técnico do DST e AIDS, a presença; a Darcísio Perondi, da
Frente Parlamentar da Saúde; por sua brilhante exposição, ao Dr. Evaldo Stanilau —
vai facilitar muito para mim, porque eu vou falar também de algumas coisas técnicas
—; e ao Presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia, Prof. Dr. Edison Parisi,
amigo também de longa data, do tempo ainda da nossa formação em Londres.
Eu gostaria de dizer a vocês que nós acompanhamos a hepatite C já há
muitas décadas, desde a época em que não se tinha nada a fazer. Você
diagnosticava, e não sabia nem se não era “não-A, não-B”. Sabia-se que o indivíduo
tinha uma hepatopatia crônica; não tinha endoscopia, não se via varizes de esôfago;
não se tinha diagnóstico das hepatites, a não ser as enzimas hepáticas; a biópsia
existia; e o tratamento era ver a história natural da doença.
Os doentes, na época, eram provenientes da cirurgia cardíaca que o Prof.
Zerbini fazia e Fúlvio Pileggi era quem assistia a parte clínica e encaminhava para o
Prof. Luiz Caetano. Eram as chamadas hepatites pós-transfusionais, mas não se
sabia que tipo de vírus era.
Então, vamos falar algumas coisas. Stanilau já adiantou bastante. Vou fazer
um relato histórico do vírus C. A infecção da hepatite C não é uma infecção apenas
do fígado, é uma infecção sistêmica, e ela agride o indivíduo como um todo. Na
hepatite C, não é o fígado que é a coisa mais importante, é o vírus que se multiplica
no encéfalo. Então, a fadiga crônica, a depressão fazem parte do quadro clínico da
hepatite C. Por outro lado, você também tem outras células, as células brancas,
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principalmente os linfócitos, que também podem multiplicar o vírus da hepatite C, e
pode se desenvolver linfoma.
Então, hoje se sabe que os indivíduos portadores de cardiopatias morrem,
mas a mortalidade é o dobro quando ele tem o vírus C do que quando ele não tem o
vírus C. Isso acontece não só com os cardiopatas, mas com os diabéticos também.
Morre mais da metade, o dobro, dos diabéticos que têm a hepatite C. Então, é uma
doença sistêmica.
Lembrando os marcos da descoberta da hepatite C, eu falaria a vocês do
Blumberg. O Blumberg descobriu um antígeno que ele inicialmente interpretou como
sendo o antígeno da leucemia, e, mais tarde, em 69, ele descobriu o antígeno
Austrália junto com London. Por isso ele ganhou o Prêmio Nobel de Medicina.
Firestone, em 73, fotografou, em eletromicroscopia, a hepatite A. E, Firestone, em
75, chamou pela primeira vez as transmissões das hepatites associadas a "não-A,
não-B", porque ele viu que não era nem A e nem B. Passado algum tempo, mostrouse também o cultivo em células, e o Schulze, vindo da indústria farmacêutica,
descobriu e clonou, em 1989, o vírus da hepatite chamada "não-A, não-B".
Posteriormente, Kuhl desenvolveu um método de diagnóstico, um anticorpo, e
o Altman também, no Nucleic acid amplification techniques — NAAT, fez isso como
uma sistemática.
O vírus da hepatite C foi fotografado em imunomicroscopia eletrônica, em
partículas de ouro, e sabe-se que é uma fita única de polaridade positiva, medindo
em torno de 30 a 70 migrogramas, é do gênero Hepacivirus e da família Flaviviridae.
São detalhes que importam na história da doença. No início, tínhamos apenas
um chimpanzé, que era um animal de grande porte, de difícil tratamento. Depois,
vieram outros animais, como a marmota, findando em um camundongo
geneticamente humanizado.
E aí se passou para culturas de células. E todo esse avanço fez com que,
mais adiante, se conseguisse — e isso mais recentemente, há poucos anos — saber
o ciclo vitral de replicação do vírus da hepatite C. E, através desse esforço, pôde-se
mapear desde a entrada do vírus na célula: primeiro, a tirada da cápsula, o RNA, a
multiplicação do RNA, depois as enzimas para fazer a nova molécula e a saída da
célula.
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Com isso, o que aconteceu? Aconteceu o milagre dessas novas moléculas,
porque esses avanços são de 2 ou 3 anos.
Então, dentre as manifestações a que me referi — a depressão, a fadiga
crônica —, há as vasculites, que são graves. Um paciente com hepatite C
apresentando uma vasculite pode evoluir para uma vasculite cerebral e sofrer um
acidente vascular cerebral, ou uma vasculite intestinal.
Há as glomerulonefrites. Há pouco tempo, vi um paciente, um médico do
Norte, que foi a São Paulo procurar o tratamento com essas novas moléculas,
porque ele já estava com insuficiência renal. Então, muitos dos pacientes têm
insuficiência renal em razão dessa glomerulonefrite intersticial.
Também posso citar as doenças inflamatórias linfoploriferativas: o linfoma; a
Síndrome de Sicca, da secura dos olhos e de todas as secreções do organismo; a
artrite reumatóide; a poliarterite; a produção de autoanticorpos. É comum ver nos
pacientes portadores do vírus da hepatite C a tireoidite, a psoríase, o diabetes
mellitus.
A epidemiologia. Isso já foi falado, mas eu enfatizaria que é o maior problema
de saúde pública da humanidade. A Organização Mundial de Saúde estima entre
180 a 200 milhões de pessoas cronicamente infectadas. É a principal causa da
cirrose, do câncer hepático, do óbito relacionado às doenças nos países ocidentais e
de 30% a 50% dos transplantes de fígado, como o Evaldo já salientou.
E o que é mais importante? É uma doença silenciosa. Vocês veem aqui que a
fase aguda é anictérica, apenas 10% desenvolvem icterícia — que é o que chama a
atenção —; 90% evoluem na fase aguda como se fosse um resfriado. E a fase
crônica também, em décadas, é assintomática.
Então, como é feito o diagnóstico? Já falamos aqui da descoberta do antiHCV, mas na fase aguda é tardio. Ele aparece tardiamente. Se quiser fazer o
diagnóstico da fase aguda, você tem que usar o PCR — polymerase chain reaction e
a cronificação se vê depois de 6 meses. Até 6 meses, você espera. Hoje, até menos.
Você espera até 3 meses e você já trata a hepatite C na fase aguda.
Então, é responsável por 40% das cirroses; 60% dos carcinomas, 30% a 50%
dos transplantes e, vejam, aqui, um fígado normal, um fígado com hepatite crônica
que evolui em décadas.
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Aqui temos uma cirrose, também evolui em décadas. E daqui em diante é que
vai aparecer o hepatocarcinoma, é diferente da hepatite B. A hepatite B pode
aparecer o hepatocarcinoma mesmo num fígado normal, desde que ele tenha o
vírus. Na hepatite C, não. Vai aparecer o hepatocarcinoma numa fase bem
avançada de doença.
Aqui já se falou, mas eu salientaria que esse é um levantamento feito e
publicado no Liver Internacional, de 2011, mostrando que o Brasil tem 2% a 9% de
positividade. Eu fiz um trabalho com o Prof. Focácia há 12 anos, no Município de
São Paulo. Através do Datafolha, nós estratificamos as cinco regiões e colhemos
sangue de todos, não os pacientes, nas casas, no Município, de 12 a 70 anos de
idade. Um ponto quarenta e três por cento do total, foram mil pessoas, tinham o
vírus. Quando você estratificava por faixas etárias, você via que, quando chegava na
década de 40 a 50, esse número subia para 3,8% da população. Isso só no
Município de São Paulo. Então, isso é uma catástrofe, não é uma coisa para ficar
esperando.
Por outro lado, tem também publicado no Journal of Hepatology agora esse
dado, com esse percentual. Considerando o Brasil tendo 2 milhões e 100 mil
portadores do vírus, a prevalência da doença, você só diagnostica 27%, em torno de
600 mil e, dentro desses 600 mil, a incidência é de 65 mil. Mas vejam quantos estão
em tratamento, em torno de 10 mil, anualmente.
Então, isso fala por si da necessidade urgente de se tomar alguma atitude.
Nos Estados Unidos, você vê a incidência de 40 mil, a prevalência é de 2,7 milhões
de pessoas e morte/ano, de 8 a 10 mil pessoas por ano morrem nos Estados Unidos
com hepatite C.
Temos esse slide. Stanislau já ressaltou o problema do afunilamento desde a
consciência da população ao diagnóstico, ao tratamento e aderência ao tratamento
atual.
Os métodos não invasivos. Hoje, não há só o método invasivo e não invasivo.
Existem vários métodos. Fleury acabou de lançar, estão na primeira página, os
métodos laboratoriais não invasivos para ver fibrose e esteatose. Então, é possível
se fazer isso.
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E o que é mais importante? Gary Davis, que é um grande pesquisador de
epidemiologia, vem fazendo o prognóstico da evolução da hepatite C já há muitas
décadas. Esse é o terceiro prognóstico que ele faz. Então, ele vê que mais ou
menos nos anos 80 começou a aumentar, e, 40 anos depois, você vai ter o pico da
descompensação da cirrose e do aparecimento do carcinoma hepatocelular.
Portanto, nós temos de cuidar disso agora. Por que tratar hepatite C? A
infecção crônica aumenta a morbidade, a mortalidade e o tratamento tem cura. Você
não tem ideia de quem estava no congresso em Londres agora, a alegria dos
expositores, de 10.300 hepatologistas de todo o mundo presentes. Foi um
congresso histórico, que marcou um paradigma da cura da hepatite C. E aqui eu
acompanhei todas essas fases, fiz pesquisas com o Interferon convencional, em que
se tratava por 6 meses e a cura era de 6%, já era um horror tomar Interferon por 6
meses, 12 meses melhorava um pouco; Interferon e Ribavirina por 6 meses, 34%;
Interferon e Ribavirina por 12 meses, 42%; quando surgiu o Peguilado, o PEG, 39%;
PEG e Interferon, 55%, e só para o genótipo tipo 1. E, agora, com o primeiro inibidor
de protease se chega a 70%, apesar de ter muitos efeitos colaterais e de ter casos
fatais com o uso do Interferon, a droga de ação direta de primeira geração.
É muito fácil você tratar uma pessoa magra, mulher, menos de 25 de IMC —
Índice de Massa Corporal, genótipo tipo 2 ou 3, carga viral baixa. O índice de cura é
muito alto, maior do que 90%. Mas quando você pega um homem com índice
corpóreo maior do que 25, genótipo 1, carga viral maior do que quatrocentos, fibrose
significativa, é em torno de 30%. Praticamente são 11 meses de tratamento com
muitos efeitos colaterais. Tenho pacientes que ficaram surdos, tenho pacientes que
desenvolveram sangramento de retina. É complicado dar um remédio que tem
tantos efeitos colaterais a uma pessoa, a um ser humano; fazer a biópsia já é uma
coisa absurda.
Na Colômbia, Stephen Zorzen foi perguntado, na Mesa em que estavam
vários pesquisadores do mundo inteiro, e o chileno falou: “Eu preciso fazer uma
biópsia ou um Fibroscan? No Chile não tem Fibroscan, então eu vou fazer a
biópsia”. Levantou um médico da plateia e perguntou: “Eu quero perguntar à Mesa, a
toda a Mesa, se faria biópsia ou Fibroscan”. Aí um americano disse: “Eu também
não tenho Fibroscan, eu faria biópsia”. O outro disse: “Eu também não tenho
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Fibroscan”. Chegou Stephen Zorzen, que disse: “Eu vou perguntar à plateia”. Todos
são médicos, tinham 2 mil hepatologistas: “Quem de vocês se submeteria a uma
biópsia hepática que levante a mão?” Ninguém levantou a mão. Ele disse: “Eu não
indico um método ao qual eu não me submeteria”.
Então, vou passando rapidamente, porque Stanislau já falou disso, é a droga
de primeira geração. Houve um aumento significativo do índice de cura apenas para
o genótipo 1. Esse é um problema sério.
E aqui são as fases de tratamento. A hepatite C hoje, dependendo do local
onde age a medicação, se tem os inibidores de polimerases, os inibidores não
nucleotídicos, os nucleotídicos, os inibidores de proteases e o inibidor de outra área
do pipeline da replicação viral.
O que é mais importante são as características de DDA — Distúrbio de Déficit
de Atenção, que agora estão na segunda onda. A primeira característica é a
eficácia. O inibidor NS5B, que é o inibidor de um nucleotídico, tem um perfil muito
bom. Ele tem um perfil de resistência excelente, é pangenômico, pega todos os
genótipos, sem efeitos adversos, e não tem interação medicamentosa. Então, é
realmente uma coisa fantástica.
E o que se faz nos Estados Unidos hoje? Isso aqui nós tiramos de uma aula
de Afdhal, em São Paulo, agora em 2014. Primeiro, o indivíduo, nos Estados Unidos,
tem múltipla escolha. Se ele tolerou o Interferon, pode tomar Simeprevir, Sofosbuvir
e, muitas vezes, precisa tomar Interferon, principalmente se ele tiver cirrose. E a
segunda opção seria sem Interferon, genótipo 2,3: Sofosbuvir, Ribavirina (12 a 24
semanas); e sem Interferon, genótipo 1: Sofaldi, Olysio, off label — usado nos
Estados Unidos —; e, finalmente, Sofosbuvir mais Ribavirina (24 semanas).
