1 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ATA DA 1º REUNIÃO Aos sete dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dezessete horas e trinta minutos, em sala do Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, sob a Presidência eventual do Senhor Constituinte Flávio Palmier da Veiga, com a presença dos seguintes Constituintes: Caio Pompeu, Cássio Cunha Lima, Eliel Rodrigues, Eraldo Tinoco, Ervin Bonkoski, Eunice Michiles, João de Deus Antunes, Maria Lúcia, Matheus Lensen, Nelson Aguiar, Rita Camata, Vingt Rosado e lberê Ferreira. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou instalada a Subcomissão e esclareceu que iria proceder à eleição do Presidente e dos VicePresidentes, convidando, nos termos regimentais, os Senhores Constituintes Caio Pompeu, Eunice Michiles e Rita Camata para funcionarem como escrutinadores e secretária da Mesa, respectivamente. Realizada a eleição, e verificando-se a coincidência do número de sobrecartas com o de votantes, apurou-se o seguinte resultado: para Presidente, Constituinte Nelson Aguiar com quatorze votos; para 1º Vice-Presidente, Constituinte Roberto Augusto com treze votos, em branco um voto; para 2º Vice-Presidente, Constituinte Antônio Salim Curiatti com treze votos, tendo um voto em branco. Foram proclamados eleitos Presidentes, 1º Vice-Presidente e 2º Vice-Presidente os Senhores Constituintes Nelson Aguiar, Roberto Augusto e Antônio Salim Curiatti, respectivamente. Assumindo a dos, dividir a grande e histórica tarefa que todos temos pela frente, depois, dentro do meu Partido, o PMDB, os entendimentos realizados para que, dentre um grupo extremamente seleto, extremamente qualificado de companheiros, chegássemos a um entendimento que levasse à indicação de um para o cargo que, pelo acordo, coube ao PMDB. Registro, Sr. Presidente, com profunda emoção e profundo sentimento de quem aqui exercita um ato de justiça, o comportamento de dois companheiros, honrados, competentes, de intensa biografia pessoal, política, no tratamento das questões da família, do menor e do idoso, os Constituintes Ervin Bonkoski e Caio Pompeu. Ambos que pleiteavam com absoluta razão, com absoluta justiça, a honrosa tarefa de presidir esta Comissão, em função dos entendimentos havidos, chegaram junto conosco à posição de indicar para a presidência um homem que tem dedicado a sua vida pessoal e parlamentar a esses temas, o nobre Constituinte Nelson Aguiar, que é indicado pela liderança do PMDB para Presidente desta Comissão. Eu poderia fazer esta indicação em nome da liderança do PMDB e, de forma muito clara e cumprindo elementar dever de justiça. Sr. Presidente, registrar a atitude dos companheiros Caio Pompeu e Ervin Bonkoski. Ao mesmo tempo, e em função dos entendimentos havidos, comunico a V. Ex.ª e aos ilustres constituintes aqui presentes que, pelo acordo foi indicada para 1º vicepresidente, o Constituinte Roberto Augusto e, para 2º vice-presidente da Constituinte Antônio Salim Curiati. Tenho certeza, Sr. Presidente, que neste clima de compreensão, de absoluta seriedade, de absoluta civilidade, esta subcomissão haverá de se transformar num exemplo para todas as demais, da forma como temos e haveremos de encaminhar os trabalhos da Constituinte. Muito obrigado, Sr. Presidente. O SR. PRESIDENTE (Flávio Palmier Da Veiga): – Muito obrigado ao Constituinte Antônio Britto pelos esclarecimentos fornecidos na nossa reunião. O SR. CONSTITUINTE NELSON AGUIAR: – Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Flávio Palmier Da Veiga): – Concedo a palavra, pela ordem, ao nobre Constituinte Nelson Aguiar. O SR. CONSTITUINTE NELSON AGUIAR: – Tivemos, ontem, uma reunião no gabinete do Constituinte Mário Covas, ocasião em que, juntos, os Constituintes Eraldo Tinoco e Ervin Bonkoski, do Paraná, analisamos se devíamos ou não disputar, nos votos, a preferência dos colegas Membros desta Subcomissão. Chegamos à conclusão de que devíamos autorizar o Constituinte Mário Covas, Líder do PMDB na Constituinte, a fazer a indicação de um dos nomes, qualquer que fosse o indicado, para ser acolhido pelos outros dois. Até há poucos minutos não sabia que o nome indicado era o meu, tanto que, conversando aqui com a Constituinte Maria Lúcia, disse que se meu nome for indicado, vou ter que pedir o voto de S. Ex.ª. Fui tomar conhecimento porque, abrindo a urna, vi as cédulas confeccionadas. Quero dizer aos Constituintes que, com a pouca experiência Presidência, o Constituinte Nelson Aguiar agradeceu em seu nome e dos Constituintes Roberto Augusto e Antônio Salim Curiatti a honra com que foram distinguidos; designando em seguida, como relator da Subcomissão o Constituinte Eraldo Tinoco. Usaram da palavra os Senhores Constituintes: Flávio Palmier da Veiga, Antônio Brito, como representante do PMDB; Nelson Aguiar, Ervin Bonkoski, Caio Pompeu, Alceni Guerra, como Vice-Líder do PFL, Rita Camata, Eraldo Tinoco, Marcondes Gadelha e Eliel Rodrigues. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente deu por encerrados os trabalhos, às dezoito horas e trinta seis minutos, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião a ser realizada dia nove de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: debate de matéria constitucional e calendário dos trabalhos da Subcomissão. E, para constar, eu, Antônio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente ata, que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente, Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. ANEXO À ATA DA 1ª REUNIÃO (INSTALAÇÃO) DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 7 DE ABRIL DE 1987, ÁS 17h30 MIN., ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Flávio Palmier Da Veiga): – Considerando que os mais idosos não desejaram assumir a responsabilidade de presidir esta reunião, tendo em vista que fui indicado para colaborar, embora jovem, quero convidar para secretariar os nossos trabalhos a Constituinte Rita Camata, por sugestão, e, como escrutinadores, os Constituintes Caio Pompeu e Eunice Michiles. Conforme os Srs. Constituintes sabem, esta reunião tem o objetivo precípuo de eleger o presidente e os vice-presidentes da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso. É público e notório que foi coordenado pelas lideranças dos partidos um acordo que culminou com indicações já sabidas, por isso queria, inicialmente, pedir à secretária que procedesse a chamada nominal dos constituintes presentes para ratificarmos o quorum indispensável para realizarmos esta reunião. (Procede-se à chamada.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Palmier Da Veiga): – Havendo número legal, que ratifica a possibilidade da realização de nossa reunião, perguntaria ao nobre colega e amigo Antônio Britto, que coordenou, em nome da maioria da Comissão do PMDB, os acordos firmados para que chegássemos aos nomes escolhidos para presidente e vice-presidentes e relator, se quer usar da palavra. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO BRITTO: – Sr. Presidente, Sr as E Srs. Constituintes, em nome da liderança do PMDB, gostaria, inicialmente, de saudar a composição desta Comissão e, de forma particular, trazer aos companheiros constituintes notícias dos entendimentos que realizamos nos últimos dias – primeiro, entre os vários partidos com assento nesta Assembléia Nacional Constituinte, de modo a que com, harmonia e respeitada a proporcionalidade, pudessem, todos os partidos que temos tido de trabalhar em equipe, não pretendemos aqui o exercício da prerrogativa de presidente, vamos trabalhar numa grande equipe nos poucos mais de 30 dias, que nos restam, a fim de que possamos realizar o melhor, na expectativa de atendermos aos objetivos da Assembléia Nacional Constituinte, que são, no campo do Direito, da Família, do menor e do idoso, oferecemos o melhor texto às Comissões hierarquicamente superiores a esta, até o Plenário. Desejo também dizer aos meus dois companheiros que, também para mim, os presidentes são eles, porque têm maior mérito do que eu; conhecemos o trabalho de cada um, através das informações que tivemos, através deles próprios e de outras pessoas. Desta forma, queremos dizer que não estamos usurpando o direito de nenhum outro, pelo fato de o nosso nome estar aí para a concorrência; queremos dizer aos companheiros que, uma vez indicado, iremos dar o melhor de nossos esforços no sentido de atendermos às expectativas de um trabalho harmônico, assegurado o maior espaço possível, primeiro, para que a sociedade seja ouvida e, segundo, para que os nossos companheiros tenham a absoluta liberdade de colocar, sem qualquer constrangimento, as suas teses, suas opiniões os seus votos. Com estas palavras declaro o meu muito obrigado ao Constituinte Mário Covas, por esta indicação e aos dois companheiros que conosco acor- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) daram em permitir que aquele Colega fizesse esta indicação. O SR. PRESIDENTE (Flavio Palmier Da Veiga): – Antes de iniciarmos a chamada para a votação, pergunto se algum Constituinte deseja usar da palavra para encaminhar a votação. (Pausa.) Não havendo quem queira usar da palavra, vamos iniciar a votação. Solicitaria aos Srs. Constituintes que, à medida em que forem chamados fizessem o uso do direito do voto. Peço à Srª Secretária, Constituinte Rita Camata, inicie a chamada. (Procede-se à chamada para votação.) O SR. PRESIDENTE (Flavio Palmier Da Veiga): – Terminada a votação, peço aos Srs. Constituintes escrutinadores procedam à apuração dos votos. (Procede se à apuração.) O SR. PRESIDENTE (Flavio Palmier Da Veiga): – Para a 2ª-Vice-Presidência, o Constituinte Antônio Salim Curiati – 13 votos. Para a 1ª-Vice-Presidência, o Constituinte Roberto Augusto – 13 votos. Para Presidente, o Constituinte Nelson Aguiar – 14 votos. Proclamo eleitos, respectivamente, Presidente, 1°-VicePresidente e 2° Vice-Presidente, os Srs. Constituintes Nelson Aguiar, Roberto Augusto e Antônio Salim Curiati – (Palmas.) Conforme o acordo feito pelas Lideranças, tenho a honra de convidar a participar da Mesa, pois foi escolhido pelo Presidente e dentro do acordo, para ser o Relator desta importante Comissão o nobre colega e Constituinte Eraldo Tinoco. (Palmas.) Queria agradecer a colaboração dos escrutinadores e da nobre Secretária, e pedir ao Presidente, aos Vice-Presidentes e ao Relator que venham à mesa, por gentileza. Antes de passar a Presidência para o nosso amigo Nelson Aguiar, queria exaltar o espírito público de dois colegas Constituintes que, na hora dos entendimentos, abriram a porta para o acordo: os Constituintes Caio Pompeu e Ervin Bonkoski, que facilitaram os entendimentos e demonstraram espírito de renúncia e alto interesse de servir, possibilitando que o irrequieto, o apaixonado em defesa do menor, o dedicado às boas causas, aquele que sempre procurou defender a causa do menor, em toda a sua vida, e que fez bela administração na FUNABEM, lutando pela causa da criança abandonada, fosse pelo seu valor pessoal, pela sua cultura, levado à Presidência desta importante Comissão. Um país, no meu modo de entender, que não tem uma família bem estruturada, que não tem a criança amparada nem defesa do velhinho, é um país sem sorte. Por isso acho que a nossa responsabilidade é muito grande, ao termos que elaborar as leis em direção à Constituinte, defendendo os postulados da família, do menor e do idoso. Há 18 anos, dirijo o "Abrigo Cristo Redentor", em São Gonçalo, conheço o sofrimento, a dificuldade do velho que, muitas vezes até rico, ou tendo já sido rico, tem que bater à porta de um asilo de velhos para viver os últimos dias. Sei da luta do velhinho e, sinto, pela vivência que tenho desde vereador, quando o fui em 1958, e durante os 25 anos em que fui deputado estadual, sei da amargura em que vive, principalmente nas áreas metropolitanas, o menor abandonado. E compreendo a dificuldade que teremos em consolidar a família brasileira tão destruída no momento, com tantas separações, tantas incompreensões. Haveremos de construir, aqui, artigos e projetos que possam amparar mais o sentimento de unidade e de grandeza da família, para construirmos, com este trabalho, um mundo melhor. Queria dizer da satisfação também que temos aqui, de ver três mulheres que representam tão bem o sentimento da mãe, da dona de casa, e especialmente da família – as Constituintes Rita Camata, Eunice Micheles e Maria Lúcia, e que, por certo, trarão a esta Comissão, ao nosso Presidente, uma experiência que vai consagrar as ações, os debates aqui e daquilo que iremos aprovar, oferecendo ao Plenário um trabalho sério, objetivo, sucinto e, acima de tudo, honesto. Por isso, Nelson, com prazer, eu o chamei de irrequieto no bom sentido, porque você quer no seu dinamismo, no seu ESpírito de servir, fazer um bom trabalho. Confiamos em você e iremos ajudá-lo a superar as dificuldades e os obstáculos. Seja feliz! (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Meus companheiros e minhas companheiras Constituintes, não é preciso dizer que estamos nervosos como se tivesse que sair para a guerra. Estava comentando há pouco com a Constituinte Maria Lúcia que já passei por algumas instituições, já exerci alguns cargos, já passei aqui pela Câmara dos Deputados, já presidi a FUNABEM – como já foi dito – mas não sei porque estou nervoso hoje. Senti-me como se estivesse debutando na direção de um cargo. Acho que é pelo significado tão profundo que tem ele para mim e, naturalmente, para os companheiros, e o resultado disso reflete-se no comportamento que temos. Sonhamos e percorremos um longo caminho até chegar aqui, e esse sonho está se realizando com muita emoção. Quero agradecer profundamente, mais uma vez, os dois companheiros que acharam por bem compor em favor do nosso nome. Foi um gesto extraordinário que não vou esquecer e na primeira oportunidade que tiver de lhes ser útil farei tudo para cumprir essa parte que fico devendo. Gostaria de agradecer também ao Constituinte Cássio, porque tinha, com justo mérito, a pretensão de ocupar um espaço nesta Mesa, mas terminou se transformando num articulador em favor do nosso nome. Esta Comissão é a mais bonita da Constituinte, e esta Subcomissão tenho a certeza, está ultimando a realização deste trabalho sem conflito, sem choque, colocando o interesse maior da elaboração constitucional acima dos interesses pessoais. Temos sabido das dificuldades, até tumulto, que vêm ocorrendo em todas as Subcomissões e Comissões. Aqui, não poderia ocorrer porque esta é a Comissão da Família e temos, com muita gratidão para nosso coração, a presença de três senhores, o que vai dar um conteúdo, não um colorido, mas um conteúdo muito espe- 2 cial aos trabalhos. Temos a presença, também, de quatro irmãos evangélicos. Pastores, inclusive, que vêm trazer também a sensibilidade dos seus conhecimentos cristãos e ajudar muito. Trarão para cá, naturalmente os seus conceitos de família, principalmente da família monogâmica, que encontramos nas Escrituras Sagradas, e que representam, segundo o nosso conhecimento, o nosso aprendizado no Livro Santo, a mais antiga instituição da Humanidade, a família, instituição divina, segundo as Escritas Sagradas. Devemos zelar por ela e temos oportunidade de trabalhar neste objetivo. Tenho a certeza de que vamos trabalhar muito e bem. Estamos recebendo comunicação do Líder do PFL que me parece não pode permanecer. Muito obrigado pela presença de V. Ex.ª. Haveremos de dar oportunidade à sociedade que precisa ser ouvida ou pareceme que a orientação é no sentido de que a primeira parte do nosso trabalho seja destinada a ouvir as Instituições. Então, queríamos abrir esta primeira discussão ainda hoje, já que amanhã não poderemos realizar nossa primeira reunião, porque o PMDB já nos convocou para uma reunião da Bancada, no mesmo horário em que os trabalhos das Subcomissões terão que ser realizados. Gostaríamos de, terminados os trabalhos, contar com a presença de companheiros e companheiras que quisessem ficar para uma conversa informal, a fim de traçarmos algumas diretrizes para que, na próxima reunião, já tenhamos alguma coisa concreta para começar o trabalho. Quero dizer aos nossos companheiros que estou ansioso por começar. Todos estamos sabendo – porque temos contatos com as nossas comunidades, com os nossos Estados – que a expectativa da ação é muito grande, a queixa é muito grande, o povo não está compreendendo a dificuldade que a Liderança dos Partidos têm encontrado, aqui, para realizar este trabalho de eleição, de composição das Mesas, das Direções destes trabalhos. Não tem sido fácil! O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Sr. Presidente, por gentileza, apenas queria dizer algumas palavras. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Perfeitamente! O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Depois que convivemos no evento de ontem junto com a Constituinte Caio Pompeu, queremos reafirmar a nossa solidariedade de apoiamento ao nobre Constituinte e companheiro à Presidência desta Comissão tão importante, como V. Ex.ª ressaltou, e dizer que, unidos, vamos realizar trabalho mercante que a sociedade brasileira espera de nós. Pode contar que o nosso espírito democrático, nosso espírito cristão, o nosso espírito aberto para as maiores causas, não chega a afetar o nosso ego, já que tivemos uma convenção particular para aceitar qualquer resultado, na vontade do nosso Líder maior Mário Covas. Da minha parte, e acredito que também da parte do companheiro Caio Pompeu, queremos, nessa reafirmação, dar parabéns, desejar pleno êxito na direção dos trabalhos, trabalhos esses de que vamos parti- 3 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) cipar como tijolos na grande construção deste edifício que se chama Família, Menor e Idoso. E tenho a certeza de que, não só o companheiro Presidente como o Relator Eraldo Tinoco, como os Vice-Presidentes Antônio Salim Curiati e Roberto Augusto, podem contar com este apoiamento, com esta solidariedade. Queremos também deixar claro, a respeito do que o Flávio disse, que temos uma responsabilidade muito grande, cada um de nós que está nesta Comissão tem uma razão especial de ser. Além das Sr as já mencionadas, cada um de nós tem um trabalho já executado na comunidade e tem sensibilidade para a família, de modo específico, ou para o menor ou para o idoso, não os deixando dissociados, porque a família compreende também o menor e o idoso. Temos essa grande responsabilidade, colega Flávio – como V. Ex.ª disse há pouco – porque se não cumprimos aquilo que deseja a sociedade, de estaremos não só com a nossa consciência pesada, mas também com uma decepção política. Temos a consciência de que, juntos, haveremos de chegar ao fim dos trabalhos desta Subcomissão, com um subsídio muito importante e muito substancioso para a Constituição que iremos, se deus quiser, concretizar no final. Meu caro presidente Nelson Aguiar, tenho a certeza de que estamos muito alegres com a sua eleição para o cargo de presidente. Era o que tinha a dizer. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito obrigado! Concedo a palavra ao Constituinte Caio Pompeu. O SR. CONSTITUINTE CAIO POMPEU: – Ontem à noite, conversavamos, os Constituintes Eraldo Tinoco, Roberto Augusto, Antônio Salim Curiati, e eu na sala da Liderança do PMDB, e dizíamos que todos somos adultos e temos consciência das nossas responsabilidades. Não deu outro resultado, até numa homenagem ao nosso Líder Mário Covas, e, felizmente, houve uma eleição por unanimidade, vamos trabalhar juntos. Isso nos deixa felizes, o astral neste começo do nosso trabalho é bastante favorável e, como foi dito, pela seriedade dos problemas a serem discutidos, temos uma responsabilidade grande. Dizia eu, durante toda a campanha, que há dois problemas que podem ter uma única solução: no fundo, o problema do idoso é a falta de carinho de que necessita é o fato de ele precisar também entregar o seu afeto a alguém, além de precisar ser cuidado. O problema do menor abandonado é basicamente a necessidade de receber de alguém carinho e afeto. Portanto, juntando as duas pontas de dois problemas, talvez encontraremos uma única solução. E quero fazer uma última homenagem: ao Constituinte Vingt Rosado, que não quis presidir a Mesa, embora lhe coubesse essa honra, contando o que S. Ex.ª me disse aqui: S. Ex.ª falou que escolheu esta Comissão em homenagem aos seus netos, na parte do menor, e em homenagem a si próprio, na parte do idoso. O SR. CONSTITUINTE VINGT ROSADO: – Muito obrigado! O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaria de saber se algum outro colega quer fazer uso da palavra. O SR. CONSTITUINTE ALCENI GUERRA: – Sr. Presidente, apenas para alertá-lo de um equívoco que, muito compreensivelmente, deva ter passado despercebido pela Mesa: O Regimento exige que a indicação do relator seja feita por V. Ex.ª, e há necessidade de que isto conste em Ata: eu gostaria que V. Ex.ª refizesse o equívoco da indicação por parte do Presidente que então presidia a Mesa. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito obrigado por esta lembrança. Na verdade, já havíamos escrito e assinado o nosso despacho. Consta aqui que a Liderança do PFL havia indicado, conforme acordo anterior que nós designaríamos o Constituinte Eraldo Tinoco, do PFL baiano, para Relator e, naturalmente, o convocamos a ocupar o lugar à Mesa. Muito obrigado pela lembrança. Essa formalidade era realmente necessária. Alguém ainda deseja a palavra? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Tem a palavra o nobre Relator. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Nobres Constituintes, muitos aqui tiveram a oportunidade de se expressar, manifestando o desejo que é comum a todos nós de realizarmos um trabalho profícuo, sério, para encontrar as soluções que a sociedade deseja para o problema da família, do menor e do idoso. Quero também dizer que a minha função como Relator será a de procurar captar, da melhor forma possível, todas as contribuições, todas as propostas, todos os projetos que chegarão a esta Comissão. Neste trabalho, procurarei dividir com todos os componentes da Comissão, porque entendo que, embora haja temas de tamanha importância; onde naturalmente opiniões divergentes poderão e deverão surgir nessa discussão, deveremos encontrar o caminho do equilíbrio, o caminho da soma das opiniões, para, finalmente, trazer um parecer que possa retratar a opinião do grupo como um todo. Vejo uma importância fundamental nesta Subcomissão porque em verdade, entendo o esforço para a elaboração de uma nova Constituição, não apenas a preocupação de compor os interesses divergentes da sociedade brasileira, mas especialmente o nosso esforço, até de futurólogos, para construirmos não apenas a sociedade que queremos para o nosso convívio, mas em especial a sociedade que sonhamos para a posteridade. E nesse esforço, naturalmente, a figura do menor aparece como a expressão mais importante, porque evidencia a capacidade de construir para as próximas gerações aquilo que almejamos. Agradeço a iniciativa dos meus companheiros de Partido que, num acordo, indicaram o meu nome para Relator desta Comissão, mas entendendo que, neste trabalho, até mesmo as barreiras partidárias, as idéias que eventualmente cada um de nós defende no seu posicionamento político, devem ser colocadas em segundo plano para, conjuntamente, fazermos um grande esforço na elaboração de uma Carta Magna que represente os desejos, as aspirações da sociedade brasileira. Este, o nosso propósito. Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE MARCONDES GADELHA: – Sr. Presidente, quero congratular-me com os eleitos e com o Relator indicado, e gostaria de fazer uma observação sobre a evolução dos nossos trabalhos. Naturalmente, cada Subcomissão tem autonomia para estabelecer o próprio roteiro, e seguirá as indicações dos membros deste colegiado. Entretanto, seria interessante mantivéssemos a agregação da Comissão como um todo, ou seja, que de tempos em tempos, uma vez por semana, pelo menos, tivéssemos reunião da Comissão como um todo, ou seja, das três Subcomissões em conjunto. Para isso, o Regimento faculta, aliás, torna até compulsória a reunião conjunta, nos termos do art. 16, quando trata de convocação de Ministro de Estado e de autoridades dirigentes de entidades da Administração Pública. O Regimento diz que “os Ministros de Estado, os dirigentes de entidades da Administração Pública comparecerão perante as Comissões, quando devidamente convidados a prestar informações, etc.” De modo que vou pedir ao Relator-Geral que trace o seu próprio roteiro. O roteiro do RelatorGeral, ou seja, do Constituinte Artur da Távola, deve ser o roteiro da Comissão como um todo. E, de acordo com esse roteiro, que inclui a convocação de Ministros de Estado e de altas autoridades, então, traçaremos o programa, o esquema, os horários das nossas reuniões. Naturalmente, esse roteiro será submetido à apreciação da Comissão, será emendado ou não, e também submetido a votos. Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE ALCENI GUERRA: – Sr. Presidente, aproveitando a estada, nesta Comissão, do Presidente da Comissão Temática, do Constituinte Marcondes Gadelha, eu gostaria de solicitar uma posição do Presidente da Comissão, para orientação dos companheiros do Partido, a respeito da Semana Santa, que se aproxima, se haverá ou não trabalho da Comissão e o que se pode informar, através da Liderança, a respeito da pauta de trabalho na Semana Santa. O SR. CONSTITUINTE MARCONDES GADELHA: – Salvo melhor juízo, o nosso entendimento é que a Comissão não deve se reunir durante a Semana Santa, embora as Subcomissões possam fazê-lo se assim entenderem, mas a Comissão não se reunirá durante a Semana Santa. O SR. CONSTITUINTE ALCENI GUERRA: – Eu gostaria, se possível, Sr. Presidente, que V. Ex.ª se manifestasse a respeito para que possa orientar a Bancada. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Acredito que a posição do nosso Presidente Marcondes Gadelha é coerente, mesmo porque os trabalhos da Constituinte, neste período, dependem de convocação da Presidência da Constituinte. Nós ainda não recebemos manifestação do Presi- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dente Ulysses Guimarães a respeito. Acho que somente após ouvirmos se nesse período a Constituinte terá ou não sessões regulares, é que poderemos manifestar-nos com relação à nossa posição de reunirmos ou não nesse período. Mas a nossa posição pessoal é que não devemos nos reunir durante os dias da Semana Santa. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Tem V. Ex.ª a palavra. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Sr. Presidente, gostaria apenas de pedir um esclarecimento: quando V. Ex.ª falou que o início dos nossos trabalhos era para ouvirmos as instituições e os segmentos interessados nesses assuntos, eu gostaria de saber como se processaria isso: se teríamos algumas reuniões para que pudéssemos organizar primeiro os nossos trabalhos aqui nesta Subcomissão, ou se já estaríamos iniciando os nossos trabalhos junto a essas instituições e segmentos da sociedade. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quero dizer à ilustre Constituinte Rita Camata que sou o Presidente da Comissão. A Comissão e que tomara as decisões. Todos esses assuntos, quando houver conflito, serão submetidos a voto, serão submetidos à decisão plenária. Agora, naturalmente teremos uma reunião prévia para traçarmos as diretrizes dos nossos trabalhos. Não seria sábio, nem sequer coerente nós tomarmos uma deliberação por ato da Presidência da Mesa, no sentido de convocar representantes da sociedade civil para serem ouvidos aqui. É uma decisão que devemos tomar em conjunto. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, permita-me uma sugestão. Nós, como o Presidente acaba de mencionar, não teremos reunião da Subcomissão no dia de amanhã, mas, provavelmente, deveremos ter na próxima quinta-feira, pela manhã, conforme previsto no Regimento. A minha sugestão é que, na reunião da quinta-feira, cada componente da Subcomissão já pudesse trazer à discussão plenária sugestões de convites de convocações para essas entidades que a Subcomissão deseja ouvir. Neste sentido, poderíamos, na próxima quinta-feira, elaborar uma pauta talvez provisória para ouvirmos essas entidades. Como provavelmente não haverá reuniões da Subcomissão durante o período da Semana Santa, nós teremos um prazo de 10 a 12 dias para formularmos os convites àquelas primeiras entidades que forem convidadas, para que essas entidades possam se preparar, e vir a Brasília e, dessa forma, instalarmos essa parte tão importante dos nossos trabalhos, que é a de ouvirmos opiniões e sugestões a esse respeito. Embora o prazo para apresentação de sugestões concretas para a elaboração da nova Constituição ainda vá, provavelmente, até o final deste mês – porque há uma divergência quanto à interpretação da data, se ele começa a ser contada com a eleição da Mesa Geral da Constituinte ou se a partir da instalação das Subcomissões, porque nós sabemos que houve um intervalo de tempo maior do que o previsto no Regimento para a instalação das Subcomissões – se não houver uma interpretação mais flexível, o prazo para que cada Constituinte possa apresentar, via Presidência da Constituinte, as suas sugestões a respeito de cada tema, poderá diminuir também. Mas eventualmente, poderíamos nesse roteiro e calendário provisórios começar a discussão dessas propostas que porventura já existam encaminhadas à Subcomissão de Constituintes que tenham apresentado na forma regimental. Então, a minha sugestão é esta: que tenhamos na próxima quinta-feira uma reunião para o estabelecimento de um calendário provisório, tanto no sentido de convocação de entidades da sociedade civil, como para estabelecermos as reuniões de discussão das propostas de texto que já tenham sido apresentados. Naturalmente, nós lutaremos para que esse prazo seja contado a partir dessa data, embora o Regimento fale que as Subcomissões teriam um prazo de 45 dias para concluir os seus trabalhos, e se nós estivéssemos contando esse prazo, a partir da instalação da Constituinte, ele já teria ido embora pela metade. Lutaremos para que o prazo passe a ser contado a partir dessa data, para que tenhamos tempo suficiente para ouvir a sociedade. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Algum nobre Constituinte gostaria de discutir as sugestões que foram apresentadas pelo nobre Relator? O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Sr. Presidente, só para alguns esclarecimentos, porque estou em dúvida sobre alguns aspectos. Ouvi que nós vamos aguardar até certo tempo a vinda dessas associações e entidades interessadas em participar conosco. Pergunto: enquanto isso acontece, poderemos participar diretamente do processo, trazendo nossas sugestões para esta Subcomissão? Ou poderíamos fazê-lo através da Mesa da Constituinte? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Houve uma sugestão. Penso que nós deveríamos discutir a sugestão primeiro. Antes de fixarmos um critério aqui, nós deveremos discutir o que ficaria melhor: se já devemos ouvir essas entidades a partir de agora, as que estivessem disponíveis para fazê-lo, ou se demandaríamos todo esse tempo, porque nesse período nós teremos que indagar: o que ficarão fazendo? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Nós temos um prazo, eu não estou identificando exatamente o artigo, talvez a assessoria pudesse dizer-me, mas cada Constituinte tem um prazo de 30 dias para apresentação das suas sugestões pessoais. Por exemplo: na qualidade de Constituinte, quero trazer uma contribuição para o problema do menor. Esta sugestão deve ser apresentada à Mesa da Constituinte, e há um prazo de 30 dias. Segundo o § 2º do art. 14 "Até 30 dias, a partir da promulgação dessa resolução, os Constituintes poderão oferecer sugestões para elaboração do projeto de Constituição, os quais serão encaminhados pela Mesa às Comissões pertinentes." Quer dizer, serão encaminhadas pela Mesa essas sugestões, que são apresentadas em plenário 4 à Mesa da Constituinte, e esta encaminhará a cada Comissão e, conseqüentemente, às Subcomissões às quais o tema seja pertinente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – De acordo com o Regimento só teremos prazo para encaminhar essas propostas até o dia vinte e sete. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – No Regimento, também há a previsão de que quarenta e oito horas depois de eleita a Mesa, as Subcomissões devem estar instaladas. E o fato político superou a letra fria do Regimento, e somente hoje estamos instalando esta Subcomissão. Entendo que este assunto deve ser levado à Mesa da Constituinte, para que o prazo de trinta dias, para apresentação de sugestões, seja também contado a partir ou da data da instalação das Comissões, ou das Subcomissões, de tal forma que cada Constituinte, inclusive à luz do debate que vai ser travado em cada Subcomissão, possa apresentar consistentemente as suas sugestões. Paralelamente a esse trabalho, que vai ser canalizado para esta Subcomissão, nós teremos a discussão através das sugestões que as entidades possam trazer à Subcomissão. Então, são duas vertentes que se encontram nas conclusões finais de cada Subcomissão. A minha sugestão é no sentido de que, em primeiro lugar, organizemos o calendário para ouvirmos essas entidades, para que esse trabalho se inicie logo após a Semana Santa. Se organizarmos logo esse calendário, nós teremos um prazo para que cada entidade se organize, prepare as suas teses, e decida a respeito das pessoas que aqui devam comparecer, etc. Este prazo, não importando que haja Semana Santa ou não, seria cumprido a partir da terça-feira, após a Semana Santa. Concomitantemente a isto, as reuniões que tivermos na Comissão, nós já poderíamos começar a discutir as sugestões que eventualmente já tenham sido apresentadas à Mesa da Constituinte. É possível que a essa altura, dado o número de sugestões encaminhadas à Mesa da Constituinte, já tenhamos assuntos pertinentes a esta Subcomissão. Então, nós traríamos à discussão essas sugestões, essas propostas. Quer dizer, não implicaria em que não tivéssemos reuniões plenárias da Subcomissão até o início deste processo de ouvir as entidades civis. Se não houver sugestão interna, a própria Presidência poderia trazer à discussão da Subcomissão alguns temas para que cada um se expresse livremente a respeito das suas opiniões, a respeito dos temas que interessam à Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós devemos informar que há no PRODASEN cerca de quinhentas propostas catalogadas, para todo projeto de elaboração constitucional. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER: – Tem que sair, mas, antes que S. Ex.ª se retire eu quero agradecer pela sua participação, presidindo os trabalhos, e agradecer também pelo adjetivo irrequieto. Naturalmente, com esse adjetivo, S. Ex.ª procurou configurar uma verdade, pois é realmente o que eu sou: um irrequieto. Muito obrigado por isso. 5 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Então, fica convocado o nosso novo encontro para quinta-feira, dia nove, nesta Subcomissão, às 9:30 horas. Parece-me que é o horário combinado. Amanhã, levantaremos no plenário essas questões de ordem com respeito ao tempo, para que na quinta-feira nós possamos trazer uma posição definitiva a respeito da questão dos prazos. Alguém mais deseja a palavra? O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – A informação que S. Ex.ª está prestando é muito importante. Eu acho o seguinte: no desenrolar do próprio trabalho, aparecerá a oportunidade de ampliar a perspectiva de cada um de nossos determinados assuntos. É o que estou sentindo, em função desse vultoso trabalho que está surgindo para nós. Agora, não se i, concomitantemente à ocasião em que temos esse trabalho, se será oportuno e conveniente ampliarmos aquilo que nós temos de nossa própria pessoa, para enriquecermos determinados artigos ou parágrafos? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sem dúvida! E creio que seria muito ruim mesmo, estaria tudo errado se já tivéssemos trazendo para cá matéria de fora pronta e acabada. Acho que nós temos que começar aqui do zero. Qualquer que seja a proposta, por melhor que ela seja, tem que ser submetida ao debate, à discussão, ao entendimento, para então começarmos, e o nosso Relator, com toda liberdade possa refletir o pensamento da sociedade civil, dos Constituintes, da experiência de cada um, a fim de que possamos oferecer às Comissões hierarquicamente superiores o melhor trabalho possível. Muito obrigado, nobres Pares, pelo voto e pela participação. Estaremos aqui no horário previsto para a próxima quinta-feira. Está encerrada a sessão. Subcomissão da Família, Do Menor e do Idoso. Aos sete dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dezessete horas e trinta minutos, em sala do Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, sob a Previdência eventual do Senhor Constituinte Flávio Palmier da Veiga, com a presença dos seguintes constituintes: Caio Pompeu, Cássio Cunha Lima, Eliel Rodrigues, Eraldo Tinoco, Ervin Bonkoski, Eunice Michiles, João de Deus Antunes, Maria Lúcia, Matheus lensen, Nelson Aguiar, Rita Camata, Vingt Rosado e Iberê Ferreira. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou instalada a Subcomissão e esclareceu que iria proceder à eleição do Presidente e dos Vice-Presidentes, convidando, nos termos regimentais, os Senhores Constituintes Caio Pompeu, Eunice Michiles e Rita Camata para funcionarem como escrutinadores e secretária da Mesa, respectivamente. Realizada a eleição, e verificando-se a coincidência do número de sobrecartas com o de votantes, apurou-se o seguinte resultado: para Presidente, Constituinte Nelson Aguiar com quatorze votos: para 1º Vice-Presidente, Constituinte Roberto Augusto com treze voto, em branco um voto: para 2º Vice-Presidente, Constituinte Antônio Salim Curiatti com treze votos, tendo um voto em branco. Foram procla- mados eleitos Presidentes, 1º Vice-Presidente e 2º Vice-Presidente os Senhores Constituintes Nelson Aguiar, Roberto Augusto e Antônio Salim Curiatti, respectivamente. Assumindo a Presidência, o Constituinte Nelson Aguiar agradeceu em seu nome e dos Constituintes Roberto Augusto e Antônio Salim Curiatti a honra com que foram distinguidos; designando em seguida, como Relator da Subcomissão o Constituinte Eraldo Tinoco. Usaram da palavra os Senhores Constituintes: Flávio Palmier da Veiga, Antônio Brito, como representante do PMDB, Nelson Aguia, Ervin Bonkoski, lider do PFL, Rita Camata, Eraldo Tinoco, Marcondes Gadelha e Eliel Rodrigues. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente deu por encerrados os trabalhos, às dezoito horas e trinta e seis minutos, cujo teor será publicado, na íntegra no Diário da Assembléia Nacional Constituinte convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião a ser realizada dia nove de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: debate de matéria constitucional e calendário dos trabalhos da Subcomissão. E, para constar, eu, Antônio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata, que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. 2ª REUNIÃO ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO Aos nove dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez horas e quinze minutos, em Sala do Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar e com a presença dos Senhores Constituintes: Eliel Rodrigues, Eraldo Tinoco, Eunice Michiles, Vingt Rosado, Sotero Cunha, Iberê Ferreira, Antônio Salim Curiati, Matheus Iensen, Roberto Augusto e João de Deus Antunes. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos, passando a palavra ao Senhor Constituinte Eraldo Tinoco, relator da Subcomissão, que discorreu sobre as dificuldades de traçar um calendário das atividades, em face do exígudo tempo determinado pelo regimento para os trabalhos da Subcomissão. Usaram da palavra, ainda sobre este tema, os Senhores Constituintes: Nelson Aguiar, Eunice Michiles, Iberê Ferreira, Roberto Augusto, João de Deus, Sotero Cunha, Eliel Rodrigues, Vingt Rosado e Matheus lensen. A seguir, o Senhor Presidente abriu discussão sobre as entidades a serem convidadas para expor suas sugestões à Subcomissão. Manifestaram-se os seguintes Constituintes: Eunice Michiles, Roberto Augusto e Iberê Ferreira. Nada mais havendo a tra tar, o Senhor Presidente deu por encerrados os trabalhos, às onze horas e quarenta e sete minutos, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte , convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia treze de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: elaboração do calendário dos trabalhos da Subcomissão. E, para constar, eu, Antonio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata, que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente – Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. ANEXO À ATA DA 2ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 9 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:15 HORAS, ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Srs. e Srªs Constituintes, em função desta convocação que o PMDB fez, para indicar o Relator, não estamos em condições de realizar uma reunião regimental. Vamos aproveitar, então, para passarmos algumas informações de tudo o que nós conseguimos levantar, de dificuldades e sugestões, e passarei a palavra ao nosso companheiro Relator para que S. Ex.ª exponha esses fatos e essas dificuldades. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, Srs. Membros da Subcomissão. Analisamos as principais dificuldades que vamos encontrar nesta fase inicial do trabalho, basicamente, essas dificuldades prendem-se à questão do cronograma. Temos que considerar que a parte elaborativa da nova Carta mais importante é precisamente o trabalho da Subcomissão, porque aqui vai nascer o embrião da nova Carta no que diz respeito aos assuntos pertinentes à Subcomissão. Ocorre que os prazos regimentais destinados ao trabalho desta Subcomissão, especialmente considerando-se as defasagens já ocorridas no início dos trabalhos, fazem com que esses prazos sofram alguns percalços. O art. 17 do Regimento, todos estão lembrados, indica que o Relator na Subcomissão, com ou sem discussão preliminar, elaborará seu trabalho com base nos subsídios encaminhados nos termos do estabelecido neste Regimento, devendo no prazo de 30 dias apresentar relatório fundamentado com anteprojeto da matéria. O § 4º desse mesmo artigo diz que a Subcomissão, a partir de sua constituição terá um prazo de 45 dias para encaminhar à respectiva Comissão o anteprojeto por ela elaborado, e não o fazendo, caberá ao Relator da Comissão redigi-la no prazo de 5 dias. Ora, esse prazo a que o § 4º se refere amarrado à constituição da Comissão, faz com que já tenhamos de início uma defasagem de pelo menos 8 dias, isso, porque a Subcomissão regimentalmente foi constituída no dia primeiro de abril, após a eleição das Mesas das Comissões, quando o Presidente eleito declarou que a Comissão estava subdividida em tais e tais comissões, cuja relação dos seus componentes já estava elaborada. Assim, o prazo do Relator vai até o dia 30 de abril para apresentação do seu parecer. Vejam que o Regimento estabelece essa questão, a meu ver esdrúxula, ao indicar no art. 17 "que o Relator na Subcomissão, com ou sem discussão preliminar..." Isso significa dizer que o Relator poderia simplesmente recolher-se ao seu Gabinete, preparar um calhamaço e completamente dissocia- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) do das discussões que venham a ocorrer na Subcomissão, viesse a apresentar o seu parecer no dia 30 de abril. É óbvio, por todas as razões, que esta prática se torna inteiramente não recomendável. Acho que, quando este próprio artigo refere-se à: "elaborará seu trabalho com base nos subsídios encaminhados" implica, a meu ver, em pelo menos três fontes de alimentação para o trabalho do Relator. A primeira fonte é, sem dúvida, a contribuição das sugestões apresentadas por cada Constituinte. Entendemos aqui, interpretando o Regimento, que essas contribuições devem dar entrada na Mesa da Constituinte, conforme estabelece o Regimento, e o prazo para isto se encerra no dia 24 de abril. Então, teoricamente, este prazo de apresentação das contribuições individuais de cada Constituinte guarda certa coerência com o prazo final de elaboração do parecer, porque, encerrando-se no dia 24, a Mesa da Constituinte encaminhando imediatamente ao relator, este teria um prazo de 6 dias para examinar essas sugestões e, com base nelas, o prazo para apresentação das sugestões em plenário, seria aquele prazo de 30 dias a partir da eleição da Mesa. Outra fonte de sugestões vem a ser a audiência das entidades interessadas que venham a ser convidadas pela Subcomissão, e o Regimento prevê entre 5 a 8 reuniões destinadas a este trabalho. Ora, vejamos aqui um dado factual importante. Temos até o dia 21 deste mês, na prática, uma impossibilidade de ouvirmos essas entidades. Primeiro, porque não é possível, até porque a Mesa da Subcomissão foi eleita no dia 7, estamos no dia 9, não teríamos como, na prática, selecionar essas entidades, oferecer um calendário apropriado para que essas entidades se preparem e aqui compareçam para a audiência da Subcomissão. Essa dificuldade é maior quando temos na próxima semana a Semana Santa, um feriado, a partir de quinta-feira, o que nos restaria, eventualmente, a terça e a quarta-feira da próxima semana para uma audiência desse tipo. Sabemos que, na prática, teremos uma grande dificuldade de quorum nesses dias. Uma semana que tem praticamente a metade comprometida com o feriado, principalmente considerando-se que o dia 21, terça-feira da outra semana, também é feriado. Tudo indica que ele será antecipado para o dia 20, segunda-feira. Não sei no caso específico de Brasília, porque parece que o Decreto presidencial diz nas cidades onde for possível. Há alguma coisa que deixa uma brecha. Não sei, não tenho nenhuma informação se no caso específico de Brasília, sendo uma data especifica, e aniversário da cidade etc., se esse feriado será também antecipado para segunda-feira. Vamos raciocinar que sim. Teríamos, então, do dia 21, terça-feira, até um prazo razoável para que o Relator pudesse colher essas informações e elaborar o seu parecer. Poderia dizer, um tempo razoável, se coincidir esse período com o período de apresentação de sugestões, de projetos, de propostas, pelos Constituintes, que termina no dia 24. Então, teríamos basicamente do dia 21 ao dia 24, quem sabe até o dia 25, para ouvirmos essas entidades, o que seria na prática, a meu ver, muito difícil conseguirmos essa mobilização e esse trabalho. Por fim, temos as sugestões encaminhadas peIa população em geral. Ainda ontem, S. Ex.ª o Presidente da Constituinte, no pronunciamento da instalação do Programa A Voz da Constituinte, caracterizou que o canal da participação popular está aberto e que as sugestões devem ser encaminhadas, o que nos faz acreditar que ainda nesse período recebamos sugestões que venham subsidiar os trabalhos desta Subcomissão. Por outro lado, temos conhecimento de mais de 500 sugestões já encaminhadas e já em fase de processamento no PRODASEN, somente para esta Subcomissão. Se realmente queremos dar importância à participação popular, às sugestões, temos que, no mínimo, nos debruçarmos sobre elas para vermos quais as que possam ser aproveitadas ou que possam subsidiar o trabalho da Subcomissão. Por todas estas considerações, vemos a total dificuldade de realizarmos um trabalho coerente, sério, de profunda reflexão, para a discussão dos temas pertinentes à nossa Subcomissão e que seja traduzido num parecer que virá à discussão. É evidente que o parecer, uma vez apresentado, estará sujeito a emendas, estará sujeito à discussão e às falhas que certamente ocorrerão nesse parecer, as quais poderão ser corrigidas na segunda instância. Mas até a esse respeito nos deparamos com as dificuldades de ordem prática. Se não vejamos o Regimento, no § 1º do art. 17 diz que: "O anteprojeto será distribuído em avulsos aos demais membros da Subcomissão para, no prazo dos 5 dias seguintes destinados à sua discussão, receber emendas." Ora, digamos que a máquina burocrática da Casa seja devidamente ágil para, recebendo o parecer no dia 30, no próprio dia 30 imprimi-lo o dia seguinte, o dia que começa a contar o prazo para a discussão do parecer e a apresentação de emendas, começa no dia 1º de maio, numa sexta-feira, que também é feriado. Quer dizer, mais uma vez teremos uma dificuldade muito grande de convocação de uma reunião numa sexta-feira que coincide com o feriado nacional do dia 1 de maio. Os Srs. Membros da Subcomissão teriam um prazo até o dia 05 para estudo do parecer, apresentação de emendas e discussão do parecer. Esses 5 dias são: sextafeira, dia 1º; sábado; dia 2; domingo; dia 3; segunda-feira, dia 4 e terça-feira, dia 5 de maio. Vejam que mais uma vez o Regimento é terrivelmente prejudicial a um bom trabalho da Subcomissão. O Relator teria mais 72 horas, conforme o previsto no § 2º, para emitir parecer sobre as emendas, sendo estas e o anteprojeto submetidos à votação. Então, teríamos reunião com o Relator novamente do dia 6 ao dia 8, que são a quarta, quinta e sexta-feiras da semana. Do dia 9 ao dia 13 – começa o dia 9 sendo num sábado – do dia 13 a Subcomissão deveria apreciar o anteprojeto, o parecer sobre as emendas e aprovar toda a matéria para que no dia 13 ela fosse encaminhada ao Relator para providenciar a publicação dos avulsos e encaminhá-los ao plenário da Comissão Temática no dia 15, quando vence o prazo de 45 dias dados à Subcomissão. 6 É evidente que essa questão nos coloca diante de um ponto a ser deliberado pela própria Subcomissão. Entendemos que os prazos regimentais, enquanto constantes do Regimento, devam ser cumpridos, e isso implica em requerermos a compreensão de todos para que essas datas, especialmente esse prazo iniciado no dia 1º e dia 9 possam ser, digamos assim, programados por todos os Membros da Subcomissão, de tal sorte que possamos ter o desdobramento normal do trabalho. É verdade que esta questão não é apenas desta Subcomissão, porquanto todas as Subcomissões estão com o mesmo problema. Por isso mesmo já surge um movimento no sentido de se tentar uma modificação desse prazo. Ontem, por exemplo, tivemos uma reunião informal com todos os Presidentes e Relatores das Subcomissões, onde essas questões foram debatidas e onde se chegou a um consenso sobre a necessidade de modificação desses prazos ou de uma interpretação mais flexível do Regimento. Por exemplo, o de não considerar constituídas as Subcomissões com as suas instalações por parte do Presidente da Comissão Temática, mas sim com a eleição das suas respectivas Mesas, desde quando o Regimento também previa que 24 horas após a instalação da Comissão, as Subcomissões deveriam ser instaladas, o que não ocorreu por dificuldade de ordem política, como é do conhecimento de todos. Essa interpretação mais flexível, caso venha a ser adotada pela Mesa da Constituinte nos facilitará um pouco o trabalho. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Apenas para transmitir uma informação. Haveríamos iniciado uma reunião, não em caráter regimental, porque tínhamos número suficiente para abri -la em caráter regimental. Como a nossa Comissão só dispõe de 19 Membros titulares até a presente data, agora alcançamos quorum, para dar-lhe o caráter regimental. Desta forma instalamos regimentalmente os trabalhos e cumpriremos o Regimento realizando a reunião regimentalmente. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Então, esta quase unanimidade deverá ser traduzida, hoje, numa palavra ao Exmo. Sr. presidente da Constituinte, numa reunião em que S. Ex.ª convocou todos os Presidentes e Relatores das Comissões e das Subcomissões e acreditamos na sensibilidade da Mesa da Constituinte, no sentido de dar-lhe uma interpretação mais adequada. Devo informar também que já há dois projetos, de autoria do Constituinte Jorge Haje, do PMDB da Bahia, em que S. Ex.ª propõe, num desses projetos, a ampliação de todos esses prazos, inclusive o prazo de apresentação dos projetos oferecidos por cada Constituinte e, conseqüentemente, alterando todos os prazos, todos os trabalhos das Comissões e das Subcomissões. Por outro lado, S. Ex.ª informou ontem nesta mesma reunião, que há pouco me referi, que deveria apresentar ontem ou no mais tardar hoje, outro projeto sugerindo ou propondo que as reuniões plenárias da Assembléia Nacional Constituinte sejam suspensos durante o período de trabalho das Comissões e Subcomissões, somente sendo convocada reunião plenária quando houver motivo que justifique a sua convocação para efeito, inclusive, de votação. Pessoalmente, coloco- 7 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) me favorável aos dois projetos até porque já havia anteriormente apresentado um estudo em que demonstrava que essas sessões plenárias da Constituinte, enquanto não temos matéria constitucional a ser discutida passam a ser na realidade apenas um fórum de debates políticos nem sempre em relação às questões constitucionais. De sorte que, caso haja acolhimento destas duas propostas, estaríamos liberados duplamente para o melhor exercício das nossas atribuições na Subcomissão e na Comissão Temática, primeiro, pela existência de um prazo maior; segundo, porque poderíamos também destinar o turno vespertino aos trabalhos da Subcomissão. Estas são as informações preliminares que nos caberia apresentar neste momento e, naturalmente, nos colocamos à disposição para esclarecimento de alguma questão pertinente a este tema. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Antes de concedermos a palavra aos nobres Colegas, vamos permitir a leitura da Ata da reunião anterior. Esclarecemos que essa Ata contém informações sucintas da reunião passada; de modo que, se algum Constituinte quiser fazer alguma emenda no tocante a fatos que ocorram na reunião anterior, pode fazê-lo. Concedo a palavra ao Sr. Secretário, a fim de que seja feita a leitura da Ata. (Procede-se à leitura da Ata.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não havendo nenhuma emenda a ser apresentada pelos Srs. Constituintes, declaramos aprovada a ata como lida. Antes de passar a palavra à Constituinte Eunice Michiles, lembro aos nossos Colegas Constituintes que estamos sob a ditadura do prazo. E vejam bem que a culpa disso não se pode atribuir à Subcomissão propriamente dita. Nós vivemos este momento, estes dias de dificuldades, de turbulências, para que se compusessem as Comissões e Subcomissões. Mas isso demandou tempo, demandou adiantamento de prazo; de modo que, os prazos regimentais já não foram respeitados. Já não se pode alegar a necessidade de cumprirmos esses prazos de forma irrestrita, de observarmos esses prazos, porque eles já foram descumpridos. Particularmente, achamos que este período de elaboração constitucional é o mais importante do que qualquer outra fase porque é nessa fase que vamos ouvir a sociedade. Creio não haver muita dificuldade para elaborarmos um texto, nós membros desta Subcomissão, uma proposta e a encaminharmos à Comissão hierarquicamente superior. Não teremos muita dificuldade. Por isso, o importante agora é ouvirmos a opinião da sociedade, o que ela tem de novo para apresentar, como ela gostaria que trabalhássemos aqui. Se ficarmos aqui submetidos à ditadura dos prazos, não teremos tempo suficiente para ouvirmos pessoas que representem entidades da sociedade civil. Por exemplo, tínhamos até feito algumas sugestões e essas sugestões naturalmente serão ampliadas aqui no sentido de que nominássemos algumas entidades de abrangência nacional que deveriam ser ouvidas, como a OAB, CNBB ou uma entidade representativa do mundo evangélico. Alguém representando a FUNABEM, alguém representando a Associação dos Juízes e Curadores de Menores e outras entidades de cunho nacional. Penso que a nossa luta pela ampliação desses prazos tem de ser desencadeada. Nós estaremos presentes à reunião das 17 horas e os Colegas que puderem fazê-lo deverão estar presentes, a fim de que possamos oferecer argumentos convincentes, no sentido de que aprovemos um projeto de resolução alterando os prazos regimentais. O nobre Constituinte Ulysses Guimarães insiste que no final deste ano teremos de estar com a Constituição promulgada. É importante fazê-lo! Temos esperado muitos anos, mais de dois decênios por uma Constituição nova e agora que temos a oportunidade de fazê-la não devemos por essas razões, estarmos submetidos a essa premência de prazos, essa premência de tempo. Demandando o tempo que tivermos de demandar, o que importa é elaborarmos uma Constituição de interesse nacional. Se pudermos fazê-la no mais curto período, melhor ainda, mas achamos que o tempo não deve ser a causa determinante da realização desses trabalhos. Deixamos aberta a palavra para nossos colegas Constituintes comentarem a exposição que foi feita e apresentarem as suas sugestões, a fim de que na reunião da tarde possamos ter uma idéia da opinião e da posição desta Subcomissão. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra à nobre Constituinte Eunice Michiles. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – É exatamente para tentar entender. Se entendi bem, o Relator disse que até o dia 30, pelo Regimento, deveria estar com o seu parecer pronto. Ora, se termina o prazo de apresentação de sugestões no dia 24 – vi pelos jornais de ontem que há um Senador que apresentará 1100 propostas – qual seria o prazo. De 24 a 30 para estudar e catalogar tudo isso? Tenho uma dúvida que gostaria de expor: essas propostas vêm para a Subcomissão! Serão discutidas aqui na Subcomissão ou vão diretas para o Relator? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Essa questão não está bem clara. Parece-me que essas sugestões serão catalogadas de acordo com o tema e encaminhadas à Subcomissão, a qual naturalmente, o Presidente dará conhecimento dessas sugestões, talvez, preparando uma ementa e a distribuindo a cada componente da mesma mas elas deverão vir para o Relator para subsidiar o seu trabalho de elaboração do parecer. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Quer dizer que elas não serão votadas? Uma proposta polêmica não passara pelo crivo da Subcomissão? Ela vai direto para o Relator? Compete ao Relator decidir se ela deve ser ou não... O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Pelo que está no Regimento ela passará aqui depois do parecer. Vejam bem, o art. 17 diz que o Relator elaborará com ou sem discussão preliminar. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Supremo poder. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Exatamente. É uma coisa realmente absurda, porque como tive oportunidade de dizer na reunião passada, entendo que o papel do Relator é o de conciliar as opiniões predominantes. Elaborar um parecer desta ordem, sem uma discussão preliminar é realmente uma tarefa, em primeiro lugar, dificílima e, em segundo lugar, até do ponto de vista... A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Nada democrático. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Exatamente. Vejam que a questão toda se esbarra no prazo. Se temos no dia 24 o encerramento da apresentação dos projetos, até que ele percorra esse trâmite burocrático de catalogação, de enumeração etc., como sabemos, isso não poderá ser automático, para chegar à Subcomissão, qual o tempo que ela terá para debater e qual o tempo que terá o Relator para preparar o seu parecer que deverá ser apresentado no dia 30? A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Uma outra dúvida, Sr. Relator, é a seguinte: depois de expirado esse prazo, no dia 24, não se poderá apresentar novas sugestões como membro da Comissão. Por exemplo: eu tenho uma outra idéia, surge da discussão uma nova idéia, ela não pode ser apresentada como sugestão aqui na Subcomissão, mesmo fora do prazo regimental? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Entendo que sim, mas na forma de emenda. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Tenho de esperar que seja feito o parecer para, então, apresentar a emenda? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Pelo roteiro aqui apresentado, sim. Termina no dia 30 o prazo do Relator. A Subcomissão terá o prazo de 5 dias para discutir o parecer e apresentar emenda e, posteriormente, o Relator terá 72 horas para emitir parecer sobre as emendas, sendo estas e o anteprojeto submetidos à votação. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Desculpe-me, Sr. Presidente, mas gostaria de esclarecer todas as minhas dúvidas. Acho que nós estamos com um limite perigoso. Nós estamos com um prazo curtíssimo. Nós corremos o risco de apresentar um amontoado de besteiras, pelo fato de não termos condições de discutir e apurar. Não vejo como, neste prazo, já que estamos no dia 9 e até o dia 30, vamos dizer que tenhamos 3 semanas, tirando os 6 dias entre feriados, sábados e domingos, nós teríamos 15 dias; tiram-se mais 7 dias de feriados e nós vamos ouvir a sociedade civil, como propõe o Sr. Presidente. Quando? De que forma? É absolutamente romântico, nós estamos elaborando em cima de propostas fictícias. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Em função das propostas da sociedade civil, é possível que apresentemos outras. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Realmente é uma questão fundamental estarmos, todos nós, conscientes dessas dificuldades, pressionarmos a Mesa da Constituinte, até levando essa decisão para Plenário, se for o caso, no sentido de que ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) o ideal a meu ver é o acatamento de projetos que já existem a este respeito, como informei, para que esses prazos sejam modificados. São prazos inteiramente irreais. Como deveríamos conduzir este trabalho? Em primeiro lugar tendo aqui uma discussão prévia de todos esses projetos apresentados à Mesa e que digam respeito aos temas da Subcomissão. Quer dizer, temos um debate, como fazemos nas Comissões permanentes da Câmara e do Senado, relativo às proposições, onde cada um livremente pudesse expressar a sua opinião a esse respeito. Caberia ao Relator captar os resultados deste debate, ou em forma do que venha ser deliberado pelo voto ou apenas captando as opiniões predominantes, para que pudesse utilizar essas informações no seu parecer. Segundo, os debates com as entidades da sociedade civil. Nós deveríamos ter esses debates de tal forma que essas informações pudessem, inclusive, facilitar cada Constituinte cristalizar, modificar qualquer pensamento prévio que tenha a respeito de determinada pessoa, inclusive convertendo isso em algum tipo de projeto ou convertendo isso a seu juízo, a respeito da matéria na hora em que a mesma viesse a ser submetida à apreciação. Outro aspecto são essas inúmeras sugestões encaminhadas pela população, individualmente, o e Prodasen está fazendo um trabalho de catalogação de emendas que pudessem também ser apreciadas aqui e discutidas em bloco, porque entendo que são matérias constitucionais muitas dessas sugestões ou não. Eu mesmo tenho recebido sugestões, coisas que vão para uma lei ordinária posteriormente; às vezes até não são objetos de lei, mas apenas uma manifestação de um desejo, de um propósito de ordem ética, de ordem moral etc. Essas sugestões deveriam sofrer algum tipo de análise por parte da Subcomissão, caso contrário estamos passando um atestado de que tudo isso é um faz -de-conta, uma brincadeira que não interessaria e com a qual não se precisaria estar gastando dinheiro, tempo e energia, com esse tipo de tratamento, só para dar a impressão de que a sociedade está sendo ouvida. E tudo isso se esbarra nesta questão. Sem uma reformulação nos prazos será impossível produzirmos um trabalho que retrate toda essa realidade, ai, o Relator terá que assumir uma atividade hercúlea de tentar examinar todo esse material para converter em parecer, num anteprojeto. Teríamos de fazer um esforço hercúleo para discutir esse parecer e apresentar emendas num prazo exíguo de apenas 5 dias e depois, novamente, após o parecer sobre essas emendas votarmos, finalmente, o anteprojeto. Estou inteiramente de acordo com as ponderações e as preocupações que a ilustre Constituinte Eunice Michiles expressa neste momento, as quais acredito serem a angústia de todos. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – De fato, com o que estamos conversando e debatendo, não há possibilidade, de modo algum, um prazo deste, ainda quando a colocação é válida e deve ser trazida para ser ouvida, segmentos como a OAB, CNBB e uma Liderança evangélica que é de vital importância, segmentos como a Funabem, diante da Subcomissão, da qual faze- mos parte, com este prazo curto, determinado desta maneira e esta pressa, pois nós sabemos que dificilmente chegaremos à perfeição, mas procuraremos fazer o melhor nesta Subcomissão, para a sociedade brasileira, porquanto, trata-se da Família, do Menor e do Idoso. Concordo que devem ser trazidas aqui Lideranças da CNBB, grupos evangélicos, Funabem e etc, mas o calendário é o grande inimigo para os nossos trabalhos. Gostaria de aproveitar, Sr. Presidente, para desculpar-me por não ter participado da primeira reunião. Sou novo, é a minha primeira experiência e não sabia desta reunião, a data e a hora. Estava no Rio de Janeiro. Em segundo lugar, gostaria de pedir para que voltasse à Ata que fala sobre a participação da Mesa, do Presidente, Relator e Vice-Presidente, pois parece que o meu nome constava e eu não estava presente nesta reunião. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaríamos de fazer uma sugestão aos nossos Colegas Constituintes de que designemos – não consta do Regimento – para garantir o direito de cada um, que apresentem aqui as suas idéias, debatendo-as. Designemos uma parte de cada primeira fase de todas as reuniões para o Constituinte que queira fazê-lo, possa usar da palavra e fazer uma exposição das suas idéias, comentando o material que possa ter a sua disposição, em cada reunião. Penso que desta forma estaríamos atendendo a este aspecto, muito importante. De repente, um Constituinte recebe um documento da sua comunidade, do seu Estado e gostaria de comentá-lo, então deveremos assegurar, aqui, este espaço, segundo orientação que recebemos da Presidência da Comissão Temática, nós deveremos cumprir o período de reunião da 9:30 às 12:30. Designaríamos um tempo que deve ser determinado nesta reunião, para que neste período possamos fazer aqui o que fazemos no plenário: o nosso pinga-fogo, cada um usando da palavra, discutindo, expondo as suas idéias e apresentando as suas sugestões. Fica feita esta sugestão e o colega que desejar discuti-Ia ou emendá-la pode usar da palavra. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Pediria permissão para voltar ao assunto que estava sendo debatido pela Deputada Eunice Michiles e pelo Deputado Roberto Augusto. Hoje, V. Ex.ª vai perdoar-me, pois cheguei um pouco atrasado e não ouvi o início. Vi apenas o Presidente referir-se a uma reunião às 17 horas e eu gostaria de ter uma informação se essa reunião é para todos participarem ou se é uma reunião dos Presidentes e Relatores. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Inicialmente, os convocados fomos nós, Presidente e Relatores. Mas o maior número de Constituintes que puder estar lá e nos ajudar a argumentar, a respeito da necessidade da ampliação dos prazos seria muito bom, embora presenciamos, e ouvimos ontem, que há uma unanimidade, dos Presidentes e Relatores de todas as Subcomissões, no sentido de que este prazo é impraticável, é inaceitável para a realização desta fase inicial dos trabalhos de elaboração. 8 O SR. CONSTITUINTE IBÊRÊ FERREIRA: – Com essa sua informação gostaria de propor que todos nós estejamos presentes, dentro do possível, à reunião, evidentemente, nela devendo ter voz, para discussão, o Presidente e o Relator. Então, que nos delegássemos poderes ao nosso Presidente, já que, parece-me, a unanimidade concorda na impossibilidade de se fazer um trabalho sério dentro deste prazo exíguo que nos foi dado. Relembro, colaborando com os Constituintes que já me antecederam e porque nós corremos o risco de criar uma grande frustração nacional. O debate sobre a Constituinte deveria ter sido no decorrer da campanha eleitoral. Mas nós tivemos eleições majoritárias e, como todo mundo sabe, isso polarizou todo o debate das campanhas eleitorais, em função dos candidatos a Governador e a Constituinte ficou em segundo plano. Se agora, nas Subcomissões, nós não estendermos estes debates às sociedades civis ou a diversos segmentos da sociedade nós criaremos um risco de estabelecer uma frustração nacional em todos esses segmentos que são interessados e que têm, na maioria das vezes, uma contribuição expressiva, da maior importância, para que possamos ter uma Constituição mais próxima da realidade e das aspirações da nossa comunidade. A sugestão que eu faria é que V. Ex.ª ouvindo os nossos pares tivesse uma delegação, para falar, em nome de todos nós na reunião, sobre a impossibilidade desse prazo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quando iniciamos nossos trabalhos, fizemos sem caráter regimental, porque não tínhamos número regimental para abrir a reunião. Nosso Relator foi convidado a fazer uma exposição dessas dificuldades todas. Muitos Colegas Constituintes não estavam presentes e eu gostaria de saber do Constituinte Eraldo Tinoco se lhe seria possível esclarecer algum fato que pudesse suscitar dúvida. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Com prazer, tentarei fazer de forma reduzida, porém clara. O art. 17 do Regimento estabelece um prazo de 30 dias para que o Relator, com ou sem discussão preliminar, apresente parecer. Ocorre que esse prazo começou a ser contado, também pelo Regimento, no dia 1º de abril e não no dia 7, quando tivemos a eleição da Mesa da Subcomissão. Isto porque o Regimento reza que a partir da constituição da Subcomissão, e essa constituição foi feita no momento em que o Presidente da Comissão Temática declarava a Comissão dividida em três Subcomissões, nominou essas Subcomissões e esclareceu que a relação dos componentes dessas subcomissões estava disponível, etc. A eleição da Subcomissão deveria ser no dia seguinte, dia 2. Ocorre que pelas dificuldades políticas que todos já sabem, essas eleições só se realizaram no dia 7. Perdemos aí preciosos dias sem que a Subcomissão tivesse possibilidade de realizar qualquer trabalho. O prazo do Relator encerrar-se-á no dia 30. Aí vem uma dificuldade. Eu desejo, como Relator, não fazer com que as 9 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) minhas idéias sejam traduzidas num parecer e num anteprojeto. Quero, da maneira mais democrática, da maneira mais conciliatória possível, incluir, nesse parecer, que se justifique no anteprojeto as idéias de toda a Subcomissão. Mas temos as seguintes dificuldades: o prazo para que cada Constituinte apresente os seus projetos, em plenário, sobre qualquer assunto, incluindo os assuntos desta Subcomissão, encerrar-se-a dia 24, também pelo Regimento. Temos uma gama enorme de sugestões, encaminhadas por pessoas individualmente, e temos o problema de ouvir as entidades da sociedade civil que, na prática, só poderíamos começar a fazê-lo no dia 21, já que a próxima semana, sendo Semana Santa, dificilmente teríamos condições de mobilizar essas entidades, até por dificuldades de ordem prática como, por exemplo, lugar em avião. Com um grande feriado que começa na quinta-feira e irá até a segunda-feira da semana seguinte, todos sabem que Brasília vira uma espécie de ilha deserta, todo mundo quer sair. Segundo problema: o Relator apresenta seu parecer no dia 30; a Subcomissão terá um prazo de 5 dias para discutir esse parecer e apresentar emendas. Acontece que, por essa circunstância de data, esse prazo começa a ser contado precisamente no dia 1º de maio, que é uma sexta-feira e também um feriado. Teríamos, então, a sexta-feira, dia 1º de maio, o sábado, o domingo, a segunda a terça-feira seguintes para discutirmos o parecer e a apresentação de emendas. O Relator terá 72 horas para emitir parecer sobre essas emendas, que significa a quarta, a quinta e a sexta-feira da semana seguinte. E novamente a Subcomissão teria um prazo exíguo de 6 a 7 dias, do dia 9 ao dia 13, para a discussão final e a votação do parecer do anteprojeto, a fim de que no dia 13 estivesse em condições de ser encaminhado à Comissão Temática. Esse prazo, por sua vez, no dia 9, começa a ser contado novamente num sábado. Para que houvesse um aproveitamento total, teríamos que fazer reuniões extraordinárias no sábado e no domingo, o que de resto está previsto no Regimento, precisando haver a conscientização de cada um a respeito da necessidade dessas reuniões. O problema do prazo para o Relator examinar todas essas contribuições – e como muito bem levantou a questão a Constituinte Eunice Michiles – é que os integrantes da Subcomissão não teriam prazo para discutir previamente essas sugestões. Então receberiam, como se diz na linguagem corriqueira, um prato feito de um parecer para, no exíguo prazo de 5 dias, incluindo o 1º de maio, uma sexta-feira, analisar, discutir e emitir emendas a esse parecer e a esse anteprojeto. Parece-me que o ponto fundamental é, em primeiro lugar, nos conscientizarmos desses problemas; em segundo lugar, aproveitando até mesmo projetos já existentes, aprovarmos uma modificação nesses prazos regimentais que entendemos ser de vital importância, porque as questões acessorias estão tendo prevalência sobre as questões substantivas. Vejam, por exemplo, que tivemos quem ficar praticamente uma semana, para discutir as questões políticas de que vai ser relator, de quem vai ser Presidente, etc., fossem equacionadas no seio de cada bancada. Agora, na hora de discutir a matéria substantiva a matéria que vai realmente constituir o cerne da questão, não teremos prazo para isso? Estamos colocando o carro adiante dos bois. Não é possível fazermos um trabalho de profundidade dentro desses prazos que o Regimento estabelece. Tenho uma sugestão, Sr. Presidente, que poderia talvez facilitar o nosso trabalho e permitir que imediatamente coloquemos para funcionar aquilo que todos nós temos interesse, que é o debate sobre as questões constitucionais propriamente ditas. Como não temos possibilidade material de convocarmos entidades da sociedade civil para, na próxima semana, ouvirmos essas entidades e debatermos as questões da família, do menor e do idoso com essas entidades, a minha sugestão é que as reuniões que ocorram na próxima semana já fossem destinadas para que cada componente da Subcomissão pudesse dispor de um tempo razoável, a fim de que exponha suas próprias idéias ou idéias em termos de projetos que já tenham sido encaminhados à Mesa da Constituinte. É possível que isso aconteça, então o autor desse projeto poderia aqui discutir, apresentar seus pontos de vista, etc., ou cada um trazer um conjunto das suas idéias, dos seus pensamentos, das suas propostas, a respeito do tema – da família, do menor e do idoso. Acho que já poderíamos, na próxima semana, no âmbito desta Subcomissão, iniciar a discussão do tema e, eventualmente, essa discussão, essas idéias etc., poderiam até ser, posteriormente, até o dia 24, transformadas em projeto, até para efeito de registro histórico de cada constituinte que, naturalmente tem compromisso com seus eleitores, tem um compromisso com a própria História, com o povo brasileiro, de modo geral, mesmo sem que essas propostas já estejam apresentadas formalmente à Mesa, pudessem ser discutidas idéias, propostas, sugestões para o tratamento do tema. Poderíamos organizar um calendário, em que cada um tivesse 20 minutos, meia hora, ou o tempo que fosse acordado, para a exposição das suas preocupações, das suas opiniões a respeito do tema, e isso já serviria de muito para que o Relator pudesse ir captando a opinião predominante desta Subcomissão. A partir do dia 21, o Presidente organizaria um calendário, definiria com a Subcomissão as entidades que devam ser convidadas e já marcaríamos esses debates com as entidades da sociedade civil a partir do próximo dia 21, dentro de um calendário que permita ouvirmos o maior número possível de entidades e, dentro do que ficar acertado, finalmente em termos de prazo final para apresentação do nosso trabalho, para decisão da Subcomissão. Coloco esta sugestão para apreciação desta Subcomissão e, se for o caso, sua aprovação. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A sugestão feita é importante, já que, como ficou esclarecido, só teremos condições de ouvir, representada, a sociedade civil a partir do dia 21. Na próxima semana, poderíamos aproveitar o tempo que dispusermos nas reuniões, a fim de ouvirmos a exposição de cada Constituinte. É importante esta sugestão, mesmo pela necessidade de nos conhecermos melhor, conhecermos a posição de cada um. Vamos tratar de alguns assuntos conflitantes, como a questão da menoridade, como a questão da dissolução da sociedade conjugal, a questão da sociedade conjugal de fato e de direito, a questão da idade penal do menor. São assuntos que estão aí, discutidos pela sociedade, e deles teremos que tratar a questão da idade para aposentadoria – já que vamos tratar do problema do idoso, temos ocasião de apresentar subsídios nesse aspecto; a questão do trabalhador rural, da mulher trabalhadora rural. Teremos ocasião de ouvir a opinião, a posição de cada Constituinte. Então, a sugestão do Relator é no sentido de que nas reuniões da próxima semana teremos ocasião de ouvir o Constituinte que se inscrever, pelo prazo que ficar aqui decidido, a fim de que cada um tenha ocasião de fazer uma exposição sobre suas preocupações, sobre suas idéias e ainda sobre suas propostas. Fica aberta a discussão. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Sr. Presidente, peço a palavra, pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte João de Deus Antunes. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Minha questão, Sr. Presidente, a respeito da dificuldade que estamos vendo para conciliar horários. Dentro do dia não teremos uma reunião, e sim duas reuniões, em virtude de pertencermos a duas comissões, uma como titular, outra como suplente. Haverá assuntos que será do máximo interesse deles participarmos e, pelo fato de termos de participar de outra Comissão, certamente não estaremos presentes. Pergunto: qual a possibilidade que teremos de tentar ao menos conciliar esse problema de horário. Às 11 horas inicia-se a reunião da outra Subcomissão à que pertenço – Dos Direitos Políticos, dos Direitos Coletivos e Garantias. Gostaria de continuar com os senhores, aprofundando o assunto, de importância vital, porém, este outro compromisso vai-me impedir de continuar, nesta reunião. Quero saber, Sr. Presidente, qual a possibilidade que teremos de conciliar o horário para os próximos dias e próximas reuniões. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – As reuniões são convocadas na forma do Regimento. Temos reuniões das 09:00 às 12:45. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – É assunto que pode ser levado também para a reunião. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sim, não há dúvida. Mas, veja bem, esse prazo vai poder ser alterado. Queremos garantir que em qualquer fase da reunião o Colega Constituinte possa usar da palavra, fica garantido o seu espaço. Além dessas dificuldades que estamos colocando, ainda temos aquelas outras: viagens aos nossos Estados, atendimento aos nossos compromissos pessoais, atendimento às pessoas que ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) nos vêm procurar, eventualmente de uma viagem, etc. De modo que temos uma premência de tempo ditatorial. Temos que conciliar todos esses interesses, e esta é a razão por que temos que aproveitar o máximo tempo de que dispomos. Estamos trabalhando no sentido de que haja essa ampliação de prazos; mas não temos certeza de que será feita. Então, temos que trabalhar em cima daquilo que está já determinado no Regimento. E o que está determinado no Regimento é essa premência de prazo, esse prazo curtíssimo que aí está. Temos presente o Relator da Comissão Temática, Constituinte Artur da Távora, a quem convidamos para sentar-se conosco, e perguntamos: quem sabe se S. Ex.ª gostaria de usar da palavra. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – Sr. Presidente, foi colocada em discussão a proposta do nobre Constituinte Eraldo Tinoco. É um cronograma que teremos que fazer. Sugiro, não agora, que sei impossível, que, na reunião de amanhã, a Mesa já nos pudesse trazer um cronograma mais detalhado, porque os prazos são tão curtos, e os que têm interesse noutra Comissão soubessem que no dia 10 seria discutido isso, no dia 11 iríamos ouvir aquilo, enfim, tivéssemos um roteiro mais detalhado, para que pudéssemos conciliar outros interesses de presença, como o Presidente acabou de dizer muito bem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Ficando aprovada a sugestão feita pelo nosso Relator, no decorrer da semana trabalharemos estes detalhes. Estamos colocando aqui, Deputado Artur da Távola, as nossas dificuldades iniciais, especialmente em decorrência da premência de prazos. O nosso Relator faz uma exposição detalhada das dificuldades que constam, e estamos manifestando as nossas preocupações com respeito à impossibilidade quase de ouvirmos a sociedade civil, que é o que há de mais importante. Sabemos que os trabalhos de elaboração constitucional já estão sendo colocados em dúvida por um amplo setor da sociedade brasileira. Se, nesse momento em que ela vai ter a oportunidade de participar, por questões de prazo essa oportunidade vier a ser suprimida, vamos ter imensas dificuldades. Já disse até que acredito que não teríamos grandes dificuldades se tomássemos ou não, por um roteiro, um texto qualquer, o Projeto Afonso Arinos, por exemplo, a Constituição de 46, não teríamos dificuldades de elaborar aqui um texto e de encaminhar a Comissão Temática. Assim, não teríamos muita dificuldade. No entanto, que valor político teria isto? Este é o momento político, é o momento do espaço político que a sociedade civil deve ocupar, ainda que as suas sugestões possam não ser acatadas, como muitas que têm chegado aqui e que são meros pontos de vista, são meras sugestões, e não representam sequer propostas. São coisas vagas. Mas é a sociedade, é a ocupação do espaço político, no trabalho da elaboração constitucional, que considero, na minha visão pessoal, o que há de mais importante nesta fase. Esta fase dos trabalhos confiados às Subcomissões também e o que há de mais importante, porque é quando a sociedade está sendo ouvida. A partir daí já vamos afunilando esse trabalho das Comissões, e, agora, a sociedade já vai ficando distante. Se não lhe dermos esta oportunidade agora, para que possa ser ouvida, para que possa apresentar suas propostas, para que possa discutir, vamos ficar numa situação política de contramão. Esta é uma opinião e uma preocupação que estamos colocando, quando formamos entre aqueles que estão lutando para que o prazo seja revisto, mesmo porque não é a Subcomissão que tem culpa pelo fato de os trabalhos não terem sido iniciados no prazo previsto. Ficar o trabalho de elaboração constitucional, nesta fase, submetido a esta ditadura do prazo seria muito temerário para nós. Então, vamos submeter à apreciação e à decisão dos colegas das sugestões feitas pelo nosso Relator, no sentido de que na próxima semana, já que só poderemos ter condições de ouvir algum representante da sociedade civil a partir do dia 21, no decorrer da próxima semana ouçamos os Membros desta Subcomissão, sobre os diferentes aspectos do direito da família, do menor e do idoso, o que cada um tem de novidade para apresentar ou quais as suas preocupações e sugestões pessoais, até por uma necessidade de nos conhecermos melhor. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Sr. Presidente, falamos a princípio, aqui, naturalmente uma sugestão apresentada por V. Ex.ª, sobre a questão da divisão do tempo, que teríamos nosso horário para fazer um pinga-fogo, expressão usada por V. Ex.ª. Passamos agora às datas das reuniões da próxima semana. A próxima semana, é Semana Santa. Os bancos, por exemplo, fecharão de 16 a 21. Já está decretado feriado bancário de 16 a 21. Naturalmente, um feriado chama o outro, um vai atrás do outro, e de 16 a 21 ninguém vai trabalhar, de quinta-feira Santa a 21 de abril, inclusive o dia 21. Naturalmente, o dia 22 vai ficar meio enforcado. Gostaria de saber, pois já estive em uma Comissão e já marcaram as próximas reuniões para o próximo dia 22. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O feriado do dia 21 será antecipado para segunda-feira, dia 20. Se marcarmos alguma reunião para a próxima semana, provavelmente estaremos fadados a chegar aqui e não haver ninguém para a reunião, para o quorum regimental. Não seria melhor pensarmos quanto às reuniões? A questão dos prazos que estamos comentando aqui, creio que eles serão dilatados. Disto não tenho dúvida nenhuma, porque não há condição. Seria também o caso de pensarmos também na próxima reunião, para evitar marcar-se uma reunião, aprová-la aqui, e depois nós mesmos não comparecermos. O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – Permita-me, Sr. Presidente. A minha sugestão é em função dos interesses dos próprios integrantes da Comissão. Concordo plenamente. 10 O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Estas questões devem ser acordadas de tal forma que ninguém fique prejudicado por uma decisão de outro, já que somos um Órgão colegiado, e temos um problema básico, o quorum para essas reuniões. Na próxima semana, segunda, terça e quarta-feira não serão dias feriados, embora, até por tradição da Casa, tanto da Câmara como do Senado, na Semana Santa normalmente não há sessões. Estamos em um ano especial, elaborando uma Constituição. Por outro lado, estamos ainda, formalmente, diante de uma ditadura dos prazos, como disse muito bem o nosso Presidente. Deveríamos, com toda a sinceridade, com toda a franqueza, com toda a lealdade, estabelecer os que estão dispostos aqui comparecer na próxima semana ou não. Até admito que muitos integrantes da Comissão já tenham, justamente por essa tradição, estabelecido compromissos, com suas bases, de visitas, de debates, a respeito dos próprios temas constitucionais. Por exemplo, marquei, e até estou tomando providências para desmarcar esse compromisso, marquei debatendo com algumas Câmaras de Vereadores sobre os problemas da Constituição, aproveitando este período. É possível que isso ocorra com todos os integrantes da Comissão. Então, Sr. Presidente, em primeiro lugar sugiro que cada um se manifeste à Secretaria da Mesa se estará ou não presente na próxima semana. E caso estejam presentes, aqueles que queiram utilizar-se deste horário e desta oportunidade para exposição de suas idéias, das suas preocupações sobre os temas da Subcomissão. Com isso o Presidente poderá, concretamente, deliberar sobre a realização ou não das reuniões, porque, de repente, marcamos formalmente a reunião, muitos se esforçarão para estar presentes em Brasília nesses dias, e chegaremos aqui e não haverá quorum , e não poderemos realizar a reunião. Quer dizer, ficarão uns prejudicados pela decisão dos outros. Vamos acertar previamente com toda a lealdade, com toda a franqueza, e saberemos, de antemão, se teremos ou não quorum para a reunião. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Sr. Presidente, faço uma proposta para que as nossas reuniões da Semana Santa sejam substituídas, porque não vão contribuir, de certa forma, para o grande desempenho do nosso trabalho. Acredito que os prazos serão dilatados e não vamos aqui pensar que em 2 dias da Semana Santa serão realizadas muitas coisas. Primeiro, porque segunda-feira – creio – dificilmente alguém estará aqui, já por costume e tradição da Casa, como disse muito bem o nobre Relator. E vamos ter terça e quarta-feira, porque na segunda-feira não há reunião. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Sessão da Câmara é à tarde, e não prejudicaria nossa reunião pela manhã. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS: – Permite-me, Sr. Presidente? Temos um roteiro traçado em nosso Estado, e dificilmente conseguiremos desmarcar tudo o que foi feito. V. Ex.ª falou que já tratou de desmarcar os seus compromissos. Nem sabíamos, sinceramente, 11 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) que haveria a possibilidade de termos reuniões aqui. V. Ex.ª sabia. Então, em cima da premência do tempo, não temos condições de desfazer os compromissos, e aí seremos prejudicados, se tivermos reuniões aqui. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, uma colocação, uma sugestão diante dessa dificuldade. Diante dessas circunstâncias, é até válido o trabalho nosso em nossos Estados. Teremos a Semana Santa, e poderemos, conforme foi levantado aqui, elaborar o nosso trabalho referente à família, ao idoso e ao menor. No dia 22, conforme foi também colocado aqui, estaríamos, em reuniões sucessivas, já com material, suprindo esta semana, porque dificilmente poderemos estar aqui. Coloco esta sugestão. Ainda que nem todos concordem, vou procurar, dentro dessas comunidades, sou um bispo evangélico, passarei dentro de minhas bases, não somente dentro dos grupos evangélicos, e também de outros, para colocar aqui. Se cada um de nós fizesse isto teríamos, a partir do dia 22, um trabalho com grande atividade e recuperaríamos este tempo inativo que teremos pela semana. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Mantenho, portanto, a minha proposta, e espero que os companheiros decidam. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Em discussão. O SR. CONSTITUINTE VINGT ROSADO: – Sr. Presidente, também não poderei estar aqui, pois tenho um compromisso no meu Estado, como o Colega falou, e não tenho jeito de desmarcá-lo. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Sr. Presidente, não fiz a minha justificativa, mas quero, em tempo, apresentála. Não estou propondo aqui dilatação de trabalho, para não trabalharmos. É no sentido de realmente atendermos aos compromissos que já havíamos assumido. A própria Casa, pois é sua tradição, já nos fez assumir esses compromissos. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, estarei presente, mas me solidarizo com os companheiros. Fiz aqui, rapidamente, um esboço, notificando os dias que faltam, e tive uma surpresa: vamos ter, durante a Semana Santa, 7 dias, inclusive contando com o dia 30, e que serão 7 dias de trabalho na Subcomissão. Então, Sr. Presidente, temos que partir para, nesta reunião de hoje, concluir que é inviável a realização de reuniões na Semana Santa. Passamos 60 dias debatendo o Regimento. Temos 7 dias para preparar. Não é possível. Sr. Presidente. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Permita-me um aparte, nobre Constituinte Iberê Ferreira. Além de pressionarmos no sentido de uma racionalidade nessa decisão, já existe um projeto concreto propondo que o Plenário da Constituinte é soberano para decidir. Então, temos que tomar decisão de apoiar esse projeto do Constituinte Jorge Hage, colocando prazos mais realistas para o trabalho, pois a questão não é só a deste trabalho de agora, mas todos os prazos colocados foram feitos em função de datas ideais para o término do trabalho. Estamos vendo que só na questão acessória já consumimos uma parcela de tempo. Entendo inteiramente a angústia e a ansiedade que a sociedade brasileira tem o respeito de contar logo com o resultado deste trabalho. Muitas vezes até há uma interpretação errada das questões. Ninguém pense que uma questão como o Regimento, por exemplo, foi tempo em demasia para ser deliberada, porque havia questões de ordem política, e esta é uma Casa política, para serem deliberadas. Não pudemos coordenar o problema do adiamento da eleição das Subcomissões, porque havia questões políticas a serem resolvidas, e esta e uma Casa política. São circunstâncias efetivas que impedem. Temos que votar, pressionar, para que este projeto vá, o quanto antes, a plenário, votá-lo, aprová-lo, para que esses prazos sejam mais realistas. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Apenas apresento mais uma sugestão, traduzindo, talvez, a preocupação da Constituinte Eunice Michiles. Cada um de nós já tem as suas idéias, os seus propósitos. Aproveito esta sugestão do Companheiro Roberto Augusto, no sentido de cada um dos Srs. Constituintes coloque, em termos de artigos, propostas, justificando naturalmente, como se fossem projetos efetivamente a serem encaminhados ao Plenário; e mesmo antes de encaminhar esse projeto ao plenário, pudesse colaborar com o Relator, oferecendo uma cópia desse trabalho, para que o Relator já possa ir captando as opiniões e as idéias dos Srs. Membros da Subcomissão, a fim de que o trabalho final possa, realmente, retratar esse conjunto de opiniões. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, esse projeto de resolução, modificando os prazos do nobre Deputado Jorge Hage, já foi encaminhado e quando será votado? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Já foi encaminhado à Mesa. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Seria interessante que todos soubéssemos, para estarmos presentes. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vamos ter uma reunião com o Presidente da Constituinte. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Em função disto. Sr. Presidente, já poderemos discutir várias questões, mas falta, ainda, um fecho da nossa reunião. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – A minha sugestão é no sentido de que a Comissão decida que não vai haver reunião e só convoquei para os próximos dias 21 e 22, de acordo com a decisão dos Srs. Membros. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Fica, então, submetida a sugestão a voto – já houve mais do que voto. Já houve declaração de voto. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Não podemos ser mais realistas do que o rei, Sr. Presidente. Não podemos ter receio de tal Comissão. Queremos fazer um trabalho sério, responsável. Não vamos ter medo de dizer que não vamos trabalhar na Semana Santa porque temos outros compromissos. Temos que assumir, porque, na realidade, o que estamos querendo é um trabalho sério e que atenda às aspirações da proposta. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Srs. Constituintes, a questão do prazo. Temos que ouvir a sociedade civil ainda com esse pequeno prazo. Faço uma sugestão no sentido que, já no dia 22, tenhamos, aqui, convocada uma personalidade representativa de uma entidade de nível nacional. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Sr. Presidente, apenas uma sugestão. É bem provável que daqui até o dia 22, neste prazo, V. Ex.ª e nós já tenhamos uma comunicação de que os prazos naturalmente poderão ser dilatados e aí já há outras medidas que naturalmente serão tomadas no dia 22. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Inclusive, sugiro que se convoque o Deputado Eraldo Tinoco e a Deputada Eunice Michiles, para que saiamos daqui para a nossa Liderança para expor exatamente isto e que os Deputados do PTB, do PMDB e todos conversem com a Liderança, façamos o debate. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Cada um junto aos seus Líderes coloque essas preocupações levantadas aqui. Convoquemos, então, a próxima reunião para o dia 22, no horário regimental. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Inclusive, Sr. Presidente, como Membro da Mesa, vou levar-lhe estes nossos pensamentos, esta nossa preocupação e esta inquietação sobre o problema de prazo. O SR. CONSTITUINTE ELIEL O SR. PRESIDENTE (Nelson RODRIGUES: – Sr. Presidente, peço a Aguiar): – Teremos a nossa reunião amanhã, palavra pela ordem. e vou-me encarregar da decisão que for tomada, hoje, na reunião que faremos com o O SR. PRESIDENTE (Nelson Presidente, e comunicaremos de ofício, por Aguiar): – Concedo a palavra, pela ordem, ao telegrama, a cada Membro desta Comissão. Sr. Constituinte Eliel Rodrigues. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ O SR. CONSTITUINTE ELIEL FERREIRA: – A partir daí faremos outro RODRIGUES: – Sr. Presidente, gostaria de cronograma, de acordo com a decisão. saber como vai funcionar, porque estamos tratando do caso específico da Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Ocorrerá do mesmo modo nas demais Aguiar): – A decisão da maioria foi no sentido Subcomissões. Em termos da nossa de que não convoquemos ou de que pelo Constituinte, no Plenário, como vai funcionar? menos não poderão estar presentes. Como V. Ex.ª tem alguma idéia a respeito? não temos presente a maioria de Membros da Comissão, gostaríamos, ainda, de ter uma O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): opinião ou uma sugestão, no sentido de que – O nobre Deputado Ulysses convoquemos ou não convoquemos a reunião Guimarães ontem na exposição que para a próxima segunda, terça e quarta-feira. fez, declarou que teremos sessões, ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) plenárias até na próxima quarta-feira – não teríamos apenas quinta e sexta-feira. Penso que todos esses fatos estão pendentes de novas decisões, em decorrência de todas essas injunções que reconhecemos. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – V. Ex.ª me desculpe, Sr. Presidente, mas muda um pouco. Se o Presidente Ulysses Guimarães convocar sessão da Constituinte para terça-feira e quarta-feira, não sei como ficaremos. A SR.ª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Eu concordo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Se o Sr. Presidente mantiver o calendário da realização das sessões plenárias, teremos que manter o nosso trabalho, ainda que não realizemos as reuniões por falta de quorum , mas estaremos na obrigação – a Mesa, pelo menos o Presidente – de manter o enunciado no Serviço de Som, da realização das sessões. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Não sei, Sr. Presidente, como será. Já comuniquei aqui que assisti, numa Comissão, deliberarem que as próximas reuniões seriam no dia 22. Seriam opiniões de Comissões, e naturalmente não vou declinar os nomes delas, porque não faço parte das mesmas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Naturalmente não estiveram atentos. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Talvez estivessem atentos para o fato da condição tradicional da Casa. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não vejo como a Assembléia Nacional Constituinte estar reunida plenariamente e não estarmos aqui presentes. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Se isso de fato acontecer, devemos estar aqui, e assumo o compromisso de estar aqui. Estar aqui para não participar da reunião é perder também tempo. Se for mantido esse pensamento do Presidente Ulysses Guimarães, devemos assumir o compromisso – nos que estamos aqui – de estar presentes, aqui, na terça e na quartafeira. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Então, de início fica convocada para segunda-feira. Qualquer mudança comunicaremos por telegrama a todos os Membros da Subcomissão. Alguém deseja falar sobre outro assunto? O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, não acompanhei a outra reunião e gostaria de saber a composição da Subcomissão. Deputados e Relator. Parece-me que o meu nome foi colocado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Por fineza, solicito que o Secretário ofereça esta informação. O Primeiro-Vice-Presidente é o Sr. Roberto Augusto; o Segundo-Vice-Presidente é o Sr. Antônio Salim Curiati. O interessante é que nesta Subcomissão ocorreram coisas extraordinárias. O Presidente foi eleito sem ser candidato, pois postulara ao cargo de Relator. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Foi o meu caso também. Foi uma surpresa quando ouvi a leitura da Ata. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estava sentado ali, pronto para dar o voto a um dos dois candidatos e esses candidatos já haviam sido eleitos. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mais uma dúvida, Sr. Presidente. Gostaria de saber se para nos manifestarmos aqui, na Comissão, dependerá de inscrição, que tempo teremos e como isto acontecerá? Será um pinga-fogo de 5 minutos ou teremos mais tempo? Como irá funcionar? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não fizemos ainda este calendário. Acredito tenhamos que seguir uma ordem, sob pena de ficarmos impossibilitados, aqui, de realizar nossos trabalhos. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Por exemplo, a idéia seria de pronunciamentos mais longos, em que o Constituinte pudesse mostrar todo o seu pensamento, abordando os diversos assuntos, ou ele teria 5 minutos, abordaria um pequeno tema, e ponto final? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quero que esta decisão seja tomada pelo Plenário. Como dissemos, queremos trabalhar aqui como um colegiado. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Seria interessante tomarmos esta decisão agora, até porque aproveitaríamos os feriados para nos preparar para essas intervenções. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Queremos que a função específica do Presidente, aqui, seja de apenas abrir e encerrar a sessão. Todas as demais decisões serão tomadas pelo Plenário. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a Palavra ao Sr. Relator. Deputado Eraldo Tinoco. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Trata-se de uma sugestão, no sentido de que cada Componente da Subcomissão possa dispor de 30 minutos para uma exposição genérica, geral e abrangente sobre as suas idéias – até 30 minutos. Portanto, estaria naquela primeira parte que sugeri, que fosse dada essa oportunidade para que cada um apresente as suas idéias a respeito dos temas da Subcomissão. Numa segunda etapa, na etapa propriamente dita de discussão das matérias, a partir da análise, da discussão e do parecer, que esse tempo fosse de 10 minutos para cada Constituinte, na fase de discussão e de encaminhamento da matéria, a partir, portanto, daquela data de 1º de maio, quando o parecer será submetido à discussão e, posteriormente, à votação. 