O que mudou na história? O índice de cura, o aumento da tolerabilidade, o
perfil de resistência, a conveniência da posologia, a redução do tempo de
tratamento, o pangenômico e a eficácia.
Eu não vou passar o eslaide seguinte, pois já foi mostrado. Vou mostrar
novamente esse dado do Gary Davis, que é dos VAs — veterans affairs. Todos os
Estados americanos têm hospitais de VAs, que são indivíduos que foram para a
guerra. Eles foram contaminados muito precocemente com drogas ou outras formas
de contágio. Aqui é mostrada a infecção, que é muito grande. A população
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cronicamente infectada de VAs é muito grande: 81,5%; pacientes cronicamente
infectadas, com cirrose: 7,38% — muitos deles já morreram —; e os que
descompensaram a cirrose, 5,68%; com carcinoma hepatocelular, está aqui; aqui, os
que foram para transplante; e os que morreram. (Mostra gráfico.)
Agora, sem que se faça tratamento, o prognóstico de 2014 para 2024, em 10
anos. Vejam a curva ascendente. Com o Peginterferon, o tratamento anterior,
também quase não muda a curva. O Peginterferon e o inibidor de protease
melhoram, mas vejam as drogas por via ora. Elas passam de 500 casos para 780
casos. Então, é inacreditável isso! A cura da hepatite C é uma realidade, não se está
falando mais de uma coisa teórica.
Aqui, os dados mais importantes e secundários. Mas dentre os secundários
vem o custo do tratamento. Eu acho que o custo do tratamento realmente é
importante.
Mostra-se aqui aquela mesma curva para 2013, já com 90% de resposta
virológica sustentada.
Também vou passar isso aqui, porque o Evaldo já falou.
Aqui são dados que ele mostrou.
O importante é tratar a lista do transplante. Tratando-se a lista do transplante,
em 30 dias negativa-se praticamente todos os pacientes. Ele entra para o
transplante sem vírus. E ele não morre rapidamente após o transplante. Por causa
da imunossupressão, em 5 ou 8 anos o indivíduo tem uma cirrose novamente, e
morre. Então, essa é uma das recomendações, uma das priorizações. Ele pode
também ser usado em pacientes coinfectados, com hepatite B ou HIV — como o
Evaldo falou.
E aqui um transplante. Vejam, aqui é um fígado totalmente cirrótico. Já havia
um pequeno nódulo, foi transplantado, e o paciente está vivo até hoje, mas com
vírus C.
Então, na verdade, o congresso nos proporcionou uma mudança de
paradigma da hepatite C para o mundo. Harvey Alter, numa introdução de curso de
pós-graduação, disse o seguinte: “O acesso ao tratamento é a todos os pacientes
que tenham hepatite C, porque é uma doença sistêmica”. Então, é uma ajuda
realística. Os baby boomers também são importantes. A vacina não é importante
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para erradicar. Mas a erradicação nos países desenvolvidos é um fato. E o
americano já começou a fazer isso. Para os países em desenvolvimento, como ele
falou, é um problema mais complexo. Por quê? Múltiplos modos de transmissão. A
vacina é uma quimera, porque o vírus é multiplicado 10 elevado a 12, por dia, e o
custo econômico é muito elevado.
Então, parabenizo esta Comissão. Espero que haja um agreement entre a
indústria farmacêutica, as ONGs, os médicos.
Srs. Deputados, espero que façam alguma coisa para que se inicie de
imediato um tratamento.
Obrigado a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós agradecemos ao Dr.
Hoel Sette Júnior a brilhante explanação, mostrando o início, o estado atual e o
futuro.
Vamos passar a palavra ao Presidente da Frente Parlamentar da Saúde, o
colega Deputado Darcísio Perondi.
Antes, gostaria de anunciar a presença do meu vizinho de Poços de Caldas,
Deputado Paulo Teixeira, grande liderança na Câmara. Ele é de Águas da Prata, e
além de vizinho é um grande amigo, que nos dá aqui uma grande honra; anunciar a
presença da Deputada Maria Lucia Prandi; e a presença da Deputada Ana Aline, do
PT da Bahia. (Pausa.) Acho que ela já passou por aqui.
Com a palavra o Deputado Darcísio Perondi, para sua explanação.
O SR. DEPUTADO DARCÍSIO PERONDI - Bom dia a todos os senhores.
Muito obrigado, Deputado Geraldo Thadeu, pelo convite.
O Deputado Geraldo tem em sua testa e na alma a marca do Deputado mais
empenhado, mais lutador, o que mais se entrega nesta luta do acesso da população
ao tratamento de hepatites virais. Nós estamos juntos há quase 20 anos. Ele se
afastou um período para ser Prefeito e depois voltou. Então, os avanços nesta Casa,
nos últimos 20 anos, têm a marca do Deputado Geraldo Thadeu. Ele me disse, no
mês passado: “Eu vou te colocar na Mesa”. E não dá para deixar de atender a um
pedido dele. Primeiro, como o de colega Deputado; segundo, pela marca que ele
tem.
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Quero saudar os meus colegas médicos: pelo entusiasmo, o Dr. Hoel; pelo
entusiasmo, o Dr. Evaldo; e a Dra. Elisa. Eu já tinha combinado com o Deputado
Thadeu que eu falaria no começo, um pouco, e depois iria cumprir outras tarefas.
Comecei a ouvir a Dra. Elisa e optei em ficar até o fim, sim. Quero saudar também o
nosso colega da Sociedade Brasileira de Metapatologia, Dr. Parise; todas as ONGs
aqui presentes; e também a indústria.
Há 20 anos, e depois, há 15 anos, e depois, há 10 anos, falávamos muito aqui
do acesso ao tratamento e da dificuldade, em termos de financiamento, e também
das relações das ONGs com o Ministério, e vice-versa. Há 3 anos, há 4 anos,
diminuiu muito a pressão sobre nós. Não sei se foi geral, não sei se também foi em
cima de vocês, Geraldo, mas diminuiu muito a pressão das ONGs. Nós até
conversamos no mês passado quando decidimos, quando o Deputado Geraldo
apresentou o requerimento.
Agora, ouvindo a Dra. Elisa, o Dr. Evaldo, o Dr. Hoel, vemos que houve
melhoras. O universo é assustador, são mais de 3 milhões, Deputado Paulo
Teixeira, companheiro de luta, e a Deputada Maria Lúcia também. São 3 milhões de
brasileiros infectados, mas eles não sabem. Eles não sabem. Mas, ouvindo aqui
inclusive um colega ligado a uma ONG, ficamos sabendo que o acesso melhorou,
mas é muito pouco em comparação com tudo do que se precisa.
Nós contribuímos, o Parlamento contribui, e como contribui. As audiências
nos dão informações, Deputado Paulo Teixeira, e nos motivam. Eu estava pensando
no que nós avançamos. A construção do Congresso Nacional de Inovação, Trabalho
e Educação Corporativa — CONITEC, que nós votamos aqui no fim da
administração de Temporão — e foi corrido, muito corrido, eu fui um dos Relatores
—, parece-me que foi um avanço. Foi tudo que nós tínhamos votado aqui, houve
veto, mas houve também um avanço. Então, foi uma contribuição porque esta Casa
acelerou, acelerou mesmo. O Senado também acelerou. O Temporão queria ainda
botar o autógrafo dele, mas foi no ano seguinte que saiu a sanção. Então, foi uma
contribuição.
Esta Casa tem contribuído também nas lutas do financiamento, mas eu estou
contente. Eu estou fora da medicina há 20 anos. Eu sou médico de criança. Nós
médicos Parlamentares ou dentistas Parlamentares temos uma responsabilidade,
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nós conhecemos uma ponta e estamos na outra ponta, que é vital, que é a ponta
das leis e da luta pelo financiamento. Então, nós também avançamos no
financiamento, mas eu estou encantado com a informação técnica mais precisa. Eu
sou sabedor daquelas drogas avançadas caras que estão lá nos Estados Unidos e
na Europa, mas antes delas nós avançamos muito nos últimos 2, 3 anos. E a
perspectiva de cura, Deputado Paulo Teixeira, da hepatite é uma coisa fantástica.
Se nós conseguirmos repetir o sucesso da política antiAIDS, que é uma marca do
Brasil e uma marca do Sistema Único de Saúde, que eu defendo de forma
intransigente em qualquer lugar, em qualquer lugar. Nós temos enormes avanços
feitos pelo Sistema Único de Saúde. Há vazios, há dificuldades, e a principal delas é
o financiamento. É preciso também melhorar a gestão, que não é a principal, porque
até para melhorar a gestão são necessários recursos. Então, a campanha, a luta
antiAIDS é um modelo.
Eu estava ouvindo tudo aqui com atenção e vi que nós podemos dar esse
passo. Nós somos um país rico. Eu fiquei animado com essa informação e mais
consciente de que o acesso ainda é o problema mais grave. Depois essa ONG aqui
vai ler, vai falar sobre a questão da Lei de Patentes, mas, para mim, o maior
problema ainda é o acesso ao diagnóstico.
Com algumas ONGs, há alguns anos, nós pensamos em fazer um
rastreamento, uma campanha brutal, muitas ONGs até participaram, mas não sei se
isso teve continuidade. As campanhas são assim, e isso foi dito aqui: acesso,
acesso, acesso, e continua. Melhorou, mas ainda, para mim, o problema mais grave
é o acesso. É o acesso.
A ciência está contribuindo. Parabéns! A ciência está contribuindo, realmente
está contribuindo. A ciência, a medicina, as sociedades, mas acho que o acesso
passa pelo financiamento, pelo melhoramento do SUS. É disso que precisa, porque
esse é um problema do SUS como um todo. É acesso também. Acesso das pessoas
ao SUS. É o diagnóstico e a luta pelo financiamento, e conversar com a indústria.
Em muitas oportunidades, a indústria soube conversar. E, se não há
conversa, há alternativas na própria Lei das Patentes: o licenciamento prévio. A
licença prévia que em algum momento o Brasil fez na questão antiAIDS e até
aproximou mais, e a indústria também veio, a indústria também veio.
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Mas nós não podemos execrar a Lei de Patentes, dizer que é inimiga. A
ciência precisa ter liberdade — nós temos outros problemas para os cientistas
pesquisarem no Brasil —, a pesquisa tem custo também, tem custo.
Às vezes, eu fico em dúvida se o custo é maximizado ou não. Na pesquisa,
sim, o custo é alto, é alto. E se se colocar muitas barreiras, isso retrai a questão da
pesquisa, mas há algumas doenças sobre as quais a indústria tem que ter uma
visão mais universal. Isso sim. Isso sim. Nós temos instrumentos para isso se for
preciso. Mas o maior é a conversa. É buscar a indústria.
Para fechar, falando em financiamento, o Ministério já tem hoje dificuldades
para fechar o mês, o custeio do mês. Há mais de 6 meses o pessoal do
planejamento, do fundo nacional... E também é óbvio que afeta o gabinete do
Ministro. É um verdadeiro terror nas relações do Ministério com o Tesouro Nacional.
Eles estão pagando em prestação por mês. Isso não acontecia. De uns 6 meses
para cá que começou. Piorou este ano. O FAEC — Fundo de Ações Estratégicas e
de Compensação passa 1 mês, passa 2 meses e parte do pagamento da alta
complexidade... Afeta todo o orçamento do Ministério essa política do Tesouro
Nacional, e o dinheiro que está posto não paga. O dinheiro que está posto no
orçamento não fecha o mês, Deputado Paulo Teixeira, não fecha o mês.
Este ano a necessidade chegará a 8 bilhões de reais. O buraco do Ministério
é de 8 bilhões de reais. Isso significam quase 2 meses de custeio. É um horror. É
um horror isso, sem novos serviços, sem novos serviços. Então, o orçamento deste
ano é absolutamente insuficiente. Nós lutamos muito aqui, e estamos lutando.
A sociedade se mobilizou no Saúde+10, 10% das receitas correntes brutas,
13 milhões de assinaturas em todo o Brasil: OAB, igrejas, Conselho Nacional de
Saúde, lideranças, líderes comunitários do Brasil inteiro. O Saúde+10 está quase
morrendo. Veio com a emenda do Orçamento Impositivo que o Governo contaminou
lá no Senado. A emenda veio para cá como uma dinamite para explodir o Saúde+10.
Os 10% das receitas correntes brutas seriam 46 bilhões a mais por ano. É mais ou
menos o que o Ministro Padilha disse numa Comissão Geral há 2 anos de que
precisaria ao ano, o mínimo.
O Tesouro já não comporta mais esse dinheiro. O Tesouro não pode, o
Ministério da Fazenda não pode, o núcleo duro do Governo não pode, se não
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existem os 46 bilhões ao ano, que são os 10% das receitas correntes brutas, eles
não podem sufocar, como estão sufocando, o orçamento do Ministério este ano e o
custeio. Não podem sufocar! E já botaram uma dinamite nessa emenda impositiva.
Na semana que vem, nós vamos votar se essa dinamite vai ser detonada, se nós
aprovaremos um DVS que tira essa dinamite que foi anexada à emenda impositiva.
Se nós não conseguirmos aprovar o DVS que tira essa dinamite, explodiremos o
Saúde+10, que tem propostas intermediárias entre 10% das receitas correntes
brutas, que significam quase 20% da líquida, e tem uma proposta intermediária
aprovada nas duas Comissões.