12 O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Já foi feito um elenco de sugestões a este respeito – um documento foi encaminhado, e não sei se os ilustres Membros desta Subcomissão já o receberam –, na página 5 está escrito: "Na discussão do anteprojeto". Não seria o caso. Solicitamos aos nossos auxiliares que esses documentos fossem entregues aqui, na Comissão, porque, quando se manda para o Gabinete, nem sempre chegam às mãos do Constituinte, e tenho a experiência do que ocorre lá – no tumulto da papelada que tenho lá no meu Gabinete. Como dispomos desse material agora, solicitamos que cada um faça um estudo das sugestões que ele contém. A sugestão do nosso nobre Relator é no sentido de que, para a parte expositiva, a parte de exposição de idéias, exposições pessoais, cada Constituinte conte com o prazo de até 30 minutos e, no momento das discussões e sugestões, conte com o prazo de até 10 minutos. Esta questão é importante, porque naturalmente algum Constituinte gostará de dispor de um tempo amplo para fazer exposição das suas idéias e propostas. Como se posiciona a Comissão a respeito deste prazo? O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Pergunto ao nosso nobre Relator, nessa sua exposição, como ficaria, por exemplo: temos um período de trabalho das 9 horas e 30 minutos às 12 horas e 30 minutos. Se alguém chegar aqui com um trabalho de 30 minutos, e esses 30 minutos com mais 30 minutos e mais 10 minutos, como ficaremos, então, no decorrer dessa sessão? Não seria, talvez, melhor tivéssemos um período de pinga-fogo inicial, alguém que quisesse apresentar qualquer proposta mais elementar ou menor possível? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Ilustre Constituinte Sotero Cunha, temos 19 Componentes na Comissão. Significa, portanto, um prazo de 9 horas e 30 minutos, caso todos utilizem esses 30 minutos, o que perfaz uma média de três reuniões apenas para ouvirmos todos os Constituintes membros efetivos da Comissão. Nessa exposição, não teríamos a réplica de 30 minutos, por desnecessária, inclusive. Teríamos uma exposição de cada Constituinte a respeito das suas idéias e das suas preocupações a respeito dos temas da Subcomissão. Sabemos que alguns utilizariam 30 minutos, outros não, e, talvez, até outros não utilizassem nenhum tempo. Se todos usarem, teremos 9 horas e 30 minutos, o que corresponde a um pouco menos de 3 sessões para ouvirmos a opinião de cada Constituinte. É evidente que não podemos pensar em termos de nenhuma entidade convidada utilizar um espaço menor do que uma reunião para debater conosco as suas propostas. Então, digamos que determinadas entidade traga dois expositores. Logo cada entidade teria uma hora de exposição; quem trouxer dois expositores, três, cinco... É problema da entidade. A entidade, como um todo, se só vier um expositor, teria uma hora, para a sua exposição. Estas são apenas sugestões. A Subcomissão a acata ou não. Temos que ver a conveniência da nossa Subcomissão. Com relação ao tema, a presença das entidades civis, que a cada instituição fosse dado o prazo de 1 hora para a sua exposição e, depois, pela ordem de inscrição, à interpelação, cada Constituinte tendo um prazo de 5 minutos para a sua interpelação, e igual Então, feita essa exposição, na tempo para resposta à autoridade ou às primeira hora da reunião, cada autoridades autoras das exposições. Constituinte, que assim o dese- 13 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) jar, teria um prazo de dez minutos para interpelações, e o expositor teria outros dez minutos para a resposta. Como são três horas de reunião, são três horas previstas para as reuniões ordinárias, teríamos duas horas de debates, intercalando-se entre o questionamento e a resposta. Se, findo o período, o tema não estiver esgotado, tivermos ainda oradores inscritos, etc., a própria Comissão poderá, numa medida de flexibilidade, prorrogar esse tempo, ou simplesmente, se considerar que a matéria já está devidamente debatida, suspender a reunião naquele momento. Teríamos, realmente, uma ampla possibilidade de debate com as entidades, porque nunca acredito que, numa resposta de três minutos se constitua alguma coisa realmente de útil para o trabalho que se propõe. Quer dizer, dentro de um processo de inter-relação, termos a possibilidade, realmente, de questionar, de levantarmos dúvidas, de discordarmos de algum posicionamento, e dar igual oportunidade para que aquele que venha a ser interpelado possa responder também dentro de um prazo razoável. Não temos aqui as mesmas dificuldades do Plenário, que é um número muito grande, tampouco das Comissões Permanentes. Temos uma tarefa específica. Parece-me que, dentro de uma proposta desta ordem, poderíamos ter, realmente, para a elaboração do anteprojeto, para a elaboração do parecer, a possibilidade de uma discussão prévia, bastante abrangente, a respeito da Comissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Entendemos que o que há de mais importante no nosso trabalho aqui é assegurar o espaço individual de cada Membro desta Subcomissão. Não pode haver qualquer tipo de constrangimento ou de cerceamento, a fim de que todos tenham oportunidade, aquelas oportunidades que não temos no Plenário devido à premência de tempo. Assegurar esse espaço individual sem atrelamento, sem constrangimento, sem cerceamento, é o que há de mais importante. Então, entendemos que esse prazo de até trinta minutos o expositor o utiliza se quiser fazê-lo. Assegurar esse prazo de ate trinta minutos é um tempo suficiente para que ele possa aprofundar, mesmo porque é um embasamento teórico, muitos gostarão de fazê-lo, muitos gostarão de mostrar a fonte filosófica e doutrinária das suas idéias, das suas posições. Então, terão tempo de elaborar com cuidado, de manusear documentos, o que queremos é garantir esse espaço. Como dissemos, a função específica da Presidência aqui, que ela não pode transferir, é a de abrir e encerrar a sessão. E tudo o mais, todas as demais decisões, queremos tomá-las, de forma colegiada, como estivéssemos numa reunião em nossa casa, em torno da mesa, como se fôssemos sócios igualitários de uma mesma empresa. Isto tem que ficar muito claro aqui, para que possamos trabalhar. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – O meu pensamento, Sr. Presidente, não é querer discordar, absolutamente, do ponto de vista do Relator. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mesmo porque queremos ouvir durante meia hora ou mais o Professor Sotero Cunha. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Muito obrigado. Estou procurando ajudar, que tenhamos, por exemplo, a coisa bem acertada, porque, se acabamos de falar que podemos trazer alguma entidade para expor aqui o seu ponto de vista em dez minutos, o que seria também muito pouco, para quem vem do Rio de Janeiro trazer um trabalho para apresentar à Comissão, uma entidade dessas naturalmente quer ter dez minutos para falar. Quero que as coisas sejam feitas de maneira que não cheguemos aqui com várias entidades. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não isso não! Pode ter certeza. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – É uma coordenação de tempo que desejo seja feita. Não estou dizendo que seja cinco nem dez minutos. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Temos uma sugestão. Já porque não temos essa possibilidade de dar oportunidade a tantos, devemos trazer aqui entidades representativas de opinião nacional. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Perfeito! O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vamos regionalizar esta questão – vai ficar difícil –, porque cada um de nós dispõe nos seus Estados daquelas entidades que gostaríamos de prestigiar. É evidente que não há prazo para isso. Aquelas entidades que representam segmentos da sociedade brasileira, a nível nacional, é que deveremos utilizar no nosso pouco espaço de tempo de que temos. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, quantas entidades poderão ser convidadas? Até quantas poderemos ouvir? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vai depender do tempo, vai depender do prazo. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – E as sugestões partirão do Plenário? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Daqui, do Plenário. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Do nosso Plenário, claro. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Exatamente. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Desde já, proponho seja convidada a UNICEF. Parece-me de extrema importância os dados que estão aqui. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Relacionamos aqui algumas. Colocamos UNICEF e a Associação Nacional dos Juízes e Curadores de Menores, uma Entidade representativa dos evangélicos. Deve ser convocada a CNBB. No entanto, há uma decisão para ser tomada aqui. Mesmo porque, estamos sabendo as posições do mundo católico com respeito a algumas questões éticas que estão colocadas sobre o aborto, sobre a indissolubilidade do casamento. É fundamental que essas entidades sejam ouvidas. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, de fato, nesta colocação aborto, divorcio, são temas importantíssimos que vão ser debatidos aqui, a CNBB tem uma colocação clara, e a liderança evangélica, outra. Então, é necessário, como disse o Presidente, trazer aqui, a CNBB, porque já é um grupo formado. Com o convite, claro, virá aqui um Líder da CNBB. E do grupo evangélico, aqui, neste Plenário, não sei quem são os dezenove. Pela manhã estávamos em seis, e poderíamos estudar aqui um líder nacional, colocando um dos nomes. Poderíamos conversar, não sei se no Plenário, porque falar aqui sobre, por exemplo. FUNABEM é fácil para um líder da FUNABEM. Não sei se particularmente com o grupo que aqui está, estudarmos uma liderança evangélica, – e fiquei muito feliz com essa colocação – uma liderança evangélica, que aqui estaria para também dar o seu parecer. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Prezado Constituinte, me permite um adendo? O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Pois não. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Temos que nos reportar ao art. 14 do Regimento: "As Subcomissões destinarão de 5 (cinco) a 8 (oito) reuniões para audiência de entidades representativas de segmentos da sociedade..." É evidente que a nossa limitação é quanto ao número de reuniões destinadas, mas não há no Regimento qualquer norma que impeça, por exemplo, a presença de mais de uma entidade na mesma reunião. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Ou extraordinária. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Ou extraordinária. Mesmo assim, o regimento fixa um máximo de oito reuniões. Então, com relação a esta questão, sugiro que o Sr. Presidente possa trazer uma relação de entidades, para que a Comissão delibere a respeito dessas entidades a serem convidadas. E mais especificamente com relação à comunidade evangélica, como sabemos que nesta comunidade temos varias denominações, pudéssemos convidar aqui representantes, que esse grupo mesmo escolhesse representantes das diversas denominações, um batista, um membro da Assembléia de Deus, enfim, poderiam aqui comparecer, numa mesma reunião, três ou quatro importantes lideranças evangélicas, cada uma trazendo a sua opinião e não teremos afinal de contas, opiniões divergentes, mas realmente obrigado, do ponto de vista representativo, o máximo possível essas entidades. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Concordo com o parecer do nobre Relator. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Dentro da proposta que apresentei, uma hora para debates, poderíamos ter três expositores, cada um com vinte minutos, já seria um tempo razoável, ou até mesmo quatro expositores, cada um com quinze minutos, e, assim, teríamos uma visão bem mais ampla do problema. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Concordo com a brilhante colocação do nobre Relator, porque no segmento evangélico não há um órgão como há no segmento católico. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Os Colegas podem também apresentar sugestões a respeito de nomes de entidades. Aqui, por exemplo, temos relacionado: UNICEF, CNBB, FUNABEM, Associação Nacional dos Juízes e Curadores de Menores – é importante ouvir, se pudermos trazer aqui... A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, por que, em vez da FUNABEM, não se convoca o Ministro da Previdência, que teria dados mais globais, uma visão ampla a nos oferecer? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quando colocamos a FUNABEM, tínhamos a idéia de colocar uma pessoa que está vivendo o drama de perto, por dentro. Por exemplo, fui presidente da FUNABEM durante onze meses e não consegui levar o Ministro até lá. S. Ex.ª não teve tempo para visitar as nossas instituições. Não consegui sensibilizá-lo no sentido de que era importante a sua presença. Ao que estamos sabendo, o atual Ministro só compareceu a FUNABEM para uma solenidade. A Presidenta da FUNABEM está vivendo a realidade do dia-a-dia daquelas instituições, ela está em permanentes contatos com entidades de outros Estados, está em conferências, está produzindo debates, portanto, ela tem uma visão muito mais concreta, muito mais real do problema específico do menor, embora esta não seja uma idéia acabada. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Concordo plenamente. A Presidenta poder-nos-ia trazer dados muito mais concretos, muito mais sentidos, no que se refere a FUNABEM. Por outro lado, o Ministro poder-nos-ia dar dados sobre saúde, também, a assistência ao menor, enfim, de um modo mais global, apenas para reflexão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O Ministro vai ficar constrangido aqui. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Por quê? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quando começamos a ver que eles não assistem, por mais que peçamos. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Podia ser também uma divisão entre FUNABEM e LBA; que também tem um trabalho com o menor e com o idoso. Poderíamos dividir, numa mesma reunião. São obras de um mesmo Ministério. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Lembraria a necessidade de ouvirmos alguma entidade que se preocupe com o problema específico do idoso. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – sugiro o MEC também, sobre a educação. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Outro tema que talvez seja importante, a respeito da questão do planejamento familiar questão que esta Comissão deverá apreciar. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Isso se insere nos assuntos de nossa Comissão? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Acredito que sim, porque se trata de família. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Por exemplo, a posição da entidade dos pediatras e com respeito ao aborto seria importante ouvirmos a posição desse pessoal. Os colegas vão-nos ajudar no cadastramento. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, uma sugestão também. Provavelmente hoje já tenhamos a escolha do Presidente e do Relator da Comissão de Sistematização. Valeria um esforço de todos os Presidentes e Relatores de Subcomissões junto à Comissão de Sistematização, porque dela fazem parte, no sentido de delimitar um pouco, de antemão, o campo de atuação de cada Subcomissão. Por exemplo, entendo que cabe a esta Subcomissão tratar do problema do planejamento familiar, mas já tenho dúvidas a respeito do problema do aborto, porque há outra Subcomissão que trata de Direitos etc., que talvez também tenha preocupações neste sentido. Então, é importante que nesse Colegiado, que é a Comissão de Sistematização, esses temas que se apresentam em superposição sejam definidos, e se estabeleça qual a Subcomissão que tem competência para tratar de cada um. Facilitaria, inclusive, a posteriori, o trabalho da Comissão de Sistematização, porque é muito mais conveniente delimitar, de antemão, o campo de atuação de cada Subcomissão, do que depois, na hora de anteprojetos submetidos à discussão, se ter aquele trabalho atualmente desagradável de se dizer não, isso aqui não competia à Subcomissão de Família, do Menor e do Idoso. Isso depois de trazermos entidades aqui, depois de debater e utilizar o nosso tempo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Embora não possamos cercear o direito de qualquer colega abordar, até com profundidade, temas dessa natureza. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, sugiro também a presença do Conselho Nacional da Mulher, já para discutir os Direitos da Mulher dentro da legislação. Esta Subcomissão é o fórum apropriado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Comunico aos colegas que minha presença está sendo solicitada para votação. Teremos que votar agora em plenário. Já podemos encerrar a reunião. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Proponho que sim. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A convocação para a próxima segunda-feira fica na dependência das informações que colhermos hoje com respeito à sessão plenária. Então, informaremos por telegramas a cada Membro desta Subcomissão. Está encerrada a reunião. (Encerra-se a reunião às 11 horas e 50 minutos.) 14 Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso ATA DA 3ª REUNIÃO, ORDINÁRIA Aos treze dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez horas e dezessete minutos, na Sala 15 (quinze) do Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar e com a presença dos Senhores Constituintes: Eraldo Tinoco, Eliel Rodrigues, Rita Camata, João de Deus Antunes, Roberto Augusto, Iberê Ferreira, Eunice Michiles, Nivaldo Machado e Paulo Marques. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos, determinando que fosse lida a Ata da reunião anterior que, foi, posteriormente, considerada aprovada. A seguir, o Senhor Presidente comunicou aos Senhores Constituintes que as entidades não serão convidadas, mas sim informadas a respeito do prazo que a Subcomissão dispõe para ouvi-las; e sobre este tema usaram da palavra os Senhores Constituintes: Rita Camata, João de Deus Antunes, Eraldo Tinoco, Eunice Michiles, Eliel Rodrigues, Paulo Marques, Iberê Ferreira e Roberto Augusto. Prosseguindo, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Senhor Constituinte Eraldo Tinoco, relator da matéria, que sugeriu à Subcomissão o seguinte calendário das reuniões para audiência de entidades representativas de segmentos da sociedade: dia 21/4 – Natureza da sociedade conjugal; dias 22 e 23/4 – Planejamento familiar; dia 27/4 – Influência da comunicação na vida familiar; dia 28/4 – Dissolução da sociedade conjugal; dia 29/4 – Proteção à gestante, à mãe e à família; dias 30/4, 4 e 5/5 – Direitos e Deveres do menor; dia 6/5 – Sistema de adoção; e dia 8/5 – Proteção ao idoso. Colocado em votação, o calendário foi considerado aprovado por unanimidade. Foi posta, também, em votação que cada entidade tenha um tempo de ate trinta minutos para a respectiva exposição e mais trinta minutos para debates, sendo aprovada a sugestão. Manifestaram-se os seguintes Constituintes: Nelson Aguiar, Eraldo Tinoco, Rita Camata, Eliel Rodrigues, Eunice Michiles, lberê Ferreira, Roberto Augusto e Paulo Marques. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente deu por encerrados os trabalhos, às doze horas, cujo teor será publicado, na íntegra, no "Diário da Assembléia Nacional Constituinte", convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia vinte e um de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: depoimentos e debate com entidades representativas do segmento social, sobre a natureza da sociedade conjugal. E, para constar, eu, Antônio Carlos Pereira Fonseca, secretário, lavrei a presente Ata, que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. 15 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ANEXO À ATA DA 3ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 13 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:15 HORAS, ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Havendo número legal, declaro aberta à reunião. O Sr. 1º Secretario procederá à leitura da Ata da reunião anterior. (É lida e aprovada a ata da reunião anterior) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Srs. Constituintes, há uma observação que precisamos fazer, já que fomos orientados no sentido de que não podemos convocar nem convidar as comunidades para estarem aqui presentes. Podemos dar conhecimento de que o espaço e o prazo estão abertos, que haja essa disponibilidade, para que essas entidades tomem a iniciativa de fazê-lo. Porque a orientação que recebemos é de que, na medida em que convidamos uma, estamos discriminando as outras. É preciso deixar essa questão em aberto, para que tomem elas a iniciativa de fazê-lo. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Creio que o fato da discriminação não fica anulado, porque, geralmente, quem vai tomar essa iniciativa são aquelas entidades que já têm maior conhecimento, já têm maior participação na sociedade. Então acho que assim mesmo continua a discriminação. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Comuniquei-me com a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, com a Associação Brasileira de Juízes de Menores, avisando que vamos ter esse tempo, esse prazo, esse espaço disponível e que previamente eles seriam avisados, quando nós começaremos esses debates. Pelo menos essas duas entidades manifestaram o desejo de estarem aqui presentes. A CNBB não estava presente – o seu Presidente, não estava presente – mas a irmã que atendeu declarou que ele não vai faltar nessa ocasião, para colocar suas posições. Sugiro, nesta manhã, que nós passemos a discutir dois pontos: primeiro, o espaço que vamos assegurar aos Srs. Constituintes, para que eles possam colocar as suas próprias posições. Acho importante nós ouvirmos todos e recebermos as propostas que cada um tenha a apresentar. Segundo, estabelecermos aqui o calendário, quando passaremos a ouvir essas entidades. O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Nobre Presidente, permite V. Exª? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Pois não. O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Estou com um compromisso, em razão de a polícia do Rio Grande do Sul estar entrando em greve e fui chamado para ver se conseguimos resolver a situação, uma vez que sou delegado de polícia. Gostaria de pedir licença a V. Ex.ª a fim de que às 10 horas e 45 minutos eu possa me retirar. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – À vontade, Sr. Delegado. Com a palavra o nobre Constituinte Eraldo Tinoco, nosso Relator. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, dado à forma como esta Subcomissão tem-se comportado, o interesse claro demonstrado por todos os Srs. integrantes, quero sugerir que a Presidência defina os temas gerais de interesse da Subcomissão e naturalmente, definir a Presidência ou ouvir do Plenário – e nós fixemos uma ou duas reuniões, de acordo com a extensão do tema, para que cada membro da Comissão possa usar da palavra, trazendo as suas opiniões, as suas sugestões e as suas propostas sobre o tema. Posso sugerir alguns desses temas: a questão do planejamento familiar, a questão da forma de constituição da família, o problema da dissolução da família, o problema da capacidade civil do menor, o amparo ao idoso, enfim, esses e outros temas que possam ser definidos pela Comissão, e cada participante, naturalmente dentro da sua experiência, dentro do seu conhecimento e dentro daqueles estudos que cada um naturalmente fará, possa apresentar as suas opiniões e as suas sugestões a respeito desse problema. Acredito que isso seja de grande utilidade para irmos compondo um pensamento conjunto da Subcomissão, para que, no momento aprazado, no momento da discussão do parecer, essas idéias já possam estar contidas no parecer e, ao mesmo tempo, já possamos ter facilitado esse trabalho. Concomitantemente a isso, desde quando tudo indica que teremos possibilidade de duas reuniões diárias, desde quando a reunião dos Presidentes e Relatores ocorrida na última quinta-feira fez com que fosse aprovada uma sugestão, para que as reuniões plenárias da Constituinte, neste período, fossem encerradas às 17 horas, para que, a partir deste instante, das 17 horas, as Subcomissões e Comissões pudessem marcar reuniões. Então, dentro dessa ótica poderíamos concentrar algumas reuniões nesse trabalho e outras reuniões, então, para ouvirmos as entidades que aqui compareçam. A respeito desse tema, não obstante essa recomendação de deixarmos a iniciativa por conta das próprias entidades, acho que a Comissão poderia induzir algumas dessas entidades, entrando em contato informal, dizendo que esse espaço estará aberto, sugerindo até que essas autoridades ou essas entidades possam ser trazidas à Co- missão, porque me parece que, não obstante o aspecto democrático de não discriminarmos, não limitarmos a possibilidade de participação de quem quer que seja, parece-me que é de bom-senso que a Comissão ouça aquelas entidades ou autoridades mais categorizadas nesses diversos assuntos, pessoas com uma larga experiência que poderão, efetivamente, acrescentar opiniões, sugestões. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Acho que deveríamos realmente comunicar e pedir que elas se inscrevessem, para que nós pudéssemos disciplinar o tempo a elas designado. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Perfeitamente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Elaboramos, inclusive, um ofício, nós já pedimos, nossa secretária está providenciando e vai trazer aqui para examinarmos, dirigido a essas entidades, pedindo que elas se manifestem com a devida antecedência, a fim de que nós possamos organizar um calendário de presença. Por exemplo, as entidades evangélicas poderiam estar ao mesmo tempo, na mesma época. Não é verdade? A LBA e FUNABEM, por exemplo, se ambas quiserem se manifestar, devem vir juntas. Trata-se de duas entidades do Governo, trabalhando na área social da criança. De modo que estamos tomando essa providência e atentos para este fato. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Somente para concluir esta participação, devo informar à Subcomissão que, a respeito do tema calendário, que nós discutimos exaustivamente na última reunião, de bom grado, informo que o prazo da Subcomissão, de acordo com interpretação de todas as Comissões e Subcomissões, inclusive deste documento distribuído pela Mesa da Assembléia Nacional Constituinte, o nosso prazo começou a ser contado no dia 9 de abril e não no dia 1º conforme a interpretação inicial. Isto faz com que o parecer deva ser apresentado no dia 11 de maio, essa informação foi distribuída na reunião dos Relatores e Presidentes, já passei uma cópia à Secretaria da Mesa, para distribuir a todos os participantes. Teríamos dois dias para publicação dos avulsos, indo até o dia 14 de maio, onde começaria a ser contado o prazo para discussão e apresentação de emendas, prazo este que vai até o dia 19 de maio. O Relator teria 72 horas para rever o seu parecer com a apresentação no dia 22 de maio e a Subcomissão teria até o dia 25 para a discussão final e aprovação da matéria a ser encaminhada à Comissão. Então, nós teríamos os nossos trabalho, portanto, até o dia 25 de maio. Acredito que esta interpretação, não obstante ponderações e até projeto que ainda estão tramitando e sendo examinados, no sentido de dilatação de alguns desses prazos, especialmente com relação ao problema do tempo para apresentação de emendas e o tempo destinado à votação final. Mas acredito que, do ponto de vista mais específico da nossa Subcomissão, se os trabalhos decorreram da forma que estamos antevendo, ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) acho que teremos um espaço bastante razoável para conclusão dos nossos trabalhos. Há um interesse geral, interesse muito acentuado no sentido de concluirmos os trabalhos nos prazos previstos, para que o resultado final desse grande esforço nacional possa ser alcançado até o final do ano, para que tenhamos a possibilidade de uma nova Constituição, ainda no ano de 1987. Acredito que nossa parcela deverá ser oferecida neste sentido, concluindo nossos trabalhos nesse calendário previsto. Naquela interpretação inicial, nós começaríamos a discussão no dia 1º de maio, agora esse período foi dilatado para o dia 14 de maio. Está sendo entendido que esse prazo poderá ir até dois antes da apresentação do parecer. Quer dizer, o Relator poderá receber sugestões até dois dias antes. Há um outro documento que está sendo distribuído pela Mesa, uma espécie de disciplinamento do funcionamento das Comissões e das Subcomissões. Acredito que esse trabalho ainda não foi encaminhado a esta Subcomissão, porque deverá ser apreciado primeiro na Comissão Temática para ser aprovado. Mas essa sugestão que naturalmente pode ser modificada tem uma previsão de que qualquer membro da Comissão ou Subcomissão poderá a ela apresentar sugestão por escrito até 3 dias e não 2, antes da apresentação do parecer pelo Relator. Então, nesse caso, como o Relator deveria apresentar o parecer do dia 11, nós teríamos, portanto, até o dia 8 de maio, para apresentação de sugestões aqui na Subcomissão. O prazo geral de o Constituinte apresentar suas sugestões em plenário previsto para o dia 23 foi também adiado. Não tenho condições aqui de informar exatamente à data que foi fixada, diante dessa nova interpretação dos prazos, mas, com certeza, o Sr. Presidente declarou na reunião, acolhendo uma sugestão que este prazo deveria ser, pelo menos, o mesmo que as entidades terão para apresentar as suas sugestões. Caso contrário, o Constituinte estaria numa situação inferiorizada em relação às entidades que, no caso, poderão apresentar as suas sugestões até a data de 8 de maio. Acredito que seja este, também, o prazo para apresentação de sugestões, em plenário. Todavia, esta informação carece de uma confirmação. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Uma informação técnica: quando o Sr. Constituinte usar o microfone, aperte o botãozinho ao lado e também decline o nome, para que possa constar da ata. Nosso operador está com dificuldade. Dadas estas explicações pelo nosso Relator, nós gostaríamos de discutir os temas e eu faria uma sugestão. O Constituinte Amaral Netto, defendendo, por exemplo, a pena de morte, apresentou um trabalho escrito. Acho que isso facilitaria um pouco o trabalho do Relator, se nós nas posições de conflitos, resolvêssemos defender, aqui fizéssemos um trabalho escrito. Apenas uma sugestão. Nós poderíamos, no momento em que nos coubesse para fazermos nossa exposição, nós teríamos esse material à mão, à nossa disposição. E depois, esse material, passando para a mão do Relator, facilitaria o seu trabalho, penso eu. Por exemplo, temos a natureza da sociedade conjugal, temos várias propostas que propõem que a sociedade conjugal amplie o seu conceito. Não apenas sociedade de direito, como consta do art. 175 da atual Constituição. A atual Constituição declara: "A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos poderes públicos." Temos propostas aí, por exemplo, do documento das mulheres, carta das mulheres, em que se amplia o conceito de família para sociedade de fato. A família é constituída de fato e de direito. É um assunto que vai suscitar muitos debates – temos certeza disto. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Sr. Presidente, peço a palavra, pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Tem a palavra o nobre Constituinte Eliel Rodrigues. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – É o que estou sentindo com relação aos temas. Realmente podemos estabelecê-los. Mas eu queria saber se seria possível, no decorrer dos trabalhos – nós termos um roteiro para discutirmos. Veio-me, agora, a idéia – quando V. Ex.ª falou a respeito da família, no art 175 da atual Constituição – se não poderíamos seguir esse roteiro, fazendo um cotejo entre a atual Constituição e aquela que a Comissão Afonso Arinos estabeleceu em outras Constituições do passado, para que pudéssemos aprimorar a redação, com o enriquecimento de novos artigos ou parágrafos e, com isto, nós teríamos um trabalho mais de cotejo. Não sei se isto seria viável, já que nós, pelo menos eu, sentimos certa dificuldade, cada um de nós temos um tema específico, no momento em que ele possa entrar, quando todos poderíamos participar daquele mesmo roteiro, enriquecendo certos detalhes. É um pensamento que apresento à Mesa. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A adoção de um texto tem vantagens e desvantagens. Acho que não poderíamos limitar. Se nós adotássemos, aqui, um texto básico para todos, eu estaria cerceando o direito de busca de outras informações aos Srs. Constituintes. Acho que isto deve ficar facultado a cada um que queira fazer. Por exemplo, se V. Ex.ª quer adotar um texto para defender as suas posições pessoais, fazer a sua própria investigação, apresentar as suas próprias propostas, acho que V. Ex.ª pode fazê-lo. Tenho, por exemplo, lá no meu Gabinete, 36 Constituintes de diferentes países, em que nós temos investigado essa questão. Eu tenho me valido destas Constituições, para os estudos que estou fazendo. Mas penso que a adoção de um texto aqui, nós estaríamos presos a uma orientação, porque não sei qual seria a opinião dos Srs. Constituintes a esse respeito. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Sr. Presidente, nós temos o seguinte princípio: para termos uma diretriz de trabalho que facilitasse a visão global do assunto, porque posso me ater a um parágrafo, a um artigo para um determinado assunto que pode me interessar e que não existe na atual Constituição. Mas, para não perdermos de vista o global, porque aquilo pode faltar depois no nosso estudo ou no do Relator, se seria viável esse modo de conduta, quer dizer, não que aprovássemos, – ipsis litteris , mas, pelo menos, fazermos um cotejo entre 16 as diferentes Constituições – qual seria a melhor, na conjuntura atual das nossas necessidades, enriquecendo com temas novos, com novos artigos. Era com relação a isto que desejava me expressar – não sei se me fiz entender – o que queria sentir era uma seqüência do trabalho para aprovação ou não aprovação, mas um roteiro ao longo disso. Por exemplo, se fôssemos tratar de planejamento familiar – nós iríamos ver o que existe e o que não existe, como enriquecer isto, forma da constituição da família, o que existe e o que não existe. É apenas um roteiro como diretriz para o trabalho do nosso próprio Relator. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com a palavra o nobre Constituinte Paulo Marques. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Sr. Presidente, gostaria de, apenas para um esclarecimento, dizer que nós fomos convocados a vir, hoje, à reunião desta Comissão, na qualidade de Suplente, tanto eu quanto o Sr. Senador Nivaldo Machado, que também é de Pernambuco. Gostaríamos de saber qual é o nível de participação que os Suplentes têm, mesmo se presente estiverem os Titulares desta Comissão, porque eu gostaria de levantar esta questão, dada o interesse que tenho de debater, por exemplo, se já será possível, hoje, a questão da responsabilidade penal do menor diante do Código de Processo Penal do Brasil e outros temas que derivam daí. Mas, gostaria de saber de V. Ex.ª qual é o nível de participação, já que nós somos titulares de outra Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Pelo Regimento, estando presente o número regimental de Titulares, os Suplentes só teriam direito à palavra para discutir, mas não teriam direito a votar. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Perfeito, mas, para esclarecer este aspecto e o outro, porque, se somos Suplentes – não sei se ainda por uma questão de tempo, já que nós estamos numa fase de organização – os nossos nomes não estão relacionados aí – nem o meu nem o do nobre Constituinte Nivaldo Machado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Naturalmente porque não recebemos, ainda, a comunicação da Liderança do seu Partido. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Ambos somos do PFL. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Perfeito. Mas, não recebemos, ainda da Liderança comunicação a este respeito. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Então, somente para ratificar: Suplente teria que nível de participação na Subcomissão? Teria direito à palavra e não a voto? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estando presente o número regimental de titulares, o Suplente apenas tem direito à palavra. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – No exercício da titularidade, ele tem todos os poderes. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Exatamente. Como agora, V. Ex.ª tem todos os poderes, 17 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) uma vez o seu nome constando da relação de suplentes desta Subcomissão, V. Exª passaria, nesta hipótese, ao exercício pleno das atividades de Titular. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós relacionamos alguns temas aqui que acho que irão merecer de todos nós uma atenção maior – a natureza da sociedade conjugal, nós falávamos há pouco; a dissolução da sociedade conjugal – o Sr. Senador Nelson Carneiro, que é Suplente desta Comissão, assegurou-me que ele quer estar presente e que S. Exª tem muito interesse para discutir essa questão. A questão do planejamento familiar, da igualdade de direitos e qualificação das crianças nascidas ou não da relação do casamento; o exercício ao pátrio poder; a idade civil e penal do menor; a idade do trabalho do menor; a aposentadoria do idoso – do trabalhador da roça, do trabalhador da cidade. Acho que todos esses assuntos vão demandar uma investigação aprofundada desta Subcomissão. Num trabalho que elaboramos, fizemos uma proposta da instituição de uma tutela especial com o objetivo de colocar na Constituição uma expectativa de direito para o chamado menor abandonado. Como nós sabemos, no Direito brasileiro, a criança dispõe de direitos em função do direito da sua família – o menor está incorporado ao direito da sua família. De modo que a criança abandonada, fora da tutela da família, ela está sem nenhum direito. O próprio Alírio Cavalieri escreveu uma obra muito importante – O Direito do Menor em Perguntas e Respostas – ele coloca como fato gerador do direito do menor, estar o menor em situação irregular. A partir daquele momento em que a criança é entregue ao Juizado de Menores, ali começa o seu direito. Por quê? Porque o seu caso passou a ser objeto de exame específico do Juiz que estiver tratando do caso. Antes que esta situação seja provocada, ele está por ai, perambulando, na condição de alguém sujeito a perversões de direito. Acho que temos de pensar fundo esta que tão, garantir no futuro texto constitucional o que não há nesta Constituição e em nenhuma das Constituições que este País já teve, o princípio do direito da criança, independentemente do direito da sua família. A partir do advento da Declaração Universal do Direito da Criança, quase todas as nações tiveram o cuidado de inserir no texto das suas constituições uma expectativa de direito da criança, independentemente do direito da família. Mas o legislador brasileiro não teve esse cuidado. Continua a criança com direitos em função do direito da sua família. Hoje, se nós encontrarmos uma criança, aqui na porta do Congresso, a primeira coisa que nós temos que perguntar é se nós podemos lançar mão daquela criança – vai criar uma responsabilidade para nós – e, segundo, o que fazemos com essa criança? Considerando que à luz do Código de Menores, toda criança, em situação irregular, está sob a jurisdição do juiz de Menores, nossa obrigação primeira é conduzir aquela criança à presença do Juiz de Menores. Mas é preciso que nós nos lembremos que, à luz do Código de Menores, quem tem direito lá é o Juiz e não o menor. O próprio Código de Menores não define, em nenhuns dos seus artigos, quais direitos à criança têm. Define apenas a forma, modos, como o juiz vai trabalhar com aquela criança. Ele é que estende a soberania da sua vontade, do seu saber, sobre a situação daquele menor para decidir sobre o seu caso. O Código de Menores não define os direitos do menor, para que, em função daquele direito definido, o juiz vá trabalhar. Por que isto? Porque não dispomos de nenhum diploma legal, neste País, que diga que esta criança é sujeito de direito, independentemente do direito da sua família, quer dizer, uma vez ao abandono. Acho que este é um momento muito oportuno. A sociedade está preocupada com essa questão. Temos recebido documentos de variadas procedências, numa demonstração de que o Brasil inteiro está hoje preocupado com a situação do menor abandonado. E por que está preocupado? Porque o menor está colocando a sociedade contra a parede. Se examinarmos a história do abandono da criança, nós encontramos uma data: 1693, quando Antônio de Sândi, no Rio de Janeiro, encontrou 20 crianças abandonadas e oficiou ao rei de Portugal a existência dessas crianças. O rei de Portugal determinou que a Câmara de Vereadores assumisse a situação desses menores. A Câmara de Vereadores, alegando que não dispunha de recursos, mandou esses menores para a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Desde aquela época, até agora, essa é a sorte do chamado menor abandonado. Ele passa a ser objeto da caridade pública, da ação dos corações abnegados. Temos aí muitos projetos que estão dando certo, mas estão dando certo muito mais em função daqueles que estão trabalhando com o projeto do que de um direito assegurado na lei que obrigue a autoridade governamental, o prefeito, o governador do Estado, a agir no sentido de atender esse menor. Vejam bem que temos uma oportunidade agora muito importante, muito grande, para trabalhar essa questão com seriedade. Deixo a palavra franqueada a quem queira comentar o assunto e como vamos estabelecer essa sistemática, a fim de que aos Srs. Constituintes sejam assegurados tempo para apresentar suas propostas. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, por uma questão de ordenação dos nossos trabalhos, em primeiro lugar, acho que deveríamos selecionar os temas a serem debatidos. Já ouvimos algumas sugestões, mas é possível que essas sugestões enumeradas não sejam ainda completas para abranger todos os aspectos atinentes a esta Subcomissão. Então, em primeiro lugar, acho que seria conveniente cada membro da Subcomissão mencionar esses temas e nós organizarmos uma listagem dos temas a serem debatidos. Em segundo plano, definiríamos as datas e os horários que esses assuntos viessem a ser discutidos, ainda a discussão a nível da Subcomissão, para que cada um se preparasse, para que cada um reunisse o material disponível, sugestões, como muito bem foi colocado pelo nosso companheiro, no sentido até da Subcomissão oferecer subsídios a esse estudo, com algum material disponível, etc. Fixadas essas datas, cada um já traria especificamente naquele dia ao debate as suas opiniões a respeito daquele tema espe- cificado, isso sem prejuízo da segunda parte dos trabalhos que seria de ouvirmos autoridades e entidades a respeito desse tema. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, peço a palavra. (Assentimento da Presidência.) Apenas uma sugestão. Acho que poderíamos, para ordenar ainda mais, fazer o nosso cronograma, agora; dia tal vai ser isso, etc, até porque há alguns componentes da Subcomissão que poderão ter alguns problemas, uma viagem. E, na medida em que se tem o cronograma, o Constituinte já sabe dos seus compromissos. Faríamos primeiro o cronograma. Em seguida, faríamos a seleção dos temas e estabeleceríamos as datas. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Mas esse cronograma já não seria em cima desses temas? O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Acho o contrário: primeiro, o cronograma, os dias que vamos discutir, o dia que as entidades virão, depois colocaremos. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, peço a palavra. (Assentimento da Presidência.) Isso que estamos conversando vem ao encontro daquilo que propus aqui, na última reunião. Hoje é segunda. A Subcomissão tem 19 componentes e, pelo que vejo, nunca vamos ter aqui os dezenove. Mas, felizmente, estou verificando a assiduidade e um bom grupo. Vou fazer o trabalho que propus na última reunião. Gostaria que aqueles que estão participando fizessem um trabalho sobre o planejamento familiar, a formação da família, a dissolução da família, a capacidade do menor, o idoso, fizessem um trabalho sobre esses temas principais e trouxéssemos aqui, porque há divergências sobre o divórcio, sobre pena de morte e que trouxéssemos esse trabalho já pronto, cada um de nós, como foi colocado pelo Relator, nesta manhã e marcássemos, na volta, o debate logo nas primeiras reuniões, antes de ouvirmos, por exemplo, entidades civis. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Isso vai facilitar muito. O dia 21, por exemplo, vai ser de debate interno da Subcomissão. Aí, vamos para a segunda fase. Nesse dia 21 vai ser debatido a natureza da família, etc. Escolheríamos o expositor e todos nós poderíamos nos preparar para discutir, para debater o assunto. Cada expositor escolheria o assunto que melhor lhe interessasse. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Eu gostaria de dar uma sugestão. Poderíamos marcar esse tema principal depois de ouvirmos a sociedade civil. Por exemplo, a questão de planejamento familiar poderia ser discutida logo após termos ouvido aqui a entidade que pudesse nos trazer esclarecimentos, subsídios; porque se discutimos antes e ouvimos uma entidade depois, talvez tenhamos que reformular o nosso pensamento. Então, deveríamos ouvir primeiro, para depois fazermos a nossa reunião interna, já abastecida por essas informações; a CNBB, na questão de divórcio, por exemplo, porque em função daquilo que eles irão expor talvez formulemos o nosso pensamento definitivo. O SR RELATOR (Eraldo Tinoco): – Estive fazendo um apanhado e teremos, em princípio, sem ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) falar em reuniões extraordinárias, os seguintes dias de reuniões: 14/4, 21/4, 22/4, 23/4, 27/4, 28/4, 29/4, 30/4, 4/5, 5/5, 6/5, 7/5, e 11/5 a apresentação do parecer. Portanto, teríamos 12 dias úteis, sem contarmos eventuais reuniões extraordinárias aos sábados e domingos. Às sextas-feiras, não temos reunião, pelo menos na parte da manhã, porque é reunião plenária Não estou contando aqui as sextas-feiras, quando, eventualmente, poderemos ter reuniões à tarde. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Quarta, dia 15, V. Ex.ª não está contando? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Quarta, dia 15, eu não estou contando. São os dias 14, 21, 23, 27, 28, 29 e 30 de abril; 4, 5, 6 e 7 de maio. Dia 11 é a apresentação do relatório com o anteprojeto. Então, acho que poderemos programar dentro desse roteiro, de acordo com a sugestão da ilustre Constituinte Eunice Michiles, esses temas que deveremos debater. Acho que aqui, até por uma questão lógica, nós deveríamos distribuir esses temas dentro de uma seqüência, de acordo com o desenrolar, porque alguns desses temas têm recuperação no outro. Por exemplo, se nós falamos no planejamento familiar, isso vai ter resultado sobre a questão da proteção ao menor. Então acho que nos restaria, agora, encaixar, dentro desses dias, os diversos temas que deveríamos tratar. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Sr. Relator, V. Ex.ª me permite? Ainda a propósito da colocação que fez a eminente Constituinte Eunice Michiles, é claro que essas colocações que serão feitas aqui pelas diversas entidades especializadas, no debate, na questão do menor e do idoso, nos interessam muito, porque vão nos subsidiar a cada vez que aqui tivermos a oportunidade de participar de algum debate, de alguma reunião. Agora, o que me preocupa, é a questão do calendário, porque sabemos, por exemplo, que são várias subcomissões e são vários os interesses de diversas entidades. Por falta de tempo, por escassez de tempo, aqui nós talvez tenhamos dificuldade em, por exemplo, convocar, vamos supor, a CNBB para vir no próximo dia 14 ao plenário da Subcomissão do Menor e do Idoso. Muito bem! Admitamos que ela já tenha um compromisso com a Subcomissão de Comunicação e Informática e não possa vir naquele dia. Nós não poderíamos desde já, uma vez que estamos aqui elaborando esta programação, fazer uma reserva, quer dizer, uma entidade que já estivesse engatilhada para ser convocada para aquele dia, a fim de que possamos ter também a certeza de que se não vier uma, virá à outra. O tempo urge e nós estamos brigando aqui, exatamente, contra esse calendário. Nós estamos programando uma série de debates, mas sabemos que as eventualidades existem e que cada entidade dessa tem interesse em participar dos debates não só nesta Subcomissão, mas em várias outras, onde estão, também, interesses seus. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Muito bem! Acho que o trabalho é de certo modo penoso nesta fase, quando estamos buscando caminhos. Lamento que não tenhamos aqui um quadro de giz, porque a minha deformação profissional de professor... Já olhei aqui umas quatro vezes para ver se tinha um quadro para escrever. Mas eu listei aqui alguns temas e acho que nós poderíamos talvez insistir um pouco em definir esses temas. Em segundo lugar, a distribuição desses temas de acordo com o calendário. Então, vejam, por exemplo, enumerei aqui nove temas que interessariam à Comissão. Então vêm: 1) natureza da sociedade conjugal; 2) planejamento familiar; 3) dissolução da sociedade conjugal; 4) proteção à gestante, à mãe e à família; 5) proteção e assistência ao menor; e 6) sistema de adoção; 7) exercício do pátrio poder; 8) responsabilidade penal do menor; 9) Proteção ao idoso. São meras sugestões para debate. Não sei se esses nove temas completariam toda a gama de preocupações da Subcomissão. Eles estão colocados aí dentro de uma certa lógica. Acho que na discussão desse tema o primeiro aspecto é a natureza conjugal, depois, como essa sociedade conjugal se comporta diante do problema da família, do tamanho da família, da composição da família, o planejamento familiar. Depois, na hipótese da dissolução da sociedade conjugal, um ponto que acho muito importante, porque vai refletir em todo o desdobramento da sociedade, que é a proteção à gestante, à mãe, na fase inicial do nascimento do filho, e à família como ente, para que a criança tenha um ambiente adequado. O problema de quando a família não completa esse processo e de que forma a sociedade deve proteger e assistir ao menor. O problema da adoção, acho que é uma questão importante dentro dessa questão. O exercício do pátrio poder, até como um desdobramento da ação familiar, a responsabilidade penal e civil do menor e, finalmente, o problema da proteção ao idoso. Isso é um mero roteiro e gostaria muito que pudesse ser completado, porque isso é um exercício para efeito de discussão. Só para completar: dentro dessa preocupação, nós teríamos, por exemplo, no dia 21 de abril, já fixaríamos, aqui, a discussão do tema número um. Mas, aí, dentro da sugestão da Constituinte Eunice Michiles, nós poderíamos, primeiro, ter a presença de entidades da sociedade civil, digamos, no período da manhã. E, no período do fim da tarde, a partir das 17 horas, já que está sendo previsto esse horário para as reuniões da Subcomissão, nós voltaríamos aqui para a discussão do tema por parte dos integrantes da Subcomissão. Depois de definidos, nós encaixaríamos os temas. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Vamos definir os dias para eles virem cá? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sim. Acho que seria 21, 22 e 23, aquelas datas que mencionei anteriormente. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Mas, aí, insisto naquela questão. E quando nós convidarmos a entidade e ela não puder vir? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Nós vamos estabelecer entendimentos prévios com essa enti- 18 dade, para saber o dia que ela vai poder estar aqui. Se houver alguma inconveniência, nós remanejaremos esse calendário. Digamos que uma entidade ou uma autoridade – e faço questão dessa distinção porque, às vezes, não encontramos uma entidade interessada ou disponível, mas temos uma alta autoridade, uma pessoa especializada no assunto. Só a título de exemplo: na questão do planejamento familiar, nós temos uma figura, hoje, que é nacionalmente conhecida por suas preocupações com esse tema, que é o Professor Elsimar Coutinho. Então, podemos não ter uma entidade que cuide desse assunto, mas temos pessoas que estudam, que se debruçam sobre o assunto e isso interessa à Subcomissão... O SR. CONSTITUINTE IRERÊ FERREIRA: – Mesmo porque nós poderemos ouvir mais de uma entidade por dia. Se uma não vem, outra pode ocupar esse espaço. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Sim, essa foi à sugestão que fiz, porque, senão corremos o risco de, por exemplo, V. Ex.ª se deslocar do seu Estado de origem e chegar aqui e não ter a entidade para a qual veio preparado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas, aí, a Pr esidência entraria em contato anteriormente com essas pessoas, para já definirmos esse calendário de atuação dentro do possível. Havendo alguma modificação, então, a Subcomissão seria notificada previamente para haver um remanejamento. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Gostaria de fazer duas colocações. Primeiro, qualquer Constituinte aqui poderá sugerir nomes de pessoas ou entidades para virem professar, também, seus pontos de vista na Subcomissão. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Exatamente. E, dentro da sistemática que o Presidente se referiu no inicio, nós não devemos fazer convites, mas esperarmos que as entidades ou pessoas busquem a Subcomissão. Mas nós podemos induzi-las. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Acho que deveria ser o contrário, se me permitem a franqueza, porque se nós formos esperar que tomem a iniciativa de vir, até para instrumentalizar essa comunicação fica difícil. Gostaria, Sr. Presidente, de colocar uma questão, se V. Ex.ª me permite: que cada Integrante dessa Subcomissão pudesse, se não agora, mas na próxima reunião, já sugerir nomes de entidades ou pessoas a que pudesse a Subcomissão se dirigir para efetuar o convite, porque tenho impressão de que, em face da grande turbulência em que vive a Assembléia Nacional Constituinte – e isso aqui é enorme, há um País enorme, onde há pessoas expressivas em vários pontos deste País, que poderiam vir aqui. Mas gostaria de apenas para esclarecer a profunda questão, se eu quiser convidar, por exemplo, uma pessoa da Paraíba ou do Rio Grande do Sul, de que forma nós poderíamos efetivar esse convite? A Subcomissão assumiria o transporte dessa pessoa para cá? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Esta é que é a dificuldade, procurei o Presidente Ulysses Guimarães para colocar essas preocupações e ele declarou que nós não dispomos de verba. Não foram estipulados recursos para esse tipo 19 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) de custeio. Se nós convidamos, nós temos que dar o banquete, não é? Nós temos que garantir a passagem para essa pessoa, ou pessoas e garantir hospedagem. Essa é a dificuldade que temos, a não ser que algum Constituinte quisesse trazer por sua própria conta. Pretendo fazer isto com uma pessoa especializada do meu Estado, mas vou dar passagem, hospedagem, levá-la para casa, para termos oportunidade de ouvi-la aqui. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Queria apenas deixar registrado o meu protesto. Nós estamos fazendo uma Constituição, precisando ouvir as lideranças dos segmentos mais importantes do País. Quanto dinheiro, se gasta com coisas supérfluas! E, num momento como esse, Sr. Presidente, nós não temos disponibilidade para trazer uma pessoa, uma autoridade, um estudioso, sobre determinado assunto, para colaborar na feitura de uma Constituição. É lamentável. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Está registrado o seu protesto e eu o levarei ao Presidente, porque esse protesto também é meu. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, peco a palavra pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Pois não. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Além desses temas, existem outros temas que, embora não sejam diretamente da ação da nossa Subcomissão, mas que têm muito a ver. Por exemplo, eu me referiria a questão da comunicação. Nós não desconhecemos a influência que têm a televisão, os jornais, às revistas, sobre a formação da família. Quem sabe nós produziríamos um documento, uma sugestão, para mandarmos à comissão competente, sobre esse assunto que tem uma influência direta na formação moral da nossa família. Outro tema que lembraria também – tenho inclusive um trabalho, se me permitissem, depois, modestamente, trazê-lo ao conhecimento da Subcomissão, a respeito do menor abandonado, onde listamos diversas sugestões no sentido do País se mobilizar para fazer alguma coisa, eu sugeriria a convocação da mulher para um serviço civil, a exemplo do homem no serviço militar e usar essa mão-de-obra preciosa, para, quem sabe, tentar resolver o problema do menor abandonado. Agora, não é um tema da nossa Subcomissão, mas seria um tema a ser, quem sabe, estudado aqui e, depois, sugerido ou produzido como se fosse trabalho desta Subcomissão para a Subcomissão competente como sugestão de alguma coisa que diz, direta ou indiretamente, respeito a esta Subcomissão. São assuntos correlatos. Lembraria mais o seguinte: a questão das creches. Não cabe aqui nesta Subcomissão? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Cabe, sim. O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Sr. Presidente, eu dialogava aqui com o colega Iberê Ferreira, do Rio Grande do Norte, se poderíamos insistir nesta questão das entidades e pessoas que para aqui virão. Nós não podemos, simplesmente, registrar a nossa indignação e o nosso protesto pela falta de recursos desta Casa, como muito bem colocou o colega Iberê que encontra recursos e alternativas para colocar em prática programas quando quer, para mandar parlamentares ao exterior, para fazer viagens que ficam diante da opinião pública, às vezes, muito mal. Nós, aqui, não somos especialistas no assunto. Cada um de nós tem uma atividade diferente, embora sejamos sensíveis ao problema que abrange a Subcomissão do Menor e do Idoso. Então, gostaria de sugerir, não sei se os colegas que aqui estão aprovariam esta idéia, de que esta Subcomissão pudesse estudar alternativas para a necessidade gritante de ter pessoas que virão expor os seus conhecimentos, os seus pontos de vista. Já que esta Subcomissão não dispõe de recursos, de dinheiro, não dispõe de passagem, não dispõe de hospedagem, se não seria de bom alvitre tomarmos a iniciativa de firmar convênios com os Governos de Estados, por exemplo, para que, a partir do momento que tivéssemos que trazer do Rio Grande do Norte um especialista que o Constituinte Iberê Ferreira tivesse interesse de trazer para cá, se a secretaria ligada ao assunto não poderia mobilizar-se, mandando o convidado para cá, pare que o Governo do Estado – que também têm interesse que este Constituinte delibere e dê solução a certos e determinados casos a dramas que afligem a todos nós. Então, as Secretarias de Estado, dos Governos estaduais; que mobilizam recursos à vontade em torno disso, a elas poderia ser feito um convite para ser firmado um convênio para, não somente desta Subcomissão, como de outras, que no momento em que tivesse que convidar uma personalidade do meu Estado pare vir aqui, esta Subcomissão emitiria essa solicitação para que ela se incumbisse de enviá-lo pare cá, dando todos os recursos de passagens e hospedagens. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vou fazer uma sugestão. Os Srs. Constituintes apresentem as suas sugestões em termos de nomes e entidades que deverão ser ouvidas. Para amanhã, nós teremos nova reunião, a fim de que neste período – não vou passar este período de feriados em Casa, vou ficar aqui à disposição desse assunto – eu possa dispor de tempo suficiente para fazer contato com essas entidades e com aqueles que possam facilitar a vinda destas pessoas a esta Subcomissão. Fica, assim, feita a sugestão no sentido de que amanhã os Srs. Constituintes apresentem a relação de entidades ou de personalidades que possam contribuir conosco no nosso trabalho. Que não seja restrito, amanhã, Sr. Presidente, se me permite, porque, de hoje para amanhã eu acho que é um período muito curto, mas acho que se a Mesa pudesse estar disponível para os nomes que pudessem, até o final da semana ou da outra semana, serem trazidos aqui. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas eu estou preocupado com o calendário para que no próximo dia 21, nessa reunião, nós então fixemos o calendário porque nós já saberemos quais as pessoas que poderão vir, quando é que poderão estar aqui. De acordo com esta disponibilidade de tempo das pessoas nós então façamos o nosso calendário. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Os primeiros nos dias 21, 22, 23. Quer dizer os temas... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Bom, ainda a respeito deste temário eu queria fazer alguma sugestão. Onde se lê: Proteção e Assistência ao Menor, eu gostaria de colocar uma coisa mais forte, "dos direitos e obrigações ao menor ou direitos e deveres, porque aqui nós...". O SR. CONSTITUINTE PAULO MARQUES: – Poderia repetir, Sr. Presidente, por favor. Substituiria qual tema, aqui? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Os Direitos do Menor que substituiria Proteção e Assistência ao Menor. Nós colocaríamos o Direito porque aí aqui caberiam as funções do pátrio poder, aqui caberia, por exemplo, a idade penal, tudo numa temática só. A idade para o trabalho do menor, caberia a adoção etc. Eu quero lembrar a pesquisa que fizemos em outras Constituições de outros países, e que deu para observar alguns aspectos importantes. Por exemplo, a Constituição da União Soviética, que é sintética, tem apenas 164 artigos, ela é analítica, quando ela trata desse aspecto, porque ela faz referência até a subsídios às famílias numerosas; ela faz referência a subsídios aos idosos; ela fala em rede comunitária de creches e de outras formas de infra-estrutura comunitária. Eu acho que este aspecto aí é muito importante. Eu penso que nesta questão da família e da criança, nós temos oportunidade, agora, de fazer um texto sucinto, em termos de princípio e de lutarmos por ele até na derradeira instância da elaboração constitucional. Eu acho que a expectativa da sociedade é muito forte, com respeito a essa questão. Eu tenho percorrido o País todo com o Presidente do FUNABEM, fiz debates, mais ou menos, 183 debates, com universitários, com entidades etc. e a convivência que temos na área, a cada dia que passa, aumenta a nossa indignação. Eu fico indignado, revoltado. Eu acho que a Nação que abandona a sua infância perdeu o respeito a si mesma. Há um pensamento oriental que diz assim: "Mostra-me como é tratada a criança do teu País que eu julgarei o caráter do teu soberano". Se fôssemos adotar esse tipo de conceito em relação à sociedade brasileira, nós seríamos julgados de uma forma muito dura, pela situação em que se encontra a infância do nosso País e nós então dizemos: não é por falta de recursos. Têm-se aqui a 8ª economia do mundo capitalista a criança está abandonada não por falta de recursos. A Professora Eunice Michiles, Professora Constituinte, referiu-se aos assuntos correlatos. Vejamos bem, a questão da prostituição infanto-juvenil. O que está ocorrendo no Brasil hoje a respeito deste assunto é uma coisa muito grave. Eu mostrarei aqui uma pesquisa que fizemos em Belém do Pará. A FUNABEM, o Juizado de Menores e a Equipe da Primeira-Dama daquele Estado, para conhecermos a situação da prostituição infanto-juvenil, em Belém. Encontramos quase 30 mil meninas, na faixa etária de 11 a 15 anos, vivendo da prostituição comercializada. Se a coisa está acontecendo com o menor é grave, muito mais grave é com a menina pela própria natureza da sociedade brasileira. O menino vai para a rua, disputa a vida, forma quadrilhas, se defende. A menina está sendo arrastada silenciosamente pa- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ra a área da prostituição. Vamos pensa, por exemplo, na questão da literatura que informa a imobilidade que esta aí. Qualquer criança vai a uma banca de jornal compra revista que não informam, não coloca...no civismo na consciência da criança apenas satisfazem o interesse de quem comercializa aquele lixo. E quero dizer, eu não vi isso nos países que conheci. Países capitalistas, como os Estados Unidos da América isso não existe, lá eles têm leis para essas coisas. Aqui esta imoralidade é aí colocada à disposição da criança e ela se utiliza disso com toda a facilidade. A questão da exploração do trabalho da criança, principalmente na área rural, o garoto, o menor "bóia-fria", como é que ele vem sendo explorado na sua tenra idade. Estes aspectos todos têm a ver com o direito do menor, embora não possamos especificamente no trabalho desta subcomissão sobre laborar este assunto, mas nós temos como influir no trabalho de outras subcomissões. E a observação que a Constituinte Eunice Michiles fez é muito importante. Nós temos uma oportunidade de oferecer subsídios ao debate em outras comissões e temos também oportunidade em comparecer lá, para expor esses assuntos, para defender estas idéias e estas posições. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Outra coisa grave também, que até uma revista semanal traz nesta semana, é o problema do tóxico. A exploração destes menores a partir de 6, 7, 8 anos, como traficantes, como uma maneira mais fácil de vender e de passar sem que a legislação puna e tenha maior controle sobre essa ação. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem! Vamos ver como é que ficou essa temática. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – (Fora do microfone. Inaudível.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Diante dos temas, acho que está dentro de um desses itens, talvez nesse de proteção à gestante, à mãe e à família. Esse temário nós podemos, na correspondência que nós vamos manter, no contato que nós vamos manter com essas entidades nós poderemos lembrar a ela de que esse temário está sendo colocado para a discussão. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, sobre o convite às autoridades, eu pertenço a um segmento, outros aqui pertencem a outros e nós não temos aqui, como eu disse em outra oportunidade, uma entidade formada. É difícil. Por exemplo, a CNBB, a FUNABEM, a LBA e outras organizações podem ser ouvidas aqui. Porém, o segmento evangélico ao qual pertenço não tem um órgão que o represente. Então, devido às dificuldades financeiras, e pelo fato de essas entidades não terem quem as represente, sugiro que convidem duas ou três pessoas para aqui comparecerem. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Acho boa a sugestão. Havia até conversado a esse respeito com o Sr. Presidente. Penso que poderíamos, aqueles que são evangélicos, depois se reunirem para o estabelecimento de uma pauta das pessoas que devem ser convidadas. Acho que isso resolveria a questão. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Por exemplo, lá na região do Rio de Janeiro, eu conversaria com alguns colegas e convidaria uma liderança. Assim também lá no Sul, no Norte, etc. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Talvez pudéssemos, depois, nos reunir e estabelecer um consenso. Ficaria então a temática geral dividida em oito itens, com essas sugestões todas apresentadas. Agora, incluindo essa sugestão do Presidente, em que há um item mais abrangente intitulado "Dos Direitos do Menor". Então fiz aqui uma refusão desse tema. Seriam esses os temas: 1. Natureza da sociedade conjugal 2. Planejamento familiar 3. Influência dos meios de comunicação na vida familiar. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – (Inaudível. Fora do microfone.) O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Poderemos debater, e o que não couber especificamente no item, poderemos, como Comissão, submeter ou ao Relator da Comissão Temática, ou ao Plenário, se for o caso, para ser redistribuído a outra Subcomissão. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Este tema é sobre a influência dos meios de comunicação na vida familiar? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Exatamente. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – O tema nº 5 é de proteção à gestante e à criança? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não, é proteção à gestante, à mãe e à família. Há aí um problema de natureza técnica que não sei responder, por isso coloquei as duas expressões. Não sei se a gestante já é considerada mãe, ou se nesse termo só depois do nascimento do filho. Neste item 6, "Dos Direitos do Menor", entraria o problema da responsabilidade civil do menor, exercício do pátrio poder; o problema dos tóxicos, que já está de certo modo indicado nessa responsabilidade civil do menor. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – O tema nº 8 é o problema da proteção ao idoso. Naturalmente, como alguns desses temas têm mais conteúdo, são mais abrangentes, teríamos a seguinte divisão, no nosso calendário: No dia 21 de abril teríamos a discussão do tema nº 1, "Natureza da Sociedade Conjugal". A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – (Inaudível. Fora do microfone.) O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – É no primeiro item "Natureza da Sociedade Conjugal". O tema nº 2, que é um tema mais polêmico, compreenderia dois dias de debates, dias 22 e 23 de abril. É o problema do planejamento familiar. Este é um tema mais polêmico. O tema nº 3 ficaria para o dia 27 de abril. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não acha V. Ex.ª que o aborto caberia nesse tema do planejamento familiar? 20 O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – (Inaudível. Fora do microfone.) O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sim! O tema nº 4 ficaria para o dia 28 de abril. Repetindo: o tema nº 2 ficaria para os dias 22 e 23 de abril. Para o dia 27 de abril ficaria o nº 3, influência dos meios de comunicação. No dia 28 de abril ficaria o tema nº 4, "Dissolução da Sociedade Conjugal", nesse dia, naturalmente, convidaríamos o Constituinte Nelson Carneiro. No dia 29 de abril debateríamos o tema nº 5. Para o tema nº 6, como é bastante abrangente, destinaríamos três dias, 30 de abril, e 4 e 5 de maio, sobre o Direito do menor. No dia 6 de maio debateríamos o tema nº 7, Sistemas de Adoção, e finalmente, no dia 7 de maio o tema nº 8, a questão do idoso. É evidente que neste calendário há alguma folga. Por quê? Em primeiro lugar, é possível que nesses dias aprazados não consigamos esgotar o assunto e então teríamos ainda a possibilidade de reuniões extraordinárias aos sábados e domingos. Numa outra hipótese, teríamos reuniões extraordinárias no mesmo dia, de acordo com os trabalhos da Constituinte. Parece-me que esse calendário teria alguma flexibilidade para as adaptações que venham a ocorrer ou sejam necessárias. É a sugestão de sistematização de nossos trabalhos, que acho que cabe uma discussão. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Gostaria de fazer uma observação no que diz respeito à sugestão da nobre Constituinte Eunice Michiles, de ouvirmos uma sessão as entidades que seriam convidadas e na outra debatermos sobre aquele temário. Não teríamos, com esse calendário, a disponibilidade de fazermos esse trabalho, porque só temos um dia. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nobre Constituinte a sugestão que está sendo apresentada é que às 12 horas e 30 minutos, que representaria o prazo regimental para o encerramento da reunião, nós não a encerraríamos, apenas a suspenderíamos, e, a partir das 5 horas da tarde, nos reuniríamos novamente para discutirmos os temas que fossem debatidos pelas entidades. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Tudo indica, com esta sugestão que foi apresentada na reunião dos Relatores e Presidentes, que naturalmente ainda vai ser objeto de deliberação do Plenário, as reuniões plenárias, nesse período, seriam reduzidas, até porque não existe ainda matéria constitucional a ser votada. Há uma sugestão no sentido de reduzirmos as sessões plenárias nesse período, de tal forma que possam ser encerradas às 17 horas. E das 17 horas às 20 horas, as subcomissões e comissões se reuniriam novamente, me parece que ordinariamente, até porque nesta minuta que a Mesa tem distribuído às diversas comissões para o ordenamento dos trabalhos das Comissões, já existe, inclusive, esta previsão de duas sessões diárias, uma às 9 horas e 30 minutos e outra de 17 às 20 horas. Aí, daria perfeitamente para atendermos a essas sugestões. Na parte da manhã nós ouviríamos as entidades e, no fim da tarde, na sessão iniciada às 17 horas, nós teríamos, então, a possibilidade de debater. Isso facilitaria, inclusive, no caso de um assunto que a sessão da manhã não esgotasse, por exemplo, as autoridades ou as entidades convidadas. 21 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Nós poderíamos prorrogar esses depoimentos para a sessão da tarde e termos uma oportunidade, também, do debate a respeito das sugestões e das opiniões de cada Constituinte. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Outro assunto? O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – Acredito, Sr. Presidente, só por uma questão formal, que devêssemos aprovar ou não este calendário, para que a Presidência, inclusive, já começasse os contatos com relação às entidades referentes a esses temas 1 e 2. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não havendo quem queira discutir o assunto, damos o silêncio como sinal de aprovação. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Acho que nós recebemos uma convocação para uma reunião do Congresso, dia 22. Essa reunião é que vai tentar compatibilizar o horário, diminuir o horário da sessão?... O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Permita-me, prezado companheiro, esta reunião do Congresso é apenas para aprovar as modificações regimentais do Congresso Nacional. Quer dizer, como o Regimento Comum, que pauta os trabalhos do Congresso Nacional, prevê a realização de sessões diárias e essas sessões não estão se realizando, como a Câmara fez no sentido de manter as suas reuniões ordinárias apenas às segundas-feiras e o Senado também já adaptou seu Regimento, há necessidade de o Congresso também adaptar o seu Regimento a essa nova situação. Essa reunião é que está sendo convocada para o dia 22. A Constituinte nas suas sessões plenárias, naturalmente vai apreciar algum projeto de resolução, no sentido de modificar, temporariamente, o horário de funcionamento das sessões plenárias. Sr. Presidente, já que este calendário está aprovado, preliminarmente, naturalmente sujeito às modificações necessárias, quero fazer duas sugestões à Comissão com referência ao tema nº 2. Há uma entidade denominada, se não me engano, Grupo Parlamentar de Estudos da Família, ou nome similar, que tem tratado desse problema do planejamento familiar. Sugiro a convocação de quem está dirigindo esta entidade... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sediada onde? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Acredito que no próprio Congresso Nacional... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Ao GEAP? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Não sei a sigla, mas tenho recebido algum material desse grupo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O GEAP é Grupo Evangélico... O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Amanhã vamos ter um novo trabalho aqui, no mesmo horário. Amanhã é dia 14. Gostaria de saber dos Colegas se vão estar aqui, que tenho passagem marcada para hoje. Se todos vão estar presentes, transfiro a minha viagem para amanhã, para que tenhamos quorum. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós gostaríamos de contar com o apoio dos nossos colegas, a fim de que amanhã nós tenhamos a listagem das entidades e das personalidades que possam estar aqui conosco para que, no decorrer da semana, eu possa trabalhar em cima desse fato concreto, a fim de que no dia 21 tenhamos como elaborar um calendário das nossas atividades. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Gostaria de ter uma informação. Esses convites, essa conversa, partiriam da Presidência ou se nós também poderíamos fazê-lo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Ficaria mais fácil para mim, inclusive. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Porque, às vezes, sendo aprovado no plenário o convite a essa entidade, ou àquela pessoa, aquele estudioso no assunto, talvez ficaria mais fácil se nós dividíssemos essa tarefa desse convite para que todos nós participássemos, efetivamente, desse processo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A dificuldade, Deputada Rita, é com respeito ao calendário. Digamos que V. Ex.ª faça um convite para o dia 23 e ele faça um convite para o dia 23. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Não, mas a nossa preocupação seria no sentido de que esse calendário seria aprovado aqui em plenário, na sessão. Agora, o risco que nós corremos é de fazer o convite para o dia 21 e a pessoa ou a entidade não poder comparecer no dia 21, podendo comparecer no dia 22. Então, haveria o desencontro. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Tenho uma sugestão para acomodar essa situação, que é a seguinte. Cada membro da Comissão, tendo interesse de sugerir uma autoridade, ou uma entidade, traria essa sugestão ao plenário e a Comissão daria poderes ao Presidente para o contato, para a definição da data, para definir, também, a forma de locomoção e de hospedagem dessa pessoa, inclusive desse atendimento de que o Sr. Presidente terá com a Mesa da Constituinte. Por exemplo, eu acabo de sugerir a presença do Professor Elsimar Coutinho. Não sei se ele teria o patrocínio da Universidade Federal da Bahia, a quem está ligado, ou de uma outra entidade, para promover a sua vinda, a sua estada em Brasília. Mas isso o próprio Presidente no contato EUNICE com ele, ou alguém que o Presidente delegue essa competência, porque de repente é uma pessoa que tem uma aproximação maior com os O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): outros membros da Comissão que facilite esse – ...de Estudos da População. contato e até para o Presidente facilite este trabalho, mas sempre com a coordenação do O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Presidente para evitar esse choque de datas, Sugiro, também, que se convide o Professor essa superposição, etc... Então, acre dito que Elsimar Coutinho. isso facilitaria bastante o trabalho. A SRª CONSTITUINTE MICHILES: – (Inaudível.) Dentro dessa ótica, Sr. Presidente, quero apresentar uma sugestão que me parece de ordem prática, que é a seguinte. Esta Comissão deu hoje uma demonstração inequívoca de interesse, de zelo, de preocupação com as suas responsabilidades. Tivemos uma reunião marcada para a qual contávamos com a presença de companheiros que, inclusive, tinham compromissos em seus Estados, e fizeram um sacrifício e aqui estão presentes. A reunião do dia 14, amanhã, e de quarta-feira , dia 15, já que não temos, dentro deste calendário aprovado, nenhum debate específico, seria apenas para questões de ordenamento do trabalho da Comissão. Acho que essas reuniões se tornariam dispensáveis; teríamos, que ainda hoje, durante o dia, ou talvez aproveitando a presença dos companheiros, verificarmos, por exemplo, que outras entidades ou autoridades deveriam ser convidadas, para o dia 21, que é logo após a Semana Santa, para trazer depoimentos a respeito da natureza da sociedade conjugal, ou nos dias 22 e 23 a respeito do tema planejamento familiar. Isso sim, deveríamos deixar estabelecido hoje, por uma razão de ordem prática. Se queremos convidar uma pessoa de outro Estado para vir a Brasília, no dia 21, teremos uma grande dificuldade de ordem prá tica, que se chama lugar em avião. Quer dizer, sabemos que no longo final de semana muita gente sai de Brasília. No caso do Nordeste, mais especificamente Salvador, sei que não há a menor disponibilidade de lugares em avião, até o dia 21; pode ser que no dia 22 tenha, mas como teremos reunião do dia 21, para debater o assunto "Natureza da Sociedade Conjugal", se queremos convidar alguma entidade ou autoridade, teremos que tomar providências hoje, para que essa pessoa, inclusive, programe a sua vida, o seu calendário. Então acredito que com relação às reuniões dos dias 21, 22 e 23 já devêssemos deixar aqui acertado quais as entidades ou autoridades que iríamos convocar. Quanto às da semana seguinte, a começar pelo dia 27 de abril, poderíamos, na reunião do próprio dia 21, aprovar ou ouvir as sugestões, e o Presidente teria toda a semana para esses contatos e a programação dessas entidades que fossem comparecer a partir do dia 27 para a discussão do tema número três, o quatro e o cinco. Então, diante desses asp ectos de ordem prática, acho que seriam inteiramente dispensáveis as reuniões do dia 14 e 15, próximos. Os integrantes desta Subcomissão não ficariam, entretanto, dispensados de cuidar das sugestões, dos temas, do debate, aproveitando para preparar-se para os debates dos dias 21, 22 e 23. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A fim de facilitar nosso trabalho, gostaria de solicitar aos Srs. Constituintes que, ao indicarem uma entidade ou pessoa, fizessem a fineza, tanto quanto possível, de indicar o endereço e telefone, a fim de estabelecermos o contato com maior rapidez. O SR. CONSTITUINTE IBERI FERREIRA: – Sr. Presidente, vou aqui fazer duas indicações para que a própria Subcomissão possa definir: acho que nesse tema de planejamento familiar seria interessante ouvirmos pessoas estudiosas da Região do Nordeste, onde o problema é mais gritante. Tenho duas sugestões, não sei se os colegas aceitarão – estou apenas pensando alto –, uma ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) seria a indicação do nome do Dr. Rubens Vaz Costa, que é um estudioso do problema; seria ele ou o Professor Cortez Pereira de Araújo, ex-Governador. Fico à vontade, porque foi meu adversário, no Rio Grande do Norte, e foi um dos primeiros Estados a fazer o convênio do planejamento familiar, sendo o professor grande estudioso dessa matéria. Rubens Vaz da Costa é do Ceará, e o Professor Cortez Pereira de Araújo, do Rio Grande do Norte. Sr. Presidente, posso procurar saber qual é o telefone ou o endereço, e logo mais passarei a informação a V. Ex.ª. Pode haver outras sugestões, apenas, no momento ocorreram-me esses dois nomes, que estão muito ligados a esses problemas. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – (Intervenção fora do microfone. Inaudível.) O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Se não me engano ligado ao Ministério da Justiça, então fica fácil localizar. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Acho que a CNBB também vai gostar de falar sobre a natureza da sociedade conjugal. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Digamos que uma entidade queira vir e falar sobre diferentes aspectos... O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Acho que deva ser aberto o diálogo, não podemos ter só uma entidade abordando. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, só mais uma questão a ser esclarecida: qual seria o tempo que deveríamos destinar a cada entidade ou autoridade convidada? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Até meia hora. Eu diria até que se aparecem três entidades ou quatro... O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Devo mencionar, apenas para esclarecimento, esse projeto de normas para o funcionamento das Comissões são sugestões emanadas da Mesa da Constituinte, e aqui as seguintes previsões: "Art. 9º O Presidente de cada Subcomissão fixará as datas das reuniões destinadas às audiências com entidades representativas de segmentos da sociedade, cabendo ao Plenário da respectiva Subcomissão selecionar, para serem ouvidas, as pessoas interessadas e especialistas, na área de sua competência, a fim de serem expedidos os convites." É o que acabamos de fazer. O art 10, diz: "Aos representantes de cada entidade será facultado usar da palavra pelo prazo máximo de 15 (quinze) minutos. Parágrafo único. Os membros da Subcomissão poderão interpelar o orador, após a exposição e sobre o assunto nela focalizado, por prazo nunca superior a 3 (três) minutos. O orador terá o mesmo prazo para responder ao Constituinte, sendo-lhe vedado fazer qualquer interpelação." O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Melhor 30 minutos, e mais uns quinze para debate. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Fica, então, acordado o tempo de 30 minutos. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – De até 30 minutos. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Temos quanto tempo de sessão? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Temos 3 horas. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Poderíamos destinar os 30 minutos seguintes para debate com aquela autoridade e, havendo uma segunda autoridade, poderíamos ouvir três. Sr. Presidente, estamos com todas essas normas estabelecidas. Fica, então, a deliberação a respeito da nossa próxima reunião. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Discutimos aqui a necessidade ou não da reunião de amanhã, a fim de liberarmos os nossos Companheiros a viajarem a seus Estados. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – De amanhã e quarta-feira. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Assim deliberamos marcar a reunião para o dia 21, no horário regimental. Muito obrigado pela presença de todos. Está encerrada a reunião. (Encerra-se a reunião às 12 horas.) ATA DA 4ª REUNIÃO ORDINÁRIA Aos vinte e um dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez horas, na Sala 15 (quinze) do Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso para a primeira audiência pública da Subcomissão com entidades representativas do segmento social, sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar e com a presença dos Senhores Constituintes: Eraldo Tinoco, Rita Camata, lberê Ferreira, Maria Lúcia, Eliel Rodrigues, Flávio Palmier da Veiga, Roberto Augusto, Eunice Michiles e Ervin Bonkoski, como membros da Subcomissão; e os Senhores Constituintes Fausto Rocha e Antônio de Jesus, como participantes. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos, dando como lida e aprovada a Ata da reunião anterior. Prosseguindo, o Senhor Presidente apresentou a Dra. Comba Marques Porto, representante da Dra. Jacqueline Pitanguy, Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, que passou a discorrer sobre o tema "Natureza da Sociedade Conjugal", sob o ponto de vista do CNDM, apresentando a proposta elaborada por aquele Conselho à Assembléia Nacional Constituinte. Concluída a exposição, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para o assunto em debate. Manifestaram-se: Nelson Aguiar, Flávio Palmier da Veiga, Maria Lúcia, Rita Camata, Eliel Rodrigues, Iberê Ferreira, Roberto Augusto, Eraldo Tinoco e Fausto Rocha. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente agradeceu a participação da Dra. Comba Marques Porto, dando por encerrados os trabalhos, às treze horas, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia vinte e dois de abril, às nove horas e trinta 22 minutos, com a seguinte pauta: depoimento e debate com a entidade "Movimento Pró-Vida de Brasília" sobre o tema "Planejamento Familiar". E, para constar, eu, Antônio Carlos Pereira Fonseca, secretário, lavrei a presente Ata, que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar , Presidente. ANEXO À ATA DA 4ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 21 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:15 HORAS. INTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Está presente aqui, representando o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, convidada que foi para debater conosco sobre a natureza da sociedade conjugal, a Sra. Comba Marques Porto. Convidaria S. Sª a ocupar conosco um espaço à Mesa. Consultamos os Constituintes sobre a conveniência ou não de a ouvirmos, em caráter informal, já que não temos quorum regimental para a realização da reunião. (Pausa.) Queremos, antes, declarar que está aberto, a partir de hoje até o dia 8, está assegurado o espaço para que representantes da sociedade possam apresentar seus depoimentos perante esta Subcomissão da Família, do Menor e do idoso. Sabemos que ela envolve temas muito importantes, assuntos muito importantes, muito controversos. Iremos tratar aqui de assuntos como: a natureza da sociedade conjugal, o planejamento familiar, a influência dos meios de comunicação na vida familiar, a dissolução da sociedade conjugal, direitos e deveres do menor, proteção da gestante, da mãe, da família e outros temas. Então, passaremos a palavra à Dra. Comba Marques Porto, que nos dará a honra e a alegria da sua exposição nesta manhã. Mas, antes, quero avisar-lhe que disporá do prazo de 30 minutos para fazer a exposição. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Inicialmente, queria dizer que me sinto muito honrada em estar aqui, representando o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, na pessoa de sua Presidente, Dra. Jacqueline Pitanguy, e também pelo fato de pertencer a uma assessoria, a um comitê consultivo que o Conselho criou neste momento dos trabalhos da Constituinte para, exatamente, dar todo o suporte jurídico necessário à defesa das reivindicações das mulheres na Constituinte. Faço parte, então, desse Comitê Consultivo, composto de oito advogados que se notabilizaram ao longo desses anos, num trabalho específico em defesa dos direitos da mulher, como profissionais e como militantes do movimento de mulheres, do movimento feminista. Sr. Presidente desta Subcomissão, Constituinte Nelson Aguiar; demais Membros da Mesa; Sras. Constituintes; Srs. Constituintes: Desde quando criado, o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, vem levando em todo o País a campanha "Constituinte Para Valer Tem Que Ter Direitos de Mulher", visando incentivar a parti- 23 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) cipação das mulheres na feitura da nova Constituição. Em permanente contato com o movimento de mulheres, o CNDM empenhouse em colher, de Norte a Sul, as reivindicações formuladas através de anos de luta em defesa da igualdade de direitos e pela conquista da plena cidadania. Desta atuação, resultou a "Carta das Mulheres aos Constituintes", documento aprovado num Encontro Nacional, ao qual compareceram cerca de duas mil mulheres representativas de grupos feministas, sindicatos, partidos políticos e inúmeras associações civis que incluem o fim das discriminações por motivo de sexo em seus programas de ação. O desdobramento desta campanha permitiu a elaboração de um articulado, no qual os anseios e reivindicações contidos na "Carta" foram traduzidos em propostas de texto constitucional, material que está sendo divulgado entre Deputadas e Deputados Constituintes, bem como nos Estados, entre as entidades representativas que, na forma do Regimento da Assembléia, podem encaminhar propostas a serem inseridas na Constituição. Acreditamos que participando deste momento histórico, fornecendo às mulheres subsídios necessários à melhor expressão de seus desejos de mudança, estaremos cumprindo nosso papel no processo de construção da democracia. O CNDM sente-se honrado em contribuir com os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte e põe-se à disposição dos Constituintes desta Subcomissão para outros debates sobre as questões pertinentes ao tema aqui tratado. Em torno do tema de nosso debate – a Natureza da Sociedade Conjugal –, desejamos trazer aos Constituintes algumas reflexões e argumentos que, inclusive, justificam nossa proposição de articulado no que concerne à família e à igualdade de direitos no âmbito do casamento. A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, dispõe que "a família é constituída pelo casamento e tem o direito à proteção dos poderes públicos" (art. 175). Teoricamente, a relação de casamento se fundamentaria no princípio da igualdade estabelecido no texto constitucional, em seu art. 153, § 1º, onde se lê que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas". Entretanto, a lei ordinária, em desacordo com o preceito constitucional, estabelece verdadeira discriminação à mulher casada, na medida em que a coloca em situação de inferioridade ao atribuir ao homem a chefia da sociedade conjugal (Código Civil, art. 233). Tal chefia confere ao cônjuge do sexo masculino pelo menos quatro privilégios: a direção da sociedade conjugal, o direito de fixar o domicílio da família, o direito de administrar os bens do casal e o direito de decidir em casos de divergência. Esta estrutura básica de família definida pelo direito vigente deve ser questionada pelo menos em dois níveis: 1º – adota-se um conceito de família excludente, defasado da realidade e originário de discriminações que atingem sobretudo as mulheres nas uniões de fato – as companheiras – e os filhos nascidos em situações não legitimadas pelo casamento; 2º – a relação conjugal estabelecida pelo casamento fundamenta-se no conceito de poder do homem sobre a mulher, a quem a lei atribui a função de colaboradora do marido na administração dos interesses do casal e dos filhos. Não é de hoje que se discute a necessidade de reformulação do conceito de família até então consagrado em nossos institutos jurídicos. Já em 1947, Nelson Carneiro levantava a voz em defesa das companheiras, propondo a sua equiparação às esposas nos casos de união estável comprovada. Até hoje tal proposição não foi acolhida por nossos legisladores. A jurisprudência veio gradativamente preenchendo o vazio da lei, admitindo alternativas como a possibilidade de se obter a declaração judicial da sociedade de fato para o fim de partilha dos bens, nos casos de dissolução da união concubinária. Não obstante as conquistas na jurisprudência e a tendência da moderna doutrina no sentido de ampliar o conceito de família, ainda são muitos os entraves para que, na prática, seja eliminado o tratamento desigual. Tome-se como exemplo o fato de que, para obter a referida partilha dos bens, a companheira tem de enfrentar uma ação judicial que dificilmente dá a vitória às mulheres que não conseguem provar sua efetiva contribuição financeira para a aquisição do patrimônio comum ao casal. Urge que a norma constitucional crie um novo patamar, aproximando o direito das transformações sociais ocorridas. O que nos indica a realidade? Há ainda quem acredite que só há família se constituída pelo casamento, como quer a lei. Em obra intitulada "Família", Edgar de Moura Bittencourt apresenta a estimativa de que "aproximadamente, metade da população brasileira (considerada a extensa área rural) é constituída por famílias naturais" (pág. 137) Recente pesquisa publicada pelo Jornal do Brasil revelou o significativo aumento de mulheres "chefes" de família. São situações de fato, em que o cônjuge ou companheiro abandona mulher e filhos ou deixa de contribuir para com o sustento da família. É também cada vez maior a incidência de mães solteiras e mesmo de mulheres separadas que, por opção, assumem; naturalmente, a "direção" de seu núcleo familiar. Trata-se propriamente de questionar o conceito tradicional de sociedade conjugal, formulado a partir, única e exclusivamente, do pressuposto do casamento legal ou mesmo da união estável entre um homem e uma mulher. Observa-se verdadeira mutação na composição dos agrupamentos familiares, podendo-se facilmente perceber que a família, na sua concretude, extrapola o limite estreito da chamada sociedade conjugal, fundamentada na relação afetiva entre pessoas de sexos diferentes. Concretamente – só fazendo um parêntese – ocorre a separação, a mulher não se casa de novo. Uma mulher com três, quatro filhos, ou um primo, um parente que more junto, representam um agregado familiar. E, do ponto de vista jurídico, até então a Constituição não considera, para os fins de direito, a família sem ser aquela fundamentada no núcleo casamento, casamento legal, como define a Constituição. Examinando-se o direito comparado, constata-se que em diferentes Constituições as referências à família aparecem no sentido de consagrar a proteção que o Estado deve a seus membros. As Constituições de Portugal, Cuba, Polônia, Iugoslávia e URSS, por exemplo, não qualificam a família que ao Estado incumbe assistir. A família terá a proteção do Estado – diz a Constituição portuguesa, não diz que família é essa, de que forma ela é constituída, se é por um casamento, por união estável, enfim, não define isso. É interessante notar que só na Constituição portuguesa encontra-se a preocupação de ressaltar que os pais e as mães, independentemente do casamento, têm direito à proteção, e que a maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes. A Constituição da República Democrática Alemã estabelece que "as mães e os pais solteiros são objeto de ajuda particular do Estado Socialista". A Constituição espanhola assegura proteção integral dos filhos, independentemente de filiação, e das mães, seja qual for o seu estado civil. No que concerne aos filhos, o nosso direito ainda perpetua distinções nefastas que se originam do privilégio dado à família constituída pelo vínculo matrimonial. Só se admite o reconhecimento dos filhos naturais e dos adulterinos após a dissolução da sociedade conjugal anterior. Aos incestuosos dá-se apenas o direito de demandar, em segredo de Justiça, os alimentos contra o pai. A melhor doutrina jurídica ainda denomina de "espúrios" os filhos havidos de pais que não podem casar-se entre si – por exemplo, filho de mãe casada com pai solteiro. Nessa hipótese, deve o pai registrar a criança apenas em seu nome, constando no assentamento do registro que a mãe é "pessoa cujo nome se omite na forma da lei". Aliás, sou um exemplo de mãe "cujo nome se omite na forma da lei", porque tive um primeiro casamento, uma separação de fato, amigável, bastante amigável, e uma segunda união, em que ocorreu uma gravidez antes de formalização da separação. Não estávamos brigando; quando se briga vai-se à Justiça: quando não se briga, não se vai. E meu filho nasceu, e eu era casada, ainda no casamento anterior. E meu marido não quis fazer nenhum tipo de declaração falsa no registro. Então, meu primeiro filho do segundo casamento foi registrado somente no nome do pai e no crédito "mãe" constava "pessoa cujo nome se omite na forma da lei". Depois que eu me separei, legalmente, tive que fazer uma escritura de reconhecimento de filho num cartório, para dizer, com uma testemunha, que eu era mãe do meu filho, e operarem-se, então, os outros procedimentos legais e burocráticos, para que, enfim, esse meu filho tivesse o nome da mãe. Coisa mais concreta não existe, eu era mesmo a mãe dele, e não havia possibilidade de reconhecimento. Então, o filho da mãe casada, com pai solteiro, não pode ser registrado dessa forma. Nessa hipótese, deve o pai da criança registrar a criança apenas em seu nome, constando do assentamento do registro que a mãe é "pessoa cujo nome se omite na forma da lei". ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATA DE COMISSÕES) Se a mulher solteira – outra hipótese – tem um filho com um homem solteiro, o nascimento da criança somente constará de registro se o pai, espontaneamente, o declarar, ou através da ação de investigação de paternidade. Uma das mais graves discriminações impostas à condição de mulher diz respeito à impossibilidade de se declarar nascimento de filho em igualdade com o homem. A Lei de Registros Públicos em vigor consagra a hierarquia do homem sobre a mulher que, mesmo sendo casada, só pode registrar seu filho mediante apresentação de documento comprobatório do casamento, o que não se exige do homem no ato da declaração. Neste domínio, a lei inverte a verdade biológica referente à certeza da maternidade e à presunção da paternidade. Nosso direito deve evoluir no sentido de declarar, no texto constitucional, a plena igualdade entre o homem e a mulher, no que diz respeito ao registro de filhos, garantindo o direito de declaração da paternidade e da maternidade, independentemente do estado civil do pai e da mãe. O Código Civil português dá à matéria, notável tratamento quando garante à mulher casada inclusive o direito de declarar nascimento de filho havido fora do casamento (art. 1.832 do Código Civil Português) bem como, quando adota a ação pública de investigação de paternidade, princípio que incluímos em nossa proposta, condicionada à representação da parte interessada. Como afirmamos na justificação do articulado proposto (documento em anexo), o direito ao nome, à declaração da maternidade e da paternidade é inerente ao cidadão. Nosso direito deve, portanto, eliminar a odiosa distinção, discriminação propriamente dita, entre os filhos, quanto à legitimidade, reparando-se assim arraigada injustiça originária de tantos traumas e conflitos. No que tange ao casamento legalmente constituído, como já vimos acima, o Código Civil Brasileiro, de 1916, obedeceu naturalmente ao princípio constitucional da Carta de 1891 que, pelo § 2º do art. 72, limitava-se a afirmar de forma geral o princípio de igualdade de todos perante a lei. Pela primeira vez, em 1934, o Constituinte brasileiro demonstra sua preocupação pela situação jurídica da mulher, proibindo expressamente quaisquer privilégios ou distinções por motivo de sexo. Embora a Carta de 34 tenha destrinçado esse princípio da igualdade, tornando explícita a impossibilidade de se distinguir pessoas em razão de sexo, mesmo assim, até 1962, pelo Código Civil, a mulher casada era considerada relativamente incapaz, e necessitava, para todos os atos da vida social, ser assistida pelo marido. Era equiparada aos pródigos, silvícolas e menores púberes. Ainda hoje, em 1987, a mulher casada brasileira não possui os mesmos direitos do homem casado. Dentre os vários artigos discriminatórios, destaca se, além do 233, esse já ficou famoso na nossa andança do movimento de mulheres, porque já são, não sei quantas, mil palestras que fizemos pela vida afora discutindo o art. 233, do Código Civil. Além do 233, o 380 é outro artigo grave que confere a ambos os pais o pátrio poder, mas ao pai o seu exercício. Estipula ainda que, em casos de divergência, prevalece a vontade do marido, cabendo à mulher recorrer à justiça se puder ou se quiser brigar e se não puder, se conformar à vontade soberana do cônjuge varão. Não é de hoje que o movimento de mulheres vem pleiteando a supressão de tal desigualdade que, no plano das leis, acarreta outras tantas aberrações discriminatórias, verdadeira lesão à cidadania feminina. Vejamos o que decorre do princípio de chefia estabelecido no Código Civil, no art. 233. A CLT confere ao marido o direito de pleitear a rescisão do contrato da mulher (art. 446), se o marido entende que o exercício do trabalho traz algum perigo à estrutura familiar. Inclusive a lei dispõe de forma muito genérica sobre isso. O que pode ser no entender do marido, esta ameaça à estabilidade da família, o fato de a mulher trabalhar? Se ele tem uma ação no Fórum, por exemplo, contra ela, se o casamento está em litígio na Vara da Família, ele pode perfeitamente valer-se desse dispositivo legal, para prejudicar a mulher nessa etapa em que ela precisa afirmar-se profissionalmente, para tornar-se independente dele. sI so está escrito na lei com todas as letras. O Código Comercial Brasileiro, de 1850, vigente até hoje, prevê a necessidade de autorização do marido para que a mulher estabeleça atividade comercial – art. 1º, inciso IV. Esse caiu em desuso. Também, desde 1850, já era para ter caído; entretanto, está escrito, com todas as letras, na lei. Porém as Juntas Comerciais não requerem mais essa autorização para que a mulher estabeleça atividade comercial. Acredito que um marido, desejoso de turbar essa trilha profissional da mulher, poderá invocar o artigo da lei. Há toda uma discussão se a Lei nº 4.121, de 1962, que nos tirou da condição de silvícolas, menores púberes, teria revogado esses dispositivos. O entendimento doutrinário e jurisprudencial é de que ela não revogou, e fica tudo entregue ao sabor da opinião formada em juízo. Se o Juiz quiser, aplica a Lei nº 4.121, entendendo que ela revoga, por exemplo, esse artigo do Código Comercial. Mas, se não quiser, não! Então, o que se precisa é tirar da lei ordinária esses dispositivos discriminatórios. Outro que causa absoluto espanto, quando mencionado, é o art. 35, do Código de Processo Penal, que proíbe à mulher casada o direito de exercer queixa-crime sem o consentimento do marido. Por exemplo, sendo eu mulher casada, sou estuprada na rua e preciso levar a queixa desse crime – no caso não é um crime de ação pública – à delegacia, preciso ter a concordância do meu marido. Se por alguma razão ele achar que inventei esse estupro ou que essa notícia levada à Polícia e, possivelmente, aos jornais lhe tira alguma coisa em termos de sua honra ou qualquer coisa parecida, ele me proíbe de formular a queixacrime. Assim, o meu direito de cidadã em exercer a justiça, de demandar a ação penal contra um homem que me tenha estuprado, fica condicionado ao desejo, à aprovação do meu marido – o que é um absurdo! Nas demais normas e regulamentos que regem a vida civil, igualmente encontramos dispositivos discriminatórios. Ressalte-se, porém, o avanço obtido quanto à declaração de rendas. Hoje tornou-se possível o rateio, entre os cônjuges, de alguns ou de todos os abatimentos considerados comuns ao casal. Não obstante tal alteração, ainda se lê no Manual de Preenchimento da Declaração de IRPF que "para efeito de declaração, o cabeçade-casal é o marido". 24 Acrescente-se que o conceito de chefia fundamentado na condição de sexo determina, no plano dos costumes e das práticas cotidianas, o exercício de um poder que ultrapassa o limite de suas atribuições legais. O cabeça-de-casal tende a assumir não tão-somente a direção da sociedade conjugal, como também o controle sobre a vida da cidadã mulher que tem como esposa. Vivemos, assim, uma grave reversão dos objetivos da lei. No Brasil, a prática de violência na constância das relações familiares decorre, no plano mais abrangente, de uma educação diferenciada que, secularmente discriminatória, em relação à mulher e que a tornou submissa ao homem; eu me convenço de que a violência constante na relação da família no plano mais restrito, tem suas raízes na hierarquia inscrita na lei, a qual transforma o marido em patrão da mulher. A violência doméstica – coações, espancamentos e assassinatos cometidos por maridos contra suas mulheres – requer medidas preventivas que passam fundamentalmente por uma série e profunda mudança nos dispositivos legais que, a despeito da efetiva participação das mulheres em diversos setores da vida nacional, ainda lhes conferem uma cidadania menor, em flagrante confronto aos direitos elementares da pessoa humana, muitos dos quais consagrados em convenções e tratados internacionais, a exemplo do que dispõe a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, da ONU, de 1979, adotada no Brasil sob a forma de lei, publicada no Diário Oficial da União de 21 de março de 1984. Recomendo a todos os Constituintes não deixem de ter em mãos, durante seus trabalhos, o texto completo dessa Convenção que, embora tenha sido convertida e adotada no Brasil como lei, não operou ainda em nossa Legislação as mudanças que, desde 1984, já poderiam ter sido operadas. Pela exposição da Dra. Comba Marques Porto, vimos quanta coisa, quanta responsabilidade tem esta Subcomissão e, especialmente, a Constituinte, neste momento da História de nosso País, especialmente pelas implicações, pelos danos que vêm causando à vida da criança que é, em última hipótese, um ser sem culpa. Não é preciso dizer, mas fazemos questão de lembrar, por oportuno que temos hoje, segundo reportagem de O Fantástico e outros documentos de que dispomos, cerca de 6 milhões de menores que não dispõe de registro no País; 8 milhões na faixa do abandono, quer dizer, considerados menores abandonados aqueles que, marginalizados pelo Estado e sociedade, se encontram fora do vínculo familiar comunitário. Também de acordo com as estatísticas de que dispomos, posto que imprecisas, cerca de 8 milhões deles, hoje, fazem no abandono, em um universo de 36 milhões de carentes. Vejamos bem, que, por trás está a questão da família. Sabemos que as outras Subcomissões estão trabalhando assuntos muito importantes, mas temos absoluta certeza de que assuntos que têm implicações diretas na vida da pessoa, especialmente do ser inocente, estão sendo tratados aqui nesta Subcomissão, e isto nos coloca diante de uma responsabilidade máscula, diante de uma 25 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) responsabilidade enorme, que é a de oferecer à Nação a proposta de um texto nos trabalhos de elaboração constitucional, que represente a expectativa do povo brasileiro, no sentido de atender o direito daqueles que hoje se encontram à margem da lei. Eu gosto muito de ler a "Luta pelo Direito". Já o li várias vezes. Acho que esta é a hora da luta pelo direito, quer dizer, o direito como instrumento de consecução da justiça. Gosto de ler o nosso livro comum, as Escrituras. Ela quase nunca faz referência ao Direito, mas em 227 passagens as Escrituras Sagradas fazem referência à justiça, significando um atributo de Deus na relação entre os homens. A Assembléia Nacional Constituinte pode significar um passo decisivo para a conquista da democratização das relações de família, na medida em que de seus trabalhos resulte preceito constitucional efetivamente inspirado em valores não autoritários que, até então, nortearam a natureza sócio-cultural da sociedade conjugal. Da mesma forma, a proclamação do princípio de igualdade no âmbito da concepção jurídica de família e no plano do casamento deve ter por conseqüência imediata a alteração das leis ordinárias, operando-se, enfim, a eliminação das discriminações que afetam a integridade da cidadania das mulheres. Como me haviam pedido que preparasse, inicialmente, um texto para ser lido em dez minutos, acredito que tenha passado um pouco dos dez minutos, mas não chegou a meia hora. Acho que foi bom, porque adiantamos a possibilidade de debater as questões aqui modestamente levantadas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Agradecemos à Dra. Comba Marques Porto a excelente exposição. Gostaríamos de nos referir também às suas acompanhantes neste encontro; a Socióloga Maria Celina Albano, Diretora da Assessoria Técnica do Conselho Nacional do Direito da Mulher, Járis Ramalho Cortes, Coordenador da Comissão de Legislação, Advogada; a física Nilse Gomes. Técnica da Comissão de Combate à Violência. Ainda como convidadas, as Sras. Luíza Maria Andrade Nóbrega e Helena Musse. não sabemos os nomes das outras pessoas presentes, mas as declaramos bem-vindas, sendo para nós uma alegria muito grande em tê-las aqui assistindo aos trabalhos desta Subcomissão. De modo que, nós estamos na busca do direito como instrumento da consecução da justiça. O direito, às vezes, significa instrumento de manutenção de privilégios e de injustiças, e aí está, então, a figura do Direito que discrimina a mulher, que estabelece diferenças de direitos e atribui franquias e facilidades naturalmente para o homem, nas relações familiares, nas relações conjugais. Estamos aqui para prestarmos a nossa colaboração com a consciência de que nos cabe fazer o melhor, e por isso nós agradecemos o conselho Nacional de direito da Mulher, na pessoa da Drª Comba Marques Porto, pela exposição que fez, e naturalmente pela oportunidade que nos dá agora de debater com ela variados aspectos do direito da mulher. Abrimos espaço para os Srs. e as Sr as Constituintes formularem questões e, antes disso se quiserem, em 10 minutos, comentar algum aspecto da exposição feita. Qualquer Constituinte poderá usar da palavra. (Pausa.) O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIERA DA VEIGA: – Embora não tenha ouvido toda a exposição da ilustre palestrante, vi que o trabalho é muito objetivo. Estamos participando, no Estado do Rio de Janeiro, de um grupo de estudos constitucionais localizado em Niterói, e um dos assuntos muito debatidos foi a maneira pela qual se consolida casamento, evitando, com a destruição do lar, pela separação, males que são sucessivos em diversas áreas, atingindo em especial às crianças, vítimas contumaz dos erros dos adultos. Pela sua vivência, pela inteligência que demonstrou na apreciação desse trabalho – "A Natureza da Sociedade Conjugal", quais seriam as idéias possíveis que a Senhora poderia oferecer para se evitar o que ocorre, por exemplo, em Brasília? Aqui a Senhora encontra dez mulheres, dez homens e seis são desquitados, estão separados. Então, nós estamos diante de um problema que tem inúmeras causas, nós estamos atrás dessa luz no fundo do túnel. Como fazer para criar obrigações e evitar, talvez, às vezes por causas primárias, irrelevantes, destruição daquela célula mater, a grandeza da vida, que é a manutenção daquilo que é instrumental para tudo, que é a família? Estamos debatendo muito isso, mas eu queria ouvir mais uma opinião, para somar a aquela que já tenho, e poder, amanhã, colaborar com a Constituinte. A minha preocupação, a senhora entendeu bem? Acho que é a básica, a fundamental, porque estamos sentindo que o índice de separação está crescendo, a família está sendo dilapidada, os efeitos éticos estão completamente afastados. Sabemos também que isso está muito em sintonia com o processo educacional e cultural de nossa gente. Mas eu queria ouvir a pincelada da senhora, para ver se eu posso assimilar alguma coisa que me dê consonância com o que eu quero apresentar na Constituinte. A SRª COMBA MARQUES PORTO: – Esse ponto que V. Ex.ª levanta acho muito importante. Inclusive me cabia aqui fazer um trabalho aprofundado, mas a exposição ficaria muito extensa, porque essa questão é realmente muito abrangente. Primeiro temos que partir dessa realidade. Quer dizer, existe uma realidade concreta, em que percebo existir vários pontos de partida, que é a questão da dissolução da sociedade conjugal. Assim poderíamos enumerar, quer dizer, sem ordem de hierarquia, por exemplo, o próprio papel que a mulher vem ocupando, que lhe foi solicitado nesse processo dos últimos 50 anos de desenvolvimento nacional. Nós entramos em massa no mercado de trabalho. Em relação a sua função de esposa, eu diria assim de um modo geral, não lhe é nem mais permitido manter aquela divisão tradicional, em que o homem era o provedor, vai à rua trabalhar, ocupar o espaço público, e a mulher dentro do espaço doméstico. Acho que a própria entrada da mulher no mercado de trabalho, na socialização, portanto, porque o trabalho na minha opinião é o primeiro elemento de socialização do ser humano, trouxe às mulheres outros referenciais em relação à vida em geral. Sou de uma geração, tenho 41 anos, em que fui educada, como a maioria das mulheres dessa época para ter como única e exclusiva finalidade, na vida, o casamento, mas não o casamento no sentido, digamos, em que a intenção primeira seja o afeto, no sentido criativo, no sentido enriquecedor. Não, nós fomos educadas para ter como finalidade da vida o casamento, e ponto, num contexto absolutamente restritivo da nossa dimensão como ser humano. Quer dizer, antes de termos vocação para a maternidade, que é uma vocação fortíssima dentro de nós, também temos outras vocações – para trabalhar, enfim para participar da vida pública. Acho que esse foi um conflito que, de certa forma originou essa crise. E outros tantos, eu, particularmente, dou muita ênfase a toda essa estrutura, inclusive jurídica, no qual o casamento foi montado. O casamento, na verdade, é um instituto que foi concebido para que dê certo sempre. A família, aquela família, o pai, a mãe e os filhos, sabemos e eu, inclusive, como advogada, que já milita há doze anos nesse campo, percebo que as pessoas são educadas para isso. Entretanto, por mil e uma razões, isso às vezes não dá certo. Primeiro porque o amor acaba, e acaba mesmo, e quando acaba, das duas uma: ou você se conforma, dentro daquele padrão moral, ético, que lhe foi imposto ou não, então, eu tenho que ficar casada, queira ou não queira. Ou o marido; eu tenho que ficar casado, queira ou não, porque não são só as mulheres que rompem com os casamentos, os maridos também. E diga-se de passagem, quando os homens rompem, talvez até por uma vivência diferente nesse âmbito, os homens às vezes rompem de maneira traumática. Ele rompe e, junto com o casamento, ele nega os filhos, abandona os filhos. Isso é muito comum encontrarmos. Pais amantíssimos, dedicadíssimos, que criaram seus filhos com o maior carinho, no momento do rompimento daquela relação afetiva com aquela mulher, junto com o rompimento do casamento ele rompe com os filhos, e sabemos de histórias de pais que jamais voltam a ter uma relação de atenção e até em termos de sustento material. Então, por mil razões, essas coisas acabam. E toda a estrutura está direcionada para que não acabe. Penso que este é um primeiro entrave que encontramos. Do ponto de vista, digamos, assim, jurídico, o que acontece? Quando o senhor começou a falar, eu me lembrei da questão do pátrio poder. Ou seja, a nossa estrutura jurídica está toda montada para que, após a separação, os casais entrem em absoluto e total confronto. Por exemplo, pátrio poder – se ocorre a separação, nós ainda vivemos uma situação em que naturalmente os filhos ficam com as mães, até porque as próprias mulheres, nesse seu trajeto de, digamos, assim, de libertação, ainda não aceitam que os filhos se separem delas, e os filhos também ainda não aceitam isso; existe um vínculo da mãe com os filhos, talvez diferente do próprio vínculo que se estabelece do pai para com os filhos. Então, os filhos, ficam sob a guarda da mãe. Entretanto, o exercício do pátrio poder, ainda após a separação, continua sendo um exercício, digamos, assim, privilegiado do cônjuge varão. Então, o que acontece? Já não há mais, digamos, decisão em comum, porque estão separados e isto, para mim, ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) e um dos pontos de maior conflito. Então, e aquela história: a guarda dos filhos fica com a mãe mas quando os filhos têm que sair com a mãe para fazer uma viagem, para ir ali ou acolá, têm que ter a autorização do pai. Quer dizer, este é um ponto que eu, quando fiz, inclusive, esse artigo, esse trabalho, eu fiquei pensando nele. Quer dizer, há toda uma arrumação, de ponto de vista jurídico e do ponto de vista da prática, que foi feita para que aquilo desse sempre certo, entretanto, não dá, e quando não dá, fica-se sem os mecanismos de operar isso. Parece-me que existe talvez uma luz, no fundo do túnel, que diz respeito à aceitação da separação como uma possibilidade. Quer dizer, na verdade as pessoas, porque foram educadas para que o casamento seja eterno, quando elas se deparam com essa não-eternidade, a vida acabou, e dali para frente elas estão fadadas a viverem um inferno até o fim da vida. Essa é a verdade. Quer dizer, acho e conheço alguns casos em que é possível se entender que a dissolução do casamento não implica automaticamente a dissolução da família. A família está concebida dentro daquele parâmetro amarrado, da coabitação obrigatória, da fidelidade conjugal. Entretanto, é possível evoluirmos e aí dependerá de todo um processo educacional e cultural mais amplo, a fim de que as pessoas aceitem a separação até psicologicamente, eu diria, e aceitem a separação, não como uma tragédia que se abateu, possibilitando que as pessoas continuem se relacionando bem, inclusive pensando nos filhos, de tal maneira que a separação não signifique esse trauma. Penso que tudo isso parte muito do princípio do respeito, de igualdade. Por exemplo, se o próprio casamento fosse constituído, até do ponto de vista legal, da prática da relação homem e mulher se ele fosse constituído num parâmetro de maior liberdade, de liberdade do homem e de liberdade da mulher – eu digo liberdade no sentido de respeito a um ser humano que está ali em coabitação – o momento da separação seria um momento menos doloroso. A verdade é que as pessoas não a aceitam. Então, quando penso no que o senhor fala, iremos ficar dando voltas em cima de uma mesma tecla, se pensamos só por um lado, na questão da manutenção da família, quer dizer, do casamento como uma estrutura básica da família. Até em meu trabalho tento ampliar para que se admita que há a família, independentemente da sociedade conjugal, porque isso é verdade. Existe possibilidade de haver família, independentemente da sociedade conjugal, com a característica que a lei atualmente lhe dá. E ainda tem o seguinte: a lei é uma coisa dinâmica. Nós é que criamos as leis; nós, homens, com toda nossa historicidade, com nossos valores, nós podemos escrever leis que permitam maior flexibilidade a esse processo todo. Não sei se estou chegando ao que V. Ex.ª quer. Acho que é uma luz muito difícil de se encontrar neste túnel. Mas é possível pensarmos na possibilidade de as pessoas constituírem família num determinado momento da vida. Isso acontece porque as pessoas se casam às vezes muito jovens. O ser humano vai crescendo, e algumas vezes não crescem juntos, e se separam. Tento fazer com que possamos imaginar a separação não como um momento de dissolução, e sim como uma nova feição da família. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Não sou daqueles que defendem a obrigatoriedade da vida conjugal; não pode ser, não pode. As nossas leis não dão aos pais a obrigatoriedade que deveriam dar na assistência aos filhos, que sofrem com a separação. Talvez tenhamos que analisar mais essa responsabilidade. A lei é muito omissa no sentido de oferecer obrigatoriedade maior, maior responsabilidade, principalmente com relação à estrutura daqueles que sofrem com a separação. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – O senhor me permite? Sobre isso que está dizendo, o casamento na verdade é assim, considerado o valor maior para termos aqueles filhos. Em relação às mulheres, inclusive, o casamento funciona muito como uma finalidade de realização da maternidade. Entretanto, o que acontece? Dá-se maior ênfase à constituição da família pelo casamento. Mas sobre isso que o senhor disse, o Estado, por exemplo, não dá a assistência que deveria dar no sentido inclusive de evitar os conflitos ainda durante o casamento, para evitar a separação. Se contarmos com uma estrutura de apoio à família, por exemplo, as creches, que é outro ponto que deverá ser objeto desta Subcomissão, na medida em que aqui se discutirá o menor, se dispormos de uma infraestrutura mínima, para que as famílias consigam desempenhar sua função, ou seja, que as mulheres possam trabalhar fora de casa, para ter a sua cidadania, para ter a sua contribuição naquele universo familiar garantido, se contarmos com uma infraestrutura, tipo creches, lavanderias públicas, de acesso a todos, isso ajudaria a que as crises conjugais minorassem. As crises conjugais passam muito por essas dificuldades na vida. Na verdade, as pessoas se casam, têm filhos e se vêem despreparadas e desassistidas, sem recursos. Quer dizer, a incumbência de educação dos filhos, nesse conceito geral em que vivemos, é única e exclusivamente do pai e da mãe. Entretanto, não se dá a esse pai e a essa mãe um apoio necessário a que isso flua de uma forma não-traumática. Então, a vida é muito difícil. Lógico, isso não se esgota somente na questão da discussão da família; é todo um processo maior, a questão da garantia no emprego, a questão de melhor distribuição da renda, que possibilite às pessoas uma vida mais humana, uma vida menos traumática. Ao se pensar na democratização da família, tem que se pensar também de a mesma continuar existindo, se é isso que a maioria das pessoas quer, mas em novas bases, com o apoio do Estado. Com o artigo que propomos, onde se diz que a família terá a proteção do Estado, e isso já está na Constituição, mas até agora não adiantou nada. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Esse é um fator de conscientização da massa em uma comunidade. Acho que a educação está em primeiro lugar, porque o art. 233 do Código Civil diz que o homem já começa com o direito de ser o chefe da família, e que esse chefe da família já entra com poderes; então, a mulher já entra submissa e, neste caso, qualquer coisa que ela ache errado ou que falte dentro de casa causa o conflito, porque, se o povo fosse conscientizado, 26 não aconteceria isso. Acho primordial tirarmos do Código Civil esse art. 233 – dos direitos e deveres do marido. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Interrompo a nossa colega para pedir que as exposições sejam feitas ao microfone, para facilitar o serviço de som, e também solicitar que cada constituinte decline o nome para o registro na elaboração da ata. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Acho que o art. 233 do Código Civil deveria ser retirado, porque o homem já entra como o cabeça do casal, o que é errado. Porque a mulher fica submissa, sujeita ao marido, o homem é o chefe, quando o casamento é uma sociedade. Ora, que sociedade é essa em que ele já entra com a chefia? Não existe isto em sociedade alguma – a chefia da sociedade já se encontra com o homem; isso é um erro. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Chefia que às vezes é exercida pelo homem a duras penas. A desigualdade não afeta só as mulheres, no meu entender; afeta também ao homem, na medida em que ele se vê obrigado, desde a infância, desde quando se educa um menino para ser o chefe, para não chorar, para ser forte. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Exato! O homem tem sempre que ser forte. Isso para mim é uma visão desigual dos seres humanos, homens e mulheres, que também acarreta para os homens um papel tão cruel, tão isolado, porque o chefe é sempre uma pessoa um tanto quanto isolada. Tudo que se exerce democraticamente em consenso, em grupo, deverá ser vivido com felicidade; a chefia é uma coisa um pouco isolada, então para eles também é duro. A outra conseqüência entra aí – voltando ao que o Sr. levantou, a questão das conseqüências da separação. Vejam só: uma mulher que passa 15 anos casada, sem trabalhar, sob a tutela do chefe, porque isso ainda existe no Brasil, hoje, mulheres que passam pela universidade, têm um curso superior e quando casam largam o trabalho, e não é só para cuidar dos filhos – este é um apelo muito forte – mas, ainda existe no Brasil essa história: "Mulher minha não trabalha fora". Assim, o homem na sua função de chefe quer ser o provedor único: ela passa 15 anos casada – de repente o marido, por exemplo, vai embora; troca a de 45 anos por duas de 20, vamos dizer, ou por uma só mesmo. O que irá acontecer com essa mulher? Continuará sendo dependente desse homem depois da dissolução da sociedade conjugal. Aí entra outro ponto grave de conflito no fórum que é a questão da pensão alimentar. Quem vai dizer que não e justo essa mulher pleitear desse homem os alimentos? É mais do que justo; ela passou a vida dentro da casa, não se formou, nunca trabalhou, está fora do mercado de trabalho, e sabemos que quem sai do mercado de trabalho ou quem nunca entrou, cada vez mais tem menos chance de entrar! Esta é a verdade, porque muitas pessoas com diplomas, formadas, não conseguem trabalho com uma remuneração condigna. Uma mulher como essa não tem outra alternativa se não passar o resto da vida que lhe sobre vivendo da pensão do marido. Isso é outro foco de conflito, porque depois que os homens se separam eles já não se sentem mais na obrigação de provedor. 27 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATA DE COMISSÕES) de chefe. A chefia vai até o momento da dissolução; acabou o casamento, ela que se vire, os filhos estão ai. Aí começam aquelas histórias que conhecemos do fórum: os homens largam os empregos, mudam de cidade para não pagar pensão. Já tive um caso em que o marido mudou de cidade para não pagar a pensão; somem, desaparecem, para não pagar a mínima pensão a que a lei o obriga. Então, por exemplo, uma mulher casada ou não, numa união de fato, se teve durante esse período de casamento liberdade para exercer, em todas as dimensões, a sua cidadania, inclusive trabalhando, essa mulher já irá passar por esse momento de separação, de forma mais inteira; ela terá como pisar firme no mundo sem ser de baixo da asa do marido e isso, em última análise, reverte numa coisa positiva para esse homem. Sabemos de casos de homens que casam três, quatro, cinco vezes e depois ficam alucinados porque o salário deles é todo para pagar pensão. Assim, se as mulheres ocupam outra dimensão de igualdade, cada vez menos essa ameaça de o homem ter de ser o eterno provedor ela vai se afastando. E quanto à própria relação entre as pessoas iguais, colocadas num plano de maior igualdade, será uma relação mais amorosa, amistosa e não ficaria aquela eterna cobrança porque estabelecendo-se uma pensão, vamos dizer, de 15%, ele rapidamente começa a ficar fazendo fantasias de que está sustentando os caprichos daquela mulher, sobretudo quando a mulher depois da separação resolve viver uma vida plena como mulher. Se ela ficar toda suja de ovo dentro de casa, tudo bem, ele paga e não reclama, mas se ela aparece arrumadinha e se ele ouviu dizer por um acaso ela saiu, arranjou um namorado, coisa perfeitamente possível – porque se não existe mais sociedade conjugal não existe mais nenhum vínculo – aí não tem jeito, eles não querem pagar mais pensão. É preciso que as mulheres tenham assegurado, tanto no mercado de trabalho, quanto em todas as dimensões de sua vida, condições de se desenvolverem como cidadãos para que isso melhore essas relações de família. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – O problema, então, é o homem? A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Não! O problema é cultura. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – O problema não é o homem, são as leis conflitantes, porque é conflitante o art 233 com o art. 153, que diz "todo o brasileiro é igual perante a lei, independente do sexo". O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – No meu modo de entender, perdoem-me, esse é um assunto muito polêmico e é interessante debatermos esse assunto. Temos que dar todas as garantias legais à mulher, no meu modo de entender. Agora, na hora da vida conjugal é a cultura, a educação que vale, é a formação. O problema é sério. É difícil a lei orientar subjetivamente, o comportamento da mulher ou do homem, tanto é que temos casos de homens que são afetivamente bons para as esposas e comandam o seu lar, e elas vivem felicidade, isso é relativo na proporção que a cultura cai, diminui. Acho que o homem educado, culturalmente preparado é um bom chefe de família e a mulher também. A mulher, amanhã pode ter todas as leis, como vamos defender, e acho que essas leis são justas esses artigos têm que cair. Tem que haver, nessa Constituinte, um processo básico, que dê uma formação desde a escola, para que se crie uma nova mentalidade, porque as causas são muito grandes. É uma coisa subjetiva que tem que ser feita pela lei de tal maneira que leve o comportamento do casal a um ponto que a família não fique destruída, porque está demais. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaria de propor – para darmos oportunidade a que outros interfiram na discussão, porque esta se torna bastante rica – que evitássemos os monólogos. O companheiro lberê Ferreira está ansioso para falar e também queremos ouvir a opinião abalizada do nosso querido pastor, e, naturalmente, ele tem alguma informação para apresentar a respeito da família monogâmica das Escrituras. Vamos ordenar as discussões, a fim de que possamos ter o maior proveito possível. Esta é uma oportunidade muito rica, porque estamos tratando com a pessoa certa, com profundo conhecimento de causa, e já que os nossos outros dois convidados, um representante da CNBB e outro evangélico não puderam vir, o primeiro por estar na eleição em Itaici, na Presidência da CNBB, e o outro por ter ficado retido em Porto Alegre em função das chuvas. Aproveitamos o nosso tempo. Sabemos que este assunto e controverso, tenho situado os meus estudos, e os debates que tenho feito, em função da criança, esse membro da sociedade conjugal que é indefeso. Isso tem me causado uma grande preocupação. Fui Presidente Nacional da Funabem, – é uma informação que estou passando para aqueles que nos visitam – e tive oportunidade de falar em mais de 80 encontros, por este País afora e visitar 17 das nossas maiores instituições e encontrei, pelo menos, 1.400 menores registrados como Pedro, como João, como Antônio, como Paulo, como Tiago, sem direito a um sobrenome, porque foram apanhados no caixote de lixo, encontrados na porta de uma casa, levados para o Juizado sem se saber quem eram o pai e a mãe, essas crianças foram mandadas para a Funabem e precisavam fazer uma ficha, e os juizes têm determinado que se dê um nome a essas crianças, que se dê um prenome; já que não se pode dar o nome de família dá-se um prenome. Vejam bem que a conseqüência desse relacionamento familiar tem sempre recaído contra o filho e não apenas ao abandonado do ponto de vista social, mas ao abandonado do ponto de vista moral. Encontramos menores abandonados em famílias ricas, menores cercados do fausto, do luxo, mas abandonados pelo pai que vai para um lado e pela mãe que também vai para o outro; menores que não têm com quem conversar, senão com a empregada ou com o vizinho e eles então começam a constituir a sua própria sociedade. Quem pensa que o menor abandonado não tem a sua família, está enganado. Tenho uma vivência muito grande nessa área, de dez anos já, e tenho encontrado grupos de menores na rua que têm o seu chefe ou sua chefe, portanto, que têm o seu comandante, na falta do pai, da mãe, da família. Eles criaram a sua própria família, eles não se subverteram, porque não têm cons- ciência disso, mas não tiveram ocasião de assimilar esses valores que chamamos de valores familiares; eles criaram seus próprios valores, seu conceito de honra, seu conceito de vida, seu conceito de ordem, seu conceito de disciplina e seu conceito de obediência, nos grupos que vão se formando por esse País afora. Exemplo poderíamos ter, num fato que tenho mencionado já, pela quarta fez, nos menores da rodoviária daqui de Brasília. Ali, há um menorzinho que é socorrido por outro e, numa noite, encontrei esse menor mais velho, deitado, encostado numa daquelas colunas e o pequenininho dormindo encostado no peito dele. É o pai, é a mãe, é a família que ele tem. Acho que a sociedade brasileira tem que pensar, repensar essa questão do relacionamento familiar, em função também e, especialmente, do interesse do pequeno indefeso, inocente, do que não tem culpa, do que não pediu para vir e veio, e que, na maioria das vezes, não só nos lares pobres, se acham abandonados. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Gostaria de formular uma pergunta para a nossa debatedora, já que estamos preocupados também com a questão do menor e vamos dedicar um período grande para debater essa relação de direito. O que ela teria a propor no aspecto da relação familiar da sociedade conjugal, dentro dessas relações na sociedade brasileira, para que o Estado garanta a esses membros da família que ficam desprovidos do pai ou da mãe, ou do pai e da mãe, e que tenham que viver por aí, à própria sorte. O que ela teria a propor para nos ajudar a formalizar, a formular no texto da Constituição de forma a garantir, a esses meninos e meninas, já fora do vínculo familiar, o direito a uma família dentro dessa nova conceituação. A SRª COMBA MARQUES PORTO: – Inicialmente, acho que sua pergunta em relação ao que fazer, com o que já perdeu essa vinculação com o núcleo familiar, pressuponho... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Queria dizer o seguinte: temos o conceito de família no art. 175, da Constituição, a família constituída pelo casamento, mas se propõe, agora, o reconhecimento da família de fato, não apenas a família de direito, mas das uniões de fato. Queria saber, dentro deste contexto, como protegermos o direito da criança, nesse novo conceito de família? A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Somando a preocupação do nosso colega Presidente da Comissão, Constituinte Nelson Aguiar, com a minha, eu trabalhei durante três anos e meio na área social, no Espírito Santo, como esposa do Governador Gerson Camata, e vivi muito o problema da mãe solteira. Isso é uma coisa que me preocupa muito, porque todo o reflexo dessa falta, desse descompromisso, dessa irresponsabilidade do homem também para com essa mulher reflete-se na nossa sociedade de hoje nos menores que estão na rua e nos que virão. E era muito comum a busca dessas mulheres, de apoio, de assistência, para que pudessem ter um enxoval, alimentação e tentar dar educação a esses filhos, mas o Estado não tinha como; legalmente ele não tem obrigações para com essa mãe. Ouvimos muito, nos trabalhos que fazíamos, pessoas chegarem e dizer: 'Você não deve fazer ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) isso, porque está estimulando a cada dia, mais mulheres com mais crianças e a sociedade sem um lar, sem uma formação. "Isso traz-nos uma preocupação, como mãe que sou também, e não vejo uma solução a curto prazo, acho que a nossa Constituição deveria garantir a essa mulher também, que ela tivesse, talvez não o seu marido, porque esses homens a cada dia constituem uma família de fato, não de direito, eles têm um, dois, três filhos e quando realmente está difícil para sustentá-los, ele pula para outra e lá vêm mais um, dois, três e a deixa; vai para outra, e essa mulher fica sem creche, sem assistência médica, sem educação para esses filhos. Praticamente não existe, não sei, nesse meu trabalho não consegui um conceito de como poderíamos fazer para que tivéssemos a garantia de que a nossa sociedade fosse mais justa, existem direitos, obrigações e deveres a serem cumpridos pela mulher e pelo homem, principalmente o homem. As pessoas dizem que a mulher dá a brecha, que ela é safada, sempre têm esse conceito; mesmo no caso da violência sexual, é porque ela deu bola e ele foi. Pareceme que isto faz parte da formação do nosso povo; ele é machista, e não podemos esperar uma evolução de um dia para o outro, mas acho que a Constituição tem que se preocupar com esses problemas que estão aí, são a nossa realidade. É preciso haver uma reflexão e ter limites para que possamos fazer uma sociedade mais justa e um futuro, amanhã, um pouco melhor do que vivemos hoje, no nosso País. Somando-se à preocupação do Constituinte Nelson Aguiar, e a Senhora Comba já nesse trabalho há mais tempo desenvolvido junto às mulheres, se tiver alguma proposta, faça-a para que possamos garantir na nova Constituição que casos como estes, que a cada dia aumentam mais, tenham pelo menos deveres e obrigações a serem cumpridos. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Acho que as respostas a essas observações estão, de certa forma, inseridas na nossa proposta já articulada. Evidentemente, em termos de texto constitucional, não se pode descer a detalhes e é preciso que se construa a futura Constituição de tal maneira que ela opere as mudanças necessárias nas leis ordinárias, que irão descer aos detalhes de como disciplinar todos esses direitos. Com relação à questão levantada de haver efetiva proteção ao menor, a criança, ao menor de idade, dentro desse contexto familiar, eis o artigo que propomos: "A família constituída civil ou naturalmente tem direito à proteção do Estado e à efetivação de condições que permitam a realização pessoal de seus membros". Acho que, em parte, aqui atingimos a essa sua preocupação. Que proteção é essa? Porque aqui não se poderá formular de outra maneira, está formulado genericamente: "...a Proteção do Estado". Que proteção é essa, em que o Estado vai ter que se preparar e municiar para fornecer, ajudar a esses membros da família? No plano das mulheres e dos adultos, eu ressaltaria a questão de uma reformulação ou de uma estruturação de uma ordem econômica – o que, aliás, vem sendo objeto de preocupação atual dos milhões de brasileiros – de tal maneira que as pessoas tivessem garantido o trabalho e a estabilidade no trabalho. Parece-me um fator de desagregação familiar passa evidentemente, e muito, por esse aspecto da inserção da massa humana, dos brasileiros e brasileiras no mercado de trabalho, de uma maneira estável; quer dizer, não é de hoje que nós, advogados, pela OAB, estamos lutando pela estabilidade no emprego; estabilidade que, de certa forma, até o advento do Fundo de Garantia, nós tivemos, e que depois acabou. Houve um momento, inclusive, logo depois da vigência do Fundo de Garantia, em que a mão-de-obra perdeu toda e qualquer garantia de emprego, as pessoas não sabiam o que seria o dia de amanhã e essa situação ainda persiste. Dentro dessa idéia da constituição de família, pessoas casaram-se, nasceram os filhos, é preciso que essa família tenha um mínimo de condições de seu desenvolvimento pessoal. No caso dos adultos, penso na questão do trabalho, considerando que já é adulto. Do ponto de vista das crianças, a questão da educação. A Constituição em vigor prevê que a educação será gratuita, pública, entretanto sabe-se que não existe a garantia do ensino gratuito à totalidade da população. As crianças estão mesmo fora da escola, as crianças não passam da quinta série. Há pesquisas estatísticas que dizem que da primeira a quinta série é o momento em que as crianças saem das escolas, parece que há um índice de reprovação muito grande na primeira série e a criança já começa a ficar com aquela pecha de menino diferente, que não consegue aprender, e dali sai da escola e não há essa efetiva garantia de educação. A questão das creches também. Não essa creche, conforme está formulada na CLT, porque na verdade não temos o direito à creche. Aliás, a palavra creche não está escrita no texto constitucional em vigor. Deve passar a constar o direito à creche, como um direito de todas as crianças de 0 a 6 anos. O que temos disciplinado em termos de creche é um direito das mulheres que trabalham, e mesmo assim as que trabalham com carteira assinada, portanto, regidas pela CLT. Sabese que o maior contingente de mulheres no Brasil trabalha fora da tutela do contrato de trabalho regido pela CLT. São as mulheres que estão exatamente nessa faixa do mercado informal, portanto, sem direito à creche. O homem trabalhador não tem esse direito pela CLT. Então, é preciso que o Estado assuma essa efetiva responsabilidade sobre a família, construindo, criando, uma rede nacional, de creches não vinculada a contrato de trabalho, mas sim à creche comunitária, aquela próxima à região que a pessoa mora, na qual ela deixa a criança durante o dia, portanto, a criança já não está na rua. Porque hoje sabemos que mesmo que a família esteja organizada, tenha pai e mãe dentro de casa, as crianças ficam literalmente na rua, porque não há onde deixar, ou então trancadas dentro de casa. Quando foi falado aqui que mesmo a criança da classe média vai buscar uma família, essa família é a televisão; ela busca uma companhia que é a televisão, que, diga-se de passagem, é outra questão que há de ser pensada pela Constituinte – a questão dos meios de comunicação – uma televisão que se ligarmos o dia inteiro e tivermos a paciência de ficar assistindo das 7 horas da manhã às 11 da noite, é uma televisão que não reforça o aspecto educativo, pelo contrário, o que as crianças aprendem na televisão é a violência. Outro dia um filho meu estava brincando na varanda e de 28 repente veio gritando, berrando, porque havia levado um susto horrorosa, e eu perguntei: "O que foi?" E ele respondeu: – "Bateu um bichinho na minha perna e eu pensei que fosse uma bala: isso porque moramos perto de uma mata". Uma bala de revólver! Quer dizer, a criança respira violência pela televisão; quando um menino há 15, 20 anos atrás, ao ver um bichinho batendo em sua perna iria imaginar que era uma bala raspando em sua perna? A criança vive nesse contexto de absoluta violência. Penso que a questão dessa efetiva responsabilidade do Estado, entra na estrutura da Constituição que V. Ex.ª irão fazer, nesse campo da família, nesse campo da educação também. Como se pode garantir o acesso de todas as crianças ao processo formal de educação à escola? E não só aquela que se opera dentro de casa? Nessa parte sobre as creches, nas tutelas especiais e, em relação à mãe solteira, que a Constituinte Rita Camata levantou, entendo que há que se admitir a reformulação da Lei de Registros Públicos, de tal maneira que a mãe possa chegar ao cartório e dizer: "Nasceu uma criança e é filho de fulano de tal", como já ocorre em alguns sistemas jurídicos. O Código Português, sob esse ponto de vista, é maravilhoso, porque dá um tratamento distinto entre a maternidade e a paternidade. Ele diz aliás o que é muito bonito, que a mulher tem o direito de registrar o filho, seja casada ou solteira, com a presunção de que o pai seja o marido da mulher. Ele avoca a questão da filiação para a mulher, que é a certeza da maternidade, e garante na lei, no Código, a investigação de paternidade inclusive com uma ação pública, como propomos aqui. E como seria o procedimento? A mulher engravida, tem o filho e vai ao cartório e diz "esse filho é meu e de fulano de tal". O que faz o registro? Chama o cidadão. Se ele estiver de acordo – porque às vezes eles até estão, mas como não há possibilidade do registro eles nem aparecem – completa-se o registro, se diz que não está, o próprio registro encaminha a questão para o juízo. Aí é o aspecto da ação pública, para que o juiz averigúe essa paternidade. Se ele não existe, se o filho é de mãe solteira mesmo, se ele sumiu no espaço, penso que aí há que se garantir à mãe solteira uma pensão especial para a criação desse filho, como existe em vários outros sistemas jurídicos. Nos Estados Unidos a mãe solteira tem absoluta proteção, assim como o deficiente físico. Tenho uma sobrinha assim. E minha irmã outro dia me disse: "Tenho uma reivindicação para a Constituinte e você que anda por lá poderia sugerir". O deficiente físico, seja filho de mãe solteira ou não, de família normalmente constituída, tem que ter uma proteção especial do Estado, tem que ter uma pensão especial. E ainda mais, disse-me ela: “Tinha que ter 5 vezes uma pensão especial, porque um deficiente físico vale por 5 crianças dentro de casa". E sabemos que isso é verdade. O deficiente físico no Brasil é absolutamente marginalizado e discriminado, por isso que nós, no princípio da igualdade, colocamos aqui: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção". Inclusive, mencionando o caso dos deficientes físicos e mentais, porque no Brasil não há a possibilidade de um deficiente físico ter igualdade com os outros. No metrô do co está destinado aos deficientes físicos". Entretanto, o deficiente físico não pode entrar na esta- 29 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ção do Metrô porque não tem por onde passar, a não ser que seja carregado no colo por alguém. Não sei se respondi bem à sua questão porque também não tenho clareza de como se transpõe da lei para a realidade, porque isso é uma coisa que se vem observando nessa nossa atividade. Eu, como advogada, venho há 10 anos discutindo o art. 233 e outras leis, em relação à mulher e percebe-me que também não adianta só mudar a lei. É o que V. Ex.ª falou. Como é que se consegue avançar mais nesse processo? É fundamental a mudança da lei, até em certos casos, como no das mães solteiras, se ela vai ter direito ou não a uma pensão especial pela condição de mãe solteira, isso é uma coisa que a lei irá disciplinar. Há coisas que são muito concretas, que ficam escritas, agora, outras tantas necessitam de um processo de reeducação, de constituição de uma outra cultura que é a cultura do respeito humano, pelo respeito aos direitos humanos; é a cultura não autoritária. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Dra. há um problema aí que está em torno de tudo isso. O problema crucial, a solução de muitos casos, principalmente, nas áreas metropolitanas, é do planejamento familiar, do controle da natalidade, porque há uma densidade demográfica crescente. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Não democrática. O SR. CONSTITUINTE FLAVIO PALMIER DA VEIGA: – Vivo no Rio, freqüento favelas, e lá quando se inaugura uma escola já há muitas sem as mesmas. No que se refere ao problema da criança abandonada existem mais de mil ao mesmo tempo sem amparo; mãe solteira temos um elevado índice. Qual a sua opinião a respeito desse problema? A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Quando se colocou a questão aqui pensei em que ponto da Constituição estaria afeta essa questão. Na ordem econômica e social? Na questão do trabalho? Na questão da família? Na educação? Temos um capítulo que trata da saúde; mencionaria isso mas com ressalva muito especial, porque toda vez em que se discute o menor abandonado, e este já traz em si uma carga, porque aqui no Brasil, o conceito de creche – V. Ex.ª., talvez, conheça melhor do que eu, porque trabalhou nessa questão – está associado muito a essa assistência ao carente. Entendo que devemos começar à pensar na assistência ao não carente, para que não haja o carente, quer dizer, reformular a questão preventiva. Não adianta ficar pensando, depois que o fato já aconteceu. No que tange ao planejamento familiar, entendo que, preliminarmente, temos muito cuidado para não fazermos uma associação muito perversa e perigosa da questão da pobreza, com a questão da natalidade, no sentido de vir a reforçar uma política controlista da natalidade. Nós mulheres que temos discutido essa questão à exaustão, porque nos diz respeito; somos as agentes da maternidade e do planejamento familiar, porque é sobre o nosso corpo que isso vai acontecer, ou já está acontecendo há muitos anos no Brasil de uma forma absolutamente anárquica. É preciso que frisemos que quando reivindicamos a assistência integral à saúde da mulher, no sentido de que lhe possa ser dada opção de ser mãe ou não, ou seja, as garantias para a maternidade com pré-natal, assistência ao parto, licença à gestante de acordo com a CLT, etc, e, igualmente, o direito de ser esclarecida e de ter à mão acesso ao controle da sua reprodução, isso não pode, de forma alguma, importar numa visão de controle demográfico. Quando pleiteamos isso, fazêmo-lo do ponto de vista da saúde da mulher, da maternidade e paternidade responsável. Há que se envolver os homens também nesse processo. Porque até hoje a maternidade no Brasil é uma questão da mulher. O homem não assume, ele é o chefe da família mas não assume esse encargo. Ele é notificado: "Oh! Meu filho, você vai ser pai". Ele não sabe bem quando vai ser pai. Quer dizer, há que se fazer uma educação voltada também para os homens do ponto de vista médico, psicológico, para prepará-lo no sentido de que a maternidade seja uma opção consciente, de tal maneira que, indiretamente, evitemos esse processo desastroso da maternidade e da paternidade humana ser equivalente à dos animais. Porque as pessoas reproduzem sem a menor noção. Faço sempre a ressalva de que isso não é uma questão demográfica. Sou, absoluta e terminantemente, contra qualquer visão político-estatal, sobretudo estatal, que venha a impor às pessoas o número de filhos que devam ter, o espaçamento entre esses filhos. Somos contra isso. Queremos que, como ser humano, o homem e a mulher tenham acesso a um número maior possível de informações e métodos. Porque não adianta chamar uma mulher da favela, explicar como tudo tem que ser feito, sem darlhe as condições necessárias. Sabemos que os métodos anticoncepcionais existentes são, na maioria, precários e lesivos à saúde; os menos lesivos – para perceber como é dramática a questão – como o diafragma, por exemplo, é absolutamente inacessível a uma mulher de classe média. Um diafragma está custando 1 mil e 500 cruzados e uma geléia custa 500 cruzados. É preciso que a ciência evolua no sentido de pesquisar novos métodos não lesivos à nossa saúde e que seja feito no domínio de saúde e nunca no domínio demográfico, porque não estamos interessados, não seria o melhor projeto democrático para o Brasil acabar com a pobreza, os menores abandonados, acabando com o direito da pessoa ter filhos em condições justas, humanas, com garantias de habitação, trabalho, salário, de condições mínimas de sobrevivência, de transporte de creches, de hospitais, de escolas, enfim, tudo isso que, junto, torna-se o ideal procurado por todos mas que, muitas vezes, tem-se a impressão de ser inatingível pelo menos nos próximos vinte anos. Às vezes, pensamos que não há jeito, mas tem de haver. A Assembléia Nacional Constituinte tem que ser o passo decisivo para chegarmos lá. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estamos atentos ao pronunciamento e ao debate da nossa convidada, que está servindo especialmente para evidenciar a grande controvérsia que temos em torno de toda esta temática. Há um ponto para o qual devemos ficar atentos: a questão da igualdade no relacionamento familiar, e em todo o relacionamento societário. Assistindo a um debate entre um Reitor e um estudante universitário, que estava preocupado com a qualidade do ensino, que tem o direito de se preocupar com a qualidade do ensino. – "Que profissional serei eu, com a qualidade de ensino que tenho?" Para chegar à universidade provavelmente ele se utilizou de um sistema educacional desigual de conquista daquele espaço. Ele não estava preocupado com a igualdade de meios para se chegar à universidade, e sim com a qualidade do ensino que está recebendo, para que amanhã ou depois possa ser um profissional, para servir a um setor da sociedade. Vamos pensar na questão da educação. Num sistema educacional em que a educação é desigual, se estamos pensando na qualidade da educação, estamos afastando o povo das possibilidades de conseguir esta educação, estamos elitizandoa em favor daqueles que dispõem dos meios para alcançá-la. Penso que a grande questão com a qual tem que estar preocupada esta Constituinte diz respeito à igualdade, em todos os ramos do relacionamento da sociedade brasileira e, no caso específico, na questão de igualdade de direitos na relação familiar desta comunidade. Como garantir esta igualdade de direitos? Quando o nobre colega toca, por exemplo, na questão do controle de natalidade, eu tremo, como o faço também com relação ao planejamento familiar. Porque esta deve ser, acima de tudo, uma decisão do casal, do homem e da mulher; da comunidade, no sentido de orientar o casal, mas não no sentido de formular propostas que devem constar da lei de forma compulsória a que essas pessoas pratiquem o controle da natalidade. Na Constituição da China está escrito que o planejamento familiar é obrigatório. Sabemos da situação da China, que tem hoje mais de 1 bilhão de habitantes. Vamos pensar no Grande Rio de Janeiro, onde temos 402 favelas. Se fizermos uma pesquisa criteriosa, iremos ver que, das 402 favelas do Grande Rio, os seus habitantes são quase todos egressos do campo, nos últimos 20 anos. Estão amontoados na cidade, não porque suas famílias sejam numerosas, mas sim porque saíram do campo, deixaram o seu natural habitat. Essa população, que está amontoada em cidades como o Rio de Janeiro e São Paulo, poderia estar no seu natural habitat e aí não estaríamos sentindo o problema nem os seus efeitos, como temos lá, no campo, na roça, famílias com 12 filhos, dos quais não estamos sentindo os efeitos, porque eles estão criando problemas para nós, na cidade onde estamos vivendo. Penso num país como o nosso, com quase 9 milhões de km2 de terras férteis, voamos do Rio para Manaus, 4 horas e 20 minutos sobrevoando esse vasto território desocupado, com enormes faixas de terra sem habitantes. Por que, então, não procurarmos, como forma de ajudar a solucionar esse problema, garantir a quem está no campo a sua permanência e possibilitar o retorno dos que querem voltar? Sei que muitos o querem. Porque ajudamos a formar a Associação dos Trabalhadores SemTerra, do Bairro Mariortis, de Vitória, que vieram do campo para fazer uma experiência na cidade, e que não deu certo. Formaram então uma associação e conseguiram terras com o Governo do Estado do Espírito Santo ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) e estão morando num acampamento cerca de alguns quilômetros da capital: voltaram para o campo! Eram homens da roça, acostumados no campo; passaram por uma experiência dramática com as suas famílias na cidade e resolveram voltar para o seu habitat natural. Os institutos estrangeiros, que estão financiando o controle de natalidade por meios mecânicos aqui no País, são grandes institutos norte-americanos – vamos nos lembrar, por exemplo, que o relatório Rockfeller colocava como uma das exigências para financiar projetos no Brasil o controle da natalidade. Vamos pensar, por exemplo, nos grandes grupos estrangeiros que têm interesses aqui já consolidados, adquirindo empresas que adquiriram terras no Brasil. Estou querendo ater-me a um aspecto específico, mas acho que esses aspectos têm a ver com a grande discussão da questão da família, do controle de natalidade, dos processos, porque na verdade o planejamento familiar é uma forma do controle de natalidade. Ele não deixa de ser uma forma de controle de natalidade. O que quero dizer é que no centro dessa discussão tem que estar o casal – o homem e a mulher juntos, a mulher, especialmente, tem que estar: essa tem que ser uma decisão pessoal, até por uma questão de respeito à pessoa. Uma mulher que tem 10 filhos e não quer ter 11, não sabe como evitá-lo. É uma questão de o Estado prover os meios de informação para que ela possa tomar a decisão de não ter o décimo primeiro filho, que ela acha que não deve ter. Não tenho uma idéia acabada a respeito disso. Na verdade, a respeito disso tudo que temos discutido aqui, não tenho uma idéia acabada. Não tenho idéias que não possam ser discutidas, aceitas, rejeitadas, emendadas. Todos nós estamos aqui em busca de filtrar nessa Subcomissão a média do conhecimento, das expectativas, do saber e do direito do povo brasileiro. O que acho importante é que há uma grande preocupação nacional. Não acredito que a sociedade brasileira, hoje, está preocupada, por exemplo, com o menor abandonado, que ela de repente tenha ficado boazinha, tenha enchido o coração de piedade cristã e resolveu amparar este menor. Não acredito. É que este encostou a sociedade brasileira na parede, e de armas na mão, está matando, assaltando, estuprando, pilhando, pedindo, bancando o profeta da tragédia nacional nas ruas do nosso País, aqui, há poucos metros dos Ministérios e do Palácio do Planalto, ele está aí presente. E por isso mesmo a sociedade se encontra amedrontada, coagida, e pede uma solução que não está sabendo dar. Temos que travar uma grande discussão, mesmo depois de elaborado o texto, em torno deste assunto, em busca de um caminho, porque me parece que a solução irá depender de repensarmos, inclusive, o modelo da sociedade brasileira. A SRª COMBA MARQUES PORTO: – Só mais uma observação: durante os debates eu estava pensando na primeira preocupação. Quer-me parecer, a nível de dúvida mesmo, porque não tenho a menor certeza em relação a essas questões, mas do ponto de vista da criança, do menor, como foi levantado, esses 6 milhões de menores sem registro, mais 36 milhões... O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Só quero lembrar que colocamos o menor, aqui advertindo que essa definição é técnica, é definição adotada pela FUNABEM, compreendendo o ser humano, a pessoa na faixa etária de 0 a 18 anos. A SRª COMBA MARQUES PORTO: – Sim, mas a questão do menor chamado carente, o menor abandonado que está na rua, que não tem mais unidade familiar, eu não colocaria como causa prioritária, na questão da dissolução do casamento. V. Ex.ª levantou a questão da Reforma Agrária, quer dizer, a questão do direito à terra, da fixação do homem à terra; se olharmos por esse ângulo, veremos que não é propriamente a dissolução do casamento, da chamada sociedade conjugal, que determina esse nível de crise, de abandono das crianças. Há crianças realmente abandonadas, por exemplo, pelos Poderes Públicos dentro de uma estrutura de família arrumadíssima, mãe, pai, casamento, tudo direitinho. Então, o que temos que ter é a garantia de que as pessoas casadas ou não casadas, em uniões de fatos ou até sem união nenhuma. Quando pensamos na questão do planejamento da reprodução, que assim chamamos por acharmos, propositadamente que é mais abrangente, porque quando se fala em planejamento familiar, só se está imaginando a família constituída pelo pai, e pela mãe, o marido e a mulher, chamo planejamento da reprodução como uma designação melhor, para contemplar os casos de mulheres que engravidam sem ser casadas – isso está acontecendo, até pela falta de orientação. Há registros de que o índice de gravidez em adolescentes aumentou brutalmente no Brasil, nos últimos anos e há também indicação, por uma pesquisa feita no Rio de Janeiro pela Drª Ester Kosonisky, que, inclusive, fez parte desse grupo de trabalho, de que a queda da virgindade na mulher caiu para 12 anos. Isso significa que houve uma liberação nos costumes sexuais e, entretanto, as pessoas não estão sendo preparadas para enfrentar essa nova vivência. Se o Estado através do seu mecanismo de proteção ao cidadão, garante que as pessoas, homens e mulheres, tenham todo esse conjunto de valores e de possibilidades de realização pessoal, quer no campo do trabalho, da moradia, da fixação do homem à terra, tudo isso, acho que tende-se a minorar esse drama da criança que se vê abandonada. Do ponto de vista moral, as pessoas facilmente esclarecem essa questão: as crianças não ficam abandonadas porque a mãe e o pai se separam. Não é! Por exemplo, quando aquela menina Mônica Granuzo foi assassinada brutalmente por um colega seu, por um menino da sua mesma faixa etária, no Rio de Janeiro, a primeira coisa que o delegado nos disse, eu estava presente na porta da delegacia foi o seguinte: "Isso aconteceu, porque os pais eram separados". Achei isso uma coisa cruel, porque isso poderia ter acontecido até com uma mulher de 40 anos que de boa-fé subisse, ao apartamento de uma pessoa amiga, então é falso supor que só a questão da separação determina esse descompasso e esse drama das pessoas que se vêem desvalidas. Porque se eu me separo do meu marido, mas tenho o meu emprego garantido, ele o dele; tenho uma boa escola para colocar os meus filhos e uma boa creche, eles jamais ficarão abandonados. Poderão ter problemas psicológicos decorrentes de uma ma transação da minha separação e mesmo as- 30 sim, se eu consigo me separar do meu marido e manter com ele relações amistosas, cordiais e de respeito, eu por ele e ele por mim, garanto que os traumas serão muito menos graves. É evidente que quando há separação o filho não pode continuar junto com o pai e com a mãe no cotidiano, se ficar com a mãe vai visitar o pai, se ficar com o pai vai visitar a mãe, isso é uma perda. Agora essas podem ser operadas de uma forma menos doentia, menos traumáticas, menos negativa, psicótica até, desde que as pessoas entendam que a separarão não é um castigo que veio do céu, para acabar com aquela família, para pôr todo mundo no limbo da amargura, pois é assim que concebemos urna separação. E também é a tal coisa, o salário do pai que já não da para viver junto, separado mesmo é que não vai dar. A mulher que passou a vida inteira ali, cozinhando, lavando, passando dentro de casa e não tem habilidade para trabalhar fora de casa com uma remuneração. Assim, ela não vai ter condição de prover aquela família. Então, não é a dissolução da família dentro desta ótica da relação conjugal, da sociedade conjugal; o que está faltando é condições para que a população – homem, mulher, criança, idoso – tenha condição de exercer a sua cidadania de sobreviver. É isto que está faltando na minha modesta opinião. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Para uma questão de ordem, prezada colega. Verifico que o debate está muito rico e muito válido, entretanto há alguns integrantes da Subcomissão que ainda não se pronunciaram. Gostaria de saber daqueles que ainda não questionaram a ilustre debatedora se gostariam de fazê-lo, e daríamos prioridade às pessoas que ainda não se pronunciaram. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Drª Comba Marques Porto, a senhora foi muito feliz na sua exposição. Como evangélico, e sentindo de perto o drama que meu companheiro acabou de abordar, porque para nós tudo seria válido, seria de bom alvitre que lutássemos para a manutenção da família legalmente constituída, mas vivemos uma outra realidade, à luz da própria palavra de Deus. Infelizmente, Deus . fez o homem reto, mas dizem as Escrituras que ele vai buscar muitas inovações, e é o que nós estamos vendo. E, basicamente do ponto de vista moral, o homem realmente contribui muito mais do que a mulher para a deformação desta sociedade, porque ele se vale dos seus anseios, da sua força, da sua maldade para destruir, e isto tem a força maligna que estamos vivendo nesses últimos dias. Deus, quando constituiu o lar, o fez de um só homem, para uma esposa só, os abençoou e ordenou a frutificação, a proliferação da espécie. E tudo ia bem, até o momento em que a sedução e o engano vieram, e a usurpação do inimigo buscou trazer o homem para distante de Deus. Daí a coisa começou a decair, e estamos vendo, como aconteceu nos dias de Noé, a extrema corrupção, a violência, que é um sinal dos nossos dias também, infelizmente, como a senhora disse, ficamos desanimados de buscar soluções a luz da lei, mas ela não vai adiantar nada, infelizmente, por mais que se busque em leis justas, porque este homem não se sujeita a máxima lei de Deus, que é o amor ao próximo, o de amor a si mesmo, ele não vai alcançar as leis humanas e não vai respeita-las. O que é lamentável. Mas digo que por 31 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) esta formação de educação, muita coisa pode trazer melhoras: uma formação mormente moral, espiritual, de que o valor da vida seja colocado na devida posição, em que não busquemos os nossos anseios, os nossos propósitos, seja marido, seja mulher, mas um contexto familiar, seja essa união estável, em termos da lei, seja ela formada, que admita o casamento, não apenas como uma formalidade legal, mas esta união que surge naturalmente e até este ponto se justifica, é a união que traz estes filhos naturais e que devem ser mantidos pela sociedade. Então, nós, como evangélicos, pelo menos eu, no meu caso característico, pessoalmente, acho que temos uma grande responsabilidade. Humildemente, confesso-me também incapaz de participar, como desejaria, dentro do aspecto do nosso ideal cristão, mas a sociedade não está preparada para este tipo de coisa, ela está sempre fugindo dos anseios de Deus, mas uma minoria está vivendo estes anseios e tem sido possível manter casais ajustados com 50, 60 anos de vida conjugal, o que é uma felicidade. O que pode ser um exemplo para os demais. Mas, infelizmente, as coisas deverão acontecer assim até que haja uma mudança na ordem mundial, quando Cristo estabelecer o Seu Reino, vai ser diferente, porque saberá julgar com justiça e com vara de ferro as nações. Então, como será a Constituição naquele tempo, eu não sei. A Bíblia fala que Ele vai reinar com vara de ferro sobre as nações, não será tolerante, não será permissivo, mas será com a reta justiça. Mas, como humanos que somos, sinto-me feliz de, numa proposição que tenho aqui diante de mim, do companheiro Nelson Aguiar, em que S. Ex.ª aborda temas semelhantes àqueles que a senhora, a Associação e os Ministros têm apresentado, em que S. Ex.ª fala que a família é constituída pelo casamento e por uniões estáveis entre os cônjuges, inclusive os filhos. Então, em que pese a minha formação cristã, vejo-me constrangido a admitir uma acomodação social, uma questão de realidade; sinto-me inclinado a também ter que assumir uma posição de apoio a certas proposições, mesmo que não sejam aquelas dos meus ideais. Muito obrigado pela sua atenção. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Muito interessante o seu posicionamento no sentido de acatar esta proposição da união/estado, como inclusive está disposto no projeto Afonso Arinos. Nós aqui, neste ponto, colocamos uma formulação diferente, ou seja, colocou-se a família civil ou naturalmente, e achamos que seria uma forma mais elástica de contemplar não só as uniões estáveis, como esta família natural, que resulta da mãe solteira, que é uma família, uma mãe solteira com um filho. Acho que realmente estamos avançando com este tipo de compreensão de sua parte, no sentido de encarar de uma forma mais realista e mais aproximada talvez deste próprio objetivo humano concebido dentro da própria visão religiosa de que V. Ex.ª falou. Acho que nesta troca iremos chegar ao denominador comum, respeitando inclusive todas as possibilidades de crença religiosa. O SR. CONSTITUINTE IBERE FERREIRA: – Todos nós aqui acompanhamos com a maior atenção e queremos inclusive, também, parabeniza-la pela exposição, pela maneira com que se conduziu nos debates até agora ocorridos aqui na nossa Subcomissão. Temos acompanhado os debates desta Subcomissão como também as propostas que têm sido encaminhadas, propostas do nosso Presidente Nelson Aguiar, do nosso companheiro Eliel Rodrigues, etc., de todas as propostas que têm sido encaminhadas à própria Comissão. Sou favorável à extinção do artigo 233, que a nobre Deputada já se manifestou sobre ele com tanta ênfase. Achamos que há um problema fundamental em tudo isto; podemos mudar tudo. Mudaremos os artigos do Código Civil, da Constituição, mas há um problema fundamental que comecei a sentir e que me parece que todos concordam que é o problema da educação. Pergunto se a Comissão já analisou, e se tem alguma proposta para um trabalho educativo porque sem ele é inviável e impossível mudarmos os artigos. Pergunto também se a Comissão já analisou o problema da censura. Não digo o termo, meio forte – censura, mas acho que teremos de votar uma censura moral, não uma censura política; mas uma censura moral é fundamental. Não podemos pensar em encontrarmos soluções para manter a família, para dar tranqüilidade ao menor, no momento em que vermos, assistirmos periódicos serem vendidos, revistas sendo vendidas, em todas as bancas de jornais sem nenhuma censura, a qualquer criança, a qualquer pessoa; televisão entrando na nossa casa, pregando a destruição do lar, da família etc. Há poucos dias vi lá na minha cidade, no interior, falavase que diziam: "Fulano está rico, fulano está ficando bem. E arranjou alguma mulher?" E até o sinônimo de uma pessoa de sucesso só se concretiza com um novo casamento. Assim, tudo isto vai destruindo e de nada vai adiantar o nosso trabalho, mudando os artigos, mudando o Código Civil, se não houver também um trabalho educativo e até certo ponto de censura nos meios de comunicação. Não adianta levar, de um lado, um grande programa de educação no País inteiro e, de outro, o maior meio de comunicação que temos, a televisão, o rádio, destruindo o que poderíamos construir ao longo de uma geração. Assim pergunto se esta Comissão do Direito da Mulher tem alguma proposta concreta e discutida sobre tais assuntos? A SRª COMBA MARQUES PORTO: – Sim. Temos em nosso articulado proposições que se referem a várias áreas de trabalho da Constituinte; evidentemente, não seria possível propor uma Constituição inteira. Tivemos aqui uma preocupação definida de fazer as proposições só do ponto de vista da especificidade feminina. O que dá para ver como é importante a questão da mulher, pois acabamos entrando em vários capítulos, mas sempre pelo viés, pela óptica dos direitos da mulher. Em relação à educação e à cultura, o nosso articulado propõe dos artigos: a Educação, direito de todos e dever do Estado que visa ao pleno desenvolvimento da pessoa dentro dos ideais de defesa da democracia, do aprimoramento dos direitos humanos, da liberdade e da convivência solidária a serviço de uma sociedade justa e livre – isso como pressuposto mais genérico. § 1º É responsabilidade do Estado assegurar a educação universal pública e gratuita em todos os níveis. § 2º As creches serão consideradas unidades de guarda e educação de crianças de 0 a 6 anos de idade. Art. A educação obedecerá aos seguintes princípios: a igualdade entre o homem e a mulher, o repúdio a qualquer forma de racismo e discriminação, a convivência pacífica entre os povos, o pluralismo cultural do povo brasileiro." Acho que este segundo artigo, onde nomeamos esses princípios, interessante. Quando V. Ex.ª explanou a sua questão, percebi que nos deparamos com um problema mesmo de qualidade do produto cultural e do produto educacional que nos é veiculado. Quer dizer, a nível da escola formal temos uma baixa qualidade de livros escolares, no que diz respeito a trazer embutidas as práticas de violência, as discriminações. No que diz respeito à mulher, o livro escolar é uma piada, isto é, a mãe aparece sempre de avental, a empregada é sempre preta, o pai está sempre lendo jornal e a mãe está na cozinha, a mãe é sempre meio burra. Quanto aos meios de comunicação, as propagandas de televisão até que melhoraram um pouco, se bem que começou a entrar num outro domínio também supercomplicado, que é a questão da exploração do objeto sexual, que é uma coisa para consumo de qualquer criança no horário das sete. Mas, enfim, nos meios de comunicação há uma visão esteriotipada da mulher. À mulher está destinado o papel de futilidade; ela só está preocupada com o cabelo, com o "shampoo". Se vai anunciar um pneu, tem que pôr uma mulher nua ao lado para anunciá-lo; quer dizer, o nosso corpo, diante dos meios de comunicação, é absolutamente vilipendiado, vendido como coisa, como objeto mesmo de apelo sexual, para a venda de qualquer produto, seja margarina ou pneu. Isso é uma coisa em que temos que ter um controle. Então, até talvez se substituísse a palavra – censura – que para nós ainda tem uma carga de um momento muito autoritário, em que a melhor produção cultural e artística foi efetivamente censurada. O que foi curioso, durante todos esses anos de autoritarismo é que os filmes pornográficos, por exemplo, cresceram como uma indústria vigorosíssima, quando a censura comia à solta as peças de melhor qualidade; as músicas do Chico Buarque, o teatro de Boal; enfim, as melhores produções foram censuradas, enquanto esses tais filmes pornográficos horrorosos, da pior qualidade, ficaram aí à disposição do consumo de quem os quisessem ver. Na questão do nosso corpo, as bancas de jornal, do ponto de vista de um desvirtuamento até da questão da sexualidade, estão cheias daquelas revistas de apelo sexual. Até que ponto aquilo contribui para o desenvolvimento da sexualidade humana, dos homens e das mulheres? Acho que no fundo reproduz um padrão: a mulher tem que ter corpo escultural. Acho aborrecido quando, dentro de casa, à noite, o homem tem ao lado dele aquela mulher que não é o padrão, mas outra pessoa que está marcada, que traz as marcas da vida, as estrias de várias gravidezes. Tudo isso acaba criando até um contexto de sexualidade completamente distorcido que se ba- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) seia, primeiro, pela falta de respeito ao próximo, do homem sobre a mulher, sobretudo, porque na verdade esse tipo de prática induz ao desrespeito do homem sobre a mulher. Quer dizer, assim como ele consome aquela revista que compra no jornaleiro, ele se dá ao direito de estuprar uma mulher. É lógico que tem toda uma conotação até, digamos, de desvio de comportamento em termos, porque o estuprador não é propriamente uma pessoa tão desajustada assim da sociedade. Ele pode ser um homem de família, um chefe de família que trabalha, que tem mulher, filhos e se dá do direito de desrespeitar uma mulher na rua. Assim acho que toda essa questão tem que ser revista. O produto cultural tem que ser repensado, isto é, de maneira que tenhamos igualdade de condições, não só as camadas médias, como o povo, e acesso a um produto cultural melhor. Quem disse que o povo não gosta de coisas boas? Na verdade as pessoas são massacradas por um produto cultural que é absolutamente desqualificado sob todos os pontos de vista, a começar pela televisão. É por isso que a questão da Constituição controlar a concessão dos canais de exploração, de meios de comunicação será uma medida superimportante. Porque, na verdade, a televisão é, digamos, domínio de quem queira. Se eu ficar muito rica e quiser comprar um canal de televisão para determinar o meu padrão educacional e cultural para pôr na tela, poderei fazer isso. Mas isto é um contra-senso. Queremos passar a V. Ex as o conjunto desse articulado com as justificações. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Estou ouvindo atentamente, estou feliz com a participação da Drª Comba Pôrto. Mas, fundamentalmente, o que está faltando para uma mudança em todos os sentidos, no Brasil – como estamos tratando do eixo família, a união do homem e da mulher, a submissão e os direitos – só há uma maneira que é a orientação prática, para a mudança desta formação moral, social, inclusive, espiritual da nossa sociedade. Há pouco nós estávamos ouvindo o nosso Constituinte que confessou, que é evangélico como eu sou também e Ministro da Palavra de Deus, faço casamento, atendo casais. Quero dar um testemunho disso: na última Sexta-feira da Paixão – Sou do Rio de Janeiro e pertenço a um segmento da Igreja Evangélica – lá, às nove horas da manhã enchemos o Maracanã, com uma lotação que só aconteceu no dia de Brasil versus Uruguai em 1950 e a maioria entre mais de 200 mil pessoas que a televisão anunciou depois, a imprensa escrita de igual forma, era mulher. E o que mais se constata no atendimento – porque a melhor maneira de se ver é como nós estamos debatendo aqui, um com o outro, conversando são os problemas. Sou casado há 27 anos, nunca ocorreu ao meu coração, a minha mente, a separação. Essa submissão em que se fala muito – há palavras que está se ouvindo aqui que não se encaixam bem, por exemplo, submissão, controle de natalidade, planejamento, como a Dra. falou muito bem, isso fere a palavra, a maneira de se dizer. Como no meu envolvimento espiritual, como Ministro da Palavra de Deus, fere também, pois não gosto de ser chamado de crente, gosto de ser chamado de cristão. São colocações de palavra que, no fim, mudam realmente situações e não somente colocações. O que mais precisa, realmente, é de orientação. Logo que cheguei ouvi a Dra. Comba M. Pôrto falar sobre o problema de a mulher não trabalhar devido à mente do homem. Antes, porém, quero falar da submissão, essa submissão que a lei divina – e não a lei do homem – impõe e ninguém pode mudar. A submissão não é isso que principalmente o homem faz. Ele pensa que a submissão é pisar na mulher, é dominar a mulher, é determinar o que ela deve ou não fazer. Falta orientação ao homem sobre a lei divina da submissão que ninguém pode mudar – não é lei do homem – não é esse cabresto que o homem quer impor à mulher, inclusive com violência. A submissão é algo de entendimento, porque não pode, numa casa, deixar de haver uma direção. É como quando estamos aqui. Se esta reunião não fosse presidida por um homem, que é tão deputado quanto eu e outros que aqui estão, se não tivesse a direção de alguém, não haveria como se reunir e entrar num debate. O homem precisa ser orientado quanto à submissão que tem no lar, é algo simples e não é o que temos visto não apenas no Brasil, mas no mundo. Quando eu era mais novo no casamento, também tinha essa mentalidade, porque adquiri dos meus pais, de que a mulher não devia trabalhar. Eu também pensava assim; contudo, uma orientação posterior foi me levando a uma mudança. Vejo que a mulher, agora, tem espaço, e como até na Assembléia Nacional Constituinte, hoje, temos mulheres, o que não havia antes, que eu me lembre. Hoje, vi também no "Bom-Dia Brasil" uma mulher de muito valor. Acho que a mulher tem espaço em qualquer situação. Havia duas mulheres, no "Bom-Dia Brasil", mas prestei mais atenção na Vice-Governadora de Minas Gerais, a qual está trazendo para a Assembléia Nacional Constituinte um assunto muito importante, que é o menor e que já foi debatido. Ela vem trazendo algo para ser visto, debatido e, inclusive, colocado em prática. A mulher deve trabalhar. Não vejo erro algum. Ela deve ter essa liberdade total. Estou confessando, aqui, que antigamente não pensava assim, mas era tudo falta de orientação. Quanto ao problema da separação do lar, creio que também deva ser orientado. Recebi um trabalho de um médico do Rio de Janeiro, Dr. Mário Leal Bacelar, sugerindo que o casamento, para ser feliz, deve começar antes da união real, civil e religiosa. Tem que haver a educação para que o casal seja levado ao exame pré-nupcial obrigatório, onde receberá a orientação sobre o que é casamento e após-casamento. Falou-se, aqui, que o amor acaba. Tenho uma experiência, a qual posso colocá-la como testemunha. Venho recebendo visitas de pessoas em gabinetes pastorais – e não são cem, mas milhares de pessoas que, por falta de orientação, não são felizes. O amor, realmente, que o mundo fala, só existe depois de um casamento onde há um relacionamento debaixo de uma orientação para uma continuidade. Aquela vivência de afeição, de bem-estar, de se querer bem um ao outro, de participar um com o outro – e isso é importante – infelizmente, num lar onde o homem acha por falta de orientação, que é o tal, não existe. É preciso 32 haver aquela amizade, aquele entendimento, o comum acordo em todas as coisas. Então, no decorrer de uma boa convivência, de uma boa vivência, quer no sentido moral ao educar os filhos, quer no sentido conjugal é que surge o amor. Nós, na Igreja Evangélica, orientamos muito as pessoas, no sentido de mostrar a felicidade do lar. A Srª há poucos minutos falou sobre a vida conjugal, onde o homem pensa que, no leito, vai ter a mulher semi-nua ou nua, que vê na televisão apresentando um produto qualquer, ou vê exposta nas revistas, ou nos filmes e novelas que expõem a liberdade de se trocar de mulher ou de homem. Esse homem pensa que, no leito, vai ter essa mulher, mas ele encontra uma mulher marcada pelas operações, pelas lutas, não somente de ser esposa como também de ser mãe. Isso tudo parte de uma orientação. Porque é na vivência que surge o amor; quando ele surge dentro de uma união conjugal não há nada que separe. E ainda que venha um problema de separação, deverá haver um processo, no nosso Brasil, na nossa sociedade, de orientação, para que este casal, ainda que na iminência de uma separação, possa se reconciliar. E não havendo possibilidade de uma reconciliação temos, no Brasil, o divórcio, que também tem que ser mudado, na espera de 3 a 5 anos. Acho que, uma vez não havendo a possibilidade da vivência, da reconciliação, deverá haver o rompimento com garantias, como a Srª colocou, para a mulher que será a ex-esposa, bem como para os filhos, inclusive prevendo punição drástica para o homem que foge, às vezes, do compromisso de não querer garantir a participação dos seus filhos e da sua ex-esposa. Gostaria que houvesse mais tempo para falar mais alguma coisa sobre isto. Inclusive, estou ansioso para ver o que a nossa Vice-Governadora de Minas Gerais está trazendo sobre o menor, porque o nosso Presidente tem muito cuidado com isso. Nós também. Acho que há uma possibilidade que deve ser colocada em prática, como tudo, porque só passar para o papel os nossos pensamentos e os nossos debates sem cumpri-los é como ler o Livro Maior, a Bíblia, e não praticar seus ensinamentos. Não se irá usufruir de benefício algum. O menor abandonado é uma verdade. Contudo, para tratar deste assunto, não é preciso saber se o seu lar é desajustado, se é filho de mãe solteira. O certo é que o menor abandonado existe. Como ouvimos, há pouco entre o Rio de Janeiro e Manaus existe um espaço muito grande de quatro horas e tanto. E já que se gasta tanto dinheiro nesta Nação com muitas outras coisas há de se convir também que se deverá investir no menor abandonado. Já que se deve tanto, e se devermos um pouco mais ou menos, nada irá alterar, num País tão rico como este, deve-se fazer o que já vem sendo feito numa continuidade evangélico. Em Fortaleza fui à uma chácara muito grande onde se trata de um problema também terrível no Brasil e no mundo: as drogas, a recuperação de viciados. Aqui em Goiás, em São Paulo, no Rio de Janeiro, o ex-Governador do Estado do Rio, Dr. Jeremias Fontes, possui uma associação, um grupo que trata dos viciados. Sou obrigado a dizer que foi um grande Governador. Pois bem, o que se deve fazer no espaço que temos em todo o Território nacional? É preciso 33 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) juntar como foi colocado aqui, o Governo Federal, o Estadual, o Municipal, a sociedade em si, para darem assistência ao menor, de uma forma prática e urgente, porque quanto mais demorarem, mais as cadeias irão ficando cheias. Esses menores só não fazem outra coisa, porque lhes não é ensinado. Estão na lei do cão, como se diz, roubando, estuprando. Há crianças de 10, 12 anos praticando um sexo desenfreado, sujeitas a doenças. Devemos colocar essas crianças em locais – e não digo FUNABEM, pois, segundo o olhar da sociedade representa uma repreensão – onde tenham educação e não somente para amanhã serem alguma coisa, mas também terem uma educação moral, espiritual, um lazer, um trabalho, para serem reintegradas à sociedade. O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Como Relator, depois de ouvir as colocações do nobre Constituinte Roberto Augusto, gostaria também de fazer algumas indagações, porque estou aqui raciocinando, verificando a grande dificuldade que terei em conciliar tantas opiniões divergentes, assim como outras que se complementam, mas que nem sempre podem ser conciliadas, no anteprojeto que deverei apresentar à Subcomissão. Parece-me que, num artigo, tenho que traduzir o que acontece em minha casa, ou seja, a história que diz que o chefe sou eu, mas quem manda é minha mulher. Este é o ponto mais importante. Contudo, deixando esta questão, ilustre Dra. Comba Marques Pôrto, tenho algumas indagações a fazer. Uma diz respeito ao problema da instituição da família. Conforme a proposta apresentada, o artigo diz o seguinte: "A família, instituída civil ou naturalmente, tem direito à proteção do Estado e efetivação de condições que permitam a realização pessoal dos seus membros." Acho indiscutível o problema da constituição da família, hoje, passar por esta questão da constituição informal ou natural, como o artigo define. Este "direito à proteção do Estado" também acredito ser uma questão que não recebe nenhuma resistência. Contudo, a minha dúvida é como poderíamos chegar a prever a solução de algumas dificuldades de ordem prática, já que temos a possibilidade de a família ser reconhecida quando instituída civilmente, ou seja, do ponto de vista formal, bem como a partir da própria Constituição ser reconhecida, quando instituída de maneira natural, de maneira informal. Por exemplo, sobre a questão da bigamia ou poligamia. Quando a lei institui o casamento civil permitindo também a sua dissolução e a constituição de um outro casamento, temos um fator de regularização deste tipo de sociedade, quando há limitação para que uma pessoa participe de mais de uma sociedade conjugal. Na medida em que a lei prevê esta informação da família a partir de uma constituição natural, como poderíamos dirimir este tipo de problema? Perante a lei, por exemplo, passaria a ter o mesmo valor uma pessoa que tem uma família constituída civilmente, e tem uma outra família constituída naturalmente? Este é o espírito da proposta ou esta forma de constituição natural ocorreria apenas na ausência de uma relação civil, de uma relação formal? Esta é a primeira dúvida. Uma segunda dúvida que coloco é muito mais de ordem pratica, ou seja, no tocante ao problema dos direitos iguais, os quais defendo inteiramente, procurando modestamente praticar. Acho que é algo muito importante, nos dias atuais. Muitas vezes um indivíduo defende uma determinada posição, assume uma determinada posição adotando, na pratica, um posicionamento totalmente diferente. Aliás, costumo sempre dizer que, na minha maneira de entender, a democracia começa em casa. Às vezes defendemos muito a democracia, lutamos por ela e a queremos mas não sabemos praticá-la na célula menor da sociedade que é a própria família. Quantas vezes pais ou mães impõem a seus filhos condições, decisões até de ordem profissional. Hoje estou com um problema, por exemplo. Tenho um filho que, talvez até realizando uma frustração minha, tem se revelado um músico de talento, não definindo até hoje, sua questão profissional. Já deverá fazer vestibular no próximo ano. Desconfio que ele quer fazer música mesmo. E fico nessa dúvida: música, é hoje, uma profissão que pode ser abraçada inteiramente? Tenho dificuldade para administrar, democraticamente, uma decisão que não deve ser minha, mas dele. Assim, quando esta proposta diz, no caput desse segundo artigo, que "o homem e a mulher têm plena igualdade de direitos e de deveres, no que diz respeito à sociedade conjugal, ao pátrio poder, ao registro de filhos, à fixação do domicílio da família... , começamos a ver que, na pratica, poderemos ter uma série de conflitos. Eu tinha dúvidas, por exemplo, a respeito da declaração da paternidade, do registro de filhos, pois a maternidade é algo quase sempre incontestável, sendo para a paternidade um pouco diferente. Mas verifiquei, aqui, a possibilidade de contestação dessa paternidade, o que me parece resolver essa dúvida. Inclusive na sua exposição e nessa justificativa, aparece a possibilidade da contestação na questão da paternidade. Ainda tenho um pouco de dúvida, aí, quanto ao problema de ordem prática, que decorre da própria morosidade da Justiça que, infelizmente, ocorre no Brasil. Vamos supor que uma mulher vá a um cartório e claro que tem um filho cujo pai é o Sr. Fulano de Tal, o qual, por sua vez, acha que não é o pai, contestando essa paternidade. Ele pode contestar. Entretanto, pelos processos normais da Justiça, o que ocorre é uma demora muito grande entre uma coisa e outra. Vamos supor que, no final das contas, pelos métodos científicos existentes, ele prove, realmente, que não é o pai daquela criança. Nesse intervalo de tempo, como poderão ser sanados danos de ordem material e até mesmo de ordem moral que possam ter ocorrido? Sobre a questão do domicilio, vamos supor que entre um casal surja um conflito de uma conveniência de se morar na cidade A ou na cidade B. Ambos têm o direito de definir isso. Como, na prática, isso irá acontecer? São dúvidas que tenho a respeito desse problema. Vamos imaginar que, na maioria das vezes, normalmente haja uma combinação de interesses, uma conjugação de interesses nessa definição, mas suponhamos que exista um conflito nessa determinação, por exemplo, do domicílio. Como isso será resolvido, supondo-se a permanência do vínculo conjugal? Esse conflito hoje pode existir – e existe – e via de regra termina com, por exemplo, a não aceita- ção, por parte da mulher, sobre a questão do domicílio, o que irá redundar fatalmente, na dissolução dessa sociedade. A partir do momento em que a lei, em que a Constituição estabeleça que o direito de escolha do domicilio é igual para ambas as partes, como esse conflito irá ser dirimido sem comprometer a relação conjugal? A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Nobre Relator, deixe-me colocar, aqui, a minha preocupação, do outro lado da moeda. Hoje, o homem tem o poder de decisão. Se a mulher acompanhar essa decisão, será que esse casamento estará garantido? O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Acho que não, porque na prática, esse direito já existe. Sou muito inclinado a ver o texto legal como a tradução de uma realidade ou, muitas vezes, como uma coisa factível. Acho que a lei não precisa ter determinados detalhes já orientados pela prática. Esse direito, hoje, já existe. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Vamos escrevê-lo, então, na nova Constituição. O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Muito bem. Talvez como uma homenagem à mulher. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Não. Como um direito. O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Mas esse direito já existe na prática. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – É só assegurar isso na nova Constituição. O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Mas esse direito já não existe? Vamos examinar na prática. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Gostaria de interrompê-lo só um minuto, para falar do caso que temos aí de colegas nossos que estão morando aqui e as esposas não querem vir para Brasília, morando em seus respectivos Estados. Então, acredito que isso deva ser uma opção de cada um. Somos cidadãos, temos que ter nossos direitos garantidos, assegurados na nova Constituição. Acho ser uma violência esse dispositivo em que diz "a mulher tem que acatar uma decisão domiciliar do marido". Tenho dito que não sou feminista, vejo a coisa mais do lado prático. Não vejo como possamos ter uma Constituição que dê esse direito que para mim não é direito, mas uma agressão à mulher, à instituição, à família, porque no casamento deve-se resolver tudo através do diálogo, através de consenso. Então, não entendo essa garantia na Lei, que iremos alterar esse quadro que aí está. O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Acho que isso já ocorre na prática. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Lutamos por democracia, vamos escrever democracia neste artigo. A SRA. COMBA MARQUES PÔRTO: – Nesse plano das relações familiares também! O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – Permita-me citar uma passagem de Rui, que diz: "Toda lei é boa se houver no julgador a virtude que o legislador não teve". Às vezes, o legislador fez uma lei bonita, mas fora da realidade, outra hora, a lei não é boa, mas quem vai aplicá-la o faz ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dentro do senso de justiça. Sobre a questão para a Constituinte, eu falava há pouco com as duas doutoras, é a da busca de relações justas. Essa é que tem que ser expectativa do Direito, porque se direito é desigual, os que o têm lutarão para mantê-lo, e os que o não têm lutarão para alcançá-lo e, aí, se estabelece o conflito. Estamos hoje observando, na sociedade brasileira, uma sociedade injusta. Talvez uma das relações sociais mais injustas do mundo é a que temos em nosso País, em termos de manutenção de privilégios e busca de direitos! Falava eu a respeito da Educação. Se a educação é desigual quem a tem irá lutar pela qualidade de educação – está só preocupado com a qualidade não estão preocupados com a garantia desse direito por outras pessoas. Se tivéssemos a igualdade ao direito de educação, todos juntos lutaríamos pela qualidade. No dia que tivermos o direito igualitário para todos, todos juntos lutaremos pela qualidade, todos juntos lutaremos pela manutenção desse direito. Porque o direito, hoje, em muitos aspectos da sociedade brasileira representa privilégios de alguns: os que não têm estão lutando por esse direito, os que têm estão lutando para mantê-lo, mesmo em forma de privilégio e aí vem se estabelecendo um conflito na sociedade. Ora, se vamos colocar na lei, relações injustas ou relações em que coloquemos o julgador na obrigação de decidir por outros princípios, e o juiz já tem hoje a faculdade de dirigir, com base na livre apreciação da prova, nos Princípios Gerais do Direito, acho que a elaboração constitucional deve ter o cuidado de pensar na justiça. E temos que admitir que, na maioria dos casos na relação do direito familiar, o lado ruim está para a mulher. Temos que admitir isso! O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – Não estou dizendo em contrário. O que estou querendo levantar é o seguinte: acho, na minha opinião pessoal, que uma Constituição não pode descer a detalhes... O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – Isto é verdade! O SR. RELATOR (ERALDO TINOCO): – ... que a prática já consagra ou que devam ser objetos de uma lei ordinária, porque, do contrário, iremos elaborar um calhamaço sem tamanho que, depois na prática, não irá ocorrer; por exemplo, julgo que uma questão muito mais séria do que o problema de definir a questão de onde morar, que talvez seja a essência do relacionamento de um casal, não está aí e não poderia estar, e que a prática já indica uma questão de opção de ambos; a questão da relação sexual. Temos hoje em dia maridos que se acham donos do corpo da sua mulher para buscá-la e possuí-la a qualquer momento em que seu apetite sexual indique? Temos! Temos violência sexual dentro de lares? Temos! Nem por isso a lei deve dizer que a relação sexual entre um casal deve ocorrer apenas no momento em que ambos o desejam. O que defendemos até como seres civilizados? Que isso só deva ocorrer quando haja o interesse de ambas as partes! Então nesse caso, deveríamos definir na lei, porque é um direito sagrado da mulher administrar o seu corpo e até mesmo o seu desejo sexual. Estou me referindo a essa questão, não sendo contrário a uma decisão, digamos assim, con- junta, e diria até mais, e porque não os filhos? Quantos filhos adolescentes são afetados diretamente por essa questão, por exemplo, de uma mudança de domicilio? Assim, o que estou querendo levantar, na minha argüição, não é a questão do direito a essa definição. Comecei as minhas palavras dizendo que acho que o melhor lugar para a democracia ser iniciada e praticada é dentro do lar. Então, não sou contrário a essência dessa questão. A minha dúvida é, e coloco para todos, se isso é matéria para figurar na Constituição? Não, mas deve figurar por uma questão de ficar claro o direito da mulher etc... Esse direito na prática já existe e não pode ser de outra maneira, até porque uma violação a esse direito implicará, necessariamente, na dissolução da sociedade conjugal. Porém se, por exemplo, isso é uma questão importante, aí é que coloquei a homenagem, não como uma depreciação, coloquei uma homenagem no sentido de ficar claro, definido – usando aquela expressão tão usual – de todos os machistas ficarem sabendo que de agora em diante têm que debater esse assunto. Só isso? Ou deveríamos ter outras coisas que também dizem respeito ao direito da mulher? Mas, confesso que a minha dúvida maior não é com relação a isso. A minha dúvida maior está na primeira questão. A SRA COMBA MARQUES PÔRTO: – A primeira? Certo! O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – Antes da resposta queremos lembrar que temos aqui dois colegas: o Fausto Rocha, de São Paulo, e Antônio de Jesus, de Goiás, que à luz do Regimento não têm direito a voto mas como não estamos votando têm direito à palavra; na hora em que acharem por bem poderão fazer uso dela, embora nosso tempo regimental já haja expirado. Todavia, como começamos nossa reunião um pouco atrasados, se for da conveniência dos membros desta Subcomissão, poderemos dilatar o tempo um pouco mais, a fim de que nossa conferencista conclua e, também, se nossos colegas quiserem terão direito à oportunidade de pronunciar. A SRA COMBA MARQUES PÔRTO: –Sr. Presidente, não me alongarei muito. Antes de entrar na primeira questão gostaria de dizer que, quando o Sr. colocou a questão da homenagem, pensei: "Em Direito, a norma nunca é uma homenagem: é um direito, uma coisa muito concreta e que obrigatoriamente deva ter conseqüências", mas logo em seguida V. Ex.ª esclareceu bem. Em relação à primeira questão – da possibilidade de se estabelecer, nessa formulação, a família instituída naturalmente, uma margem de possibilidade, talvez, de incentivo à prática de bigamia, poligamia, aí eu levantaria uma questão preliminar com relação a isso, que é a questão da finalidade da lei. Temos que ter, de certa forma, uma noção mais ou menos precisa, de que objetivos pretendemos atingir na formulação de um artigo de lei, seja ela qual for, seja Constituição, seja lei ordinária, seja até um regulamento ou portaria. Quer dizer, aqui, quando formulamos, repare que formulamos em aposto – "A família, instituída civil ou naturalmente, tem direito à pro- 34 teção do Estado..." Então, qual é a inteligência desse artigo, dessa proposição? O direito que se pretende tutelar aqui e o direito da família, dos seus membros terem garantida essa proteção do Estado, que há de se traduzir na norma ordinária – e até em programas específicos, como um programa de assistência integral à saúde da mulher, por exemplo, que é um programa do Ministério da Saúde – o desempenho dessa proteção que nós achamos que a família merece dos Poderes Públicos. Eu, particularmente – esse trabalho foi um trabalho de grupo – evoluiria no sentido até de suprimir esse aposto aí: "A família tem direito à proteção do Estado", como consta da Constituição portuguesa, porque acho que ainda é formulação mais objetiva, quer dizer, se o núcleo desse artigo, dessa proposição, é a garantia dessa proteção, seja através das creches, da assistência médica, da saúde, da moradia, se o núcleo do artigo aqui é essa finalidade, cada vez me convenço de que não é preciso que uma Constituição defina, qualifique que família é essa, na medida em que a realidade já traduz o que é essa família. Nós estamos diante de uma realidade. Do ponto de vista em que V. Ex.ª coloca a sua preocupação, eu digo que o sistema vigente define: "a família será constituída pelo casamento", o que não implica se reduza o número de bígamos e bígamas, de polígamos e polígamas que existem por aí. Sabemos, inclusive, que como a lei dispõe, ela da ao homem o direito de registrar o filho que quiser sem levar nenhum documento comprobatório de nada. Os homens praticam a bigamia, até às vezes instituída, oficializada com mulher dentro de casa, o casamento na certidão, e têm outra casa adiante com outra mulher, e registra aquela criança de forma falsa. Ele se declara como casado, e põe seu nome no filho da própria concubina. Então, a questão da bigamia e da poligamia já entra até, talvez, no domínio antropológico que eu aqui não saberia expor da melhor forma, porque minha formação é de advogada, em que não podemos tentar esgotar na lei, essa dimensão tamanha do que seja a natureza humana. Se estamos discutindo a natureza da sociedade conjugal, não podemos nos perder. Na verdade, essas questões são colocadas na prática e na vida. E digo o seguinte: a lei, como está, não coibiu até hoje. Não coíbe. Vai-se numa favela dessas como V.Ex.ª assiste lá, no Rio de Janeiro, e que mais se vê – nas poucas vezes que fui, porque nunca fiz um trabalho sistemático, mas em determinado momento nós tivemos um projeto; o Centro da Mulher Brasileira, no Rio, teve um projeto de orientação jurídica na favela do Chapéu Mangueira, lá no Leme – havia mães com nomes omissos na forma da lei, havia mulheres querendo saber o que faziam para registrar o filho; quer dizer, essa questão já está, na realidade, colocada sem saída, porque a lei não dá as soluções necessárias. Na minha opinião, não cabe a um texto constitucional definir ou dispor em relação a tal questão, como não cabe a um texto constitucional definir quantas vezes um casal deve ter relações sexuais por mês ou por semana. Acho que é um domínio da vida que não pode estar atrelado sobretudo às injunções do Estado. Nós temos, aqui no Brasil, uma formação que implica em que o Estado intervenha em tudo quanto é dimensão da vida do 35 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ser humano. Isto é uma questão perigosa, por isso mesmo nós somos contra que o Estado venha dizer quantos filhos teremos que ter, pois isso é uma temeridade, como ocorre na China e não está no âmbito da Constituição. Se achamos que a bigamia é uma coisa nociva, vamos combater isso numa outra instância, que não a da regra jurídica, porque senão você corre o risco de trazer a norma a uma ineficácia e a uma situação que é a pior que existe na norma jurídica, quando ela é falsa; quer dizer, quando ela não atinge a sua finalidade, quando ela e fragorosamente desrespeitada. Não interessa escrever o Direito para que ele seja descumprido. Então, não vamos tentar legislar sobre questões que não estão contempladas no âmbito do Direito. Acho que esse é o problema com que nos deparamos. Quanto à questão dos conflitos, esse exemplo que V. Ex.