O movimento como um todo quer continuar na luta, sim, da receita corrente
bruta de 10%, que é de 46 bilhões por ano. A proposta do Governo não aumenta
quase nada em 5 anos, do muito que precisa. Isso para não encher vocês de
números.
Então, quanto à perspectiva de financiamento, nós vamos travar também uma
luta para trazer essas duas drogas de lá. E a questão dos genéricos, que foi
colocada aqui por você, que pode ser o genérico biológico, imunológico, é muito
mais complexa e vai passar também pelo financiamento. Às vezes, dizemos: “Olhe,
não tenho procuração do Ministério aqui”. Às vezes a gente briga muito lá, no
Ministério, eu vejo líderes de ONG enlouquecidos, e esquecemos que o
financiamento não é prioridade do Governo que o meu partido apoia. Eu sou do
PMDB. Não é. Então, nós vamos também ter essa dificuldade.
Mas eu fiquei muito contente com o que ouvi aqui. Deputado Geraldo, eu sou
um soldado seu. A Deputada Maria Lúcia deve saber muito mais que eu, que vim de
Santos, o Deputado Paulo Teixeira, um soldado seu, e você vai ser o nosso general
nessa luta. Temos de ter foco. Às vezes nós temos dificuldade de ter foco, nós
somos puxados por tudo que é canto aqui. Então você vai ser o cara que vai ficar
em cima de nós para termos foco nessa luta.
Podem contar comigo e com a estrutura que nós temos.
Obrigado. (Palmas.)
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. DEPUTADO DARCÍSIO PERONDI - PMDB do Rio Grande do Sul.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Eu vou dar sequência
aqui aos trabalhos.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós estamos aqui para
defender e salvar vidas. Esse é o objetivo nosso, independentemente da política.
Nós estamos aqui na política, estamos cumprindo um ideal de vida que a gente tem
no coração de salvar vidas. Este é o objetivo de todos nós aqui, num momento de
muita grandeza.
Antes de dar a palavra aos Parlamentares que aqui estão, à Deputada Maria
Lúcia e ao Deputado Paulo Teixeira, só gostaria de fazer um agradecimento ao
Deputado Darcísio Perondi. Quando S.Exa. assumiu a Presidência da Frente
Parlamentar de Saúde, me fez o convite para representar a Odontologia na Frente
Parlamentar e também na causa das hepatites. S.Exa. tem sido um grande
companheiro, um grande amigo, tem dado toda a abertura. Não só abertura, mas
como presença, nessa demonstração de estar incorporado a essa nossa luta.
Ficamos muito agradecidos, Deputado Darcísio Perondi.
O SR. DEPUTADO DARCÍSIO PERONDI - Quando a gente faz escolha pela
esperança, tudo é possível. A esperança não de esperar, a esperança de
esperançar, de fazer acontecer, de acreditar. Eu acho que as ONGs têm uma luta
maravilhosa, os cientistas e todos vocês de fazer acontecer. Eu acho que a palavra
esperança deve ser a luz, esperança de esperançar, de fato fazer acontecer.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Quero registrar a
presença dos Deputados Eleuses Paiva, que é de São Paulo, e também foi
Presidente da Associação Brasileira de Medicina e tem feito um trabalho
extraordinário em defesa da saúde pública no Congresso, e do Deputado Ságuas
Moraes, do Mato Grosso. Agradeço a presença a todos.
Gostaria de fazer rapidamente uma pequena explanação. Eu acompanhei
bem os estudos tanto do Dr. Evaldo como do Dr. Hoel. Eu sou da geração de 1975,
quando começou o processo todo da hepatite C, e fui contaminado com a aplicação
de uma injeção numa farmácia. Meu pai era médico, e eu me consultava com ele a
distância. Eu era dentista em São Paulo, e ele morava em Alfenas. Eu estava muito
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gripado, colocando muito sangue pelo nariz. Ele me mandou eu ir à farmácia tomar
um Calcium Sandoz na veia. Eu fui para a farmácia e tomei o Calcium Sandoz. Um
dia, estava jogando numa quadra de futebol de salão na Vila Maria e comecei a
passar mal, senti enjoo e tudo o mais. Aí descobri que estava na fase aguda da
hepatite, “não-A”, “não-B” naquela época. Eu fiquei muito tempo com a doença.
Tratei-me no Medicina Tropical do HC. Depois fui me tratar com o Dr. Hoel. Quando
definiram o vírus, veio o Interferon Alfa. Sofri uma barbaridade, tomei 12 vezes o
Interferon. Fiquei raquítico.
Tem a questão da discriminação. Eu sou dentista, fiquei muito debilitado e
perdi quase toda a minha clientela. O pessoal achava que iria contaminá-los.
Quando você falava que tinha hepatite, as pessoas sumiam. Acho que não era
preconceito, mas medo da população toda.
Depois eu entrei para a política. Quando eu entrei para a política, o Dr. Hoel
disse que eu teria que tomar Interferon Peglado. “Mas Dr. Hoel, eu vou fazer política,
vou fazer campanha”. Ele respondeu: “Não, tem que tomar”. E aí eu fiz o tratamento
e a campanha. No final do tratamento e da campanha, eu estava curado e eleito.
Quando aqui cheguei à tribuna, o meu primeiro pronunciamento foi sobre
hepatite. Quando fiz o tratamento, metade do custo eu banquei e a outra metade foi
paga pelo SUS. Eu disse o seguinte naquela época: “Olhe, você que está me
assistindo, se for portador de hepatite crônica e tiver parente, amigo, vá lá na
Secretaria de Saúde. Se não tiver, pegue um advogado, vá ao Ministério Público e
entre com um processo”. Hoje a gente até segura para que não haja a judicialização
da saúde, porque senão — com a falta de medicamentos, e às vezes eles nem
existem, principalmente na área de câncer —, se o Ministério for bancar tudo,
quebra.
Mas o que aconteceu? Nós viemos para cá e começamos. Tínhamos lá as
ONGs. Está aqui Varaldo, que é um grande lutador, bravo, ele briga, e tem uma
esperança, junto com o Jeová, o grupo todo e outras ONGs. Eles fizeram um
trabalho muito forte, muito grande naquele tempo, de 2002 ou 2003 para cá, não é,
Varaldo? Eu quero fazer justiça; gosto de ser muito justo nas minhas coisas.
Tempos atrás, um grande político do Brasil — eu não vou falar nome; tenho
tanta raiva disto que não vou falar nome — disse que a questão das hepatites era
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lobby de laboratórios e que aquilo ele não aprovava. Acho que o Varaldo lembra
disso. Isso ficou na história. Eu não gosto nem de falar nome, porque vão pensar
que, porque agora nós estamos em um ano eleitoral... Mas ficou uma tristeza para
nós.
Depois veio — e é o que eu gosto de falar — o Presidente Lula, que nos deu
uma grande abertura, uma grande abertura para o Ministério. Ultimamente o Ministro
Padilha também deu uma grande abertura a esse setor, colocou lá o Dr. Fábio
Mesquita, que ainda continua. Ontem eu estive lá. “O que eu vim fazer aqui hoje, se
amanhã ele vai estar lá com a gente?”, eu pensei. Mas foi bom. Mesmo assim eu fui.
Foi bom, porque ele não veio hoje aqui, e eu conversei com ele lá ontem, com a Dra.
Elisa; ele explanou tudo para nós. Falou do que está acontecendo, daquelas
reivindicações que nós fizemos quanto a haver um laboratório para tipagem do vírus
em cada Estado, pelo menos um na capital. Hoje, todos os Estados têm. Todos! Há
Estados que têm dois, três, quatro, mas todos têm pelo menos um. São 37 ao todo,
e nós temos 27 Estados.
A outra reivindicação que nós fizemos — e eles já a estão encaminhando — é
sobre o Fibroscan: que os laboratórios e todos os Estados possam ter um
Fribroscan.
Gente, quando eu fiz a primeira biópsia, lá atrás, depois que colocaram a
agulha, fiquei 2 horas sem enxergar. Eu senti tanta dor que fiquei 2 horas sem
enxergar. Está rindo, não é, Varaldo? Você deve ter feito também. (Pausa.) Três. Eu
fiz umas quatro biópsias. Mas depois já havia um sedativo. Você fez também?
(Pausa.)
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Está louco! Eu fiquei sem
enxergar; foi uma pancada.
Mas a coisa evoluiu muito. Evoluiu muito essa luta. Ontem eu fiquei muito
entusiasmado ao falar com o Dr. Fábio Mesquita. Ele me falou dos projetos, dos
programas, da questão dos tratamentos, dos números de casos de sucesso. Quanto
à disponibilização — Varaldo e também o Dr. Evaldo e o Dr. Hoel se lembram disso
—, quando saía um medicamento de última geração, Deputado Paulo Teixeira,
levava 8 anos para entrar no protocolo do Ministério da Saúde. Hoje, isso é quase
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que imediato. Esses inibidores de protease já estão aí, já são disponibilizados pelo
SUS. Nós temos aqui o representante de um laboratório do comprimido que é
mágico, que está curando praticamente 100%. Está aqui o representante do
laboratório, que já está em contato com o Dr. Fábio, e já estão fechando o
fornecimento desse milagroso medicamento.
Então, eu vejo que as coisas acontecem hoje, estão acontecendo, apesar da
questão que o Deputado Darcísio coloca aqui, meio sombria, de financiamento, tudo
o mais. Claro que nós sabemos que é preciso um Ministério com mais
financiamento, que é preciso mais financiamento, o que tende a nos dar uma
condição melhor. Mas não está faltando nada de política no atendimento, no
Ministério da Saúde, do Programa DST-AIDS e Hepatites. Quando nós estivemos
em Santos, naquele encontro, o Jeová e o Dr. Evaldo me disseram que com o Dr.
Fábio Mesquita realmente teríamos uma nova fase no Departamento de DST-AIDS e
Hepatites. Isso realmente se confirmou.
Ontem eu saí de lá sinceramente entusiasmado. Saí de lá com muito mais
esperança de que as coisas vão acontecer muito mais no tratamento. Eu digo que,
nesse período todo, às vezes por incompreensão... Às vezes, a própria grande
imprensa fica no pé, porque de vez em quando a gente ia até a ANVISA e uma vez
saiu a seguinte manchete: “Médicos vão à ANVISA fazer lobby”. Bom, se for lobby
para salvar vida, eu faço questão de dizer que eu fiz muito lobby para salvar vidas, e
graças a Deus nunca levei vantagem nenhuma.
A Frente Parlamentar nós sempre tocamos com muita dificuldade. Hoje eu
fico muito entusiasmado com o fato de a Deputada Maria Lucia participar. A Frente
hoje está desativada, porque as dificuldades são grandes, Deputada Maria Lucia.
V.Exa. vai ver que são grandes. Vamos reativar a nossa Frente, vamos fortalecê-la
novamente.
Nós temos um colega que é cliente do Dr. Hoel também. O Deputado Carlos
Magno, há 20 dias, fez o transplante, está em plena recuperação, graças a Deus.
Ele já não tinha fígado mais! Graças a Deus já está em plena recuperação e já está
com o medicamento na mão, para tomar, para não ter recidiva. Então, a gente tem...
Agora eu faço uma sugestão ao Dr. Parise, Presidente da Sociedade
Brasileira de Hepatologia, ao Dr. Eleuses, que foi Presidente da Associação Médica
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Brasileira, e a todos que aqui estão. Sobre a questão do diagnóstico, seria uma
sugestão, Deputado Eleuses. Por exemplo, quantos milhares e milhares de pessoas
todos os dias saem dos consultórios médicos com prescrições de solicitações de
exames clínicos de sangue? Sugiro à classe médica que faça um trabalho no
sentido de que a todo paciente a quem seja solicitado um exame de laboratório
sejam incluídos o exame das enzimas hepáticas e os exames do fígado. Eu acredito
que aí nós teríamos um grande avanço no diagnóstico. É claro que, quando
estiverem alterados os resultados, se o médico não for um especialista da área, que
encaminhe o paciente para pesquisar, para fazer exames e para diagnosticarem o
que ele tem. Eu acho que nós tivemos um grande avanço, demos uma grande ajuda,
a classe médica dará uma grande contribuição para o diagnóstico das hepatites no
nosso País.
Eu falei um tanto a mais, mas hoje eu estou muito feliz, sabe, Deputado Paulo
Teixeira, muito feliz mesmo, porque eu acho que a nossa Câmara dos Deputados, o
Congresso dá uma contribuição grande nesse trabalho. Os médicos, a classe
médica, principalmente os Deputados, nunca faltaram com apoio à nossa causa,
aqui, das hepatites.
Eu vou passar agora a palavra para a Deputada Maria Lucia, para que S.Exa.
possa falar para nós todos.
A SRA. DEPUTADA MARIA LUCIA PRANDI - Bem, eu queria cumprimentar
o Deputado Geraldo Thadeu e me colocar à disposição para reativar esta Frente
Parlamentar que tanto já contribuiu para a questão das hepatites. Cumprimento
também o Deputado Darcísio Perondi, que se retirou, mas que é Presidente da
Comissão de Saúde; a representante do Ministério da Saúde, Dra. Elisa; o Dr. Hoel
Sette Júnior; meus colegas Deputados, o Deputado Eleuses Paiva, os Deputados
companheiros de partido, o Deputado Ságuas Moraes e o querido amigo e
companheiro Paulo Teixeira, mas muito em particular e especialmente cumprimento
o Dr. Evaldo Stanislau, que aqui não só representa o hospital, a pesquisa, mas tem
toda uma representatividade como pesquisador e médico atuante, além de
representar o Grupo Esperança.
Eu recebi dE Jeová uma mensagem e vou lê-la. Aproveito para estender
meus cumprimentos a todos os representantes da sociedade civil, especialmente ao
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Grupo Esperança. Jeová mandou uma mensagem assim: “É hoje. Temos a grande
esperança de que seja esta audiência pública o divisor de águas para a ampliação
do acesso e, consequentemente, mais cura para os infectados com o vírus da
Hepatite C.”
O Dr. Evaldo iniciou a fala dele dizendo que, talvez, estejamos fazendo
história neste momento. É bom nos lembrarmos de que, no começo, quando da
descoberta do vírus da Hepatite C, falávamos que era a AIDS do terceiro milênio.
Hoje nós vemos que a Hepatite C, pelos dados apresentados pelos pesquisadores,
pelas estatísticas, tudo isso, é um problema maior do que a AIDS, seja pelo número
de infectados, seja pela questão de que, se a AIDS não tem propriamente a cura
total, ela não tem levado à morte, tem-se tornado uma doença crônica, enquanto,
nas hepatites virais, especialmente na Hepatite C, como foi apresentado pelos dois
pesquisadores, nós não temos tido resultados muito positivos em relação aos
medicamentos.
Eu sou da época que Ribavirina não constava. Na época, era a Portaria nº 29,
não sei se ainda é, que a incluía na cesta de medicamentos que o SUS disponibiliza.
Depois, vieram os outros medicamentos, continuamos a luta, o peglado, que era
mais caro também, tudo isso. Mas, pelos dados apresentados, o que nós vemos são
os pacientes se queixando demais dos efeitos colaterais, como foi apresentado aqui.
É com muita tristeza que a gente vê hepatite em muitas pessoas, muitos lutadores
da sociedade civil ou em pacientes comuns evoluindo para a cirrose, para o câncer
de fígado. Então, realmente, nós temos que reverter esse quadro.
O Dr. Evaldo, de lá do congresso internacional onde foram apresentados os
novos dados, passava mensagem com um superentusiasmo de que poderíamos
estar fazendo uma revolução em relação à Hepatite C, com a possibilidade, como foi
apresentado, da cura.
Eu penso que nós vivemos um momento em que o Ministério da Saúde se
coloca totalmente aberto à discussão, à participação, ao empenho, para buscar
soluções. Nós temos tido, conforme disse o Deputado Geraldo, uma receptividade
muito grande. Sabemos da questão do financiamento. Eu fico pensando: acho que
ninguém de nós aqui foi privilegiado com a retirada da CPMF, não é? Não sei. Na
verdade, retiraram mais de 20 bilhões por ano do orçamento do Ministério. Enfim,
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não se pode propor de maneira nenhuma a volta de impostos, porque a sociedade já
paga muito, mas eu penso que isso foi um grande problema.
Acho que a sociedade civil está extremamente organizada. Ela encontra,
tanto no espaço do Poder Executivo quanto no espaço do Poder Legislativo,
colaboradores, formas de atuação, que é como nós pretendemos fazer — vocês já
têm feito ao longo da história no Congresso Nacional, e nós fazíamos na Assembleia
de São Paulo. Temos de buscar a solução para esse remédio chegar, para o acesso
a essa nova droga, para que, através dos estudos, tenha a possibilidade da cura.
Nada é impossível.
O Deputado falou de esperançar, mas esperançar com luta. Quando David
Capistrano, que foi a primeira cidade do Brasil, como o Dr. Evaldo citou, passou a
distribuir o coquetel de AIDS gratuitamente, a luta levou a que mais tarde o
Ministério o fizesse para todo o Brasil, que virou protagonista mundial no combate à
AIDS/HIV. Quer dizer, nós temos a possibilidade de, a exemplo de outros países,
permitir o acesso ao remédio Sofosbuvir.
(Não identificado) - O Sofosbuvir não é o único. É um entre tantos.
A SRA. DEPUTADA MARIA LUCIA PRANDI - Um entre tantos.
A gente fez alguns estudos sobre esse remédio, essa droga, sobre os
elementos que compõem esse medicamento — como disse o Dr. Evaldo, é antiviral
e, assim sendo, tem a possibilidade maior de ser genérico, o que já é um grande
avanço — e ele já é vendido em alguns países com preços possíveis, enquanto a
Comunidade Europeia e os Estados Unidos têm preços muito mais altos.
Então, eu acho que cabe aí a nossa ação, como cidadãos, como sociedade
civil, como políticos, como brasileiros, de como vamos articular as diferentes forças
para que se possa, então, permitir esse acesso. Como disse o Dr. Evaldo, é um dia
histórico, revolucionário.
Os nossos companheiros de bancada não só do PT, mas de todos os partidos
temos de nos comprometer. O que a Casa pode fazer? É através de legislação? A
gente teve a luta da quebra das patentes, que foi fantástica, na época dos
medicamentos da AIDS. Então, que mecanismos nós podemos acionar para reverter
esse quadro? Eu particularmente acompanho isso. Fiz um pronunciamento na
Assembleia por volta de 1997, 1998 e fui procurada pela Transpática, uma ONG
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também muito atuante, que já trabalha mais com os transplantados, com os que
serão transplantados.
O Grupo Esperança e outras ONGs vieram, acima de tudo, buscar o
diagnóstico para o tratamento, e a nossa região tem avançado nesse sentido.
Quando falo de casos familiares — acho até que foi o Geraldo que citou —, pergunto
por que não se faz um exame de sangue. Parece que hoje se faz um exame para
detectar se teve ou não hepatite para quem vai fazer transfusão de sangue, para
quem vai doar sangue. Mas não é uma rotina de todos.
Eu tive um irmão, que até foi paciente muito mais tarde do Dr. Evaldo, que já
tinha feito cirurgia, tinha marca-passo, tinha isso, tinha aquilo, e só foi descobrir que
tinha hepatite C quando os sintomas apareceram de maneira agravada. Ele fez
cirurgias, fez tudo e ninguém sabia. Ele foi por iniciativa própria a um serviço público,
porque se sentia tão mal que achou que estava com HIV, que contraiu AIDS, que as
pernas estavam ficando finas, tinha cansaço, a barriga estava grande. Ele foi ao
canal 2, onde se conseguiu montar o atendimento da Prefeitura para o caso, e aí viu
que já estava com cirrose, com câncer.
Então, eu quero encerrar, dizendo que realmente é um dia histórico, até
porque se vislumbra, mais do que o tratamento, uma possibilidade de cura e o não
sofrimento dos efeitos colaterais.
Eu quero dizer, Daniele, que fiquei bem tristinha. Seu pai, o Jeová, luta tanto.
Ele disse: “Ah! Estou na fila do transplante”.
Então, nós nos juntamos a todos e a todas, com a certeza de que teremos o
apoio do Congresso e, muito especialmente, do Ministério da Saúde, porque quem
está lá é o Fábio Mesquita, que entende e é comprometido com a questão — não só
ele, mas também o Ministro e todos os outros da equipe.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Gostaria de dizer que esta
audiência pública começou quando a Daniele veio ao meu gabinete, representando
o pai, o Jeová, sentou-se e me ajudou. Num instantinho, nós tivemos a colaboração
da Comissão de Seguridade, e foi viabilizada esta audiência.
Concedo a palavra ao Deputado Paulo Teixeira.
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O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - V.Exa. me daria um aparte de 1
minuto para cumprimentá-lo, Deputado Geraldo Thadeu?
Estamos chegando ao final desta Legislatura. Eu queria dar um testemunho a
todos que nos acompanham tanto na Comissão como nos órgãos de divulgação da
Casa sobre o trabalho do Deputado Geraldo Thadeu.
Eu estava falando com Parise, um colega amigo, que, quando eu cheguei
aqui, Paulo, fui procurado pelo Deputado Geraldo Thadeu, que começou a conversar
comigo sobre hepatite C. Eu cheguei a duas conclusões. A primeira, de que ele era
médico. Não tive dúvida, por conta da conversa. A segunda — eu fiquei mais
preocupado ainda —, de que era médico e hepatologista. Tinha tanto dado na mão
que eu, como médico, ficava com a cintura... Eu preciso dar uma olhada, dar uma
reciclada para começar... Depois descobri que ele não era médico, que era dentista,
mas com conhecimento. Hoel, nós temos que tomar cuidado, porque senão ele
rouba a clínica da gente.
Cumprimento o Deputado Geraldo Thadeu e acho que muito da política atual
que se traça neste País em relação à hepatite C tem a mão de S.Exa. e de outros
Parlamentares da Casa que ele teve a competência de aglutinar em torno de si para
poder avançar.
A gente sabe que o Parlamento não tem condição de legislar, mas tem
condição de levantar alguns problemas, de colocar alguns problemas politicamente
em evidência, e eu vejo, Deputado Geraldo Thadeu, que V.Exa. fez isso com
extrema competência. Então, não poderia deixar, perante seus pares, de falar da
sua luta incansável aqui na Casa.
Era isso que eu gostaria de falar.
Vou ter que me retirar, mas antes — como eu tenho direito à fala depois do
Deputado Paulo Teixeira, Deputado da bancada de São Paulo, e sei que não é
norma das audiências públicas — gostaria de pedir, Deputado Geraldo, que, no meu
lugar, fosse dada a oportunidade para que o Dr. Parise, hepatologista, que trabalha
nesse setor, fizesse uso da palavra, por 3 minutos ou 4 minutos, para falar do
trabalho que as entidades médicas vêm desenvolvendo nesse setor. Eu acho que
isso poderia abrilhantar ainda mais a sua audiência.
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Parabéns, Deputado Geraldo Thadeu! Parabéns, Deputado Paulo Teixeira!
Parabéns Elisa, Evaldo, Hoel pela exposição! Muito obrigado.
Obrigado, Presidente, pela gentileza. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Obrigado.
O Deputado Eleuses é um grande Deputado, que representa aqui a defesa da
saúde pública, principalmente. Tem uma atuação muito forte. É um grande
companheiro e amigo. Vocês viram que ele é um grande amigo meu; tenho a maior
estima e carinho por ele também.
Passo a palavra ao Deputado Paulo Teixeira, outro grande companheiro e
amigo, para que ele possa fazer a sua explanação...
A SRA. HELOÍSA AMÉLIA GONÇALVES CAIADO - Eu quero fazer uma
denúncia, porque o Ministério da Saúde... Fui eu que entreguei nas mãos de Serra a
criação da hepatite C. Eu fui a uma reunião, acompanhando a Ana Maria, de Santa
Catarina. No primeiro dia, era puta e prostituta. No segundo dia, era só traveco.
Todos com roupa de mulher, querendo que o Ministério da Saúde pagasse
fonoaudiólogo para eles. Diziam: “Nós estamos precisando é de faixas, de
propaganda”. É o trabalho que o senhor está fazendo. Não é essa porcaria! Eu fiz o
maior sacrifício para vir aqui. Estou com câimbra nas duas pernas.
Fui portadora de hepatite C. Tomei essas merdas desses remédios durante 1
ano. Perdi todos os dentes e cabelo, mas não deixei de lutar.
Meus cumprimentos ao meu grande amigo. Sou apaixonada por Jeová (risos),
pelo Carlos que me conseguiu a primeira dose de medicação, porque o Jofran Frejat
disse que não dava. Aí o Conselho daqui lhe disse para dar o medicamento. Ele não
será eleito nem síndico de bloco. Moro aqui desde 1960.
Eu quero agradecer ao senhor pela minha intervenção. Quero deixar anotada
a minha intervenção. Isso é um absurdo! O Ministério da Saúde não tem dinheiro,
porque gasta dinheiro em porcaria, em merda!
Peço desculpas. Meu nome é Heloísa Amélia Gonçalves Caiado. Eu sou
aposentada como Procuradora da Advocacia-Geral a União, e a minha irmã foi a
primeira mulher-chefe do Ministério Público Federal.
Obrigada. Desculpem-me. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Eu passo a palavra ao
Deputado Paulo Teixeira.
O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Sr. Presidente Geraldo Thadeu, eu
quero, preliminarmente, parabenizá-lo pela Frente Parlamentar, parabenizá-lo pela
audiência. Quero cumprimentar o Dr. Hoel, o Dr. Evaldo e a Dra. Elisa. Quero
cumprimentar todos os participantes deste evento.
Preliminarmente, quero destacar três pessoas que estão aqui. O primeiro
destaque é para a estreia brilhante da Deputada Maria Lucia Prandi, que enriquece
o nosso Parlamento. Eu tive oportunidade de ser colega dela em São Paulo, quando
era Deputada Estadual. Ela teve um mandato brilhante na área da educação. Foi
Presidente, várias vezes, da Comissão de Educação. Representa Santos,
representa a melhor tradição da política brasileira, representa tão bem o nosso
Estado e, para essa causa, é uma grande aliada, porque Santos deu uma
contribuição enorme na questão da AIDS, por conta do Porto e pela boa política
pública da Prefeita Telma de Souza e do Prefeito David Capristano.
O segundo destaque é sobre o Dr. Evaldo. O Dr. Evaldo é médico, trabalha
nessa área e traz todo o seu conhecimento científico e político para a área. Ele traz
uma grande contribuição para nós e vai nos ajudar a resolver esse problema.
Portanto, quero aqui destacar a presença do Vereador e médico Evaldo
Stanislau, que tão bem atua nessa questão e tantas contribuições tem dado. Ele é
da cepa da boa política e traz também um profundo conhecimento técnico. Por isso,
quero saudá-lo.
Terceiro, Deputado Geraldo Thadeu, é que o Deputado Darcísio Perondi dizia
que V.Exa. é o nosso general. Há 80 anos, eu não poderia dizer isso, porque nós
estávamos na guerra entre Minas e São Paulo, e Poços faz divisa com Águas da
Prata, e vocês usavam matracas. Então, eu não tinha condições de dizer que V.Exa.
era o meu general. (Riso.) Hoje eu tenho e o constituo como general nessa luta tão
importante de prevenção da hepatite C e do tratamento dos pacientes de hepatite C.
Eu venho da luta contra a AIDS. Primeiro, eu propus um projeto de lei com
base na experiência de Santos. Quando o Ministério Público proibiu o Programa de
Troca de Seringa, em Santos, eu fiz uma lei, em São Paulo, autorizando. E, aí, nós
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tivemos 127 programas de trocas de seringas no Brasil para prevenir a
contaminação da AIDS e hepatite pelo compartilhamento de seringas.
Era uma estratégia de saúde pública.
A SRA. DEPUTADA MARIA LUCIA PRANDI - Permita-me, Deputado?
Apenas lembro que o Dr. Fábio Mesquita, na época, sofreu um processo por
conta da distribuição gratuita de seringas em Santos, porque foi considerado algo
que estava servindo ou incentivando a drogadição. É importante registrar isso,
porque eu acho que a luta vai mostrando...
E o Deputado Paulo Teixeira, de maneira corajosa, na Assembleia, fez toda
uma legislação, inclusive de política de redução de danos.
O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Obrigado, Deputada Maria Lucia.
Depois, quando o cientista David Ho, no Canadá, lançou aquele antirretroviral
para AIDS, eu entrei, junto com as ONGs de AIDS de São Paulo, com uma ação no
Ministério Público exigindo que o Estado de São Paulo distribuísse a todos os
portadores do vírus da AIDS o antirretroviral. O Estado de São Paulo fez um acordo
com o Ministério Público, distribuindo o antirretroviral em São Paulo, e depois o
Senador José Sarney foi autor de uma lei que deu isso no Brasil. Ouvindo aqui,
parece-me que nós temos que dar um passo maior do que temos dado.
Primeiro, eu quero dizer que fico muito feliz quando vem o nome do Fábio
Mesquita como Coordenador do Programa de AIDS que, em minha opinião, é um
dos maiores especialistas nessa área no Brasil. Ele tem uma experiência
internacional, veio agora da OMS, estava no Vietnã cuidando da OMS. É um grande
especialista e, podemos dizer com tranquilidade, um dos maiores do País e um dos
maiores do mundo. Certamente, V.Exa. dá aqui um depoimento do acerto das
políticas que o Fábio está fazendo no Ministério, que o Ministro da Saúde e a
Presidente da República estão fazendo.
Agora, nós precisamos detectar aqui que passos temos de dar para melhorar
essa situação. Se não me engano, nós temos 500 mil pacientes de AIDS no Brasil.
Três milhões de pacientes de hepatite é um número muito importante, muito
significativo. Então, nós precisamos trazer o Fábio — não pude ouvir a Dra. Elisa,
nem o Evaldo, mas ouvi o Dr. Hoel —, para ver como ampliar o programa para os
portadores de hepatite, para a prevenção da hepatite. Como a Deputada Maria Lucia
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disse, temos que oferecer o teste e estimular a população a fazê-lo. Portanto,
precisamos ver como poderíamos ampliar a prevenção e melhorar o diagnóstico.
Que seja um primeiro passo!
Eu sugiro, Presidente, que V.Exa. possa, primeiro, escolher a Deputada Maria
Lucia como sua Vice-Presidente, porque terá uma grande Vice-Presidente; segundo,
trazer o Fábio aqui para discutirmos os programas de prevenção e diagnóstico.
Gostaria de dizer que recebi esta carta, que todos receberam, do Movimento
Brasileiro de Luta contra as Hepatites Virais. O Movimento diz que o preço do
medicamento é um problema relevante. Se realmente for o que foi dito na carta, nós
precisamos dialogar com o Ministro da Saúde e com o INPI. Nós temos, sim, que
respeitar as patentes.
Antes, eu quero ir para a Lei de Patentes. Em primeiro lugar, a Lei de
Patentes foi aprovada no Brasil em 1996, fruto de um acordo da dívida pública de
1992 feita pelo Collor, em que os Estados Unidos impuseram uma Lei de Patentes
considerada além do que o TRIP propunha. Aqui nós fizemos o chamado TRIP plus.
Isto é, nós colocamos na nossa lei exigências superiores ao que o Acordo TRIP já
permitia. Então, já é uma lei leonina e não atende aos reclamos de saúde pública.
Em segundo lugar, nós fizemos, em 2007, à época do Ministro Temporão e do
Presidente Lula, a quebra da patente de um medicamento contra a AIDS. Em
terceiro lugar, nós precisamos trazer a debate o preço desse medicamento. Se
houver abuso de poder econômico na indústria farmacêutica, nós não podemos
também nos ajoelhar, não podemos admitir isso, partindo dessa primeira frase
atribuída ao Einstein, a de que o mundo não é perigoso por causa daqueles que
fazem mal, mas por causa daqueles que olham e não fazem nada.
Então, eu quero sugerir esses três encaminhamentos, Comandante Geraldo
Thadeu: primeiro, incorporar a Deputada Maria Lucia na estrutura; segundo, chamar
o Dr. Fábio Mesquita, Coordenador do Programa de AIDS e Hepatite do Ministério;
e, terceiro, chamar o Ministro, ou quem ele designar, e o Presidente do INPI. E
vamos ouvir também os argumentos da indústria farmacêutica. Se houver abuso do
poder econômico no preço desses medicamentos, nós precisamos ajustá-lo, porque
não é possível aceitarmos que o medicamento tenha um custo inacessível a um
programa. Enfim, na resolução final, não estaremos dando conta. Poderemos
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perguntar: “É preciso aumentar o financiamento?” “É” “É preciso universalizar o
acesso?” “É”. Agora, se nós tivermos um preço abusivo, não será fechada a
equação, e 3 milhões de pessoas poderão morrer.
Portanto, a minha sugestão é de que encaminhássemos uma audiência com o
Dr. Fábio Mesquita, para saber se é possível ainda ampliar os programas de
prevenção e diagnóstico. Segundo, discutirmos o tema do acesso ao medicamento e
se há abuso do poder econômico na venda do medicamento, como está sendo
trazido aqui pelo Movimento Brasileiro de Luta contra Hepatites Virais. O Movimento
vai ao nervo e começa discutindo a Lei de Patentes. Então, o que ele está dizendo é
que o preço está sendo abusivo. Ora, se essa denúncia for entendida como
diagnóstico correto de uma prática da indústria farmacêutica, nós não poderemos
pactuar com uma prática de abuso de poder econômico.
Portanto, eu quero sugerir a discussão aqui dessa agenda do acesso ao
medicamento, quero sugerir para a sua agenda, meu general — impossível de ser
dito há 80 anos, mas agora constituído como tal. E todos os pratenses que viveram
a Revolução de 1932 haverão de entender que a sua causa é maior do que o que
aconteceu em 1932.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - O primeiro pedido do
Deputado Paulo Teixeira já está completamente aceito. Nós fazemos o convite
agora à Deputada Maria Lúcia para somarmos forças em defesa dessa causa no
Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados.
Ontem eu estive com o Dr. Fábio Mesquita. Eu vejo a preocupação com a
questão do custo. Mas nós tivemos o pico disso que foi o grande problema do custo
do tratamento das hepatites, o advento do Interferon Peguilado, principalmente.
Essa foi uma fase em que foi difícil resolver tudo.
Mas o que se avançou hoje no protocolo de inclusão, no protocolo dos
medicamentos de última geração, foi uma grande vitória dessa luta toda, das ONGs,
de todos que aqui estão, do próprio Ministério, tanto que hoje, realmente, por
exemplo, esse medicamento que lançaram — estávamos conversando aqui com o
Dr. Fábio — já está praticamente chegando. Esse medicamento foi lançado em 2014
e já, já estará entrando no protocolo.
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Então, acho que nós não estamos tendo esse grande problema que tivemos
no passado. Isso aí está bem equacionado e é uma grande vitória, uma grande
conquista.
Eu vejo que o grande desafio de todos é o diagnóstico, porque é uma doença
silenciosa, que já era para ter avançado. Essa foi a sugestão que eu dei para a
classe médica. Vou passar a palavra também ao Dr. Parise, que é da Sociedade
Brasileira de Hepatologia. Estão aqui o Dr. Hoel, o Dr. Evaldo e a Maria Elisa, que
são da área de medicina.
Dra. Maria Elisa, vamos fazer uma parceira com a classe médica, sociedade
brasileira, Associação Médica Brasileira, enfim, com todos que possam fazer um
trabalho, Deputado Paulo Teixeira, de contribuição do diagnóstico do portador de
hepatite crônica, que muitas vezes é silenciosa, e a grande maioria não sabe que é
portadora. Aí, eu tenho certeza, nós vamos avançar muito.
Vamos, democraticamente, Deputado Paulo Teixeira e Deputada Maria Lucia,
conceder 3 minutos. Depois, temos mais dois. Vocês vão querer ler aquele
documento? (Pausa.)
Primeiramente, vamos passar a palavra ao Dr. Edison Roberto Parise,
Presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia.
(Não identificado) - ... está fazendo para ampliar o diagnóstico. Falo depois
ou agora?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - O Dr. Parise vai falar.
Depois a senhora.
(Não identificado) - Tá. Falo depois.
O SR. EDISON ROBERTO PARISE - Na pessoa de V.Exa., eu gostaria de
cumprimentar todos os Deputados da Casa, todos os Parlamentares aqui presentes.
Quero falar da nossa alegria de ver a reativação ou pelo menos o
planejamento de reativação dessa Frente Parlamentar, que já nos deu muitos frutos
na luta contra a hepatite C. Sabemos da importância que isso tem.
Eu gostaria de dizer que isso que o senhor acabou de dizer já está em
andamento. Juntamente com a Associação Médica Brasileira, a Sociedade Brasileira
de Hepatologia lança, em julho, uma campanha direcionada aos médicos e ao
público em geral, sobre a conscientização da importância da hepatite e da
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importância de os médicos estarem alinhados através de mala direta, de
comunicação direta com os médicos. Isso já está em andamento e veio numa boa
hora.
Até há pouco tempo, se o senhor me dissesse isso, eu diria: “Eu não sei se
isso é eticamente legal”. Por quê? Porque se analisarmos a situação do tratamento
das hepatites, não é por acaso que nós estamos, há vários anos, tratando o mesmo
número de pacientes, porque os serviços que recebem esses pacientes estão
abarrotados e porque esse tratamento que temos agora é cruel para o paciente. Ele
consome 48 semanas de tratamento, que exige um monte de exames e um monte
de retorno dos pacientes. Cada vez que começamos a tratar um paciente, nós
estamos adotando um filho por 1 ano ou mais de tratamento. E o pior é que somente
a metade, no máximo, desses pacientes respondia ao tratamento. A outra metade
continuava dentro do serviço e os serviços começavam a não dar. O ideal seria que
a gente estivesse preocupada com diagnóstico, com acesso, mas a grande verdade
é que hoje nós estamos discutindo sobre o que foi o grande foco aqui: o
medicamento. Está tudo diferente daquilo que a gente já aprendeu. A gente
aprendeu que o importante é começar com a prevenção e não ficar preocupado com
o tratamento. Mas no caso específico aqui, esse tratamento muda tudo.
Para que o senhor tenha ideia, o tempo de tratamento pode ser encurtado
para 12 semanas, para 3 meses ou até menos que isso. Os efeitos colaterais não
são necessários. O número de exames cai. De cara, nós já aumentamos o acesso
em pelo menos três vezes. Se hoje atendemos em média 10 mil pacientes, nós
podemos atender já, imediatamente, 30 mil. Mas isso é muito pouco na realidade da
hepatite do nosso País. Nós temos de 2 a 3 milhões de infectados. Pelas contas,
não tratamos nem 100 mil. Isso sem contar que tem gente que trata duas ou três
vezes, como foi aqui colocado.
Conforme pesquisa feita pela Sociedade Brasileira de Hepatologia e pelo
Datafolha, em 2011, somente 20% da população das grandes capitais tinha feito o
teste da hepatite C. Ou seja, nós temos um iceberg todinho para ser diagnosticado.
Nós temos Estados no Brasil onde somente a Capital trata, porque o
tratamento é difícil. Então, o indivíduo tem que viajar quilômetros para chegar à
capital e ser tratado. Com essas drogas atuais, que dão um monte de efeito
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colateral, os médicos acabam desistindo. Os médicos não estão motivados. E essas
novas drogas mudam completamente essa concepção, porque é fácil tratar, você
pode envolver mais médicos, você pode ter mais acesso. Então, nós temos uma
inversão de valores muito grande. Ao conseguir o remédio, nós conseguimos
melhorar o acesso ao diagnóstico.
Temos muita coisa para fazer. Os diagnósticos rápidos não podem ficar
restritos aos Centros de Referência e Treinamento em DST/AIDS. Por que os
centros especializados não fazem? Por que as universidades não fazem? Nós temos
que ampliar esse acesso, nós temos que dar a essas cidades de 400, 500 mil
habitantes... Cito algumas, como, por exemplo, Patos e Campina Grande, na
Paraíba, que têm médicos que podem ser desenvolvidos — e a sociedade está
traçando um plano para desenvolver e capacitar esses indivíduos para esse novo
tratamento, que vai ser muito mais fácil de se conseguir.
Então, infelizmente, nós estamos invertendo a ordem das prioridades:
discutindo aqui medicação. Concordo plenamente com o senhor: nós devíamos
discutir coisas melhores. Mas aqui existe uma sucessão de casos em que a inversão
é válida. Então, realmente, conseguir um tratamento mais humano e mais digno para
os portadores da doença é prioritário.
Eu gostaria de agradecer a oportunidade de ter me expressado e de
cumprimentá-lo por sua constante luta, bem como a todos os Parlamentares,
esperando que realmente possamos ter a capacidade de reativar e lutar por esses
pacientes.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós estamos recebendo
aqui o Deputado Jorge Bittar, do PT do Rio de Janeiro, o que nos dá um grande
prazer.
Nós vamos agora conceder a palavra ao Sr. Bartolomeu Luiz de Aquino, da
Comissão de Articulação com os Movimentos Sociais.
O SR. BARTOLOMEU LUIZ DE AQUINO - Sr. Deputado, parabéns pela
organização desta nobre audiência que será o marco inicial para tentarmos fazer um
grande barulho em torno dessa doença que é silenciosa.
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A Lei de Propriedade Industrial — LPI, Lei de Patentes, permite que o
interesse econômico se sobreponha ao direito à saúde e, em muitos casos, até
mesmo ao direito à vida, uma vez que relega à própria sorte aqueles que não podem
custear o tratamento. E isso ocorre num país como o Brasil, que tem o SUS e cuja
Constituição Cidadã garante a todos o direito à saúde, impondo esse dever ao
Estado. Os arts. 6º e 196 da Constituição da República Federativa do Brasil aludem
bem a isso.
Há muito tempo estamos permitindo que o mal seja feito, mas é claro que
paciência tem limites.
O art. 5º da Constituição Federal, em seu inciso XXIX, dispõe:
“Art. 5º ......................................................................
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos
industriais privilégio temporário para sua utilização, bem
como proteção às criações industriais, à propriedade das
marcas, aos nomes de empresas e a outros signos
distintivos, tendo em vista o interesse social e o
desenvolvimento tecnológico e econômico do País;”
Ocorre que essa lei não promove o desenvolvimento tecnológico e econômico
do País, tampouco protege o interesse social. Ao contrário, ela protege interesses
econômicos estrangeiros em detrimento de direitos fundamentais como o direito à
saúde e à vida.
O Congresso foi rápido na aprovação da Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996,
a Lei de Propriedade Industrial. Tínhamos 10 anos para discutir e implementar o
acordo tríplice, mas o fizemos em 1 ano. O então pensamento neoliberal do Estado
mínimo orientou a solução do que seria benéfico para o Brasil. Hoje, entretanto,
sabemos que essa solução, entre aspas, “não foi boa para a sociedade brasileira”.
Nosso déficit no setor farmacêutico passou de 1 para 10 bilhões de dólares. A Índia,
por exemplo, só alterou sua legislação interna em 2005 e nesse meio tempo
desenvolveu sua indústria farmacêutica.
Falando sobre a alteração da lei, o Projeto de Lei nº 139, de 1999, está
tramitando há 15 anos nesta Casa e possui 13 projetos de lei apensados, entre os
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quais destaco o Projeto de Lei nº 5.402, de 2013, nascido de amplo debate
promovido pelo Centro de Estudos e Debates Estratégicos desta Casa.
Srs. Deputados, 15 anos é tempo demais! Já houve algumas alterações na
LPI, mas realizadas através de medidas provisórias, como a de nº 2.105-15, de
2001, convertida na Lei nº 10.196, de 14 de fevereiro de 2001.
Como aqui é a Casa do povo, dirijo-me respeitosamente aos nossos legítimos
representantes, que, nesses 15 anos, não conseguiram vencer o lobby daqueles
que, por debaixo dos panos, defendem interesses menos nobres e contrários aos
interesses e às reais necessidades do povo brasileiro. Peço engajamento aos
representantes do povo no sentido de que solicitem à nossa Presidenta que,
tomando como base os projetos já discutidos nesses 15 anos, utilize os recursos da
medida provisória para alterar a Lei das Patentes, dando ao Estado administrador
ferramentas para melhor cuidar da saúde de seu povo.
Lembro que, em 19 de setembro de 2011, à ONU a Presidenta Dilma falou
sobre a licença compulsória para medicamentos de atenção às Doenças Crônicas
Não Transmissíveis — DCNT, maior causa de morte no Brasil e no mundo. E as
alterações propostas nesse projeto de lei vão de encontro ao discurso proferido pela
Presidenta naquela oportunidade. Certamente, essa matéria será alvo de discussões
durante a campanha eleitoral deste ano.
Dia 1º de maio, a Presidenta Dilma mencionou que a pressão popular gerou
alguns pactos na saúde, sendo o Programa Mais Médicos um deles. Seria oportuno
aproveitar este momento e pedir necessárias alterações na Lei das Patentes. A
Gilead com o sofosbuvir serve como exemplo do absurdo resultante desse tipo de
lei.
Trago à discussão caso atual. A Gilead, fabricante da droga Sovaldi
(Sofosbuvir), usada no tratamento de hepatite C, estabeleceu o preço de mil dólares
para cada comprimido, o que acarreta um custo de tratamento de 84 mil dólares, em
12 semanas, ou 168 mil dólares, em 24 semanas, conforme o genótipo do portador
de hepatite.
A Gilead também comprou a Pharmasset, que desenvolvia essa droga junto
com a BMS em pesquisa clínica de fase 2. Por essa transação, pagou 11,2 bilhões
de dólares, com 89% de ágio, uma vez que o valor da empresa era de 5,97 bilhões.
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E rompeu a parceria com a BMS. Após concluir a fase 3 da pesquisa clínica, foi
autorizada pela FDA a comercializar a droga em dezembro passado, estabelecendo
esse preço absurdo de mil dólares por um único comprimido!
Em síntese, o atravessador quer que os usuários paguem a conta. Já faturou,
apenas no primeiro trimestre de 2014, 2,27 bilhões de dólares. Não seria esse um
exemplo clássico do abuso do poder econômico? O preço do comprimido, na
verdade, é suficiente para tratar mais de 4 pessoas por 12 semanas, segundo a
química brasileira Eloan Pinheiro, que esteve nesta Casa em audiência passada.
Cabe ressaltar que esse mesmo medicamento já foi oferecido ao Egito por
900 dólares em quantidade suficiente para o tratamento de 12 semanas. Já para a
Índia, foi oferecida licença voluntária para fabricação de genéricos ao custo de 2 mil
dólares o tratamento. Índia e Egito desenvolveram e usam genéricos de Interferon,
produzidos localmente, no tratamento da hepatite C. Na Índia, já há 2 oposições de
concessão de patente para o Sofosbuvir. No Egito, a análise preliminar do pedido já
sinalizou pela não concessão da patente.
Conclusão: por terem enfrentado o monopólio das patentes em suas leis
locais, desenvolveram genéricos e receberam um cala-boca vantajoso. Nós,
brasileiros, também precisamos de uma lei que proteja nossos interesses, e não os
desse monopólio assassino.
A importância da droga Sovaldi (Sofosbuvir): trata a hepatite C com índice de
cura superior a 90% e efeitos colaterais reduzidos. A OMS calcula que haja entre
130 milhões e 150 milhões de pessoas no mundo infectadas com esse vírus HCV,
que, muitas vezes, provoca doenças hepáticas relacionadas, incluindo a cirrose e o
câncer de fígado, causando a morte de 350 mil a 500 mil pessoas anualmente.
No Brasil, a estimativa é de que haja 3 milhões de infectados cronicamente.
Essa mesma empresa, a Gilead, já pediu à FDA americana autorização para
comercialização de outra droga, a Ledipasvir, que, associada ao Sofosbuvir, em
pesquisas clínicas fase 2, obteve resultados excepcionais, tratando infectados de
HCV e HIV, transplantados de fígados e pessoas em fila de transplante, com cirrose
descompensada, como o Dr. Evaldo tão brilhantemente explicou aqui.
Se tratarmos essas populações, milhares de vidas brasileiras poderão ser
salvas, como ele falou. Essa droga deverá ser aprovada ainda este ano, ou, no mais
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tardar, no início do próximo. Após a aprovação, o preço do comprimido de
Sofosbuvir mais a Ledipasvir certamente será muito caro, razão pela qual
precisamos ter nossa Lei de Patentes alterada, mesmo contrariando a ganância dos
investidores, a fim de assegurar efetivamente direitos fundamentais, como a vida e a
saúde do povo brasileiro.
Não custa lembrar, conforme disposto no art. 170 da Constituição, que a
ordem econômica “tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social”. Em outras palavras, a razão de ser da economia é
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, e não de
reduzir a expectativa de vida, nem muito menos de eliminar vidas humanas menos
favorecidas.
Relembrando a história da AIDS, vimos que se buscava acordo para baixar os
preços de medicamentos, eis que milhões de pessoas morriam sem acesso ao caro
tratamento. Não podemos permitir que essa estratégia se repita com a hepatite C.
Se o Legislativo e o Executivo não se unirem para resolver a questão, o Judiciário
será o último recurso. E, com certeza, o nosso Judiciário prima — como advogado
posso afirmar isto — pelo princípio constitucional.
Porém, todos nós sabemos que essa solução desorganiza o orçamento da
saúde, que já é debilitado, além de ser uma medida paliativa, uma vez que pode
possuir alcance reduzido a um número restrito de pessoas, o que viola o princípio da
universalização do acesso à saúde.
Para finalizar, o Movimento Brasileiro de Luta contra as Hepatites Virais conta
com o empenho dos bons representantes do povo para promover alterações
necessárias à Lei das Patentes, assegurando efetivamente os direitos fundamentais
do cidadão brasileiro e contribuindo para o desenvolvimento tecnológico e
econômico do nosso País, mas sem perder de vista que a dignidade da pessoa
humana é um dos fundamentos da República brasileira, conforme proclama o art. 1º,
inciso III, da Constituição Federal. A economia é apenas um instrumento para a
promoção dos direitos fundamentais, e nunca um fim em si mesmo, a ponto de
sacrificar vidas.
Muito obrigado! Contamos com vosso apoio. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Vou passar a palavra
agora ao Pedro Molina, do Grupo Esperança, de Santos.
Antes, porém, gostaria de registrar a presença do Ronaldo e do Ever, também
do Grupo Esperança. Eles estiveram no meu gabinete ontem. O pessoal do
Esperança está todo aí.
Com a palavra Pedro Molina.
O SR. PEDRO MOLINA - Sr. Presidente, gostaria de agradecer à bancada, a
todos os presentes, em especial ao Dr. Geraldo Thadeu, que nos abriu esta porta de
duas folhas, para que a gente possa realmente discutir e trabalhar em função de um
mal que atualmente é um mal maior: a hepatite C.
Digo que estou muito orgulhoso de estar aqui ouvindo e vendo tantas pessoas
engajadas nessa situação e que se fazem presentes. Mas, como ativista que eu
procuro ser, preciso expor e reforçar muito do que foi dito aqui. Coloco como
primeiro passo que o remédio se mostra importantíssimo! É praticamente um
verdadeiro divisor de águas.
A partir daqui, a partir de hoje, a partir desse remédio, nós teremos muitas
coisas a fazer e muitas coisas a melhorar ao portador. Isso foi bem colocado pelo
Dr. Evaldo. Agora, digam para mim quantos de nós não gostaríamos de estar vendo
Jeová aqui? E se esse remédio já estivesse aprovado? Esse tempo, essa demora...
o que leva a isso?
Então, essa é uma coisa que compromete muito a saúde, a vida das pessoas.
Jeová lutou muito por esta audiência aqui, mas não pôde estar aqui. Quantos tantos
outros não passaram por isso? Eu mesmo sou transplantado. Quando descobri, já
era tarde demais! Tenho 9 anos de transplante e sou... Por favor... Estou intervivos.
Já tentei mais de uma vez negativar o vírus, e não consegui. De careca que eu era,
careca acabei ficando mais ainda, porque fiz o último tratamento, caiu e não voltou
mais!
Então é uma coisa que nós devemos realmente levar mais a sério, pensar
mais nessa condição de poder possibilitar esse remédio à população.
O segundo passo que eu vejo é que isso mostra a necessidade de agilizarem
a liberação desse remédio. Será que precisaremos ir às ruas? Se preciso for, a
sociedade civil irá. Com certeza, as ONGs não deixarão passar isso de modo
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inexistente ou ineficaz. Vai-se à luta, tenho certeza disso. E já convido, de antemão,
as ONGs a trabalharmos nesse sentido. Se preciso for, diante do que já foi mostrado
pelo senhor, que o remédio está lá, saindo do forno direto para a boca do portador
da hepatite C...
Mas, de outra maneira, quero colocar aqui o seguinte: por que o Ministério da
Saúde não utiliza o RDC nº 3, de 2 de fevereiro de 2010, que, no seu art. 4º, § 1,
letra "a", contempla que a medicação pode sair da fila e pode ser liberada; não é
preciso ficar lá esperando a ANVISA pela aprovação desse medicamento. Caso
precisem, eu tenho ela aqui, aliás. (Ininteligível) tem essa Resolução. É uma coisa
que poderia adiantar bastante, para a liberação dessa medicação para nós. Então,
eu acho que isso também seria uma coisa a se pensar.
O terceiro passo — e agora, como o Dr. Parise colocou, eu gostaria de
colocar também uma parte — é o seguinte. Eles colocam esse medicamento numa
condição de que dê poucas intercorrências, ou seja, poucas manifestações. Mas,
mesmo assim, por que nós, o Brasil, não temos os hospitais-dia, onde os portadores
de hepatite C, quando têm alguma intercorrência, não possam ir? Digo esses
centros de referência. Hoje, por exemplo, vamos pensar em Santos — eu sou de
Santos, e vamos falar de Santos. Se eu chegar ao Guilherme Álvaro, que é o
hospital de referência, provavelmente não terei um médico lá da minha
especialidade, da minha necessidade. Por que não termos um médico que seja
plantonista e que não precise estar lá? À noite não precisa ter um plantonista lá. Ele
poderia muito bem ser comunicado através de rádio, através de um celular, para que
pudesse tomar uma providência no sentido de amenizar o problema desse ou
daquele paciente. E por que não, no caso de a intercorrência ser mais séria? Por
que nos preocuparmos? Esse paciente já saiu de uma colocação para um hospital,
para ser internado. Quantos de nós — agora digo como eu aqui — que tínhamos
encefalopatia e não tínhamos aonde ir para fazer uma simples lavagem intestinal?
Não que eu gostasse, mas uma simples lavagem intestinal. Eu chegava aos
hospitais, e eles me falavam assim: “Você tem hepatite C?! Acho bom você tomar
soro”. Isso é uma coisa que eu acredito que seja comum pelo Brasil todo.
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Então é uma coisa, Deputado, que precisaria também se colocar em pauta:
montar pontos de referência para tratamentos da hepatite C, para que quem tem
essas ocorrências possa ser realmente tratado e ser levado a uma situação melhor.
Com referência às ONGs e os Parlamentares, temos que nos unir no sentido,
como assim está sendo feito hoje, de trazermos resultados mais imediatos e
soluções mais imediatas. E o remédio, sem dúvida alguma, é uma delas.
Os tratamentos, como eu falei, trazem intercorrências. Os hospitais... E outra
coisa que sentimos no dia a dia, principalmente nos polos de aplicação, são equipes
multidisciplinares. Essas não há. A pessoa chega lá para tomar o medicamento, está
cheia de problemas, e ninguém tem soluções para ela. Existe uma enfermeira que
vai fazer uma aplicação hoje; mas, quando ele for tomar o remédio, será que ele não
vai ter nenhum tipo de problema?
Eu mesmo, no Albert Einstein, era considerado como tranqueira: tudo
acontecia comigo. Será que todos que vão tomar essa medicação não vão
apresentar algum tipo de problema, algum tipo de intercorrência? Será que vai existir
pessoal gabaritado, dentro desse planejamento, para executar esses cuidados e
passar isso para a pessoa que está com necessidade?
Aí, eu vou partir para outro lado, já partindo para quem tem a cirrose
descompensada, e hoje pensando novamente em Jeová, que foi uma parte que
aconteceu comigo, na minha época. Com a rápida liberação desse remédio,
evitaremos entrar em outro gargalo, que é o transplante.
E, aí, cabe aqui outra audiência pública — e espero que vocês sejam reeleitos
para que possam continuar nos ajudando. Isto eu falo de coração, porque é
necessário. Nós não podemos esperar que se monte uma nova equipe para
começar tudo de novo. Nós precisamos de vocês — precisamos muito de vocês!
Eu acompanho a questão do transplante, sobre o que existe a Portaria nº
2.601, de 21 de outubro de 2009. Essa portaria acabou se tornando uma porcaria,
porque ninguém faz nada por ela, ninguém quer saber dela. Não se tem polos de
captação de órgãos. A pessoa fica 3, 4, 6 meses, 1 ano esperando para receber
uma doação. Nesse meio tempo, quem tem uma cirrose descompensada — pessoa
que agora, aparentemente, vai poder pelo menos tratar o vírus, mas o que não vai
solucionar o problema da cirrose — não pode esperar.
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Quantas mortes existem em que se podem aproveitar órgãos, e que são
despejados fora esses órgãos? E por vários motivos: hospitais que não aceitam
fazer isso, porque acham que o SUS repassa um valor ínfimo para eles, e porque
eles só vão receber do valor ínfimo 70%, e que isso não paga nem a hora da
máquina ligada... Tudo isso tem que ser revisto, tem que ser repensado.
É dada uma verba de 20 mil reais mensalmente para quem tem isso. Mas
eles não fazem nada; eles se preocupam em retirar a córnea, pois só se retira a
córnea na hora. E dispensam o resto do corpo. É um fato triste, mas é uma
realidade. É só olhar, é só ir atrás, que se vai ver que isso é uma verdade.
Para terminar, eu digo um fator preponderante, que é a divulgação.
No comecinho, a Dra. Elisa colocou a questão dos kits. Este ano, se eu não
estiver enganado, 1 milhão e 800 mil kits seriam comprados pelo Ministério da
Saúde. Em Santos isso não chegou. Se não é o Grupo Esperança sair à luta para
fazer essas testagens, Santos não teria testagem. Desculpem-me, mas existe uma
coisa que tem de ser vista. O Grupo Esperança, em Santos, faz o trabalho da
Prefeitura e do Governo, dia a dia. Vai começar, no dia 12 agora, uma que vai até o
final do mês. Vamos a Guilherme Álvaro, vamos ao Poupatempo, vamos à
Beneficência Portuguesa. Essa é uma obrigação das ONGs? Eu acho que isso aí
tem que ser revisto, tem que ser repensado.
Uma outra coisa é a propaganda, conforme já foi colocado aqui. Não se faz
propaganda da hepatite C. Às vezes, eu chego a pensar que o Governo aposta na
morte. Não é possível... Tem que se mostrar o que acontece com a pessoa que tem
hepatite. O Governo tem que ser incisivo. Não é para as pessoas ficarem com medo,
mas, sim, para que a população se digne a fazer o teste, para ver se tem o vírus. E,
caso alguém descubra ser positivo, que possa fazer o tratamento e se tornar um
negativo.
Está faltando isso, Deputados. Precisa-se fazer a divulgação da hepatite. Não
é só falar: “Vá lá e faça a testagem da hepatite.” Ninguém vai, mesmo porque
ninguém sabe o que pode acontecer a si em 20 anos. Se essa pessoa tiver a
hepatite, como é que em 20 anos estará o fígado dela...
Esses são os meus pontos. Agradeço muito a oportunidade. Fico muito feliz
de estar aqui!
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Obrigado a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós vamos passar para
as considerações dos membros da Mesa e palestrantes.
Passo inicialmente a palavra à Dra. Elisa Argia Basile Cattappan.
A SRA. ELISA ARGIA BASILE CATTAPPAN - Respondendo rapidamente a
um dos encaminhamentos do Deputado Paulo Teixeira, sobre o que o Departamento
vai fazer para ampliar o diagnóstico, a primeira coisa é lançar, para a rede básica,
para o SUS, para o posto de saúde da periferia, um manual de treinamento não só
do médico, mas de toda a equipe de saúde, de toda a equipe que possa estar apta a
manipular sangue, para botar o teste rápido na rede básica. Com isso,
expandir-se-ia muito, com certeza, o diagnóstico. Além disso, deve-se fazer todo um
material de elucidação e de treinamento de toda a equipe multidisciplinar, não se
esquecendo de que, nas regiões mais longínquas do País, não há médico ainda,
mesmo com o Mais Médicos.
Então, capacitando-se a equipe multidisciplinar, mesmo que a equipe
multidisciplinar seja um técnico de enfermagem, ela terá condição de fazer um teste
rápido. Com o resultado dando positivo, o paciente pode ser encaminhado para uma
carga viral.
Agora, quanto aos testes rápidos, respondendo à questão de estar um pouco
devagar o abastecimento, realmente, vai-se normalizar a distribuição a partir do mês
de junho. Há todo um processo de compra. Porque não é só a gente fazer assim que
chega; há toda uma rotina de serviços públicos federais, estaduais e municipais para
compra de remédios.
Por que não se divulga tanto a hepatite? Primeiro de tudo, é muito difícil achar
a cara da hepatite. Quem se expõe? Eu me exponho, você se expõe, e quem mais
está aqui se expõe. Quando a gente procura alguém de peso para fazer alguma
campanha, falando assim “eu tenho hepatite”, ninguém aparece, porque ninguém
quer se expor. Como o próprio Deputado disse, ele perdeu a clientela. Eu, quando
clinicava, não queria que ninguém soubesse que eu tinha hepatite, porque isso
espanta, é algo que compromete. “O que fez essa pessoa para ficar com hepatite?”
— pergunta-se. Existe o preconceito. Então, hepatite C é uma doença sem cara.
Não há quem apareça para se expor. Eu me disponho a me expor, você se dispõe e,
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com certeza, o Deputado também, mas o fato é que essa é uma doença sem cara.
Então, é muito difícil... O pessoal que tem HIV sai na rua, grita. Quem tenha hepatite
C, só se você pegar no laço, porque não vem ninguém.
Então, era isso que eu queria dizer.
Outra coisa: toda vez que a ONG tem alguma sugestão, o melhor jeito de
encaminhar a sugestão são os fóruns. Nos escrevam que vai haver reunião do
Comitê Técnico Assessor em Hepatites Virais, porque não adianta só dar pedrada
sobre o Governo. Pode ser que, no passado, ele até merecesse, mas, agora, com o
Fábio Mesquita no comando, é totalmente diferente. Eu me comprometo de corpo e
alma com isso. Então, eu faço um empenho, porque eu não luto só pelo outros, eu
também luto por mim, porque isso tem que deslanchar. Então, aceitamos sugestões.
Não é só para tacar pedra, fazer crítica. Precisamos de ideias e ações da sociedade
civil.
Quanto ao problema dos sistemas de atendimento, pela equidade do SUS,
compete à sociedade civil cobrar das autoridades legais a constituição de sistemas
que atendam às necessidades. Mas, para isso, precisa-se da cobrança de vocês. O
Ministério não pode chegar e falar: "Fulano, faça isso na Prefeitura". Não dá para
fazer isso. Então, a sociedade civil tem que fazer a pressão dela, para obter o
resultado necessário.
Obrigada, e desculpem-me por me ter estendido.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Eu agradeço à Dra. Elisa
pelas suas palavras, pela apresentação.
(Não identificado) - Só 1 minutinho, por favor, Deputado Geraldo. Só 1
minutinho, Dr. Evaldo. São 2 frasezinhas, por favor...
No ano passado, a Prefeitura de Santos ou o Estado fez mil testagens. O
(ininteligível) fez 35 mil testagens. Só isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Nós passamos agora a
palavra ao Dr. Evaldo Stanislau, para suas considerações.
O SR. EVALDO STANISLAU AFFONSO DE ARAÚJO - Bem, eu gostaria,
inicialmente, de agradecer mais uma vez a oportunidade e de dizer da felicidade que
a gente tem em poder estar aqui.
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Eu acho que é importante não terminar esta audiência — como disseram o
Deputado Paulo Teixeira, a Deputada Maria Lucia Prandi e o Deputado Geraldo
Thadeu — sem um encaminhamento. A gente tem que ter encaminhamento. É
audiência pública para se tirar encaminhamentos. E eu fico um pouco preocupado,
porque a gente pode ter andado, avançado, e, de repente, podemos cair em
algumas armadilhas que são perigosas.
A primeira armadilha é ficar aprisionado no passado. Eu vejo falas que nos
remontam a um passado complicado, a um passado que me traumatizou como
médico. O Grupo Esperança é um retrato vivo disso. Eu tenho de positivo que eu
mostro a história natural da doença e vou mostrando o que vai acontecendo nos
pacientes que a gente vê nos ambulatórios. Então, no começo, quando comecei a
trabalhar com hepatite C, era só alegria: pacientes com sorologia positiva,
examezinho fácil. Agora sou infectologista, não sou mais hepatologista. Mas não há
semana em que não vejo um nódulo de fígado, uma cirrose descompensando ou um
paciente morrendo. E, no nosso Grupo Esperança, quantos companheiros já nos
deixaram e que estão fazendo a luta de outra maneira?
Então, esse passado, que é um passado de maus resultados, e, sobretudo, o
momento ainda presente, de passado recente da assistência, como Parise colocou,
nos aprisionam. Cada paciente que entra em um serviço... Não é que a gente casa
com o paciente. Mas cada paciente novo tira a oportunidade, a vaga de 10
pacientes. Não é que a gente fica com esse paciente; é que a gente tira a
oportunidade de que pelo menos 10 novos pacientes sejam atendidos, dada a
complexidade dessa assistência que existe hoje.
Então, a gente tem que olhar para frente e não ficar olhando para trás. A
gente tem que ver o que pode fazer de melhor para tratar mais pacientes, para
acolher mais pacientes e para evitar o Jeová, para evitar tantos outros que estão na
beirinha para evoluir bem e, aí, acabam evoluindo mal. Assim, a cabeça é nova, e a
doença é diferente daquilo que a gente viu, como falei anteriormente.
A segunda armadilha é que a gente tem que ser proativo. Eu não começo um
diálogo brigando, não começo um diálogo declarando guerra. A gente precisa
aprender a arte da negociação. O Brasil não é um neófito nessa área. O Brasil tem
experiência; o Brasil vem fazendo isso historicamente com o HIV. Se, por um lado, o
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Brasil viu que, em algum momento, quebrar patente era importante (e foi
interessante), hoje, o Brasil vê que essa política ensinou à indústria farmacêutica
que, parafraseando o Romário, “chegou agora e já quer sentar na janelinha”. Não,
não é bem assim; tem que chegar com mais modéstia. E a indústria farmacêutica
hoje chega para negociar com o Governo em outro patamar e com outra postura.
Assim, esse foi um aprendizado. Muitas vezes, mesmo com quebra de
patente, o remédio licenciado compulsoriamente, ou genérico, hoje é mais caro,
acreditem, do que o remédio da indústria farmacêutica. Vou dar um exemplo: o
genérico do Efavirenz, um remédio usado para tratar de HIV. Hoje, ele é mais caro
do que o original, que poderia estar sendo comercializado.
Então, diante desse aprendizado, eu vou tomar liberdade, já que o Deputado
fez uma menção, de dizer que o Governo brasileiro — e eu sou membro do Comitê
Assessor, como foi dito aqui, e tenho testemunhado algumas situações — está
negociando. E sabem por que está negociando? Porque não dá para esperar que
toda a tramitação legal, que tudo isso ocorra, enquanto o Jeová e tantos outros
morrem.
Alguém conhece um sistema de saúde mais rigoroso do que o inglês? Alguém
conhece alguma coisa mais rigorosa do que o Nice? Pois bem, como acabou o Isol,
o NHS, que é o sistema de saúde do Ministério da Saúde inglês, comprou 500
tratamentos, a preço de mercado, para salvar vidas de pacientes que estão em fila
de transplante na Inglaterra.
Assim, o Governo brasileiro, até onde eu tenho acompanhado, está
negociando firmemente e duramente. Não vai se entregar. Mas ele tem um
compromisso — e eu acho que nisso os Deputados podem ajudar — que é o de que
a gente não veja toda essa negociação, toda essa legislação acontecer. Isso é
importante que ocorra, porque vai garantir a sustentabilidade da política; mas, de
imediato, a gente tem que negociar, sim, e a preço justo. Eu tenho certeza de que
todas as companhias que precisam e querem entrar nesse mercado para salvar
vidas estão dispostas a vender os produtos pelo preço justo, que não é esse preço
que os Estados Unidos evidentemente pagam. É um preço muito mais próximo do
que a Índia paga, do que o Egito paga. Tem que ser assim. O Brasil não é os
Estados Unidos, mas o Brasil também não é um pobre país africano. Existem
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condições, existe um meio-termo, e eu tenho certeza de que a gente vai chegar a
isso. E para quê? Para salvar vidas imediatamente, vidas que não podem ser
desperdiçadas.
Essas medidas de licença compulsória, essas outras medidas são muito
importantes e vão assegurar a sustentabilidade da política, porque uma coisa é a
gente começar a tratar 10 mil, 15 mil, 30 mil pacientes, e outra coisa é tratar de 3
milhões de brasileiros.
Nesse sentido, o movimento social está corretíssimo, e o Governo brasileiro
tem que avançar, sim, para a gente conseguir erradicar a hepatite C no Brasil e dar
um exemplo para a América Latina e para países menos privilegiados que o Brasil e
que não têm condições nem de negociar — esses, sim, é que têm, de imediato, que
ser amparados pelos países que estão em condição melhor de desenvolvimento.
Era isso o que eu queria falar.
A gente tem que tomar cuidado para não cair na armadilha do passado, não
ser traumatizado por esse modelo assistencial complexo que não avança; ou seja,
não cair nessa armadilha de já começar uma guerra, porque a gente precisa ter
remédio para ontem, eis que muitos pacientes precisam urgentemente de
tratamento.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Muito obrigado, Dr.
Evaldo. O senhor foi brilhante na sua explanação. O que o senhor abordou é
realmente o que eu penso. Não podemos pensar no passado, não. Temos que
pensar nos avanços que vamos conseguir. Esse é o caminho.
Agora, vou passar a palavra ao Dr. Hoel Sette Júnior, para suas
considerações.
O SR. HOEL SETTE JÚNIOR - Eu gostaria de agradecer. Esta foi uma
reunião extremamente proveitosa, em que todos tiveram oportunidade de falar. O
Deputado Geraldo Thadeu está de parabéns pela liderança nesta Casa, há muitos
anos, para resolver o problema da hepatite C.
Eu gostaria de lembrar uma coisa que não foi falada aqui. Além de fazer o
diagnóstico precoce, todo paciente de hepatite C tem que ser vacinado para hepatite
A e hepatite B, além de fazer exame para HIV, para saber se não é um coinfectado,
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porque a maneira de contágio das viroses transmitidas pelo sangue é a mesma.
Então, todos que têm hepatite C têm que fazer exame para verificar se têm o
anticorpo da hepatite A. Se esse paciente pegar a hepatite A superajuntada, vai
embora, e de forma fulminante!
Eu gostaria de agradecer a presença do Dr. Parise, nosso Presidente, bem
atuante. A Sociedade Brasileira de Hepatologia nunca teve uma posição tão
brilhante como a que está tendo na gestão dele. Agradeço a todos os presentes,
representantes da indústria farmacêutica e das ONGs. E digo que nós avançamos
bastante.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Eu gostaria de dizer,
antes do encerramento desta audiência pública, que, de acordo com a nossa
maneira de trabalhar aqui no Congresso, quem faz as explanações são os membros
da Mesa e os Parlamentares. E nós hoje abrimos a palavra a todos vocês,
democraticamente, com toda a liberdade para falar. São importantes as
reivindicações e as colocações dos movimentos sociais e dos ativistas. Assim, nós
consideramos que esta foi uma belíssima audiência pública!
Acredito que não podemos retroagir. Antigamente, não tínhamos condições
de conversar; não havia diálogo, conversa. Se um Deputado ia conversar com o
Ministro ou com o diretor, o responsável pela área dos programas, está fazendo
lobby para o laboratório, ele está ganhando dinheiro para o laboratório. E aí vem,
joga na imprensa, coloca a imprensa falando que o Parlamentar estava lá na
ANVISA fazendo lobby, que foi ao Ministério fazer lobby.
Tem os problemas que acontecem? Tem; existem os problemas daqueles que
usam o poder para o mal, mas nós estamos aqui, nós estamos na mesma causa,
lutamos, partilhamos.
Eu enfrentei muita dificuldade na minha vida. A minha família enfrentou
dificuldades, assim como a de vocês, que abraçam a causa. Tem os profissionais
que se preparam na vida, como o Dr. Parise, o Dr. Hoel, o Dr. Evaldo, a Dra. Elisa.
Enfim, nós estamos aqui unidos no mesmo objetivo.
Eu brinco muito e falo assim: “O negócio de salvar vida não dá muito voto,
não, viu?” Não dá muito, não, mas dá muita realização, sabe? Dá muita realização;
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dá a realização do dever cumprido, de saber que a gente pode contribuir para uma
sociedade melhor, não é verdade? E, quando a gente encontra profissionais como
nós temos aqui, que são comprometidos com a vida humana mesmo, que são
cientistas que lutam para salvar essas vidas, as ONGs que aqui estão também, os
movimentos sociais...
Aliás, eu, quando tive a minha hepatite, eu me socorri lá com o Grupo
Esperança, fui atrás. Eu liguei para o Grupo Esperança para me orientar, para me
tratar e tudo.
Então, eu acho que foi uma audiência pública, mas nós temos que dar
sequência. A nossa parte agora, com a convocação que a Deputada Maria Lúcia fez
para nós aqui, através inclusive do Deputado Paulo Teixeira, nós vamos já nos
organizar novamente, junto com o Carlos Magno, que nós esperamos que daqui uns
dias esteja aqui de volta, nós vamos todos nos unir novamente e fortalecer esse
trabalho. Eu espero que o Jeová logo logo esteja também recuperado — ele está
tomando esse novo medicamento para se recuperar, para ficar bom e voltar a ficar
aqui junto com a gente.
Eu quero agradecer a todos os palestrantes, a todos que estiveram aqui, a
todos que participaram desta audiência pública. Como o Dr. Evaldo disse, aqui nós
vamos, cada um no seu trabalho, continuar essa luta. E eu fiquei ontem...
A conversa que tive com o Dr. Fábio Mesquita me encheu de muito ânimo. Eu
até pensava assim: “Acho que agora não precisam mais da gente, não, viu?” Mas
vamos continuar, vamos trabalhar, porque nós temos muitos desafios pela frente.
O Dr. Mesquita, coloquei à vontade lá, a Dra. Elisa estava lá, falei na questão
do financiamento... Aqui, no orçamento, está garantido. Eu disse a ele também,
Deputada Maria Lúcia, que aqui, quando da elaboração do novo orçamento, nós
estaremos à disposição para defender o programa das hepatites, das DSTs, AIDS,
para que não falte recurso para o programa, que ele seja um programa que avance
cada vez mais.
O Dr. Evaldo aqui falou com muita propriedade: “Hoje, a relação da indústria
com o Ministério da Saúde, com o Governo, é completamente diferente.” O diálogo,
o entendimento tem contribuído significativamente.
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Número: 0549/14
COM REDAÇÃO FINAL
08/05/2014
Eu digo para você, Molina, e digo também a Bartolomeu, que houve um
momento em que houve a necessidade de quebra de patente, inclusive do programa
de DST/AIDS, mas eu digo para vocês que entendo perfeitamente do que vocês
estão falando. Se hoje eu tenho o meu vírus negativado é porque nós devemos à
ciência e à pesquisa. Nós temos também que valorizar a indústria farmacêutica,
porque, se não fosse isso, talvez eu não estivesse mais aqui, assim como milhares
de pessoas não estariam mais aqui.
Então, a gente tem que ser justo nesse sentido. Agora, nós vamos lutar. Se
tiver que acontecer guerra para lutar, para reduzir custos, para dar o maior acesso
aos pacientes que precisam de tratamento, nós vamos fazer isso, mas chegar a um
extremo de uma quebra de patente é outra história. Eu acho que se nós
começarmos a pensar só em quebra de patente, quebra de patente, talvez, no
futuro, não tenhamos medicamentos, drogas que vão salvar vidas, como estas que
estão aqui chegando para nós hoje.
Então, não tenho nenhuma preocupação, como Parlamentar, de chegar aqui
e falar para vocês a verdade: que eu defendo a ciência, defendo a pesquisa, valorizo
os laboratórios, valorizo os movimentos sociais, que acho que são importantes e
fazem reivindicações, porque estão lá na ponta representando aqueles que sofrem.
Nós estamos aqui na Câmara dos Deputados, na nossa simples, humilde Frente
Parlamentar, mas estamos aliados, de mãos dadas com vocês, em todo esse
cabinho, para que os portadores de hepatite, principalmente, no nosso caso, das
hepatites crônicas, possam... Aí nós temos portador de hepatite B, que tem a vacina,
e vai acontecer como aconteceu com a poliomielite, se Deus quiser, erradicada com
essa vacina do recém-nascido. Nós temos muita mortalidade ainda devido à hepatite
B, principalmente nos Estados do Norte e Nordeste, que nós temos acompanhado.
Com a palavra Nádia, por 1 minuto.
A SRA. NÁDIA VILLAS BOAS - Cumprimento o Deputado e a Mesa. Quem
fala é Nádia Villas Boas, de Porto Alegre, do Movimento Brasileiro de Luta contra as
Hepatites Virais e representação no Conselho Nacional de Saúde.
É só uma dúvida: eu gostaria de saber se, a partir desta audiência, nós vamos
ter reativada a nossa Frente Parlamentar das Hepatites Virais nesta Casa?
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Thadeu) - Já está, inclusive com a
Deputada Maria Lucia, aqui.
Hoje nós estamos indo embora correndo porque, chega na quinta-feira, a
gente corre para a base. Quando se fala que Deputado não trabalha, eu falo assim:
“Fica um mês comigo, mas de domingo a domingo. Tem que dormir, levantar, viajar,
trabalhar.” (Risos.) Aí vocês vão ver como é que Deputado trabalha, não é, Maria
Lucia? Mas, semana que vem, terça-feira, voltando aqui, já vou com a minha
assessoria, com a Deputada Maria lúcia, para nós formalizarmos. Quero que vocês
sejam os padrinhos e testemunhas da nossa nova Frente Parlamentar das Hepatites
Virais.
Quero agradecer a todos os senhores e senhoras convidados e a todos que
estão aqui até esta hora. Acho que tivemos aqui uma boa audiência pública, e a
Internet deve estar bombando. O pessoal da minha assessoria lá em Minas está
todo acompanhado e tenho certeza de que está entusiasmado.
Foi uma audiência pública que encheu de satisfação a todos nós, eu tenho
certeza. Até a próxima, se Deus quiser.
Eu declaro encerrada esta reunião, esta audiência pública.
Muito obrigado. (Palmas.)
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