ª deu, da questão da discordância em relação à fixação do domicílio, acho que uma das piores discriminações que o 233 produz é essa. Já atendi um caso de um rapaz que foi me consultar querendo exatamente exercer esse direito: a mulher tinha emprego garantido, era funcionária pública, tinha emprego garantido na cidade; ele era desempregado e tinha aparecido para ele um emprego igualmente estável, porque ele era do tipo autônomo, numa outra cidade, e ele queria que a família toda se transferisse para lá – e a mulher não queria. Virei-me para ele e disse: "O que você vai fazer quando chegar lá? Vai abrir um vinho para comemorar? Você leva sua mulher à força; você tira sua mulher do emprego e o que vai acontecer com seu casamento quando você chegar lá? Então é aquilo que percebemos. A norma como está – é o que V. Ex.ª levantou – acaba resultando no inverso, porque se o homem carrega uma mulher à força, para morar num lugar, porque na lei está escrito que ele tem esse direito, esse casamento já acabou. Acho que quando há esse tipo de conflito é porque o consenso já acabou mesmo. Para isso, inclusive, reservamos nesse artigo – e o Código deve reservar – o direito de decisão judicial. Se a nível do casamento você proclama a igualdade entre os cônjuges, não tem essa de chefia, não tem chefe, não tem cabeça do casal e que em momentos de divergência que se vá à justiça, pois a palavra do Juiz vai decidir, diante das provas concretas dos autos, quem é que tem mais condição de ficar naquela cidade, quem é que não tem, quem é que tem condições de criar aqueles filhos, etc. V. Ex.ª levanta o problema da morosidade. Esse é outro departamento, não se pode pôr a carroça na frente dos bois. A questão do Judiciário é outro ponto que está sendo debatido nesta Constituinte, não nesta Comissão. Nós, inclusive lá no Rio de Janeiro, na Ordem dos Advogados, estamos com um articulado pronto referente ao Poder Judiciário. Realmente urge que o Poder Judiciário se adapte à demanda. Ele é um serviço público da maior relevância que está absolutamente defasado da real demanda. O que V. Ex.ª falou é verdade: um processo hoje, no Brasil, está arriscado a levar cinco anos. Agora, aí é a tal coisa, nós temos é que garantir a eficácia do Poder Judiciário. Não é possível que um processo se arraste por cinco anos quando ele pode ser resolvido em três meses. Hoje, um procedimento sumarís - simo no fórum é um procedimento que, de sumaríssimo não tem nada, pois leva no mínimo três,quatro anos para ser resolvido, salvo em algumas Varas em que os juízes fazem um malabarismo para conseguir pôr aquilo tudo em ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estão sendo até chamados de processos sumíssimos.! A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Sumíssimos, pois de sumaríssimo no Fórum não existe nada. Quer dizer, nós vivemos hoje uma realidade no Poder Judiciário que é contra a natureza para a qual ele foi criado, ou seja, quem demanda na Justiça gratuita, já sabe que está perdido mesmo – esse não vai ver o seu direito alcançado nunca e até mesmo quem paga os preços caríssimos que a Justiça exige – a Justiça tem que ser gratuita para todos – acho que pode parecer fantasia, mas não é. O Judiciário é um serviço que se presta, então, quem tem dinheiro vai lá e paga, mas mesmo quem tem dinheiro vai lá, paga, não consegue resolver nada. Além do que, colocasse a Justiça à margem de tudo quanto é corrupção, tráfico de influência. São outras questões que não podemos nem escrever na Constituição: "É proibido corrupção". Não adianta, porque a corrupção está num outro domínio. Não adianta escrever na Constituição: "Não pode fazer golpe de Estado", porque o golpe de Estado é exatamente aquele que desfaz toda a ordem constitucional. Então são coisas que acho que fogem realmente. Agora, a nível do Judiciário não têm soluções. Os advogados, pelo menos, têm propostas, têm soluções para moralização, para autonomia, para independência do Poder Judiciário, para que ele se torne um órgão eficaz. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Dr.ª, já que a Sr.ª está trabalhando nessa área e eu, infelizmente, estou presidindo esta Subcomissão, não vou poder participar efetivamente. Nós temos uma proposta já encaminhada instituindo uma expectativa de instância comunitária do Direito. Alguns advogados são contrários, mas nós achamos que muitas das relações de Direito já são decididas na comunidade, exatamente por descrédito na Justiça: "Ah! Não vai procurar juiz, não vai procurar advogado, não. Você está doido, vamos fazer um acordo", e terminam fazendo um acordo lá na comunidade. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – A Justiça de Pequenas Causas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Justiça de Pequenas Causas, mas aí há a figura do juiz. Nós queríamos dizer o seguinte: a figura do Juiz de Paz, com a sua competência ampliada, de tal forma que ele fosse eleito pela comunidade e pudesse ser destituído também pela comunidade, a fim de que ele pudesse interferir, em termos de acordo, em todas as questões que não têm motivos, a fim de passar para a área do Judiciário. Nós que trabalhamos no Fórum, sabemos, o que hoje engarrafa a Justiça são processos originários de conflitos sociais, de conflitos entre pessoas, que não têm motivo de passarem para a área do Judiciário; briga entre marido e mulher; alguém bate no carro do outro está lá na lei, dizendo; "Bateu atrás, paga o prejuízo", mas, aí, forma-se um processo e, às vezes, arrola-se uma testemunha que está a não sei quantas léguas de distância, para usar uma expressão da Bahia. Queremos lembrar que está expirado o tempo dos trabalhos desta Comissão. Não sei se há outra interferência. Gostaríamos de ouvir aqueles que a guisa de conclusão, quisessem fazer uma inserção. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Quando cheguei, estava ouvindo o nosso Bispo falando – eu o admiro muito e o respeito pela importância do seu ministério perante a sociedade – e pude, agora, ouvir as judiciosas ponderações da doutora, convidada pela Comissão. Faço parte desta Comissão Temática, mas não desta Subcomissão e agradeço pela oportunidade de falar. Quero limitar meu tempo a 2 ou 3 minutos. Ajudem-me a policiar-me. Falo na televisão, sou pago para falar, fico mal acostumado e não quero me exceder aqui. Um tema que talvez cause risson, que é uma palavra difícil, é submissão. Não pretendo completar nem aduzir nenhuma consideração; gostaria de dar, talvez, um pequenino esclarecimento da forma como a maioria dos cristãos têm visto os textos bíblicos que tratam da submissão. Temos aqui outro pastor presente: submissão da mulher ao marido e de ambos a Cristo. Se Deus é amor, então, a essência desta submissão se deve exercer em amor, e sempre de acordo com os princípios da palavra de Deus, quer dizer, uma sujeição natural. Apenas esta decisão bíblica – e ela é muito clara – se aplica somente àqueles que aceitam os preceitos bíblicos nas diversas denominações, e não aos outros que não aceitam a Deus como Criador de todas as coisas. Então, se estamos tratando aqui de uma legislação que deve atingir à população como um todo, aos crentes e aos descrentes, é claro que temos que levar isto em consideração, para entender bem que esta submissão é em amor, e a medida deste amor é dada no próprio texto bíblico: é a medida do amor de Jesus pela Igreja e ele deu a vida pela Igreja. Ora, quem, sendo marido, pretendendo "submeter" a sua esposa à sua própria vontade, à sua decisão só poderá fazê-lo à luz dos excertos bíblicos, se exercer na medida o amor de Jesus, a ponto de dar a sua vida. Assim como um pai impede que o filho toque no ferro quente, porque sabe que ele vai queimar a mão, chegará o dia até que ele poderá permitir, para que o filho, sentindo aquela bolha crescer, aquele ardor, aprenda para sempre, na prática, que não será conveniente desrespeitar aquela experiência do pai. É evidente que, muitas vezes, a mulher terá de suprir a incapacidade do marido para exercer liderança. Isto acontece muitas vezes na prática. Tantas vezes que o marido aprenderá que ele terá que se submeter, ele sim submeter-se ao bom-senso da mulher. E bom-senso é o apanágio que caracteriza a personalidade da mulher. Ela tem uma visão acima da que o homem costuma ter. Prudente será o marido que, antes de tomar a decisão – e isto também é bíblico –, ouça as ponderações da esposa, e a decisão seja o fruto do consenso, visando sempre ao bem do casamento. Assim, devese entender a submissão, em amor. E vejo que neste ponto o texto bíblico resolve para os casais que são cristãos um sem-número de conflitos, porque a palavra final será do marido e aqui, se me permitem jocosamente, quero registrar o ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) que ocorre também em minha casa. Geralmente a decisão do mando é: "Sim, senhora!" A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Queria dizer que achei este debate muito interessante; foi uma experiência inclusive para mim, pessoalmente, muito rica. Fui candidata a Deputada Constituinte e... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – É suplente! E Deputada suplente. A SRA. COMBA MARQUES PORTO: – Suplentíssima! E acho que, de repente, o processo de nossa participação e este esforço que é comum das pessoas que querem construir uma nova sociedade verdadeiramente democrática e se soma, quer dizer: não ser constituinte, mas estar onde estou, sela participando, trabalhando junto com o Conselho, seja até no exercício da minha profissão, discutindo essas questões, acho que a Constituinte, neste sentido, produziu um avanço; ela saiu melhor do que pudéssemos imaginar, ou seja, essa possibilidade das entidades, da sociedade civil estar aqui, na condição não de constituintes, mas de cidadãos e, no caso, nós, mulheres, cidadãs, trocando idéias com vocês, participando disto, é uma coisa riquíssima. E creio que há de ser devidamente dentro dos prazos curtíssimos, explorada e levada até a última possibilidade de repensarmos tudo isto. Acho que foi muito bom, foi prazeroso estar aqui e, inclusive, na pessoa da Presidente do Conselho, eu me coloco a disposição para retornos e para continuidade deste debate não só aqui nesta Comissão, como em outras, porque é disto que irá resultar para todos nós uma grande gratificação e, quem sabe, aproximar o texto da nova Carta Magna do ideal, nessa pluralidade e, nessa diversidade, dos senhores pastores. Eu não sou da Igreja Protestante, mas o outro é de outra Igreja, enfim, acho que nessa pluralidade de pensamentos, de tendências, pode-se perfeitamente, dentro desta prática democrática, chegara um consenso. E é isto que espero que nossa Constituinte alcance. Muito obrigada.! O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Compete-nos, na condição de Presidente, agradecer a nossa conferencista, porque, na verdade, ela fez uma conferência para nós e acredito que este espaço cumpriu a sua finalidade. Tenho perguntado que dificuldades teríamos nós, experimentados que somos – alguns na áreas do Direito e em outras áreas – em elaborar um texto e submetê-lo à Comissão Temática. Não teríamos muito. De modo que o que achamos que há de mais importante nos trabalhos de elaboração constitucional é este momento reservado para ouvirmos os representantes da sociedade. Por isso mesmo, do dia 21, de hoje ao dia 8, temos este espaço reservado aqui para debatermos com diferentes setores da sociedade brasileira. E esta Subcomissão decidiu dividir este temário em: Natureza da Sociedade Conjugal, objeto da discussão, hoje; nos dias 22 e 23 – Planejamento Familiar; dia 27/4 – Influência da Comunicação na Vida Familiar; dia 28/4 – Dissolução da Sociedade Conjugal; dia 29/4 – Proteção à Gestante, à Mãe e à Família; dias 3/4, 4 e 5/5 – Direitos e Deveres do Menor, dia 6/5 – Sistema de Adoção e dia 8/5 – Proteção ao Idoso. Qualquer pessoa que tenha tomado parte nos debates, inclusive nossa conferencista, se quiser nos dar a honra noutra ocasião, poderá estar presente aqui, para tomar parte conosco nesta discussão. Não podemos convidá-los – inclusive ela não foi convidada para estar aqui –, mas podemos induzir as pessoas, avisando que este espaço está aberto, e estamos na expectativa de recebermos, amanhã, um representante também da CNBB para debater conosco o planejamento familiar. O Pastor Samuel Cardoso Machado, Presidente da Convenção Batista Brasileira, nos daria a honra de uma grande exposição. Tenho certeza que ficou retido no Rio Grande do Sul e não pôde comparecer. De modo que nos sentimos gratos por sua presença e pela presença de suas acompanhantes, pela oportunidade de termos colegas de outras comissões, e dizermos que não somos os donos da verdade. Estamos aqui como representantes do povo, na expectativa de fazer o melhor para atendermos à expectativa popular, que é grande. Queremos ainda superar, se Deus quiser, a descrença que já existe em alguns setores em relação aos trabalhos desta Constituinte. Estamos fazendo um esforço, e temos certeza de que no ato da promulgação da futura Constituição, estaremos oferecendo à sociedade brasileira um instrumento de trabalho para que ela possa avançar. Alguém tem estado preocupado dizendo que a Constituição futura terá vida curta. Não estamos preocupados se vai ter uma vida curta, longa ou perene; estamos preocupados em garantir um espaço para que a sociedade possa avançar, para que, num clima de liberdade e segurança, todos possamos debater e, lembrando o grande Governador baiano, meu amigo pessoal Waldir Pires, pessoa que aprendi a admirar na convivência que tivemos – ele no Ministério e eu na Presidência da Funabem – "a sociedade brasileira precisa ser repensada, a questão da criança, a questão das relações familiares". Temos que travar um amplo debate em torno dessas questões, porque não será por lei que vamos resolver isso. A lei tem que ser uma expressão do fato social e, naturalmente esta Constituição não vai ter a vida perene que muita gente pensa. Queremos é garantir um espaço para que as modificações que venham a ser feitas o sejam pela sociedade, cormo resultado da luta da sociedade brasileira ocupando esse espaço, neste nosso vasto e rico território. Muito obrigado a todos, muito obrigado à nossa Doutora. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Lembro que esta Subcomissão estará reunida aqui, amanhã, no horário regimental. Está encenada a reunião. (Levanta-se a reunião às 13 horas.) ATA DA 5ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, REALIZADA EM 22 DE ABRIL DE 1987 Aos vinte e dois dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez, na sala 15 (quinze) do Anexo Il do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso para audiência pública da Subcomissão com entidades representativas do segmento social, sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar e com a presença dos Senhores Constituintes: Iberê Ferreira, Antônio Salina Curia- 36 ti, Eraldo Tinoco, Eunice Michiles, Rita Camata, Maria Lúcia, Sotero Cunha, Eliel Rodrigues, Roberto Augusto, Flávio Palmier da Veiga e Ervin Bonkoski, como membros da Subcomissão e o Senhor Constituinte Chico Humberto, como participante. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos, determinando que fosse lida a ata da reunião anterior que foi considerada aprovada. A seguir, o Senhor Presidente apresentou os Drs. Daniel Barbato e Geraldo Hideu Osani, médicos, do movimento Pró-Vida de Brasília, que discorreram sobre o tema "Planejamento Familiar", com apresentação, inclusive, de slides sobre o problema do aborto. Concluída a exposição, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para debate com os expositores. Usaram da palavra os seguintes Constituintes: Antônio Salim Curiati, Eunice Michiles, Rita Camata, Maria Lúcia, Flávio Palmier da Veiga, Roberto Augusto e Chico Humberto. Prosseguindo, o Senhor Presidente convidou o Senhor 1º VicePresidente, Constituinte Roberto Augusto, para assumir a Presidência, tendo em vista a necessidade de ausentar-se por alguns momentos. Reassumindo a Presidência o Senhor Pr esidente comunicou aos Senhores Constituintes que a Subcomissão fui convida pela Assembléia Legislativa de Vitória – ES, para participar de um debate naquela cidade com as entidades representativas do Estado. Colocado em votação, o convite foi aprovado, ficando a data a ser confirmada posteriormente. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente agradeceu a participação dos Drs. Daniel Barbato e Geraldo Hideu Osanai, dando por encerrados os trabalhos, às doze horas e cinqüenta minutos, cujo teor será publicado, na íntegra no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: depoimentos e debates com as entidades Sociedade Fluminense de Medicina e CNBB, sobre o tema "Planejamento Familiar". E, para constar, eu Antônio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata, que depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar , Presidente. ANEXO À ATA DA REUNIÃO ORDINÁRIA DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 22 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:00 HORAS. ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Havendo número regimental, declaro aberta a reunião. Gostaria de informar aos Srs. Constituintes que recebemos um convite da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo, endereçado a esta Subcomissão, com o objetivo de realizar uma reunião naquele Legislativo estadual, no próximo sábado. Estão colocando toda a infra-estrutura daquela Casa no sentido de fazermos um debate com a sociedade capixaba. Penso que esta sistemática poderia ser utilizada em outros Estados durante todo o período de 37 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) elaboração constitucional. Teríamos ocasião de debater com as comunidades a nível local. O Presidente da Assembléia Legislativa, Deputado Dilton Lírio Neto, acha que é uma oportunidade para seus coestaduanos, a nível do Espírito Santo, conhecerem o maior número possível de parlamentares desta Subcomissão e o maior número possível de pessoas e entidades a tomarem parte, lá, durante todo um dia, da discussão dos problemas que tratamos aqui. Fica, portanto, formulado o convite. Se o mesmo for aceito por esta Subcomissão, tomaremos, então, as providências, no que diz respeito à viagem, para a realização do encontro. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra a V. Ex.ª. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Sr. Presidente, indagaria de V. Ex.ª se, indo ao Espírito Santo, vamos ter condições de visitar, depois, todos os outros Estados? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estou citando um fato concreto. Recebemos um convite do Estado do Espírito Santo, não recebemos convites de outros Estados. Na medida em que os outros convites forem chegando – se chegarem –, então iremos deliberando se poderemos ou não fazer essas viagens. Vou submeter à apreciação dos Srs. Constituintes se concordam ou não com a decisão desta Presidência. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra a V. Ex.ª. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Sendo do Espírito Santo, sou suspeita de fazer qualquer observação. Mas, entendo que é importante para esta Subcomissão o contato direto com esses segmentos da sociedade. Partindo do princípio de que já temos concretamente um convite, colocaria aqui a minha posição favorável, dizendo que acho que é este o caminho que deveremos seguir. Surgindo outros convites, entendo que seria fortalecer as nossas buscas, pois, com esse contato, conseguiremos fazer com que os nossos trabalhos tenham o reflexo, que todos esperamos, direto da própria sociedade para a nossa Subcomissão. Fico muito enaltecida deste convite ter vindo do meu Estado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Favorável, embora suspeitíssima. Agora, queremos ouvir uma posição insuspeita. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra a V. Ex.ª. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Sr. Presidente, quero saber quais são as condições, se o Estado pagará as despesas ou se será tudo por conta do parlamentar. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – É claro que o Estado do Espírito Santo não permitirá que os membros desta Subcomissão paguem suas Hospedagens naquela unidade da Federação. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Sim isto no que diz respeito ao Estado do Espírito Santo. E os outros Estados? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Aí, não sei. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Precisaríamos saber também. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Veja bem, estamos trabalhando em cima de um convite, de um fato concreto. Quanto às passagens, nos encarregaríamos de ver junto à Mesa da Assembléia Nacional Constituinte a possibilidade de liberá-las. Com passagem e hospedagem, acho que não teríamos o direito de reivindicar outro tipo de apoio. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, o convite seria para este sábado? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sim. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Lamento. Não daria para adiar para o outro sábado? Teria o maior prazer em comparecer, mas tenho outros compromissos. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas, aí, já teria vencido o nosso tempo aqui, na Constituinte. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Aí existe o problema de tempo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sim. Ao invés deste sábado trabalharíamos no outro; talvez fique melhor porque daria tempo para fazermos uma divulgação maior. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Quanto a isto também não me oponho. Irei, estarei presente para colher subsídios. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Neste caso o problema é mais com relação ao tempo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Tenho absoluta certeza de que seus irmãos acorrerão com muita pressa àquele encontro no Estado. Será ótimo tê-lo lá. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – Para mim será um prazer e uma satisfação poder chegar ao seu Estado, Presidente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nobre Deputado Antônio S. Curiatti, V. Ex.ª vai conosco? O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO S. CURITTI: – Irei. No dia que for marcado estarei presente. A minha indagação foi no sentido de atender aos outros Estados. Mas V. Ex.ª tem razão quando diz que esse é um fato concreto. Vamos atender numa homenagem também ao Sr. Presidente e aos demais membros que compõem esta Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Acho que o deputado Dilton Lírio, que e muito esperto em matéria de política, está querendo prestar uma homenagem à esta Subcomissão. Solicito ao Sr Secretário que proceda à leitura da Ata da reunião anterior. (É lida e aprovada a Ata da reunião anterior.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Hoje temos a alegria de receber o Sr. Daniel Barbato, do Movimento Pró Vida, de Brasília, que vai falar sobre planejamento familiar. Convido S. Sª para tomar assento à mesa. Estando S. Sª acompanhado do Dr. Geraldo Hideu Osani, nós os recebemos como bem-vindos à nossa reunião. V. Sª dispõe do tempo de até 30 minutos para fazer a sua exposição e, naturalmente, para desenvolver o seu trabalho técnico. Desta forma, concederemos a palavra ao Dr. Daniel Barbato. O SR. DANIEL BARBATO: – Sou Professor na Universidade de Brasília, na área médica. O meu objetivo principal, como médico, é trabalhar pela qualidade de vida da comunidade à qual pertenço. E nesse trabalho observei que um dos ângulos mais importantes, sustentado pela sociedade em Brasília, é o problema do aborto. Os leigos acham que aborto é sinônimo de planejamento familiar e sabe-se que nos países superdesenvolvidos, onde o aborto foi adotado como controle de natalidade, o resultado tem sido negativo. A população européia, principalmente a italiana, conheço em particular, é uma população que está ficando velha. Não há um planejamento familiar, um controle da natalidade científico. E para mostrar este aspecto, porque a qualidade de vida da família tem vários ângulos que têm que ser enfocados, quando se fala em planejamento familiar, logo podemos dizer que resolvemos dois problemas: um é o do aborto e outro é o do menor abandonado. O menor abandonado, não tenho dúvida, terá o seu problema resolvido no dia em que cientificamente o homem planejar a família. O mal será cortado pela raiz e não contemporizado. Vou mostrar um audiovisual para que V. Ex.as conheçam melhor o problema do aborto, porque muita gente só fala em relação ao conceito e não se preocupa com o que se passa com a mulher. Nós temos que dar muita importância para as conseqüências de um aborto. Aqui em Brasília temos perdido muitas e muitas senhores em aborto provocado e é classe média baixa, na classe paupérrima, onde se observa isto. Mas é muito triste o problema do aborto em Brasília, posso lhes afirmar. V. Ex.as verão dois aspectos. Numa fase anterior, primeira fase, em crianças cujo parto foi provocado, ou prematuramente ou espontaneamente, verão que os métodos médicos atualizados podem conduzir à vida, à recuperação dessa criança com 20 semanas de vida intra-uterina e até menos. Depois verão o problema do aborto que, infelizmente, não corresponde à do Brasil. É um audiovisual americano, mas dá para fazer uma projeção do que se passa no Brasil. Gostada que fosse iniciada a projeção do filme ao audiovisual. Prestam atenção ao relato do audiovisual porque fixarão muito dos conhecimentos transmitidos, que servirão, por certo, de apoio aquilo que pretendem fazer em relação ao aborto. (Procede-se à projeção.) O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Pela oportunidade. Sr. Presidente, com devida licença do Dr. Daniel Barbato, solicitei do Secretário desta Subcomissão que chamasse o "Jornal da Constituinte." Eu faria um apelo a ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Ex.ª para que insistisse, pelo menos, que "Jornal da Constituinte" reproduzisse em parte esses textos aqui anunciados. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vou apresentar uma sugestão, para saber se o nosso conferencista, Dr. Daniel Barbato, dispõe de tempo para passar esse filme novamente amanhã. Então, nos encarregaríamos de fazer uma divulgação maior. O SR. DANIEL BARBATO: – Muito bem! O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Também sugiro que a Comissão de Direitos Humanos tenha oportunidade de vê-lo. O SR. DR. DANIEL BARBATO: – Srs. Constituintes, eu queria só deixar mais uma mensagem aos Senhores. O aborto é a interrupção espontânea ou violenta do desenvolvimento do ser humano em qualquer fase da vida, a partir da concepção. A legalização ao aborto. Srs. Constituintes, não moraliza o ato em si. Ao Estado cabe respeitar e defender a vida de todo indivíduo, desde a concepção. V. Ex.as ficarão surpresos com o que esta se passando nos países superdesenvolvidos. Nesses países alugam-se mulheres para desenvolver o conceito até uma certa fase do desenvolvimento intra -uterino. E, ele é interrompido para quê? Para industrializar a gordura desses bebês para a fabricação de cosméticos de beleza. Aí está a violência. Srs Constituintes. Sr. Presidente, quero agradecer este momento, e sempre o faço com emoção quando defendo a vida. Em qualquer situação, este é o papel filosófico da minha vida, como médico e como pessoa humana. Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.) Subcomissão ou fora dela sobre a matéria. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O Sr. Constituinte Antônio Salim Curiati também é médico. S. Ex.ª está dando o seu depoimento. Há pouco estávamos conversando e percebia S. Ex.ª que estava, acima de tudo, emocionado, quando passavam aí as gravuras, com a exposição que estava sendo feita. Temos, naturalmente, agora, o momento da discussão, do debate. A palavra está franqueada a quem queira formular as questões ao nosso conferencista. O SR. DR. GERALDO HILDEU OSANAI: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao Dr. Geraldo Osanai. O SR. DR. GERALDO HILDEU OSANI: – Também pertenço ao Movimento Pró -Vida. Sou ginecologista-obstetra. Felizmente estou sendo convi dado pelas escolas de 2º-Grau para mostrar essa projeção. É um trabalho de conscientização sobre o que é o aborto. Antes de mais nada, o aborto é um fato, não um pensamento filosófico. Não é nada econômico é um fato antes de mais nada. Que as pessoas sejam a favor ou contra, mas que sejam ou que conheçam, ao menos através de slids . Outra preocupação minha é que sabemos existir um mundo que chamamos de engenharia social, um jogo de desinformação que leva as pessoas, muitas vezes, à tomada de determinadas posições através de um jogo de números falsos. Não sou contra o movimento feminista, mas trago como exemplo, à frente de mulheres feministas, o que é o aborto. Como disse, o aborto é um fato. O que me preocupa, e se vê muito em noticiários, é essa manchete: "Brasil, mais de três milhões de abortos por ano". Pergunto: como é que se faz estatística de coisa proibida? E coloca mais, baseando-se nas estimativas atribuídas à ONU, citando uma organização internacional. Chega à conclusão de que as complicações advindas da prática do abono clandestino eram responsáveis pela morte de cerca de 340 mil mulheres por ano. Então, o número 340 mil, ou menos que seja, emociona a pessoa. Trouxe a estatística de mortalidade do Ministério da Saúde, de 1980, que é mais ou menos a o período desse fascículo. Em 1980, morreram no Brasil 344 mulheres. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Parece-me que há outra parte? (Continua a projeção do filme) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte António Salim Curiati. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Sr. Presidente Nelson Aguiar, cumprimento V. Ex.ª e o Relator Eraldo Tinoco, por ter trazido a esta Subcomissão uma pessoa do gabarito do Dr. Daniel Barbato, que faz uma exposição de caráter científico, altamente comunicativa e que elucida realmente todos os presentes. Acho fundamental que matéria dessa natureza seja realmente divulgada. infelizmente soube que todos os jornalistas foram para a A estatística oficial do Ministério da Subcomissão de Reforma Agrária e Saúde abrange 75% da veracidade. Subcomissão do Índio. Mas, a disposição de V. Ex.ª. Sr. Presidente, de trazer o Dr. Daniel Aqui estão todas as causas do aborto. E novamente a esta Comissão amanhã, faz com aqui fica subdividido. que fiquemos tranqüilos neste aspecto. O que é aborto? É a interrupção da O assunto primordial hoje nesta reunião gravidez, seja com ou sem embrião. Ocorre, é o planejamento familiar. Sem dúvida o Dr. geralmente, que cresce a placenta e não existe Daniel colocou bem o problema do planejamento embrião. Matou doze mulheres. familiar. S. Sª evita, praticamente, o aborto e o menor abandonado. Então a ênfase principal Aborto retido, aquela gravidez que é desta reunião é, realmente para com o interrompida espontaneamente, fica dentro do planejamento familiar, para qual sou inteiramente útero. Geralmente provoca infecção: matou cinco favorável. mulheres. Felicito ao Dr. Daniel pela Gravidez ectópica, que se chama exposição e, na primeira oportunidade, de aborto tubário É a interrupção da gravidez gostaria de ter mais contato vara na trompa ou qualquer lugar fora do útero: que pudéssemos trocar idéias ou aqui na matou quarenta e ta sete mulheres. 38 O aborto espontâneo, matou onze mulheres. O aborto induzido, sem indicação admitida l egalmente. Aquela mulher que chega no pronto-socorro e diz que provocou aborto: matou quarenta e duas mulheres. E o aborto não especificado, devemos colocar também como aborto promovido Matou cento e sessenta e duas mulheres. Chamo a atenção de V. Ex.ª para essa engenharia social que existe, que faz com que nós, a sociedade, através de um jogo de números, comecemos a ter pensamento diferente. Neste País onde se fala em controle de natalidade, temos que pensar também nos riscos da mulher tomando a pílula anticoncepcional. Então, vamos ver que infelizmente tem aumentado, não trago os dados, mas como medico ginecologista posso afirmar, tem aumentado muito o número de mulheres que morrem por infarto de miocárdio. Muitas vezes, a mulher pode não sentir, na época em que está tomando o anticoncepcional, mas os efeitos sobre os vasos do coração vão se fazer sentir quando ela estiver em torno dos quarenta, cinqüenta anos de idade. E mais o cigarro, que é outra causa do infarto. A incidência do infarto do miocárdio entre homem e mulher está quase igual. Antigamente era doença de homem, hoje não é mais. Quando falamos em planejamento familiar, temos que levar também à conscientização do povo o melhor método prescrito. Não podemos dizer que só vai limitar filhos. No planejamento familiar não é limitação de filhos. É preferível ser uma mulher sadia, mãe de dez filhos, do que uma mulher doente, mãe de dois filhos, ou órfão, mãe de um só. Temos que levar à população a conscientização de todos esses métodos. Inclusive os ditos métodos que provocam abortos. Levamos muito em consideração que a efetividade do método anticoncepcional se dá pelo percentual. Levando-se em consideração o percentual, talvez o DIU funcione tão bem quanto a pílula anticoncepcional. Dispositivo intra uterino. Temos que levar em consideração que é um método, também abortivo. As pessoas dizem 2%, 3%, o importante para nós, do Movimento Pró-Vida, não é o percentual, é o valor absoluto de cada um, de cada vida humana. Estou à disposição de V. Ex.as sobre os métodos anticoncepcionais, se é planejamento familiar, como é que vamos fazer isso. Não sou psicólogo, mas tenho lido muito a respeito de psicologia. Existem uns trabalhos que afirmam que o número de filhos deve ser levado em consideração. A maioria das famílias modernas querem de preferência um casal. E nos trabalhos modernos de psicologia, sabe-se que um casal de irmãos, é somente um casal de irmãos e não muitas vezes amigos. Quando se fala em planejamento familiar, fala-se na diferença entre um filho e outro – três, quatro anos. E ocorre a mesma coisa. Uma criança de seis anos não brinca com uma de três anos, e vão se encontrar só depois da adolescência. Isto cria também irmãos, mas não amigos. Outros falam que três filhos é o ideal, e há trabalhos que falam sobre o filho do meio. Existe o mais velho; o caçula, paparicado e o filho do 39 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) meio. Os que lideram com delinqüência juvenil vão ver que, na maioria, em três filhos, se der problema, é o filho do meio; não é o mais velho, nem o mais novo. Tudo isso deve ser levado à população. Planejamento familiar não é limitar filho, é planejar uma família sadia, uma família boa. Temos que levar isso em consideração. Antes de mais nada, acredito que deva ser introduzido nas escolas o currículo "educação sexual" e que isso também, seja colocado, do contrário não adianta. Vamos tratar somente dos efeitos e não vamos combater a causa. Temos que ir na raiz do problema. O que falta no Brasil é uma educação sexual consciente e o que existe é uma sexualidade comercializada. (Palmas.) A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Dr. Geraldo, gostei muito da explanação, tanto de V. Sª, como do Dr. Daniel. Tive duas filhas, felizmente Deus me deu somente dois filhos, e eu desconhecia totalmente esse assunto. Sempre fui e continuarei sendo contra a legalização do aborto, principalmente, agora, e sempre que puder levarei ao público o que aprendi aqui porque antes desconhecia o que fosse um aborto. Gostaria de saber a sua opinião sobre educação sexual nas escolas. Há que se ter pessoas com condições de dar esse tipo de aula às crianças, como seria? O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – Uma pessoa que esteja integrada a parte psicológica e a parte fisiológica. Sabemos que existe a fisiologia da sexualidade, a parte orgânica, que funciona, e a parte psicológica. Infelizmente existe uma dicotomia. O psicólogo cuida somente da psique e o médico cuida da parte orgânica. Então, temos que formar os profissionais. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Isso também é muito perigoso. O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – Formar profissionais, com aulas dadas por psicólogos e médicos, uma formação de profissional, educador sexual. Não pode ser somente médico, somente psicólogo. Não somos somente psique ou somente corpo. Deve ser formar primeiro o profissional que vai dar esse tipo de aula. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Está aberto o debate. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – (Intervenção no microfone) O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – O método anticoncepcional ideal é escolhido pelo casal. Não é pela mulher, nem pelo homem, mas pelo casal. A pílula anticoncepcional, quem é que evita? – A mulher. Camisinha, quem é que está evitando? – O homem. Isso faz com que, muitas vezes, a mulher não sinta nem o prazer do orgasmo, porque no momento em que o homem vai colocar a camisinha, a excitação passa, e ela tem uma curva de excitação menor. A curva de excitação da mulher é mais achatada do que a do homem. No momento em que vai colocar a camisinha, a excitação da mulher passa, o homem atinge o orgasmo, a mulher sente somente um orifício de prazer. A verdade é esta. Então, o homem evita, mas a mulher sofre as conseqüências também. O diafragma não é muito eficaz. É eficaz, talvez, para o ginecologista porque vejo muitas mulheres colocando o diafragma, mas não o coloca direito. Ele sai e não evita, de jeito nenhum. Então aquela que quer colocar diafragma, vai todo o mês ao ginecologista. É muito bom, mas quem sai ganhando é o ginecologista. Na ligadura de trompa joga-se a responsabilidade sobre a mulher. Na vasectomia, quem está evitando é o homem. Nós ensinamos o método de Bilings, método da ovulação, no MOBRAL, o pessoal está aprendendo. É o método da ovulação da mulher aprender quando está ovulando. Esse método era dado somente para casais, à mulher sozinha não adianta porque precisa da compreensão do homem e esse método dá uma eficácia de 97%. Então o melhor método é o casal que procura. Acho que nós e o Estado, devemos levar ao conhecimento da população as falhas, as conseqüências todas, não só no âmbito psicológico, como no âmbito físico. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – O nobre Colega afirmou que a pílula leva à conseqüências funestas para o organismo. Então, gostaria de saber do Colega qual seria o método ideal, independente do casal resolver. Nós precisamos orientar o casal. Vamos sugerir: a pílula na mulher e a vasectomia no homem ou qualquer outro método anticoncepcional. Queria saber de V. Sª qual método que sugeriria e sugestionaria, como mensagem, para o casal. Na verdade o casal está sedento de ter conhecimento, de fazer planejamento familiar. O casal não tem conhecimento da realidade da fisiologia da reprodução. Então ele quer saber do médico qual é a sua sugestão. O SR. HIDEU OSANAI: – Na prática, tem que sugerir o método natural. Na prática, no meu consultório, uso o método natural. O SR. DANIEL BARBATO: – Só complementando. O grande trabalho que cabe à Medicina fazer é educar, agredir o casal com informações científicas, e cabe ao casal escolher qual o método melhor. Esta liberdade de escolher o anticoncepcional, o meio de concepção, o número de filhos, tem que ser um direito inalienável do casal. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Mas há necessidade – desculpe-me interrompê-lo – de alguém levar a informação. Nós tínhamos em São Paulo um programa que chamava-se Educação Familiar para exatamente levar a informação. É claro que o casal, dentro da sua voluntariedade, recebe a sugestão e a informação. Nós é que precisamos informar ao casal, qual é o método que realmente melhor lhe convém porque ele não está preparado para isto. Por isso é que nós tínhamos um programa que chamava-se Educação Familiar, exatamente, levando em consideração todos esses aspectos. nha dúvida, existe a violência na rua porque existe a violência em casa, na família. E nós temos de informar, ser claro, trabalhar em grupos pequenos, formar equipes. Eu, com vinte, trinta equipes, para trabalhar pelo planejamento familiar, risco este País em cinco anos, melhorando a sua qualidade de vida, mas dê-me condições para isto. A realidade é que oferecemos tudo isto, mas ninguém dá apoio. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Nós estamos aqui para dar apoio. O SR. DANIEL BARBATO: – Neste País existem recursos humanos altamente qualificados, mas são subtilizados ou não são utilizados. Nós temos que respeitar a família. Mas a família, não como a de hoje. Eu trabalho, durante as minhas férias, no interior do Brasil. Eu e minha mulher, somos médicos. Pegamos remédios da CEME e vamos trabalhar no interior do Brasil. A última vez, fomos ao Amazonas, ao médio Purus, em Labre e Boca do Acre. Trabalhamos em trinta e sete seringais. Em trinta e quatro deles, nobre Constituinte, fomos os primeiros médicos a pisar naquela região e vimos famílias com vinte e cinco filhos, trinta filhos, porque entraram cegos, não foram informados do planejamento familiar. É isso que temos de fazer, mostrar como planejar a família, desde o noivado. Ali começa o planejamento familiar. Por melhor que seja a condição econômica e social da família, o casal não pode, logo depois do casamento, ter um filho porque precisam se adaptar entre eles primeiro para qualificar a sua vida e depois ter a sua casa, e depois falar assim: “Professor Barbato, agora nós estamos em condições de ter o nosso filho”. Isto nós fazemos aqui com vários casais em Brasília. Então eles têm consciência do que é ser pai e ser mãe, condição sócioeconômica, ter um cobertor para dar ao seu filho. Então, vou lá, viajo 30, 40 quilômetros para atender a um casal. Por minha conta. Não tenho assistência de ninguém. Quem me ajuda é minha mulher que ganha quatro vezes mais do que eu. Então, o que acontece? Eu vou lá, mostro para o casal o que eles tem de fazer, estudo o ciclo menstrual da mulher pela tabela que ela fez... O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Foi isto que indaguei. Então precisa alguém mostrar, como está fazendo V. Sª agora, mostrando ao casal qual é o tipo, a qualidade, o comportamento melhor, para que ele, dentro da sua liberdade, escolha o que quer. Estamos inteiramente de acordo. Só que precisamos pegar este trabalho que V. Sª está fazendo... O SR. DANIEL BARBATO: – Eu estou até arrepiado. A minha pressão deve estar 22 agora. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Devemos ampliar esse trabalho. Por isso solicitamos aqui a presença do Jornal da Constituinte, para que ele seja O SR. DANIEL BARBATO: – V. Ex.ª divulgado e que a população na sua grande está dando um dado regional. Como eu sou do maioria tome conhecimento da realidade. Pantanal, sou um pouco bairrista relação em ao meu Estado, à minha região, porque O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – tem que ser informada precisamente sobre Este trabalho que estou fazendo, sobre este assunto, acho que a Medicina tem explicação de todos os métodos que deixar de ser passiva para ser agressiva, anticoncepcionais, sem sugerir nada, nas para lutar pela qualidade para ser agressiva, escolas de 2º Grau, sempre é possível, mesmo para lutar pela qualidade de vida da família. tendo que trabalhar, marcar ponto. Ano passado Hoje, nobre Constituinte e V. Exª não te- eu dei 192 palestras a respeito de sexualidade. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) métodos anticoncepcionais. São palestras que levam de uma a três horas, uma manhã praticamente. No ano retrasado, treze crianças que iam ser abortadas, as mães resolveram assumi-los. Já no ano passado foram vinte e duas. Inclusive, duas por estupro... é como o Dr. Daniel Barbato falou, às vezes o noivado é muito curto para aprender. Acho que a moça tem que aprender quando está ovulando, quando não tem relação sexual ainda. Isso faz com que ela diferencie o fluxo de ovulação, com o fluxo da excitação. É diferente. Temos que ensinar isto à juventude, muitas vezes já na fase adulta. Quando vai casar, é muito em cima, não dá tempo. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Muito bem. Só para concluir, entendo que o trabalho que ambos estão fazendo é merecedor de todo o carinho, de todo o agradecimento, todo o reconhecimento da população brasileira. É um trabalho nobre. Só que é um trabalho de enxada, mas está sendo construído. Nós queremos um trabalho de trator. Por isso é que vamos trazer amanhã, de acordo com o nobre Presidente, a televisão e o rádio, para que toda a comunidade possa tomar conhecimento deste belo programa que V. Sª vêm realizando. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A nobre Constituinte Eunice Michiles pediu a palavra. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Queria perguntar ao Sr. Geraldo como S. Sª já chegou ao dado de 97% de sucesso no método Billings; quer dizer, esse resultado não estava superestimado? No meu Estado não sei se o Dr. Barbato teve oportunidade de constatar que as mulheres não têm condições de distinguir um fluxo que seja por uma infecção uterina, pois estão permanentemente nesse estado, daquele fluxo de pré-ovulação. O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – O método de Billings, método de ovulação, não basta somente o profissional chegar, mostrar e dizer: esse é o método. O profissional tem que estar junto para mostrar o tipo de corrimento. Depende do modo como se levou a informação e da assistência que é dada. Isso é muito importante. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Acho que para as camadas que realmente necessitam, a das mulheres mais pobres e mais humildes, desse método funciona muito pouco porque elas não têm condição mental de distinguir entre um fluxo e outro. É uma mulher que está permanentemente num estado de inflamação. O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – Sim, mas ela aprende a conhecer quando que é o fluxo da ovulação e quando é o fluxo da infecção. Até isso ela aprende a distinguir. Isso é muito importante. Muitas mulheres têm corrimento infeccioso e acha natural. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mas poderíamos com esse método, atingir a grande massa, que precisa de uma assistência quase que permanente de um médico, para dizer: este aqui é corrimento e este é um fluxo natural? Parece-me assim inexeqüível quando se trata de atingir a grande massa. O SR. GERALDO HIDEU OSANAI: – Perguntou sobre estatística. O dado estatístico foi um trabalho que fizemos e nós mesmos demos assistência. O SR. DANIEL BARBATO: – Nobres Constituintes, queria lhe transmitir uma experiência pessoal. O trabalho médico depende muito do amor com que ele pratica. Logo depois que me formei, casei com uma mineira. Ela é médica também. Ela me levou para o interior de Minas Gerais, para o sudoeste de Minas, uma cidade pequena, chamada Candeias, que domina uma área rural muito grande em relação a Campo Belo, Formiga, Santo Antônio do Jacaré, Itapicirica. E eu, muito moço, querendo servir à comunidade, peguei 40 casais analfabetos da zona rural, que não tinham contato, muito raro, com a cidade, que já era pequena. Trabalhei durante dois meses nesse programa. Comecei a estabelecer as regras do programa, para o casal e durante dois meses eu os preparei, e comecei o programa dois meses depois. O resultado foi espantoso. Eu, médico recém-formado, trabalhando em cidade pobre, ainda arranjei dinheiro para comprar termômetro, um caderno e um lápis. Isso, eles souberam manejar, souberam olhar o termômetro e registrar no caderno. A disciplina foi tão grande, que durante os três anos eu que permaneci como médico nessa região, dos 40 casais, só um teve problema de gravidez por solicitação da mulher, porque o marido estava organizando um programa extracasa e ela queria ter o filho. Quando a informação científica é dada e obedecida, a questão de porcentagem e de cultura fica colocado de lado, porque depende da competência, da capacidade e da vontade de resolver o problema de quem pratica esse ato. Fizemos esse programa. Depois saí de lá e não tive mais notícias. Fui para a Universidade Nacional de Medicina, onde fiz concurso para professor. Continuei esses programas aqui, em Brasília, do mesmo jeito, fornecendo esses elementos básicos, principalmente para casais novos. Quando a participação do casal é efetiva, o resultado é formidável. Mas cabe ao programador, ao executor desse programa emocionar o casal, porque, com esses dados, cheguei à conclusão de que a mulher brasileira pouco se conhece, quanto mais o marido. Assim colhi louros que não lemos em revistas, em livros científicos, porque aqui no Brasil a maioria das informações que o médico tem, o caríssimo Constituinte sabe disso, são informações do estrangeiro. Como professor de anatomia, vejo variações anatômicas entre as informações de um autor francês, com as informações que o cadáver me dá. Então temos que estudar cada caso. Sabemos que a mulher brasileira, em sua grande maioria, ovula em torno, do 14º dia do ciclo menstrual, mas há variações que têm que ser estudadas pela equipe de planejamento. Por isto é que temos que realizar esse trabalho com pessoas que realmente querem realizar esse programa. Nós vamos melhorar muito a qualidade de vida da população brasileira. Como V. Ex as sabem, o resultado da educação, do trabalho, da produção depende fundamentalmente da saúde. Nada mais é igual à saúde e nada mais que ter uma família equilibrada, bem formada em que todos os filhos tenham as mesmas oportunidades porque eles foram preparados pela equipe de planejamento familiar. A equipe de planejamento familiar tem que se preocupar até com a alimentação desse pessoal. Todos pensam que alimentar-se bem, com 40 muito condimento, com muito tempero, é o bem alimentar. Isto é um suicídio, sabemos disso. Todos estão brigando pela carne de vaca. Quão maléfica é essa carne de vaca para o organismo humano. Então, tudo isso abrange o planejamento familiar. V. Ex as estão recebendo informação de dois médicos que não se preocupam com dinheiro. Eu tenho o meu motivo, mas o Dr. Osanai não tem, ele é mais altruísta do que eu. Não me preocupo com dinheiro porque a minha mulher ganha quatro vezes mais do que eu. Então tenho cobertura dela. Mas, nós viemos transmitir a V. Ex as, não resultados de livros, mas de trabalho em campo. Esse médico aqui, apesar do seu aspecto, ele é gaúcho, parece japonês, mas não é. Entre nós surgiu uma amizade tão fraterna, que nos entendemos até sem termos conversado um com outro, porque temos o mesmo objetivo, que é lutar pela qualidade de vida da família brasileira. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Para mim é uma felicidade muito grande ter dois homens, como V. Sas, que aqui estão, trazendo essa mensagem tão bonita, tão cristã. Infelizmente, esse trabalho, que é tão grandioso, tão bonito, há o reconhecimento público e falta homens, como V. Sas, para que pudéssemos ter realmente uma sociedade mais justa e mais livre, que é o que todos nós desejamos. Gostaria de dizer, como cristã que sou, pela formação que recebi, que fico muito aliviada ao saber que há pessoas especializadas, pessoas que lidam com o trabalho científico e têm essa preocupação com o ser humano, não só com as conquistas científicas, com o salário, mas também com o valor da pessoa humana. Sabemos que esses propósitos de V. Sas são muito grandiosos, são realmente coisas que gratificam a nossa existência. Infelizmente, são casos ás vezes perdidos nesta multidão que aí está. Gostaria de formular uma pergunta, no sentido de saber, através desses longos anos de estudo e de trabalho, qual seriam as sugestões que V. Sas nos trariam? Tenho uma preocupação muito grande com o planejamento familiar, através desse método Billings. Eu, que tive um trabalho muito grande, ligada a essa área social menos favorecida, dos menos privilegiados, senti muito a falta, até de educação mesmo, da parte do próprio casal. O marido não quer saber se a mulher está em época de fecundação, de ovulação. É como se tivesse um objeto. Ele quer usá-lo independente de qualquer circunstância. Isso se verifica, principalmente, nessa camada de dois, três, quatro, oito, dez, quinze, vinte filhos. É uma camada que não tem nem acesso ao consultório, ao INPS, aos postos de saúde. E isso me traz uma responsabilidade muito grande, também conhecedora como sou dessa triste realidade. Como poderíamos assegurar a essas pessoas, a essas famílias, a essas senhoras o direito de serem assistidas e de ter acesso a esse métodos, a esses esclarecimentos, que vejo hoje, num trabalho bonito, como o que V. Sas nos trazem? Sendo um privilégio de poucos, não um direito de toda família, de todo cidadão, de toda mulher. Apresentamos a sugestão, no sentido de, através da Constituição que iremos elaborar, garantir esse direito a toda mulher de ser assistida, de ser acompanhada. 41 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Gostaria de adiantar que apresentei à Mesa um projeto, e o Dr. Geraldo nos apresentou hoje, de educação sexual nas escolas. Mas que isso dará resultado a longo prazo, não a curto prazo. Iremos formar, educar uma geração futura com esses conhecimentos, mas, na realidade, precisamos deles já, não daqui a vinte, dez, quinze anos. O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – Como disse, essas aulas, que levam ao conhecimento do público, devem ser ministradas por profissionais, porque aparecem muitas perguntas técnicas. Infelizmente, não sei se é verdade ou não, mas li um dado estatístico: que somente 10% dos profissionais médicos são médicos por vocação. Então como o Dr. Barbato falou, deve-se ter amor à profissão. Não é? Se somos médicos só por estatus , que só vamos pensar em dinheiro. O que não dá dinheiro, não vamos botar a mão. Se vamos pensar na parte científica pura e simplesmente, não vamos lidar com o povo, vamos ficar mais no consultório ou pesquisando. Então, desses 10%, quantos por cento seria? Não sei. Que tenham conhecimento ou estão dentro da área de ginecologia, ou de urologia, que é mais específica para a área sexual, e pegar esse pessoal. Seria importante que tivéssemos profissionais, não somente médicos, mas na área paramédica. O enfermeiro, o técnico de enfermagem também podem levar esses conhecimentos. Acho que deve haver, antes de mais nada, uma preocupação do Estado em formar. Sem formar o profissional, não dá. Sem formar o profissional para levar esses conhecimentos não há jeito. Não tem jeito. O Dr. Barbato está aqui, e é prova disto, nós começamos com 30 casais. Depois começamos a passar esses slides. Aí começaram a surgir as perguntas técnicas e eles não sabiam responder. Eles foram ficando chateados por não saberem responder. Acabou eu e o Dr. Barbato dando estas palestras, porque surgem as perguntas técnicas. Nós temos é que formar técnicos, isso é imprescindível. Não adianta também jogarmos ao povo um método anticoncepcional mais eficaz, deixando a Igreja de lado, colocar DIU à vontade. Não é isso. Por exemplo, no interior da Paraíba, não vou jogar pedra em ninguém, mas existe uma comunidade onde se diz que dá assistência. Vimos lá meninas com oito, nove anos mestruando porque a mãe dá anticoncepcional, achando que é remédio. Não é a distribuição aberta assim do anticoncepcional também, sem levar o conhecimento. Não adianta chegar e dizer que faz mal para uma mulher se não disser como faz mal, por que faz mal e quando vai fazer mal. Ah, eu não sinto nada, não estou sentindo nada. Tudo bem! Não sente nada agora com 20, 30 anos, vamos ver com quarenta e cinco, cinqüenta anos. Nós temos que levar esse conhecimento. Nós temos que nos preocupar com isso. Então, antes de mais nada, é a formação de técnicos, de profissionais para levar isto. Se não formarmos o técnico para levar esse conhecimento, não há jeito. Eu acho que não há jeito. Sei que o nosso trabalho é mínimo, não aparece na sociedade, mas, não estamos a fim de aparecer. O importante é cada vida, não a relatividade, é cada vida. Então, quando conseguimos convencer uma pessoa a não abortar e quando fazemos o parto é uma coisa linda. Quando conseguimos f azer uma moça que foi estuprada, violentada, a não abortar, a família toda curtir uma criança. Acho isso lindo. Se a vida acabasse hoje, já valeu a existência. Nós não nos preocupamos com a relatividade. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Volto à minha pergunta no sentido de passar essa mensagem para a coletividade: Vida, colocou aí a formação de profissionais – seria essa a solução? O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – É essa a solução. Não vejo outra. Não adianta um voluntariado não técnico. A experiência que nós temos, de oito anos pró-vida, não adianta a pessoa de boa vontade sem conhecimento científico. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATTI: – Como os técnicos são poucos, deveríamos aproveitar a tecnologia atual, e levar as mensagens dos poucos técnicos que existem para a comunidade, por intermédio da televisão, do rádio. V. Sas já poderiam iniciar uma campanha pela televisão, pelo rádio. Acho que aí atingiria uma comunidade realmente grande, dentro de uma diretriz que interessa à sociedade. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Aproveitando também a oportunidade, pergunto a V. Sas até onde os governos ampararam mensagem sadia? Até que ponto houve a sensibilidade do Governo Federal, do Ministério da Saúde, do Ministério da Previdência ou de algum Governo Estadual, de engajar uma proposta objetiva, técnica, moderna em defesa desses postulados que V. Sª tão bem estão apresentando à nossa Comissão de Família, Menor e Idoso? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Complementando a pergunta, no sentido de que V. Sª nos informem, Pró-Vida é uma entidade organizada, com estatutos, com sede, é financiada, recebe apoio de entidades do Governo, etc.? O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – Há oito anos era movimento da Igreja Católica. Mas, como tudo o que vem da Igreja, as pessoas dizem que é coisa de carola, nós há cinco anos fundamos a Sociedade Pró-Vida. Uma Sociedade civil, sem fins lucrativos, que, infelizmente, não podemos mostrar os seus frutos. Nesse caso chega aqui uma mulher: "olha, essa aqui quis fazer o aborto. Está aqui o fruto". Nós não podemos e não devemos fazer isso nunca. São pessoas, um voluntariado, que nos oferece dinheiro. Muitas vezes é problema financeiro, outras é problema de ordem psicológica. Então, temos psicólogos na entidade, que dão assistência não somente à gestante, mas a toda família. Há pais que expulsam suas filhas de casa. É claro, ninguém educa para ser pai de mãe solteira. Então, não nem um direito que ele tem de dar bronca, mas um dever. Por isso, muitas vezes, expulsam suas filhas. Nós as acolhemos, enquanto os psicólogos trabalham com a família. Basta dizer que nesse tempo de existência, nenhuma moça, expulsa de casa, ficou fora, todas voltaram para o lar. Mostramos também a elas que o pai tem o direito de fazer isso, de achar ruim. Ele não vai bater palmas à mãe solteira. Então, damos uma cobertura, de retaguarda, mas também importante é conscientizar e arcar com a conscientização. Agora, não podemos conscientizar em grande escala se não temos suporte para arcar com a responsabilidade. Nós i vai aparecendo um bocado de mãe solteira. E o que é que se faz com a mãe solteira, numa sociedade que ainda lhe atira pedras? O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Dr. Geraldo, por gentileza, V. Sª já tiveram contato com as autoridades do governo, já demonstraram esse plano ao Ministro da Previdência? Já tiveram a oportunidade de dialogar com o Governo em termos desse projeto, porque este é um grande trabalho? O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – Modestamente, não sei se estou criticando o Governo, acho que não adianta. Prefiro arregaçar as mangas e fazer o trabalho. Não tive nenhum contato com o Governo. A única coisa que partiu do Governo que vi e deu resultado, foram as palestras em escolas de II grau. Os professores ficaram sabendo e me colocaram como palestrista nos cursos supletivos. Há uma dotação orçamentária para isso. É esse o apoio que tive em Brasília. É um trabalho de conscientização. Não sei se o Dr. Barbato tem. Mas não fiz nada assim de planejamento em termos de Governo estadual, federal. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Isto para ser multiplicado tem que atingir a área do Governo, até haver uma lei que obrigue o Governo a fazer isso. Acho isso fundamental para a sobrevivência da vida salutar do homem, principalmente junto às camadas carentes, pobres. Não basta só a importância de captarmos aqui essas idéias e até formalizarmos emendas à Constituinte. Acho que para aplicar isso, multiplicar e atingir a meta só os Governos é que poderiam ser os instrumentos capazes de atender à grande demanda. V. Sª está falando coisas que muitos precisam ouvir. Quem sabe se o Ministério da Educação poderia usar este projeto para através das escolas do II grau e levar esta mensagem, provocando uma consciência jovem em defesa destes predicados? Inclusive sou amigo do Ministro Raphael de Almeida Magalhães, tenho influência e poderia até levar às autoridades, independente do processo constitucional, para já assimilarem essa idéia. Embora não tenha assistido o início de sua explanação, vejo que é de alto alcance social. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Tenho duas questões a apresentar aos ilustres conferencistas. Há outras considerações que gostaria de fazer, mas as deixarei para uma etapa posterior. Como encaram o problema do aborto nos casos de deficiência física da gestante, o chamado aborto terapêutico? E uma outra questão, que já foi abordada aqui de passagem pelo Dr. Geraldo, mas sobre a qual gostaria de ter melhores esclarecimentos a respeito do ponto de vista de ambos, é o caso do aborto quando a concepção é violenta. No caso de estupro, por exemplo, quando não há, por parte da mulher, a vontade, pelo contrario, muitas vezes, a concepção ocorre violentando inteiramente a sua consciência e seu físico? O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – A respeito disso, a experiência que temos foi com o caso de moças que foram estupradas e que resolveram assumir a concepção. Mas esses slides conscientizam muito. Muitas pessoas, mesmo as que são violentadas, fazem o aborto sem saber o que estão fazendo. Depois chegam, olham essa coleção de slides e se arrependem. Já tivemos casos de pes- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) soas que abortaram e se arrependeram, fizeram sem saber o que estavam fazendo e por isso se arrependeram. Por isso é que nossos psicólogos dão assistência a essas pessoas. Toda pessoa que vai abortar, seja em caso de estupro ou terapêutico, deve ser esclarecida do que vai fazer. Mostrar esses slides antes: "Você vai fazer isso ou não?" Tivemos outros casos, não de estupro, mas de pessoas que não queriam a criança. Temos também casais que adotam as crianças, de moças que não quere. O que não queremos é que a pessoa faça algo impensadamente e depois carregue na consciência o peso do que fez. Isto é muito importante. Daí o trabalho de conscientização antes de se realizar o aborto. Em caso de estupro, sem entrar no mérito da Igreja, no mérito moral, no mérito criminal, acho que toda pessoa deve estar consciente do que vai fazer, seja legal ou ilegal. Começa por aí. Deixamos a pessoa decidir. Agora estou fazendo o pré -natal de uma moça que foi estuprada. Ela conseguiu autorização do juiz para o aborto. Mas já está com 5 meses de gestação. Então desde o processo da violência até à autorização passaram 5 meses. Quem ela vai achar para fazer? Só um charlatão. Um médico, mesmo que seja legal e autorizado pelo juiz, sabe que com 5 meses está jogando com a vida da mãe. Enquanto existe essa morosidade judicial, nem pelo processo legal dá para se fazer. E aqui vai uma confissão pública: eu comecei a me dedicar, a ter consciência a respeito do aborto por causa de um aborto terapêutico que fiz. Nas escolas de Medicina aprendemos Anatomia e lidamos com cadáveres, seres humanos sem vida. Depois chegamos ao período do internato, da residência, quando fazemos curetagem de abortos incompletos ou inevitáveis, que não têm jeito. Depois de sair da faculdade, foi a primeira vez que me apareceu um caso de aborto terapêutico. Uma paciente minha ficou grávida, e mais do que o útero crescendo, o rim dela crescia. Ela começou a fazer uremia. E formei uma junta de nefrologistas que concluiu pelo aborto terapêutico, porque os rins não iam agüentar e os dois iam morrer. Coloquei-a na mesa, fiz tudo direitinho como manda a lei. Botei o espectro, dilatei o colo do útero. Até aqui, tudo 100%. Todos assistindo a um aborto terapêutico num país onde este caso não acontece, com permissão legal. Mas quando tirei o embrião, o tórax e a mão fazendo assim, tremendo, o mundo acabou para mim. Foi quando eu vi que, mesmo sendo médico, mesmo tendo lidado com cadáveres, nunca tinha tirado uma vida humana. E se eu, formado, não tinha consciência do que era aborto, imaginei o resto do povo! Então, não quero que meus amigos médicos fiquem numa situação dessa. Se eu me formei médico e não estava consciente disso, nunca tinha visto tirar uma vida, e estava naquela de salvar a vida da gestante, acabei tirando uma vida. Eu me senti ali, sinceramente, como um assassino. E, aí é que vi o trabalho que temos que fazer de conscientização. Então sou contra o aborto terapêutico, sou contra ele porque leva muito à comodidade médica. Antes do aborto, não poderíamos ter tentado uma diálise? Não se poderia fazer tudo? Não. Mas é mais cômodo e mais fácil fazer o aborto terapêutico do que fazer outras coisas que custam muito caro para Medicina. A verdade é esta. A triste realidade é esta. Eu fiz um aborto terapêutico e, por causa disso, vi que estava inconsciente a respeito do aborto. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Nessas situações em que está correndo a mãe esse grave perigo de saúde, a opção não pode ser para o tipo de cesariana, que procure salvar a criança também? O SR. GERALDO HIDEU OSANI: – Não, quando é bem no início, pela tecnologia, preste bem a atenção, se copiássemos a tecnologia americana, e uma mulher que sofresse isso em qualquer parte de seu corpo e ficasse grávida, poderia inclusive pegar-se esse embrião e transplantá-lo para outro útero. Tentase isso? Não, não se tenta isso! Faz-se isso? Não, não se faz isso. Então, a nossa posição, sinceramente, é muito cômoda. No caso de uma cesariana temos o caso, por exemplo, de eclampsia severa; nós arriscamos, não tem jeito, vai morrer a mãe, a criança, a gente arrisca tudo, tira a criança e, na maioria, tanto a mãe quanto a criança se salvam. Mas quando a gestação está no início, de 2 meses e meio a 4 meses, como nesse caso do aborto que fiz, as perspectivas eram péssimas para a gestante. Mas eu coloquei isso para ela. Ela disse que não havia problema. Ela se condoeu da minha situação. Sinceramente, a verdade é esta: estudamos medicina com cadáveres, vivemos no prontosocorro, salvando vidas. Vejo que é assim a Medicina. Medicina é ciência e arte de se prevenir e curar doentes para se salvar vidas. Tirar vidas não é ato médico; sou totalmente contra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Parece-me que nosso conferencista quer fazer uma complementação e, ai, ouviremos as argüições. O SR. DANIEL BARBATO: – Sobre a pergunta do aborto por defeito físicos detectados, também não há indicação de aborto. O SR. RELATOR ERALDO TINOCO: – Eu digo não, em salvar a vida da criança, mas da deficiência física da gestante. O SR. GERALDO H. OSANI: – Isso daí o médico que a conhece deve tomar todas as providências necessárias para evitar que ocorra uma gravidez. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Veja bem, a questão da minha pergunta diz respeito ao seguinte: nós, nesta Subcomissão, de resto em todo o processo de elaboração da nova Carta Constitucional, teremos que tomar decisões pessoais a respeito do tipo de voto a ser dado em determinada matéria. E essa questão, naturalmente, vamos esgotá-la no âmbito desta Subcomissão, depois iremos esgotá-la no âmbito da Comissão de Família, da Comissão Temática, depois vamos esgotá-la na Comissão de Sistematização, depois em plenário, em que o voto individual nosso é somado a outros votos, muitas vezes, de opiniões inteiramente diferentes. Então o meu propósito com esta questão é o de esclarecer o mais possível os integrantes da Subcomissão a respeito de uma decisão que teremos que tomar. Quer dizer a questão, por exemplo, de como a nova Constituição deve tratar esta matéria. Claro, entendo perfeitamente essa questão da conscientização, na tentativa, que corresponde inteiramente a minha maneira pessoal de encarar o problema, in 42 clusive dentro de uma filosofia, de que todo esforço deve ser realizado para se salvar uma vida. Esta é a minha concepção filosófica, inclusive. Mas acredito que, em se tratando de um texto legal, vamos ter que dar uma previsão de poder ou não poder isso acontecer, quando, por exemplo, uma pessoa não tiver essa conscientização. Quando uma jovem, uma senhora de qualquer idade, com capacidade fisiológica de conceber é violentada, e ela sabe que traz em suas entranhas o fruto de uma violência, e se ela não tivesse a consciência, por exemplo, de que deve assumir a maternidade e levá-la às últimas conseqüências, se o meio familiar for hostil a isso, a sua decisão de abortar deve ou não ter amparo na lei? Digo isto do ponto de vista ético, do ponto de vista moral, isso é válido ou não é válido? Quer dizer, quanto ao problema terapêutico, o Sr. teve uma experiência dramática em sua vida. Eu compreendo perfeitamente essa experiência dramática e a sua posição pessoal em ser contrário. Mas digamos que a lei não lhe permitisse fazer isso, a até a sua decisão profissional não lhe levasse a isso, e aquela gestante viesse a falecer em função de um problema não diretamente vinculado à gravidez, será que a sua consciência também, posteriormente, não o teria levado a dizer que se tivesse tomado uma decisão de executar aquele aborto, naquele momento, não teria salvo uma vida, que tem a responsabilidade de outros filhos, que tem a responsabilidade familiar, que tem o cuidado por outras crianças que necessitam de seu amparo; quer dizer, é uma questão muito complexa e nós vamos ter que tomar uma decisão. Não estou, ainda, manifestando uma opinião pessoal, ou que a venha a traduzir, até porque, desde o primeiro dia aqui, o meu papel de Relator eu procurarei levá-lo até a, última instância, no sentido de procurar a opinião dominante e que prevaleça na Subcomissão. Por isto, tenho, inclusive, me disciplinado muito a ficar aqui apenas ouvindo, e me manifestando o menos possível, na tentativa de captar a opinião. Então esta é uma questão fundamental. Quer dizer, não só o problema em si do aborto. Como o problema do aborto nesses casos e que o nascimento da criança, o prosseguimento do processo de gestação possa trazer outras conseqüências correlatas. Aí, a insistência da minha pergunta, nesse sentido. O SR. GERALDO H. OSANI: – Infelizmente, não separamos o médico. Eu sou eu. Por que eu penso assim? Acho que a minha resposta para o caso já foi dada pela experiência desagradável que tive. Eu não tenho jeito de pensar de modo diferente. V. Exª me desculpe. Mas é por essa experiência dramática que me marcou. Não posso pensar de outro jeito. Até o momento que fiz o aborto, que dilatei o colo do útero, eu estava do lado de lá, estava cumprindo a lei, salvando uma vida. Mas no momento em que tirei o embrião é que me senti do lado de cá. Então, o pessoal que estava do lado de lá, no modo de dizer, dos médicos não conscientes que nunca fizeram um aborto e que venham a fazêlo, não vão dar pedradas, de jeito algum, senão vou começar a dar pedradas em mim mesmo. Acho que o essencial, a respeito do aborto, é que estamos tirando uma vida, acabando com uma vida. Temos que fazer tudo para respeitar a vida Infelizmente, a vida humana está desvalorizada. A pes- 43 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) soa vale pelo que produz; se não produz, não vale nada – é desse jeito. Os aleijados que não produzem, os velhos que não produzem não valem, porque não produzem. Mas as pessoas não estão sendo valorizadas simplesmente por serem pessoas, seres humanos. Em casos terapêuticos, o aborto terapêutico em nefropatia grave por exemplo, digamos que seja possível o aborto com diálise. Se nós colocarmos um dispositivo legal, do aborto terapêutico, vai ser mais cômodo ao médico fazer o aborto terapêutico para que essas crianças não venham ao mundo. Isso é fato. Outra coisa: o meu medo pela legalização do aborto. É oficialização do desrespeito à vida. A gente sabe que a vida está desrespeitada, mas, uma vez legalizada, oficializa-se o desrespeito à vida. Nos Estados Unidos, se nós formos estudar sua legalização do aborto, veremos que não se começou legalizando aborto de seis meses, por cesariana; começou com um mês, mês e meio, dois meses, foram aumentando as indicações. Até hoje existem as indicações de ordem psicológicas; basta a mulher achar que psicologicamente não está preparada para ser mãe, pode abortar ou que faça cesariana para isso. Então, oficializar o desrespeito à vida é o meu medo, porque pensamos que é para o momento atual, não vai ficar na educação. E colocam, inclusive, para as mulheres – se a gente tira, o pessoal diz que é hipocrisia e que o amor maior é o da mãe pelo filho. Se a gente oficializa que a mãe não precisa amar o filho, qual outro amor que a gente vai ter? Se oficializarmos isto: a mãe não precisa amar seu filho. Ora, se a mãe não precisa amar seu filho, então por que ela vai ser amada, por que ela vai exigir também amor? Colocamos isto. Então, o meu medo é que o desamor sobre as mulheres aumente, porque oficializa, legaliza. A mulher não ama o filho: porque eu vou amar a mulher? A mentalidade vai atrás disso aí. O machismo existe em lugares onde o aborto é legalizado. Então, não é pela legalização do aborto que se vai dar melhores condições à mulher. Dessas meninas que resolveram fazer o aborto, eu vi cem por cento, não é pela criança que elas rejeitam; elas rejeitam pelo medo de contarem ao pai, medo de contar à mãe, pela tristeza que vão dar aos pais, pelas condições de educar os filhos, depois. Uma vez eu fui levar a notícia para os pais de uma menina, o cara queria sair no tapa comigo, porque achava que eu é que havia engravidado a moça; entrei mal no assunto, quase que eu apanho. Mas, é esse o medo. Então, se nós modificarmos a situação, elas querem os filhos. É disto que precisamos. Antes de mais nada, acho que temos de conscientizar que a gravidez está com dois meses e meio, está desse jeito e nós vamos fazer isso. Se a mulher não souber o que vai fazer, dias depois, como disse um sociólogo na UnB, vai causar um trauma a quem já fez aborto. Eu sei disso, sei do arrependimento. Acho que só ha trauma e arrependimento em coisas que não fazemos legalmente, nas coisas malfeitas. O trabalho é de conscientização. Não me preocupo se legaliza ou não; a maior preocupação é a oficialização no que diz respeito à vida. Mas o meu trabalho continua, seja proibido ou não, o meu trabalho continua, acho que não podemos parar A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Permita-me, Sr. Presidente O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª me desculpe, mas o Constituinte havia pedido a palavra antes. O SR. CONSTITUINTE CHICO HUMBERTO: – Sou médico, sou cirurgião vascular, sou angiologista, e não tive oportunidade de passar por essa experiência, por aquilo que o colega acabou de relatar, que acredito seja mesmo a mais desgastante possível. Mas meu nome Chico Humberto não é sem razão: é por causa de Chico Xavier, que é amigo da família e faço questão de preservar. Mas apesar de ser espiritualista, ser kardecista, ser reencamacionista, temos uma realidade nacional que já deve ter sido relatada aqui hoje; é de um fato em que estamos sendo coniventes e, infelizmente, esta legislatura que vai resgatar o Brasil do segundo milênio, o Brasil do ano 2000 é que tem obrigação de discutir, inclusive o aborto. Sou contra o aborto, por princípios, mas sou a favor da sua legalização, por causa desses dados, porque são três milhões de abortos praticados no hoje Brasil, dados oficiosos, são estatísticas oficiosas. Temos, aí, perto de 300 mil óbitos de mulheres que praticam aborto de fundo de quintal. Setenta por cento dessas mulheres, quando praticam abordo de fundo de quintal, vão para uma cirurgia grave, uma cirurgia pesada, para as peritonites, para as esterectomias. Aí, nós temos mais um milhão e oitocentos mil mulheres que não procriarão mais. Estamos, na verdade, matando ou intercedendo num ciclo de vida; estamos tirando dela a oportunidade de procriar. E, por incrível que pareça, essa é a realidade, não podemos tapar o sol com a peneira, e vamos nos desgastar demais aqui dentro, aqui dentro e lá fora com a opinião pública, mas não podemos mais tapar o sol com a peneira. Essa é a realidade brasileira. E nesta hora, quando se fala na legalização do aborto, quando se vê os exemplos dos países, em que na sua maioria, no mundo atual, já foi legalizado o aborto, nós vemos que nos Estados Unidos houve um decréscimo da prática do aborto. Em Cuba houve uma diminuição da prática do aborto, depois da legalização, como eles também não deveriam ter dados oficiais, porque ninguém conta que faz aborto, e o médico é o contraventor, o médico é um marginal, o médico é um assassino. A mulher, que é a principal, responsável é imune. Na sociedade atual ela não é punida, o médico sim. Ele é procurado pela paciente, ele não compactua com nada, ele entra, muitas vezes, como foi o caso relatado pelo colega, que quase apanhou do pai, porque foi interceder foi uma coisa que não tinha nada a ver; ele é procurado, muitas vezes, ou na sua totalidade das vezes, para poder interceder. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Companheiro, se o médico não intervir, não aceitar a procura da mulher, ela naturalmente continuará e terá o filho normalmente. O SR. CONSTITUINTE CHICO HUMBERTO: – Engano do Senhor, a maior parte dos abortos são feitos em fundo de quintal por quem não é especializado. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mas, legalizando, vai aumentar o número de charlatões. Esses abortos de fundo de quintal vão so- mente legalizar e vai aumentar o número de abortos. O SR. CONSTITUINTE CHICO HUMBERTO: – O aborto de fundo de quintal é praticado hoje. Eu estou oferecendo um dado para a Senhora do que está sendo feito hoje. Isso é feito hoje, não é feito por charlatão não, é feito hoje por qualquer pessoa, pela própria paciente. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Permita-me um aparte. (Assentimento.) – Quantos assaltos são praticados no Brasil? Por isso, nós vamos legalizar o assalto? Não! (Palmas!) O SR. CONSTITUINTE CHICO HUMBERTO: – Não é o problema de se legalizar o assalto ou não. É o problema de se permitir a uma sociedade que tenha instrução na sua época certa, e o problema de se permitir a uma sociedade que tenha emprego, é o problema de se permitir a uma sociedade que haja dignidade no pagamento do seu salário, e daí nós temos essa quantidade de assaltos, aí nos temos 15 milhões de crianças marginalizadas. Não é se legalizar assaltos. Nós estamos analisando o mérito, apenas, e, quando se fala em assalto, nós não questionamos o problema social gravíssimo neste País, que tem o salário mínimo de 1.300 cruzados. O SR. RELATOR ERALDO TINOCO: – Eu acredito que essa questão do aborto também é muito relacionada com o problema social maior. Se examinarmos, a falta da consciência médica, de pessoas que, digamos assim, aceitam praticar em fundo de quintal um ato que é ilegal, então isso redunda numa falta de educação, uma falta, digamos assim, até de preparo social. Também, se examinarmos essa estatística, que não sei se é válida ou não, porque são dados estimados, justamente por isso o Senhor acabou de falar que ninguém revela que fez aborto. Então, essa estatística deve ser amplamente contestada. Vamos verificar que a maioria dessas pessoas que se submetem são pessoas que não têm educação apropriada, que não enfrentam, não tem capacidade, por exemplo, de enfrentar uma realidade e que a isso se submetem. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Gostaria de assegurar ao Constituinte Chico Humberto o direito de defender a sua tese, sua posição; e, aí, teremos oportunidade de contraditar. Estamos interferindo na sua exposição, tirando-lhe o direito de defender a sua tese. O SR. CONSTITUINTE CHICO HUMBERTO: – Já estou terminando. Inclusive quanto ao problema da dúvida, quero deixar bem claro: o aborto de fundo de quintal não é praticado pelo médico, – e, aí, quero defender a minha categoria; o médico faz aborto, na sua clínica, no seu hospital, com toda higiene, com tudo aquilo que os recursos técnicos exigem de sua formação profissional. O aborto de fundo de quintal é fabricado por elementos estranhos, que eu não sei quem, e nem me interessa saber. É bom que se faça essa distinção. Mas, os dados que eu tenho de um milhão e oitocentos mil casos cirúrgicos por abortos praticados de fundo de quintal, esses são verídicos, esses são reais. E caem na rede estatal hospitalar, e aí vem o ônus maior para a Previdência Social, porque depois que fazem a bobagem, recorrem ao médico aqui dentro. Nisso também nós não podemos tampar o sol com a penei- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ra. Fica muito mais caro o tratamento de uma seqüela de aborto do que a sua prevenção ou a sua educação ou até a sua legalização, para o Estado, para a União. Então, eu gostaria de deixar como dados que a sociedade não vai poder somente dizer sou a favor ou sou contra o aborto, vai ter que legislar. E amanhã, depois que terminada a Constituinte, nós vamos ter que fazer a legislação específica. Nós vamos ter que regulamentar aquilo que nós propusemos na Constituinte. E aí eu gostaria de saber como é que ficariam as penalidades que vão ser impostas, não só aos médicos, mas também às pacientes, porque não podemos discriminar no Brasil o cidadão. Fica só responsável o médico? Ou a mulher também vai ficar responsável quando ela comete, mas não é punida, Ela é responsável mas não é punida. Isso é o mais grave. O médico perde o seu CRM, o médico perde a sua condição de trabalho, o médico é tratado como um marginal, como contraventor, e a mulher, não. Então, o que temos de fazer é dar cultura ao nosso povo, para que ele tenha consciência ou não de dar a destinação que bem entender ao seu corpo. E aí, sim, eu advogo a causa de que a mulher deveria opinar mais nesta questão. Eu agradeço a todos e me desculpem a interrupção, mas eu acho de vital importância, porque nós todos estamos interessados em fazer com que haja a maior clareza possível, a maior transparência possível, para que o cidadão brasileiro lá fora possa saber que não temos medo de encarar e discutir o problema. Essa a função maior da nossa permanência aqui dentro. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – O nobre Constituinte Chico Humberto está convidado para a reunião de amanhã. Vamos trazer uma pessoa que virá defender a tese da legalização do aborto. Estamos trazendo de volta os nossos convidados de hoje, queremos que eles estejam aqui para nos dar a honra de realizar o trabalho que foi realizado aqui, então eu acho que nós vamos ter amanhã uma sessão bastante movimentada, bastante agitada. Então eu convido o Constituinte Chico Humberto que nos dê a honra de sua presença, amanhã novamente. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Gostaria inicialmente dizer que sou contra ao aborto, por uma questão de formação e porque considero uma questão moral. Entretanto, acho que a questão deve ser vista de todos os ângulos. O que elas pedem hoje, o que elas reclamam é a discriminação do aborto. Eu não estabeleço bem uma diferença entre isso e a legalização do aborto, porque me parece que aquilo que não é proibido é permitido. No entanto eu pergunto: é justo que a mulher que faz um aborto, por circunstâncias que ninguém está analisando aqui, ninguém está lembrando que todo o peso de uma gravidez indesejada cai sobre a mulher. Aquele que ajudou a fazer o filho, que foi o parceiro para fazer o filho está fora da história: quer dizer, ela assume sozinha todo ônus, todo o peso, toda a vergonha, enfim, tudo aquilo que traz ônus de uma gravidez indesejada, especialmente se ela for uma pessoa solteira. Agora, a legislação hoje, o Código Penal prevê a punição da mulher, sim. É justo que essa mulher assuma sozinha essa gravidez indesejada, que só ela deva ser o ser moral que não queira o aborto, porque o homem está fora desta história! Esse, o meu questionamento para esta reunião, que não se abordou. Então, já que vamos legislar sobre o assunto, por que não tentar amarrar também um pouco o parceiro daquele feto? Estamos vendo as coisas muito unilateralmente, é crime, não é crime, é moral, não é moral, sem analisar o que isso pesa, o que isso significa. No entanto, reafirmando, eu pessoalmente sou contra ao aborto, acho que é uma questão moral, não é uma questão só de saúde, não entra absolutamente no elenco de medidas de planejamento familiar, e votarei em qualquer circunstância contra o aborto; mas acho que essas considerações paralelas elas precisam ser trazidas também à discussão, porque não é tão fácil, não é só dizer não, não pode abortar. É um peso muito grande que a mulher tem que assumir no momento em que resolve realmente permanecer com aquela gravidez que realmente não é desejada. Muito obrigada O SR. GERALDO H. OSANI: – Queria colocar, aqui, a experiência que tenho a respeito de o homem assumir. Acontece, muitas vezes, que o homem resolve assumir, mas o assumir dele é pagar o aborto. Este é o assumir. Mas quando assume a criança também há um problema de ordem psicológica um pouquinho maior: ele vai querer a criança registrada no nome dele; então é filho de mãe solteira, cuja criança esta registrada com o nome de um pai. Acontece que, na legislação vigente, quando um homem casa com uma mãe solteira não está registrado o nome do pai, ele pode, no momento, no ato civil, reconhecer o filho dele como legítimo. Então, na educação dos filhos, da prole, fica a diferença. Nos temos que também mudar a parte do Código Civil no que concerne a isso; porque se aquela criança foi assumida pelo pai, está registrada com o nome do outro, já começa o problema, não é mais herdeiro do outro, comunhão parcial de bens. Então, fica um problema. É uma coisa complicada. Então, o que eu tenho visto é isso. As complicações, principalmente essas jovens de 15 e 16 anos, quando o homem assume e registra no nome dele, muitas vezes elas começam a fazer chantagem depois. Um dos conselhos inclusive que eu dou para as meninas, solteiras, é o seguinte: se você vier a se casar com ele você registra no nome dele, porque pode ser assumida no ato do casamento, se não se casar não bota no nome dele, porque aí o outro com quem for casar pode assumir a paternidade, sem criar problemas de ordem psicológica para a criança. Então, nós temos que pensar no futuro também. Então, a experiência que eu tenho, que não é pequena, é de oito anos, já defrontei com esses casos. Então, esse assumir a paternidade, como ficaria oficializado no papel, ou coisa parecida? Teria que acabar com a certidão de nascimento, uma para pegar outra? Vejo um problema muito a sério com isso aí. O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – Antes de dar a palavra ao Colega aqui ao lado, deixe-me lembrar, porque chegaram outros Constituintes depois do aviso que fizemos. Nós recebemos um convite da Assembléia Legislativa do Espírito Santo, em que o seu Presidente convida esta Subcomissão para realizar uma reunião no Estado do Espírito Santo. O ponto de vista dele é que a 44 sociedade capixaba gostaria de participar. Muitas entidades e pessoas gostariam de participar dos trabalhos desta Subcomissão. Não podem, porém, se deslocar para cá. Então está sugerindo que nós realizemos na Assembléia Legislativa, e propõe a data de sábado próximo, para uma reunião como a que realizamos aqui, a fim de que os capixabas possam ter oportunidade de participar. Alguns outros colegas, o Deputado Salim Curiatti alegou que nós não teríamos condições de participar em todos os Estados, e eu lembrei a ele que recebemos apenas um convite até agora. Portanto, estamos trabalhando em cima de um fato concreto, que é o convite que recebemos do Deputado Dilton Lírio, naturalmente querendo prestar uma homenagem a esta Subcomissão, devido ao fato dela estar sendo presidida por nós, mas eu acho que é uma oportunidade, é um fato novo. Alguns colegas, que já ouviram antes o convite, concordaram com a idéia e já se colocaram viajar conosco. Os três outros Constituintes que chegaram após tomam agora ciência desse convite, que me parece está pegando apenas na questão do tempo, acham que sábado está muito em cima, sábado próximo, mas eu acho que a estrutura da festa lá é problema do Deputado Dilton Lirio, os convites, nós iríamos ajudar na promoção. De modo que o convite está feito, alguns já aceitaram, mas nos temos que ter, pelo menos, o quorum regimental para realizarmos uma reunião comum, como a que realizamos aqui. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Não há possibilidade para o outro sábado? O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – O outro sábado é após o Dia do Trabalho, sexta-feira. Naturalmente, muitos gostarão de estar nos seus Estados, aproveitando o final da semana prolongado; há esse inconveniente. Precisamos deliberar sobre esse assunto para que eu possa entrar em contato com o Deputado Dilton Lírio, para que ele possa organizar o encontro. O SR. RELATOR ERALDO TINOCO: – Se for este sábado, nós dais aqui Roberto Augusto e Sotero Cunha, estaremos presentes, neste sábado, no outro não. O SR. PRESIDENTE (NELSON AGUIAR): – Vamos oferecer toda a pauta como sugestão, para que possam debater diferentes assuntos. A proposta de que nós teremos uma reunião pela manhã e outra a tarde. Dormiremos no Estado do Espírito Santo, e os que quiserem voltar no dia seguinte, domingo, poderão fazê-lo, e os que não quiserem, poderão continuar conosco no Estado do Espírito Santo. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, eu gostaria que o Deputado Chico Humberto estivesse aqui para essa colocação, mas, certamente, amanhã voltaremos ao assunto. No momento em que S. Ex.ª falava, eu olhava para o semblante dos dois médicos, e meu coração pulsava também. Então comecei a contemplar as deputadas. A mulher não é a grande culpada nisso. Acompanhamos, no Brasil, todo esse problema de aborto, e S. Ex.ª tocou no aborto de quintal. Acontece o aborto de quintal porque para a mulher fazer um aborto, com a grande maioria de médicos, precisa ter muito dinheiro. Não se faz um aborto com meia dúzia de cruza- 45 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dos. Então a mulher vai, recorre a fundo de quintal, porque ela não tem dinheiro para tal. Agora, a formação também para a legalização ou não do aborto, depende muito da família, e, junto a isto, primeiramente estão a educação espiritual de cada um de nós. Não fui criado num lar evangélico, hoje sou inclusive, bispo evangélico; fui criado num lar cristão, católico. Quando se faz, numa estatística, essa pergunta, ela responde: sou católica, mas não pratico, não busca a verdade. Há na Bíblia uma palavra que diz que "o meu povo sofre, pois lhe falta conhecimento da verdade". Por causa dessa formação espiritual, o homem e a mulher se voltam para caminhos que, se o Constituinte tivesse visto os slides que foram passados aqui, e que vão ser repetidos amanhã, S. Exª talvez mudasse sua colocação sobre o aborto. Somos contra o aborto. Nós, que temos uma formação cristã sadia, somos contra o aborto. Quando o Relator Eraldo Tinoco, colocou as duas hipóteses do risco de vida para a mãe, no caso de estupro, eu também tinha esse pensamento, que está sendo mudado depois dessa palestra com a presença desses dois médicos. Quando assumi rapidamente ai a Presidência, com a ausência do nosso querido Presidente, perguntei isso ao Dr. Daniel Barbato. Ele é de uma região onde eu nasci em Mato Grosso: fiquei muito feliz mesmo. E creio, inclusive, não somente como Constituinte, mas como homem de uma visão espiritual, que é uma dádiva de Deus a dupla de médicos que aqui comparece hoje. E nós devemo-nos conscientizar de uma coisa: o plano de ambos – inclusive guardei algo que o Senhor falou logo no início – se coloca nas mãos do Senhor 30 equipes, e o Senhor tem condições de fazer isso, em cinco anos, foi o que o Senhor colocou aqui, riscaria, quer dizer, correria o Brasil conscientizando a família brasileira daquilo que o Senhor mostrou aqui e do grande valor da vida. Creio que esta Constituinte deve, por intermédio nosso aqui desta Subcomissão, levar isso avante, com todo o esforço possível, porque se tentam tantas coisas, se investem em tantas coisas, muito melhor seria investir numa causa como esta que hoje os Senhores aqui apresentaram. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem. Minha opinião particular coincide com a da maioria aqui. Tenho uma preocupação na Carta que nos dirigiram as mulheres; elas colocam como reivindicação o direito à legalização do aborto. Então vamos naturalmente ter ocasião de estabelecer um debate muito forte. Estamos convidando uma representante das mulheres, que defende a legalização do aborto, para que ela esteja conosco amanhã, a fim de que possamos ter as posições claras aqui e não ficarmos com o monopólio da verdade. Do meu ponto de vista, sou cristão, sou também de uma igreja evangélica, com uma prática da religião há 28 anos, acho que a vida tem início no ato da concepção, que no meu modo de ver é um ato de Deus, já que Deus e a fonte da vida. O casal está sendo usado apenas para que o ato da vida seja desencadeado. Todas estas dificuldades não são criação de Deus são criação do homem. A verdade é que os problemas são do homem. Gostei muito da posição assumida pelo nosso conferencista, Dr. Geraldo Hideu Osanai, porque ele não quis abrir mão do princípio. Há um pensador que diz que o homem e um princípio No momento em que ele abre mão do princípio que ele defende, ele passa abrir mão do fato de ser homem. Pode essa idéia ser um pouco exagerada. Mas a verdade é que se defendemos o princípio da vida, como um ato de Deus, transigir com respeito a isso é transigir no tocante ao princípio que acatamos e que adotamos. Agora, temos que respeitar as opiniões de outras pessoas. Estamos lendo um livro que nos foi oferecido ontem, que e um negocio horroroso que ocorre na Inglaterra: exatamente os fetos resultados de abortos são usados para a indústria de cosméticos naquele grande país. Quer dizer, é um negócio de apavorar a gente, o que demonstra que o respeito à vida não é um princípio universal aceito por todos os homens. Só fico espantado é de ver que atrás disso tudo existe uma coisa: dinheiro, posição e dinheiro. Há, no Estado do Espírito Santo, não vou citar o nome, por uma questão de respeito – um médico que ficou riquíssimo fazendo aborto, e terminou secretário da Saúde do Es tado. Ficou riquíssimo fazendo aborto. Ora, como defender o médico nessa situação? Não estou dizendo que a mulher e o homem não sejam culpados. Mas como defender o médico que vai ganhar dinheiro para fazer o aborto? Se ele estivesse socorrendo uma pobre vítima, que quer se livrar do filho por qualquer razão, mas o fizesse gratuitamente, muito bem. Mas é preciso que se passe primeiro no caixa, e deixe lá o pagamento. Quer dizer, ele está ganhando dinheiro para suprimir o direito à vida. Outra coisa também que me espanta na sociedade brasileira, e acho que se nós levássemos a questão para o público dificilmente ficaríamos com a maioria da população, hoje neste estágio de desinformação, é a falta de respeito no tocante à vida dos que já nasceram. Falei ontem numa reunião da comunidade cientifica, sem ser cientista, mas coloquei esta opinião: assisti neste País muitas coisas escandalosas, li muito sobre elas, até escrevi a respeito. Por exemplo, os escândalos financeiros, a guerra da repressão, repressão política com ingrediente da tortura até a morte, o uso de crianças para diferentes práticas delituosas, as perversões que ocorrem aí envolvendo crianças são coisas escandalosas. Mas acho que uma nação, quando abandona sua infância, chegou aos limites, da degradação. Acho que quando um povo aceita como um fato natural o abandono da infância, do inocente, o desprezo da infância, e eu acho que ela chegou o momento em que tem que parar para rever, para se repensar. E aí é que eu me lembro outra vez do Governador Waldir Pires – a Deputada Rita Camata olhou para mim, espantada, quando eu me referi a essa expressão do ex-Ministro e exGovernador Waldir Pires: "A sociedade brasileira precisa se repensar", foi a colocação dele. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Ilustre Presidente, permite um aparte? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com prazer. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Ela ficou espantada porque quando V. Exª começou a falar de um Governador da Bahia, eu balancei a cabeça no sentido positivo; quando V. Exª falou que era o Waldir Pires, eu balancei no sentido contrário. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas eu não quero entrar nessa briga baiana, porque ela é muito particular, e todos que entraram lá se machucaram. Chega para nós as brigas capixabas. Mas eu quero pensar nisso; por que nós vamos ter respeito no tocante àqueles que estão no ventre da mãe que quer ficar livre dele se nós não temos respeito para com aqueles que lá nasceram? Se nós formos ali na Ceilândia, nós vamos ver crianças pequeninas que estão começando a andar, disputando com os porcos e urubus nos lixões o direito de não morrer de fome. Ora, se essa sociedade não tem respeito para com aquele que nasceu, que está viva, que está palpitando, que está conversando, por que ela vai ter respeito no tocante àqueles que, assumindo uma posição muito individual e particular, vão lá para se livrar do filho? Por isso eu acho que essa coisa tem que passar por um amplo debate, uma grande discussão nacional. Eu penso que dispor do pessoal técnico para trabalhar tecnicamente esta questão, no sentido de informar sobre métodos, sobre meios, é muito importante. Mas, nós precisamos de uma posição política e social a respeito dessa questão. Tenho falado, por exemplo, que a questão do menor é uma questão política, é um problema cuja solução depende de atos de Governo e, portanto, de decisões políticas, este País não tem dinheiro para a infância. Eu fui Presidente da FUNABEM, e sei a peregrinação que tive que fazer nos Ministérios em Brasília, na SEPLAN, para conseguir um orçamento de 800 bilhões de cruzeiros, eu sei a dificuldade que tive, eu sei quanta briga tive. Eu sei enfrentar tecnocratas atrás da mesa dizendo: "Mas como que o senhor quer passar de um orçamento de 160 bilhões para o orçamento de 1 trilhão? E eu dizia: "Da mesma forma que os senhores conseguiram dinheiro para tapar o buraco do Banco, aquele Banco do Rio Grande do Sul, do Banco Sulbrasileiro", etc., etc. Quer dizer, eu não acho que o problema da infância brasileira seja par falta de recursos; não é, é por falta de prioridades. Se o problema da infância fosse um problema de prioridade nacional, a solução aparecida. Mas nós vemos aqui com que facilidade se arranca o asfalto da rua para fazer de novo, com que se gasta o dinheiro com obras que não têm nada a ver com o interesse direto das pessoas. Eu me lembro que, naquela época, eu era Deputado aqui, fiz urna denuncia e fui duramente censurado. Era Presidente o Deputado Flávio Marcílio. Exª então resolveu substituir as máquinas que nós temos nos nossos gabinetes; tínhamos antes a máquina Remington azul, 3 máquinas em cada gabinete, e resolveram substituí-las por aquela máquina que temos lá, aquela máquina branca, adquiriram 1000 máquinas, àquela época, de uma multinacional sueca. Transferiram, portanto, para aquela empresa, um volume extraordinário de dinheiro num mesmo instante em que as mulheres entram aqui nos corredores do Congresso Nacional com um filho no ventre, com outro no braço e com outro puxando pela mão mendigando dos Congressistas esmodia. Veja bem que este é um problema grande, complexo, vasto, e quando nós estamos aqui pen- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) sando na questão do planejamento familiar e, dentro desta discussão, a questão do aborto, temos que levá-la para muito longe, ter coragem de enfrentar obstáculos, de contrariar pessoas, porque, repito, se não estamos tendo nenhum respeito para com a vida daqueles que ainda estão por nascer, principalmente das mães e dos pais que querem ficar livres deles? Convocamos para amanhã no horário regimental, a nossa nova reunião, já que à tarde teremos outros encontros, como a eleição do IPC. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, permita-me antes de concluir a reunião. Ouvi, pelos alto-falantes, que foi transferida a sessão do Congresso Nacional para aprovação das mortificações do Regimento do Congresso Nacional. De qualquer forma, a reunião está prejudicada. Mas, Sr. Presidente, dentro do propósito de elaboração do parecer do anteprojeto, eu acho importante que tenhamos essas reuniões de debate interno da subcomissão. Então, eu gostaria que ficasse um prazo, uma oportunidade qualquer para termos esse debate, porque eu, na qualidade de relator, tenho inúmeras dúvidas, ainda, por exemplo, ontem, depois daquela discussão sobre o problema de família, eu fiquei com mais dúvida do que quando cheguei aqui. Acho que somente através do debate da Subcomissão poderei, realmente, esclarecer esse ponto de vista, de acordo com a opinião que prevaleça na maioria. A questão, hoje, do aborto nos casos previstos na lei – estou saindo desta reunião com mais dúvidas do que quando aqui cheguei. Gostaria, realmente, de ter esclarecimentos. Agora, para facilitar, estou me propondo fazer o seguinte: Na medida em que esses temas forem debatidos, tentarei fazer um trabalho de sugerir o texto, com a justificativa, e entregar informalmente aos companheiros da Comissão, para que cada um possa refletir em cima daquele texto, daquela justificativa e, até mesmo, sem debate prévio do parecer, mas já possam encaminhar-me, de maneira informal, as suas observações, as suas sugestões, no sentido de tentarmos chegar a um texto final de anteprojeto o mais próximo possível da vontade da maioria da Subcomissão. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Amanhã, teremos a relação dos companheiros que deverão ir conosco ao Espírito Santo e, então, tratarmos da hospedagem, das passagens, horário de vôo etc. Queríamos agradecer a presença dos dois médicos conferencistas. Naturalmente, os teremos amanhã de novo, para continuarem enriquecendo os nossos conhecimentos a respeito desses assuntos tão controversos. Está encerrada a reunião. tuinte Nelson Aguiar (PMDB-ES), com a presença dos seguintes Constituintes: Roberto Augusto (PTB-RJ), Antônio Salim Curiatti (PDS-SP), Eraldo Tinoco (PFL-BA), Cássio Cunha Lima (PMDB-PB), Eliel Rodrigues (PMDB-PA), Ervin Bonkoski (PMDB-PR), Eunice Michiles (PFL-AM), Iberê Ferreira (PFL-RN), João de Deus Antunes (PDT-RS), Maria Lúcia (PMDB-AC), Rita Camata (PMDB-ES), Sotero Cunha (PDC-RJ), Vingt Rosado (PMDB-RN), como membros da Subcomissão e os Senhores Constituintes Sandra Cavalcanti (PFL-RJ) e Abigail Feitosa (PMDB-BA), como participantes. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou iniciados trabalhos e solicitou fosse dispensada a leitura da Ata da reunião anterior, que foi considerada aprovada. Prosseguindo, o Senhor Presidente apresentou os Drs. Dernival da Silva Brandão, médico, como representante da CNBB e João Evangelista dos Santos Alves, médico, como representante da Academia Fluminense de Medicina que discorreram sobre o tema "Planejamento Familiar", com apresentação, inclusive, de slides e filme sobre o aborto e métodos anticonceptivos. Concluída a exposição, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para debate com os expositores. Manifestaram-se sobre o assunto os seguintes Constituintes: Cássio Cunha Lima, Maria Lúcia, Iberê Ferreira, Ervin Bonkoski, Sandra Cavalcanti, Abigail Faltosa e Eraldo Tinoco. A seguir, o Senhor Presidente colocou em votação a data em que a Subcomissão reunir-se-á na Assembléia Legislativa de Vitória-ES, para participar de um debate naquela cidade com as entidades representativas da sociedade local; ficou decidido a data de trinta de abril. Nada mais havendo a tratar, o Senhor presidente agradeceu a presença dos Drs. Dernival da Silva Brandão e João Evangelista dos Santos Alves, dando por encerrados os trabalhos às quatorze horas, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia vinte e sete de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: depoimento e debate com entidades representativas do segmento social sobre o tema "Influência da Comunicação na Vida Familiar". E, para constar, eu, Antonio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata que, depois de lida e aprovada será assinada pelo Senhor Presidente. – Nelson Aguiar, Presidente. ANEXO À ATA DA 6ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 23 DE ABRIL DE 1987, ÀS 9:50 HORAS ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Há constituintes que não tiveram ocasião de assistir reunião de ontem, como também pessoas da nossa assistência. Creio Aos vinte e três dias do mês de abril que seria oportuno repassarmos os slides. do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às (Projeção de slides.) nove horas e cinqüenta minutos, na Sala da Comissão de Municípios – Anexo II do O SR. PRESIDENTE (Nelson Senado Federal, reuni-se a Subcomissão Aguiar): – O tema proposto é planejamento da Família, do Menor e do Idoso, familiar e não especificamente, o sob a presidência do Senhor Consti- aborto. Aliás, temos recebido algumas ATA DA 6ª REUNIÃO ORDINÁRIA, REALIZADA EM 23 DE ABRIL DE 1987. 46 observações de desagrado. Ontem mesmo, através de um telefonema, alguém, cujo nome deixo de mencionar, observava que aborto não é assunto para a Constituição, e que outras nações não se preocuparam em colocar nada que diga respeito ao aborto no texto de suas Constituições. Observamos, em contrário a essa pessoa, que todas as nações do mundo estão preocupadas com a proteção à vida. Se no texto da Constituição não se deve falar especificamente sobre o aborto, acho que temos obrigação de inserir no texto da Constituição algo com à sociedade e ao Estado cabem assegurar o direito à vida. O que temos a que perguntar é: A partir de quando ao Estado e à sociedade incumbe assegurar o direito à vida? Na carta das mulheres, temos no nº 9 do titulo "saúde": garantia de livre opção pela maternidade, compreendendo-se tanto assistência ao pré-natal, parto e pós-parto como o direito de evitar ou interromper a gravidez, sem prejuízo para a saúde da mulher. Ontem recebemos um telefonema do Conselho do Direito da Mulher, que manifestava o desejo de retomar a esta Comissão para debater este assunto: o aborto. Gostaria de saber se há algum representante do Conselho presente. Se tiver, nós o convidamos para fazer parte da Mesa. A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – Gostaria que ficasse registrado que esta carta das mulheres representa apenas o ponto de vista de uma parcela ínfima das mulheres brasileiras, assinadas, talvez, por apenas 20 ou 30 mulheres, de um período de estudos que envolveu no máximo duas mil. Então, não seria interessante que ficasse registrado na Ata da nossa reunião que isto é a carta das mulheres. Isso não é a carta das mulheres. Esta carta, por exemplo, eu jamais assinaria e tenho a certeza de que milhares e milhares de mulheres também não a subscreveriam. Então não é a carta das mulheres; é a carta de um pequeno grupo de mulheres, pensando que, por estarem num Conselho, podem impor a sua vontade à de milhões de mulheres brasileiras. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Vamos ordenar os nossos debates. Já assistimos à exibição do filme e dos slides e vamos dar oportunidade aos nossos expositores, lembrando a S. Sª que o tema proposto é o planejamento familiar; e dentro deste assunto, naturalmente, o assunto tem suscitado maior interesse e uma controvérsia muito maior. Pela ordem, concedo a palavra ao Dr. João Evangelista, que terá 30 minutos para fazer a sua exposição, em seguida falará o segundo expositor, dispondo do mesmo tempo e, no final, daremos a palavra aos Srs. Constituintes que desejarem comentar ou fazer indagações. O SR. JOÃO EVANGELISTA: – Dirijo-me ao Exmo. Sr. Presidente desta Subcomissão, aos Srs. Constituintes membros da Comissão e aos demais presentes: Constitui realmente uma grande honra participar desta reunião e entregar à Subcomissão da Família dois trabalhos de médicos fluminenses, fundamentados em ampla revisão bibliográfica, que representam a colaboração da Academia Fluminense de Medicina, aos estudos que se de- 47 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) senvolvem para a elaboração da nova Constituição brasileira, a qual, todos esperamos, estará a altura dos mais elevados valores e anseios do povo brasileiro e da humanidade, inclusive anseios de liberdade com responsabilidade. Constituindo-se, certamente, em um instrumento de autêntica valorização e promoção do homem, em sua dupla dimensão temporal e eterna. Certamente dará respaldo ao direito à vida desde o momento de sua concepção, valorizando, inclusive, as fontes da vida, pois não é possível promover a pessoa humana, desvalorizando a própria vida que se quer promover. Vamos aproveitar o tempo de que dispomos para transmitir alguns trechos dos trabalhos que apresentamos à consideração da Subcomissão da Família. Neste trabalho não discutimos temas de ordem econômica ou demográfica. Ativemo-nos à atuação médica. Porque, realmente, reconhecemos que existem situações em que numerosas famílias se vêem na contingência, na necessidade, de controlar o numero de filhos a curto ou a longo prazo. Vemo-nos, assim, diante do problema do planejamento familiar e da necessidade de encará-lo objetivamente, que é justamente o tema da reunião de hoje. Entre os vários aspectos a se considerar surge imediatamente, uma questão fundamental, que é justamente a escolha dos métodos a serem adotados e as providências paralelas a serem tomadas, de modo a atingir os fins que se deseja sem produzirem efeitos sociais graves que possam denegrir a dignidade humana, criando um circulo vicioso e de conseqüências imprevisíveis. O remédio inadequado ou mal formulado, ao invés de representar solução para a doença social, poderá acrescentar mais problemas, mais misérias à nossa, já agitada, humanidade nesse final de século. Consideramos justa a preocupação pelo crescente aumento de gestações indesejáveis, sobretudo em mulheres solteiras e de idade cada vez mais precoce. E evidente, pelo menos nos parece, que constitui um contra-senso a promoção abusiva do sexo pelos meios de comunicação social, pelos meios de publicidade, promoção essa estimulada, inclusive, pela difusão de métodos anticoncepcionais, que são colocados à venda sem a mínima restrição. Cria-se, assim, uma atmosfera de inadequada valorização do sexo, com estimulo de uniões em todos os ambientes e em todas as idades, mas, sobretudo, entre adolescentes. Esses, sem discernimento suficiente, são levados pela propaganda e pelas facilidades que lhes são oferecidas a atitudes irrefletidas e inconseqüentes, pois são ainda imaturos, porém atitudes essas capazes de gerar novas vidas e com isso os efeitos contraceptivos dos métodos artificiais se anulam pelo exagerado estímulo ao processo procriador que eles próprios ajudam a criar, tanto no uso ordenado da vida conjugal quanto no desordenado sexo sem compromisso. Então o recurso passa a ser o apelo ao abortamento provocado, eliminando-se os filhos, ditos indesejados, em número cada vez maior de mães solteiras e mesmo de famílias constituídas. A mentalidade antinatalista evolui do anticoncepcionalismo, em si mau, ao aborto livre, e desse à eutanásia de pessoas moribundas ou deficientes em qualquer idade. É importante, aqui, assinalar esta inter-relação entre mentalidade anticoncepcionalista e antina- talista e mentalidade abortista, os dois caminhos pari passu. A medida em que as técnicas de anticoncepcionalismo se aperfeiçoam, as técnicas do aborto também se aperfeiçoam. No mundo inteiro, o respeito à vida, nos Códigos Penais, nas nações que foram liberando o aborto, colocando essas crianças que vimos aí à margem da lei, foi conseqüência de uma propaganda, de uma difusão do anticoncepcionalismo. Já naquela época, quando começou esse movimento mais acentuado de controle de natalidade, pessoas sensatas já previam isso, que o número de abortos iria aumentar, ao invés de diminuir. Hoje vemos que nas cidades onde mais se pratica o anticoncepcionalismo, é onde mais se pratica o aborto; onde mais o anticoncepcionalismo está entranhado na sociedade, é onde mais o aborto também está sendo aceito com muito mais facilidade. Forma-se um ciclo vicioso, e daí o respeito à vida vai cada vez mais sendo desrespeitado. Tudo isso em nome de pseudodireitos nunca devidamente explicados, porém apoiados em chavões amplamente difundidos e que conseguem anestesiar as consciências atônitas, pelo ritmo da vida moderna e, por isso mesmo, pouco atentas à realidade e à importância de certos fatos: que muitas vezes vemos passar, e não damos importância às conseqüências a que isto pode levar no futuro; e já estamos. realmente, vivendo muito essas conseqüências. É óbvio que uma das principais e urgentes providências a serem adotadas, não só por motivos éticos, mas também com vistas à apropriação responsável e planejamento familiar, é a de prover, pelos meios cabíveis, o saneamento ambiente moral e espiritual da sociedade, restabelecendo, inclusive, o respeito à sexualidade humana, seu valor, sua bondade, sua beleza. Mas, o problema que realmente desejamos colocar aqui é o seguinte: Como fazer um honesto planejamento familiar sem afetar a instituição da família? Sem agredir a saúde e a dignidade da mulher? Sem atingir a dignidade dos cônjuges? Sem desvalorizar a vida humana? Sem deturpar a finalidade intrínseca do ato procriador? Sem fechar as portas à vida? Os métodos propostos exigem, portanto, um criterioso exame de todas as suas particularidades e conseqüências antes de serem aceitos. A aplicação do método é matéria eminentemente médica. Então, nós, médicos, não podemos aceitar práticas profissionais que esvaziam a medicina em seu conteúdo ético. Assim, julgamos oportuno, neste momento, tecer algumas considerações sobre os principais métodos propostos na atualidade, atendo-nos à exposição de alguns fatos que rios parecem importantes para esclarecer aos que devem, por dever de ofício, ordenar o planejamento familiar, através de meios lícitos, e não de meios que sejam por si a negação dos elevados fins a que se propõe. Com este escopo, e tendo em vista o respeito à vida, inclusive o respeito a mulher, dividimos os métodos de planejamento familiar proposto na atualidade, em três categorias. Pediria que fosse projetado o primeiro slide . São vários os métodos propostos na atualidade para o planejamento, para o controle da natalidade. Agrupamos, tendo em vista, justamente, o respeito à vida humana e à mulher. Existe um grupo de métodos que destroem a vida já constituída. É o aborto provocado. São métodos criminosos, porque atingem uma vida que já existe. Métodos que impedem a formação da vida, que interceptam a formação da vida. Uma vez desencadeado o processo de formação, ele é interceptado e impede que essa vida se forme, são os métodos antinaturais, artificiais, é a anticoncepção. Existem os métodos que respeitam as fontes da vida e se baseiam no conhecimento pela mulher de sua própria fertilidade, em seus períodos férteis e inférteis, seria o método natural de planejamento familiar. O próximo. Esses métodos criminosos, aqueles que destroem a vida, o aborto provocado – existem várias técnicas de aborto, não vamos passar por elas, uma vez que, inclusive, já foram apresentados, mas vamos nos deter em dois itens: o DIU, dispositivo intra-uterino e as pílulas, e aqui nos referimos especialmente à um tipo de pílula, que é chamada pílula do dia seguinte, que não é tomada em tempo oportuno de impedir a ovulação, mas é em tempo oportuno para produzir na cavidade uterina, na mucosa que reveste o útero, uma alteração tal que impede a fixação do novo ser concebido, então a mulher menstrua sem saber que concebeu um filho. O dispositivo intra-uterino, sobre esse vamos falar um pouquinho mais, porque ele é muito freqüentemente apresentado como sendo anticoncepcional, mas ele é um artefato abortivo. É colocado dentro do útero da mulher, aí mantido por tempo indefinido para impedir que a gravidez evolua todas as vezes que sua portadora concebe um filho. Porque a concepção é feita na extremidade da trompa, é lá que as duas células se encontrem. Houve uma pergunta, o momento em que se deve garantir o direito à vida, parece que a resposta é muito fácil porque é o momento em que a vida tem início. A vida tem que ser respeitada a partir do momento que ela começa, e ela começa nesse momento, quando as duas células maduras, espermatozóide e óvulo de duas pessoas de sexo oposto, se unem e deixam de ser duas células maduras para se transformarem no ser humano mais imaturo que existe, mais imaturo e mais indefeso, que precisa de maior defesa; é justamente no momento que ele se constitui. Então, nesse momento, como disse a pessoa que falava pelos slides, ele ainda não tem nariz, não tem olhos, não tem cabelo, mas o tipo do nariz, o tamanho do pé, enfim, o grupo sanguíneo, o fator Rh, todas as suas características individuais já estão aí determinada, e vai se desenvolver pelo resto da vida. A calvície vai aparecer depois de 50 anos e não antes, mas já estava determinado lá. Vejam, querem apresentar o DIU como sendo anticoncepcional porque dizem que o espermatozóide talvez não chegue lá, mas as células reprodutoras masculinas, são células maduras e têm resistência, são milhões, de 80 a 200 milhões que são lançadas, e o útero não é o local onde elas vão ficar, é o local de passagem, as que realmente demoram mais aqui morrem antes, porque o ambiente não é nada bom para a vida, foi colocado propositadamente para não ser bom. Mas elas são em números de milhões, e vai fecundar o óvulo. Isso demonstrado por vários trabalhos, inclusive pela Organização Mundial de Saú- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) de. Outro argumento do qual se lança mão é que a gravidez não começaria aí, mas começaria no momento em que o concepto se fixaria no útero, mas é o mesmo concepto que veio de lá e que se fixa aqui. De maneira que não existe possibilidade de argumentar dessa maneira. O corpo estranho aqui colocado transforma esse ambiente hospitaleiro num ambiente hostil e mata, com essas células chamadas macrófagos, que vem ao útero para englobar o corpo estranho que foi colocado, uma defesa ao organismo, e agride o novo. A mulher menstrua sucessivamente, concebe sucessivamente sem tomar sequer conhecimento, porque o primeiro sinal que a mulher percebe da existência do novo ser é justamente dias depois, quando a sua menstruação não vem e ele é morto antes disso e a mulher não chega a saber da sua existência. Então, o DIU é um dispositivo abortivo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com a licença do nosso expositor quero convidar o Constituinte Antônio Salim Curiatti para assumir a Presidência porque tenho necessidade de retirar-me por alguns minutos. O SR. JOÃO EVANGELISTA: – O Dispositivo Intrauterino – DIU – além desse efeito letal sobre o concepto, produz vários efeitos colaterais, várias complicações no organismo da mulher e vamos enumerar, aqui, algumas complicações contidas em documentos do Ministério da Saúde. Os mais constatados são: endometrite – infecção da mucosa uterina; aborto séptico, porque, às vezes, o DIU pode falhar e a gravidez evolui podendo produzir sérias complicações tanto para o feto como para a mãe podendo, portanto, causar esse aborto com infecção; perfuração do útero e cérvice; infecção pélvica; vaginite; leucorréia; erosão cervical; gravidez equitópica; sangramento intermenstrual; prolongamento do fluxo menstrual; anemia; dores lombares e pélvicas; dismenorréia; disparonia; reação cutânea alérgica; bradicardia secundária: perfuração para o abdome, podendo resultar em aderências abdominais; perfuração intestinal; obstrução intestinal e massas físticas pélvicas. São complicações citadas em documento do Ministério da Saúde. Sobre o DIU, ficamos aqui. Agora, vamos falar sobre as pílulas anticoncepcionais, não aquelas que falamos no início, são as pílulas clássicas, são as pílulas de uso corrente. Pode passar para o próximo mostruário, por obséquio. Essas pílulas são compostas de substâncias hormonais e a medicina, de longa data, usa substâncias hormonais para o tratamento de doenças, para tratamento de alterações endocrinológicas, enfim, estados mórbidos que exigem substâncias hormonais para tratamento. Temos experiências já acumuladas inclusive visando a esses medicamentos sempre com cuidado, porque são medicamentos que têm uma série de efeitos colaterais. Nunca vi a medicina usar um medicamento como esse durante tanto tempo, em mulheres absolutamente normais, porque justamente por elas serem normais é que essas pílulas são dadas a elas. Os métodos antinaturais são aqueles que impedem a concepção e como já expusemos existem vários métodos que enumeramos aqui: substâncias espermaticidas, barreiras mecânicas, práticas sexuais anômalas, com coito interrompido, etc., são além de serem antiéticas, antiestéticas, não atingem o fim a que se propõem, porque são falhas. Vamos nos ocupar principalmente das pílulas. Quanto à esterilização cirúrgica, também não vamos nos ocupar porque é uma cirurgia, uma operação definitiva e que, por si só, já mostra restrições bem sérias. Além de muitas mulheres e muitos homens que se submetem à ligadura do deferente, as senhoras podem apresentar distúrbios menstruais por defeito da vascularização do ovário, o que é comum, pode haver problemas de frigidez, nos homens, pode haver problemas de impotência. De qualquer maneira, é uma atitude definitiva e o tempo, realmente, não nos permite entrar em maiores considerações sobre esses métodos. Vamos nos ater à pílula, que é o método mais usado. Pode passar o seguinte, por favor. (Projeção.) Dissemos que as pílulas agem em mulheres que são normais, que têm a sua fisiologia e seu mecanismo normais, para impedir que do ovário saia um óvulo. Mas, para impedir isso, não é apenas "o ovário pára de ovular e tudo continua funcionando direitinho". Aí é que está. Existe um delicadíssimo sistema de inter-relação glandular, uma glândula pequenina, com apenas alguns milímetros, que fica situada num estojo ósseo, na base do crânio, chamada hipófise ou pituitária, que recebe estímulos de uma parte do cérebro chamada hipotálamo, então forma-se o eixo hipotálamo – hipófise – ovário, essa glândula controla todo o sistema endócrino do organismo; as tiróides, as supra renais, as gônadas – testículos no homem, ovário na mulher – existem nos dois sexos e na mulher, especificamente no seu relacionamento com o ovário, produz os hormônios que vão fazer com que esse ovário ovule e produza, também, os hormônios femininos, aqueles que dão à mulher as suas características femininas: a distribuição do pêlo, o tom de voz, a própria sensibilidade feminina, a psicologia feminina é influenciada por esses hormônios estrogênios; além do mais, elas preparam o endométrio, a mucosa uterina para acolher o novo ser, no caso de fecundação, e fazem o colo do útero produzir um muco, que facilita a ascensão do espermatozóide. O que acontece, então, quando a pílula é administrada a uma mulher que tem isso funcionando normalmente? É um sistema delicadíssimo. A medicina atualmente é que está se aprofundando mais nisso, mas ainda não conhece suficientemente. É de uma delicadeza muito grande esse ciclo hormonal. São quantidades de hormônios que vão se inter-relacionando uns com os outros, na hora que um está baixo, o outro está mais alto, vão mudando de quantidade no correr do ciclo. Pode passar adiante. (Projeção.) O que acontece é o seguinte: a pílula, agindo sobre, glândula hipófise, faz com que ela pare de produzir aqueles hormônios que vêm estimular o ovário e este para de funcionar e vai, aos poucos, se atrofiando. O uso de pílula durante muito tempo, esse evadiu pude chegar a uma atrofia difícil de recuperar depois; ele pára de ovular e de produzir hormônios da feminidade. Então a mulher que tinha os seus hormônios naturais no seu organismo, fazendo com que ela ovulasse e dando a ela todas as suas características femininas, agora tem um hormônio fabricado em laboratório, 48 porque a sua fábrica natural, o ovário, não elabora mais esses hormônios e essa pílula agindo sobre a mucosa uterina, que está aqui representada, também produz uma transformação anormal. De maneira que essa pílula é anticoncepcional porque sua principal ação é impedir a ovulação através de tudo isso, mas quando há uma ovulação de escape, pode haver uma fecundação, esse endométrio está mal preparado e ela tem secundariamente um efeito abortivo, porque esse novo ser não é capaz de se desenvolver aqui, e às vezes consegue. Não existe método anticoncepcional 100%, todos têm um índice de falha. Só considerando essa ação principal da pílula, ela tem que ser colocada em suspeito, porque ela age obstando uma fisiologia normal, destruindo, desequilibrando todo o sistema endócrino e destruindo esse eixo hipotálamo – hipófise – ovário. Este é o mecanismo de ação, detalhes sobre ele também não são conhecidos, só alguns aspectos, e sabemos que isto acontece. Não sabemos intimamente como essas coisas se desenvolvem, porque existe ainda muitos pontos obscuros na própria endocrinologia. A medicina está agindo ao contrário, quer dizer, ao invés de dar remédios para curar doenças, está dando remédios para criar estados patológicos. Estamos vendo que efeito anticoncepcional dessas substâncias é conseqüência de uma malfazejação direta sobre o delicadíssimo sistema endócrino feminino, alterando-lhe o funcionamento normal, impondo-lhe um ritmo patológico que pode tomar-se estável e persistir assim alterado mesmo após retirada a pílula. As pílulas são compostas da associação de dois hormônios com ação estrogênica e progesterônica sintéticas, fabricados em laboratório. Não se pode afirmar quais deles produzem os efeitos, um ou outro efeito, porque eles agem sinergicamente e, inclusive, os progestogênio podem ser metabolizados em estrogênios. E muito difícil selecionar a pílula anticoncepcional que oferece riscos menos graves. Mesmo os pesquisadores encontram dificuldade para selecionar critérios através dos quais os progestogênios possam ser devidamente comparados, pois entram em jogo vários fatores meu sempre fáceis de serem avaliados. Sabe-se, por exemplo, que cada pessoa tem seu sistema enzimático com algumas características próprias que já estão lá na célula inicial dizendo como serão esses sistemas enzimáticos, que metabolizam melhor certas substâncias que outras, são aquelas individualidades próprias que estão lá na célula inicial dizendo como será. Quer dizer, cada pessoa tem as suas idiossincrasias, tem seus fatores predisponentes a determinadas doenças e, portanto, a determinadas complicações e tudo isto é muito difícil de avaliar e precisar. Alguém já disse, com muito acerto, que toda mulher que toma pílulas anticoncepcionais está se submetendo a uma verdadeira experiência em escala mundial e a experiência continua em andamento, podendo-se afirmar que na história da humanidade, em tempo algum, uma droga com um mecanismo de ação não devidamente esclarecido em todos os seus pontos e com tantos efeitos colaterais e complicações possíveis fora liberalmente aplicada a tão grande número de pessoas normais por tempo tão prolongado. 49 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) A seguir vamos enumerar alguns efeitos colaterais das pílulas anticoncepcionais, isto foi lido da literatura mundial, não é a experiência individual de um médico, é a experiência de grandes serviços que estudam todas essas patologias das pílulas, que catalogaram – e aqui está enfarto do miocárdio. É maior a incidência de enfarto do miocárdio entre as consumidoras das pílulas anticoncepcionais. Quanto mais longo for o tempo de uso das pílulas, maiores serão os índices de mortalidade por doenças do aparelho cardiovascular, que persiste elevadas ainda que a mulher suspenda o seu uso. A propensão às doenças que elas adquiriram com o uso da pílula depois de algum tempo não têm retorno e a hipertensão arterial é outro problema que pode surgir ou agravar-se no decorrer do uso das pílulas, e alguns fatores de risco aumentam o perigo de morte por doença cardiovascular nas usuárias das pílulas anticoncepcionais: hábito de fumar, hipertensão arterial, diabetes, obesidade, hiperglicemia, idade acima dos 35 anos. Efeitos sobre a coagulação sangüínea – observa-se aumento na maior parte dos fatores de coagulação sangüínea diminuindo o tempo de coagulação. Pela ação das pílulas anticoncepcionais verificam-se várias alterações que interferem no mecanismo de produção das tromboses. Vários estudos realizados na Inglaterra. Suécia, Dinamarca, Estados Unidos, têm comprovado positiva correlação entre o uso de estrogênios e risco de acidentes tromboembólicos: pulmonar, cerebral, coronariano, retina, trombose venosa das veias profundas e aumentando de 3 a 8 vezes o risco em mulheres sadias sem nenhum outro transtorno pré-disponente. Sendo que para as tromboses superficiais da perna o aumento de risco é de 50%. Efeitos sobre o metabolismo – ocorre redução nos níveis sangüíneos de vitaminas hidrossolúveis de cálcio, e zinco de magnésio. Verifica-se aumento de triglicérides, lipídios e colesterol, de grande importância na patogenia da arteriosclerose e do enfarto do miocárdio. Observa-se queda nos níveis de aminoácidos e albuminas. Há interferência no metabolismo cerebral do triptofano com diminuição dos níveis de serotonina no cérebro, podendo provocar distúrbios depressivos e do sono. A diabetes pode ser agravada ou surgir em pessoas suscetíveis. Foi relatado que 15 a 40% das consumidoras das pílulas anticoncepcionais apresentam alteração no teste de tolerância à glicose. A obesidade constitui fator que aumenta o risco das complicações nas usuárias da pílula e por isso as obesas estão mais sujeitas aos efeitos colaterais indesejáveis, mas também constitui fator de aumento de risco o teor de gordura inferior a 15% do peso corporal e logo, não só as obesas, mas também as magras estão mais expostas às complicações causadas pelas pílulas; então, obesas e magras. As maiores de 35 anos. Efeitos sobre o sistema nervoso central – tem sido constatado aumento de 6 vezes o risco de trombose cerebral em mulheres sadias sem transtornos predisponentes, cefaléias que vão aumentando progressivamente e casos de enfartos cerebrais. Efeitos sobre o aparelho digestivo – vários deles desde os mais inofensivos, como náuseas, vômitos e colites, até mais graves, como pancrea- tite aguda, icterícias, cálculos da PLANEJAMENTO NATURAL vesícula, ademonas em células hepáticas, DA FAMÍLIA etc. Queria, ainda, mostrar uns slides, só I – Considerações gerais para ilustrar. (Projeção) A família, sendo uma instituição natural, deve merecer por parte dos poderes Vejam a propaganda de uma pílula, a públicos uma proteção condigna. Por ser uma chamada segunda geração de pílulas. São instituição de direito natural, além e acima dos produtos seqüenciais, têm sua segurança fatores de ordem econômica, a organização e comprovada por extensa casuística. Este proteção da família devem levar em produto, depois de muito usado, no auge do consideração o ambiente e os valores em que seu uso, o laboratório manda uma carta aos se assenta a sociedade. A não-proteção médicos dizendo: descontinuamos a desses valores, especialmente os valores fabricação de Novulon S, 11 anos após o seu éticos, levará progressivamente toda a lançamento em mercado brasileiro, período sociedade, da qual a família é a "célula em que proporcionou os resultados esperados mater", à degradação; a ponto de se poder pelos médicos e usuários e, certamente, afirmar que, caso se queira destruir a também os inesperados, porque aqui está: sociedade humana e os seus valores mais retiraram de fabricação por causa de elevados, deve-se começar por destruir a incidência de casos de carcinoma do instituição familiar. endométrio, que é câncer do útero, e todos No I Congresso Nacional em Defesa esses produtos seqüenciais foram retirados da Família e dos Valores da Civilização Cristã, do mercado. observei que há uma citação de Dom Vicente (Projeção) Scherer que diz: "É no ambiente do lar que se O mesmo produto, o mais fisiológico. decidem ordinariamente os rumos, o caráter, A pílula é totalmente antifisiológica, destrói a grandeza ou a ruína da criatura humana". uma fisiologia constituída. Esses produtos Entendemos, portanto, de uma foram retirados do mercado, certamente, por maneira bastante clara e explícita, que não se motivos graves, por doenças que estavam pode abrir mão dos valores éticos para a causando, como nódulos de mama, e foram construção de uma sociedade retirados do mercado quando estavam no verdadeiramente humana. Faz-se necessário, auge da produção. e com urgência, promovermos o saneamento (Projeção) espiritual e moral da sociedade brasileira. Não Agora teríamos alguns slides sobre o temos o direito de nos emitir neste momento terceiro grupo que seria o dos métodos oportuno para o real desenvolvimento do naturais, mas não vamos falar porque o Dr. nosso País. Faz-se necessário salvaguardar Dernival Brandão irá se ocupar deles. as nossas instituições da mentalidade Queremos relembrar que a fertilidade pragmática utilitarista e hedonista que está a humana não constitui doença para ser impregnar o nosso comportamento como povo tratada, é sinal de saúde que pode e deve ser e como nação. preservada. Agora, a fertilidade pode e deve A paternidade responsável é implícita ser bem conhecida pelos casais ao próprio exercício da função conjugal. No para que estes, no exercício da paternidade exercício dessa paternidade responsável é responsável, possam controlá-la importante, sobretudo, salvaguardar a fisiologicamente. dignidade humana na pessoa do cônjuge. Só Vamos terminar repetindo aqueles há verdadeiramente progresso quando há o votos que formulamos no início, de que a crescimento da pessoa humana. A ciência e a nova Constituição seja realmente das mais técnica, quando mal empregadas, são avançadas do mundo, oferecendo, inclusive, desumanizantes, rebaixam a dignidade um belo exemplo de grandeza, promovendo a humana desse homem feito à imagem e instituição da família, proibindo a violação do semelhança de Deus. direito fundamental à vida o inocente, desde o No seu agir o homem não pode ser momento em que ela começa a existir, da inconseqüente e desorientado. Ele necessita fecundação, da concepção, e valorizando a de normas objetivas de comportamento de sexualidade humana como fonte de vida a ser critérios objetivos de moralidade, que, violado respeitada. podem fazer voltar à barbárie a nossa Era o que tínhamos a dizer. (Palmas.) civilização. Isto porque os grandes erros da O SR. PRESIDENTE (Nelson humanidade não começaram grandes: foram Aguiar): – Concedo a palavra ao Dr. pequenos desvios de comportamento, às Dermival da Silva Brandão, representando a vezes pequenas omissões e concessões que CNBB. lhes deram origem. O SR. DERMIVAL DA SILVA Cabe lembrar aqui o que disse Leo BRANDÃO: – É com grande honra que Alexander, Presidente do Tribunal de compareço a esta Subcomissão da Família da Nuremberg, a respeito dos crimes nazistas. Assembléia Nacional Constituinte para Assim falou ele: "Qualquer que tenha sido a contribuir, dentro de minhas possibilidades, na grandeza desses crimes, uma coisa ficou elaboração da Constituição brasileira. patente a todos nós, eles não começaram Farei uma parte da minha exposição grandes". Muito antes do nazismo, já na lendo, por um motivo simples: vou ser mais Alemanha, um jurista e um médico fizeram um fiel ao meu pensamento, e, com isto, livro sobre a vida carente de valor em que vou ganhar, também, um pouco de eles relativizavam esse valor absoluto da tempo, neste precioso tempo que me é vida e, tempos depois, chegamos daquilo a concedido. quem o Dr. João se referiu, que Considerações gerais sobre o médicos nazistas chegavam a planejamento natural da família, que é o sacrificar crianças porque tinham objeto da minha exposição e que implantação baixa de orelhas. Os grandes foi pedido pela CNBB para que eu crimes são pequenos desvios, pequenas expusesse. concessões na sua origem. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Dentre os critérios que fundamentam a instituição familiar, podemos afirmar que "a união do homem e da mulher no casamento é a forma de união mais rica, por todas as virtualidades de desenvolvimento que comporta". (1) São duas as razões essenciais da união conjugal: a felicidade dos cônjuges e a continuação do casal pelos filhos, a procriação. Assim, dizemos que a união conjugal é, ao mesmo tempo, unitiva, pelo amor que une os cônjuges, e procriativa, pelo fruto deste amor que os uniu. Por outro lado, "a diferença dos sexos é a diferença mais profunda que existe entre os seres humanos, homem e mulher. () Cada qual como ser completo em si, uma pessoa; mas complementares, enquanto compõem a humanidade. E, diante, da sexualidade, como seres sexuados, constatamos que a sua união ressalta a função procriadora, uma vez que só a procriação exige a existência dos dois sexos. Gostaria de lembrar est e fato, que é biológico: a procriação exige a existência de dois sexos. Se os homens deixassem de existir, não haveria a espécie humana, não haveria mais procriação, mas tudo o mais poderia acontecer. Portanto, e fundamental, é implícito ao exercício sexual a procriação. Falam, gritaram em torno de procriação. Do lado do homem há emissão de 300 milhões de espermatozóides, cada um deles apto a fecundar o óvulo; do lado da mulher há toda uma complexa fisiologia que gira em torno da ovulação, que é o fenômeno central da sexualidade feminina. Mas, a atração sexual que promove isso não deve se restringir a meras satisfações físicas alheias ao resto do comportamento humano. Há algumas pessoas que erigem o prazer como a única finalidade do ato. Isso é de graves conseqüências. Devem estar integradas em um todo vivencial humano, portanto com as características específicas psicológicas, sociais, morais e espirituais que transcendem o mero prazer físico e se integram no amor humano. Este "tem, pois, por objeto a união tão completa quanto possível de um homem e de uma mulher que encontram um no outro o seu complemento". (3) E não aceitam, nem podem aceitar, serem manipulados como objetos de prazer, nem o marido manipula a mulher como objeto do seu prazer, nem o inverso . Não podem aceitar nem aceitam serem um meio para um fim, a pessoa humana jamais é um meio, é sempre um fim em si. Não podem ser tratados como coisas, não se pode coisificar a pessoa humana". O que rebaixaria a sua dignidade de "feitos à imagem e semelhança de Deus". É preciso denunciar, vigorosamente, uma tendência que se pretende inserir na própria sexualidade humana que é o instinto de posse e dominação: uma tendência de colocar o prazer como fim em si mesmo do ato sexual, numa perspectiva em que o outro é instrumentalizado como objeto do prazer. E aí, a sexualidade humana perde a sua bondade natural em detrimento do prazer sexual que em si é bom, porque é uma dádiva divina, mas que não pode ser reduzido a uma animalidade puramente instintiva, em uma dimensão basicamente genital despersonalizadora. A pessoa humana não age por instinto. O ato instintivo é basicamente animal. A pessoa humana age racionalmente. Tem vontade e é livre para amar. Livre, por quê? Porque pensa e pode decidir. Portanto, tem uma inteligência e tem uma vontade. O prazer sexual encontra a sua razão de ser numa dimensão psicossociobiológica interpessoal, que é humanizante na sexualidade humana. As duas razões essenciais da união conjugal – união e procriação – são interdependentes: nem união manipuladas, excluindo a procriação, nem a procriação manipulada excluindo a união, como acontece na fertilização in vitro e transferência de embrião. Nem uma coisa sem a outra, nem a união sem a procriação nem esta procriação sem a união do homem e da mulher, que é o fruto daquele amor. O filho é a unidade dos esposos realizada fora deles mesmos. Vamos ver agora os métodos artificiais, numa visão bem rápida, já que o Dr. João expôs com muita propriedade as suas piores conseqüências. Dentre os valores que as soluções pragmáticas desprezam, temos o respeito à integridade morfológica – anatômica – fisiológica e psicológica da pessoa humana, a não manipulação do próprio ato de transmissão da vida. Quanto menos se respeita o processo natural do ato, tanto menos o ele se conforma à sua instituição objetiva. Os processos artificiais de planejamento familiar não consideram esta desnaturação do ato. Dai todos eles terem contra -indicações médicas, algumas de natureza grave, como é o caso dos contraceptivos hormonais orais: outras vezes de natureza menos grave, como é o caso do coito interrompido, do condor, do diafragma, etc. As leis naturais, as leis físicas e químicas são impostas aos seres e do ponto de vista da pessoa humana elas são propostas. Mas uma vez violadas, se voltam contra o próprio homem. Temos aí a AIDS como prova disto e outras doenças. Há ainda a considerar os reflexos sociais. A partir da mudança do comportamento sexual, induzidas por estes ditos modernos de planejamento familiar, é fato facilmente observado que houve grande aumento na promiscuidade sexual após o advento das pílulas. Isto, as revistas que tratam das doenças sexualmente transmissíveis mostram muito bem. Promiscuidade esta que afetou e vem afetando cada vez mais a nossa juventude, às vezes adolescentes, impúberes, o que não pode passar despercebido pelas nossas autoridades é o estiolamento da nossa juventude. E isto é grave. O que não podemos deixar de ver é o estiolamento da nossa juventude que, também, através do sexo, é levado a um maior consumo das drogas, pois a ninguém é dado desconhecer a relação íntima que existe entre essas duas coisas Sexo e droga nesses ambientes promíscuos. E mais ainda Srs. Constituintes, prestem atenção e meditem há mais duas conseqüências imediatas, promovidas pelo estímulo precoce às atividades sexuais de nossa juventude: as doenças sexualmente transmissíveis e os abortamentos provocados. Afora outros, de natureza médica mais importantes, como o aumento do câncer genital provocado pelo uso precoce da função genital. Está comprovado pela ciência médica. Procurem observar indagando em juizados de menores, dos médicos que atendem a jovens, às vezes impúberes, como estão aumentando assustadoramente estes dois males na nossa civilização. Há 30 anos exerço a ginecologia e obstetrícia. Exerço-as no meu consultório particular, mas exerço tam- 50 bém no INPS. Portanto, atendo pessoas simples, de baixa condição social. E vejo que em ambos os casos, na juventude pobre, na juventude de classe média ou mesmo na ri ca, os problemas estão se avolumando, as doenças venéreas e os abortamentos provocados. É preciso afirmar que a maioria da clientela que freqüenta os abortários é constituída por nossa juventude. Quando se vai a estes abortários, há prevalência de 90% de jovens, às vezes de 12 ou 13 anos, que procuram para "tirar o neném" eufemismo que usam para matarem o próprio filho. E a família, para onde vai? Como podemos calar-nos diante de todos esses fatos? Vejamos a afirmação, facilmente constatada, de um psicólogo do Instituto de Ciência do Comportamento de São Paulo sobre os rumos da família. Observamos a continuação de uma tendência que tem mais de 5 anos e que tem suas raízes, pelo menos, nos anos 60, quando apareceram as pílulas: a criação de modelos altern ativos para a família convencional, clássica, institucionalizada da sociedade brasileira, formada por pais e filhos. Então, procura -se modelo de criação de lucros alternativos, entre eles o de jovens que saem muito cedo de suas casas para morar em grupos das mais variadas espécies. E sabemos as conseqüências disso. Especialmente no campo das drogas e dos desvios sexuais – homossexualismo, etc. Como negar que relações pré e extraconjugais não foram estimuladas por esses métodos, aviltando a sexualidade humana em relações sem compromissos, em sexo com medo, em sexo em motéis? E crianças que saem da aula, dizem que vão para o colégio e vão para os motéis, espalhados por este Brasil afora as centenas, aos milhares? Formas irresponsáveis de comportamento humano, que minam a estrutura básica da família e da sociedade. Já o planejamento natural da família implica no respeito básico aos processos biológicos da reprodução humana, respeitando igualmente os seus aspectos psicológicos e sociais, tomando a união conjugal a expressão responsável de um bom relacionamento humano. Sobre os métodos naturais, vou adiantar um pouco as considerações, mais de ordem geral, sobre o método Billings, que é o método da ovulação, um desses métodos que vou mostrar que são usados dentro dos métodos naturais. A ovulação é necessária para haver a gravidez, e é em torno dela que se localizam os períodos férteis da mulher. A ovulação é precedida e acompanhada de sintomas – muco cervical, elevação térmica – tudo isto vou mostrar – que pode ser percebida com relativa facilidade pelas mulheres. Na percepção desses sintomas, principalmente a presença de muco vervical, com aspectos físicos definidos que caracterizam o período fértil, está a base do êxito que o método Billings vem alcançando no planejamento natural da família. É um método verdadeiramente científico, comprovado com avaliações hormonais, exames físicos e já submetido a provas experimentais. É prático, simples e econômico, já sendo aplicado em países de baixa renda econômica. A Organização Mundial da Saúde incluiu este método entre os de mais alta eficácia; 98,5%. Alguns livros falam 97%. Tendo feito, inclusive, a Organização Mundial da Saúde experiências bem-sucedidas em países pobres, como El Salva- 51 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dor e na índia. É um método aplicado em situações variadas da fisiologia feminina, tais como ciclos regulares e irregulares, ciclos onovulatórios, na amamentação, na pré e pós-menopausa, etc. Para isto, a mulher deve aprender a observar o seu próprio padrão de muco cervical identificando os seus dias férteis e inférteis do ciclo menstrual, através da quantidade e qualidade e aparência desse muco. A partir desse conhecimento, ela é capaz de, numa perspectiva humana, de crescimento com responsabilidade, regular o seu relacionamento físico-sexual em vista do número de filhos que o casal pode e deve ter. Queria agora mostrar os slides. (Projeção.) Primeiro, este enfoque da filosofia básica do planejamento natural. O método natural respeita os processos biológicos da reprodução humana. São coisas importantes no exercício da medicina. Respeita a mútua fertilidade, integridade e dignidade dos cônjuges: respeita vida humana no próprio nível das fontes de transmissões da vida. Os anovulatórios, por exemplo, não respeitam porque sideram o ovário. A mulher que toma pílula está sendo submetida a uma castração medicamentosa temporária. Toda vez que se der um hormônio a uma pessoa, a glândula correspondente fica parada. Se eu der o hormônio da tireóide para, se dou hormônio do ovário, os ovários param. São hormônios exógenos, formados fora do organismo, não são hormônios endógenos, fabricados pelo próprio ovário. São hormônios sintéticos, para os quais o nosso organismo tem um sistema metabólicos capaz de eliminá-lo. Eles vão-se acumulando no organismo, e com o tempo vão dando problemas. Torna eficaz o conhecimento dos períodos férteis e inférteis, possibilitando o controle natural generoso e consciente do número de filhos; promove o diálogo conjugal, fazendo com que ambos os cônjuges assumam uma atitude responsável diante da sexualidade. O diálogo conjugal aumentou com o uso do método natural. Além disso, acabou aquela história de dizer: – Você usa camisinha, eu boto diafragma, você toma pílula, eu faço vasectomia. Não. O casal, ambos, marido e mulher, é responsável pelos filhos que querem ter. E é responsavelmente que os dois devem assumir o compromisso diante de sua família, diante dos seus filhos. Esta uma visão humanista da sexualidade humana. O planejamento natural da família é um estilo de vida conjugal que ajuda os esposos a crescerem como pessoas e amarem-se mais e melhor. O próximo, por favor. (Projeção.) Aqui fala em métodos naturais. Continência, periódica, Ogino-Knaus, sintotérmicos e Billings. O Ogino-Knaus é feito uma tabela. Tenho muitas clientes que usaram, continuam usando e estão se dando muito bem porque têm ciclos regulares. Para elas é excelente, e não falha, mas para quem não tem ciclos regulares, pode falhar. Os métodos do sintotérmicos aproveitam outros sintomas que a mulher tem, como o aumento da temperatura provocado pela progesterona, que é um dos hormônios da mulher, e outros, como dor na mama, irritabilidade, que traduzem a passagem da ovulação. Mas e Bilings é o método mais moderno, em termos de métodos naturais. Pode passar o próximo slide . (Projeção.) Entre os métodos naturais, para o sintotérmico temos esse gráfico de temperatura basai. Se uma mulher tirar todo dia a sua temperatura, ela vai verificar que depois de algum tempo a temperatura sobe alguns décimos de graus. Se ela sabe que já subiu três dias, daqui para cá ela sabe que não pode mais haver ovulação, ela já aconteceu nesta fase. Então, esse método permite usar a união conjugal depois da ovulação. Somente na fase pré-menstrual. Pode mudar o slide . (Projeção.) O método Billings é um método científico amplamente estudado e que respeita o organismo da mulher. É científico no sentido de que aproveita o conhecimento científico para o crescimento da mulher. Porque a ciência, quando é usada desnaturando, não é a verdadeiramente ciência. Quando se usa, por exemplo, conhecimento de psicologia para fazer lavagem cerebral, não estou fazendo ciência. Se conheço a fissão e a fusão atômicas, mas uso a bomba atômica para lançar em cima de cidades, não estou fazendo ciência. Mas, se uso esse átomo como para a paz, para exames médicos, para tratamento de doenças, através da radioatividade, aí, sim, estou fazendo ciência. Então, vemos o seguinte: um desses hormônios, que é o estradiol, que é esse vermelho, ele sobe muito nesta fase. Esse hormônio estradiol que provoca a ovulação, estimula algumas glândulas que têm no colo do útero, que vai secretar o muco e vai deixar a mulher molhada na época desta ovulação. Porque, depois quando ele sobe outra vez, pari passu, sobe outro hormônio, que é a progesterona, que vai impedir essa ação. Vou mostrar como. Portanto, é um método verdadeiramente científico. Pode passar. (Projeção.) É um modo de viver, é um sentido de vida. É um sentido em que o método é aberto à vida. Não é um método antinatalista. Não aceito que se coloque o planejamento natural da família como método de controle de natalidade. Não é um método anticoncepcional, no sentido em que ele não manipula o ato da concepção. Ele respeita a integridade. Apenas permite ao casal usar ou não o seu direito à união conjugal em determinados períodos de sua vida conjugal. Quando houver um motivo claro, explícito, válido, para que realmente eles não usem. Com responsabilidade. Ele exige realmente compreensão do casal, uma observação exata, anotações exatas, e cooperação amorosa. Mas não é um método de elite. Tenho um serviço de planejamento natural da família dentro de um posto de Niterói, do INAMPS, para pessoas de baixa renda e, portanto, de nível social mais baixo e até de nível intelectual mais baixo. Qualquer mulher, como aconteceu em El Salvador e na Índia, é capaz de observar esse padrão de muco. E é dito pela Organização Mundial de Saúde que já no primeiro mês a grande maioria das mulheres já é capaz de detectar a sua ovulação. Nesse método, que se baseia no fato de a mulher ser muito mais tempo infecunda, ela só é fecunda nos dias em torno da ovulação, só naqueles dias ela é capaz de conceber, neste método, com toda a fertilidade do casal depende tanto do homem como da mulher. O diálogo, o conhecimento, e com participação necessária para adotar esse método fortalecem a união matrimonial e aumenta a felicidade conjugal. (Projeção.) E é isto o que acontece. Aquele hormônio que mostrei em vermelho, o estradiol, é ele quem estimula as glândulas que tem aqui no colo do útero – aqui é um útero cortado, tirada a parte da frente, para mostrar que ele tem uma mucosa por dentro – e tem aqui no colo do útero, que já entra em contato com a vagina, umas glândulas, e estas glândulas secretam um muco apenas nesta época, única e exclusivamente em função daquele estradiol. Passou a ovulação, se forma no ovário da mulher um hormônio chamado progesterona, para a gestação, que vai estimular outras glândulas, que também tem aqui no colo do útero. Este é o muco "E", existe o muco "G". Pode passar. (Projeção.) Depois da ovulação o tampão de muco cervical, que é estimulado pela progesterona. Então, aquele muco tampou o útero, para impedir que novos espermatozóides pudessem penetrar e até germes de vagina. Isto faz com que a mulher volte imediatamente à secura, porque aquele tampão é grosso, é bem viscoso. Apenas nesta época da ovulação, é que ela se sente úmida, uma umidade que é característica, que em cada mulher pode se observar. Não é um método de massas, que eu posso dar uma aula para 60 pessoas, é um método para pequenos grupos e depois acompanhar durante algum tempo, um, dois ou três meses, essas mulheres. Depois elas começam a ensinar. Este é um fato amplamente difundido em todo o mundo. As próprias mulheres, os próprios casais que usam este método são monitores deste método. E são eles que vão irradiando para os vizinhos, para os amigos. Pessoas simples, costureiras, pessoas que trabalham em balcão, que sabem perfeitamente transmitir esses conhecimentos para suas colegas. E transmitem melhor que os médicos. O médico fala muito em ovulação, em muco "G", em muco "E", e elas não. Ela fala no visgo, quando se enxuga, quando vai fazer xixi, que sai no papel higiênico. E aquilo. Elas entendem multo mais quando e explicado por uma companheira que lhes fala deste método. Portanto, é um método que não gasta dinheiro, não se compra nada, não precisa de visita ao médico, não se gasta dinheiro com coisa nenhuma. É transmitido de casal a casal. Pode passar. (Projeção.) E é uma coisa complexa. Não e só o muco cervical. Nós vemos aqui o muco cervical. Mas não é só o muco cervical, mas ovário, supra-renal, hipófise, endométrio, as mamas, a própria mulher é influenciada em sua fisiologia. Nós sabemos que a maioria dos crimes praticados por mulheres foram feitos na época da tensão pré-menstrual. Isto é um fato comprovado em prisões femininas. Portanto, a fisiologia feminina é complexa, e o fenômeno central é a sua ovulação. Em torno da ovulação gira a sua feminilidade. A menstruação é uma decorrência. Poderíamos até dizer de maneira figurada, que a menstruação é uma frustração do organismo que se preparou para uma gravidez e ela não aconteceu. O fenômeno central é a ovulação. Pois é esta ovulação que não é respeitada nos métodos anovulatórios. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Falam, às vezes, que esse método não é natural porque quando a mulher está mais apta para o ato sexual, que é a época ao cio, a época da ovulação. Espera lá, não é assim. A mulher não tem cio, a pessoa humana não é condicionada por hormônios, a mulher é muito mais condicionada pelo amor que tem por seu marido, pela presença dele. Duvido que a mulher que esteja na sua ovulação, que o marido chegue em casa zangado, ela tenha vontade de ter relações com ele. Não é possível. Basta apenas a presença do marido, em qualquer época do ano. E as estatísticas provam e, nesse serviço de esterilidade eu comprovei, que a maior atividade sexual da mulher é na época pré e pós-menstrual. É um fato simples. Podem observar com suas companheiras. A maior atividade sexual não é na época da ovulação. Naturalmente não é. Apenas 6%. A grande maioria tem atividade sexual um pouco antes ou pouco depois da sua menstruação. É um fato interessante. Nos animais inferiores a fêmea não aceita mais o macho depois que está grávida. Ao contrário, muitas mulheres têm mais vontade de estarem com seus maridos quando estão grávidas. Talvez porque já haja uma certa congestão da mucosa vaginal, que é uma das fases preparatórias para o ato. E isto, digamos do ponto de vista animal, não teria explicação. Só na pessoa humana se explica isso porque existe um fator, que é o amor, é a presença do companheiro, do seu marido. E o amor que os une é, digamos, muito mais favorável ao ato do que o cio, que não existe na pessoa humana. Pode passar. (Projeção.) De uma maneira gráfica seria assim o ciclo menstrual. A menstruação, alguns dias. Depois de alguns dias secos começam os dias úmidos e em todo este período aqui a mulher pode engravidar. E tem um dia em que aquela umidade é muito mais pronunciada, chamamos de "pico". Aqui está escrito "ápice". E uns três dias depois do "pico" a mulher não deve ter relações. Isso porque o óvulo ainda está fecundável e o espermatozóide pode sobreviver naquele muco cervical alguns dias. A vagina é acida, é hostil ao espermatozóide mas o muco é alcalino e protege o espermatozóide e ali ele pode ficar alguns dias vivo. Depois desses três dias ela está livre para sua vida conjugal, durante uns 10 dias. Se ela observar isso, jamais vai ter filhos. Outra coisa também que se diz é que podem ocorrer duas ovulações. Não. O mecanismo é muito complexo para que permita duas ovulações num mês só. Se houver é com diferença de horas porque é o mesmo estradiol, é aquela mesma subida daquele hormônio que vai provocar duas ovulações; ou no mesmo ovário ou num ovário e no outro, com diferença de horas apenas. Mas uma hoje e outra daqui a 5 dias, isso jamais poderia haver. Mas, mesmo que houvesse, era necessário que houvesse a presença do estradiol porque ele dá o efeito "gatilho", ele é quem dá a extrusão do folículo para soltar o óvulo e esse estradiol que está presente para isso, forçosamente estimularia as glândulas do colo do útero para fabricar aquele muco tipo "E", que vai dar aquela umidade vaginal. Portanto, mesmo assim apareceria novamente a umidade e a mulher não iria ter relações da mesma maneira, porque ela não pode ter relações quando estiver úmida. Pode passar. (Projeção de slide.) E a coisa é mais ou menos assim. Depois que á ficou sequinha, alguns dias após a menstruação, pode aparecer um muco grosso que vai ficando cada vez mais fino até chegar o dia do "pico". Este é o sinal mais seguro da ovulação. Muco transparente, pode esticar-se bastante sem romper, como clara de ovo, e acentuada sensação de estar molhada. Cada mulher dá uma definição: "Doutor, estou molhada. Parece até que fiz xixi e não me enxuguei". "É um verdadeiro aguaceiro". "Parece uma geléia". Cada uma tem uma maneira de observar e de sentir, mas todas sentem. A mulher que não sentir é porque não está ovulando. Tenho visto isso no meu serviço de esterilidade conjugal, mulher que diz "Eu não percebo isso." Vai ver ela não está ovulando porque não tem estradiol. O estradiol não está estimulando as glândulas de colo do útero para fazer o muco. E quantas mulheres que não têm filhos, querendo tê-los, porque evitam ter relações neste dia pensando que isso é corrimento. E a gente diz: "Não, isso não é corrimento, isso é natural. Isso é necessário para que o espermatozóide suba e vá fecundar o óvulo". E somente por isso, quando não há outro impedimento à gravidez, quando não há outra causa de esterilidade, ela consegue engravidar. Só com essa pequena observação. Passados aqueles dias, logo, pela ação da progesterona, o muco vai ficando grosso, grudendo, grumoso, não se estica mais, se tentar esticar, rompe e desaparece dias depois, dois três dias depois. E a mulher voltou ao período estéril outra vez, período infértil. Só no outro mês é que ela poderá engravidar novamente. Pode passar. (Projeção de slide ) Como identificar o fluxo mucoso? Esse método tem várias maneiras de se ensinar. Cada país adota uma maneira. Está espalhado em mais de 80 países. Essa é uma maneira de os países darem à mulher uma orientação. Há várias outras, que não trouxe, mas existem muitas. Pode passar. (Projeção de slide ) Na América Central, uma senhora fez selos que coloca durante o mês. Selos vermelhos, naqueles dias da menstruação; selos verdes, quando está sequinha, selos brancos, quando está com muco; com uma cruz marcada no dia em que observou o muco escorregadio e fibroso, que é o dia mais propício à gravidez, e seio amarelo, quando o muco é mais de padrão infértil, é um muco grosso. Cada mulher, observando isso durante uns 3 três meses, está apta, depois sem usar mais este método, a seguir o seu método natural de planejamento. Pode passar. (Projeção de slide ) Há várias maneiras de se ensinar. Uma maneira muito boa foi a do Dr. Guilherme Gibon, na América Central. Pessoas analfabetas, do campo, que trabalham com a terra, foram capazes de entender. Comparando a mãe com a mãe terra. Terra seca, terra do Nordeste. Eu tenho nordestinos no meu serviço e pergunto: "Na sua terra, se plantar na seca vai dar?". "Não, não vai dar, Doutor." "Bom, está ótimo." "Bom, e choveu. Agora vai dar? "Agora dá". Elas têm planta em casa, sabem que para ter vida é preciso molhar. "Bom, passou a chuva, mas a terra ainda está molhada por baixo. Se plantar, dá?" "Ah, ainda dá. Terra molhada 52 dá." São aqueles dias que ficam depois que a mulher passou a ovulação, passou o "ápice", dois ou três dias. Depois a terra voltou a ficar esturricada outra vez, e aí não dá mais. Pode passar. (Mudança de slide ) Assim é a mãe mulher. Na terra seca ela não vai ter neném, mas se ela está úmida, é como a terra que está chovendo, vai ser fértil. E quando pára a chuva, mais uns dois dias e ela ainda consegue conceber. Depois, não mais. Vem a menstruação e começa tudo outra vez. Pode passar. (Mudança de slide ) E para que gravem melhor, mostro este slide . O período em que a mulher pode engravidar, desde que ela começou a ficar úmida, até dois ou três dias depois que passou a umidade. E vejam como pessoas simples são capazes de entender. Em São Paulo, uma irmã me contou que faz esse método e que uma moça muito simples perguntou – mesmo sem entender da fisiologia – "Uai, quer dizer se tiver relação naqueles dois dias só vai nascer o pé do menino? (Risos.) – Pessoas simples, que usam o método, mas sabem usar porque é só observar, não há problema nenhum, não há dificuldade, não há técnica. Vamos adiante. (Projeção.) Este método possibilita o planejamento da gravidez. Baseia-se em sólido conhecimento científico. Pode ajudar casais infecundos a conseguir a gravidez. Tenho conseguido isso no serviço. É natural e por isso completamente inofensivo. Não requer uso de pílulas de espécie alguma, ajuda a estabelecer a harmonia física e mental do matrimônio. Pode ser usado com sucesso nas seguintes circunstâncias: ciclos irregulares, abandono da pílula, menopausa, amamentação, porque em todos esses casos, se a mulher estiver ovulando, forçosamente ela estará úmida. "E o corrimento, doutor? Se estiver com corrimento?" Deve tratar. Mas, mesmo com o corrimento, com o tempo qualquer mulher é capaz de distinguir o corrimento do muco natural, cervical. E até o próprio muco da excitação sexual, com o tempo, ela sabe distinguir. Um médico, por telefone, pode dizer: "Oh, doutor, estou com um corrimento branco, leitoso, parece leite coagulado, está com ardência." "Isso é micose, minha senhora. Use isso." "Mas o meu corrimento é amarelo-espumoso, tem um mau cheiro, cheiro de peixe podre." "Isso é uma tricomoníase." Dá coceira é tricomona, não dá coceira é gardinerela. Pelo tipo de corrimento a gente sabe de longe, por telefone, a gente é capaz de dizer o que é. Será que a própria mulher observando-se ela não vai distinguir também? É claro que distingue. Portanto, os corrimentos não atrapalham o uso desse método. Mas se atrapalhasse, era bom. Era promover a mulher a que ela fosse a um consultório médico e fizesse o seu tratamento. Pode passar. (Projeção de slide ) É natural, não depende de instrumentos, nem de medicamentos; é prático, não depende de cálculos, nem de tabelas, nem de testes químicos; é simples, depende apenas de auto-observação, é eficiente, tem eficácia de 98,5 comprovada em 5 países pela Organização Mundial da Saúde. É só isso, muito obrigado. (Palmas.) 53 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Acabamos de ouvir duas excelentes exposições. Como começamos a nossa reunião atrasados, estamos com o nosso tempo muito adiantado. Mas gostaríamos de dar oportunidade, avançando no tempo um pouco, para que os Srs. Constituintes tivessem ocasião de conversar com nossos expositores A palavra está franqueada. Temos aqui a Professora Abigail Feitosa, médica e Deputada Constituinte, conhecedora profunda desta questão do aborto, ela naturalmente terá oportunidade de opinar. A palavra está franqueada a qualquer dos Srs. Constituintes que queiram usá-la. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Presidente, gostaria de fazer algumas colocações. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte Cássio Cunha Lima. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Inicialmente, gostaria de reiterar, publicamente o pedido que fiz ao Presidente da Comissão, Constituinte Nelson Aguiar, para que em oportunidade próxima sejam convidadas pessoas que tenham posicionamentos contrários às que mostraram o seu posicionamento hoje, sem que eu queira, neste instante, entrar no mérito da discussão. Apenas como forma de ampliar o debate e possibilitar um conhecimento mais profundo do assunto. O Constituinte Nelson Aguiar deu-me explicações de que foi feito o convite, apenas não houve por parte dos convidados a preocupação de se fazerem presentes para mostrarem o seu posicionamento. Volto a solicitar que seja feito o convite para que possamos enriquecer os nossos debates. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Lembro ao Constituinte Cássio Cunha Lima que estamos aconselhados no sentido de que não façamos convites, mas que anunciemos às pessoas e às entidades que existe um espaço garantido aqui na nossa Subcomissão, para que essas pessoas possam comparecer e fazer as suas exposições, porque, na medida em que estivéssemos convidando uma pessoa ou uma entidade estaríamos, por ordem, discriminando outras. Tivemos, ontem, contato com o Conselho Nacional do Direito da Mulher que manifestou desejo de estar presente. Naturalmente para defender esta posição que consta do nº 9 do tema "Saúde", que diz: "Garantia de livre opção pela maternidade, compreendendo-se tanto a assistência ao pré-natal, parto e pós-parto, como o direito de evitar ou interromper a gravidez, sem prejuízo para a saúde da mulher". Apenas o Presidente já estava com compromisso em outra Subcomissão, mas se reservou o direito de comparecer em outra ocasião e se fazer pronunciar. Tivemos, também, ontem aqui o Constituinte Francisco Humberto, mas S. Ex.ª faz questão de ser chamado de Chico Humberto do Estado de Minas Gerais, que defende uma posição contrária, uma posição diferente. S. Ex.ª teve oportunidade de usar o microfone e nós queremos assegurar exatamente isso, o livre direito das pessoas opina- rem desta ou daquela forma para que os Srs. Constituintes possam avaliar o máximo possível as opiniões da sociedade brasileira com respeito a esses assuntos tão controversos. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Gostaria de fazer apenas uma pergunta aos expositores. Durante um relativo período de tempo tive vivência muito próxima, no meu Estado, na Paraíba, com pessoas de baixa renda, onde via com extrema preocupação o número crescente de mulheres, principalmente jovens, solicitando ajuda dos poderes públicos para a ligação de trompas. Ao que parece, não tenho nenhum dado estatístico, mas tal prática vem crescendo de forma assustadora. Eu faço a seguinte pergunta: "Qual ou quais os prejuízos que trazem, principalmente para uma jovem mulher, a ligação das trompas"? O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – A ligadura de trompas ou laqueadura tubária é um método radical. Poucas mulheres poderão voltar a conceber e levar sua gravidez a termo depois que fizerem essa ligadura. Pode haver uma reimplantação tubária, uma chamada salpingoplastia, mas a trompa sempre ficará danificada. Segundo, é um método que, prejudicando também a circulação do ovário, porque a trompa corre ao lado do ovário e sempre prejudica, é um fato comprovado que, pelo menos, 25% dessas mulheres voltam à mesa de cirurgia para fazer curetagem, para tirar úteros porque o ovário que tem a sua circulação, a sua vascularização prejudicada, ele interfere no mecanismo complexo da fisiologia da ovulação. E era melhor que não tivesse porque se há uma parte do ovário danificada ele vai interferir, se não há ele não interfere. Então, era melhor tirar esse ovário porque o outro funciona, já que ele está prejudicado, ele não tem uma fisiologia normal, ele vai interferir de tal maneira que levaria fatalmente um grupo de mulheres a voltarem à mesa de operações. Um outro número de mulheres, por uma razão que não é explicada, mas na espécie humana, vem a ter frigidez sexual; outras voltam a sentir bicho correr na barrica. Sabemos que há mulheres que têm hemorragias cataclísmicas, poderia dizer, impressionantes e que não querem tirar o seu útero, porque acham que se tirar vai diminuir a sua feminilidade. Realmente não diminui porque, mantendo os ovários, mantém a fisiologia normal. Esses hormônios do ovário é que vão manter essa fisiologia normal, o útero não interfere, mas, por via psicológica, sabemos que pode interferir até com a frigidez sexual. Então, mexendo nas trompas, elas podem passar, depois disso, a sentir. Um bom número de mulheres volta e diz: "Doutor, queria voltar novamente a ter filhos. Qual é a minha possibilidade"? Respondemos: "Não é tão grande". "Ah, se é assim não quero fazer uma cirurgia para isso". Em realidade, percebemos o arrependimento daquelas que usaram esse método radical. Não é um método preconizado. Além disso, é um método, vamos dizer assim, que manipula o organismo. Isso mais na filosofia. É um método que faz uma amputação, danifica o organismo da mulher e por uma razão social, não propriamente médica. Quando se faz isso como controle de natalidade, porque se é uma doença daquela trompa, tudo bem, mas se é por um controle da natalidade a função não é médica, quer dizer, o problema não é de ordem médica. Então estamos usando um ato médico para solucionar um problema social. É como se um rapaz chegasse para mim e dissesse: "Doutor, sou arrimo de família e fui convocado para ir à guerra. Se o Sr. amputar o meu dedo, não posso puxar o gatilho e o Exército não vai me aceitar. Corta o meu dedo!" Não é o meio. Se cortar posso estar fazendo um bem, mas não é o caminho. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – A mulher ovula nesse período, ela tem a menstruação, mesmo com a trompa desligada? O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – Normalmente, quando ela liga a trompa ela deveria menstruar normalmente. Porque os hormônios do ovário caem no sangue e é pelo sangue que vai agir no útero. Agora, como eu expliquei. A própria circulação do ovário fica prejudicada muitas vezes pela ligadura de trompas. E aí vêm as irregularidades menstruais. O SR. JOÃO EVANGELISTA: – Outra coisa importante nos casos dessas senhoras, não só dessa região, mas de todo o Brasil, o que podemos oferecer a elas é algo muito melhor, é um planejamento natural da família, que não mutila. A fertilidade é coisa muito importante; a fertilidade não é coisa para se jogar fora. O planejamento natural da família é algo que se pode oferecer muito melhor. Então se necessita ou se pede uma coisa, nós podemos oferecer mais. É um aprofundamento na instituição no planejamento natural da família. Seria esta a resposta às necessidades destas pessoas, nestas situações, porque a pobreza não justifica que se dê o pior, mas que se dê o melhor. Realmente, isto é possível ser feito. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Inicialmente, queria parabenizar os ilustres conferencistas pela maneira clara com que fizeram as suas exposições, contribuindo para que esta Subcomissão possa chegar a uma conclusão clara, a uma conclusão adulta. Em segundo lugar, queria, antes de formular a minha pergunta, dizer que, lamentavelmente ao lado desse esforço que fazem os médicos, pessoas responsáveis da sociedade, conversando, explicando a 20, 30 ou, às vezes, de pessoa a pessoa, ao lado disso é preciso que nós não percamos de vista que é necessária uma atuação também no que diz respeito aos meios de comunicação, porque enquanto se fala a 10, 20, 30, 40 pessoas, um anúncio, através da televisão, atinge 1 milhão de pessoas. Acho que não podemos deixar de lado o aspecto "meios de comunicação", para que possamos encontrar um denominador comum. Eu queria saber sua posição e dos ilustres conferencistas no que diz respeito à interrupção da gravidez nos casos de estupro e de risco de vida da mãe. O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – No atual Código Penal Brasileiro, apesar de o aborto estar incluído nos crimes contra a pessoa e contra a vida, há uma incongruência filosófica ao permitir o aborto nos casos de estupro e nos casos em ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) que, digamos, seria a bolsa terapêutica. Eu digo incongruência porque diz que não é crime, apesar de haver um movimento agora para discriminar. Mas diz que não se pune o médico quando se faz o aborto: a) quando não há outro meio de salvar a vida da gestante e quando a gravidez é resultante de estupro. Com relação ao primeiro caso, nós tivemos oportunidade de apresentar um trabalho à Academia Nacional de Medicina sobre o problema do aborto. Esse trabalho foi laureado pela Academia e foi feito até um livro, que foi distribuído hoje pela Constituinte Sandra Cavalcanti a alguns Constituintes. Nele nós tratamos deste problema e mostramos, com o depoimento de vários médicos, cientistas nacionais e estrangeiros, que não se justifica o aborto terapêutico, porque esta figura, se não houver outro meio de salvar a vida da gestante, nunca se configura. O aborto terapêutico seria feito na iminência de uma morte e se feito, agravaria a situação. Depois, com o progresso da Medicina, que deve ser colocado a serviço da vida e não da morte, hoje vemos que a maioria das indicações que havia para o chamado aborto terapêutico, não existem mais, desde que se tomem as providências. Por exemplo, uma mulher que tem uma cardiopatia grave, esta mulher deve ser trazida lá do interior da Paraíba, do interior de Minas, e ser colocada num hospital onde tenha durante 9 meses a sua assistência. Deve até ser internada. E por que não? É uma vida humana que está em risco. Por que alguém pode ir aos Estados Unidos fazer uma implantação de safena e não se dá à uma pessoa brasileira a condição de ter seus filhos, desde que bem tratada, num hospital universitário, por exemplo? Esse é que deve ser o sentido da ação do Governo. Neste sentido é que deve ser feito esse trabalho, de salvaguardar a vida daquela criança que está sendo gerada, tratando da mulher que é portadora daquela doença. No caso do estupro nós poderíamos dizer que uma violência não justifica outra, nem vai encobri-la. Uma mulher que foi violentada, não será matando o próprio filho que vai encobrir a violência que sofreu, nem vai apagar, pelo contrário, vai aumentar. Ela foi violentada por um indivíduo, agora vai ser violentada porque vai ser morto o seu filho. Mesmo que ela não queira, é uma pessoa humana e é filho dela. É uma pessoa humana, e isso não há dúvida nenhuma. A medicina já diz claramente que, já no zigoto, existe um ser humano e completo. Portanto, matar um ser vivo humano e completo é homicídio, mesmo quando ser vivo humano e completo é fruto de um estupro. É um ser como eu, somos seres distintos. Tem todas as características do ser vivo; tem metabolismo, tem respiração, tem o ADN, que é a matéria da vida; o ar, que é a matéria da vida, passa de pai a filho, de filho a neto, e assim por diante. É um ser vivo humano, por quê? Porque é uma lei biológica, ninguém planta couve para colher abacaxi, ninguém sobe num pé de manga para comer abacate, só se levar no bolso, mas lá ele não colhe, porque é uma lei biológica, cada espécie só reproduz a própria espécie. Um casal de coelhos quando tem relações não dá girafas de jeito nenhum, não pode dar. Um casal humano que tenha uma relação vai ter um ser vivo da espécie humana, isso não há nenhuma dúvida. E digo mais, um ser vivo completo, já no zigoto, porque ali está todo o seu padrão de vida. O seu código genético é único, irrepetível. Deus não repete a mesma pessoa. Se matar aquele podemos ver milhões de outros indivíduos irmãos, mas não será a mesma pessoa. O código genético está ali, naquele momento já está determinada a cor dos olhos, o grupo sangüíneo, o fator RH, o sexo, até traços de comportamento. Quantas vezes o avô diz: "esse garotinho parece o pai dele quando era pequeno. "Por quê? Porque é filho daquele pai. Traço do comportamento são herdados, às vezes. O ser vivo humano, completo, sem a menor dúvida, se for morto, é um homicídio. Podem dizer: "Mas a forma não é de pessoa humana!". É, sim, senhor. Um ser vivo quando nasce, uma criança quando nasce, não está completo. O ser vivo anda, é bípede. "Mas ele não sabe andar, não tem dentes, não sabe se comunicar." O recém-nascido age por instinto, o ser vivo não age por instinto ele suga o seio materno sem ter aprendido ainda. É um ser em evolução, desde que se forma no zigoto até a idade de 16, 17 anos, ele está em formação. E cada estágio de formação tem a forma própria, característica daquela fase em que se encontra. Não vamos dizer que um bebê que nasce não é humano porque não sabe falar, porque o seu cérebro não está completamente desenvolvido ainda. Então, não sabe se comunicar, não sabe comer, não sabe comer uma feijoada. A ontogênese, a formação completa do ser como ser humano, só se completa com a puberdade quando ele é capaz de se reproduzir, que é a característica essencial do ser vivo sexuado. Portanto, é sempre um ser em evolução, e a forma própria, característica daquela fase em que se encontra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós recebemos um convite da Assembléia Legislativa do Espírito Santo para fazermos uma reunião desta Subcomissão com a sociedade capixaba. O convite foi aceito, decidimos ontem, mas ficou na dependência de encontrarmos um meio de transporte. Esse meio de transporte foi encontrado agora. Assim, gostaria de saber se V. Ex.as, Srs. Constituintes, estariam dispostos a viajar conosco no sábado para esse encontro. O avião ficará a nossa disposição para voltarmos ainda no sábado. Sairíamos na parte da manhã, faríamos duas reuniões com os capixabas, que já estão mobilizados, e à noite voltaríamos. E aqueles, a partir do Espírito Santo, que quiserem se deslocar para os seus Estados, poderiam fazê-lo. Como essa providência tem que ser tomada de urgência, já que temos que dar o retorno para o assessor do Ministério da Aeronáutica que vai nos conduzir, precisamos tomar a decisão já. Houve uma proposta do Constituinte Eraldo Tinoco, nosso Relator, no sentido de que fizéssemos esse encontro no Espírito Santo na próxima quinta-feira, porque na sexta-feira teremos um dia de trabalho e a partir do Espírito Santo cada um poderá tomar o seu destino. (Pausa.) Está aprovado para quinta-feira. Vamos tomar as providências para que façamos o encontro no Espírito Santo, na próxima quinta-feira. 54 O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Queria fazer uma análise sucinta. Depois da projeção do filme, a Constituinte Sandra Cavalcanti fez uma intervenção muito precisa, logo no início, dizendo que o manifesto das mulheres é inexpressivo diante de uma população brasileira. Nós temos trabalhado, por muitos anos, com famílias, desenvolvendo encontros de jovens e casais. É uma preocupação, depois desta exposição, vem-nos sensibilizar. Já disse aqui o nosso colega que enquanto se fala para nós, para outros convidados, 50 pessoas, assuntos tão palpitantes, é evidente que nós temos a responsabilidade de, depois de muita meditação, de uma filtração, incorporar isto à nova Constituição. Mas, com respeito ao aborto, que é um método natural, tivemos uma pergunta do Constituinte Cássio Cunha Lima, falando da sua Paraíba, das jovens senhoras querendo ligação de trompas. E V. S.ª fez uma justificação científica plausível. Eu queria perguntar a V. S.as o que nós podemos fazer para conscientizar o povo brasileiro? Isto é importante, é fundamental. Nós recebemos hoje as manifestações a favor do aborto, como, dizia o Constituinte Chico Humberto. Eu vou contra o aborto mas defendo a sua legalização. É um contra-senso. Diz o Constituinte que precisamos colocar isso na televisão. O Presidente Nelson Aguiar, quando aqui sentado, na ocasião do filme "O Grito do Silêncio", dizia: "vamos levá-lo a uma cadeia nacional de televisão, ou a um canal de televisão". Muito bem! Nós faremos isso. Mas será periódico. Nós temos que desenvolver um trabalho. Eu pediria aos senhores, Dr. João Evangelista, Dr. Dermival e toda a equipe, que reflitamos e estabeleçamos metas para atingirmos o método natural. Poucas são as senhoras neste Brasil que têm conhecimento. É preciso um processo de educação, um processo de conscientização. Nós sabemos que o grande mal brasileiro é a falta de cultura e de formação religiosa. Temos, a partir deste instante, que nos preocupar nesta amplitude de conscientização nacional, tanto quanto contra o efeito maléfico do aborto, quanto a implantação do método natural. Era esta a análise que desejava fazer, e perguntar a V. S.as e aos nossos colegas se têm algo mais palpável para atingir essa meta. O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – Concordo plenamente com o Constituinte Ervin Bonkoski, quanto ao fato de que os meios de comunicação são muito importantes. Temos aqui vários comunicadores, inclusive a Constituinte Sandra Cavalcanti que tem feito muito na televisão por isto. Mas mesmo assim sentimos um certo boicote. Esse mesmo método natural foi filmado por uma televisão no Rio de Janeiro, foi ao meu ambulatório, onde faço essa entrevista inicial com algumas pacientes que querem o método natural, e ela filmou para passar no Globo Repórter, mas não saiu. Não saiu porque, talvez, não interesse a campanha, não se gasta dinheiro com método natural, não se vai a médico quando é método natural, não se compra nada, é feito em casa muito naturalmente, passado de amigo a amigo. Eu não sei porque, mas não se passa. 55 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – E nem há multinacionais e farmácias vendendo produtos para 34 milhões de mulheres no Brasil. O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – São fatos como este que vêm mostrar porque isso não é difundido. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Pela ordem de inscrições, passo a palavra à nobre Constituinte Abigail Feitosa. A SRA. CONSTITUINTE ABIGAIL FEITOSA: – Vou colocar aqui o que entendo porque há pressão pelo aborto, porque há pressão pelo controle da natalidade. Afinal de contas, durante 20 anos este País concentrou a riqueza. Quando nós falamos em fazer reforma agrária, quando falamos em valorizar o ensino público, quando falamos em fazer a saúde pública, há uma grita. Então começa o contra-senso: é contra o aborto, é contra o controle da natalidade, mas não luta pelo ensino público, não luta pela saúde pública. É preciso ter saída. As pessoas se desesperam. Estão nas favelas. As favelas aumentam. O posseiro que está no campo, é empurrado pela grilagem para as favelas. Na minha cidade, em Salvado 70% estão na favela, e cada dia aumenta. As pessoas não têm saída para seus problemas. Não têm comida, não têm emprego. Aparece o filho, não tem saúde. O Método Biliings é muito interessante. Sou ginecologista e obstetra há 30 anos. Então, conheço muito bem esse problema em todos os níveis e em todas as camadas sociais. Para fazer o Billings é preciso que haja o ambulatório perto, para a pessoa ver se está sempre com corrimento porque pode ser uma pessoa que não tem acesso a nada. Tem que haver ambulatório em todo lugar, tem que haver a rede pública, não pessoas ganhando dinheiro, mas rede pública. Isso também importa em investimento. Quando colocamos a questão do aborto, a pessoa se desespera. Não tem emprego, vê chegar outro filho, há os tabus da sociedade em todos os níveis sociais. Não é a mulher que tem 7, 8 filhos que faz aborto, mas mulheres de nível melhor, porque o tabu está dentro da casa daquela que não aceita que a solteira engravide. Respeita a vaca que está prenha, a cachorra que está prenha, mas não respeita a mulher que está grávida. Então, vamos enganar, vamos fazer aborto. E muitas fazem. Sei disso, pois trabalhei durante muitos anos na Maternidade Cecília Balbino. Foram vinte e tantos anos. Lançam mão de tudo pelo desespero. Temos que lutar pela mudança desta injustiça social que está aí. E de tudo, quem "paga o pato" é a mulher. Para o cidadão tudo é muito bonito. Eu passei 30 anos ouvindo jovens chegarem na minha frente e dizer. "Dra. estou grávida e ele disse que o problema é meu, que eu me vire." São coisas que têm que ser remanejadas, têm que ser muito discutidas porque passam pela emancipação da mulher. A mulher no mercado de trabalho. São coisas que têm que ser discutidas porque fazer aborto realmente não emancipa mulher nenhuma, nem a luta pode se essa. É o desespero da coisa. Eu, por exemplo, acho que essa questão que o companheiro colocou, de que mesmo estuprada ela deve aceitar a gravidez, tem que ser vista direito. Nós não pode- mos ser mais realistas do que o rei. Imaginem aqui a filha de qualquer um de nós estuprada por uma pessoa que ela não sabe nem quem é, e ela engravida. Ela vai carregar a vida inteira. Não é a questão de um crime contra o outro, mas ela vai ter o direito de decidir. Nós não podemos culpar essa mulher, ela ter que carregar no ventre um filho que não sabe nem de quem é, de uma violência que sofreu. Acho que estamos indo longe demais na coisa. Sou contra o aborto, conheço de perto porque fiz 10, 12 curetagens na Maternidade Cecília Balbino, em plantão, e sei de todas as maneiras como se fez, mas não podemos ser mais realistas do que o rei. Como a questão de esterilização. Os Deputados, para ganharem voto, fazem campanha para esterilizar as mulheres: os médicos para ganharem dinheiro, fazem campanha para esterilizar as mulheres dizem "Você está com mais de 2 filhos. É irresponsável". Mas ele não luta por nada que vá dividir a riqueza nacional. Está tudo ligado ao problema econômico, não é uma coisa solta, de moral, de ética. Está tudo ligado ao problema econômico. Se a sua oferta de emprego é maior, então pode deixar que o índice de natalidade aumente; se a queda de emprego vai lá para baixo, então não dá para nascer menino nenhum. Quem estuda demografia sabe que estão interligadas. E a moral é muito em função disso. Isso tudo tem que ser bem discutido para a população, de uma hora para outra, não pensar que os Constituintes são retrógrados, que não querem um avanço. Essa coisa tem que ser discutida. Do mesmo jeito que as pílulas, o DIU fazem mal. Mas, têm que ser distribuídas pílulas para as pessoas, desde que elas passem por um exame, avaliando uma por uma. Não sou contra a pílula. E receitei a pílula a vida inteira. Agora, sou contra a campanha de pílula pela televisão, sem exame médico. Sobre o DIU, é discutível o que o companheiro colocou. A coisa não é daquela maneira. Quanto à questão do DIU ser abortivo, é muito discutível porque o problema é mais do meio ambiente. Inclusive, faço parte da Comissão do Ministério da Saúde que estuda o direito da reprodução. Não liberamos o DIU porque não temos nem como os ambulatórios do País fazerem o seu acompanhamento. Mas essa coisa ainda é discutível. De qualquer modo, acho que é preferível colocar o DIU do que deixar a mulher engravidar e fazer um aborto. Porque se você torna imprópria a nidação, é uma coisa que dá muito menos problema do que você sair fazendo aborto. É claro que o País não tem condição de sair botando DIU, liberado pelo Ministério da Saúde, porque a sua rede de saúde está insuficiente. Temos que analisar a coisa mais friamente. A questão da pílula, por exemplo. Sabe-se que até os acidentes ecológicos acontecem porque de uma hora para outra, sem a maior responsabilidade, se solta agrotóxico no campo. Dois mil e tantos golfinhos estão morrendo nas praias da Bahia hoje. Deve ter sido as coisas que são postas no cacau e termina batendo na água do rio e vai para o mar. Assisti 400 toneladas de peixe morto no rio São Francisco devido ao vinhoto. Não podemos ser contra o progresso, não podemos ser contra a Ciência. Temos que ter sangue frio para analisar e ter valores para que cada pessoa tenha direito, e cada caso, de per si, ser analisado. O direito à assistência à saúde. Não podem chegar e dizer: "todos vão usar DIU". Até para fazer o método de Billings tem que fazer o papa-nicolau para ver se há problema de infecção local. O colega informou que isso dá mais em pessoas que tem vida sexual precoce. Pois eu digo que câncer também dá em pessoas que não engravidam e que não amamentam. O câncer de mama dá mais em pessoas que não amamentam. De modo que o que quero é que nesta Constituinte seja assegurado o direito de todas pessoas. Não ser uma coisa muito estreita. Quanto ao aborto, acho que temos que garantir a vida, mas também temos que dar voz e espaço para que as pessoas todas sintam que esta é a Constituição que queriam. O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – Ex.ª, quando falei que dava câncer quando há atividade genital precoce, é uma verdade e V. Ex.ª conhece. Pelo fato de a mulher também ter câncer de mama quando não engravida, não é alternativa do que falei. Se juntam. As duas coisas não se contradizem. Há mulher que tem mais câncer quando tem vida genital precoce e não engravida. Se ela engravidar a gravidez protege. Há um velho axioma da obstetrícia que diz que a mulher que não tem filhos tem mioma. Sabe que os estrogênios atuam sobre os órgãos alvos, sobre a mama, sobre o útero, sobre a vagina dando esses problemas e que a gravidez pela progesterona protege a mulher desses problemas. Então não há alternativa, se juntam essas coisas. Somos pelo progresso, pela Ciência, quando o progresso e a Ciência são colocados a serviço do homem, a serviço da mulher. O DIU é abortivo e isso ninguém duvida hoje, Ex.ª. O próprio professor Paulo Belfort de Aguiar, da BEMFAM, disse claramente em um simpósio do qual participei, que o DIU é abortivo. Eles diziam que não era abortivo pelo fato de que a gravidez começava com a nidação. E se não havia nidação não havia gravidez, não havendo gravidez não há aborto. Mas nós sabemos que o aborto, em essência, é a morte, é a expulsão do concepto antes de sua viabilidade. Então, hoje ele diz que realmente é aborto. O Professor Jorge de Resende, em sua "Obstetrícia", diz muito claramente: "se a gravidez começa com a nidação, tudo bem!". O concepto já existe antes da nidação, e a mulher não pode ter um concepto sem ter concebido. Seria uma incongruência. Logo, como o aborto é a morte, a expulsão do ovo, do concepto antes de sua viabilidade, existe o aborto claramente. O Doutor João mostrou que é um dos fenômenos que pode acontecer. Entre os 300 milhões de espermatozóides, muitos passam, e sabemos que há gravidez junto com o DIU. Há ovolução da gravidez que há sempre quando há o DIU, só que ela não é continuada, porque não há nidação. Portanto, o DIU é abortivo, e ninguém duvida disso mais hoje. O próprio Doutor Paulo Belfort disse isso claramente: "Não negamos que o DIU é abortivo". E disse mais, que não aceita o controle da natalidade que não inclua o aborto. Dentro daquele mesmo axioma de que o progresso é para o bem da humanidade. Se essa contenção ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) da natalidade, pelos métodos artificiais, leva ao aborto, isto não é Ciência, isto não é progresso. Quando V. EX.ª fala na distribuição da riqueza, o problema da pobreza, isto é um problema sério, realmente é. Mas o problema do aborto, das favelas da Bahia, não são esses que estão nos abortários. V. Ex.ª mesma quem falou que quem faz o aborto é gente de classe social mais alta. Portanto, não é o problema da pobreza que está implicando. Essas pessoas até que aceitam mais a sua gravidez e ligam menos as suas trompas. Os abortários estão cheios de gente de vida social de classe média e classe alta. O SR. CONSTITUINTE JOÃO EVANGELISTA: – Sobre o problema do aborto, em caso de estupro ou em outra circunstância qualquer, gostaria de fazer também uma pergunta para que cada um responda. A vida humana inocente é ou não é inviolável? Se ela é violável, então, a nossa será ou não? Onde nós vamos parar se admitimos que a vida humana inocente é violável? Agora, se ela é inviolável, então todos os seres humanos têm direito a ela, tem que ser garantido por lei. Perguntamos: que é aquilo que foi gerado na trompa da mulher? É um ser humano ou não? Se é um ser humano, então, a vida dele também é inviolável. Agora, se não é um ser humano, que ser é aquele? Então tem que provar. A ciência já comprovou que a vida humana começa daquela maneira e que da união de um óvulo com o espermatozóide não pode sair coelho nem girafa. Ora, é uma vida humana! E a vida humana inocente é inviolável! Por que discriminar essas vidas mais necessitadas de proteção? Seja gerada de que maneira for, começou a existir. – E o direito à vida não é outorgado a ela por instituição nenhuma. É inato, começou a existir com direito a existi. É doloroso, – é difícil. E, a mulher que foi estuprada e que engravidou, não é o aborto que vai tirar dela a marca dolorosa que ficou nela. Vai acrescentar. Eu sei que será difícil para ela. Mas problemas difíceis têm que ser resolvidos pelo caminho mais correto. A vida humana inocente é inviolável. Então não há alternativa. Se abrirmos caminho para violar estas, então, o caminho estará aberto para violar todas as outras. Agora, quanto ao problema do Diu peço desculpas, mas realmente, inclusive, quem usa Diu diz que não impede a nidação do óvulo. Apenas usa de artifícios para justificar o seu ato. Mas existem trabalhos científicos, sérios, comprovando que o Diu realmente não impede a fecundação. De sorte que o Diu é um abortivo, agora é fim abortivo que agride seres que não têm chance nenhuma de se defenderem. Quanto à pobreza, tudo isso nos preocupa. Realmente, é muito importante. Nós temos que nos preocupar sempre, como já respondi, em oferecer o melhor. E o melhor é realmente o método do planejamento natural. É só haver o interesse, realmente, voltado para ele. Era o que tinha a dizer. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra pela ordem ao Constituinte Cássio Cunha Lima. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – A Constituinte Abigail Feitosa colocou um ponto que, a meu ver, parece fundamental na questão do aborto. O aborto transcende o aspecto médi- co-científico, é um problema de cunho social e precisa ser visto sob a ótica do social. Logicamente, não encontramos qualquer pessoa que tivesse condições de defender a prática do aborto com bases científicas. Mas existe a realidade social e não podemos permitir que o Brasil continue, como vem sendo há muito tempo, um país do faz-deconta. Existe a prática do aborto, independentemente da sua legalização ou não. São praticados centenas de milhares de abortos por ano. Encontramos clínicas clandestinas com facilidade. Médicos sobrevivem à custa de abortos praticados na ilegalidade. Conhecemos também o caso de mulheres mais pobres, mulheres menos favorecidas, que fazem o aborto através de instrumentos ponteagudos, de sondas, enfim, dos métodos conhecidos pela ciência e pela medicina. Precisamos, ao mesmo tempo em que encararmos esse problema, como um problema humano, científico, encará-lo também como um problema social. Não adianta defender a não legalização do aborto ou se posicionar contra ele, se não há uma postura firme para a garantia dos direitos sociais. Posicionar-se contra o aborto, assim como contra o ensino público gratuito, contra a saúde para todos, no meu entendimento, parece um contra-senso. É preciso que haja reforma ampla na estrutura social, parafraseando a nobre Constituinte Abigail Feitosa. Existe uma altíssima concentração de renda. Existem cerca de 80 milhões de brasileiros vivendo na faixa da miséria e miséria absoluta. E preciso que se criem condições humanas – e, ai, volto a utilizar o aspecto científico – para que os seres humanos, as mulheres principalmente, possam usufruir uma vida com dignidade. A pergunta que faço aos expositores é a seguinte: qual é a proposta clara para encontrar-se uma solução para o problema que existe? Existe a prática de aborto, em larga escala no Brasil, independentemente da sua legalização? E colocaria, para contraargumentar uma posição que é adotada pelos defensores do aborto, que me parece ter uma certa lógica, porque eles partem do seguinte principio a partir do instante em que haja a legalização do aborto, S. Sª permitirá que a mulher se utilize dos meios oficiais de saúde? Poderá ser consultada sem qualquer problema por um médico, por exemplo, do INAMPS; e o médico através da sua consciência profissional, do seu conhecimento científico poderá apresentar à mulher as conseqüências e os danos que poderá lhe trazer ao seu corpo, a sua vida um aborto praticado de forma violenta. Isso, parece-me, é um argumento forte que não pode deixar de ser esquecido. Se chegar ao consultório de um dos expositores uma mulher que queira praticar o aborto através dos meios oficiais garantidos por lei, tenho certeza de que, através das ilustrações que foram aqui apresentadas, através das ponderações que foram aqui mostradas, teremos uma grande chance de demover um grande número de mulheres à prática do aborto. Precisamos tratar este problema com coragem e com realidade, para que possamos encontrar a melhor solução que passe, necessariamente, por uma sociedade mais justa, mais igual, onde haja direito para todos, principalmente o direito à saúde, à educação. Volto a frisar: não se pode ser contra o aborto e, ao mesmo tempo, ser contra a educação públi- 56 ca, gratuita, contra a saúde pública, enfim, contra os direitos coletivos e individuais de uma sociedade em geral. Então, pergunto: seria válida essa argumentação que através da legalização poderíamos ter uma queda acentuada da prática do aborto através da conscientização não apenas de massa, mas Individual, no contato entre médico e paciente? O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – Nobre Constituinte, gostaria de começar voltando ao início da sua ponderação. O problema do aborto transcende o ético e cai no social. E a minha posição é totalmente inversa, transcende o social porque é problema ético. A ética é normativa. Todas as ciências, inclusive a sociologia, tem por dever observar os preceitos normativos éticos, morais de uma sociedade e de uma Nação. O Direito e a Moral são dois círculos concêntricos, dos quais a Moral é maior, é mais abrangente. Um direito social que não observasse os preceitos morais seria um direito injusto e cairíamos numa lei injusta, porque os preceitos éticos são superiores aos direitos sociais. Se legalizássemos o aborto, na teoria, sabemos que facilitaria a prática. E na prática, o aborto, nos países onde foi legalizado, uns dizem que não diminuiu, mas aumentou. E sem diminuir os abortos clandestinos. Por quê? Porque a mulher que engravidou quando o marido estava fora, não vai procurar a Previdência Social para fazer o seu aborto; porque a menina que engravidou sem ser casada, essa também não vai procurar um ambulatório da Previdência para fazer o seu aborto. Então, as causas do aborto clandestino continuarão sempre, mesmo legalizando o aborta. E este foi aumentado de muito, como prova a prática do aborto nos países onde ele é legalizado. Portanto, acho que é uma posição que poderia parecer, à primeira vista, boa, mas que, na prática, não se coaduna com a verdade. Primeiro, porque o aborto em si mata uma criatura humana, um ser humano indefeso e não culpado; não tem culpa nenhuma, não pode ser condenado à morte. Então, é um ser humano que nada fez de errado, quaisquer que tenham sido as práticas melhores. Posso fazer um aborto nas melhores clínicas do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Brasília, de Recife, de João Pessoa, vou continuar matando, de qualquer maneira, uma pessoa. Mesmo que a mulher esteja protegida, o filho dela vai ser morto. Portanto, este fato é inconteste. Nas melhores técnicas continuarei matando, e vou aumentar de muito o número de pessoas que vão se beneficiar dessa prática malfazeja. O SR. JOÃO EVANGELISTA: – Depois, veja bem, se seguirmos esta trilha de raciocínio de que um fato estabelecido justifica sua legalização, quer dizer se existe aborto, a solução para isto não é legalizar, porque então teríamos de caminhar para uma legalização de uma porção de outras coisas que existem e que não podem ser removidas. Por exemplo, o roubo existe. Alguém seria capaz de propor a legalização do roubo porque é impossível erradicá-lo. É preciso que se tomem todas as medidas para solucionar os problemas; não legalizá-los. Com relação ao aborto, o problema da inviolabilidade da vida humana inocente, que é um problema seriíssimo. O dia em que a vida humana for considerada violável e a legislação excluir seres 57 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) humanos da sua proteção, então, onde vamos parar? Estamos dando os primeiros passos, como disse o Dr. Dermival, os grandes problemas começaram pequenos. Então, o que virá atrás de tudo isso é a inviolabilidade da vida humana, que está em jogo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Relator Eraldo tinoco. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Não vou falar como Relator, mas como membro da Subcomissão para emitir algumas opiniões de ordem pessoal. Sempre analiso a sociedade como um macros-sistema, em que essa questão econômica, por exemplo, é de fundamental importância e tem um interrelacionamento muito estreito com todas as outras questões, como também coloco a questão educacional que depende também do econômico e é conseqüência do econômico. No aspecto específico que estamos tratando, acho um ponto de grande relevância, porque a maioria desses problemas que estamos discutindo decorre de uma questão muito simples: a grande maioria das famílias e das mulheres, em particular, não tendo condições educacionais até de acesso a determinadas informações que lhes permitam uma decisão adequada a respeito, por exemplo, do método anticonceptivo que devem usar. Mas isso vai até um pouco além; vai até à essência do problema que estamos discutindo, que é a questão do planejamento familiar. Sabemos que no Brasil esse tema é muito debatido. Existem aqueles que defendem a idéia de que temos um território muito grande ainda para ser habitado, então, não deveria haver nenhum tipo de limitação ao crescimento populacional, porque precisamos ocupar os vazios demográficos, etc. O que verificamos, na prática, é o seguinte: as famílias de classe média têm, em primeiro lugar, a possibilidade de acesso às informações. Economicamente, têm condições de alcançar seu objetivo. Seja pela compra de anticoncepcionais, seja pela utilização de outro método qualquer, elas podem decidir, de forma livre e soberana, no âmbito familiar, o número de filhos que desejam ter. Quando nos dirigimos à periferia das cidades – como a Constituinte Abigail Feitosa se referiu na sua experiência, e é também a minha longa experiência – encontramos as famílias e não só na periferia das cidades, também no meio rural isso é muito comum – inteiramente desprovidas de informações e de possibilidades de decisão a esse respeito. O número de filhos, como é usando na linguagem dessas pessoas, é "o que Deus quis". Quando se entrevista uma pessoa dessas: "Mas como nessas condições, você tem tantos filhos? E, às vezes, filhos de pais diferentes, sem nenhuma estrutura familiar?" Ah, Dr. ah, professor, é porque Deus quis. Nada precisamos dizer a respeito de experiências pessoais, porque as temos de modo marcante a esse respeito. Então, no meu entender o ponto central da discussão deva ser o seguinte: devemos caminhar ou não para uma sociedade em que as pessoas tenham a possibilidade de uma forma livre e soberana, já que somos seres racionais, definirem se devem ter filhos, quantos e em que época. Este, parece-me, é o ponto central da questão. Como entendo que as pessoas devem ter a possibilidade desse tipo de decisão, defendo pessoalmente a idéia de que o Estado deve contribuir, nunca impor – porque seria, inclusive, antidemocrático, totalitário – mas contribuir a meu ver, para que essas pessoas tenham a consciência do problema e tenham os meios à sua disposição para resolver essa questão. Tendo cada indivíduo esta possibilidade, parece-me até que essa discussão toda a respeito do método – se é a pílula, o DIU, se é o método natural Billings, se é a tabela, a camisinha, a vasectomia – passa a ser uma decisão consciente do casal. Ou estamos numa sociedade que caminha a passos largos, infelizmente, para uma completa liberação da prática do sexo, uma decisão pela qual a mulher tenha a possibilidade de administrar o seu corpo e possa, conscientemente, decidir se naquele momento deseja um filho. Eu, por exemplo, não tenho preconceito com relação ao problema da mãe solteira. Mas o que examinamos e vejo na prática é que 99% das mães solteiras jamais desejariam ter aquele filho. Algumas chegam ao desespero de recorrer a um abortador de fundo de quintal, a um prático, a uma pessoa sem a menor qualificação para buscar uma liberação de um peso que está trazendo de uma concepção indesejada. Então, dentro dessa ótica e chegando especificamente ao problema da nossa discussão hoje, concordo inteiramente numa possibilidade de planejamento familiar, como uma decisão livre, consciente dos casais ou dos indivíduos. Entretanto, em se tratando de métodos sou frontalmente contrário ao aborto como uma forma de evitar o nascimento. Acho realmente que é um atentado à vida; acho que se houve uma ignorância ou se houve até um descuido, ou se houve até uma circunstância de uma falha em qualquer desses métodos e houve a geração de um ser, essa vida deve ser preservada. Entretanto, questiono e tenho dúvidas que ainda não foram sanadas nessa discussão desses dois dias quanto à questão do aborto terapêutico e a questão do aborto que vá, digamos assim, interromper uma gravidez provocada por uma violência, porque ai, já entra numa questão até muito íntima. Conheço situações de mulheres que, mesmo com sério risco de vida, decidiram assumir a gravidez até as últimas conseqüências. Mas numa decisão pessoal e não uma coisa imposta pela lei, dizendo: "Não, não pode abortar numa situação dessa". Como conheço casos de pessoas que, tendo uma gravidez provocada por um ato de violência, assumiram a maternidade e vieram a ter os seus filhos e conviver com esta realidade. Conheço muitas pessoas que adotaram crianças que não são nem filhos seus e que tratam aquela pessoa como se fosse filho das suas próprias entranhas. Entretanto, conheço também pessoas inteiramente traumatizadas, diria, com a sua vida totalmente desorganizada por terem um filho produto de um ato para o qual efetivamente não contribuiu do ponto de vista psicológico, do ponto de vista físico, apenas do ponto de vista biológico. Então, a meu ver, temos que decidir essa questão com muita maturidade. Entretanto, no meu juízo, pelo menos até este momento, pode ser que na discussão posterior venha a ser modificado, quero acreditar que a exceção que a lei faz a esses dois casos, não impondo, mas deixando ao livre arbítrio do indivíduo, no caso terapéu- tico uma decisão que é da mulher; se ela tem constituído também do marido e, especialmente, dos médicos que a assistem que têm muito mais possibilidade de aquilatar os riscos de uma manutenção ou não da gravidez, e nos casos de uma gravidez provocada, por exemplo, por estupro que essa decisão também seja pessoal, seja uma decisão pautada na liberdade de analisar todo um contexto social e pessoal e, finalmente, haver essa decisão. Mas, a meu ver, a lei não pode e nem deve proibir ou limitar ou impedir ou evita que esta decisão tão grave possa ser tomada livremente pelas pessoas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Indagaria dos Srs. Expositores se desejariam comentar a posição do Constituinte Eraldo Tinoco. O SR. JOÃO EVANGELISTA: – Voltaríamos ao início da discussão, porque uma resposta pessoal fica um ser, aí, que não foi ouvido; é aquele ser que foi gerado. Como ouvi-lo? Ele é um se humano igual a nós. Nós tivemos o tamanho dele. Fomos tão indefesos como ele está neste momento. Como perguntar a ele? Então, aí seria completo. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sim, mas ai nós vamos também para um outro ponto, que nenhum ser humano não foi ouvido se quem nascer. E nós temos sempre essa indagação. Temos muitas pessoas infelizes que dizem: "Mas eu não pedi para nascer, eu nasci mas não foi culpa minha." Acho que não é apenas o problema olhado por esse ângulo, mas olhado dentro de um âmbito maior, dentro de um âmbito, pelo menos, de uma célula social, relacionando o se que vai nascer com o ser que o está gerando. O SR. CONSTITUINTE JOÃO EVANGELISTA: – Mas não é o ser que vai nascer, é o ser que existe. Não é o nascimento que marca a existência da pessoa, como vimos aí no filme. Se ele não foi perguntado se não queria nascer, nós também não fomos. Então, alguém poderá dizer que não respondi, se não nasci não devo viver? Ele é um ser que começou a existir exatamente igual a nós. Está numa fase da vida pela qual nós já passamos. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Constituinte lberê Ferreira, a seguir nós temos inscrita a Constituinte Sandra Cavalcanti. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, serei breve. A minha tendência é concordar com o Relator, Constituinte Eraldo Tinoco no que diz respeito à interrupção da gravidez no caso de violência. Apenas queria ouvir um pouco mais, eu precisava de um esclarecimento ou que os conferencistas me dissessem se o meu raciocínio está correto ou não. No instante em que uma mulher engravida devido a violência de um estupro, às vezes até de um marginal, etc, ela deve sofrer traumas tão grandes que me parece, eu não sei, não sou médico, ela pode, inclusive, transferir para o próprio feto, para a própria criança esses traumas e, inclusive, prejudicar o desenvolvimento da própria criança. Queria saber se isso procede. Se prejudicar, nós não estaríamos também permitindo o nascimento de uma pessoa anormal? Era essa a indagação que eu queria fazer. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. DERMIVAL DA SILVA BRANDÃO: – Não transfere. Constituinte. Não há nenhuma substância química que uma pessoa traumatizada psicologicamente possa passar à carga genética, à carga cromossômica do ser formado, do blastocisto, do embrião, que venha transformá-lo num monstro. Não há nada. Mesmo uma pessoa que tenha uma gravidez acidentada do ponto de vista psicológico, perdeu o pai, perdeu a mãe, está sozinha no mundo, perdeu o marido, esta pessoa pode ter um filho perfeitamente normal. Uma pessoa doente mental pode ter um filho são. É como a lepra, por exemplo. A pessoa que tem lepra, o filho vai nascer normal. Não passa, não há uma substância que passa para aquela criança. Dizem, inclusive, que Charles Chaplin era filho de uma louca, e nasceu normal. E a gente vê muitas crianças normais filhos de pais que são loucos. Quer dizer, não há nada nesse sentido que se possa pensar em torno de passar da mulher estuprada que foi violentada. Agora, ela pode passar, sim, a violência para o seu filho, porque não deixa de ser filho. E esse o problema crucial. É esse o problema principal que se pergunta: é uma vida humana? É. É inocente? É. Como passar por cima disso? Como, digamos assim, matar um ser vivo inocente, um ser vivo humano? Esse é o problema. O drama todos nós participamos dele. Deus me livre de minha filha ser estuprada, mas se o for, minha filha, aceite o seu filho. Paciência. É meu neto, não deixa de ser porque ela foi estuprada. E vamos tratar de proteger essa vida. Se ela não quiser, poderemos entregar. Soube que na invasão das tropas alemãs na França, muitas francesas foram estupradas e esse estupro levou o Governo francês a aceitar como filhos da França todas aquelas crianças. E quanto ao problema da gravidez indesejada que o Constituinte falou, é um depoimento pessoal. Minha mãe me teve em Maracuii, uma terrinha lá longingua no interior de Alagoas. Eu já era o quarto filho. Tenho certeza que mamãe quando soube que estava grávida disse: "Meu Deus, mais um, não é possível". E chorou até, de tristeza. Mas tenho certeza que com três meses de gravidez, se sangrasse, ela diria: "Dr., salva meu filhinho." Estou cansado de ver isso em meu consultório e no INAMPS, pessoas que quando o teste deu positivo dizem: "Dr. Não posso". E aí chora. Três meses depois, sangrou, elas dizem: "Pelo amor de Deus, Dr., salva meu filhinho"! Raramente, mas muito raramente, a gravidez é indesejada quando o filho nasce. Aí a mãe dá a vida pelo próprio filho. Talvez, sem querer agredir a ninguém, neste Plenário aqui, 50 ou 60% fomos de gravidez indesejada e nem por isso os nossos pais deixaram de nos querer. Isso é muito natural, é muito comum, porque uma geração implica em uma série de responsabilidade, de encargos, mas o amor que a mãe tem pelos filhos supera tudo isso. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Temos duas comunicações. Uma comunicação e um convite. O nobre Constituinte Ulysses Guimarães, Presidente da Assembléia Nacional Constituinte, informa que o prazo para que os Srs. Constituintes apresentem suas próprias propostas vai até o dia 6 de maio. Recebemos um convite da Comissão Nacional Criança e Constituinte, para às 16:00hs, no Salão Negro, quando as crianças deverão entregar uma proposta aos Srs. Constituintes. Dos membros desta Subcomissão, aqueles que puderem estar lá nesse horário estarão prestando uma homenagem às crianças. Com a palavra, a Constituinte Sandra Cavalcanti. A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – Vou ser breve. Queria apenas registrar três aspectos desse debate que vem sendo muito fecundo e que acho muito oportuno. Primeiro é que o texto constitucional não vai descer a pormenores que aqui estão sendo debatidos, o que invalida os debates, porque vai ser exatamente de um debate sobre pormenores, sobre detalhes, sobre minúcias, que nasce na cabeça de todos nós o grande princípio, a grande norma que vai ser consagrada no texto constitucional. Querme parecer que não vamos tratar sequer da palavra aborto na Constituição. Não vamos discutir sobre aborto terapêutico, sobre a possibilidade do aborto decorrente do estupro; não vamos discutir o planejamento familiar feito por métodos externos, ou por decisão e vontade, mas vamos discutir princípios e esses princípios terão que corresponder a uma visão do problema. A Constituinte Abigail Feitosa, com o brio que lhe é peculiar, colocou uma questão aqui que precisa ser, de novo, analisada, e nisso fui seguida pelo Constituinte Cássio Cunha Lima, como se todas as pessoas que estão se posicionando contra o aborto publicamente aqui nas reuniões, fossem pessoas que são contra a escola pública, são contra a reforma agrária e são contra a distribuição de renda. É como se houvesse qualquer elo juntando essas posições e transformando a posição contra o aborto numa posição elitista, conservadora, capitalista, quando não há nada que relacione uma coisa à outra. É preciso que isso fique registrado, porque essa confusão está começando a ocorrer e ela nasce maneira como um grupo de feministas neste País vem colocando esta questão, misturando estações que não tem nada a ver umas com as outras. Particularmente sou conta o aborto, lecionei a minha vida inteira em escola pública; trabalhei, na política, em cargos executivos, em favor aos pobres, dos favelados, das pessoas humildes; não amealhei fortuna e não represento qualquer elite capitalista e nem qualquer multinacional. Então, não tem nada a ver. Essa questão precisa ficar muito separada, para não começarmos a ter aqui esse tipo de discussão, que é paralela. A colocação é de princípios: vamos ou não vamos consagrar na nossa Constituição o direito à vida? Essa é a pergunta. Como é que a vida vai ser colocada na nossa Constituição? E, correlatos, existem outros problemas, como a eutanásia, tortura, pena de morte, a fome como forma de genocídio social, a liberação da droga. Essas são as questões correlatas. Não uma bandeirola de escola pública e escola particular, que é um assunto de 1960, inteiramente ultrapassado, que não cabe mais nem discutir no Brasil de hoje, e menos ainda, uma questão sobre reforma agrária, que também estamos vendo com outros olhos. Só fala em reforma agrária no Brasil quem não se deu conta de que o mundo sofreu um processo 58 de avanço tecnológico de tal ordem que a reforma agrária não passa mais só pela posse da terra, passa por um processo de educação, passa por um processo de industrialização e passa pela conquista de uma tecnologia da terra. Então, vamos separar isto. O que a nossa Subcomissão, a meu ver, tem que encarar, é o problema da família, que começa com a garantia da vida. A partir do instante em que ficar consagrado na nossa Constituição o princípio de que a vida é inviolável, todo o resto que se queira construir em cima dessa declaração, fugindo disso, é contraditório. Se a vida é inviolável, o direito de nascer existe; o direito de sobreviver, após o nascimento, existe; o direito de se alimentar, o direito de estudar, o direito à saúde, o direito ao apoio da sociedade, o direito ao asilo, o direito à velhice, o direito à habitação são decorrentes deste, sim, o grande princípio. Se abrirmos, como colocou tão bem o Dr. João Evangelista e o Dr. Dermival, principalmente nesse livro que hoje aqui foi distribuído, se abrirmos o flanco, por um momento que seja, faremos a legalização do aborto. A legalização vai significar que uma lei injusta, do ponto de vista moral, seja inscrita na vida brasileira. Hitler fez isso. Ele obteve a legalização da morte dos judeus. Era lei. Ele conseguiu uma lei para que as crianças que nascessem com graves deficiências físicas fos sem colocadas em câmaras de gás. Era uma lei. Mas, eticamente, do ponto de vista do direito natural, era uma aberração. Então, a Constituição brasileira não vai descer a esses detalhes, mas o princípio que ela vai inscrever é um só, no capitulo dos Direitos e Garantias Individuais, mais do que no capítulo sobre Família, mais do que no capitulo sobre Educação, mais do que no capítulo sobre Saúde. Vamos ou não inscrever lá: "todo brasileiro tem o direito de nascer". Nem precisa ser brasileiro. O Estado tem que proteger o direito de nascer. O direito à vida é inviolável. Dai decorre tudo o mais, Sr. Presidente, se não, vamos para uma Constituição absolutamente contraditória. Os debates estão servindo apenas para esta pequena frase, que, se aparecer na nossa Constituição, determinará todo o arcabouço constitucional que vamos erguer. Vamos ou não sustentar que a vida, neste País, é um direito que ninguém pode violar, sob nenhum pretexto. Mais nada. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Permite V. Ex.ª um aparte, nobre Constituinte? (Assentimento da oradora) – Concordo inteiramente com esse princípio, mas acho que temos que conjuga-lo com outros princípios. Por exemplo, vamos supor, porque isso faz parte de todas as constituições do mundo, ou seja, a defesa da soberania, que, dentro desse princípio da soberania, conjugado com esse princípio do direito à vida, uma nação estrangeira qualquer invada o território nacional, e, como um mecanismo de defesa, os nossos soldados tenham que combater em frentes de batalha, inclusive atentando contra a vida desses indivíduos. É um atentado ao direito à vida, embora a defesa... A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – No mundo inteiro, a guerra é. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sim. Então, veja V. Ex.ª, essa questão é muito delicada, 59 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) quando traduzimos isso em relação a questões práticas. A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – Nobre Constituinte, apenas para me manter dentro desta questão levantada, que é muito importante. A moral sempre sustentou um outro direito que a criatura humana também tem que é o da legitima defesa... O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – É onde eu ia chegar. A SRA CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – A legítima defesa significa que a pessoa agredida tem como defender-se. O direito à vida só vai dar essa legítima defesa quando a pessoa for capaz de se defender. E aí fica novamente a questão a vida é inviolável, e V Ex.ª não pode perdê-la, a não ser, agredido, em legítima defesa – pode ter atirado em outro – mas a esta altura, V. Ex.ª já é uma pessoa consciente, é uma pessoa adulta, tem meios, tem modos. E, quando se fala em aborto, qual é a legítima defesa daquele ser que está dentro do ventre materno? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Mas, e a mãe que carrega aquele ser? A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – A vida dela? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Ela é agredida, ela é violentada. A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – Um erro não justifica outro. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sim, mas não justifica também quando alguém, é agredido e que agride. Aliás, na própria Bíblia, o Cristo disse: "quando lhe baterem em uma face, dê-lhe a outra". Mas, em determinada circunstância, o próprio Cristo pegou seu chicote e expulsou os vendilhões do templo. A SRA. CONSTITUINTE SANDRA CAVALCANTI: – Mas não matou. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Há um aspecto que é muito correto, e, quando traduzimos e vamos vê-lo do ponto de vista imediato, objetivo, que atinja diretamente as pessoas, a questão fica. Aqui, o meu propósito é o de esclarecer. Acho que esta Subcomissão, num determinado momento, se achar que é da sua competência, porque pode até achar que não seja, terá que definir essa questão. O meu propósito, ao suscitar este aspecto, é muito mais o de esclarecer a minha posição. Como Relator, vou colocar no anteprojeto essa ou aquela posição. Não é defender previamente uma posição ou outra, mas quero deixar claro isso, ou seja, que o meu propósito é o de suscitar o debate, justamente para esclarecer melhor a questão. Então, coloco esses pontos, que me parecem fundamentais para o nosso esclarecimento. O SR. CONSTITUINTE JOÃO EVANGELISTA: – Poderia esclarecer, em apenas uma palavrinha, porque é importante. Trata-se de um problema obstétrico. (Assentimento do orador) O feto não é agressor da mãe. Legítima defesa é contra um agressor. O feto nunca agride a mãe. Não há essa possibilidade. é exatamente essa perspectiva de vida. Acho que o grande pecado de Karl Marx em tudo que escreveu foi não fazer nenhuma referência à criança. Acho que a criança é tudo. Se alguém me pedisse um exemplo vivo de liberdade, eu diria: a criança é a liberdade. As crianças, lá em casa, para mim, são a liberdade. E, às vezes, eu fico comentando que no seu modo de ser elas estão muito mais corretas do ponto de vista da vida, do uso da vida, da forma de gozar a vida do que o adulto que criou regras escravizadoras para si e para outras pessoas. Aprendi muito nesse debate. Ele me foi profundamente inspirador e vamos continuar com ele. Acho que precisamos defender a vida como um direito inalienável. É um direito intransferível de cada pessoa. Acho que precisamos criar a concepção responsável, isto sim, isto precisamos criar neste País. Nós precisamos ter um meio de comunicação que precisa ter vergonha. Nós temos os órgãos comunicação hoje colocando o ensino da relação sexual irregular nos filmes que já se passam nas nossas televisões para as nossas crianças. E essa tragédia maior no meio do povo. E porquê? Porque o homem sai para um lado, para buscar um emprego; a mulher sai para outro, para lavar roupa: a filhinha fica dentro de casa com o aparelho de televisão ligado, sem ninguém para orientá-la, e quem está orientando essa criança é o dono do meio de comunicação. Acho que e tarefa da Constituinte é quebrar este monopólio. A comunicação é um direito do cidadão, a informação tem que ser um direito, não pode ser um direito de quem, detendo o meio de comunicação, informa o que acha que está bom informar a população. De modo que esse monopólio dos meios de comunicação – do jornal, do rádio da televisão – que o dono usa como quer e joga na nossa cara o lixo que acha que deve jogar, e nós às vezes aprendemos até a digerir sem mastigar aquilo que é jogado lá. O tempo que se gasta com coisas inúteis nos meios de comunicação, um filme como esse não tem espaço para ser rodado. É um absurdo. Até para ter o direito dos que são contrários aprofundarem as suas teses, não ficarem defendendo sem segurança. Quando aquela coisa que diz assim "a mulher tem o direito de interromper a gravidez no seu ventre..." A gravidez não resultou só de um ato dela. E o homem? Não vai ser ouvido. E o pai? Não vai ser ouvido. Essas coisas todas precisam ser discutidas. Nós temos que ampliar o debate. Respeito, por uma questão de princípio, o direito das outras pessoas opinarem do jeito que bem entenderem. Mas, o meu voto já está dado. Se depender do meu voto, a sociedade e o Estado ficarão na obrigação de assegurar o direito à vida a partir do ventre materno. Muito obrigado. (Palmas). O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nada mais havendo a tratar, declaro encerrados os trabalhos, convocando outra para a próxima segunda-feira, na hora regimental. Está encerrada a reunião. Subcomissão da Família, do Menor e do idoso ATA DA 7ª REUNIÃO ORDINÁRIA, REALIZADA 27 DE ABRIL DE 1987. Aos vinte e sete dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez horas e trinta e cinco minutos, na Sala da Comissão de Municípios – Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do Menor e do idoso, sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar (PMDB – ES), com a presença dos Senhores Constituintes: Flávio Palmier da Veiga (PMDB – RJ), Maria Lúcia (PMDB – AC), Eliel Rodrigues (PMDB – PA), Cássio Cunha Lima (PMDB – PB), Vingt Rosado (PMDB – RN), Ervin Bonkoski (PMDB – PR), Iberê Ferreira (PFL – RN) João de Deus Antunes (PDT – RS), Antonio Salim Curiati (PDS – SP) e Nivaldo Machado (PFL – PE), como membros da Subcomissão. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou fosse dispensada a leitura da Ata da reunião anterior, que foi considerada aprovada. Prosseguindo, o Senhor Presidente convidou os Deputados Constituintes Arthur da Távola e Hélio Costa para tomarem assento à mesa como palestrantes. A seguir, o Senhor Presidente passou a palavra aos Senhores Constituintes Arthur da Távola e Hélio Costa que passaram a discorrer sobre o tema: "Influência da Comunicação na Vida Familiar". Concluída a exposição, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para debate com os expositores. Manifestaram-se sobre o assunto os seguintes Constituintes: Ervin Bonkoski, Eliel Rodrigues, Flávio Palmier da Veiga e Maria Lúcia. Dando continuidade à reunião, o Senhor Presidente convidou o Senhor Constituinte Cássio Cunha Lima para assumir a Presidência, tendo em vista a necessidade de ausentar-se por alguns momentos. Reassumindo a Presidência, o Senhor Presidente agradeceu a participação e colaboração dos Deputados Constituintes Arthur da Távola e Hélio Costa, dando por encerrados os trabalhos, às treze horas, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte , convocando os Senhores membros da Subcomissão para a próxima reunião, a realizar-se dia vinte e oito de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: exposição e debate com o Senador Constituinte Nelson Carneiro, sobre o tema: "Dissolução da Sociedade Conjuntônio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata, que depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar , Presidente. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ANEXO À ATA DA 7ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 27 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:34 HORAS, ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Havendo número regimental, declaro abertos os trabalhos da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso. Estamos aguardando a presença do nobre Deputado Hélio Costa, que deverá desenvolver conosco, aqui, um debate sobre o tema: A Influência dos Meios de Comunicação nas Relações Familiares. Como contamos, agora, com a honrosa presença do nosso Relator Artur da Távola, Relator da Comissão Temática, que é um expert no assunto, um escritor de renome nacional e um dos homens que, neste País, tem demonstrado maior competência nos meios da comunicação escrita, nós gostaríamos de ouvi-lo, e S. Ex.ª se propõe a conversar conosco até que o nosso conferencista compareça. Então, passaremos a palavra ao nobre Constituinte para que, a seu critério, possa expor a respeito deste tema: Influência a dos Meios de Comunicação nas Relações Familiares. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – As duas formas tradicionais de educação de formação, a família e escola, foram abaladas, principalmente a partir da metade do Século XX, pela entrada súbita, expansionista, em forma de roldão, dos meios de comunicação. A invasão deu-se em decorrência de algumas evoluções eletrônicas, tecnológicas, a saber: a miniaturização dos circuitos, os satélites e as várias formas da edição eletrônica. Quando a tecnologia descobre o circuito miniaturizado liberta a aparelhagem das anteriores limitações de tamanho. No caso da televisão, por exemplo, a miniaturização além de permitir receptores menores, retira a câmera do estúdio fechado e a coloca na mão do câmera man, ganha a rua, a vida, a realidade exterior. A miniaturização dos circuitos engendra dois outros adiantamentos decisivos: o editor eletrônico e o vídeo-teipe. Assim, os três elementos tornam-se diretamente responsáveis pela modificação de; organograma de produção: capacidade expressiva; proliferação da informação pela facilidade de locomoção das equipes e linguagem audio-visual do meio. O RÁDIO Os meios de comunicação passam, a partir da década de 50, a viver vertiginosas expansões: o rádio ganha a instantaneidade porque, pela transmissão externa, consegue ser o mais rápido dos veículos. Até hoje, apesar dos avanços da tecnologia televisual, o rádio é o mais rápido dos veículos. A televisão possui a vantagem, no caso de transmissão instantânea, de não ter tantos mediadores, quanto o rádio, preso que está, este, à palavra e ao som. A mediação da televisão é apenas a da Câmara e a do som local. O radio precisa de alguma forma de tradução ou narração. A partir da década de 50, também os jornais passam a operar com avanços tecnológicos relativos à qualidade gráfica, à velocidade de impressão e à possibilidade maior, graças, também, ao satélite, de edições nacionais. As edições nacionais, nos jornais, não alcançaram o Brasil, País tradicionalmente marcado por edições locais, o Brasil não conseguiu o jornal nacional, até hoje. O que não deixa de ser interessante, por outro lado. A ocupação do universo nacional viria a se dar pela televisão e pelas revistas a partir de 1960. O rádio ganha a instantaneidade, ganha a rua, libertando-se do estúdio, pela facilidade dos equipamentos, e ganha o que viria a ser a sua maioridade sonora, a transmissão em FM, freqüência modulada. A freqüência modulada gera, para o rádio, esta característica: propicia a maioridade sonora graças aos efeitos da estereofonia, gerando qualidade de recepção e da alta precisão da emissão. O rádio FM propende para o gênero musical, emissão de natureza estética, baixa mobilização do ouvinte, um rádio de desmobilização "relax'", prazer. Em compensação o rádio AM, por não ser, salvo recentemente, portador de maioridade sonora propende para a palavra, a informação, debate, comunicação direta, a pulsação quotidiana da comunidade, pois as novas tecnologias lançam o ouvinte dentro do rádio. Vicejam então, e telefonemas, pesquisas, pedidos de "sucessos". É um rádio de contatos com os ouvintes, de relação direta com a comunidade local. Enquanto a FM "universaliza" sua mensagem, a AM torna-a local, ativa com base na palavra. E é paradoxo: o rádio AM, possui alcance maior de ondas – (emissoras AM de potência afta atingem praticamente todo o País, sobretudo à noite) – porém toma-se um rádio da comunidade. A FM, de alcance reduzido, (seu espectro alcança apenas o perímetro da cidade) tende para a universalidade, através da mensagem musical. Pode ser que a recente implantação da AM Estereofônica venha a inverter o processo. A estereofonia não provém do rádio e, sim, da indústria fonográfica. Opera, hoje, sobre a mensagem musical, um efeito decisivo a que chamo de audiência universalizante. A estereofonia, via qualidade sonora, propicia, no mercado discográfico, o intercâmbio cultural de natureza extrafronteiras. No bojo do processo – não tenhamos ilusão – está o clássico mecanismo de dominação econômica e colonização cultural. Do ponto de vista cultural, porém, traz aos jovens de todo o mundo a possibilidade de um encontro de vivências e troca de experiências, inclusive sensoriais, que não existiria não fossem a estereofonia e os processos contemporâneos de disseminação de bens culturais. Um jovem inglês, vivendo as crises decorrentes de uma sociedade pós-industrial, pode, hoje, via disco, comunicar-se com outro brasileiro ou africano vivendo aflições diversas, as de países em luta para entrar na era industrial. Mensagens, reações, emoções comuns à juventude, e não ao contexto sócioeconômico de cada sociedade, estabelecemse a partir da estereofonia, e seu poder tanto de penetração quanto de agrado. 60 Outra curiosa característica: o rádio AM, por ser ligado a comunidade, realiza tarefas de resistência cultural. Ao refletir a comunidade, o rádio AM obriga-se a manter os padrões musicais locais e, em função do mercado a atender, ajusta-se ao gosto médio dos segmentos do público a que se destinam. O rádio FM, apesar da limitação de alcance mas por deter a maioridade sonora, reflete a tendência universal. A maioria das rádios FM, no Brasil, tem sua programação timbrada por cultura estrangeira. E a maioria de rádios AM, pela vinculação direta com o mercado, possui programação de corte e timbre nacionais. As mesmas elites intelectuais que, por razões de vanguarda, defendem tomada de posição nacional na área da cultura, desconsideram o rádio popular AM. Preferem alcunhar de "kitsch", "cafona", "brega", este tipo de transmissão, sem considerar seus aspectos de resistência cultural. A música sertaneja, por exemplo e as interioranas, ecos e restos de uma cultura local, estão se perdendo. Pois somente no rádio AM são tocadas. E, assim, a música popular e a de carnaval. As elites desconhecem tal característica ao qualificar o rádio AM através de conceitos oriundos de artes de elite, e consideram subarte as formas populares de comunicação. Em função da expansão, filha do desenvolvimento tecnológico, começa, então, o rádio a viver um processo de maturidade de mercado: a segmentação. O do rádio já possui mercado que funciona por segmentos. Se o ouvinte deseja programa protestante o encontrará; se deseja tangos, idem; e assim, música erudita, fado, poesia ou esporte etc. Cada um destes mercados funciona por segmentos. Só foi possível ao rádio operar assim, porque o espectro do dial, ou seja, a oferta de produtos aumentou. Hoje há, no espectro AM, em cada cidade a possibilidade de 20 e poucas emissoras, em FM. Aumentando a oferta, aumenta, necessariamente, a democratização da produção, embora não haja ruptura do esquema ideológico dominante, decorrente, no caso brasileiro, do predomínio absoluto do capital, pois no Brasil, o rádio, em praticamente 95% das concessões, está entregue à empresa privada. Há, contudo, segmentos absolutamente desatendidos pelo rádio, no Brasil, como a programação infantil. Há tempos, o Ministério da Educação publicou estatística, segundo o qual é de 0,01% a proporção de programas infantis em todos o espectro de rádio no Brasil! Eis uma tarefa não atendida pelas empresas: programas de rádio para as crianças, o que não deixa de ser estranhável de vez que a criança é consumidora e indutora ao consumo. E o rádio desconheceu a criança que, no entanto, está apta ao contato como meio puramente auditivo que opera direto sobre a fabulação, vive da palavra falada ou do som. O rádio, como a literatura, opera com palavra sobre a fantasia, a imaginação, o que levou um pensador da matéria, McLuhan a chamá-lo de "meio quente". McLuhan dividiu os meios de comunicação em "frios" e "quentes". Quando um meio de comunicação possui a alta definição, ele seria "frio". A televisão seria um meio frio porque opera sobre os sentidos, dando-lhes imagem, cor, som. Essa concreção da televisão determina no espectador menos exercício interno. O rádio, por 61 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) usar palavra, o material da fantasia, seria um meio quente. Leva o ouvinte, necessariamente, a um trabalho de complementação, criação, fabulação, intervenção. Ora, a criança, sobretudo nas fases pré-escolares, vive plena de fantasias e há educadores que afirmam: a escola com seus rigores racionais, impede o florescimento dessa outra face da mente humana, tão rica, talvez mais rica, a fabulação, a invenção, a constante renovação do fluxo mental. O rádio favorece esse tipo de indução, estimula a fantasia e a criatividade. A própria estereofonia, em alguns países, vem sendo utilizada, não apenas na música. Há experiências no rádio alemão, de obras de rádio-peças como eles chamam feitas em função de estereofonia. Ela recria para o ouvinte um espaço cênico, real à direita e à esquerda, amplitude que gera, do ponto de vista sonoro, o mesmo espaço físico propiciado pelo teatro. A rádio-peça, outra das formas literárias avançadas e profundas, está abandonada pelo rádio infantil e para adultos. Em outras palavras, é mais rendoso virar disco do que produzir uma rádiopeça; é mais cômodo manter um programa de telefonemas com os ouvintes do que uma produção infantil. O rádio deve ao processo econômico muito do seu avanço, porém, não pode ficar adstrito às regras implacáveis da competição mercadológica. Deve haver, no país, a convivência de formas: a privada, a pública e a estatal. Por outro lado, os empresários que investem têm as emissoras de maior audiência. O rádio ainda é o maior meio de comunicação deste País, do ponto de vista quantitativo, do ponto de vista da facilidade de operação e do ponto de vista da disseminação de emissoras. Não há, porém, no Brasil! Os devidos cuidados e estudo com o rádio. Ele pertence de tal maneira ao cotidiano que já não desperta a preocupação intelectual; mesmo assim na informação, no debate, na música, é o principal instrumento de politização e de libertação existencial. Principalmente via música. A poesia de John Lennon percorre os jovens do mundo com sua carga de significados via disco e via rádio. As bases emotivas, as formas anárquicas ou ajustadas de vida vêm via música, via letra. A música popular, essa interessante junção do pequeno poema com o envólucro melódico ou harmônico, talvez seja o principal instrumento de transformação social do Século XX, e é quase que desconhecida como tal pela intelectualidade, e pela política, salvo no meio acadêmico. Nenhum jornal, hoje mantém coluna de rádio, e todo esse meio que permite a informação é instantâneo, o contato com a comunidade. Poderíamos, ainda levantar a falta de reflexão sistemática sobre o rádio e a criança, o rádio e o idoso, o rádio e o cego. O rádio é o único meio usado pelos cegos brasileiros e do mundo inteiro, e em todas as duas mil e tantas emissoras do País não há uma para os cegos, capaz de permitir leitura para os que não podem ler. Todo o espectro de emissoras em ondas curtas, deveria estar sendo utilizado porque saiu do broadcasting (isto é, da competição de mercado depois que a FM entrou) para o mais completo intercâmbio educativo. A influência atomizada do rádio é maior do que a influência concentrada da televisão. A TELEVISÃO Em meu livro "A liberdade do Ver", capítulo I (Televisão, informação e mudança), digo: "A tendência predominante em quem observa a avassaladora influência dos meios de comunicação é a de supô-los onipotentes, todo-poderosos, espécie de Moloch devorador de nossos dias, idéias e ideais. Potentes, são! Onipotentes, jamais! Tais considerações apocalípticas atribuem toda a força aos meios e muito pouco a quem está do outro lado, o público, elemento que "corre-com" a comunicação, logo, concorre com ela. O público não é uma unidade estática ou moldável massa na qual se imprime a forma (e o conteúdo) determinada pelas secretas estratégicas dos sistemas mantenedores dos processos da comunicação como aparelhos ideológicos. Os sistemas procuram a modelagem e parte do público a ela adere, por coincidência de propósitos profundos ou por submissão. O público (real e potencialmente) não é uma unidade amorfa e passiva. Possui características da passividade e amorfila, porém o público é uma diversidade de alto dinamismo e resistência. Daí decorre e não onipotência dos meios de comunicação, acima aludida. No comportamento do receptor da comunicação, conforme suas condições culturais, caracterológicas, emocionais e intelectuais, latejam quatro instâncias nas quais se trava o embate entre o afã de convencimento e modelagem de qualquer massificação e o reagir diversificado do receptor. As instâncias são: Mimética, Empática, Reflexiva, Libertária. Elas não são como escada. Atuam concomitante, ainda que contraditórias, em cada comunicação e em cada recepção. A instância mimética é aquela segundo a qual cada pessoa tende a mimetizar, imitar, incorporar ou aceitar o que vem da comunicação, segundo o grau e a natureza da coincidência entre seus códigos cultural e conceitual e a matéria emitida. É comum a pessoas de qualquer nível cultura. Cada segmento mimetiza algum comportamento ou emissão. Evidente, porém, que ela é pronunciada e predominante em segmentos acríticos do público. Quanto menos cultura mais mimetismo e repetição. A instância empática incide com as demais. Corre paralela. Através dela, os mecanismos emocionais fazem-se presentes numa relação de self para self (quando num plano profundo de empatia) ou, então, de inconsciente para inconsciente ou de emoção para emoção. Ela independe de controles racionais. Não os nega ou contraria, mas funcione paralela e com idioma e características próprias. Conforme a tipologia psicológica do recptor da comunicação, a instância empática pode ter a predominância. Particularmente as emissões de televisão são, no campo da comunicação, as que mais estimulam a vigência da instância empática, pelo fato de trazerem o mistério humano ao nível do close up. A instância empática propicia e suscita relações entre público e meios de comunicação, alheias ao controle racional e até contrárias a ele. A instância reflexiva opera no nível racional, coincidente com os demais. Ela opera ao mesmo tempo (concomitante com a emissão) embora possa continuar a ser exercida a posteriori, quando o receptor da comunicação realiza a leitura crítica, na qual seus padrões de julgamento e reflexão são acionados. A instância reflexiva é predominante em pessoas de bagagem conceitual diferenciada e capacitada de traduzir em idéias e juízos de razão o que receberam via comunicação. Racional, crítica e conceitual, eis a natureza da instância reflexiva, comum a qualquer receptor mas, como vimos, predominante nos que possuem nível cultural mais alto. A instância libertária difere da reflexiva porque não convoca apenas a razão. Ela é a expressão da democratização interna de todas as características do ser, inclusive as indefinidas: as que mobilizam a intuição, a sensibilidade, os elos cósmicos etc. A instância libertária defende o que é profundo em cada indivíduo, em cada sociedade, em cada cultura e em cada raça. Ela é preservadora do que é mais caro ao ser humano, a sua individualidade e o seu instinto de conservação. Nela, nenhuma massificação pode entrar para modelar. Ativá-la é mister de qualquer atividade educativa, religiosa ou institucional destinada a preservar a liberdade humana, supremo bem do ser humano, como a vida e a igualdade de direitos. Escravo e prisioneiro eis o destino do homem. Escravo ele é, e prisioneiro, até de si mesmo ou de suas idéias. Possui, porém, uma instância profunda, a do livre-arbítrio. É a instância libertária na qual existe – em potência – a possibilidade da liberdade. Todo homem é dotado de um plano profundo, em relação ao qual pode viver sem auscultar, mas que existe e emite impulsos. Nele prolifera a permanente possibilidade de revisão, contradita, busca, procura e pergunta que faz em cada fato ou idéia. Lavra nessa instância a ameaça permanente às nossas próprias opiniões, idéias, crenças e até convicções. Ativá-la é exercito do homem maduro. As quatro instâncias coincidem, (concomitantes embora contraditórias) em qualquer comunicação e em qualquer receptor. Conhecê-las é libertar-se de seu domínio para usá-las no benefício próprio e da vida. Mac Luhan dizia que, se os sistemas pretendem impedir o efeito de transformações culturais e políticas operado graças à televisão, o que deveriam fazer era proibir a existência da televisão. Existindo e funcionando, mesmo dominada pelos sistemas hegemônicos, ela promove, por si só, mudanças profundas na cultura e no comportamento dos homens. Correntes marxistas afirmam o oposto. Que a televisão a modela, como a escola, os hábitos e comportamentos de um povo. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Quem a dominar, dominará o pensamento e determinará hábitos e até necessidades." Na verdade, tanto a TV tende a manter os valores vigentes e dominantes em qualquer sociedade (seja ela qual for, socialista ou de mercado) como, ao mesmo tempo. possui uma força transfiguradora que escapa ao controle do sistema mantenedor. A televisão de qualquer país representará. sempre, como a imprensa, a luta interna entre as pressões para conservar e as pressões para mudar. O resultado dessa luta é o programa que vai ao ar, espécie de trégua e pacto do possível, código do permitido. Esse entrechoque enriquece o mundo noticioso, principalmente nos países de formação democrática onde nem o Estado nem o capital preponderam com absoluta imposição de suas disposições. Países altamente democratizados conseguem o equilíbrio entre os ditames do capital, os do Estado e os dos profissionais e artistas que compõem o quadro funcional dos meios de comunicação. A humanidade ainda não encontrou melhor forma que a democrática (por isso tão rara) de relacionar essa fonte de poder, que são os meios de comunicação, com as necessidades e direitos de quem está do outro lado: o consumidor. A televisão é um aparelho ideológico, ou seja, um meio modelador, destinado a construir e manter a ética e a estética próprias ao sistema hegemônico (dominante). Em qualquer sistema ela existe e funciona como expressão do poder (poder político e bélico); é a expressão de um poder cultural que decorre do poder econômico e do poder bélico. Poder econômico e bélico operam juntos e dominam o Estado. O poder cultural discrepa porque deriva do efeito dos meios de comunicação (que representam a ideologia do poder político) e dos artistas e pensadores que não representam essa ideologia. Do choque dessas tendências vive e atua o poder cultural: ou ele decorre das forças hegemônicas que impõem seus gostos, hábitos e valores: ou decorre da oposição a tais forças. O poder cultural é tão poder quanto o político. Possui as suas regras, sacerdotes, mecanismos, repressões e recompensas. Toda forma de poder tem que ser capaz de assegurar condições de sua manutenção como poder. Precisa, portanto, paralisar, cristalizar o avanço e a mudança para que permaneça "poder". O poder se utiliza: então, da massificação. É a chamada alienação dos meios de comunicação". Esse processo, porém, não é onipotente. O poder tende à massificação, porém a massificação não é onipotente, como já vimos. Dentro da televisão ocorre um conflito: ao mesmo tempo que, enquanto ideologia, tende a cristalizar o pensamento e a se transformar num aparelho ideológico destinado a exaltar as qualidades e as virtudes do sistema (poder econômico, poder político e poder militar), tal controle se dá na parte falada, no texto, no discurso. Não, porém, no tocante à imagem. O sistema, enquanto ideologia, não tem interesse em fazer da televisão senão uma vitrine cor-de-rosa. A televisão exibe muito mais o belo, o bom, o agradável, o prazenteiro do que o ruim. Em função da competição, porém (nas sociedades abertas), ela precisa se colocar na posição de quem está denunciando mazelas sociais. Embora além de denunciar nada possa fazer (são questões sociais que se definem ao nível da economia e da política e não ao nível da televisão, a televisão pode encaminhar e consolidar a reivindicação comunitária. Ao fazê-lo, mesmo na condição de veículo do "sistema", ela está levando a miséria e a dor latentes e jacentes através da imagem. A força da imagem fala por si, não há discurso ou pressão ideológica que modifique os seus efeitos. O volume diário de matéria telejornalística adensa e aprofunda o efeito transformador da televisão. Significa que na pauta de leitura da televisão existe, de um lado, o propósito de dominação e, de outro, a desestruturação desse propósito promovida pelas características da imagem. Nem, apenas, a visão de Mac Luhan; nem, apenas, a dos analistas da escola marxista. A televisão é um conjunto caótico de signos de efeitos imprevisíveis. Parece provado que a comunicação eletrônica de imagens mobiliza muito mais e profundamente os sentidos. A recepção é mais sensorial que racional, vale dizer atua sobre os sentidos numa proporção maior. Quando o cidadão está imobilizado, sentando, com olhos e ouvidos ocupados, vendo e ouvindo imagens e sons numa alucinante sucessão (e cada uma com carga de tensão intrínseca), está ingerindo e empatizando, através dos sentidos, uma forma de conhecer diferente das anteriores. O processo de tomada de contato com a realidade vem através de mecanismos que, por mobilizarem mais os sentidos, diminuem a carga de esforço e atuação de outros elementos componentes do sistema neuropsíquico do indivíduo, razão principalmente. Através dos sentidos nos vem o que vai ficar na inteligência; e se a pessoa dispõe de um conduto sensorial aumentado ou dilatado pelo uso continuado de uma tecnologia cuja característica é dilatar o sensorial, chegarão, então, ao intelecto cargas maiores (e mais difíceis de definir) que as ali chegadas quando os sentidos tinham uma relação diferente com a realidade externa, pois eram menos mobilizados do que agora. De ser verdadeira esta premissa, pode-se inferir que cabe à televisão missão mais importante e profunda do que habitualmente se lhe atribui. Assim, as mensagens televisivas passam a carecer de um estudo acurado para a verificação da exata medida da influência, no intelecto, do alargamento dos 62 condutos sensoriais pelos quais transitam as mensagens. Mesmo que os mecanismos puramente racionais, durante o auge da tecnologia do livro, estejam relativamente bloqueados na televisão, aquel'outros decorrente do alargamento dos condutos sensoriais criam novas formas de inteligência empático-sensível." O video tape, modificando as relações de produção; o editor eletrônico; o satélite permitindo a comunicação instantânea internacional e o circuito miniaturizado, permitindo o pequeno aparelho e sua portabilidade, fizeram a revolução da televisão, o "mídia" saiu do estúdio, o velho estúdio, eterna representação da realidade e ganhou a praça, a vida, o sol, a rua. É como se a televisão tivesse sido invadida pela sociologia do País. Muda, então, a estratégia de produção. A ficção, hoje a base de audiência das emissoras via telenovela e telesséries, ganha a sua força principal após o video tape, a edição, o circuito miniaturizado e a disseminação via satélite. Enquanto a televisão, atada e fatalizada estava ao estúdio e não possuia o video tape , era necessário armar a produção em função da mesma ordem em que as cenas iriam ao ar, como no teatro. Quando, graças ao video tape e ao editor eletrônico, a produção se liberta, toda a técnica de elaborar programas se transforma. Muda, por conseqüência, o chamado "padrão" de produção. Aumenta a audiência, consagra-se o mercado. logicamente o veiculo. Viriam à luz telepeças ligadas ao regional brasileiro as de maior sucesso, porque é quando o País começa a se ver na televisão. Ainda que sob a forma ficcional, ele ganha relativa consciência de si mesmo. Quando o País reúne-se diante de um noticiário nacional ou de eventos desportivos, ganha características inusitadas de integração e co-participação. Por outro lado, destaque-se o oposto no aspecto ideológico. Na medida em que, cada vez menos pessoas ou empresas "falam" para mais pessoas, dá-se um fenômeno de concentração tanto de capital como de dominação ideológica do sistema capitalista, como este País nunca viveu. A televisão, portanto, vive um processo paradoxal, rico, multifacetado, curioso: acompanhou a linha do desenvolvimento econômico capitalista incentivado pelo autoritarismo no Brasil (concentracionista), com a vinculação e colocação de um Estado forte a serviço do capital. Fortalecem-se, então, os principais aparelhos ideológicos do sistema, principalmente meios de comunicação e escola privados. Por outro lado ocorre, como conseqüência, o desenvolvimento qualitativo e quantitativo da televisão. Este País sabe fazer televisão. Ela ganha fundo contato com o mercado, dá-lhe riqueza e variedade de produção, processo que leva, hoje, o Brasil a exportar o seu produto televisual até para países de altíssimo nível cultural. O dado contraditório e desafiador do processo de comunicações brasileiro é o fato de padecermos da falta de democratização das formas de informação (vive-se um processo de concentração, e, ao mesmo tempo, possuirmos um sistema produtor desenvolvido, exportador até, afinado com as principais vontades do mercado, embora ainda muito longe de suas necessidades. 63 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Este é, pois, o dilema dos Constituintes: encontrar a forma de democratizar o processo. aproveitá-lo em seu lado positivo e ampliá-lo. Alguns propõem a forma estatizante pura. Outros, o oposto, terceiros, como eu, a forma interativa, mista. A forma privatista pura, que está praticamente em vigor, se possui os dinamismos decorrentes da atividade produtiva, possui, igualmente, as limitações de uma vinculação exclusivamente mercadológica, e ideologicamente subordinada aos centros de decisão econômica, e não configura um quadro de democratização, pelo contrário, tendem para o oligopólio no setor. Somente em sistema tripartite (entidades privadas, públicas e estatais) poderá democratizar a comunicação: estado, iniciativa privada e instituições da sociedade civil, dividindo a tarefa e oferecendo as suas propostas de televisão. A Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso – permitam-me os Srs. e Sr as Constituintes – não vai poder ficar alheia à discussão ideológica do tema, pois dela provém o produto-programa. A discussão é ideológica, logo política e envolve a filosofia de concessão de canais e, sobretudo, a discussão dos rumos da comunicação. Cabe ao legislador, no campo da comunicação, mais que um código de proibições (dentro do qual este País viveu durante tantos anos), um código de finalidades. É preciso rediscutir as finalidades do processo de comunicação social e é preciso jungir empresa privada, Estado e comunidade às respectivas finalidades. Fazse comunicação no País para algumas finalidades, uma das quais o desenvolvimento econômico e a empresa privada o implementa muito bem. Esta, não é, porém a única finalidade de um sistema de comunicação. Há as culturais, as educativas, as comunitárias. A todas o sistema de comunicação deve atender e não apenas filiar-se à ditadura do primado do econômico. Há, portanto, um conjunto de finalidades diretamente relacionadas cor o futuro deste País, a formação de suas crianças, a complementação dos processos educativos. Por isso não devemos defender uma forma exclusiva de orientação de meios de comunicação. Ao contrário, o País deve fazer conviverem as várias propostas: privada, estatal e pública. Elas fornecem à sociedade a possibilidade de opção, escolha, uso de experiências variadas. Por essa razão, a tendência contemporânea dos meios de comunicação no mundo é a da forma plural. No mundo atual já não há mais a tutela exclusiva da família no processo de formação. Este é o tema de relevância para Constituintes. Hoje, família, escola, sociedade e meios de comunicação atritam-se na direção de obterem mais poder e educar. Todo problema da sociedade humana é de poder. Há eternamente a luta pelo poder. No campo da formação, família, escola, sociedade, meios de comunicação, neste final de Século XX, lutam pelo poder cada qual com os seus exércitos. O pacto escola-família é antigo, centenário, com conflitos como todo pacto, porém vem caminhando quase sempre administrado pelas igrejas, que são as representantes da família, organizada, em geral as das classes médias e altas, e institutos, organizações com grande experiência nessa re- presentação. Mas a união família-escola-meio de comunicação não está formada. Primeiro, porque o meio de comunicação prescinde da família na sua orientação ideológica; ele é filho do capital ou do Estado: segundo, porque a própria família não se aparelhou para relacionar-se com o meio, de vez que o desenvolvimento do meio foi rápido demais, em progressão geométrica, impedindo a assimilação da pletora de conceitos, de conseqüência e influências contidas no bojo do seu desenvolvimento. Estamos, portanto, nos umbrais da construção de uma nova sociedade para este País, com o dever de discernir a relação complexa familía-escola sociedade-Estadomeio de comunicação. Precisamos fazer com que os meios de comunicação sejam reflexos dessa pluralidade e não decorrências do predomínio de uma dessas formas de poder. A sociedade democrática é a sociedade do equilíbrio das desigualdades, ou seja, a organização do equilíbrio dos diferentes, os que vêem o mundo por óticas diversas. Só teremos uma estrutura democrática de comunicação se a tornarmos plural e variegada como a sociedade. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Só queria, nobre Constituinte Artur da Távola, perguntar onde entraria a comunicação escrita aí? O meio de informação escrito. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – Não abordei os meios escritos, é verdade, e cabe este estudo a esta Subcomissão. Fiquei um pouco preso, no improviso, aos meios de comunicação, de vez que os meios escritos não são concessões de serviço público e, portanto. escapam de certa forma, às formas de controle existentes para as concessões. Qualquer um de nós pode fundar uma empresa. A legislação brasileira não prevê qualquer vinculação do jornal ao Estado. sob a forma de concessão. Não sendo concessão, escapa um pouco a esse tipo de controle. A concessão, sim, é regulamentada pelo Estado, o Estado tem deveres de fiscalização e o concessionário tem deveres de atenção com o Estado. O jornal é uma empresa. E a modernidade está consagrando os jornais de grandes empresas. Fica difícil, pelo desenvolvimento tecnológico hoje, para o pequeno empresário criar jornais como no passado, a tecnologia tornou-se extremamente cara, a distribuição complexa e não há dúvida, também – este é um tema para nós – de que o mesmo processo de concentração ocorrido nos meios eletrônicos dá-se nos jornais. Se examinarmos a quantidade de jornais que as principais Capitais do País possuíam no passado, vamos verificar que era bem maior que a de hoje. Tudo isso se prende ao mesmo processo de concentração. Finalmente, esse tema pode trazer, também – e não foi abordado aqui por mim – o problema e as formas de censura. Nesse particular, quero declarar-me absolutamente contrário a qualquer forma de censura do Estado. Não considero o Estado um instrumento hábil para censurar qualquer manifestação cultural. Acredito que, quem trata com meios de comunicação tem o dever ético de se dirigir a multidões e, portanto, deve encontrar seus mecanismos in- termos de seleção. Porém, a meu juízo, essa seleção deve ser feita pele empresa em intima conexão com os profissionais que nela trabalham. Sou a favor da proliferação de códigos e conselhos éticos internos, jamais censura. Se este País não considerasse que os profissionais estão aptos a discutir os aspectos éticos da sua profissão, nunca teria uma Medicina, um Direito, uma Engenharia respeitáveis. Nestas profissões são corporações, elas mesmas, que se encarregam de gerir os aspectos éticos da profissão. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sr. Constituinte, antes que V. Exª encerre porque sei que tem compromissos e pode sair a qualquer momento e nos deixar, aqui, órfãos dessa informação que pretendo que nos transfira, gostaria de colocar o seguinte: V. Exª tocou num ponto controverso, delicado, que é a questão do controle ético, moral, daquilo que deve ser ou não informado à sociedade. Temos uma preocupação; constantemente estamos nos deparando com famílias, com pessoas que se acham agredidas com determinadas programações que são veiculadas pelos meios de comunicação, determinadas cenas que aparecem, determinados fatos. Ora, a informação é um direito do indivíduo, um direito do cidadão, direito de ser informado, um direito da pessoa. Mas ai é que entra a grande questão: os que detêm o meio, detêm a propriedade do meio de informação, terminam determinando, de alguma forma. o que deve e o que não deve ser informado. Não é? E digamos que o cidadão está com o seu aparelho de televisão ligado em casa e, daqui a pouco, surge um fato, uma cena, uma colocação, que é jogada para ele, para seus filhos, para sua esposa, uma cena de novela, por exemplo, ou outro fato qualquer, de repente essa família se vê agredida por isso. Primeiramente, ela sabe que quem detêm o meio de comunicação jamais irá ouvi-la, e se a ouvir vai lhe dar alguma forma de atenção pequena. E. segundo, ela não dispõe de meio imediato para entrar em contato imediato com aquele que está produzido o fato, que o está colocando dentro de sua casa. Então, resta a essa pessoa desligar a televisão. Temos muitos casos assim. não é? Até encontrei um cidadão que disse o seguinte: "Fui obrigado a tratar a minha televisão da seguinte forma, taquei um martelo na cara dela. Ela estava criando muito problema dentro de casa, para meus filhos". Queria que o Sr. antes de ir embora e naturalmente isso já fica servindo como uma reflexão para o Constituinte Hélio Costa, ajudando-o na sua exposição, colocasse como vê esta questão. propriedade do meio de informação. O Sr. falou que o Estado não deve controlar. Ora, no meu modo de ver, o Estado tem que ser um instrumento na mão do homem, não deve ser uma coisa à parte, como é hoje, o Estado está lá e a sociedade está aqui, o Estado está dizendo o que a sociedade pode ou não fazer, a que a sociedade tem ou não direito, daqui a pouco vem o Governo, que representa o Estado. e pratica um ato sem consultar a sociedade, sem levar em conta que esse ato vai provocar dramáticas conse- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) qüências na vida das pessoas, que, às vezes, não têm nada a ver com isso. Pois bem isso aí passa por outra discussão. O Estado tem que ser um instrumento do homem e, instrumento para que o homem possa realizar os seus fins, seus objetivos, alcançar os seus objetivos individuais e sociais. E, neste caso, quando o Estado interfere, instrumentalizado pelas pessoas, pelos cidadãos, teria, então, que interferir para controlar. No caso, por exemplo, do meio de comunicação, o Sr. é contra qualquer tipo de censura, mas quando a sociedade se acha agredida por determ inadas coisas que são veiculadas não tem forma de se defender, não tem como se defender. (Palmas.) E por que ela não tem forma de se defender? Porque o meio de informação, o meio de comunicação é propriedade particular, e o proprietário se acha com o direito de colocar lá o profissional que julga o que deve ser colocado e determina o que deve e o que não deve ser veiculado. Nós encontramos isso no rádio, no jornal e na televisão. Muitas vezes, o jornalista vai lá e coloca uma informação a seu respeito que não corresponde à verdade, ou que corresponde à parte da verdade, e o Sr. terá dificuldades para colocar, ganhando o mesmo espaço, a informação que o Sr. acha que é correta, no seu modo de defender. Então, a pergunta que estou fazendo é a seguinte, como o Sr. vê esse fato de, sendo o meio de comunicação propriedade de algum cidadão ou de algum grupo, como é que fica, em face disso, o direito de o cidadão ser correta e livremente informado, já que ele tem o direito de possuir a emissora, o órgão informativo, mas o Sr. também tem o direito, como cidadão, à informação correta. Como é que o Sr. vê essas duas coisas? O SR. ARTHUR DA TÁVOLA: – É muito difícil responder a isso. Todas as formas são precárias. "A democracia é o pior dos regimes, com exceção de todos os demais," dizia Churchill. Se cria uma censura forte, com base no que se coloca com muita precisão, o respeito moral, o direito de cada pessoa de sua Casa não ser invadida, agredida, inevitavelmente essa força da censura, que começa com a cobertura moral, acaba na censura política. No Brasil nós estamos saindo disso. Segundo: Será o Estado o meio mais indicado para censurar programas, peças de teatro, livros? É a organização do Estado? Que Estado? O Estado democrático, talvez, mas o Estado democrático ainda é um sonho. Alguns países o possuem e nos Constituintes livramos intensa luta por construí-lo agora. No Estado democrático ele se representa pela sociedade. No Estado autoritário, que é o brasileiro atual, ele se representa pelo Governo. Pergunto: é o Governo a instituição? É o Poder Executivo, que é parte do governo, sozinho, o instrumento hábil para a representação da sociedade? Não! Até porque, neste País, desde 1960, não há nenhum governo eleito pelo povo. Vejam o perigo de entregar tal decisão às mãos do Governo, que não representa nem o Estado. Então, vejam como é complexa a questão. Se nós, Constituintes, formos capazes de criar neste País um Estado democrático (e só a discussão do que é Estado democrático leva anos) possivelmente, construindo um Estado democrático, tere - mos instrumentos que exercitarão democraticamente o poder de censura. Porém nós não temos o Estado democrático ainda. Estamos, talvez, construindo – o ou começando a construí-lo. Por isso. Sr. Constituinte, eu insisto em dizer que não sou contra, sou a favor de que os meios de comunicação consultem permanentemente a família, a sociedade, para quem se dirige, apenas sugiro que seja feito na relação direta dos meios com a sociedade, intermediada por pessoas competentes, os profissionais. E devo lhe dizer Sr. Constituinte, que os profissionais de imprensa jamais foram ouvidos sobre os critérios éticos de uma notícia, de um editorial, de uma matéria que vai ao ar. É apenas a empresa que detém esse poder. Defendo a existência de um conselho ético interno que represente a sociedade, sob o ponto de vista do profissional, e da empresa. Mas acredito também que as empresas são as maiores interessadas, já que vivem numa relação com o mercado, num bom contato com a sociedade e, portanto, com a família. Não tenha V. Ex.ª dúvida, num país democrático, a empresa que discrepar e se chocar com a média do sentimento coletivo não obterá êxito. Será sancionada pela própria realidade, o mercado. Portanto, o importante é criar um Estado e empresa, em conjunto, discutam esta matéria eternamente complexa e subjetiva: a vida. E não apenas como temos no Brasil, hoje, só a empresa ou só o Estado, e no caso do Estado só o Governo, e nem só o Governo, só o Poder Executivo. Portanto, é preciso sair de camisa -de-força este verdadeiro absolutismo dentro do qual vivemos no Brasil: o do Poder Executivo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós temos dois colegas Constituintes querendo fazer indagações. Quero lembrar que talvez fosse mais rico, mais produti vo, nós deixarmos para mais tarde. Eu asseguraria aos nossos companheiros o direito de fazer as perguntas, mas antes eu queria, já que tenho uma necessidade rápida de sair, eu queria passar a Presidência por um pouco, para o "menino da Constituinte" O SR. PRESIDENTE (CÁSSIO CUNHA LIMA): – Se o nobre Constituinte Artur da Távola puder, dispuser de tempo para responder os questionamentos, vou solicitar um pouco da paciência do Constituinte Hélio Costa, porque considero o assunto de grande importância, de grande relevância. Passo, portanto, a palavra ao ilustre Constituinte que havia solicitado a palavra. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Sr. Constituinte Artur da Távola, gostei imensamente da sua exposição, daquele retrospecto do rádio, do rádio estereofonizado, da separação de AM e de FM. Gostaria, inclusive, em outra oportunidade, de discutir e abordar assunto, porque essa é a minha atividade profissional. Sou radiodifusor. Gostei dessa última colocação, depois da provocação feita pelo nosso ilustre Presidente, Constituinte Nelson Aguiar, com respeito à ética e deixarmos afastada aquela tão odiada censura. Eu sou contra a censura. Agora, naquela correlação de família – escola – meios de comunicação, hoje temos o domínio absoluto dos meios de comunicação, rádio e televisão envolvendo o comportamento da escola e 64 da família, sobretudo da família, porque a escola é uma conseqüência da família. No meu modo de entender, esse conselho ético seria, talvez, a forma jurídica para a nossa Comissã o, dentro de um dispositivo que pudesse estabelecer a responsabilidade dos proprietários dos meios de comunicação. Hoje, apela-se mais para a responsabilidade. As famílias, a sociedade, a escola, todos nós, somos vítimas da irresponsabilidade. Vamos falar da televisão. A televisão, através dos filmes importados, todos eles eivados de violência. As inúmeras novelas, das empresas geradoras, hoje estabeleceram um comportamento diversificado. Não sou conservador, mas os bons costumes e a família, no seu contexto puro, devem ser preservados. Censura, não. Falta responsabilidade. Então, encontro a forma de se estabelecer um conselho ético comunitário, envolvendo diversos segmentos sociais, inclusive do próprio veículo, que daria a possibilidade de, numa manifestação, chamar o proprietário ou os produtores de determinados programas e discutir, não censurar, mas discutir, trocar idéias. Porque pergunto: como é que vamos dialogar, se nós não temos possibilidades, não temos formas de chegar ao diretor, ou chefe, ou pro prietário do veículo? Então, dentro desse raciocínio, nós, que só recebemos, que somos passivos, que somos moldados, vamos rediscutir com o proprietário. Mas pergunta-se: e se o proprietário, se o diretor, se o programador não quiser ouvir? Então, temos que discutir uma forma de correlação com o Estado, que é o detentor daquela concessão. Estabelecer, não sei, uma punição, uma pena ou coisa parecida, como existe hoje no código, já superado, de telecomunicações. Então, eu deixaria, como contribuição, meu caro Constituinte Artur da Távola, para que voltássemos a debater no sentido, talvez, de fazer um dispositivo ordenado juridicamente para criar um conselho ético comunitário entre os diversos segmentos da sociedade, da comunidade, incluindo nesse conselho também a participação da empresa de comunicação. O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte Eliel Rodrigues, mas devido ao adiantado da hora, solicitaria a S. Ex.ª que não ultrapassasse o tempo de três minutos, para que o companheiro Hélio Costa possa fazer sua explanação. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Ilustre Deputado Relator Arthur da Távola, foi muito proveitosa a sua palestra. Ela foi muito importante para a discussão do tema que temos diante de nós, da Influência dos Meios de Comunicação nas Relações Familiares. Estou apresentando uma sugestão para a Subcomissão correspondente, que trata da censura nos meios de comunicação, tendo em vista a formação moral e espiritual da nossa nacionalidade. Isso porque temos observado que o disposto no § 8º do art 153, da atual Constituição, que diz: "§ 8º É livre a manifestação·de pensamento, de convicção política ou filosófica, bem como a prestação·de informação independentemente de censura, salvo quanto a diversões ·e espetáculos públicos, responden- 65 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) do cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer..." E assegura adiante outras coisas. Então, a experiência tem demonstrado que essa liberação de censura, aliás em verdade sou favorável a que não haja censura em termos da expressão de pensamento, no aspecto político, sou favorável a que não haja, mas quando ela fere a sensibilidade e a formação da família e da sociedade, no aspecto moral, estamos de acordo com esse sentimento. Então parece-me que, ao elaborarmos uma proposta, já com enriquecimento da sugestão do nobre Constituinte, que foi muito válida, um conselho ético da própria empresa, da própria emissora e do próprio jornal, creio que tenho mais um elemento a adicionar quando defendo a censura por parte do Governo, quando ela extrapola, quando a liberdade de consciência está sendo conspurcada pela liberdade que a empresa tem de fazer os seus programas e lançá-los, por uma questão financeira, dentro da sua sobrevivência. Então, eu me proponho a adicionar, entre as entidades que devam fazer parte desse conselho de censura, além de outras a própria empresa ligada a esse contexto. Parece que é um modo de conciliar que o Governo, que a população, já que não podemos ir diretamente à emissora, mas que entidades de classe, como dos jornalistas, de apoio ao menor, entidades religiosas possam participar dessa discussão, se determinada firma, se determinada programação é válida ou não para ser levada aos nossos lares. Então, creio que, adicionando minha sugestão a esse conselho ético, por parte das empresas, tenhamos mais um elemento que possa, também, ser ouvido e possa apresentar sua sugestão sobre a validade ou não de determinada proposta. É uma forma de, não só o Governo participar, não só entidades particulares representativas, religiosas, educacionais, ou do menor fazerem parte, mas também da própria entidade empresarial poder também se fazer ouvir, nessas ocasiões, junto a esse conselho que representará o interesse maior do Governo assim estabelecido. Queria, também, agradecer as palavras de V. Ex.ª, que enriqueceram mais um detalhe do meu pronunciamento. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima): – Concedo a palavra ao Constituinte Flávio Palmier da Veiga. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Conheço demais o seu trabalho, a sua luta em defesa da cultura na televisão. Agora mesmo ficamos assistindo ao seu programa de exaltação da música, muito bem colocado, um patrimônio cultural da televisão brasileira. Pergunto, como homem de televisão, já que a televisão está violentando o lar, comprovadamente, todos aceitam esse paradigma, está ferindo a criança, o adolescente, está até separando casais, maltratando o conceito de integração, da grandeza do lar e da família, pelos novos programas, que penetram no lar, pergunto: Por que os homens que preparam os programas na televisão não exaltam, nos seus textos, a oportunidade de obras literárias, os grandes vultos brasileiros, o debate de temas culturais, com a participação da sociedade, dos jovens, o chamamento das universidades, dos estudantes ao tema da televisão? Por que não se exalta a ecologia, a natureza? Porque estamos casados, principalmente nos horários nobres, de não assistirmos a um programa que possa contribuir com a vida, com o sentimento, com a formação moral, ética e cultural da família, do jovem e do povo. Então, o que nos entristece é termos uma exceção, que é a TVE, que ainda se preocupa um pouco com esses programas. Mas, por que esses poderosos homens de televisão não se preocupam com essa base, com esse essencial, fazendo debates de sindicatos e aproveitando e imaginando temas que pudessem levar, principalmente nos horários nobres, uma conceituação de eficiência, de defesa do lar, da família e da cultura? Porque nós temos tanta coisa boa para apresentar neste País, a nossa história é tão rica, a nossa cultura, a nossa arte é tão capaz, e não se consegue mentalizar, aos homens que comandam a televisão, esses postulados, precisando a Constituinte criar, como bem disseram os nobres Constituintes, e como se admitiu, num Estado democrático, o nobre Deputado Artur da Távola, um conselho que não é censura, mas será censura para normalizar e defender o homem dentro da casa, vendo televisão ao lado de sua família. Por que não surgiu ainda isso? Vai precisar de a Constituinte criar um canal que obrigue a televisão a provocar esse estado mental de direito, que é o estado de defesa do sentimento, da família e do lar, ao assistir um programa de televisão. Será que é só interesse comercial, será que não existe gente boa nesses grupos? Não existe defesa da família e da sociedade? Essa é a pergunta que desejava fazer. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – Sou obrigado a responder. Há um pensador da comunicação chamado Umberto Eco, que divide os analistas do fenômeno comunicação no que chama de "apocalípticos" e "integrados". Noto que a maior parte dos membros da Comissão da Família, do Menor e do idoso parece inserir-se entre os "apocalípticos". Diz Umberto Eco que os apocalípticos são intelectuais que vêem, nos meios da comunicação, um sintoma do apocalipse. Eles os consideram fatores da destruição dos valores. Já os integrados, entre os quais incluo-me, não têm tal visão apocalíptica dos meios de comunicação, não os vêem como onipotentes. O meio de comunicação é potente, evidentemente, modela, conforma. Porém, não onipotente. Devo dizer ao Constituinte Flávio Palmier da Veiga, que provado, hoje, em pesquisas, esta que o meio de comunicação não é potente no sentido de formar convicções, porém no sentido de reforçar convicções já existentes ou em formação. Se a sociedade tem, latente ou patente, uma convicção na direção de posição anti -racista, por exemplo, o meio de comunicação é eficaz no sentido de fortalecer a convicção pré -existente. O sistema de comunicação de um país não é apenas o que dele pretendem fazer seus dirigentes. O sistema de poder detentor de cada meio de comunicação é – ele também – submetido a injunções várias, contraditórias. E como a comunicação não vive sem ou contra o mercado e suas exigências, ainda há este outro vetor (o mercado) a determinar correções de rumo, aceitações ou rechaços das pressões várias. Se houver um mercado exigindo liberação sensual maior nos programas e comerciais, para lá caminhará a comunicação por maiores que sejam os protestos. Se o mercado prioritário exigir rigor repressivo nas cenas sensuais, ele virá. Funciona pois a comunicação como o estuário das pressões várias, no qual o principal desaguadouro é o do mercado majoritário. São, portanto, os produtos de comunicação, sempre, a média do confronto entre idéias novas e velhas, entre concepções antigas e modernas, entre tendências conservadoras e vanguardistas. A comunicação não é estática: é um campo de intensa e permanente batalha entre os vários códigos ideológicos, verbais, políticos, doutrinários, religiosos etc. A televisão é, dos meios de comunicação, o que mais sofre pressões porque, por sua natureza de meio intrinsecamente associado às disposições do mercado, trabalha com o código do permito. A TV opera sempre no limite do permitido. Avança conforme o permitido; recua na mesma proporção. Quem quer uma televisão engajada politicamente e, desalienada, voltada para o real social ou sensual, por exemplo, encontrará do outro lado, a pressionar, quem a deseja alienada ou pelo menos alheia aos problemas reais ou profundos de uma sociedade. Enquanto a televisão provoca reações nos setores mais conservadores da sociedade, os segmentos que se consideram "avançados" não a apóiam! Jamais haverá uma televisão, em qualquer sistema, que opere contra o código do permitido, até porque a televisão é a própria expressão desse código, na medida em que faz parte do mesmo sistema que o mantém, na condição de um de seus "aparelhos ideológicos". O máximo possível para o criador que, como profissional, trabalha nos meios de comunicação é introduzir dissintonias no código do permitido jamais derrotá-lo ou denunciá-lo. O sistema não o permitirá. Introduzir dissintonias no código do permitido é jogar com conflitos e contradições existentes no permitido, no já aceito. É trabalhar tais conflitos, levá-los ao publico sob a forma de debates, de ficção, de noticiário, de análises. É da natureza do "permitido" (vale dizer, a ideologia) operar e imperar sobre o público, seja por imposição natural ou repressiva. É impossível exigir que o permitido passe ao público um estado de consciência sobre o processo pelo qual esta sendo levado ao público, não como "permitido" mas como "verdade". A consciência sobre o "permitido" que é levado ao público como "verdade" só advém de algo alheio a cada meio de comunicação: a leitura crítica, realizada por analistas, críticos, estudiosos, professores etc. Tal consciência é muito difícil de ser traduzida porque nem sempre é clara, vale dizer, nem sempre é possível ter-se plena consciência do conteúdo ideológico ou mitológico presentes numa comunicação enquanto estamos sendo alvos dela. Como essa consciência nem sempre é clara e como o poder de quem a possui é sempre marginal ao sistema (até porque é minoritária e ainda por cima o ameaça), ela (consciência) permanece ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) fora do processo, difícil de chegar a quem vai sendo (de?trans?com?re?) formado pelo código do permitido. A prova da pujança de qualquer sistema de comunicação será, pois, sempre, ser atacada com igual ferocidade pelas posições extremas. O que a televisão mostra está carregado de latências. O que está latente não está patente, mas pulsa por trás. Essa pulsação aguça e mobiliza o telespectador. Ele não vê, adivinha. Não constata, sente. Não flagra, percebe. O que a televisão mostra fala de maneira eloqüente do que ela esconde. O escondido está latente no mostrado. Através do estudo e da interpretação do que é mostrado (o permitido) alcança-se o latente, o escondido. Nesse escondido está a verdade. Funciona, então, o código do permitido também da seguinte e reversa maneira: a verdade aparece através do que é escondido, em função das palavras, reações situações que escapam ao código de proibições e induzem o telespectador às conclusões. Quem o expressa de maneira clara é o humor. Uma de suas facetas é alterar as disposições do código do permitido, sem revogá-lo. O permitido, quando por momentos (se não fosse por momentos, fosse para sempre, o sistema não permitiria) burlando, rompido ou arranhado, transformase na matéria-prima do humor. Humorista é o que fala a verdade oculta através do código do permitido. Este código é temporariamente revogado ou anarquizado para contrariar as disposições de quem determina o que é permitido. Entre o código do permitido e a verdade existencial da-se, em todas as sociedades, uma pugna terrível. A verdade existencial sai sempre ganhando, ainda que tenha que trapacear. Mas é vitoriosa a curto prazo. A longo prazo, é quase sempre o código do permitido (o sistema) o vencedor, até porque há algumas bases profundas e algumas verdades incrustadas nas mentiras e hipocrisias do permitido. Verdades familiares, de vida, de formação, de classe social, de amizade, de hábito, de convivência. O que precisamos, isto sim – e estou de acordo, em essência, com V. Ex.ª Deputado Flávio Palmier, e com outros colegas – é fortalecer a instituição educacional. Só a educação sólida prepara o homem para discemir diante da força dos meios de comunicação, dos aparelhos ideológicos, das formas distorcíveis da visão economicista do século XX. É um erro de enfoque colocar o problema brasileiro na programação de rádio e televisão, com todos os defeitos que têm, e nós podemos fazer aqui uma reunião só para analisar esses defeitos, que não são poucos, repito, principalmente na área infantil, é muito mais importante fortalecer a condição cultural, porque cultura e educação permitem ao homem o discernimento, ler o jornal e saber o que está por trás e o que está nas entrelinhas. Fora daí as pessoas serão eternamente vulneráveis a formas de massificação. Se não for a massificação da televisão, será outra forma. A humanidade sempre foi massificada. A história da humanidade é a história de massificações sucessivas. Há algumas formas de enfrentar a massificação. Cito-as em meu livro "A Liberdade de Ver" do qual alguns trechos trans- 66 crevo a seguir não sem antes aludir à formação, os educadores são os liberdade de informação como a principal: comunicadores da educação. Ambos têm o dever de estar abertos à "Todos os sistemas, sem exceção, instância do livre-arbítrio, respeitando e foram massificadores. Qualquer sistema despertando os elementos da consciência político, religioso ou econômico procurou crítica, porque a tendência dos sistemas é a utilizar os meios a seu alcance para fazer das de massificar. pessoas executoras ou repetidoras de suas Um sistema dominado por uma disposições. É o que Althusser chama sociedade mercantil, uma sociedade de venda "confundir ideologia com verdade". Uma e consumo de produtos, tende a massificar. O disposição do sistema dominante é tão dever do profissional que trabalha como profundamente arraigada no pensamento, que agente desses meios modeladores é passa a ser verdade o que é ideologia. Nos polivalente porque está diante de uma sistemas religiosos, por exemplo, tal confusão disjuntiva terrível e complexa: atender às ficou muito patente com o passar do tempo. necessidades desse sistema, mas contestar Devido à mudança das normas éticas, o que suas cristalizações, carreando os elementos antes era tido como uma verdade de reflexão a quem por ele se modela. insofismável, indiscutível, ficou como uma O problema ético do professor é, no disposição ou um ditado que pertencia aos fundo, ser um agente do sistema e, ao mesmo interesses dominantes numa determinada tempo, um agende de mudança! época. A única forma de enfrentar a força O problema ético do homem de avassaladora da ideologia, como pré- comunicação é ser, ao mesmo tempo, um modeladora do pensamento, é a consciência agente do sistema e um agente de mudança! crítica. A própria consciência crítica esbarra "Ambos operam em veículos nesse dilema terrível: ela identifica um mantenedores do sistema, para modificá-lo e processo de dominação, mas ao fazê-lo, para garantir a liberdade e a consciência inevitavelmente, engendra a próxima forma de crítica diante dele." dominação. Mais claro: todo mecanismo de substituição dos grupos de dominação acaba Esta é uma questão complexa, por por se transformar numa cristalização, que isso eu não possuo a convicção apocalíptica. engendra e trata de manter os mecanismos de Não considero o meio de comunicação dominação ulteriores. onipotente. E tudo depende do nível de educação e cultura de quem está do lado de Ao identificar um processo de lá. País educação engendra, exige a dominação, a consciência engendra o comunicação de alto nível. A recíproca é próximo. Removido um núcleo de dominação, verdadeira... (Palmas.) o próximo, que fora libertário na sua origem, domina, impõe-se e se cristaliza. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Já estamos com o tempo se Não há, na história, nenhum indício de exaurindo. Sabíamos que teríamos essa sistemas que (via meios de comunicação riqueza de informações hoje, aqui, em se existentes) não tenham tentado modelar as tratando de quem se trata. consciências e as vontades. A SRA. CONSTITUINTE MARIA Ao longo da história, todos os LÚCIA: – O problema e a conscientização. sistemas massificaram. Sempre! Porém nunca O SR. PRESIDENTE (Nelson a massificação foi onipotente! Hoje em dia, há Aguiar): – Desculpe, eu não lhe dei a palavra. um elemento novo e perturbador na história da Perdão. tentativa de massificação: informação. A SRA. CONSTITUINTE MARIA Embora manipulada ideologicamente LÚCIA: – Não tem problema. O senhor tocou pelos sistemas, a eles escapa em algumas de no assunto que eu ia falar. Justamente era a suas conseqüências. A informação é falta de conscientização do povo; um povo portadora de um mecanismo de transfiguração educado, automaticamente, estará apto a que é o principal elemento com o qual contam discernir qualquer programa, qualquer censura as pessoas contra a massificação. que houver, ele saberá fazer. O mesmo processo que massifica, ao se utilizar da informação, é portador de níveis diversos da consciência da não massificação. No mundo moderno, a produção e o processo tudo podem; só não conseguem derrogar a consciência, por mais que a embotem. Do outro lado da comunicação está um ser chamado homem que traz, dentro de si, uma instância, o livre-arbítrio, no qual a liberdade humana é sempre uma potencialidade e uma possibilidade. O encontro dessa instância está na educação. Qualquer ser humano possui a capacidade de defesa, racional ou instintiva, contra as modelagens sistêmicoideológicas. Profissionais de comunicação e profissionais da educação têm missão parecida: assim como os comunicadores são os pedagogos da in- O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas aí é que está, é o que ele disse, alguém tem me perguntado o que a Constituinte pode fazer para acabar com a fome, para acabar com a dívida. Eu digo: olha, a Constituinte tem uma função primeira, é reorganizar o Estado democrático para que as pessoas, num regime de liberdade, possam se organizar e buscar os seus caminhos. Vamos agora ouvir o Constituinte Hélio Costa. Ele já é nosso conhecido, através dos meios de comunicação, principalmente através da TV Globo. Nós acompanhamos importantíssimas reportagens que S. Ex.ª nos transmitiu dos Estados Unidos, onde morou durante muito tempo. É um homem que vive a comunicação por dentro. Nós o escolhemos e o convidamos exatamente porque, sendo uma pessoa da televisão, sendo um 67 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) profissional da televisão, um profissional que trabalha nesse meio de comunicação e informação, poderia ele satisfazer a curiosidade de muitos, transmitindo algumas coisas que nos são ocultas e que nós vemos como mito, essa coisa que impressiona a gente. É o fato de determinados personagens, determinadas figuras, e a própria televisão, hoje, se transformar num mito, porque o que a televisão disse passa a ser a verdade absoluta. Pode não ser verdade, mas: – você viu o que que disse na televisão? É a forma de mitificar a televisão, e seus personagens que vem causando uma espécie de curiosidade para mim. Tenho procurado ler muito a esse respeito. Vejo isso dentro da minha casa, com meus filhos. De repente, a minha filha, aí em casa, ela quer pentear o cabelo como a Xuxa se penteia, quer calçar o sapatinho da Xuxa e está acabado, e quem for falar o contrário vai ter guerra com ela, porque a Xuxa, para ela, é um mito, é um ídolo, e não adianta falar nada. Ora, isto veio através de um programa de televisão. Com a palavra o Constituinte Hélio Costa. O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Sr. Presidente, pelo fato, de estar viajando desde quinta-feira à noite, até há exatamente uma hora e meia atrás, quando cheguei ao Congresso, infelizmente, não recebi a informação de que deveria comparecer a esta reunião, e certamente não me sinto absolutamente preparado para um diálogo e um contato direto sobre o assunto que estamos discutindo. Mas, como sou um homem de comunicação, conforme disse V. Ex.ª, com 14 anos de televisão, 31 anos de jornalismo, de rádio, jornal e televisão, e, só de ouvir, por alguns minutos preciosos, a exposição do Deputado Artur da Távola e as opiniões dos que estão aqui presentes, já quase que me sinto mais ou menos ambientado para poder conversar sobre o assunto. Nas pequenas anotações que fiz, lembrei imediatamente do assunto que estava sendo discutido no momento em que cheguei, que é exatamente o do código de ética, que devíamos ter neste País. Devo lembrar que o Brasil é considerado, hoje, no mundo ocidental, o País mais regulamentador de todos. É um país onde para se mudar um computador de 10 megabitts do 10º para o 9º andar, precisa-se de uma autorização expressa da Secretária Especial de Informatica. É um país onde se pede um papel para absolutamente tudo. Eu gostaria de ver, especialmente dentro do setor de comunicação, menos regulamentação partindo do governo e mais participação da comunidade. É evidente que não é fácil fazer isso, no momento em que sabemos que a televisão, no Brasil, começou de uma maneira atropelada, vamos dizer assim, custou a se estabelecer, na realidade, como um veículo no Brasil, não por falta de força, como veículo, mas por falta de poder aquisito do nosso povo. Hoje, nós só temos, ainda, num País de 140 milhões de habitantes, no mínimo, 30 milhões de aparelhos de televisão, muito embora a média de audiência no brasil seja de três pessoas por aparelho e, segundo se informa, o brasileiro vê, em média, cerca de 5 horas de televisão por dia. Mas, ainda assim, o começo da televisão foi meio atropelado, no Brasil. Então, não tivemos a oportunidade de estabe- lecer uma série de parâmetros com outros países que já haviam estabelecido o princípio da comunicação de vídeo, como nos Estados Unidos, por exemplo, onde ela começou realmente, como na Inglaterra, como na Europa, como na França. E devo dizer que os Estados Unidos são um exemplo típico. Não existe regulamentação do Governo Federal sobre o que a televisão pode, deve ou vai fazer: existe, sim, um código semelhante ao que nós queremos e deveríamos implantar no Brasil, que é o código de ética. Este código de ética é mais poderoso, absolutamente mais poderoso do que qualquer instrumento oficial que possa ser criado, até mesmo pela nossa Constituinte, porque ele vai estar guardado, protegido pela própria comunidade, que é mais ou menos o que o Constituinte sugere, também V. Ex.ª sugere, onde está mais ou menos situada a idéia do Deputado Arthur da Távora. Acho que nós temos condições de estabelecer este código de ética. Na TV americana, assim como na TV inglesa, não existe uma lei proibindo um beijo sexy às 8 horas da noite, mas é evidente que não se faz, por quê? Porque se o fizerem, o código de ética da própria empresa e das entidades particulares que acompanham a vida das emissoras e redes de televisão imediatamente será aplicado, e esta emissora vai ser censurada. Não tenha a menor dúvida de que isto acontece, diariamente, nos Estados Unidos. Então, é uma censura que parte do povo. O povo tem esse direito, o povo pode se organizar, as entidades têm força, e imediatamente vão se fazer presentes. Agora, criar uma lei que, amanhã, dependendo do regime de Governo que vamos ter neste País, e Deus sabe como estamos aqui com os dedos, assim, cruzados, esperando que esta Constituinte possa estabelecer um princípio democrático duradouro, em que vamos experimentar, talvez pela primeira vez, uma democracia plena, constante. Não só para nós, mas para os nossos filhos, nossos netos, e daqui para frente. E, se não tivermos isso? Vamos dar um instrumento poderosíssimo ao regime que estiver aqui, ditando as suas ordens, como tivemos durante 20 anos, e vamos ter que seguir, religiosamente. Assim, a minha preocupação é de regulamentar menos e ter a sociedade participando mais. Acho perfeitamente viável, desde que a sociedade, como um todo, partindo das idéias que surgem aqui, no momento em que fazemos a nossa Constituição, possa realmente se organizar, possa realmente criar estas condições básicas, essas entidades que estarão com esse código de ética na mão para apresentar aos donos de emissoras de televisão e rádio, e aos proprietários de jornais; terão força suficiente para evitar qualquer absurdo, como, inclusive, vemos, quase que diariamente, como disse o Constituinte, na televisão. Esta é a primeira observação que eu gostaria de fazer em torno do que eu acho que seria o mais importante, em se tratando deste assunto, comunicação, especialmente televisão, com a família e a sociedade. No rádio e na televisão, temos que observar algumas coisas que nos levam de encontro a vários posicionamentos, se tivermos essa lei, se for implantada uma lei neste País controlando, criando mais uma vez uma censura realmente violenta, como sempre houve aqui. Por quê? A própria notícia é uma coisa violenta. Será que nós todos não nos lembramos daquela cena terrível do assassinato, por exemplo, do Presidente Kennedy? Será que não nos recordamos, ainda, do impacto emocional que trouxe o atentado ao Papa, em Roma? Será que não nos chocamos, ainda, com as cenas de Guerra do Vietnã, ou da fome da Etiópia? Estas coisas todas são agressivas. Então, se tivermos que tirar toda a agressividade da televisão, temos de tirar isso também, e, ao fazermos isso, estaremos impedindo o veículo de cumprir a sua missão social de informar, de abrir a cabeça das pessoas para o que acontece na nossa comunidade, na nossa cidade, no nosso Estado, no nosso País e no mundo como um todo. Então, penso que o veículo tem que ser aberto a quase absolutamente tudo, dentro dos parâmetros de um código de ética. Acho que esta seria a melhor solução que poderíamos encontrar, para tornar com efeito, no Brasil, uma idéia do que seria democracia dos meios de comunicação, no informar, mas uma democracia vigiada, acompanhada pela comunidade, que teria na mão um instrumento de força capaz de fazer prevalecer os princípios que nós queremos para a família brasileira. Do ponto de vista de liberdade na televisão, acho que, conhecendo 73 países, viajando durante 14 anos pelo mundo inteiro e, logicamente, acompanhando em cada país que chegava – passava às vezes um mês – o que se fazia na televisão, eu posso garantir aos Srs. que, do ponto de vista técnico e do ponto de vista artístico, nós estamos entre as três melhores televisões do mundo, sem dúvida alguma. Do ponto de vista ético, acho que estamos bem abaixo do que ocorre, por exemplo, na França, do que ocorre na Inglaterra, do que ocorre nos países da Escandinávia. Mas é evidente que estamos mais ou menos no mesmo nível dos Estados Unidos, e vamos estar também no mesmo nível da Itália. Mas acontece que, neste momento, em que temos que decidir até que ponto vai a liberdade dentro de um veículo de comunicação poderoso como a televisão, nós vamos nos deparar com um problema mais sério. Ou nós entregamos tudo para o Estado, ou transformamos a televisão, dentro do regime capitalista que temos e já adotamos e convivemos com ele, e entregamos tudo à iniciativa privada. Na iniciativa privada é quase que praticamente impossível se fazer uma televisão ou um rádio falando exclusivamente das matas maravilhosas que temos, das crianças crescendo nas escolas e sendo bem educadas, da proteção que devemos dar ao meio ambiente, essas coisas todas. São muito nobres todas essas causas e os assuntos, evidentemente, empolgantes, quando tratados artística e profissionalmente, mas nós estamos dentro de um sistema capitalista com a nossa televisão; então, ela tem que sobreviver, e sobrevive como? Sobrevive do anúncio. Portanto, há que se criar, dentro de uma forma dinâmica, que é a televisão, aquilo que cria interesse, o que coloca o telespectador diante do aparelho. É claro que temos programas maravilhosos a fazermos, sem termos de usar a violência, sem termos de usar o sexo, não estou defendendo isso na televisão, até pelo contrário, mas a televi- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) são é dinâmica, e temos que participar desse dinamismo. Eu só gostaria de ver, no Brasil, a televisão perfeitamente dividida, onde, não o Estado, mas o povo tivesse uma participação efetiva no complexo que se chama hoje TV Educativa. Podíamos ter mais TVs educativas no Brasil, podíamos dar mais recursos à TV Educativa, podíamos criar a TV comunitária; podíamos abrir as freqüências de UHF; podíamos criar a televisão por cabo, que servisse a todos esses interesses da comunidade, como já acontece na Inglaterra, nos Estados Unidos, por exemplo. Então, no momento em que se tiver a televisão comercial, mas com seu dinamismo e, às vezes, fugindo a essas guias importantes, do que nós chamamos de dever da televisão perante a família e a sociedade, aí se teriam outros recursos, se teriam outros canais. Mas, infelizmente, o que vejo é que no Brasil, com todo o progresso que se fez na TV Educativa, até agora ela não recebeu apoio suficiente do Governo nem do povo, porque, em outros países, a TV Educativa é, na realidade, subvencionada pelo povo, mas não através do governo em si, o governo entra com uma participação até mínima. Na América do Norte, a TV Educativa é mantida por contribuições do próprio telespectador: na Inglaterra, paga-se uma taxa mensal para se ver televisão; quando se tem a BBC em casa, automaticamente paga-se 9 libras por mês, que vem descontado, automaticamente, no banco que você determinar. E o governo entra com muito pouco, entra com uma subvenção. Aqui, infelizmente, acontece o oposto; o governo paga tudo da TV Educativa e, por pagar tudo, acaba, automaticamente, se tornando o dono da TVE. Quer dizer, então faz-se o que o Governo quer, na TVE, não necessariamente o que a comunidade quer; e é caro. Televisão, lamentavelmente, para mim, se resume nesta frase: TV é caro. Quem não tem dinheiro, se não tiver muito dinheiro, e não houver muita aplicação na muleta básica da televisão, é impossível se fazer televisão de qualquer nível, seja educativa, seja comercial. Ela tem que ter equipamento e tem que ter talento, e os dois custam caro. Sem esses dois não se consegue fazer televisão, nem comunitária. Então, é evidente que temos que ver de que maneira podemos criar um mecanismo para que a TV Educativa, no Brasil, tenha apoio suficiente para poder melhorar, aumentar, incrementar, aprimorar a sua programação, para que ela possa atender a um público tão grande que, de repente, pela beleza da sua programação, voltada inclusive para as coisas mais nobres da nossa sociedade, possa competir realmente com a TV particular, com a TV privada, enquanto as duas sejam regulamentadas. Outra coisa importante, e imagino que muita gente até ache que eu, ao chegar no Congresso, acabo sendo o homem da Globo, e quero garantir aos Srs. que não sou; sou apenas um jornalista profissional, fui Diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais durante muitos anos, sou membro do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro, participo ativamente de todas as manifestações da classe, tenho o maior prazer em dizer que trabalhei numa organização competente e que produz, dentro do ramo de jornalismo e lazer, um trabalho eficiente, que pode, necessariamente, ser corrigido e aprimorado, conforme disse, mas que, lamentavelmente, é acusada, muitas vezes, de fazer televisão no Brasil e ter o monopólio nesta área, no País. Acho que, nesse particular, também nós devemos abordar e colocar o nosso pensamento. Será que existe, realmente, um monopólio da televisão no Brasil? Existe um monopólio em dois sentidos: o monopólio da audiência e o monopólio da publicidade. Por quê? Porque a televisão, que envolve talento e equipamento, no Sistema Globo, por exemplo, tem com fartura, talento e equipamento. Porque, para dizer a verdade, se os Srs. fizerem uma comparação do que existe, hoje, nos sistemas de televisão do Brasil, a Organização Globo tem parece que trinta e poucas emissoras espalhadas pelo Brasil inteiro, cinco emissoras de propriedade e algumas afiliadas nesse total; a TV Bandeirantes aproximadamente a mesma coisa; a TV Sílvio Santos, a TVS também no mesmo nível: e a TV Manchete exatamente o mesmo número. Então, se nós temos o mesmo número de televisão para todo mundo, se todas as redes estão situadas praticamente nos principais mercados, e têm disponibilidade de fazer televisão com o número de emissoras pelo interior mais ou menos aproximado – e diga-se de passagem, o total das 4 redes no Brasil nos leva a 150 emissoras aproximadamente – temos 120 emissoras independentes no Brasil. Por que razão, então, nós não recondicionamos isto aqui, e pensamos porque a TV Globo tem, então, essa audiência tão fenomenal? Acho porque, do ponto de vista jornalístico, do ponto de vista de lazer, faz-se o melhor possível no Brasil, e por se fazer o melhor possível, acaba-se tendo a melhor audiência. Mas é até com prazer que nós, que viajamos pelo interior, e começamos a sentir, aos poucos, a revolução que está acontecendo no País, do ponto de vista de comunicação, que a gente sente o prestígio subindo, por exemplo, a TV Manchete, que a gente sente como a TV Bandeirantes começa a se esforçar para também causar uma competição democrática, inteligente. Quer dizer, isso para nós, profissionais, é muito saudável. Ou seja, nós gostaríamos de ver uma estrutura mais ou menos como ocorre, talvez, nos Estados Unidos, onde as três redes de televisão dividem, mas a zero vírgula qualquer coisa, a audiência. Os Srs. vão encontrar a CBS, NBC e ABC, uma com 17 pontos, a outra com 17,2 e a outra com 17,8. Então, o que faz isso? O que faz isso é a programação inteligente, é o jornalismo honesto, correto, atuante. Então, será que não tenho queixas, será que não tenho observações a fazer sobre, por exemplo, nosso jornalismo de televisão? Evidente que tenho, é claro que tenho. Mas o povo, quando quer, quando tem na cabeça uma mudança, consegue fazer coisas extraordinárias, e, no Brasil, consegue coisas miraculosas, na realidade, haja vista o que aconteceu aqui com a eleição de Tancredo neves; no momento em que houve a primeira manifestação, no Paraná, não houve cobertura de televisão; quando essa grande manifestação popular chegou a São Paulo, a cobertura foi dividida. Ela ocorria em São Paulo e no Rio de Janeiro, mas quando Brizola falava só aparecia no Rio, não aparecia em São Paulo. Então, fazia-se 68 uma divisão de quem podia falar onde, para que as coisas não fossem agitadas, com muita pressa, e nada disso foi o suficiente para conter um desejo extraordinário de o povo se manifestar: queremos democracia, queremos mudar! E o que aconteceu? Dois meses depois, todas as redes de televisão deste País, todos os jornais, estavam engajados naquela máquina extraordinária que foi criada, partindo do povo, para se eleger Tancredo Neves. Acho, assim que tudo é possível, a partir do momento em que o povo realmente se interesse, que o povo participe, que o povo se empenhe. Quando o povo quer mudar, muda. Há um filósofo inglês, chamado Lord Neubord, que dizia que quando não é necessário mudar é necessário não mudar. E o inverso é exatamente também válido – quando é necessário mudar, nós temos de mudar, e depressa. Eu acho que é o que nós devemos e podemos fazer aqui. (Palmas.) O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Sr. Constituinte, sabemos da sua experiência no contato com a televisão de diversos países do mundo, e até esse trabalho o projetou nacionalmente no Brasil. Acho que o problema brasileiro está numa origem, a maneira da concessão de canais, porque os canais são distribuídos, lamentavelmente, sem qualquer planejamento, orientação, e também sem nenhum efeito ético nessa concessão. Vamos ser claros, eles são concedidos politicamente. Sendo politicamente, seguem a orientação ideológica e política daqueles que os concedem. Queria saber, para me posicionar, como são concedidos os canais nos outros países do mundo? Eles são julgados por conselhos? Eles são concedidos dentro da área política? Na concessão existe algum dogma ou alguma norma que obrigue à defesa de programas que se identificam com os interesses da sociedade de cada estado constituído? Qual a diferença? Eu queria perguntar isso ao nobre colega que nos honra, hoje, nesta Subcomissão da Família. Qual a diferença entre a concessão dos canais no Brasil e a concessão nos outros países do mundo, que o colega visitou e onde conviveu com esse assunto, tão importante na influência na comunicação com a família, com a sociedade? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – A sua pergunta é muito válida, porque, na realidade, uma das coisas que mais me preocupa é exatamente o modelo de se dar concessões no Brasil. E eu sugeri, muitas vezes, antes de ser eleito, e depois, durante a minha campanha, e espero contribuir, inclusive, com uma proposta nesse sentido, de que a concessão de canais de rádio e televisão no Brasil seja feita através de uma comissão federal de comunicações. Comissão esse que seria estabelecida, tirando pessoas da sociedade, do meio, representantes, desde o proprietário de uma emissora de rádio e televisão até ao mais humilde empregado de rádio e televisão, mas passando por todo espectro. Eu acho que assim nós teríamos, ali, pelo menos um ambiente democrático para se entregar, por assim dizer, uma concessão de rádio ou televisão no Brasil. E isto não seria novidade, porque, na realidade, é exatamente assim que acontece nos Estados Unidos, é assim que acontece na Inglaterra, é assim que acontece na França. 69 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Agora, comparativamente, conforme o Sr. me disse, vamos estabelecer, em princípio, o que ocorre nos Estados Unidos. Vamos dizer que o Sr. more numa cidade de 30 mil habitantes, e naquela região já tenha sido estabelecido a viabilidade de um canal de FM. O Sr. é profissional do ramo, então o Sr. vai à Comissão Federal de Comunicações, faz um ofício e diz que o Sr. é candidato. Automaticamente serão consultados os outros possíveis candidatos, ou publicado em jornal, e vai haver uma concessão naquela cidade. Mas independe da força política. São feitas audiências públicas naquela cidade, para se estabelecer quem, na realidade, está preparado profissionalmente, socialmente, para dirigir uma emissora de FM, ou explorar um canal de FM. As audiências públicas, na cidade, são as mais importantes, porque, na realidade, o povo daquela cidade tem uma participação importantíssima, porque os membros da comissão chegam ali, ouvem as pessoas, pontos de vista divergentes, às vezes os mais complexos, saem dali e tomam, com os seus colegas em Washington, por exemplo, uma decisão sobre uma pequena cidade, no interior dos Estados Unidos, que tem disponibilidade de canal. Eu acho isso perfeitamente democrático. Acho que seria a coisa mais importante que nós poderíamos fazer, no País, do ponto de vista de como entregar essas concessões. Agora, vamos também relacionar o outro lado, se você chegar na Ásia, com raríssimas exceções, como o Japão, por exemplo, se você chegar na Escandinávia, a televisão é estatal. Então, não existe concessão, as concessões são do Governo, o Governo explora tudo, o Governo diz como faz, quem faz e de que maneira faz. Por isso que sou contra esta idéia, no Brasil. Acho que o modelo econômico que existe, hoje, na Europa, o modelo que existe nos Estados Unidos, e que nós acompanhamos, o modelo da televisão comercial ainda pode ser recuperado no Brasil e ser realmente o modelo ideal para nós. Mas temos que mudar, em princípio, esta base de como começar a distribuir esses canais. Eu, por exemplo, tenho uma emissora de FM no interior de Minas Gerais, na minha cidade, na minha terra. E vou explicar em dois minutos, o drama que vivi para conseguir esta emissora. Em 1979, foi aberto o edital, e como tínhamos duas emissoras de AM, que eram simplesmente uma negação, ninguém ouvia, equipamentos velhos, pessoas mal pagas, assinando, na realidade, recibos de salário mínimo, e ganhando metade, essas coisas todas, eu fui procurado por um grupo, autoridades, jovens, pessoas da cidade que se interessavam, pedindo que eu entrasse nessa concorrência, porque assim nós podíamos ter, quem sabe, uma emissora que pudesse conviver com o progresso que a cidade vinha fazendo nos últimos anos. Então eu aceitei, disse: – vou participar disso. Entrei nessa concorrência contra dois políticos, dois políticos realmente famosos nesse País; um deles, o avô tinha sido Governador do Estado, o outro político tinha sido líder do Governo, Presidente da Câmara etc. E eu fiquei ali naquela meio, coitado, esmagado de uma forma brutal. E como eu consegui esta rádio? Foi feito um abaixo-assinado na minha cidade, com 18 mil assinaturas, para que a concessão fosse entregue ao jornalista, porque eu nem pensava ainda em ser político, ao jornalista Hélio Costa. Isso sensibilizou o Presidente José Sarney e, evidentemente, sensibilizou o Ministro das Comunicações. E acabei, então, recebendo essa concessão. O que é que eu fiz? Apliquei nesta concessão praticamente as minhas economias, na época. Fiz a melhor rádio FM do interior do Brasil, modéstia à parte, com o melhor equipamento possível de se comprar. E hoje transformei essa rádio numa rádio de serviço para a coletividade, eminentemente de serviço, que acho que é o futuro presente do rádio. Se o rádio não se adaptar, por exemplo, à necessidade de ser rádio-serviço, infelizmente nós vamos ficar apenas ouvindo música em FM, que é muito bonito, com dois canais separados perfeitamente, música estrangeira inclusive, mas sem nenhuma utilidade pública. Então, eu criei ali 70% de rádio FM, e 30% de rádio AM, por assim dizer, com um departamento de jornalismo atuante, com sete pessoas trabalhando, com correspondentes, inclusive, em Brasília, Belo Horizonte, no Rio de Janeiro. E será que uma rádio do interior dá para fazer isso? Não dá, é praticamente impossível de se fazer isso, porque eu não vivo da minha rádio, não vivo do que a rádio produz. Então, a rádio é um serviço público à coletividade, porque recebi esta concessão, ou permissão, exclusivamente por causa da força popular. Dezoito mil assinaturas convenceram o Presidente da República e o Ministro a entregarem para mim essa rádio, que exploro. Acho, portanto, que esse é um exemplo, na realidade, para qualquer cidade do interior atuar de uma forma positiva. A participação da comunidade, quando vai ser decidida a concessão de uma emissora de FM, ou AM ou até mesmo de televisão tem que ser grande. E acho que o próprio empresário, se convive com esta comunidade, com esta sociedade e tem o apoio desta comunidade, á j por serviços prestados, ele não vai ter o menor problema em convencer também, ou ser ouvido por essa sociedade de ser apoiado por ela, porque já vi casos semelhantes, no interior também, de empresários de televisão que acabam recebendo o apoio generalizado de uma cidade. Por quê? Porque estão fazendo um trabalho correto, e eu não posso até me furtar de dizer que exemplo é esse, o exemplo é da Rádio Itatiaia de Belo Horizonte, que sempre se primou por ser uma emissora essencialmente jornalística, rádio informativa, e geralmente tem o apoio popular, onde quer que seja. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – Eu gostaria de fazer um alcance pequeno aqui, ainda na sua pergunta. É apenas uma pequena observação. O Constituinte Hélio Costa explorou muito bem as formas de concessões; agora, eu acho que uma delas precisa de um desenvolvimento nas chamadas formas estatais; existem países que têm a concessão dada pelo Estado, porém as emissoras não são do Governo. Esse é um conceito que cabe aqui à consideração dos Constituintes, é o conceito do público não estatal. No Brasil, temos essa disjuntiva dolorosa de Estado versus privado, como se só existissem essas duas formas de organização. A forma inglesa e sueca são formas nas quais a concessão é estatal para uma só emissora, no caso da Inglaterra, a BBC – isso agora está mudando – porém, a gestão do canal não é uma questão estatal, é uma questão pública. Com relação à forma alemã, por exemplo, não há canais privados, há um só canal que emite, com três ou quatro emissoras, a emissora a, emissora b e a emissora c; a administração é de profissionais, mas a orientação é de um conselho que representa a comunidade. Então, vejam, esta é uma forma em que o Estado garante a comunicação de organização pública. O Presidente da República, o Poder Executivo pode querer algo, e a emissora não fazer, porque a emissora é dirigida pela sociedade. Estas são formas públicas que convivem. Agora, nos países da chamada área socialista, aí as formas não são públicas, são estatais, é diferente, é o Estado diretamente o administrador. Então, a grosso modo, nós teríamos a forma privada, no modelo norte-americano, que o Constituinte Hélio Costa colocou com muita precisão, conhece muito bem o problema, organizado por um grande Federal Comunication, que é uma comissão federal de comunicação composta de membros da sociedade, orientando apenas o sistema privado, não há sistema público. Há sistemas universitários em UHF. Há a forma estatal pura, que é a forma dos países socialistas, e há a forma pública, em que ela é garantida pelo Estado, porém administrada por uma instituição da comunidade. O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Se o Constituinte me permite, o exemplo típico que V. Ex.ª citou é muito bom, porque a Inglaterra funciona assim, em parte. Ela funcionava do ponto de vista estatal, depois passou a funcionar nessa forma híbrida, e hoje a Itália também está desta forma. O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – A Itália tinha essa forma. Agora, o que é que acontece? Essas também são formas monopolísticas, embora pública não estatal, ela é monopolística, porque não permite outras formas de emissoras. Portugal é assim, França é assim, agora esses países começam a admitir, ao lado da forma pública, a forma privada. Daí, só para concluir, eu acredito que nós podemos, no Brasil, encaminharmo-nos na direção da forma tripartite. Ter um modelo privado, ter um modelo estatal, e ter um modelo público, por quê? Porque as três propostas possuem peculiaridades respeitáveis, possuem modelos, são propostas. E uma sociedade plural deve possuir também uma comunicação plural. O SR. CONSTITUINTE FLAVIO PALMIER DA VEIGA: – Essa fórmula pública seguiria uma legislação para se efetuar? O SR. CONSTITUINTE ARTUR DA TÁVOLA: – Sim, mas ela tem uma legislação. Cito sempre um caso expressivo, que talvez só aconteça em países anglosaxônicos, que é o seguinte: quando a Inglaterra estava em guerra com a Argentina – sabem que um país em guerra imediatamente tem as suas comunicações subordinadas ao interesse maior, que é o interesse estratégico do País cessam, digamos assim, as chamadas liberdades ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) constitucionais; a Inglaterra é um país tão interessante que a BBC quis pôr no ar determinadas informações que o Ministério da Defesa Britânico, no momento da guerra das Malvinas, proibira. Pois bem, a BBC colocou no ar as informações que o Ministério da Defesa, em estado de guerra, proibira. É um caso interessante, por quê? Porque a corporação BBC tem uma tal autonomia, por ser pública, ou seja, garantida pelo Estado, porém administrada por uma micro-projeção da sociedade, que o fato de ser pública a coloca acima do Governo. A palavra acima não é boa, extra-governamental. Ela funciona como instituição própria, livre, autônoma, é a palavra correta, autárquica, – se quiserem – mas a sua composição não é uma composição em que o Governo, o partido dominante tem a maioria, e sim ela representa a sociedade. Agora, são formas monopolistas, o que a Europa está fazendo é manter essa forma, porém procurando acabar com o monopólio dessa forma. Tenho a impressão de que essas experiências são muito úteis. O Brasil tem uma comunicação privada, já de muito boa qualidade. Ele não pode pura e simplesmente extirpar a comunicação privada. E tem uma comunicação estatal que, em alguns pontos, se é deficiente por razões materiais, está liberta também da tutela do capital, e portanto ela é ideologicamente mais livre, embora esteja sob a tutela do Governo. Daí que a forma plural parece ser a forma que melhor atende à variedade do real. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O nosso tempo está vencido; nós temos duas perguntas, não é? O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – A minha é rápida dentro deste contexto. O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Eu só queria fazer uma observaçãozinha rápida em cima do que o Constituinte Artur da Távola falou, e o Sr. fala imediatamente. É que toda essa estrutura, mesmo tripartite, como propõe o Constituinte Artur da Távora, é muito válida, mas nós temos que ter segurando, suportando essa estrutura pelo menos duas coisas básicas, que é mais ou menos o que discutimos aqui anteriormente. O código de ética, que teria que ser aplicado a todas as três, e também uma coisa que funciona com precisão absoluta nos Estados Unidos, e na Inglaterra, especialmente, que é a igualdade de tempo. Quer dizer, imaginem os Srs. que, se o Presidente da República falar durante meia hora, hoje à noite, nas três redes de televisão dos Estados Unidos, a Oposição tem exatamente o mesmíssimo tempo na semana que vem, no mesmo dia e mesma hora, por lei, a igualdade de tempo. Se alguém for atacado no programa das sete horas, no noticiário das sete, injustamente, essa pessoa tem o direito, por lei, de usar aquele mesmo programa, com o mesmo número de minutos, para se defender corretamente, desde que prove que foi injustamente atacado. Essas coisas é que têm que ser muito pensadas também, porque, em qualquer estrutura de televisão, se não as tivermos, lamentavelmente nós não teremos uma televisão democrática. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Sr. Constituinte Hélio Costa, nós temos as conces- sões no Brasil, pelo prazo de 15 anos para televisão e de 10 anos para o rádio. Nos Estados Unidos há uma diferença de prazo, e depois eu gostaria de saber a sua informação a esse respeito. Mas, estou muito preocupado com o que o Constituinte Flávio Palmier da Veiga levantou, e já venho pensando, estudando, apesar de a Subcomissão mais apropriada ser a de Ciência e Tecnologia e Comunicação, mas tenho intenção de, se possível, apresentar uma proposta. Agora, essa elucidação sobre o conselho existente nos Estados Unidos me trouxe, talvez, um novo horizonte. Eu imaginava estabelecer um conselho composto por pessoas da sociedade, por políticos, mas nunca atinei para a viabilidade de colocar o empresário interessado, porque ele se torna, até certo ponto, suspeito. Eu queria saber da sua opinião mais objetivamente, como nós poderemos compor esse conselho para estudar a distribuição dos canais, das freqüências disponíveis dentro do plano nacional? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Eu acho que a melhor solução seria um conselho que fosse representativo de toda a comunicação social. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Ele teria um caráter local para cada município? Ou seria nacional só? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Não. Ele seria nacional, mas evidentemente que ele poderia participar da decisão local, conforme dei o exemplo da pequena cidade dos Estados Unidos, transferindo para lá dois ou três membros desta comissão, para ouvir a comunidade, no momento em que uma concessão for feita. Agora, acho que não é difícil, para nós, inclusive, estabelecermos um conselho federal de comunicação, onde tenhamos o proprietário de televisão, mas também tenhamos o jornalista, o simples profissional de imprensa, que trabalha dentro daquela emissora, onde tenhamos o representante do sindicato da classe, onde tenhamos o ouvinte de rádio representado, onde tenhamos o telespectador representado, onde tenhamos, conforme disse, todo o espectro da comunicação social. Então, é evidente que se tem do dono, proprietário da emissora, até o seu simples funcionário, lá em baixo, passando por todos os setores, vai-se encontrar uma fórmula democrática, vai-se conseguir fazer um diálogo, vai-se conseguir representar a sociedade. Eu não vejo dificuldade em colocar neste conselho proprietários e empregados. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – E Partidos políticos! O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – E Partido políticos, é claro, sem dúvida nenhuma. Quer dizer, toda a sociedade que utiliza a comunicação social, ou faz a comunicação social, deve estar representada. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Qual é o prazo nos Estados Unidos para a concessão? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – É de 10 anos. 70 O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Rádio e televisão? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Sim, de rádio e televisão. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Constituinte Hélio Costa, quando V. Ex.ª, falou acerca do código de ética, pareceu-me que não há nenhuma implicação, nenhuma contradição em que esse código de ética possa ser utilizado – uma vez elaborado – pelos integrantes daquilo que estamos propondo na nossa sugestão para a Constituição; desse órgão que terá a seu encargo examinar os programas de rádio e televisão, seja divisão respectiva do Ministério da Educação, ou seja o Conselho Superior de Censura, que teria a incumbência de, numa segunda instância, aprovar ou desaprovar aquilo que a divisão competente venha a encarar com o válido ou não válido. Então eu pergunto: do seu ponto de vista, há algum inconveniente em que a existência desse código de ética seja exclusiva, ou ele poderá ser aplicado por essa entidade, por esse setor do poder público que, tendo em sua equipe representantes das diferentes classes sociais, representativas de setores educacionais, religiosos, do menor e do próprio empresário, dentro da ótica do Constituinte Artur da Távola, que se possa ter, então dentro desse consenso, a aplicação, não de critérios pessoais, mas desse código de ética, que viria reforçar a participação da coletividade e dar uma amplitude maior para isso. Dentro do seu ponto de vista, isso seria válido? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Partindo de uma organização do governo, não Sr. Constituinte. Eu gostaria de ver esse código de ética aplicado pelos setores da sociedade, escolhidos, evidentemente, dentro de uma representação global, por assim dizer, de todos, mas não pelo Governo. Eu seria contra qualquer participação do Governo, porque seria uma forma de censura também. E, lamentavelmente, a censura acaba, querendo ou não, acaba, extrapolando, às vezes, tanto no que diz respeito à televisão quanto ao rádio, e também no setor cultural. Eu gostaria de ver mais a sociedade aplicando esse código de ética do que o Governo. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Mas, quando encaramos que a sociedade está presente nesses representantes dessas classes já referidas, nós não estamos tendo, realmente, uma entidade representativa em melhor espécie, melhor vulto do que entidades parceladamente? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Mas o Senhor estaria sob a tutela do Governo? O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Certo! Eu diria que seria, mas, se o código seria válido para as entidades, por que não pode ser válido para essa classe representativa, esse setor que está usando o mesmo código, apenas com poderes mais definidos, dentro do contexto de uma Constituição? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Sr. Constituinte, V. Ex.ª há de convir comigo que, Ia- 71 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) mentavelmente, no Brasil, a força de persuasão, às vezes, do poder, do dinheiro, da influência, do governo, pode trazer benefícios muitos grandes, extremamente grandes a uma pessoa que esteja diretamente ligada a esta decisão. Unidos isso acontece. As três redes americanas de televisão têm um código único, eu, inclusive, uma vez consegui esse código e transmiti para o Brasil. Infelizmente, até hoje, não sei se foi usado por um momento sequer. Mas existe um código em que as três empresas maiores dos Estados Unidos Aliás, nós sentimos isso praticamente acertaram numa reunião entre si um código em todos os setores da administração pública, de ética, realmente. no Brasil. Se o Governo quer, às vezes consegue simplesmente porque tem o poder O SR. CONSTITUINTE ELIEL de virar a cabeça das pessoas. Eu acho que RODRIGUES: – Agora, dentro do aspecto da um conselho de ética, ou, esse código de nossa Subcomissão, que trata dos direitos e ética, aplicado por um conselho de ética, garantias individuais, qual a sua posição para tinha que ser isento absolutamente de que seja assegurado aquilo que temos em tudo, e não podia nem mesmo ser empregado vista, que é a manutenção dos critérios do Governo, nem de qualquer organização. morais, éticos e espirituais para a salvaAcho que tinha que ser representativo da guarda da família, quanto aos critérios de sociedade, mas sem remuneração. Acho comunicação? Dada a experiência que que tinha que representar, realmente, o que estamos vivendo, porque, pelo que estou há de mais puro e importante na nossa sentindo, ela extrapolaria a nossa atribuição, sociedade, mas sem tutela de ninguém, já que estamos levando para outras nem do Governo, nem de grandes Comissões para outros setores fora do nosso organizações. âmbito de decisão, pelo que eu senti, com esse código de ética, e a não formação dentro O SR. CONSTITUINTE ELIEL dos capítulos da nossa Constituição, para os RODRIGUES: – Então, vamos exemplificar o direitos e garantias individuais, como entraria aspecto prático da coisa. Quer dizer, nós aqui, portanto, o aspecto desse controle que poderíamos, em termos constitucionais, em nós achamos que deva existir para a termos de Constituinte, estabelecer que seria segurança e a juventude, da infância, e criado ou deveria ser criado o código de ética também para nossa formação cultural e para as rádios e comunicações, não é? moral? O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Eu acho que, na Constituinte, V. Ex.ª vai ter, na realidade, que decidir mais em cima do regime tripartite, que propõe muito bem o Constituinte Artur da Távola, ai já seria mais em cima do nosso código de telecomunicações. Eu acho que não seria uma matéria constitucional, na realidade é decisão disto. Eu acho que uma lei ordinária, ou complementar, poderia exemplificar e determinar, em detalhes, o que seria então esse código de ética. O SR. CONSTITUINTE HÉLIO COSTA: – Se V. Ex.ª analisar bem o próprio Código Nacional de telecomunicações existentes hoje, ele estabelece uma programação que tem que ser observada. É evidente que poucas emissoras de rádio e poucas emissoras de televisão, no Brasil, seguem religiosamente o Código de Telecomunicações, mas ele determina que V. Ex.ª tenha que ter programas culturais, V. Ex.ª tem que ter tantos por cento de notícia, V. Ex.ª só pode rodar, no máximo, 49% de música americana, V. Ex.ª tem que ter O SR. CONSTITUINTE ELIEL programas de utilidade pública. Agora, quem RODRIGUES: – Certo. Então, estamos faz isso? Ninguém segue o que existe! analisando que somos, pelo menos eu não Na realidade, vou dizer a verdade sou, mas é o que eu estou ouvindo, não é? para V. Ex.ª a surpresa que sinto é de, ao Há partidários da não censura. Mas esse analisar tudo isso, ver que as leis existem, código de ética, de qualquer forma, será uma elas simplesmente não são aplicadas. censura. A esperança que tenho é de que, com O SR. CONSTITUINTE HÉLIO este movimento nacional, que no Brasil inteiro COSTA: – Não! Não seria uma censura. Ele hoje a gente sente de que estamos fazendo não teria o poder, na realidade, de até uma nova Constituição, essas leis que, na mesmo evitar uma coisa que vai ao ar hoje à realidade, não serão leis novas, serão noite, mas ele pode punir no dia adaptações mais ou menos do que já existe, seguinte. Então, a empresa sabendo que mas com essa consciência de que agora existe essa possibilidade, ela mesma já teremos uma Constituição duradoura, as leis vai ter que seguir aquelas normas básicas do serão aplicadas. Porque, se o senhor for código. correr toda as emissoras de televisão e rádio do Brasil, e aplicar o atual Código de O SR. CONSTITUINTE ELIEL Telecomunicações no que diz respeito à RODRIGUES: – E se nós fizéssemos, se programação, V. Ex.ª fecha todas elas. Então esse código fosse feito, e fosse, se tivermos orientação, partindo, agora, com a então, utilizado, dentro do principio que o inclusão deste Código de Ética para esta nobre Constituinte Relator, Artur da programação, e ela for cumprida, eu acho que Távola, preconizou, que a própria vai atender a praticamente todo mundo. empresa tivesse esse conselho de ética, que fosse aplicado diretamente por ela, O SR. CONSTITUINTE ELIEL uma vez elaborado, não seria mais RODRIGUES: – Muito obrigado! viável? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós agradecemos aos O SR. CONSTITUINTE HÉLIO Constituintes Artur da Távola e Hélio Costa. COSTA: – Eu acho que é uma das Foi uma oportunidade muito grande de formas, porque nos Estados aprendermos, e a hora que precisarmos dos Srs. vamos chamá-los de novo. Nós vamos continuar debatendo até o dia 8. Nós falamos há pouco aqui, com o Sr. Artur da Távola, que não teríamos muita dificuldade para elaborarmos um texto sobre o assunto Família, Menor e Idoso e encaminharmos à Comissão de Sistematização como sugestão nossa. Aqui temos juristas e poderíamos nos assessorar de outro, tomar textos como modelos, e acrescentarmos alguma coisa das informações que temos adquirido aqui. Mas, acho que importa é ouvir, é aprender, não é? Isso tem sido muito rico para nós. Estamos com a nossa ida ao Espírito Santo confirmada. Deixamos com o nosso secretário uma correspondência que ele está encaminhando, pedindo que os Srs. Constituintes que estiverem dispostos e interessados em viajar conosco, cumpram os condicionamentos que estão colocados ali, quer dizer, às 18 horas e 30 minutos, nós teremos que estar na Base Aérea, atrás do Aeroporto Internacional, para viajarmos às 19 horas. Temos que nos lembrar de que os militares, nesta questão, têm uma virtude que os civis não têm, eles cumprem horário. O horário previsto para saída do avião é 19 horas e nós, então, estaremos voando a partir das 19 horas. A expectativa lá no Espírito Santo é muito grande. Nós temos, já, vários movimentos que confirmam presença, como movimentos de menores de rua, o Juizado de Menores, o Tribunal de Justiça manifestou desejo de estar presente, as Varas da Família da área da Grande Vitória, a Associação das Assistentes Sociais, o Movimento dos Idosos e a Associação do Voluntariado, pessoal que trabalha com menor. Então, vamos ter um movimento muito grande lá, e vamos ter um dia exaustivo, porque me parece que a programação que se faz é no sentido de que, chegando ao aeroporto às 9 horas, às 10 horas nós realizaremos uma reunião com a comunidade; às 12 horas iremos para o almoço, às 14 horas, iniciaremos um outro debate, das 14 horas às 17 horas, aí teríamos 3 horas de trabalho. Após, então, para aqueles que quiserem nos dar a honra de permanecer no Estado do Espírito Santo, durante o final de semana, será ótimo para nós, iremos indicar as nossas possibilidades turísticas no nosso Estado. E os que quiserem voltar terão um vôo à disposição a partir das 19 horas. Muito obrigado. E amanhã estaremos aqui para debater a dissolução da sociedade conjugal. Muito obrigado. Está encerrada a reunião. (Levanta-se a reunião às 12 horas e 58 minutos.) ATA DA 8ª REUNIÃO ORDINÁRIA Aos vinte e oito dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às dez horas e quinze minutos, na Sala da Comissão de Municípios – Anexo II do Senado Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, do menor e do idoso, sob a presidência do Senhor Constituinte Nelson Aguiar, com a presença dos seguintes Constituintes: Antônio Salim Curiati, Eraldo Tinoco, Cássio Cunha Lima, Eliel Rodrigues, Ervin Bonkoski, Eunice Michiles, Flávio Palmier da Veiga, lberê ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Ferreira, João de Deus Antunes, Maria Lucia, Rita Camata, Sotero Cunha, Vingt Rosado, Nelson Carneiro. Havendo número regimental, o Senhor Presidente declarou iniciados os trabalhos e solicitou fosse dispensada a leitura da Ata da reunião anterior, que foi considerada aprovada. Prosseguindo, o Senhor Presidente convidou o Senhor Constituinte Nelson Carneiro para fazer uma exposição sobre o tema "Dissolução da Sociedade Conjugal". Concluída a palestra, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para debate. Manifestaram-se sobre o assunto os seguintes membros da Subcomissão: Ervin Bonkoski, Eunice Michiles, Rita Camata, Cássio Cunha Lima, Sotero Cunha, Flávio Palmier da Veiga, Eraldo Tinoco, Eliel Rodrigues, Antonio Salim Curiati e Fausto Rocha, como participante. A seguir, o Senhor Presidente agradeceu a participação do Senhor Constituinte Nelson Carneiro, dando por encerrados os trabalhos às treze horas e vinte minutos, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião a realizar-se dia vinte e nove de abril, às nove horas e trinta minutos, com a seguinte pauta: depoimentos e debates com entidades representativas do segmento social, sobre o tema "Proteção à gestante, à mãe e à família". E, para constar, eu, Antonio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata que, depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. ANEXO À ATA DA 8ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 28 DE ABRIL DE 1987, ÀS 10:15 HORAS, ÍNTEGRA DO APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Havendo número regimental. Declaro abertos os trabalhos da reunião desta Subcomissão. O Sr. Secretário procederá à leitura da ata da reunião anterior. Convidamos a maior autoridade em problemas da família e do menor que temos, hoje, no Parlamento Brasileiro, o Constituinte Nelson Carneiro, para nos orientar sobre o assunto. Concedo a palavra ao nobre Constituinte Nelson Carneiro. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Acho que a matéria que me foi confiada já é do conhecimento de cada um dos presentes. É um assunto sobre o qual, hoje, todos estão convencidos de que a Constituição deve ter no texto um artigo que possibilite a dissolução dos lares que não conseguiram se manter unidos. De modo que é muito simples a minha exposição. Depois de longos anos o Congresso aprovou a Emenda Constitucional nº 9, que possibilitou o divórcio, mas acho que hoje é preciso uma revisão nesse texto. Naquele ano de 1977, as dificuldades eram notórias, e a campanha que se fazia contra o divórcio era imensa, sob a alegação de que a aprovação do divórcio destruiria a família brasileira – 10 anos passados vemos que não destruiu, nem no Brasil nem em nenhum país do mundo. Acho que devemos rever, cautelosamente, o texto de 1977, não para permitir – ao contrario de muitos que defendem essa tese – o divórcio imediato, como sucedâneo do antigo desquite, e hoje da separação legal, porque todos somos latinos-americanos e um ímpeto, uma divergência ocasional pode levar um casal a se separar definitivamente, através do divórcio para construir uma nova família sem um prazo de meditação. O próprio chamado desquite amigável, tem um prazo de dois anos depois do casamento. Exatamente para que o casal se acostume, pessoas vindas de famílias diferentes, de terras, costumes e culturas diferentes, dificilmente se ajustariam em 1 ano ou em 6 meses de convivência. Por isso, a lei permite – sabiamente – que só depois de 2 anos possa o casal se separar ou desquitar por mútuo consentimento. Quanto ao desquite, ou a separação consensual, é remediável, o divórcio não; esse corta todos os laços do casamento. De modo que eu, que tenho sido apontado sempre como um destruidor de famílias, luto pela manutenção de um prazo depois da separação, para permitir um divórcio – ou para permitir um novo divórcio. Quero esclarecer, desde logo, que sou contra aquela estupidez que os antidivorcistas conseguiram incluir na Lei nº 6.515, que só permite o oferecimento de um divórcio. O próprio Código Civil, elaborado pela Câmara, e que está sendo revisto pelo Senado, já não inclui esse dispositivo, que era, realmente, um contrasenso. Mas, acho que devemos manter o divórcio na Constituição, com duas modificações: em vez do prazo de 3 anos, depois da separação legal, esse prazo deve ser diminuído para dois anos. Todos os países do mundo mantém um prazo, seja de um ou dois anos, a não ser as excessões dos Estados Unidos e da França, mas quase todos os países, principalmente os da América-Latina, e nós somos latinoamericanos, todos, mantém um prazo, exatamente dado o nosso temperamento; a diminuição do prazo de 3 para 2 anos seria uma solução razoável. O prazo de 3 anos, realmente é excessivo, mas a extinção do prazo será prejudicial. A emenda Constitucional tinha um parágrafo que permitia que, os que tivessem, àquela data, 5 anos de separação, pudessem promover o divórcio direto, independente, sem a etapa da separação judicial. Isso foi resolvido pela Lei nº 6.515 em que, habilmente, isso foi ampliado, no artigo 40, no qual se dispôs o seguinte: "No caso de separação de fato, com início anterior a 28 de junho de 1977, e nele completados 5 anos, poderá ser promovida a ação de divórcio, na qual se deverão provar o decurso do prazo da separação e a sua causa". Quer dizer, o legislador civil ampliou – o texto Constitucional e, em vez daqueles 5 anos – que era a intenção do constitucionalista – começaram a correr, por terem sido vividos antes de 1977, então a jurisprudência, acolhendo o texto da lei, admitiu que bastava que tivesse sido iniciado antes de 1977. Isso levou a que muitas pessoas, que apenas tinham se casado, ou se separado em 1976, por exemplo, pudessem se valer desse 72 dispositivo. Esse dispositivo tem sido objeto de muitas fraudes, porque é muito fácil, com a prova testemunhal, alguém que está separado em 1978, 1979 fazer uma prova desde que marido e mulher estejam de acordo, de que essa separação antecedeu a 1977. Por isso, numa emenda que ofereci, sugiro que se inclua, já como texto constitucional, a segunda hipótese: a de que a pessoa separada, de fato por 5 anos contínuos, possa propor ação de divórcio. Levando em conta de que um casal que está realmente separado há 5 anos, evidentemente decidiu não reconstituir a sua vida conjugal. É um prazo largo para que marido e mulher julguem da conveniência do restabelecimento, ou não, da sociedade conjugal. Nesse problema da família, o que é importante é referir duas emendas, que figuravam na proposta de emenda Constitucional, oferecida pelo Presidente Figueiredo, e por ele retirada. A elas ofereci subemendas; assim julgo o que essas duas declarações devem constar do texto constitucional, em vez daquela célebre afirmação de distinção de sexo, raça etc, como dizia o § 1º, do art. 151, da Emenda Figueiredo, que veio, aqui, com a minha redação: "São intangíveis os valores da pessoa humana em seus direitos fundamentais, devendo o Estado respeitar e proteger a família, seu nome, sua imagem e sua privacidade." Os autores portugueses estudam largamente o problema da privacidade, que no Brasil não existe: ninguém é punido por invadir a privacidade do outro. "Todos são iguais perante a lei sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Serão punidos pela lei os preconceitos de raça e de estado civil." O preconceito de estado civil é um preconceito hoje vigente no Brasil. Quem acompanha as ações trabalhistas, ou a vida nas empresas, sabe que o fato da mulher casar já determina a demissão nos bancos. O fato dela estar grávida é outro motivo para a demissão da funcionária ou da trabalhadora. De modo que é preciso ressalvar que a lei vai punir esse preconceito, não só sobre o sexo e a raça, mas também sobre o estado civil, de que é vítima a mulher. Na definição da família, também acho que com pequena subemenda que ofereci, o texto mais oportuno será aquele que reproduzi numa emenda, e que também colhi na proposta de emenda constitucional do Presidente João Figueiredo, que, em vez de dizer que a família é constituída pelo casamento e que é indissolúvel, dizia da seguinte forma: "Os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos. Os pais são obrigados a manter e educar seus filhos, ainda que nascidos fora do casamento. A lei proverá no sentido de que, na falta ou impossibilidade dos pais, os filhos menores – (eu corrigiria para incapazes) – recebam assistência social." Esses dois textos, resumiriam os deveres do Estado para com a família. Agora, falo como quem está relatando o capítulo do direito de família no Código Civil; tenho aqui um trecho que 73 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) lembra o que diz a Constituição Portuguesa no art. 36, nº 4: "Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de qualquer discriminação, e a lei, ou as repartições oficiais, não podem usar designações discriminatórias relativas à filiação." Esse é um artigo que deve figurar, também, na Constituição, com esta ou outra redação, porque, quem fez, como eu, toda a sua carreira no estudo do Direito da Família, sente que uma das grandes pechas é o cidadão ter, na sua Certidão de Nascimento: pai ignorado, é um labéu permanente, um constrangimento permanente. A Lei nº 3.200, já impediu que se dissesse que os filhos eram legítimos ou ilegítimos, na certidão, mas desde que não dê o nome do pai, evidentemente está provada a ilegitimidade. E isso é um labéu que pesa, principalmente, sobre as moças: elas sofrem muito mais quando têm que apresentar a certidão para processar o casamento, e têm que denunciar que pai é ignorado. Na Itália se permite que se dê um nome fictício para o pai da criança que se registra. Houve aqui, há muitos anos, na Câmara dos Deputados, um projeto do hoje Ministro do Supremo Tribunal, Oscar Corrêa, que reproduzia, na Legislação brasileira, o dispositivo da lei italiana, permitindo que aquela mãe solteira ou cujo pai não queria reconhecer o filho, pudesse, reconhecê-lo. Nesse caso, porém, o registro deveria conter uma nota de que seria feito de acordo com a lei número tal, para não impedir que, amanhã, conhecido o pai, o filho propusesse contra ele a necessária ação de investigação de paternidade. Esses dispositivos referentes à filiação, também complementam e integram o texto referente à família. Hoje não há mais, em nenhuma legislação do Mundo, distinção contra os direitos e deveres dos filhos legítimos ou ilegítimos, diz Clóvis Bevilácqua; no Brasil se sustenta isso, e também de que não há necessidade de continuar, a lei civil, distinguindo entre os filhos legítimos, ilegítimos, naturais, adulterinos, incestuosos, espúrio, quando bastará dizer, apenas, filhos nascidos no matrimônio e fora dele. Todas as modernas legislações, como a Suíça, inclui essa distinção. De modo que a minha exposição é breve. Apenas sustentando que se deve manter na Constituição o instituto do divórcio; mas, 10 anos passados, dando uma nova redação, não tão larga quanto defendem os que querem um divórcio fácil, mas não tão rigorosa como fomos obrigados a aprovar no ano de 1977, ano a que se seguiram as eleições de 1978 e quando se esperava que o número de divórcios fossem tantos, que já havia até escritórios especializados para promover essas ações, o que resultou efetivamente num insucesso, porque os escritórios fecharam, os divórcios correram como ocorriam os antigos desquites. Não houve aquela pletora de divórcios e, ainda hoje, o número de divórcios é igual ao número de desquites antigamente. No primeiro momento houve um maior número porque muita gente que estava separada há muitos anos, desquitada há muitos anos e se valeu logo da lei, certamente temeroso de que acontecesse no Brasil o que aconteceu na Argentina, onde a lei do divórcio durou apenas 10 me- ses, porque, com a vitória do golpe de estado, presidido por Aramburo, o texto que permitia o divórcio foi revogado. De modo que, estou mais para responder do que para expor. Meus pontos de vista são conhecidos, as emendas foram enviadas, certamente, a esta Subcomissão e estou à disposição dos colegas, – já que, por acaso, sou também suplente desta Subcomissão – para responder a qualquer pergunta. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Sr. Presidente, peço a palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte Ervin Bonkoski. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Quero aproveitar o vínculo da sua exposição. Cheguei agora, já com algum atraso, mas, V. Ex.ª está falando sobre o divórcio, em termos de manter o que está, ou de dar mais ou menos elasticidade? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Pela Emenda Constitucional em vigor, somente depois de 3 anos da separação judicial, ou do desquite antigo, é que pode ser proposta a ação de divórcio, sugiro que esse prazo seja reduzido a 2 anos, e não a 3. É a primeira modificação que sugiro. Também o parágrafo único, da emenda número 9, permitia que quem estivesse separado, de fato, há 5 anos, propusesse diretamente uma ação de divórcio. Sugiro que isso deixe de ser um texto provisório, uma disposição transitória, para se converter uma disposição permanente. Mesmo que não tenha havido a separação legal, antigamente chamada desquite, que seja permitido a quem seja provadamente separado, de fato, há 5 anos contínuos, sem restabelecimento da sociedade conjugal, requerer a ação de divórcio, atendendo à realidade brasileira, à constatação da prática do divórcio, nesses 10 anos. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Para um novo divórcio dez anos? A lei só permite um divórcio? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não! Um divórcio apenas, não é possível, ninguém apóia esse texto; esse texto foi incluído na Câmara dos Deputados, na Lei do Divórcio, mas, era um texto tão mal redigido; que diz, salvo engano – tenho a lei aqui – art 38: "O pedido de divórcio, em qualquer dos seus casos, somente poderá ser formulado uma vez". Óbvio, o pedido de divórcio é formulado por quem? Pelo autor, ou pela autora? Imaginemos a hipótese de um homem que requer o divórcio; requereu pela primeira vez, formulou o pedido pela primeira vez; ele se divorcia e se casa com uma moça solteira. Amanhã, eles se desentendem, por qualquer motivo e ocorre a seguinte solução: ou ele se separa consensualmente, ou então vem a separação judicial, contenciosa. Indaga-se: e essa mulher, que não formulou nenhum pedido de divórcio e que era solteira, está impedida de pedir o divórcio? Pelos termos da lei, não. A lei diz: "o pedido de divórcio, em qualquer dos seus casos, somente poderá ser formulado uma vez. Ora, quem formula o pedido é quem o apresenta, é quem faz a inicial. Então, essa Senhora que casou, pela primeira vez, fica impedida de pedir o divórcio, amanhã? Não, abre-se-lhe a possibilidade dela casar outra vez. Mas se, amanhã, ela casar outra vez fica impedida de pedir o divórcio, ainda que seja ré, nunca tenha formulado pedido algum de divórcio. O que tem acontecido? Essa redação é tão ruim que o Senador Jarbas Passarinho, que defendeu esse texto porque já vinha como emenda da Câmara ao Senado, – o projeto teve início no Senado, o Senador Jarbas Passarinho foi ao Presidente Petrônio Portella para ver se conseguia, dada a crítica que eu fazia da tribuna, se podia redigir de outra forma esse artigo, porque como está escrito, só quem formulou o pedido é que não pode formular o segundo. Então, o Senador Petrônio Portella – isso está nos Anais – declarou que, ou aceitava como estava aqui, porque tinha vindo da Câmara assim, ou então se rejeitava a emenda. E esse texto foi incluído como veio da Câmara e, como veio da Câmara, não impede que a mulher, na hipótese que eu criei, requeira o divórcio. Mas, como ficará? Ela requer pela primeira vez, pode casar, e ele? Ele fica separado legalmente e não pode casar o que é um contra-senso num País onde se admite o divórcio. Para constituir outra família ele tem que voltar ao concubinato, quando melhor fora que ele tivesse a possibilidade de constituir um segundo casamento legal, uma segunda união legal. Mas, o que sustento, é que, apesar de acusado de tanta liberalidade em minhas leis, acho que não se deve fazer o divórcio imediato, tem-se que dar um tempo para a meditação. Se para o desquite amigável hoje, separação por mútuo consentimento, se exige dois anos do casamento, por que para a dissolução definitiva da sociedade conjugal não se exigir, também os mesmos dois anos? Acho que o prazo de 3 anos é excessivo, melhor será reduzi-lo apenas para 2 anos. Essa é a tese que sustento, no que diz respeito ao divórcio em si. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Então significa que um casal que se desentende, e se separa, através do desquite, depois de 2 anos de casados, passa mais 2 anos separados, para depois então poder pedir o divórcio? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Aí ele só terá que provar – como diz a lei – o decurso desse prazo e o cumprimento dos deveres assumidos na separação judicial, antigamente chamada desquite. Só isso. A mulher não pode se opor nem o homem, desde que decorridos os 2 anos e os compromissos assumidos no desquite ou na separação consensual, foram mantidos, estão sendo cumpridos e não há outro motivo de oposição. A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Gostaria de fazer uma pergunta a V. Exª, que há muitos anos estuda a matéria. Se esse prazo diminuído, e essa facilidade de se divorciar, uma duas, três, quatro vezes, se a nossa sociedade está preparada para essas leis para essas medidas? Porque isso me preocupa muito, vemos pessoas muito jovens, sem conhecer ou saber da vida de casado, que não é muito fácil essa convivência, sem ter esse preparo, esse início, essas coisas todas, parece-me que, a partir do momento em que a pessoa não tem mais razão para viver com outra, ela. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) tem que ter direito de escolha, mas, o que me preocupa é essa juventude, porque eles dizem: vou casar se não der certo amanhã me separo. A lei garante isso. Então, não sei se nós estamos preparados para essa legislação que queremos escrever. Faço essa pergunta para que V. Exª possa nos esclarecer. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Por isso mesmo que crio esses problemas, essas dificuldades. Quando alguém casa, muitas vezes, e casa imaturamente, Ievado por uma paixão ocasional, ou até por outros motivos, tem um período de convivência: se há um motivo que determine a separação judicial, se ele pode acusar a mulher ou vice-versa de haver quebrado os compromissos com o casamento, ai não precisa esperar os 2 anos. Pode ele se desquitar judicialmente, contenciosamente, dez dias depois do casamento, ou ela também a regra é que os jovens casais esperam sempre o transcurso de 2 anos para fazer o chamado desquite amigável. Ora, esses 2 anos já são 2 anos da vida, que transcorre, mas, nem aí ele pode propor a ação de divórcio, ele terá que esperar, pela lei atual, 3 anos. A minha proposta é pra que esse prazo seja reduzido para 2 anos. Então, só de 4 em 4 anos ele teria essa oportunidade, sem contar o tempo que demoram as ações respectivas. Se nós impedirmos o segundo casamento, estaremos empurrando esses jovens para o concubinato. Ao invés de casar pela segunda ou terceira vez, eles vão para o concubinato e, este, leva ao filho ilegítimo e à sanção que sofre o filho ilegítimo, ainda hoje, na sociedade, felizmente esmaecida, é muito grave. De modo que acho que não há possibilidade de se fixar apenas em um divórcio porque há motivos, muitas vezes, que justificam um segundo divórcio. Vejamos a hipótese de alguém que se divorciou, e casa uma segunda vez; vamos colocar a questão, sempre culpando os homens, em homenagem às mulheres... A SRA. CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Para não errar! O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – É, para não errar! ...Uma Sr.ª que se divorciou, e casou pela segunda vez, entra em casa e encontra o seu marido, no leito nupcial, com outra mulher. O que não é incomum, ou ao menos não é excepcional, pois acontece, às vezes, até com pessoas do seu próprio círculo. Ao chegar, então, o que faz? Proporá a mulher, contra o seu marido, a necessária ação de separação judicial. Mas, no caso ela e o cônjuge inocente não têm culpa nenhuma da atitude do marido, e não poderá casar mais e ela, mais do que o homem, sofrerá as consequências de viver ilegalmente, no concubinato. Porque ao homem se permite quase tudo. Hoje ainda não se permite esse quase tudo às mulheres. Há muitos anos, num hotel da Áustria, em Viena eu com um casal brasileiro nos hospedávamos no mesmo hotel, era eu, ao tempo, viúvo, de modo que estava só, e chegamos com os nossos passaportes, porque a primeira coisa que se faz é entregar o passaporte; quando o porteiro viu que o passaporte era do Brasil disse ao meu amigo: Não! O Sr. não precisa não! Basta o Senhor declarar que está acompanhado de sua esposa – não quis o passaporte da mulher. E nós estranhamos aquela atitude, quando ele explicou: – isso foi antes da lei do divórcio – geralmente os brasileiros chegam aqui não com as suas esposas, mas com outras companheiras. Então nós, quando damos um mesmo apartamento a duas pessoas que não são casadas, estamos colaborando para o lenocínio e somos punidos pela lei austríaca. É melhor que o homem assuma a responsabilidade, nós não queremos conhecer o passaporte da mulher. Se levarmos em conta essa realidade de que quem casa a segunda vez pode também ser obrigado a pedir o divórcio, não por ato seu mas, evidentemente por ato do cônjuge, estamos atirando para uma separação dos dois, sem nenhuma forma legal, e cada um vai fazer o seu lar ilegítimo, ou então damos uma solução legal, e essa solução legal é a mais apropriada, porque Virgílio Sá Pereira já dizia, e vale sempre repetir a lição do mestre: "Uma família existirá sempre, legítima se possível, ilegítima se necessária". O exemplo vem do paraíso quando o homem não quis viver só, por isso pediu a Deus que lhe desse, – e graças a Deus, Deus o atendeu – a companhia da mulher. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Há muitos anos V. Ex.ª vem defendendo o divórcio, nos primeiros estudos, nos primeiros levantamentos, V. Ex.ª se baseou, sociologicamente, em que? Porque hoje entendemos que o divórcio é fruto de uma má separação para o matrimônio. A época, V. Ex.ª fez estudos nesse sentido? Porque se facilitar o divórcio, como dizia o nobre Constituinte, vamos ter um casadescasa como ocorre nos Estados Unidos, e não vamos jamais alcançar uma consciência de preparação dos jovens para o casamento. Dias atrás assistimos a um programa de televisão em que apareceram jovens, filhos de artista de televisão também, com 18, 20, 22 anos, com um dois filhos, e separados. Ali ficou evidente que é o meio-ambiente familiar ou artístico, mas houve uma precipitação, uma falta de preparo para o matrimônio. Então, se formos facilitar, V. Ex.ª está fazendo a sua proposta inclusive de diminuição de prazo, nós não vamos incentivar cada vez mais o despreparo para o matrimônio? Entendo isso hoje, sociologicamente, religiosamente, em todos os aspectos da comunidade, por isso tenho muito receio. Gostaria de ouvir a sua opinião. O SR. CONSTITUNTE NELSON CARNEIRO: – Primeiro não sei se o programa era norte-americano! O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Não, um programa nacional. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não, digo a exibição desses jovens... O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Não, filhos de artistas brasileiros. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Certamente não se valerá da lei do divórcio, porque foram exatamente as uniões chamadas casamento, todos os dias se lê nos jornais: a artista 74 tal está casada com o fulano de tal, mas nunca foram ao cartório fazer o casamento, porque se eles tivessem cumprido a lei, não seria possível fazer divórcios um atrás do outro. Porque a lei exige, primeiro, a separação legal. O desquite que, em regra, ocorre no Brasil, depois de dois anos, com o desquite amigável, é a forma mais comum e, depois de concluído esse processo, a atual Legislação exige mais três anos para que ele possa constituir uma família legal, possa se divorciar, para então se casar novamente. Ora, um jovem que tenha iniciado a sua vida matrimonial aos 18 anos e tenha cumprido esses prazos, só aos 23 anos ele estará livre para casar a segunda vez. Nesses 5 anos ele pode ter vários filhos de várias mulheres, mas não filhos havidos do casamento ou por causa do casamento. Quando comecei essa campanha, que se iniciou com o amparo à companheira, em 47, o reconhecimento dos filhos adulterinos pela lei de 49, não havia no Brasil senão um curso de noivos feito pela Igreja. Foi uma crítica severa que fiz, em sucessivos discursos, que fez multiplicar o número de cursos de noivos no Brasil, porque só então as igrejas, em geral, sentiram a necessidade de multiplicar esses cursos de preparação para o casamento. Mas, o legislador civil não pode criar, na Constituição, um curso de preparação de noivos; a lei ordinária é que pode criar esses cursos, mas a lei constitucional tem que ser muito sucinta, tem que ter apenas as regras gerais. Aqui é inteiramente diferente do que ocorre nos Estados Unidos, por isso é que temos um prazo, de 2 anos e 3 anos. De modo que 5 anos, no mínimo, terá que viver um casamento para que seja possível constatar a sua impossibilidade de permanência e se dissolver. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Constituinte, não se pode, de forma alguma, empanar a realidade; a sociedade muda como muda a História e nós não podemos sob qualquer pretexto, principalmente na ótica de legislador, empanar a realidade da separação, mais especificamente talvez dos jovens, – sou jovem, casado, tenho, graças a Deus, um matrimônio estável – mas conheço outros jovens, e não apenas jovens para não colocar sempre a responsabilidade dos fracassos na juventude – que não conseguem êxito no seu matrimônio. Quero louvar a preocupação de V. Ex.ª de, como legislador, encarar de frente o problema e tentar, através do amparo legal, conseguir regulamentar situações que existem de fato, e que, infelizmente, no meu ponto de vista, não desaparecerão, por mais esforço que se faça, porque há uma mutação da sociedade, há uma mutação do conceito de família e precisamos encarar de frente esse problema. Não podemos continuar fazendo do nosso País um país de faz de conta, não incluindo nas leis ou na legislação mais ampla os fatos e acontecimentos que assistimos diariamente, e a garantia do divórcio, a meu ver, é uma forma de proteger a família, proteger, evitando desgaste maior entre marido e mulher, desgaste que sempre é refletido, em maior escala, nos filhos; para que a lei possa proteger, de qualquer forma, de qualquer maneira, o que resta de um matrimônio, principalmente no tocante a saúde espiritual dos filhos 75 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) que, como disse, são sempre os mais penalizados. Louvando a sua posição, quero fazer uma pergunta:. a atual Legislação, na redação que V Ex.ª há pouco leu, permite que o indivíduo promova apenas uma ação de divórcio. Vo citar um exemplo: estou casado hoje, me separo, cumpro os prazos legais; volto a me casar, fiz o meu primeiro pedido de divórcio, estarei impedido, pela lei, de fazer um outro pedido de divórcio? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sr. Constituinte antes da resposta de V. Ex.ª quero aproveitar a observação feita pelo colega Cássio Cunha Lima, com respeito à sociedade, de fato, a que ele se referiu. A atual Constituição, no art. 175, define que a família é constituída pelo casamento e terá direito a proteção dos poderes públicos. A formulação que V. Ex.ª apresentou aqui, os valores da família, quer dizer, não se definir como se define no art. 175, mas se dar a forma como V. Ex.ª propõe: os valores da família serão salva-guardados pelo Estado, como ficaria a questão da sociedade, de fato? Temos, por exemplo, a Carta das Mulheres que contém uma proposta no sentido que se defina a família, mais ou menos, como a família constituída pelo casamento e pelas uniões de fato, completando a própria proposta do Constituinte Afonso Arinos, que também regulamenta a união estável. Como ficaria o casamento, em face das uniões, de fato, reconhecidos pela Constituição Federal? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Exatamente para fugir a esse aspecto, atendendo à realidade brasileira de hoje, não só brasileira, mas em todos os quadrantes do Mundo, a família sofre uma evolução e o constituinte brasileiro há de pensar num termo que perdure através de algumas décadas, no mínimo atravesse o século. Não podemos continuar afirmando que a família é constituída pelo casamento. A família é constituída pela união de um homem e uma mulher com o propósito de perpetuidade temporária, durante a vida, evidentemente com essa intenção mas, que nem sempre se concretiza por motivos supervenientes. Mas, em regra, quem casa tem sempre a preocupação de tornar permanente a sua união. Os fatos supervenientes são imprevisíveis. Por isso acho que a redação exclui essa distinção que a Carta das Mulheres sugere entre família constituída pelo casamento e uniões livres. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não Ex.ª A Carta das Mulheres diz que a família é constituída por uniões de fato e de direito, não define a família. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Quero ressaltar que a redação não é minha, fiz apenas uma pequena subemenda, quando oferecida ao exame do Congresso Nacional é um texto da antiga emenda proposta pelo ex-Presidente João Figueiredo, emenda constitucional que foi retirada antes da votação. Os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos Poderes Públicos. Os pais são obrigados a manter e educar seus filhos, ainda que nascidos fora do casamento. A lei proverá no sentido de que, na falta ou impossibilidade dos pais, os filhos incapazes recebam assistência. Os valores da família, a definição da família deve vir no Código Civil e não na Constituição. A família que não é constituída pelo casamento também é família, desde que haja homem e mulher vivendo juntos, como se fossem casados. Hoje todas as leis amparam as uniões livres que perduram durante muitos anos. De modo que, união de fato e de direito, chamo a atenção para essa dicotomia que acho que não deva existir. Os valores da família incluem, portanto, amplitude, não diz que obrigatoriamente a família é constituída pelo casamento, evidentemente que uma das formas mais eficientes de se constituir família é com o casamento mas, isso é no Código Civil, onde os filhos nascidos no casamento são filhos legítimos e os nascidos fora do casamento são ilegítimos. A mulher e o homem têm presumidamente deveres recíprocos no casamento, inclusive esse casamento tem uma fórmula de dissolução dentro do Código Civil, e as uniões livres, exatamente por serem livres, se dissolvem como se constituem. De modo que acho que, ao invés de dizer: união de fato e de direito, melhor seria dizer: os valores da família, porque aí se incluem todos esses valores sem distinguir, sem ferir aqueles que não se casaram e vivem como se fossem casados. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Só uma observação. Temos pesquisado muito e recebido muitas propostas, inclusive algumas que mantém o conceito do art. 175. Veja bem, a partir do instante em que a lei reconhecer e amparar a existência da família constituída de fato, para que se ter o trabalho de casar? Se eu posso constituir uma família de fato, protegida pela lei, com, todas as garantias para a mulher, para o homem e filhos, para que se dar ao trabalho de casar? V. Ex.ª não acha que desta forma estaríamos criando uma coisa muito mais ampla do que o divórcio? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Aqui não se diz que a família é constituída pelo casamento, ou não, diz que os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos. Não se distingue se é a família legítima ou ilegítima. Porque o dever do Estado é amparar todas as famílias e não apenas aquelas constituídas pelo casamento. Quem dá direitos diversos à união livre ou à união legítima é o Código Civil; a Constituição apenas tem a regra geral. É que os valores da família, qualquer que seja a fama, ou será que a família que não é constituída legalmente não merece a proteção do Estado? Essa também merece, porque tem filhos que merecem a proteção do Estado, porque são filhos e são brasileiros, prestam serviço militar como os filhos legítimos; contribuem com os impostos como os filhos legítimos. Também os lares constituídos ilegalmente, livremente, muitas vezes são mais duradouros do que aqueles constituídos legalmente. Por que então distinguirmos e ferirmos apenas um aspecto, denunciando a união de fato ou de direito? Não, vamos querer que todas sejam de direito, mas aquelas que.não puderem ser de direito, e me perdoem meus colegas masculinos, pois geralmente as uniões livres não se legitimam por culpa e egoísmo dos homens, que, tendo conquistado a mulher, não se interessam, muitos deles, pela regularização dos lares. Evidentemente a minha experiência de cinqüenta e tantos anos de advogado de família me dá autoridade para dizer isso. Quem não se interessa pela regulamentação da família da união livre é, em regra, o homem, porque a mulher que já vive com um homem, há muitos anos, só sonha casar, e muitas vezes são dois solteiros ou um viúvo e um solteiro mas, quem não quer é o homem. Lembro-me da minha juventude; havia um homem rico, que durante os 4 dias da festa do Senhor do Bonfim abria sua casa, dia e noite para a festa, ele não tinha filhos; naquele tempo eu era rapaz, com 18 anos, e estudante de Direito. Íamos lá, a festa começava no sábado e só acabava na terça-feira. Um dia a senhora com quem ele vivia, há muitos anos, chamoume e já antecipando o Dr. disse: "Dr. o Senhor quer me fazer o favor de pedir ao fulano que case comigo? Mas, minha senhora, a senhora não é casada com ele? Ela disse: não. Já vivo com ele há 30 anos. Mas, por que ele não casa? Então, fui a ele, já tinha uma certa ascendência intelectual sobre ele, e procurei convencê-lo. Ele disse: "Dr. eu caso mas só na hora de morrer. Mulher é boa até a hora de casar, depois acabou. (Risos.) Essa é uma mentalidade generalizada. Muitas pessoas não casam, mas a mulher quer sempre casar; quem não quer é o homem, o egoísmo masculino é que impede, ele acha que perde a liberdade. Enquanto ele não casa a mulher é muito boa, no dia que casa a mulher passa a ter direitos. Então, acho que os valores da família atendem a tudo isso. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Esse assunto é muito importante e temos que trabalhar sobre ele, temos que encaminhar uma proposta para nossa Comissão temática e como temos um especialista aqui não vamos soltá-lo sem que deixe essa questão bem a limpo. Tenho aqui várias Constituições, por exemplo a da Itália que diz. "A República reconhece os direitos da família como sociedade natural, fundada no matrimônio. O matrimônio é baseado na igualdade moral e jurídica dos cônjuges, com os limites determinados pela lei para a garantia da unidade familiar." A Constituição da China tem uma coisa interessante sobre as mulheres – essas gozam dos mesmos direitos dos homens em todas as esferas da vida política, econômica, cultural, social e familiar. O art 49 da Constituição da China diz: "O casamento, a família, a mãe e a criança são protegidos pelo Estado." Tanto o marido como a mulher tem o dever de praticar o planejamento familiar." Lá tem que ser, porque já tem gente demais. A Constituição de Cuba: "O Estado protege a família, a maternidade e o matrimônio. O matrimônio é a união voluntariamente consertada de um homem e de uma mulher, com aptidão legal para isso, a fim de fazer vida em comum, repousa na igualdade absoluta de direitos e deveres dos cônjuges, os quais devem atender à manutenção do lar e á formação integral dos filhos, mediante esforços comuns de modo que es- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) se resulte compatível com o desenvolvimento das atividades sociais de ambos." Esta inclusive muito mal redigido para o nosso gosto. A Constituição da União Soviética diz: "A família goza da proteção do Estado. O casamento baseia-se no acordo voluntário entre a mulher e o homem. Os cônjuges são absolutamente iguais em direitos, em suas relações familiares." Aliás uma constituição sintética de apenas 174 artigos. O Estado protege a família através da criação e desenvolvimento de uma ampla rede de instituições maternoinfantis, da organização e aperfeiçoamento do serviço comunitário e da alimentação pública, através de concessões de subsídios de nascimento, e benefícios às famílias numerosas, bem como outros tipos de subsídios e de formas de auxílio às famílias. Por último temos a Constituição de Portugal, à qual V. Ex.ª se referiu: "A família, como elemento fundamental da sociedade tem direito à proteção da sociedade e do Estado e à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal de seus membros. Sou conservador, neste aspecto, inclusive na proposta que estamos encaminhando, que é uma peça bruta tirada da floresta, nós não tivemos preocupações com os aspectos de forma, porque quisemos colocar, na nossa proposta, o máximo de idéias e, para efeito de discussão, formulamos da seguinte forma: "A família é constituída pelo casamento e por uniões estáveis". Abaixo colocamos: "Ao Estado incumbe garantir total proteção ao casamento". Isso seria proteção ao casamento como instituição? Cabe a quem queira casar já que estamos reconhecendo a sociedade de fato. Essa questão para mim é complexa porque a sociedade de fato existe. Não quero abrir mão do casamento, mas também não se pode impedir hoje, à luz da lei – como dizia nosso colega Cássio Cunha Lima – que os casais se juntem; eles estão se juntando, e com que facilidade. Em função da proteção do direito ao filho, temos que reconhecer a existência daquela família. Tenho aqui alguma coisa parecida com o que V. Ex.ª colocou ali: "os filhos, nascidos ou não da relação do casamento, terão iguais direitos e qualificações. Minha preocupação é em manter o instituto do casamento e que o Estado o proteja também. Nessa questão do divórcio, que está dissolvendo essa família constituída pelo casamento, concordo com V. Ex.ª não desejo que ele seja tão liberal. A sua emenda à Constituição disse: "o casamento somente poderá ser dissolvido nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de 3 anos". O senhor está propondo agora que seja por mais de 2 anos. A redação ficaria, então, assim: "o casamento somente poderá ser dissolvido nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de 2 anos". Minha preocupação é com a criança – já não estou preocupado com a mulher ou o homem. A situação da criança brasileira que resulta das chamadas uniões de fato é deplorável. Gostaria que V. Ex.ª nos ajudasse a encontrar uma forma de salvaguardar o direito da criança, que simplesmente é deixada sem que se saiba quem é o pai ou a mãe é mandada para uma instituição, sem direito ao registro. Temos de encontrar uma forma de dar um nome completo a essa criança. Ao deixar a FUNABEM, nas diversas instituições, deixei 143 crianças, pelo levantamento que foi feito, registradas apenas como José, Antônio ou Paulo, por ordem do juiz. Fazia-se uma ficha, em que constava: "pais desconhecidos". Temos de encontrar uma forma de salvaguardar o direito dessa criança. Talvez em função dessa necessidade de termos, no Brasil, qualquer coisa em torno de 6 milhões de menores sem registro, ou seja, de menores que existem de fato, mas não de direito, deve por isso o Estado reconhecer, a partir da Constituição, a sociedade de fato. Isso não está claro para mim. Quando digo que temos que segurar nosso Constituinte Nelson Carneiro aqui, a fim de que S. Ex.ª nos deixe o máximo de luzes sobre essa questão, já que temos que encaminhar um texto sobre este assunto, estamos colocando essas indagações e revelando as nossas confusões a respeito desse emaranhado de conceitos, que, no final das contas, representa a matéria que tem extraordinária implicação na vida das pessoas, especialmente das crianças. Obrigado. A SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Como essas crianças apareceram na FUNABEM, sem pais, sem nome. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – De variadas formas: ou deixadas num caixote de lixo ou simplesmente largadas na porta da FUNABEM com um telefonema anônimo, dizendo: "Estamos deixando uma criança aí". O SRA. CONSTITUINTE MARIA LÚCIA: – Que dizer que elas não vinham indicadas? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – São crianças apanhadas nas áreas de prostituição, por ordem judicial, e encaminhadas à FUNABEM, sem se saber quem é o pai ou a mãe. Essas crianças não foram adotadas porque ninguém as quis acolher para efeito de adoção, quando elas ganhariam o nome da família. O que um juiz pode fazer com uma criança que não tem pai nem mãe? Ela tem que ter uma fichinha; temos de ter um registro dessa criança. Como ela não tem um nome de família para ter um registro completo, está sendo registrada como Paulo, Pedro, João, Tiago, sem o nome dos pais. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Presidente, sua preocupação relativamente à proteção ao casamento é uma preocupação válida, sem dúvida. A bem da verdade, não só em relação ao casamento, mas qualquer outro tipo de proteção que cai no abstrato, e a proteção à família, a meu ver, é abstrata, porque precisaríamos de uma política social ampla que realmente garantisse essa proteção, porque não adianta consagrar, na Constituição, que o Estado irá proteger a família, quando o Estado, por exemplo, não oferece educação gratuita em todos os níveis; quando o sistema de saúde não é adequado à estrutura social. São proteções de cunho 76 eminentemente legal, que levam, inclusive, a uma descrença por parte da população no valor de uma Constituição nova. Se repetirmos os erros cometidos, há bem pouco tempo, de consagrar direitos na Constituição, e, na vida prática, estes direitos não forem respeitados, estaremos, mais uma vez. contribuindo para a descrença e para o nãofortalecimento da organização social do nosso povo. Precisamos, sim, garantir a proteção à família na forma legal e também na prática, através de uma mudança estrutural na sociedade, para que a proteção não seja apenas hipotética, como será para a família, a criança ou o idoso. Precisamos trazer à realidade uma política que realmente proteja a família, a criança, o idoso, enfim, todos os segmentos sociais. Gostaria de voltar a uma pergunta, em cuja resposta o Constituinte não abordou a possibilidade de um autor promover uma nova ação de divórcio. Para deixar bastante claro, se, na atual legislação, após haver promovido uma ação de divórcio, é permitido voltar-se a promover, como autor, uma nova ação de divórcio. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Pela lei atual, não poderia promover, como autor, duas ações de divórcio, mas poderia ser parte em duas ações de divórcio. Na hipótese – não quero colocá-la na pessoa de V. Ex.ª – de Manoel da Silva haver casado uma vez e ter sido infeliz neste casamento. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – E caso ele case, pela segunda vez, com uma divorciada também, os dois divorciados, ela tendo promovido a ação e ele também? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Aí os dois promoveram a ação. Pelo texto da lei, nenhum dos dois poderia promover o segundo divórcio, ainda que um tivesse tentado matar o outro. Ele teria, apenas, que se separar legalmente e não poderia se casar nunca mais. Digamos que o homem tentou matar a mulher e os dois eram divorciados. Ela vai ao juízo e consegue a separação judicial por tentativa de morte. Apesar disso, ela, que é o cônjuge inocente, que não tentou matar ninguém, não pode casar nunca mais. Ele não casa, como punição. Mas ela também é punida, pois não poderá mais casar, por já ter casado uma vez. Quero responder ao nosso ilustre Presidente, que traz a sua contribuição valiosa de brilhante Presidente da FUNABEM no Rio de Janeiro. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Fui o maior menor abandonado deste País. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO – Como ele próprio leu, as Constituições falam em proteção à família e, depois no matrimônio. É exatamente aquela mesma distorção que o grupo de senhoras quer fazer: as uniões legitimas e as uniões livres. A Constituição não pode fazer essa distinção, porque ela própria está punindo os que nasceram dessas uniões livres, já que vai proteger, para que distinguir? Se vai proteger tanto as uniões livres como as legítimas, constituídas pelo casamento, por que separar uma da outra? A proposta diz: "...pelo casamento e pelas uniões livres". Quer dizer, a própria legislação atribui ao casamento, 77 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) depois, outros direitos e deveres que são da Lei Civil. O que se deve dizer é que o Poder Público, na Constituição, protege a família, e não dizer que protege a família legítima e a ilegítima, porque aí a própria Constituição estará discriminando. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª me desculpe, vou insistir nesse ponto, porque estou sempre pensando na criança. O homem e a mulher estão sempre pensando neles dois e esquecendo os filhos. Essa é uma tragédia nacional. Constituinte Cássio Cunha Lima, chamo a atenção para isso. Se temos 6 milhões de menores que não têm registro, essas crianças não podem sequer serem matriculadas numa escola. Talvez o pai e a mãe já tenham se casado de novo, se arrumaram por lá e o filho ficou nessa situação degradante. A questão da família, da união dos pais, tem uma grave implicação em função, por exemplo, do pátrio poder, que é um instituto que resulta do casamento. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não resulta só do casamento, pois mesmo não sendo casado o pai exerce o pátrio poder e, hoje, homem e mulher exercem o pátrio poder. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estou pensando na criança. Dentro do contexto de família, ela tem direito, no Direito Brasileiro, em função do direito da família, tanto é que o chamado menor abandonado, que está fora o vínculo familiar, menor que não se sabe onde se acha o pai ou a mãe, ou menor em estado de orfandade, a sua expectativa de direitos agora vai depender de um ato do Juiz de Menores. Ele não tem direito, enquanto indivíduo, enquanto pessoa, porque esse direito está na dependência do direito da sua família, se ele não tem família não tem direito. Essa questão é complexa devido ao fato das implicações que ela tem na vida da criança e acho que a criança é um membro da família. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – O texto que sugiro responde a isso. Diz: "Os valores da família – e aí não distingue se e família é legítima ou ilegítima – serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos." É a mesma coisa que se diz aí. "De que a família legítima ou ilegítima..." A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Se a Constituição diz que existe a família em função do casamento, aí, não estariam fora as uniões, que, embora estáveis, não são legais? Diz o seguinte: "A família é constituída pelo casamento". Mas, e os valores da família, isso também não é um pouco ambíguo? O que são valores da família? O que é família? A família é só aquela constituída pelo casamento? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não. Exatamente porque não faz esta distinção é que inclui todas as famílias. A SRA CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mas a Constituição não diz que só é família aquela constituída pelo casamento. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não, este é o art. 173 e essa é uma substituição desse artigo. O texto continua, para responder ao Presidente: "Os pais – não diz se são legítimos ou ilegítimos – são obrigados a manter e educar seus filhos, ainda os nascidos fora do casamento". Quer dizer, aceita, portanto, que a família se constitua pelo casamento, mas obriga a todos os pais, sejam eles pais de filhos legítimos ou ilegítimos, a responder pela educação dos filhos e completa, como faz hoje a legislação francesa, dizendo: A lei prover. "A lei proverá, no sentido de que, na falta ou impossibilidade dos pais, os filhos incapazes recebam assistência social." Portanto, aí estão todos os elementos que são distribuídos pelas legislações diversas. Mas, quero dizer, agora, aqui está o homem que está estudando o Código Civil, lerei um trecho de um parecer sobre uma emenda, em que abordo esses problemas da investigação da maternidade e da paternidade, dos filhos que são encontrados nas portas das instituições. Em erudita monografia de Pedro Mauro Cabral, "Pesquisa e Evolução do Direito da Família e Matéria de Filiação em várias Legislações Modernas estuda, inicialmente, as legislações russa, polonesa, tchecas, chinesa e cubana, para assinalar que, nas quatro últimas, os filhos nascidos fora do casamento têm o mesmo direito dos nascidos do casamento. Refere-se a seguir, o mestre baiano, à legislação vigente na Escandinávia, para destacar como grande novidade na dinamarquesa a perquirição da paternidade dos filhos nascidos fora do casamento, que possa a ser direta preocupação do Estado. E informa: "Já antes do nascimento da criança, a mãe tem o direito de solicitar que uma ação seja intentada contra o homem que ela designa como sendo o pai de seu filho. Mas não só o médico ou a parteira, que assiste no nascimento da criança, nascida fora do matrimônio, deverão, dentro de 15 dias, fazer um relatório a respeito ao Instituto de Assistência Maternal. Reunidos todos os elementos possíveis a mãe é convocada e, dentro de um mês, deverá indicar quem é ou pode ser o pai da criança. O caso, então, é entregue ao comissariado de polícia, que convoca o indigitado pai. Se esse assume a paternidade o assunto se encerra. Quando não, o caso é entregue à justiça para apreciação em decisão final." Também na Finlândia funciona escritório do bem-estar social, que toma a si as sindicâncias para determinação da paternidade: se não há o reconhecimento, todos os filhos têm a mesma posição. O mesmo na Noruega, na Suécia, desde 1977, e recentemente, no Direito português, a averiguação oficiosa, tanto pode ser da maternidade, arts. 1.608 a 1.813, como da paternidade, assegurado à mãe o direito de intervir como assistente. Em Portugal, no moderno Direito português, a mulher denuncia ao Tribunal da Família quem é o pai da criança. E antes mesmo do nascimento dela já procura assegurar a paternidade, através de uma investigação. Mas isso é no Código Civil, não pode ser, sugiro eu, como Relator do Código Civil. Cito isso como um meio de se perquirir a paternidade ilegítima e, principalmente, a paternidade desses que não têm nem pai nem mãe. A ação é da polícia e da justiça. O Constituinte não pode descer a isso. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sr. Constituinte, o Sr. me desculpe, mas disse que ia ficar chato com esta matéria. Veja bem, V. Ex.ª se referiu à Constituição de Cuba, e nesta eles descem a esses detalhes, não é no Código Civil. Veja bem: "Todos os filhos têm igual direito, sejam havidos dentro ou fora do matrimônio. Está abolida toda a qualificação sobre a natureza da filiação. Não se consignará declaração alguma diferenciando os nascimentos, nem sobre o estado civil dos pais nos registros de inscrição dos filhos, nem em nenhum outro documento que tenha referência à filiação. O Estado garante, mediante processo legal adequado, a determinação e reconhecimento da paternidade." Está na legislação civil de Cuba, mas eles tiveram o cuidado de colocar o princípio dessa coisa toda nas suas Constituições. Estamos diante de dois problemas, se não reconheço na Constituição a união de fato, estou deixando uma brecha para o legislador ordinário não reconhecer, em função da tradição, em função do que tem sido o casamento ao longo da História da Humanidade, e aí vamos deixar a criança outra vez desprotegida. Se eu reconheço – estou mostrando as dificuldades – a sociedade familiar de fato, estou dizendo que o casamento se torna inútil. Para que casar, se na constituição reconheço a família constituída de fato. O casamento vai ser para quem gostar da tradição. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Aí não entra a questão da propriedade, da comunhão de bens, porque numa união que não seja pelo casamento isso deixaria de existir e isso é um atrativo para uma união legal. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estou criando toda essa celeuma mas estou pouco preocupado com o homem ou a mulher, pois minha preocupação é com a criança, com os que têm nascido como produto dessas famílias e que estão sendo jogados ao abandono. Estamos com um compromisso, todos nós, mas eu com um compromisso pessoal de criar um caso nesta Constituinte; na hora dos debates, criar um problema, um caso, fazer aqui uma birra política, com respeito ao direito da criança. Quero ver no texto desta Constituição o princípio do direito da criança garantido, independentemente de ter ela família ou não. De modo que estou criando esse caso todo pensando na criança. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mas, Sr. Presidente, veja bem, quando a legislação fala em famílias constituídas por casamento ou por uniões estáveis, acho que não tem nada a ver com esse menor abandonado, que não é fruto de uma união estável e sim de uma união ao acaso. Acho que essa proteção à família constituída pelo casamento ou as uniões estáveis, para mim não está bem, não tem nada a ver com esse menor abandonado a que o Sr. se referiu. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Tem! Há muitas uniões que são estáveis, o homem vive com a mulher num canto desse país, lá na favela, dois, três, quatro anos e não registra os ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) filhos, por isso eles não podem ser matriculados. Aí entram na estatística dos analfabetos do País. A SRA CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Também isso vem através do casamento. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Presidente, vou insistir – vou ser bastante prático e talvez peque por isso – que não interessa ao senso comum, ao homem médio da sociedade, essa proteção abstrata à família, por parte da Constituição, porque, na realidade, a proteção ou o privilégio que se queira dar a um casamento, não garante, de forma alguma, uma vida tranqüila para o pai, mãe e filho. É apenas um preceito legal, hipotético, que, na verdade, não se exerce na prática – através do artigo tal da Constituição não se pode ter garantido o direito à educação do seu filho, pelo menos em termos atuais, nem à estabilidade do casal, nem tampouco à saúde, o pleno emprego, enfim, as lutas, que são as lutas do povo brasileiro. Então, essa proteção legal, hipotética – volto a dizer – pouco vai interessar à sociedade brasileira, pode ter certeza disso, porque esse amparo, o que é importante é regulamentar e reconhecer a existência do casamento ou da união de fato. E volto a concordar com o Constituinte Nelson Carneiro quando S. Ex.ª não trata da definição de família na atual Constituição, definição de família pelo casamento, apenas garante os valores da família. Perdoe-me o nobre Constituinte, mas não é essa proteção abstrata não. Veja a questão, por exemplo, do chamado filho ilegítimo – vamos usar essa expressão; o cidadão arranja um filho com outra mulher, que não do casamento dele; o nome desse indivíduo é Paulo Alves de Aguiar, por exemplo; ele não tem nenhuma obrigação, vamos dizer, de colocar esse "de Aguiar" lá na frente, do nome da criança e isto cria problema para a criança. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Esse fato concreto vai ser resolvido com a proposta do Constituinte Nelson Carneiro. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Nobre Constituinte, se garante isso na lei se estará protegendo essa criança, do ponto de vista legal. Aí essa proteção não é abstrata, como V. Ex.ª está dizendo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª pegou o único exemplo de proteção concreta, mostre-me outra proteção à vida digna da família que eu possa aceitar. Esse exemplo específico que V. Ex.ª cita é resolvido pela proposta do Constituinte Nelson Carneiro, que reconhece a existência da família não a definindo apenas pelo casamento, e garante, logicamente, os direitos do filho ilegítimo. Essa questão é concreta, mas todas as outras que possam vir a se concluir, no tocante aos direitos dos valores da família, são abstratas, na maioria. É isso que estamos assistindo durante todo o tempo. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Queria reler o texto, porque é importante responder a esse problema dos filhos, que também me preocupa, e também das uniões estáveis, porque quem defendeu a vida inteira as uniões estáveis, neste País, fui eu. Em 1947, ao impressar na Câmara dos Deputados, apresentei o famoso Projeto nº 122, que diria apenas o seguinte: para os efeitos de pensão, aposentadoria, alimentos e outros, equipara-se à esposa a companheira de mais de cinco anos. Foi um Deus nos acuda, deste País. Portanto, preocupo-me muito com as uniões estáveis. Outra iniciativa minha: o homem que vive com uma mulher, há cinco anos pode descontar do Imposto de Renda a parte relativa à sua companheira, como se fosse a sua esposa. A companheira, hoje, pode pedir a continuação da locação, como se fosse a esposa, como se fosse a viúva. A companheira tem direito hoje à pensão e a salário-família do funcionário público, graças a iniciativa minha, depois de muitos anos. De modo que sempre defendi as uniões estáveis, não posso é incluir na Constituição tudo isso, porque senão, ao invés de ser Constituição passa a ser Código Civil. Por isso resumo dizendo o seguinte: os valores das famílias, e são todas as famílias, porque família não é só a que se casou, é toda família, a que casou e a que não casou, desde que seja estável. O SR. CONSTITUINTE SOTERO CUNHA: – O que me preocupa é que esta forma de igualdade entre a família legítima e a não legítima, venha a trazer praticamente a dissolução desta pelo casamento. Na África, por exemplo, o homem tem duas, três, quatro famílias, desde que ele possa manter, é o costume sul-africano. Aqui no Brasil não sei se vamos conseguir isso facilmente, porque a família legítima se souber que o marido tem uma outra família mesmo não sendo legítima, dá uma briga danada. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Nós sabemos. Mesmo que não tenha, basta que ela pense que sim. A redação proposta sobre a família legítima e as uniões livres agrava mais o problema, chama a atenção para uma dicotomia, quando diz: os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos. Isto é uma Constituição, não um Código Civil. Os pais são obrigados a manter e educar seus filhos, ainda os nascidos fora do casamento. É a igualdade dos filhos, nascidos fora do casamento, que a Constituição cubana, que o eminente Presidente acaba de ler, e várias Constituições do mundo, hoje, acentuam. Mas, é possível que os filhos nascidos dentro ou fora do casamento não tenham meios de prover essa subsistência. Então, o texto continua:... "a lei – e não a Constituição – proverá no sentido de que na falta ou impossibilidade dos pais os filhos incapazes recebam assistência social". Portanto aqui tem todas as soluções. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Quem são os filhos incapazes? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – São os menores e os interditos. A Emenda Figueiredo apenas falava em menores. Essa emenda "incapazes" é de minha autoria; naquele tempo uma subemenda, porque incapaz também o interdito, que pode ser maior de idade. Assim, acho que, primeiro, os valores da família não fazem essa dicotomia, que é chocante na Constituição; dizer que a família e as uniões estáveis, tem que definir o que é união estável. Quantos anos se considera uma união estável? Dois anos? Três anos? Quatro anos? Dez anos para ser estável? O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Permite V. Ex.ª? 78 O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Pois não. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Acho que o que está dificultando a nossa definição, o problema dos filhos é mais fácil de se proteger, mas a distinção de direitos da família legítima e não legítima, acho que tem que existir. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Como o nosso companheiro Sotero Cunha tem que sair, vou lembrar a nossa viagem, depois de amanhã, a Vitória, vamos fazer uma reunião com os capixabas, um debate com a sociedade capixaba. Está confirmado o vão, sai daqui às 7 horas da manhã, da Base Aérea, de modo que os Srs. Constituinte que demandarão conosco àquela cidade, Vitória, deverão estar às 6 horas e 30 minutos na Base Aérea. Lembro que os militares não são como nós, eles têm horário, não irão nos esperar. Às 10 horas faremos um debate na Assembléia Legislativa, ao meiodia almoçaremos e às 14 horas iniciaremos outro debate, até às 17 horas, para os que quiserem voltar o vão estará à disposição a partir das 19 horas. O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – Sr. Presidente, para uma questão de ordem. Discutimos aqui a necessidade de uma reunião, debate da Comissão hoje, à tarde, e não sei se V. Ex.ª a convocou. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Ainda não convocamos. Temos vários colegas Constituintes reclamando a falta de espaço para um debate entre os membros da Comissão, e têm razão. Acontece que o calendário das nossas atividades não foi feito por mim, foi estabelecido pela própria Comissão; apenas não estamos cumprindo o calendário. Como não temos podido reunir na parte da tarde, este debate entre os membros da Subcomissão tem estado prejudicado. Por sugestão de vários colegas estamos convocando para as 5 horas, aqui na Comissão, a nossa Assessoria e o pessoal do som, já ficam avisados para que possamos fazer essa reunião e estabelecer o debate que vem sendo reclamado já há muito tempo. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – ...Se pudéssemos encontrar uma forma de dar mais ênfase e proteção à família ilegítima, embora respeitemos essa situação, acho que garantiria o fortalecimento dessa circunstância básica que é o matrimônio legítimo. Como V Ex.ª vê isso? Porque o problema dos filhos, como foi citado, eles podem ser protegidos. Os filhos de casais legítimos ou não serão protegidos pelos seus pais, que ficarão obrigados a zelar pela sua vida, garantindo saúde, educação e total proteção. Qualquer texto pode resolver isso. Agora o que sinto é que há um consenso que está evoluindo nesta Subcomissão... O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Para falar no casamento. O SR. CONSTITUINTE FLAVIO PALMIER DA VEIGA: – Sabemos que a proteção à família tem que ser em qualquer área, mas, valorizando um pouco, através da lei, aqueles que são legítimos. Como fazer isso? Aí que vem a criatividade do legislador. 79 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Todas as Constituições são interpretadas pela Legislação Civil, todas as legislações civis do mundo, hoje, amparam essas uniões ilegítimas. Claro que não tem a presunção legal. O que distingue o casamento da união livre é que a presunção legal, que resulta do casamento, determina uma porção dos direitos e garantias que a mulher, por exemplo, que vive com outro homem não tem. A mulher casada tem direito a alimentos, quando há divergência com o marido e ela não é culpada; a mulher da união instável não tem ainda; a mulher casada herda, com a morte do marido e a mulher que tem uma união instável não; esta tem que propor uma ação ordinária para provar que colaborou. A ação dura 5 ou 6 anos e ela acaba desistindo. As distinções resultam do próprio casamento, mas resultam mais da Lei Civil. A Lei Civil é que tem que privilegiar o casamento como um estímulo à união permanente de homem e mulher ou ao menos presumidamente permanente, mas sobretudo lhe dê o cunho legal. Todas as legislações civis se preocupam em privilegiar o casamento e o Brasil também vai fazer isso, mas ao mesmo tempo a constituição tem que se lembrar de que a família não é só aquela que se constitui pelo casamento mas também aquela que se constitui pela união livre. Por exemplo: num país onde um grande número de casamentos é celebrado através da Igreja, e no interior deste mesmo país, onde vários lares são constituídos somente religiosamente, essas esposas, são esposas. No interior – e todos nós aqui conhecemos o interior – perguntamos: A senhora foi ao cartório? Ela responde: Não: O casamento civil é difícil, custa caro; o casamento religioso é muito mais simples e a fé determina que a pessoa prefira a fórmula mais simples, que é o casamento religioso. Então as estatísticas de que eu me vali no curso desse debate, algumas trazidas pelos saudosos Alcântara Machado e Macedo Soares, mostravam que a percentagem de casais constituídos apenas religiosamente era muito grande no Brasil. Mas essas são famílias como as outras, só não têm os mesmos direitos, são famílias estáveis. De modo que acho que não precisa haver distinção – entre família legítima e uniões estáveis, porque estamos – em vez de amparar a família – sintomatizando. Não há necessidade disso. A família é uma só, haja ou não haja casamento. Esta é a união de homem e mulher vivendo juntos, criando os filhos, sofrendo juntos, alegrando-se juntos, isso é que é família. Desde que se diga que os valores da família serão salvaguardados pelos poderes públicos, o Poder Público também tem o dever de amparar essa união estável, desde que ela seja estável, desde que tenha filhos, ou então o Governo vai distribuir leite somente para aqueles casais constituídos regularmente e não para os outros. Quando se faz distribuição de leite, ninguém vai perguntar se a família é legítima ou ilegítima, é a assistência social, é o Estado amparando, salvaguardando a família e os filhos. De modo que acho que colocar isso é pior: é melhor dizer que a família é constituída pelo casamento, como está na Constituição atual. Dizer-se a família é constituída pelo casamento e pelas uniões livres é pior. A Comissão terá que definir o que é união estável. O que é união instável? É a que dura 5 anos, 3, 2 ou 1? É de fato ou é legal? O casamento pode ser uma união estável, se dura, e deixa de ser estável se não dura. Acho melhor se não definir na Constituição, isso é obra da Lei Civil, o que tem que se dizer é que a família será protegida pelo Estado. Como se diz que a juventude, a infância, a adolescência, são objetos de proteção especial do Estado, também a família é objeto de proteção especial do Estado. Quando se assegura a proteção especial do Estado para os adolescentes não se pergunta se é legitimo, ilegítimo, preto ou branco; são todos adolescentes, todas as famílias merecem essa proteção do Estado. Eu até ficaria muito satisfeito se dissesse expressamente que as uniões estáveis ou ilegítimas teriam proteção porque isso sempre sustentei, mas acho que não deve figurar isso na Constituição; as uniões estáveis e o casamento; são iguais, para que diferençar? Diz: a família. Para que dividir? Se fôssemos dizer: a família constituída pelo casamento, tais benefícios, e as uniões estáveis terão outros, diferentes daquele, muito bem. Mas dizer: o casamento e as uniões estáveis terão os mesmos direitos, para que dizer isso? Basta dizer: as famílias. Porque só as famílias, quer durem 6 meses, 8 meses, ou 1 ano; muitas vezes a família é constituída, e morre o marido, com 6 meses de casamento. Deixou de ser estável? Acabou a família por isso? Têm os filhos, tem a clã familiar. Assim, dividir é pior. Eu que sempre lutei pelos direitos da companheira não tenho nenhuma dificuldade em aceitar como tese o amparo às famílias legítimas e às uniões estáveis. Mas acho que estamos criando uma dificuldade inicial. O que é família estável, união estável? É de cinco anos ou é aquela que se constitui? Os casamentos religiosos são uniões estáveis? O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – A proposta das mulheres não fala em uniões estáveis, essa é uma proposta que estou fazendo, a proposta das mulheres trata das uniões, de fato. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Uniões de fato, portanto, por quê? Porque são famílias, mas se são famílias, não precisa distinguir. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Por que essa fuga? Porque que às vezes têm casais que não têm nada que impeça a consolidação da legitimidade da união, esse que é o problema. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Sabe por quê? Porque o homem não quer casar, o egoísmo masculino não quer. Se você procurar em cinco famílias, que vivam juntas há muitos anos, quem não quer casar é o homem. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – E se o casal tiver um filho e eles não quiserem dar a paternidade, como é que fica? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Como é? O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Se esse casal que não é legítimo e que V. Ex.ª diz que é estável... O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Estável, não sou eu que o digo. Essa expressão não é minha, é do Presidente, uniões estáveis, é do Presidente, estou combatendo. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Nobre Constituinte, se um casal que não é legítimo tem um filho e não quer dar paternidade a esse filho, a criança vai ser protegida como? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Hoje, na legislação, acabei de citar aqui, da Escandinávia, na legislação portuguesa, a mãe que vai ter esse filho ilegítimo pode denunciar à Justiça e a Justiça faz investigação. De modo que, antes mesmo da criança nascer, ela já sabe quem é o pai, e ele é obrigado a aceitar a paternidade. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Isso é ruim, vai para a Justiça e demora muito. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Demora no Brasil, mas não vai ficar na Constituição. Em outros países civilizados que têm melhor preparação judiciária já fazem. De modo que a criança já nasce com pai. Ou então, fazer-se, como na Itália, onde se põe o nome de pai fictício: apenas o que não se permite mais, o que não deve se permitir é dizer – filho de pai ignorado; tem que ter um pai, porque o cidadão que mostra a certidão de nascimento, pai ignorado, ele sofre um trauma toda vez que isso acontece. O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Sr. Senador, na prática, sou um homem que anda pelo interior, tem muitas crianças que não têm registro civil. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não têm, porque o registro civil... O SR. CONSTITUINTE FLÁVIO PALMIER DA VEIGA: – Estou apresentando uma emenda, a criança nasceu, a certidão tem que ser expedida logo. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Por que não tem registro civil? Primeiro, porque a lei proíbe que se declare o nome do pai, se não for casado; isso é que precisa acabar. Mas quem acaba é a lei civil, e no projeto do Código Civil vai acabar. Registra-se o filho com o nome do pai, seja ele casado ou solteiro. Se ele é casado, ele que sofra as conseqüências do ato, a culpa é dele, ele que carregue a cru do seu erro. Depois, o que há é o seguinte: o registro é pago, por mais que se diga que o registro é gratuito, ele é pago. E para não pagar é preciso ir à LBA ou a uma assistente. O registro de nascimento deveria ser gratuito, no Brasil. No começo da minha vida parlamentar, caí na asneira de oferecer um projeto desses e quase fui esquartejado, e o projeto foi julgado inconstitucional, isso era direito, quem devia regulamentar era o Estado, os cartórios são do Estado. O registro civil deveria ser inteiramente gratuito. Há três registros que, no Brasil, deveriam ser gratuitos: o de nascimento, o de casamento e o de óbito. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Mas preferimos manter os cartórios que são uns prêmios que damos, muitas vezes, não aos mais capazes, mas, em muitos casos, aos mais amigos, aos grandes feudos. Eles criaram isso, o registro de casamento é gratuito, mas a preparação, a habilitação, tudo é pago. Num debate que travei, sinto que estou desviando um pouco, certa feita, em Florianópolis, fiz essa crítica à Igreja, porque ela realizava casamentos religiosos sem o prévio casamento civil. E um sacerdote, que me aparteou, disse o seguinte – Naquele tempo: há muitos anos – a diferença é a seguinte, é que o nosso casamento é gratuito, fazemos casamentos coletivos, que são aqueles que fazem na roça e é gratuito, o sujeito dá um porco, uma galinha; e o civil, naquele tempo custava 200 cruzeiros, que era muito dinheiro. Se se perguntar num cartório quanto custa um registro civil de nascimento, se vê quanto custa, porque o escrivão tem que viver disso. Precisamos acabar com esses cartórios, senão o sujeito não registra. Em toda parte é assim. O casamento civil é que tem que ser gratuito, e o casamento tem que ser facilitado. Muita gente não casa porque não pode pagar, custa mais caro casar no civil do que não casar. Os casais mais pobres são casados pela LBA; de vez em quando casam 200, 300 juntos, por quê? Porque a LBA faz esse movimento. De modo que, enquanto o casamento for pago, o registro de nascimento for pago, o registro de óbito for pago, estamos apenas estimulando essa multiplicação de oficiais de registro civil para viverem disso, quando deveria ser de uma repartição pública. O sujeito chegaria, registraria o filho e pronto. Hoje, no Brasil, é preciso até o DARJ; tem que ter um papelzinho, pagar imposto antes, para registrar o filho. E se pune o que não registra na época. Continuando, acho que, seja como querem as mulheres, as uniões de fato, seja como sugere o Presidente, as uniões estáveis, tudo é pior do que dizer, os valores da família, porque exclui essa divisão e deixa a lei civil prestigiar o casamento, o que, aliás, resulta aqui do próprio texto. Quando fala do filho, diz: "os pais são obrigados a educar e manter seus filhos, ainda quando nascidos fora do casamento". Portanto, no próprio texto, admite-se a existência do casamento, como forma de legitimação dos filhos. Não há como abandonar esse texto. Luto por ele, porque acho que por todo esse longo peregrinar de 50 anos foi a melhor definição e confesso que não tinha nenhuma simpatia pela Emenda Figueiredo, mas ela foi a que, com esse artigo, definiu melhor o problema. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte Eraldo Tinoco. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Prezado Constituinte e conterrâneo Nelson Carneiro, concordo inteiramente com a sua preocupação que a Constituição deva se referir à proteção da família, porque sendo o núcleo básico da sociedade, acho que essa preocupação deve estar contida na Lei Maior. Agora, vem uma indagação: Essa conceituação da família já deveríamos tê-la como algo internalizado no pensamento, digamos assim, no entendimento de cada pessoa, ou deveríamos definir na Constituição o que se entende por família? É uma primeira preocupação que exponho porque, se falamos como está previsto na sua proposta, se falamos como está previsto na sugestão da Comissão Afonso Arinos, e até em outras proposições que já recebi, como nosso Presidente se referiu, sempre há uma referência à família. Por exemplo, na Comissão Afonso Arinos: "Todos têm o direito de constituir família e será reconhecida como comunidade na vida social, nos termos do art. 362 dessa Constituição." Aí, o art. 362 se refere: "A família, constituída pelo casamento ou por uniões estáveis, baseada na igualdade entre o homem e a mulher, terá proteção do Estado." Parece-me que em nenhuma dessas redações fica claro o conceito de família. Concordo inteiramente que essa expressão "por uniões estáveis" não define de maneira alguma o que seja o agrupamento familiar, pelo menos dentro do nosso conceito atual de sociedade. Nós todos, por exemplo, para suscitar um aspecto polêmico, ouvimos e vemos, quase que diariamente, na imprensa ou em reuniões, ou até mesmo em grupos formados a esse respeito, que defenderem, por exemplo, a união de pessoas do mesmo sexo. Esta união pode ser até, do ponto de vista dessas pessoas, uma união estável. Isto podemos considerar como um grupamento familiar, ou não? Então, vejam bem. Minha preocupação reside nesses aspectos. Nós entendemos a família como um conceito já formado da união de duas pessoas de sexos diferentes, de maneira formal ou não, que podem ou não podem ter filhos, porque um casal que não tenha filhos não deixa de ser uma família. A presença do filho é um complemento à família. No entanto, às vezes, esse complemento é até biologicamente impossível. Então, é uma indagação inicial, na sua experiência, que eu gostaria de ver um pouco esclarecida. Se, ao falarmos da família, o Estado deve proteger a família, se em termos de um texto constitucional, isto já deve parar por aí ou deveríamos ter um esforço adicional para definir o que seja esse termo família. A segunda preocupação minha, e que eu gostaria de colocar, é a seguinte: nessa discussão toda, nós vemos sempre uma certa confusão entre os aspectos da vida familiar e os aspectos, por exemplo, de proteção à criança. E alguém já lembrou aqui que, muitas vezes, a criança vem ao mundo sem ser dentro de uma união familiar. Quantas e quantas crianças nascem, vêm ao mundo sem ter nenhum tipo de vinculação familiar. E esta criança, obviamente, merece o amparo do Estado. E deste aspecto vem a questão inicial do seu direito a um nome. Qual a melhor solução para isso? Essa solução italiana de um nome fictício, de um pai fictício, isso, porventura, tira o aspecto intrínseco de uma pessoa que, durante a sua vida não vai saber quem é o seu pai? Esse nome, se essa pessoa é alguém que tem essa angústia de saber sua origem e que faça uma investigação e que chegue à conclusão de que aquela pessoa tida na sua certidão não existe, isso diminui o seu problema, a sua angústia, ou esta solução viria apenas para evitar constrangimentos formais 80 de numa Certidão de Nascimento não constar um determinado nome? Ou nós deveríamos atacar o problema outro ângulo, de que a mãe fosse a principal responsável pelo registro e em qualquer circunstância pudesse declarar a paternidade, cabendo ao varão, aí mencionado, o direito de não reconhecer? Esse aspecto já foi aqui discutido? Entretanto, em conversas posteriores a respeito desta idéia, alguém me colocou uma situação que pode ocorrer. O que é que pode evitar, por exemplo que uma mulher vá a cartório registrar o seu filho e ache, por exemplo que o Deputado Nelson Aguiar, pela sua declarada vocação de defensor do menor, deva ser mencionado como pai daquela criança e até que ele prove o contrário, quais os danos morais, quais os danos até familiares que isso possa causar, quando nós sabemos que, infelizmente, a Justiça no Brasil é muitíssimo lenta? Já o deixei aqui diante de um problema, enquanto V. Ex.ª se afastava daqui. Então, vejam bem, são questões de ordem prática, são questões até do dia a dia, mas de terrível repercussão, e que podem ocorrer em função de qualquer dessas hipóteses. Então, minha angústia, como Relator da matéria, é precisamente esta. Quer dizer, como converter em um texto legal a melhor solução para esse problema, de tal sorte que cause menos prejuízo às pessoas envolvidas nessa questão? Enfim, estou aqui querendo me louvar da sua vastíssima experiência sobre o tema, para responder a essas indagações que, acredito, não são apenas minhas, mas de toda a Comissão que vai ter uma dura responsabilidade, no momento oportuno, através do voto consciente de cada um dos seus integrantes, de decidir a respeito dessas matérias. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Inicialmente, eu agradeço e quero dar minha contribuição. Primeiro: O que se entende como família? O Código Civil é que vai dizer como é a família, vai dizer o que é e o que não é família, pois família não é o encontro casual de homem e mulher, isto não é família. A família é uma união que se quer permanente, que se deseja permanente. Mas, se se fala em uniões estáveis, não se pode prever, não há um laço que determine que presumidamente seja permanente essa família, porque se é estável, é aquela união que começa e acaba quando os participantes decidirem. Quando há o casamento, para terminar a vida familiar, é preciso um processo judicial em que há ou separação ou divórcio, mas há um processo. Nas uniões estáveis não, cada um resolve. Há até uma canção que termina com esta frase: "Mané, apague o fogo que eu não volto mais". É assim que terminava a união estável. A mulher resolveu ir embora e, na classe pobre, deixou a comida no fogo e disse: "Mané, apague o fogo que eu não volto mais". No casamento, não. O casamento termina através de morte ou pelo divórcio e a sociedade conjugal, pela separação ou pelo chamado antigo desquite. Mas a separação estável não tem regra. A família é aquela que todo mundo sabe o que é, não precisa definir na Constituição o que é família, 81 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) porque também não se define o que é adolescente. O Estado ampara a criança, o adolescente, mas qual é o adolescente? O que tem de 14 a 18 anos? É de 10 a 20? É que são coisas tão comuns que não precisam definição. Muitos procuram definir na Constituição. Isso tem que ser definido no Código Civil. Também o Projeto Afonso Arinos cai nesse erro de repetir casamento e uniões estáveis. Então, para que distinguir? Basta as uniões estáveis, incluindo nelas o casamento, já que, presumidamente, o casamento é uma união estável, até que se dissolva pelos meios legais. É muito mais estável, presumidamente, do que a união simples de homem e mulher. De modo que eu acho que é melhor não distinguir entre uniões estáveis e casamento, embora eu seja favorável a que se ampare as uniões estáveis. Até nesse projeto do Código Civil, que está sendo discutido no Senado, há várias emendas minhas, em favor dessas uniões estáveis e a ampla legislação que existe sobre companheira, resulta de minha autoria. Mas acho que a Constituição não deve distinguir. Deve falar na família. O legislador civil é quem vai dizer se isso é família ou não. Uma família é estável enquanto dura, mas quanto tempo? Vamos ter, então, de dizer na Constituição o que é união estável ou deixar para que a lei civil diga o que é união estável? Então se dirá que é a união de 5 anos. Mas a união de 4 anos, também não é estável? A de 3 muitas vezes é mais estável do que a outra. E vai criar um problema, porque, se alguém dissolve uma união aos 3 anos, mesmo que seja pela morte de um dos parceiros, a união deixou vel, se disser que a união estável é aquela de 5 anos. Se alguém vive apenas 3 anos e morre um, essa união era estável durante os 3 anos, mas não chegara a alcançar os 5 anos da união estável que a lei definiria. Na Lei do Divórcio, acontecia um caso interessante. É que havia muitas famílias que não se podiam casar, as uniões não se podiam realizar legalmente, mas que tinham 10, 15 anos. E o que acontecia? Tinham bens. E como sempre, os homens colocavam os bens em seus próprios nomes, acreditando serem mais capazes, devido às velhas tradições machistas do Brasil e em todo o mundo, aliás. Então, tudo era no nome do homem. Fui obrigado a botar um artigo 45, se não me engano, na Lei do Divórcio que diz que esses casais que já tinham passado, ele dos 60 anos, ela dos 50 anos, e que seriam obrigados a casar pelo regime da separação legal de bens, – portanto, os bens todos ficariam com os homens, embora as uniões tivessem 10, 15 anos, – fui obrigado a botar um artigo permitindo que esses casais, que tivessem 10 anos de convivência, ou tivessem um filho, pudessem se casar por qualquer dos regimes, inclusive pelo da comunhão de bens, para que essas mulheres, que viviam com os seus companheiros, não fossem prejudicadas, porque os bens ficariam sendo sempre do marido. Como era pelo regime da separação, elas não participariam jamais. De modo que é preciso definir o que é união estável, porque se nós botarmos na Constituição, família e uniões estáveis, uniões legítimas, temos que definir o que é união legítima e o que é união estável. União estável é aquela que dura quanto? 5 anos? É um prazo arbitrário. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Digamos a união de fato e a união de quem, Senador? É um homem e uma mulher? Só queria lembrar... O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Essa é uma definição tão comum, é um conceito tão comum que família é homem e mulher, que acho que a Constituição não deve descer a este detalhe de dizer que é união de homem e mulher como se fosse possível nós admitirmos família de dois homens ou de duas mulheres. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Mas a tradição, Sr. Constituinte Nelson Carneiro, pelo menos a tradição de alguns países, cujas constituições temos em cima da mesa, é a definição da família. Aqui, por exemplo, a Constituição da Itália, a que V. Ex.ª se referiu, diz: "A República reconhece os direitos da família como sociedade natural fundada no casamento." Veja bem: "O matrimônio é baseado na igualdade moral e jurídica dos cônjuges, com os limites determinados pela lei." O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas essa Constituição é de que data? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – É de 1986. A Constituição é esta aqui, de 1986. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Esta é feita logo depois, é a Constituição italiana, logo depois da guerra. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Não, aqui não diz. O livrinho tem na capa 1986. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – A Constituição italiana é logo depois da guerra e ali, sob a influência, evidentemente, do Vaticano, do Partido Democrata Cristão e, isso, depois da guerra. Hoje, com lei do divórcio, aprovada até em plebiscito na Itália, a situação deve ter se modificado, mas a definição continua. Não sou contra o conceito. Acho que não temos que defini-lo na Constituição. O que é a família? Todos sabem o que é a família: é a união de homem e mulher, tendo filho, para procriar, para manter a espécie e tal. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Nós observamos exatamente isto, que uma Constituição, como a da Rússia, demonstra essa diferenciação, quando diz: "A família goza da proteção do Estado." Embaixo ela diz: "O casamento baseia-se no acordo voluntário entre a mulher e o homem." O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Essa expressão "o casamento baseia-se na união voluntária", é óbvio, mas se quiser constar na Constituição, não faz mal nenhum, é tão óbvio que acho que não precisa figurar na Constituição. Porque o casamento que é feito por união forçada é um casamento nulo, ou sob coação. Quer dizer, é tão óbvio que não precisa figurar na Constituição. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – O que venho observando e que essas constituições estão sempre falando na família e falando no casamento. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – É claro. Nós estamos fazendo uma Constituição não para copiar as outras, mas para o futuro e por isso é que eu digo, os valores da família. Já que nós reconhecemos que no Brasil, ao lado da família legítima há um grande número de famílias que não são constituídas pela lei civil, são, primeiro, os casamentos religiosos, as esposas religiosas; depois, as uniões livres ou as uniões estáveis. Se nós reconhecemos isso e tudo isso é família, então, por que não dizermos, os valores da família? A família inclui todos esses aspectos. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quais seriam, então? Nós teríamos que definir os valores. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Isso é a lei civil que vai dizer. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas, V. Ex.ª coloca o núcleo da questão nos valores; já não é mais agora na família; mas os valores da família. Que valores seriam esses? Como definir? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – A lei civil é que vai definir. Os valores da família são: assistência, garantia, pensão, alimento, tudo isso está em valores da família. A respeitabilidade, privacidade da família, está na emenda anterior, para proteger a família. O parágrafo anterior que também é emenda minha, diz: "São intangíveis os valores de pessoa humana e seus direitos fundamentais, devendo o Estado respeitar e proteger a família, seu nome, sua imagem e sua privacidade." São os valores da família. Agora: "Todos também são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso, convicções políticas". E ainda: "Serão punidos pela lei os preconceitos de raça e de estado civil." Quer dizer, esses é que são os valores da família, esses e outros, evidentemente, que a lei civil vai incluir. Agora, não podemos dizer, se nós queremos proteger a família, não podemos ferir a família, dizendo: "A família constituída pelo casamento e as uniões do Estado... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas, digamos, a proposta das Senhoras, na carta que nos encaminharam: "A família é constituída por uniões, de fato e de direito, e terá direito à proteção do Estado." O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Terão direito em uniões, de fato e de direito. Quer dizer, exatamente isto, chama a atenção... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não. A redação precisa é a seguinte: "A família constituída, a família, de fato e de direito, terá direito à proteção do Estado". O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Para que dividir a família, já que vamos proteger ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) as duas? Por que dividir em uniões de fato e uniões de direito? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Porque elas existem, nobre Constituinte. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas, então, se o conceito família é global, inclui os dois, para que distinguir? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª está levando para o Código Civil. Está atribuindo a responsabilidade do Código Civil para estabelecer a diferenciação. Quer dizer, não se diferencia na Constituição. Mas, como elas são diferentes de fato, porque são diferentes, o que nós estamos atribuindo? Atribuímos ao Código Civil a obrigação de estabelecer os conceitos que vão diferencialas. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – De acordo com a minha velha luta, eu não tinha nenhuma restrição, se eu estivesse fazendo aqui um projeto de lei ordinária. Como é um projeto de Constituição, eu acho que dizer que as uniões, de fato e de direito, são iguais, têm a mesma proteção, nós estamos distinguindo na família, as famílias legítimas e as famílias ilegítimas. E isso é que hoje não se admite no direito. A família tem que ser respeitada, sendo legítima ou ilegítima. Tem de ser amparada, sendo ilegítima ou legítima. Mas não precisa dizer isto na Constituição. Se disser só as uniões pelo casamento merecem proteção é uma tese, porque aí exclui as uniões de fato. Mas dizer as uniões, de fato e as de direito, merecem a proteção, é dividir a família, sem necessidade. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mestre, V. Ex.ª me desculpe, mas eu disse que nós iríamos ficar bem birrentos nesta questão, porque nós temos aqui do nosso lado um dos maiores conhecedores do País. E como nós temos uma responsabilidade, como disse o Relator, de apresentar uma proposta, de forma que nós possamos sustentá-la nas instâncias superiores desta Constituinte, até o Plenário, nós queremos deixar esta coisa bastante clara para nós. E para mim não está. Ora, se eu vou permitir que a legislação ordinária estabeleça diferenciação entre a família, por que não deixar num artigo da Constituição este princípio estabelecido? Eu direi, Ex.ª que estou muito preocupado, como já disse a V. Ex.ª, com a questão do filho, da criança. Às vezes, quando vamos travar um debate a respeito da família, estamos preocupados em assegurar o direito do homem e o direito da mulher. Eles dois resolvem o seu direito e largam um tremendo abacaxi que a criança vai carregar para o resto da vida, uma cruz sem fim. Ora, se nós garantimos a proteção da família, de fato, essa questão não está clara para mim, eu a estou colocando – mas se nós garantimos a partir do texto da Constituição, o reconhecimento da família, de fato, a lei vai ter a obrigação de garantir o direito da criança, sem as restrições que tem hoje, não é verdade? Hoje, a lei ordinária impõe para a criança, nascida fora da relação do casamento, uma comédia trágica que já conhecemos aí. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Salvo engano, o nobre Relator deve ter aí uma emenda minha sobre os filhos. Eu gostaria que fosse lida, porque é exatamente sobre isto que o ilustre Presidente sustenta a igualdade absoluta entre os filhos. Eu sempre sustentei isto. E também não tenho nada a opor em que se diga que as uniões de fato e as de direito tenham a mesma proteção. Não tenho dúvida nenhuma sobre isso. Apenas acho que não se deve fazer isto na Constituição. Dizendo a família, já inclui tudo. Desde que não se distinga, como diz o Código Civil atual, a família é constituída pelo casamento, não se está excluindo as famílias que não são constituídas pelo casamento. Quero resumir o meu pensamento, eu sempre distingui os lares constituídos à margem da lei. De modo que não sou contra a que se diga que a proteção à família de fato deve ser dada pelo Estado. Mas acho que não há necessidade de se dizer. Seria mais claro até que se dissesse a família, constituída, as uniões de fato ou de direito. Seria até mais fácil, de acordo com a minha posição pessoal. É para isso que eu tenho lutado sempre. Mas acho que não fica, apropriado na Constituição dividir a família e até estimular as uniões de fato. Porque se diz que "as uniões de fato e de direito terão os mesmos direitos, então, nós estamos quase que aconselhando as uniões, de fato, preferentemente às uniões de direito, quando a ilusão é de que as uniões de fato têm menos direito do que realmente têm as uniões de direito. De modo que, quando se diz os valores da família, se incluem as de fato e as de direito, já que nós temos todos o mesmo conceito de família. A Constituição atual é que diz que "a família é constituída pelo casamento..." mas se isto não constar da nova Constituição, o conceito de família é aquele conceito universal. É o conceito da união do homem e da mulher, com o propósito de manter uma união permanente e de onde nasçam e se criem os filhos, em comum. Isto é que é o conceito generalizado do que seja família. Mas se quer dizer as uniões de fato e de direito, está de acordo com tudo o que preguei na vida, só não deve ficar na Constituição, a meu ver, mas se ficar, eu estou vitorioso numa campanha iniciada desde 1947, na Câmara dos Deputados. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com a palavra o nobre Constituinte Eliel Rodrigues. O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Senador Nelson Carneiro, eu não tive a oportunidade de ouvir V. Ex.ª, porque cheguei um pouco atrasado, mas me chamou a atenção este fato de que o nosso Relator com o Sr. Presidente estão debatendo: sobre a família de direito e de fato. Então, eu faço uma reflexão a respeito da bigamia, poligamia, quando nós encaramos o aspecto da família de fato e não de direito. Perguntaria se não seria mais viável para o bem da sociedade e para, dentro da sua formação cristã, pelo menos no nosso País, para que nós lutássemos a fim de que essas uniões de fato e não de direito fossem regulamentadas, houvesse o casamento normal, houvesse uma forma de o Governo ajudar nesses casamentos, nessa formalização, em vez de nós estarmos trabalhando, levando a sociedade para um aspecto mais preocupante, que e o problema da bigamia ou da poligamia... 82 O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não! Eu acho que evidentemente a bigamia existirá sempre, se nós equipararmos a sociedade de fato à sociedade constituída pelo casamento. Porque o homem casado que tenha uma outra situação fora do lar, evidentemente, está sendo um bígamo, embora ele não tenha casado uma segunda vez. Mas a bigamia aí, que é o crime do sujeito casar duas vezes, não é tanto pelo fato do casar, passaria, então, a ter um aspecto moral; o cidadão ter duas vidas, duas famílias, aí ele seria bígamo, não porque a lei diz que ele é bígamo, não é a definição legal, mas é a definição moral, o sujeito é bígamo porque têm duas famílias, duas mulheres ao mesmo tempo. Acho que o nosso debate resulta, hoje, da seguinte dificuldade. Creio que não deve ficar na Constituição as uniões, de fato e de direito, terão os mesmos direitos. Se nós dissermos que a família terá proteção do Estado aí nós incluímos os dois sem distinguir. E não incentivamos, não dizemos às uniões, de fato, que devem continuar, de fato, porque se elas têm os mesmos direitos das uniões legais, legítimas então por que alterar a sua situação? O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Nobre Senador, V. Ex.ª não acho que isto levaria a estimular as uniões de fato, e reduzir os casamentos? É uma indagação que faço, porque acho que isto resultaria neste comportamento. Então, haveria um estímulo para as uniões, de fato, e com isto reduziria o número de casamentos. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – É exatamente por isto que a minha proposta não tem esta redação. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – A sua proposta tem apenas dois artigos e quatro parágrafos. Então, é curta. Ela consta: "A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos." "O casamento é indissolúvel." V. Ex.ª acha que ele não deva... O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não. Eu tiraria, eu diria só que a família tem a proteção especial do Estado. A famÍlia. Porque não só a família constituída pelo casamento tem a proteção do Estado. Tem um grande número de famílias, no Brasil, que não foram constituídas pelo casamento. E quando se fala em casamento, é evidente que se fala em casamento civil. Há milhares de lares no Brasil, centenas de milhares, constituídos apenas pelos laços religiosos. Nem por isso deixam de ser família, nem por isso deixam de merecer a proteção especial do Estado. Se nós dissermos que só a constituída pelo casamento civil merece a proteção especial do Estado, nós estamos excluindo essas famílias. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Na nossa maneira de entender, nós não podemos igualar os direitos. E V. Ex.ª está querendo igualar esses direitos. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: Não! Ao contrário! O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Dá a impressão que V. Ex.ª estaria estimulado... 83 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não. Esta expressão não é minha. É sugerida pelo nobre Presidente que citou aqui civis textos, um que diz: "As uniões, de fato e de direito, terão a proteção do Estado". E outra que diz: "O casamento e as uniões livres terão a proteção do Estado". Ora, evidentemente, não é isso que a minha emenda diz. A emenda não é minha. Eu acolhi, em 1975, com pequena alteração um texto que veio na Emenda Figueiredo, texto contra o qual ninguém se levantou, ao tempo, no Congresso Nacional e só não foi aprovada porque o Presidente Figueiredo a retirou. O texto que eu sugiro é que se diga o seguinte: "Os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos. Os pais são obrigados a manter e a educar seus filhos, mesmo os nascidos fora do casamento. A lei proverá no sentido de que na falta ou na impossibilidade dos pais, os filhos incapazes recebam assistência social." Portanto, este é o texto que eu sugiro que deva figurar na Constituição em vez daquele: "A família constituída pelo casamento terá a proteção especial do Estado". Esta é a minha posição. Outra não é a posição que tenho empreendido, desde que ingressei no Congresso em 1947, em favor dos lares que não são constituídos à sombra da lei; essa luta me leva a aceitar, se for esta a decisão. Mas acho que não deve ser. Nós não devemos figurar na Constituição a igualdade entre as uniões, de fato, e as uniões de direito. Não deve figurar. Nós devemos, ao contrário, facilitar o casamento civil, propiciar que maior número de pessoas venham para o casamento civil. E para isto precisamos tornar gratuito, realmente, o casamento civil. A habilitação para o casamento civil. Mas haverá sempre quem não possa se casar. Então, essa união livre, nem por isso, na lei civil, deve ter menos proteção do que a união legitima, inclusive tendo em vista os filhos nascidos dessas uniões, que não podem ser punidos, não podem ser distinguidos ou afastados de qualquer proteção por não serem filhos legítimos. Aliás, o Código Civil já deverá excluir esta brutal e ominosa distinção entre filhos naturais, legítimos e ilegítimos. De modo que a minha posição é exatamente esta, a de amparar a família, sem ressaltar se ela é ilegítima ou legítima. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nobre Constituinte, permita-se deixar claro aqui porque o Constituinte Salim Curiati chegou depois, bem como o Fausto Rocha. Veja bem, a nossa proposta, que eu disse para ele, é uma peça bruta, tirada da floresta, para efeito de discussão. Nós estamos na expectativa de que ela sirva, amanhã ou depois, para contribuir nesta grande construção constitucional que estamos fazendo. Nós propusemos a família, constituída pelo casamento e por uniões de fato, uniões estáveis – mudando um pouco a redação – terá direito à proteção do Estado. Eu quero dizer o seguinte: não podemos fechar os olhos para uma realidade que existe. E a partir do instante em que eu digo em que eu reconheço que a família que só tem direito a proteção do Estado é a constituída pelo casamento, como e no texto da Constituição de hoje: "A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção do Estado." Veja o art. 175. O que é que a Constituição está fazendo? Ela está excluindo a família que não é constituída pelo casamento. E esta família existe. Esta é a coisa. Quando ela diz:: "A família será constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos poderes públicos", ela está excluindo da proteção dos poderes públicos a família que não é constituída pelo casamento. Como está hoje? No meu modo de ver e na prática, é o que vem ocorrendo. Se eu coloco, e veja bem, a divergência aqui, a controvérsia, que suscitou aqui é que o Constituinte Nelson Carneiro acha que não se deve definir aqui o conceito na Constituição. Eu acho que deve, já que nós temos que defini-la na lei ordinária, porque não fazê-lo a partir da Constituição, já que não vamos transformar a Constituição num Vade mécum , pelo acréscimo de um artigo a mais ou de dois artigos. Só que eu tive o cuidado de salvaguardar na minha proposta, eu ainda não estou defendendo. Ela está colocada para a discussão. Mas eu coloquei – "A família, constituída pelo casamento, por uniões de fato – alterando a redação anterior – terá direito a proteção dos poderes públicos". Agora, embaixo, aproveitando a experiência de outros povos, de culturas milenares, "ao Estado incumbe garantir proteção ao casamento, à família, à mãe, à criança," como fizeram as outras Constituições. Quer dizer, eu estou reconhecendo a existência do instituto do casamento, como uma instituição milenar que precisa ser protegida. Agora, não significa dizer que, pelo fato de ela ser uma instituição milenar e estar sendo protegida, eu haja famílias que não sejam constituídas pelo casamento. O que eu quero é salvaguardar o direito – e aí agora é que entra numa discussão que os nobres constituintes não tomaram parte dela – salvaguardar o direito especialmente da criança. Eu não vejo por que o direito de discriminar a criança, a chamada criança hoje constituída aí dessa forma, nascida em lares que não existem. E o que se está fazendo é discriminando. Porque veja bem. Eu citei um fato quando eu saí da FUNABEM, eu deixei 143 meninos e meninas registrados só com um nome, porque o pai não assumiu, porque a mãe não assumiu, largou este menino lá na porta, não se sabe quem é o pai nem a mãe. não se preocupou em fazer investigação da paternidade e até da maternidade. Por isso essas crianças ficaram sem direito. Hoje, nós temos 8 milhões de menores abandonados fora do vínculo familiar, desses milhões, diz uma reportagem do "Fantástico", 6 milhões não têm registro. Se essas pessoas não têm registro, elas não existem, elas não são cidadãs, não o serão nunca, porque o documento informador de cidadania é o Registro de Nascimento, não é verdade? E sem o documento informador da cidadania, elas não têm o direito à educação porque não podem ser matriculadas na escola. E eu estou pensando na mudança desta coisa para salvaguardar o direito da criança que não tem nada a ver com esses desatinos que vêm sendo cometidos por homens e mulheres por aí afora. E, às vezes, ficamos preocupados com o homem e a mulher e esquecemos dos filhos que vem sofrendo as conseqüências. Aquilo que eu acrescentei, os filhos nascidos ou não da relação do casamento terão iguais direitos e qualificações? Veja bem, é em função da família, de fato, que estou reconhecendo lá em cima. Se eu deixo isto para a legislação civil, esta coisa vai resultar numa controvérsia e numa dificuldade muita maior, porque, como eu disse os valores da família que representam, agora, não família, mas os valores que representam o núcleo da emenda do ilustre Constituinte Nelson Carneiro, no mesmo modo de ver, que representam o núcleo dessa emenda, aí já não é mais a família, mas os valores se eu deixo para a legislação ordinária definir isto é claro que ela vai definir esses valores como aqueles da família constituída na forma da lei no meu modo de ver. De modo que, acho que essa discussão que é muito rica para nós, e seguramos o nosso Constituinte aqui e não queremos soltá-lo, estamos falando como com um anjo – V. Ex.ª se lembra daquela passagem? Como aquele cidadão, Jacc que se agarrou com o anjo, até que o anjo desse uma resposta para a sua angústia? Estamos fazendo isto agora. Temos aqui o maior conhecido do assunto e por isso nós estamos espremendo o derradeiro sumo, a fim de que essa coisa fique clara na nossa cabeça. Temos uma enorme responsabilidade diante da sociedade brasileira, diante da Assembléia Nacional Constituinte, que é a de fornecer um texto para que possa ser definido, defendido, aceito ou rejeitado nas instâncias superiores. Mas a nos Membros desta Subcomissão, nos caberá a obrigação de defender ou de produzir as alterações daquela matéria que sair elaborada daqui. Queremos deixar esta questão clara, para que a controvérsia se diminua lá em cima nas instar das superiores da Assembléia Nacional Constituinte. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Então, a proposta de V. Ex.ª e para que se equipare a família de fato, à família de direito. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não o que estou querendo reconhecer são as uniões, de fato, que a lei reconheça as uniões, de fato aí, a legislação ordinária e que vai estabelecer a diferença. Mas quero que a Constituição reconheça as uniões de fato, como família, a fim de salvaguardar no direito dos membros desta família, da criança, a fim de que possa gozar da proteção do Estado. Porque hoje, como está na atual Constituição, a família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos poderes públicos quer dizer, passa a ter direito à proteção dos poderes públicos apenas à família que é constituída pelo casamento. Isso tem implicações na vida das crianças. Quer dizer, a Constituição hoje exclui da proteção do Estado, passa da condição de sujeito, de direito para a de objeto de assistência, de proteção, da caridade pública, de outras formas, da vigilância da área do Juiz de Menores, etc., passa a ser objeto da atenção de uma legislação especial essas uniões, de fato. Ora, isto tem conseqüências extraordinárias na vida das pessoas, especialmente na vida das crianças. Sabemos que essas crianças que nascem da relação dessas famílias de fato, elas vêm sem culpa, sem nenhuma culpa, elas vem carregando uma cruz extraordinária pelas ruas das cidades grandes e pequenas deste País, são filhos de ninguém que estão por aí afora. De modo que, acho que temos que pensar neles. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Sr. Presidente, por que não pode permanecer o art. 175 e acrescentar um outro parágrafo com relação à existência da família, de fato? “A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos poderes públicos”. O casamento somente poderá ser dissolvido nos casos expressos em lei desde que haja prévia separação judicial." O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Que é a emenda do Constituinte Nelson Carneiro. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Exato. O outro parágrafo, o outro artigo daria direito à família, de fato. As uniões, de fato, estariam num outro parágrafo, num outro artigo. "As uniões, de fato, terão direito à proteção dos poderes públicos". O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Temos que lembrar o seguinte. Ao longo da história da humanidade, a família nunca foi constituída pelo casamento, nos primórdios não era constituída pelo casamento. O casamento é uma criação jurídica. A união, sim, mas o casamento, não, a formalização do casamento, não. Essa foi uma criação do homem... O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – O casamento, porque a família começou com o casamento. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Olhe aqui, amigo, se nós examinarmos a história do povo de Deus, nos primórdios, vamos encontrar a bigamia solta. Que família era esta? Nos primórdios, não. A família é uma instituição divina, agora o casamento não. Tínhamos lá os nossos respeitáveis homens do passado com a bigamia solta. Tinha até a prostituição solta. Basta ver que Salomão tinha 300 concubinas. Que casamento era este? O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Isso não foi que Deus concordasse ou permitisse. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Que casamento era este? Que cidadão privilegiado era este que podia casar 300 vezes e ainda ter 700 outras mulheres. Não, tenha paciência. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Mas no princípio não foi assim, no princípio foi um só para cada um. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, gostaria de voltar à apreciação do meu ponto de vista com o nobre colega Nelson Carneiro. É que entendi o ponto de vista dele, e ele não advoga – é natural que não poderia, nem deveria – o problema da bigamia. Mas quando se fala no cuidado, na preocupação que também é comum ao nobre Presidente da nossa Subcomissão, em relação ao menor, não vejo dificuldades em que se mantenha essa unidade conjugal, trabalhando em favor dela, já que não somos favoráveis, nem estamos pensando em problema de bigamia, nem poligamia. O que se trata aqui é de uma simples constituição civil, legal, mesmo no casamento religioso que pode se equiparar ao civil, desde que preenchidas as formalidades legais, aquelas que a nos- sa Constituição estabelece. Então, por que não trabalhar no sentido de ajudar essas famílias que não estão legalmente constituídas dentro dos princípios monogâmicos, em tê-las de tal forma que a prole possa ser devidamente amparada e tenha os seus direitos? Estamos trabalhando no sentido de justificar, de acertar coisas que estão erradas. Então devíamos nos deter à base... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A lei não pode criar problemas, a lei tem que solucionar os problemas. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Acho que a forma do art. 175 poderia ser mantida, se dissesse "A família terá a proteção especial do Estado", sem dizer que é família legítima ou família de fato. Porque o que se protege é a família, seja ela constituída pelo casamento ou não. Desde que seja família, necessita de proteção do Estado. Isso é o que o Estado ampara, a família. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª reconhece a existência da família não constituída pelo casamento? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – É família não constituída pelo casamento, mas é família. A família constituída pelo casamento religioso, que não se registra civilmente, é família. E o interior do Brasil está cheio de famílias. Se andarmos pelo interior, fulano é casado. Pergunte: "Casou aonde?" "Casou no padre". Não casou no civil, mas é família. E essa família merece a proteção do Estado, porque é um núcleo que trabalha junto, vive junto, serve junto, colabora para o engrandecimento do País. De modo que o art. 175, desde que tire "a família constituída pelo casamento", "a família terá a proteção especial do Estado ou dos poderes públicos", não há diferença alguma. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Aqui não consta se é casamento feito pelo Estado ou pela Igreja. Então a família é constituída pelo casamento e terá proteção dos Poderes Públicos. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Evidentemente, numa Constituição de um país leigo, fala evidentemente com a lei civil. Não pode considerar o casamento que é feito fora da lei civil. De modo que aí é o casamento civil. Tanto que a ele se equipara o religioso, depois de cumpridas certas formalidades. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Numa segunda fase, no Código, pela lei ordinária se estabeleceria esta diferenciação. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas veja V. Ex.ª A própria Constituição diz aí, se não me engano no artigo seguinte, que o casamento religioso, cumpridas as formalidades legais, poderá ser equiparado ao civil, quer dizer, terá os mesmos direitos, o que importa dizer que num Estado leigo o casamento que a Constituição ampara é o casamento civil, e permite que o casamento religioso, desde que seja registrado no civil, tenha os mesmos direitos, a mesma proteção. Mas, hoje, no ano de 1987, não podemos desconhecer que a família não se constitui só pelo casamento. A família se constitui pela união do homem e da mulher, com o propósito de manter 84 permanente essa união e para a criação e educação dos filhos. De modo que dizendo que a família terá proteção especial do Estado, estamos dizendo tudo. Agora, não é possível mais distinguir os filhos. Estou inteiramente de acordo com tudo o que se disser em favor dos filhos. Mas acho que no momento não há nenhuma legislação que distinga, no que se refere a direitos e deveres, os filhos legítimos dos ilegítimos. Todos são filhos. Se tivéssemos que punir alguém, que puníssemos os pais, e não os filhos. De modo que não podemos deixar de amparar todos os filhos, qualquer que seja a sua qualificação. É por isso que todas as legislações – eu sinto que não tenha chegado aqui uma emenda de minha autoria. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Já chegou. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Eu gostaria que ela fosse lida. Não é aquela da criança, não. É outra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sr. Senador, só quero colocar um reparo. Na prática, existe extraordinária distinção entre a criança nascida da relação do casamento e a não nascida dessa relação. Tanto que a criança vai para o Juizado de Menores, e, chegando lá, ela não tem direitos, quem tem direitos é o Juiz. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas se o filho legítimo for jogado na rua, abandonado, ele vai para o Juiz. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Basta pensarmos com que facilidade, por falta do reconhecimento dessas famílias, os doutores Juízes de Menores estão mandando crianças para o estrangeiro. Há aquele problema na cidade de Salvador, em que a mulher deixou dois filhos sob a guarda do Juiz, Dr. Aguinaldo Bahia, e este os deu a uma família francesa, por adoção. E agora a mãe deseja ver os filhos, e eles se encontram na Europa. É esta a falta de respeito, a falta de proteção a esses seres humanos. Vejam bem: a mulher foi lá e deixou os filhinhos dela guardados. Mas porque ela não tinha marido, aí é diferente, é outra família, essas crianças são outras crianças. Ora, como é que não existe na prática? Existe, Senador, e existe de forma escandalosa no Brasil. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas, sou acusado de defender a família fora da lei. Sou mais do que o Constituinte Nelson Aguiar. Toda a minha vida pública, aqui no Parlamento, desde 1947, foi marcada por isso. O Monsenhor Arruda Câmara, meu saudoso adversário, dizia que eu era o "Cavaleiro Andante das Concubinas". De modo que não tenho nenhuma restrição a isso. Mas apenas acho que há alguma coisa que não deve figurar na Constituição, deve figurar na lei. Desde que se ampare a família, deve-se amparar todas as famílias, sem distinção. Lamento que não tenha chegado uma emenda de minha autoria, uma sugestão de minha autoria, que diz que os filhos terão os mesmos direitos, qualquer seja a sua natureza, a sua filiação. Não há mais isso. Nenhuma legislação civil moderna do mundo, hoje, faz essa distinção. V. Ex.ª tem aí o Código de Portugal, no qual deve ter um artigo expresso sobre isso. 85 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – É a Constituição de Portugal. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – A Constituição de Portugal tem um artigo sobre a igualdade de todos os filhos. É isto que temos que reproduzir na nossa Constituição. A sugestão é essa. Era essa que eu reproduzia aí. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu leio: "As crianças têm o direito à proteção da sociedade e do Estado, com vistas ao seu desenvolvimento integral. As crianças, particularmente, os órfãos e os abandonados, têm direito a especial proteção da sociedade e do Estado contra as formas de opressão e de discriminação e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições." O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não é esse artigo, não; é outro, em que diz expressamente que os filhos... O SR. CONSTITUINTE ELIEL RODRIGUES: – Enquanto o nobre Constituinte está procurando esse artigo na Constituição de Portugal, volto àquele mesmo aspecto. Por que não lutarmos para a legalização dessas famílias que estão nesse estado? Já que deve amparar a prole e os filhos legalmente, excluído o problema da bigamia e da poligamia, por que não lutarmos para que o Estado assuma a responsabilidade de fazer esse casamento, de legalizar essa união de direito, que, de fato, já existe. É o que volto a pensar. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muitos não estão casando porque não querem. Então, aproveitando a sugestão do Constituinte Antônio Salim Curiati, porque a minha preocupação não é com o casamento, não é reconhecer o casamento, o que deve acontecer é o Estado proteger essa família. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – É a minha também. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu sugeriria: "a família, constituída ou não pelo casamento, terá direito à proteção do Estado". O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Na minha posição pessoal, estou de acordo. Mas acho que, como membro de uma Assembléia Nacional Constituinte, equiparar, na Constituição, assim... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas não estamos equiparando. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Constituída pelo casamento ou não, é pior do que tirar a expressão: "A família terá proteção especial do Estado". O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Senador, vamos chegar lá na frente e vamos cair naquela história de a lei específica não reconhecer a família que não é constituída pelo casamento. Não vai reconhecer. Se não reconhecermos isso, a partir da Constituição, quando chegar na hora da legislação ordinária, não vai ser reconhecida. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Estou surpreendido, porque achava que era o mais radical dos defensores da família ilegítima. Tenho sido crucificado por isto. Mas vejo que as propostas aqui são maiores, vão além da minha. Acho que a família é aquela que é constituída por homem e mulher, com o propósito de manter permanentemente essa união, e onde nascem e se criam os filhos comuns, haja ou não casamento legal, religioso ou civil. Então a definição de família é esta. Agora, a definição de casamento é outra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – V. Ex.ª não acha que a definição de casamento deva estar na Constituição, assim como a dissolução do casamento? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – A dissolução, não. Desde que se fala em dissolução, tem que se falar em casamento. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – V. Ex.ª acha que a Constituição deve falar em casamento ou não? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Desde que se fala em dissolução do casamento, tem que se falar no casamento. Se não V. Ex.ª não tem como falar no divórcio. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Eu coloco o principal. A Constituição deve-se referir ao casamento, ou V. Ex.ª acha que o casamento deva ser objeto de lei ordinária, como o Código Civil? O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Não, acho que se deve falar no casamento, mas não como excludente da proteção aos que não se casam. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Então acho que consegui captar o seu pensamento a respeito. Acredito que como teremos que falar no casamento, me parece que talvez numa forma de se chegar a este pensamento seria, num artigo falar sobre essa proteção à família, sem descer a detalhes. Agora, quando for falar em casamento, talvez possa dizer-se que o casamento civil, forma prioritária de constituição da família... O Sr. acha que não? Ou como se definir no texto constitucional o casamento se não amarrado ao problema da constituição da família. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – A proposta do nobre Constituinte, em um dos itens em casamento. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Eu falo em matrimônio. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Eu gostaria que V. Ex.ª repetisse a proposta. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – "Os valores da família serão salvaguardados com a proteção dos poderes públicos". Qualquer família. "Os pais são obrigados a manter e educar seus filhos, ainda os nascidos fora do casamento." Portanto, aceito a existência do casamento. "A lei proverá no sentido de que, na falta ou impossibilidade dos pais, os filhos incapazes recebam assistência social." Eu resumo aqui. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Aí o nobre Constituinte Nelson Carneiro praticamente oficializa o casamento. Acho que o casamento, na proposta do Senador Nelson Carneiro, não está excluído, está expresso. Agora vem expressa a proteção aos menores que não são de família regularmente constituída. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Sim, proteção aos menores que não são nascidos no casamento. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nobre Constituinte, nós que temos servido – essa aliás, é uma função do político, até por vício, até pelo defeito de ser político – como advogado do fórum, na busca do direito da mulher, nascida ou não de membros de família não constituída pelo casamento, sabemos o quanto é difícil. Se não tiver uma figura na lei para proteger direitos da sua família, o homem, hoje, está deixando a mulher para trás com muitos filhos e caindo no mundo. Quando se vai atrás dele, ele diz: "Não, não tem casamento, não tem lei que obrigue". Ele protesta lá na frente que o filho não é dele. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Mas a proposta do Senhor está resguardando... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A proposta do Senador, no meu modo de ver, quando ele diz: "Os valores da família..." Que família é essa? Se não se define que família é essa... Eu conheço o jurista brasileiro, o conservadorismo do jurista brasileiro, o legalismo do jurista brasileiro, o positivismo "Conmteano" do direito brasileiro, conheço a teoria consagrada do nosso sistema jurídico de que a lei é a fonte suprema do Direito. Ora, se não deixarmos isso garantido a partir da Lei Maior, chega lá o jurista e vai dizer: "isso não é família; não é casada, não tem direito a proteção". Vai passar outra vez a ficar à mingua da bondade de juízes que vão examinar a questão com base na livre apreciação da prova, nos princípios gerais do Direito, do interesse social, e foi criado isso exatamente porque a lei... O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Presidente; a mensagem está clara, cristalina na proposta do Constituinte Nelson Carneiro. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – No meu modo de ver não está, quando S. Ex.ª diz assim: "os valores da família..." Então tenho que perguntar: que família é essa? S. Ex.ª diz lá: "família constituída de fato, também". Mas não está dito. Se não está dito, a Lei Ordinária não vai reconhecer. O que quero dizer é o seguinte: "a família, constituída ou não pelo casamento...", e agora estou dizendo na lei... O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Mas ai, Presidente, V. Ex.ª equipara a família de fato, com a família de direito. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não estou equiparando não. A questão da proteção que estou colocando aqui, alimento, remédio, educação para filho, etc., vejam V. Ex.ª. "A família, constituída ou não pelo casamento, terá direito à proteção dos poderes públicos." Mais, embaixo estou colocando: "Ao Estado incumbe garantir proteção ao casamento, à família, à mãe e à criança." O que estou querendo salvaguardar é o direito dos membros da família aqui em cima, e nisso ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ela tem que estar equiparada ao da outra, por que não? Temos que equiparar o direito à alimentação, o direito à cura, o direito ao remédio, à assistência jurídica ao da família constituída pelo casamento. Acho que essa proteção do Estado deve ser a mesma, apenas o casamento tem que ser salvaguardado para quem quiser casar; eu respeito isso. Sou casado, vou lutar até o fim pelo meu casamento. Acho que ele tem valor para a minha família. Só que acho que pelo fato de eu, minha mulher e meu filho termos uma família constituída, na forma do casamento, previsto na nossa lei, a proteção a nossa família tem que ser privilegiada em relação aos filhos, às crianças das outras famílias não constituídas pelo casamento. O SR. CONSTITUINTE ANTÔNIO SALIM CURIATI: – Sr. Presidente, não é excludente na mensagem. Manaus, dentro da sociedade brasileira, é a dificuldade em que está colocada a família não constituída pelo casamento, quando ela tem que proteger os seus direitos, os direitos dos membros da família, os direitos como indivíduo, como pessoa. Chega lá, diante do jurista, do homem que só entende a lei, e aí pronto. Quando se tem algum juiz que vai examinar essa questão com base em outros valores – porque a emenda do Constituinte Nelson Carneiro é excelente, não estou aqui contestando S. Ex.ª, estou colocando uma questão o então se ele não define esses valores familiares, os valores da família, vai ser o valor da família constituída pelo casamento. O SR. CONSTIUINTE NELSON CARNEIRO: – Acho que há uma contradição aqui no texto, ilustre Presidente. "A família, constituída ou não pelo casamento, terá direito à proteção do Estado." O SR. PRESIDENTE (Nelson Do meu ponto de vista, não tenho Aguiar): – Eu emendei: "família constituída, nada a opor. Apenas acho que se distingue o ou não, pelo casamento..." que não se precisava distinguir. Mas, em todo O Sr. Constituinte Nelson Carneiro caso, como se tem que falar em casamento... terá direito à proteção." mas aí vem o artigo seguinte: O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Aqui embaixo: "ao Estado incumbe "A família é constituída pelo garantir proteção ao casamento..." casamento e por uniões de fato..." O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Sem, acho que aí, no meu ponto de vista, estou inteiramente de acordo. Acho que se deve dizer isso porque, no meu entendimento, acho que a família de fato também merece proteção. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Infelizmente, o exemplo que estou buscando aqui é muito ruim para nós, ideologicamente muito ruim, porque é de um país socialista. Mas veja o que diz a Constituição da União Soviética, que é uma constituição sintética, de, um país que no nosso território cabe três vezes dentro do dele, na questão da proteção ao direito da família, eles descem a detalhes. Vejam V. Ex.as. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não, isso eu risquei. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – "Ao estado incumbe a proteção ao casamento, à família, à mãe e à criança..." O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Por que estou colocando a família? Porque estou reconhecendo o direito à proteção da família, não constituída pelo casamento. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Mas isso é uma repetição. Pode ficar só: "A família, constituída, ou não, pelo casamento, terá direito à proteção do estado", está tudo dito, não precisava repetir mais, "A família goza da proteção do porque "ao Estado incumbe garantir proteção Estado." – não falou se é constituída ou não ao casamento, à família e à mãe". pelo casamento. Mais, embaixo, diz: Se ele tem "a proteção à família, constituída ou não pelo casamento, terá "O casamento baseia-se no acordo direito à proteção do Estado", não há voluntário entre a mulher e o homem. Os porque dizer que há risco. Se ficar nisso, cônjuges são absolutamente iguais em direito, está mais do que eu queria, é o que eu nas suas relações familiares. O Estado tenho sustentado a vida inteira, não há protege à família, através da criação e divergência, no caso. Acho apenas que a desenvolvimento de uma ampla rede de reação vai ser muito maior do que o texto instituições materno-infantis, de organização e que eu sugeri. Mas, do meu ponto de vista, aperfeiçoamento dos servidores comunitários de toda a minha vida pública e parlamentar, e da alimentação pública, através de acho que a forma sugerida pelo Presidente concessão de subsídios de nascimento, de é muito mais ampla do que a minha, porque subsídios e benefícios a famílias numerosas, a dos filhos podemos dizer que os pais são bem como outros tipos de subsídios e de obrigados... Está assim. forma de auxílio à família." "A família, constituída pelo Inclusive é um texto muito mal casamento, ou não, terá direito à proteção redigido e mal traduzido, mas na verdade é o especial do Estado." seguinte: nessa questão da proteção – veja Agora eu diria: bem que estou protegendo o casamento, e quando estou protegendo o casamento... a lei "Os pais são obrigados a manter e do divórcio, quem quiser descasar ou não, educar seus filhos, ainda os nascidos fora do estou protegendo o casamento. A casamento. A lei proverá no sentido de..." minha preocupação, como advogado do fórum, que está metido nessa questão O SR. PRESIDENTE (Nelson do menor abandonado, nadando contra Aguiar): – A respeito dessas crianças, o rio Amazonas, como se estivéssemos fiz outra proposta porque veja bem, e aí nadando de Belém do Pará para agora é uma síntese para garantir 86 o instituto do direito da criança, independentemente da família; então, coloquei aqui: "As pessoas de menor idade, especialmente os órfãos e os abandonados, o Estado assegura, em regime de absoluta prioridade, os direitos inerentes à vida, à liberdade, à alimentação, à saúde, à educação, à profissionalização..." – aliás, eu fiz isso até lá no Ministério da Educação, com o apoio da Comissão Criança e Constituinte – à habitação e ao lazer, colocando-as a salvo de qualquer forma de discriminação, opressão ou violência". Crio o instituto de direito da criança aqui, uma figura de direito da criança independentemente da existência da sua família, como uma obrigação do Estado e da sociedade prover. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Se o texto for apenas esse, a gente coloca apenas o princípio de cada e acabou. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu não fiquei preocupado com a forma; eu fiquei preocupado foi em acatar as idéias, as opiniões. Mas, Senador, o pessoal já saiu, porque o nosso tempo já acabou há muito tempo. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Eu gostaria de fazer uma pequena colocação. Eu tenho muito respeito e admiração pelo nosso Senador, que tem sido um paladino na luta pela conquista e garantia tanto de liberdades como de aperfeiçoamentos jurídicos. V Ex.ª tem recebido sempre o respaldo e a admiração de toda a Nação. Queria também trazer o meu reconhecimento pela luta denodada do nosso Presidente Nelson Aguiar, a quem tenho ouvido repetidamente, e com muito respeito, e sentindo pulsar o coração quase na mesma dimensão do coração de V. Ex.ª. Eu digo quase, porque eu não tenho tido uma defesa assim tão marcada nesta Comissão, já que pertenço a outra subcomissão. Mas sempre que posso sair de lá, venho para cá, Senador, para aprender, para ouvir, e hoje, com mais razão, pela presença do nobre Senador Nelson Carneiro. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – O Deputado Eraldo Tinoco trouxe a sua contribuição, e eu gostaria de falar dois ou três minutinhos. Em primeiro lugar, como evangélico, eu defendo a separação entre Igreja e Estado, e entendo que, por mais lógicas, compreensíveis e dignas de serem seguidas as ponderações e as colocações da Bíblia, elas servirão sempre para aqueles que as acatam, aqueles que acreditam em Deus, e, como nós estamos aqui preparando uma legislação para um País como um todo, que contém, embora uma maioria cristã, mas como outros segmentos devem naturalmente se submeter à Constituição, ela deve então ter uma outra abrangência superior até àquela dos fundamentos bíblicos que nos animam, mais do que a outras, no nosso entendimento, na busca do bem comum. Então, se a lei é para todos e se nós temos que também nos ater aos fatos que aí estão, temos que ver que hoje geralmente os fatos mais encontradiços são que o casamento se forma depois do nascimento do filho ou quando se avizinha o nascimento de um filho. É pena que a gente veja isso. E incumbe muito mais às igrejas ligadas 87 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) a que denominação seja, no seu trabalho de proselitismo, no seu trabalho de ensino, as escolas e a educação hoje estão muito desvirtuadas, e não cabe ao constitucionalista analisar as razões disto nem forçar qualquer coisa através da Constituição. A Constituição, basicamente, é para estabelecer direitos que possam ser seguidos sempre. Creio, e é uma posição minha, pessoal, que como dizia Toinbel, um historiador inglês, que escreveu sobre a história das civilizações, nós vamos ter em breve o surgimento de uma nova onda que traga no seu bojo comprometimentos étnicos e morais maiores dos que os que temos hoje, até porque estamos numa fase que talvez não se admita sequer que caiamos tanto dela, em termos comportamentais. Se temos visto na pratica, como dirigente que sou da AEB – Associação Evangélica Beneficente, que cuida de 2 mil crianças, mais 76 igrejas evangélicas na sua maioria, e também católicas, que cuidam de crianças, recebendo no próprio templo, nas salas anexas, essas crianças, somando 3.600 tenho tido experiências parecidas com o que tem tido o Constituinte Nelson Aguiar. Acho também que o ideal seria que a nossa Constituição fosse sintética, lamentavelmente, ela é mais do que analítica, ela é prolixa, a atividade legiferante no Brasil só encontra paradigma na Índia que ganha da nossa, e que talvez, seja a única Nação que ganhe, no entanto, no aspecto da garantia da família, do menor e do idoso, que é o assunto primordial desta Comissão, nós só temos uma página e meia. E eu acho que esses direitos, antes e mais do que os outros, devam ser explicitados, minudentemente, para salvaguardar, como disse muito bem o nosso Presidente, lá na hora da defesa, diante do juiz, o direito da criança, desassistida sempre, e apesar de eu defender que as entidades civis, não essas que estão alinhadas em uma direção, repetindo palavras de ordem como se fossem sindicatos, todas elas, e aí não veja pluralidade nenhuma, aí eu estou com o nosso Presidente: Achar que o Estado deva encontrar, até por caráter vital, porque se a vida dessa criança não subsistir, não haverá mais direitos de garantir ou tutelar. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Só quero que V. Ex.ª me permita um aparte, só para lembrar que, quando o menor abandonado, quer dizer, o menor sem vínculo com a família, ou em estado de orfandade, cai diante do juiz, está lá diante do Dr. Juiz, o Dr. Juiz vai decidir o seu caso, não com base em uma expectativa do Direito que esteja definida, do direito dessa criança. Não há lei nenhuma que defina esse direito, porque o direito da criança é em função do direito da família; se ela está em estado de abandono, então, resta ao Dr. Juiz estender a essa criança a soberania da sua vontade e do seu saber, para dar a decisão a respeito dela. Ora, quando o juiz é um estudioso do assunto, e nós temos alguns no País, embora tão raros... Eu viajei por este País afora e tive uma experiência, por exemplo, em Teófilo Otoni, onde fiz um debate com uma comunidade lá. Disse: "Dr. Juiz, me empreste o seu Código de Menores". Ele disse: "Infelizmente eu não o tenho". Descemos para Nanuque, onde fizemos outro encontro, outra cidade de Minas Gerais. Disse: "Dr. me empreste o seu Código de Menores". Ele respondeu: "eu não tenho". Bem, os juízes das comarcas interioranas, que não são juízes de menores, mas são juízes de Direito, que também têm atribuições de juízes de menores, estão completamente alheios a esta questão, até porque o Código de Menores não é estudado nas escolas de Direito. Não existe Cadeira de Direito do Menor. Algumas escolas estão começando a instituir isto. Pois bem, lá no juizado de menores, quem tem direito é o juiz. É um negócio espantoso! O juiz é que tem direito. E ouvi isso na FUNABEM. Por exemplo: menino que já tinha vencido o seu tempo. "Dr. Juiz, o garoto fulano de tal venceu o seu tempo previsto ria norma do acautelamento." Ele disse: "deixa ele lá mais um tempo". O que é isto? Isto representa uma vergonha nacional, uma falta de respeito, exatamente porque esta criancinha não é sujeito de direito; ela passou da condição de cidadão sujeito de direito para de objeto de assistência, vigilância, proteção, desprezo e outras coisas mais. Ora, nós temos agora a grande oportunidade de, a partir do texto da Constituição, fixar a figura do direito dessa criança, para que amanhã ou depois, se eu quiser defendê-la, eu tenha em que me agarrar. Hoje eu não tenho. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Sr. Presidente, eu agradeço a V. Ex.ª o aparte elucidador que traz ao meu pronunciamento, que é único, e desejo concluí-lo, e entendo até, e admiro, a maneira apaixonada como o Presidente, que é um homem equilibrado e que sabe muito bem presidir esta Comissão, hoje esqueceu-se até de passar a Presidência a um colega, eu entendo isso e o admiro até mais por isso. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu vou só alertá-lo de que aqui nós temos uma acordo: quando um sai, outro assume, sem precisar passar a Presidência. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Então eu quero trazer isso como um gesto de admiração. Vejo a sua vibrante defesa como característica de toda uma vida dedicada ao menor, na mesma dimensão que vejo o trabalho cio Senador, com menos tempo para o Presidente, e por isso com menos louro e com menos conquistas, porém, com o mesmo ardor e com a mesma admiração. De forma que, ao concluir o meu pronunciamento, mesmo que corramos o risco desse juiz de menores não ter sequer o Código de Menores, que seria a legislação específica, seria a sua Bíblia de cabeceira, ali na mesa de trabalho, e, provavelmente, não tenha também Constituição, ainda assim, o Sr. Presidente, como parlamentar, como evangélico que é, terá o meu apoio integral. Não sou membro efetivo desta Comissão, não tenho direito a voto, mas S. Ex.ª terá o meu apoio nessa sua luta. E não sou burocrata, acho que numa reunião como esta as formalidades são prescindíveis. Então, quero deixar a minha admiração e o meu apoio. Se tivermos que exagerar por excesso, eu estou com o Presidente, embora veja nas palavras do meu mestre, Senador, a quem tanto admiro, Nelson Carneiro, desta vez eu assumo este impulso de vontade que deve suplantar até a razão, e não haverá mal nisto na minha maneira de entender. Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Eu queria apenas lembrar aqui um artigo que eu citei, e que é objeto de uma emenda que ainda não chegou aqui, que é cópia exatamente do art. 36, nº 4, da Constituição portuguesa, que diz: "Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de qualquer discriminação, e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações discriminatórias relativas à filiação" O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Acho que acrescentando os das direitas, está ótimo. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Dos direitos, sim. Essa proibição, é da lei civil, da Lei nº 3.200, mas não se cumpre. É objeto de qualquer discriminação, "e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações discriminatórias relativas à filiação". Essa é uma emenda que não chegou aqui até agora, mas foi copiada do art. 36, nº 4, da Constituição portuguesa. Acho que aquele texto inicial, sugerido pelo Presidente resume mais: "a família não constituída pelo casamento terá direito à proteção do Estado". Agora, é preciso que se diga: quanto aos filhos, não só o problema da assistência dos nascidos dentro ou fora do casamento, eles têm o dever de educar os filhos, manter e educar os seus filhos. Pode-se colocar assim: "Os pais são, abrigados a manter e educar os seus filhos, ainda os nascidos fora do casamento", e aí colocar esse artigo da Constituição portuguesa que proíbe... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estou colocando aqui, Senador, porque embaixo ficamos adstritos àquela questão, assim: "O casal gozará de iguais direitos e arcará com iguais deveres na relação familiar. O pátrio poder poderá ser exercido pelo homem ou pela mulher, subordinando-se esse exercício aos interesses dos filhos, quer de ordem material ou moral". Eu disse para V. Ex.ª, coloquei uma peça bruta para efeito de discussão, neste caso eu coloquei: "Nos casos em que os pais comprovem incapacidade para responder pelos direitos e interesses dos filhos, ao Estado incumbirá provê-las por meio de tutelas especiais". O CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – Eu acho que agora tem que colocar essa referência do nº 4, do art. 36, da Constituição portuguesa que é muito importante. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Já tenho aí um vasto material e outras contribuições também, e no parecer procurarei ser fiel à opinião predominante na comissão. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – O que eu não quero é que se repita o erro de que só o casamento faz a família. Isso não é verdade. A família é um fato natural, nasceu antes do casamento civil. Nós estamos pensando no casamento civil, porque a Constituição não pensa no casamento senão no civil. E nasceu antes do casamento civil. O casamento civil nasceu no Concílio de Trento. De modo que não é possível a gente colocar a família constituída apenas pelo casamento civil, quando isso não é verdade; nem apenas pelo casamento religioso, quando se registra. Há muitos casamentos religio- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) sos no evangélico que não ocorre isso, porque no evangélico só casa religiosamente quem é casado no civil. O SR. CONSTITUINTE FAUSTO ROCHA: – Mas o casamento religioso sempre teve sentido civil e aceito pelo civil. O SR. CONSTITUINTE NELSON CARNEIRO: – De modo que eu acho que essa redação, se vitoriosa, ressalva a luta que eu tenho tido, que é amparar essas famílias que são constituídas e que vivem muitos anos à margem da lei. Outro dia mesmo passou na televisão um casal de antigos escravos, ele com 104 anos, e a mulher com 106, que casaram no padre, e são família, têm não sei quantos filhos e netos. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Senador, V. Ex.ª não sabe o quanto nós estamos felizes por tê-lo tido aqui, V. Ex.ª nos permitiu a nossa irreverência, nos permitiu as inserções sem obediência ao Regimento, permitiu a gente chegar à minudência deste assunto que não é comum, quando nos temos aquelas conferências em que se baseiam em fatos teóricos, nos permitiu ir a fundo nesta questão, e nós estamos muito gratos pelas luzes que V Ex.ª trouxe aqui, pela forma com que colaborou, com paciência que é extraordinária no sentido de nos ajudar, e nós iremos nos socorrer de V. Ex.ª novamente quando precisarmos. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, peço a palavra para uma questão de ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ou nobre Constituinte. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Eu indago se a reunião está encerrada ou se está interrompida, para recomeçar às 17 horas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sugiro à secretária entrar em contato com todos os membros da comissão, avisando que às 17 horas teremos reunião. Prosseguiremos na discussão deste assunto. Está encerrada a presente reunião. niões vespertinas e, portanto, de colher a média das opiniões dos Senhores membros da Subcomissão, a fim de que possa elaborar o anteprojeto. Sobre o assunto, o Senhor Presidente sugeriu que o Senhor Relator apresentasse, por escrito, alguns aspectos necessários à análise dos Senhores membros da Subcomissão, para posterior discussão em plenário. Dando continuidade aos trabalhos o Dr. Daniel Barbato, médico, e Dr.ª Eleonora Menecutti de Oliveira, socióloga, respectivamente, representante do Movimento Pró-Vida de Brasília e CNDM, que discorreram sobre o tema: "proteção à gestante, à mãe e à família". A seguir, o Senhor Presidente colocou em votação a participação dos ouvintes da Subcomissão nos debates a serem travados. Ficou deliberado que os ouvintes poderiam abordar os expositores durante os debates. Concluída a exposição, o Senhor Presidente franqueou a palavra aos Senhores Constituintes para debate. Manifestaram-se sobre o assunto: Eunice Michiles, João de Deus Antunes, Iberê Ferreira, Eraldo Tinoco e Ervin Bonkoski, como membros da Subcomissão; Constituinte Benedita da Silva, as como participante, e, ainda, Sr. Marília Largura, Ana Liese Turler e Carmem Maria Souto, com ouvintes. Nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente agradeceu a presença do Dr. Daniel Barbato e da Dr.ª Eleonora Menecutti de Oliveira, dando por encerrados os trabalhos, às quatorze horas, cujo teor será publicado, na íntegra, no Diário da Assembléia Nacional Constituinte, convocando os Senhores Constituintes para a próxima reunião, a realizar-se dia trinta de abril, na Assembléia Legislativa de Vitória-ES, com a seguinte pauta: depoimentos e debates com entidades representativas daquele Estado. E, para constar, eu, Antônio Carlos Pereira Fonseca, Secretário, lavrei a presente Ata, que depois de lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar, Presidente. ANEXO À ATA DA 9ª REUNIÃO, ORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, REALIZADA EM 29 DE ABRIL DE 1987. ÀS 10:16 HORAS ÍNTEGRA DO (Levanta-se a reunião às 13 horas e APANHAMENTO TAQUIGRÁFICO, COM 35 minutos.) PUBLICAÇÃO DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO, ATA DA 9ª REUNIÃO ORDINÁRIA, CONSTITUINTE NELSON AGULAR. REALIZADA EM 29 DE ABRIL DE 1987. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): Aos vinte e nove dias do mês de abril – Havendo número regimental, declaro abertos do ano de mil novecentos e oitenta e sete, às os trabalhos desta Subcomissão da Família, do dez horas e quinze minutos, na Sala da Menor e do Idoso. Comissão de Municípios, Anexo II do Senado Estamos aguardando a presença da Federal, reuniu-se a Subcomissão da Família, Dr.ª Eleonora Menicuci de Oliveira, que está do Menor e do Idoso, sob a presidência do vindo de São Paulo. Acho que está havendo Senhor Constituinte Nelson Aguiar, com a um pequeno problema com o vôo e deve presença dos seguintes Constituintes: Eraldo atrasar um pouquinho. Tinoco, Sotero Cunha, Rita Camata, João de Nós ternos de volta o Dr. Daniel Deus Antunes, Vingt Rosado, Eunice Michiles, Barbato do Nascimento, que se inscreveu lberê Ferreira, Cássio Cunha Lima, Roberto para falar sobre a proteção do menor. Por Augusto, Flávio Palmier da Veiga e Ervin sugestão do nosso Relator vamos fazer a Bonkoski. Havendo número regimental, o inscrição dos colegas Constituintes que Senhor Presidente declarou abertos os deverão fazer as suas inserções Estamos trabalhos e solicitou fosse dispensada a solicitando aos Srs. Constituintes que façam a leitura da Ata da reunião anterior, que foi sua inscrição para os debates, a fim de considerada aprovada. Prosseguindo, o evitar o monopólio da palavra. Às vezes Senhor Presidente concedeu a palavra ao começa a ocorrer, o assunto fica muito Senhor Relator da Subcomissão, Constituinte palpitante para alguns que estão debatendo, Eraldo Tinoco, que colocou para os Senhores e terminam monopolizando a palavra e Constituintes das dificuldades em realizar reu- trazendo prejuízos para os outros. En- 88 tão, vamos seguir uma ordem de inscrição a fim de ordenarmos o debate. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, peço a palavra para uma questão de ordem. Queria pedir a compreensão dos Membros da Comissão para abordar aqui alguns problemas que estou verificando. Nós tínhamos previsto, naquele plano inicial de trabalhos, a realização de sessões matutinas para efeito de ouvirmos autoridades sobre diversos assuntos, dentro daquele cronograma estabelecido. Mas tínhamos previsto, também, a realização de sessões vespertinas, a partir das 17 horas, para o debate interno da Subcomissão, para efeito de casarmos as opiniões dos integrantes da Subcomissão a respeito de diversos assuntos. Na prática, estas reuniões das 17 horas têmse mostrado inviáveis, porque uma série de outros compromissos, sessões do Congresso, eleições de instituições ligadas à Casa, etc., têm inviabilizado essas reuniões. Ontem mesmo, a Subcomissão fez uma tentativa de prosseguir a reunião da manhã na parte da tarde e verificamos que não havia número significativo para isto. Então, a meu ver, temos que equacionar, preliminarmente, este problema. Se nós aproveitamos a própria reunião da manhã para este tipo de debate, que é de fundamental importância para o trabalho do parecer e do anteprojeto que deveremos apresentar no dia 11, isto porque algumas questões foram aqui debatidas mas em nenhum momento se pode apurar a opinião predominante da Subcomissão. Então, corremos o risco de fazermos um anteprojeto sem o balizamento da opinião média da Subcomissão e isso vai acarretar maior trabalho posteriormente, pelo número de emendas, pela dificuldade de votação deste parecer quando vier a plenário. Então, eu coloco esta questão de ordem, no sentido de reservarmos algumas dessas reuniões, talvez até hoje, se não for confirmada a presença da ilustre palestrante, para resumirmos um pouco esta primeira parte e dedicarmos á segunda parte da reunião para estas questões. Levantei aqui uma série de itens sobre os quais eu gostaria de ouvir a opinião de cada um dos integrantes desta Subcomissão. Deixo essa questão com o Presidente, com a Subcomissão, pata que possamos resolvê-la preliminarmente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – É. Como dissemos aqui este calendário de atividades não foi feito pela Presidência, foi uma decisão tomada pela Comissão. Então não poderei alterá-la. As dificuldades de nos reunirmos à tarde, já estão identificadas, devido ao número de atividades que temos que realizar, a partir da Assembléia Nacional Constituinte. Não temos pedido nos encontrar para conversar, mas temos um calendário feito: nós teríamos que cancelar algumas dessas atividades ou teríamos que estabelecer uma nova sistemática, dividindo o tempo por exemplo, metade do tempo destinado a uma parte, e a outra destinada à discussão, entra nós, membros da Subcomissão. De modo que está aí aberta a observação e a sugestão de cada um. Temos ainda proteção à gestante, à mãe, à família, 29 de abril. Destinamos três dias 3 do 4, 4 do 5 e 5 do 5, para Direitos e Deveres do Menor. No dia 30 nós estaremos no Espírito 89 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Santo. Já está feita toda uma programação. Viagem marcada, meio de condução conseguido, hospedagem preparada no Estado, e comunidade convocada. Vamos dar este tempo lá. Ai nos resta 4 do 5, 5 do 5, 6 do 5º Sistema de adoção – eu acho que este era um ponto que nós poderíamos, quem sabe, resumir, suprimir, neste dia, já que nós temos apenas uma questão que me parece complexa. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Eu vou colocar de uma forma mais concreta a minha proposta. É que nós dedicássemos 30 minutos desta sessão para ouvirmos o convidado inscrito e depois passaríamos a este debate interno da Subcomissão e, na oportunidade, eu apresentaria aqui uma série de questões que, prioritariamente, eu gostaria de ouvir os integrantes da Subcomissão. Caso a outra convidada compareça, aí nós dedicaríamos a reunião de outro dia. Mas a importância de definirmos logo esta questão Sr. Presidente, porque isso já facilitaria para o avanço dos trabalhos do Relator, para estas questões que já foram objeto de exposições e debates aqui nesta Subcomissão. Quer dizer, inclusive talvez pudéssemos adiantar a parte do anteprojeto antes mesmo da entrega oficial, para que sugestões já fossem surgindo, como eu disse aqui, e faço questão de reafirmar com muita ênfase, não desejo em hipótese alguma fazer um trabalho a duas mãos. Eu quero fazer na medida do possível, um trabalho em que haja uma participação efetiva de todos os membros desta Subcomissão. Acredito que é uma forma mais democrática e mais produtiva de realizarmos o nosso trabalho. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sem oposição acatamos a sua sugestão. Passamos a palavra então ao Dr. Daniel Barbado pelo tempo de 30 minutos. O SR. DANIEL BARBADO: – Sr. Presidente. Srs. Constituintes, um tema atualizado para o Brasil, o da assistência materno-infantil. Todos os países que conseguiram um bom desenvolvimento exerceram essa medicina preventiva a nível dessa assistência. E esta assistência começa na fase pré-nupcial, em que a saúde do casal é avaliada por especialistas. Em realidade, quando se faz um programa e eu não conheço no Brasil, um programa nacional, que se preocupe em qualificar uma gestação, para que se possa criar um indivíduo sadio; é muito importante para a Nação que ela tenha uma população sadia. Eu me lembro, quando fui fazer um curso no Rio de Janeiro, de um ano, disseram-se que o Brasil para se tornar uma grande potência só falta ter uma grande população. Porque um grande território ele tem. Mas o que adianta ter uma grande população, se essa população em sua porcentagem grande não é saudável? Então, nós ternos que nos preocupara com a qualidade do "conceptu" desde o momento em que se iniciou a gravidez até o momento em que ele chega à fase adulta no pós-natal. Essa e uma política desenvolvida por todos os países, que atingiram um grau de economia elevada. Porque tem uma população sadia. Os Srs. não imaginam que hoje em dia o INPS tenha um gasto enorme para atender a essa população que nem produz em muitos casos. Então, a assistência materno-infantil tem que ter a preocupação primordial de qualquer serviço de assistência médica à população. E ao Governo cabe se preocupar com essa assistência médica. E a assistência médica não se preocupa apenas com o desenvolvimento da gravidez normal. Preocupa-se até com o futuro do "conceptu". Existem regiões no Brasil em que o problema da falta de assistência materno-infantil está tão grave que estão nascendo crianças, que não atingem o desenvolvimento normal, nem na sua altura nem no desenvolvimento do seu encéfalo. Por que isto? É falta de uma assistência médica e alimentar durante a gravidez. O conceptu não recebe aqueles alimentos necessários para o seu desenvolvimento. Deve-se notar que uma vez ocorrida a concepção, ali cessa o fornecimento de qualquer outro elemento para o ser concebido. Ele começa a fazer o seu desenvolvimento, através do recebimento de material provido da própria mãe. E é por isto que a mãe tem que ser assistida cientificamente, – nós temos que largar o problema de mamdorismo em Medicina. Temos que assumir uma gravidez para a própria saúde da mulher e para que nasça um indivíduo em boas condições. Meus amigos, eu tenho conhecido várias regiões deste País e os Srs. não têm que imaginar que o Brasil é Rio de Janeiro central, é São Paulo central, é Brasília central, Belo Horizonte central, e Manaus central. Os Srs. têm que estabelecer medidas para uma grande população que vive alheia de toda essa proteção, em real, junto à Medicina. Temos que pensar – isto eu falo sempre porque foi onde eu fiz o melhor programa da minha vida médica, a que foi no médio-Purus. Nós temos que pensar naquela população, que é chamada de população preguiçosa porque ela é portadora de anemia verminótica, desde o momento em que nasce, porque o marido e a mulher também são portadores de uma anemia. E são incapazes de fornecer o material necessário para o desenvolvimento normal dessa criança. Isso acontece no interior de Mato Grosso, no interior do Amazonas, também do Pará, e de Minas Gerais. E é assim que nós temos que pensar. Porque e nós teremos uma população em que o gasto com a saúde será muito menor, o gasto com a educação será muito melhor, porque a capacidade de aprendizado dessa criança será maior e em menor tempo. Eu leciono na Faculdade de Medicina e conheço as pessoas pela sua produção. São 25 alunos, os conheço a todos. E os separo pela velocidade do aprendizado. Não é pelo condicionamento, mas pela fixação do conhecimento adquirido. A gente observa que varia de pessoa para pessoa, porque de pessoa para pessoa houve diferença de assistência materno-infantil. Na Itália, o ilustre Professor Cacaccí se preocupou muito cedo com a qualidade de vida da população italiana. Formou um instituto em Nápoles e depois ele se transferiu para Turim. E foi ele que, pela primeira vez na Itália, falou em qualidade de vida de mãe e de filho e isso se alastrou. Isso é uma verdade cristalina, porque, por má alimentação da gestante, da assistência permanente à gestante, nós vemos nascer crianças com más formações congênitas que representam um gasto enorme para a Nação. A própria gestante com duas, três, quatro gestações entra num estado de pauperismo orgânico. E, cabe ao Estado fazer esse controle, mas com competência. E um assunto muito sério para produção e para a riqueza nacional ter uma população sadia. Nós não podemos pensar em desenvolvimento de uma gravidez, sem assistência medica competente. Mas esse direito inalienável que a mulher tem que ter, não deve se restringir às grandes cidades. Deve-se preocupar com o interior do Brasil, porque esse interior produz muita riqueza à custa de muito sacrifício dessa população. Eu concito os Srs. Constituintes a se preocuparem fundamentalmente com essa assistência materno-infantil. No Ministério da Saúde existe um Departamento de Assistência Materno-infantil que tem que ser apoiado economicamente. Tem que ser apoiado com profissionais competente. Porque com a população sadia nós vamos ver que este País vai resolver muitos dos seus problemas. E o INPS, através do INAMPS, deixará de ter que resolver muitos problemas da saúde, em nível de infante e em nível de adulto. Porque muito triste para a gente que trabalha na anatomia, na faculdade, quando abre o cérebro de uma criança que provém de uma determinada região do Brasil, ver um encéfalo menor do que aquele que vêm de outras regiões ricas do Brasil. E cabe a nós não esperar pelo futuro, estamos cansados de esperar pelo futuro. Cabe a nós tomarmos atitudes, hoje, nesta Constituinte, para melhorarmos a saúde da população brasileira. Só assim poderemos contribuir com alguma coisa para que essa Nação se torne rica. Sem pessoas competentes e com saúde, pois a saúde é o sustentáculo da vida humana, sem saúde não se aprende, sem saúde não se cria, o dia que nós tivermos uma população que seja capaz de produzir, ninguém mais poderá segurar esta Nação. É preciso compreender que os serviços médicos são mal pagos, eles não têm motivos para fazer uma assistência de casa em casa, nem um planejamento para isso, e nós temos que ter uma Medicina agressiva junto à população. Eu quando vi no Amazonas, crianças subnutridas, porque diziam que as frutas de lá faziam mal, que o limão fazia mal, que o ovo fazia mal que a carne fazia mal e não comiam por causa disso, isso é falta de educação, é falta de participação da sociedade, que se especializou em agredir essa população. Devemos dar assistência essa população; e preocupando-nos desde a concepção, nascimento, à fase do infante, nós vamos ter um adulto competente, com saúde. Os gasto do INPS serão muito menores. Essa a mensagem, Sr. Relator, que eu queria trazer para os Srs., é a minha preocupação com a qualidade de vida do ser concebido, e nós não podemos ter um ser concebido com qualidade de vida, se não dermos assistência real, não poética, não escritos, mas de fato, a toda mulher se engravida no Brasil. Assim nós vamos ter uma população sadia. Muito obrigado pela sua atenção. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós temos três Srs. Constituintes inscritos, a Constituição Eunice Michiles, a Constituinte Rita Camata e o Constituinte João de Deus. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Sr. Presidente, uma outra questão de ordem. Nós temos dois aspectos, o primeiro é considerar se em relação ao pronunciamento do Dr. Barbato, essas intervenções seriam interpelações ao palestrante. E caso não sejam, digam respeito à temática mais ampla, eu gostaria de, antes, oferecer aqui algumas dúvidas que levantei, que poderiam subsidiar essas discussões. Então, acho que caberia a manifestação de cada um seé a respeito do assunto tratado, ou se já poderíamos passar àquela segunda etapa dos trabalhos, dentro de algumas preocupações que foram aqui levantadas. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem. Nós verificamos, ao longo de todos esses dias, que uma série de temas foram abordados aqui em palestras, em discussões, mas sem que tivéssemos uma possibilidade efetiva de conhecer o pensamento de cada Sr. Constituinte integrante da Subcomissão, a respeito desse tema. Parece-me que seria de grande validade que, neste momento, nós pudéssemos fazer uma espécie de apuração de opiniões a respeito dessas questões. Por exemplo, tratamos aqui do problema do planejamento familiar. Quais as dúvidas suscitadas em relação a esse tema? Primeiro, deve ser um planejamento familiar, um princípio consagrado na nova Constituição? Nós deveremos mencionar no texto constitucional que o planejamento familiar é um princípio que deve ser adotado pela sociedade brasileira? Caso essa resposta seja afirmativa quais os limites da interferência do Estado neste problema? Deve ser um planejamento obrigatório e o Estado funcionar como elemento de fiscalização e de acompanhamento dessa obrigatoriedade? Deve ser o planejamento familiar uma prerrogativa do casal? Do homem e da mulher estabelecerem, de uma forma adequada, o número de filhos, o espaçamento entre esses filhos, etc.? Se for este o pensamento, qual deve ser a interferência do Estado neste ponto? Apenas fazendo um amplo processo de educação, para que as pessoas se conscientizem da validade, da necessidade, da importância de refletirem e decidirem a respeito do tamanho e da composição da sua família? Deve o Estado interferir nos meios à disposição dos casais para a prática do planejamento familiar? Nós vimos aqui a discussão e apresentação de muitos métodos te de limitação dos nascimentos, métodos anticoncepcionais e me parece que seja uma questão óbvia que a Constituição não deva descer a esse detalhe, se o método "a", ou o método "b" seja a o mais adequado, mas a indagação que se faz, e que me parece, se a questão for considerada, caberia no texto, é definir se, por exemplo, o Estado deve colocar à disposição das pessoas, da famílias os meios científicos disponíveis para a prática do processo anticoncepcional. Então, parece-me que essas questões são questões fundamentais na definição desse tema Planejamento Familiar, e outros que possam ser acrescentados. Eu aqui apenas coloquei alguns pontos de dúvida, e gostaria de ouvir a opinião de todos os integrantes da Subcomissão. O segundo ponto, que foi muito discutido, o Conceito de Família. Deve no texto constitucional figurar as formas de constituição de família, quer dizer, lembro ai algumas propostas, como por exemplo a proposta do Conselho da Mulher a que reza: "a família instituída, civil ou naturalmente, tem direito à proteção do Estado, etc., etc., a proposta da Comissão Afonso Arinos diz, textualmente: "a família constituída pelo constituída pelo casamento, ou por uniões estáveis baseada na igualdade entre o homem e a mulher, terá a proteção do Estado". A proposta do Senador Nelson Carneiro é de que não houvesse no texto nenhuma caracterização desta forma de constituição da família. Então é uma questão que merece efetivamente a apreciação da Comissão. Se isso deve figurar no texto ou não, e se deva figurar, se devemos num texto constitucional limitar apenas a forma de constituição da família, o casamento, se devemos incluir essa expressão uniões estáveis ou da forma proposta pelo Conselho das Mulheres, "instituída naturalmente", enfim, qual o enfoque? Qual o pensamento dos integrantes da Subcomissão a respeito deste item? Merece a família a proteção do Estado? De que forma esta proteção deve ser consignada? Os direitos dos cônjuges devem ser direitos iguais, mencionados de uma forma ampla? Ou deveremos descer a detalhes, como esta também na proposta do Conselho da Mulher, que o homem e a mulher têm plena igualdade de direitos e deveres que dizem respeito à sociedade conjugal, ao pátrio poder, ao registro de filhos, à fixação do domicílio da família e a titularidade e administração dos bens do casal. Nós devemos descer a esses detalhes no texto constitucional ou não? O problema dos Direitos dos Filhos devem ser iguais direitos para os filhos legítimos e os ilegítimos, os nascidos fora do casamento? Como deve figurar a questão do registro civil? Essa questão foi levantada aqui diversas vezes. A questão da mãe solteira. Os filhos, que não são conhecidos os seus pais, de que forma devem ter acesso ao registro civil? Se isso também deve figurar no texto constitucional. O problema do aborto é uma outra questão. Deve figurar o aborto no texto constitucional, ou não? Devemos dizer na Constituição que a prática do aborto é livre, totalmente aberta? Ou somente nos casos de exceção, como o aborto terapêutico, e o problema do aborto provocado por violências sexuais? Deve haver uma proibição total do aborto no texto constitucional? Enfim, vejam que nós temos uma tarefa de definir todas essas questões. A Comissão vai ser chamada, formalmente, a votar a respeito do texto que venha a ser apresentado, mas acho que seria muito útil o esclarecimento desses pontos. E gostaria de ouvir a opinião de um por um dos integrantes da Comissão, a respeito dessas e de outras preocupações. Para isso, Sr. Presidente, eu sugiro o seguinte, que para uma primeira rodada de opiniões, seja permitido que cada Constituinte, usando aí um tempo de 15 minutos, ou outro tempo que seja deliberado, possa expressar as suas opiniões, naturalmente com a possibilidade do aparte, se o orador conceder, mas evitando-se interrupções, fora da ordem da inscrição, para que os nossos trabalhos tenham uma seqüência mais adequada, e possamos, inclusive, captar com mais facilidade essas opiniões. É a questão que gostaria de levantar e sugerir à Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quero acrescentar uma sugestão, então, Constituinte Eraldo Tinoco. Eu acho que a sua preocupação é válida no sentido de elaborar um texto que cor- 90 responda à média das opiniões dos Srs. Constituintes, para que não tenhamos aqui uma luta muito intensa na hora de debatermos o seu parecer. Então, eu sugeriria que, para facilitar inclusive a minha compreensão, o meu trabalho individual e, naturalmente, dos Srs. Constituintes, que o nobre Relator levantasse as suas dúvidas por escrito, quer dizer, aqueles pontos que ele considera de conflito, e entregasse a cada um de nós, para que pudéssemos, inclusive, fazer um estudo intenso a respeito, uma indagação mais profunda, e poderíamos até formalizar, por escrito, a nossa opinião. No momento adequado nós faríamos o debate aqui, e teríamos o nosso documento escrito para encaminharmos ao Sr. Relator. Porque poderá ocorrer o risco que eu defenda uma tese aqui, pelo simples uso da palavra, e minha palavra fique ao vento. Eu gostaria, então, que o elenco dessas dúvidas pudéssemos ter em mãos, a fim de que pudéssemos colocar a nossa particular posição a respeito das dúvidas suscitadas. Então deixo essa sugestão: que o Sr. levante todos os pontos considerados conflitantes, como resultado do que já se ouviu aqui, com respeito a essas questões todas levantadas agora e outras ainda, para que, então, até a época aprazada, possamos fornecer a nossa posição pessoal por escrito, inclusive para que o Sr. Relator, lendo-as, possa com mais facilidade tirar as suas dúvidas. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Eu concordo inteiramente com a sugestão do Presidente, até porque, tanto o Relator pode escrever todas as suas dúvidas, etc., como todos nós poderemos também opinar, nos preparar sobre cada um desses assuntos levantados. O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Presidente, eu gostaria de aproveitar a oportunidade para apresentar também uma sugestão, que a meu ver poderá facilitar os nossos trabalhos, ordená-los, e torná-los mais eficientes. No tocante aos debates, que já foram realizados, eu gostaria de sugerir que fossem feitas as inscrições prévias para os Constituintes que quisessem fazer uso da palavra, com limitação do tempo para as perguntas e respostas, para que possamos fazer um debate mais proveitoso, e não apenas emitir opiniões esparsas, como ocorreu. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Acabo de inscrever o Constituinte Cássio Cunha Lima. O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA: – Muito obrigado. E para que possamos fazer, através das inscrições, as nossas colocações com tempo limitado, e as respostas também com tempo limitado, para que possamos tirar maior proveito dos debates que estão sendo realizados aqui na nossa Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem. Muito boa sugestão. Aliás, já havia sido feita pelo nosso Relator. E nós já estamos tomando essa providência. De modo que já temos quatro Srs. Constituintes inscritos, e outros que desejarem debater, está aberta a inscrição. Há uma pergunta feita, agora, que não consta do Regimento e que, naturalmente, eu não posso responder. O público que nos assiste pergunta se haveria possibilidade de qualquer pessoa fazer uma indagação. Esta matéria é alheia ao Regimento. 91 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Eu não poderia deliberar a respeito sem antes ouvir a opinião dos nossos colegas, membros desta Subcomissão. Também já temos presente a nossa debatedora, Dra. Eleonora Menecuri de Oliveira, que está presente. E desta forma então cumpriremos o calendário que está estabelecido, ficando para posterior deliberação a proposta feita pelo nosso Relator. Então, está aberta a formulação de opiniões, se devemos, ou não devemos e de que forma permitir que as pessoas da assistência interfiram no debate, através das suas perguntas. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Se me permite. (Assentimento do Presidente.) Eu penso que os presentes, que acompanham os nossos trabalhos, poderiam ter a oportunidade de abrirmos um espaço para dois deles fazerem perguntas, indagações, para que eles não sejam meros ouvintes, e na expectativa que eles têm, possam tirar as dúvidas, o que poderá também nos trazer subsídios para a complementação dos nossos trabalhos. O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA: – Sr. Presidente, eu gostaria de saber, fugindo um pouco do assunto, se existe alguma pauta elaborada para a reunião que será realizada amanhã no Espírito Santo, da nossa Subcomissão? O SR. PRESIDENTE: (Nelson Aguiar): – Bom, há uma expectativa muito grande, segundo os contatos telefônicos que temos feito, e há várias entidades que comparecerão, como a Associação do Voluntariado que vai estar presente, o Movimento dos Menores de Rua, o Movimento dos idosos, e outras entidades que irão comparecer. De modo que a nossa idéia é instalarmos os trabalhos às 10 horas, deveremos chegar às 9; às 10 horas chegaremos lá para a primeira fase dos contatos, às 12 horas iríamos para o almoço e às 14 horas retomaríamos para, até às 17 horas, ouvirmos a sociedade. Esta parte não ficou ainda decidida, como é que vamos nos conduzir no Estado do Espírito Santo, porque ainda não sabemos o número de entidades que teremos presentes. A nossa idéia, a idéia do Presidente é no sentido de que não vamos ao Espírito Santo para falar, nós vamos ao Espírito Santo para ouvir e para recolher as propostas e ouvir posições que a sociedade tenha a apresentar. Naturalmente muitos dirigiram as suas perguntas aos Srs. Constituintes, mas me parece que o que está programado lá, pela Assembléia Legislativa é que parte da manhã as entidades seriam apresentadas, e havendo tempo, já começaremos os debates. Na parte da tarde, então, estaremos dedicando três horas aos debates, às discussões e ao recebimento do material das propostas que os capixabas tiverem apresentado. De modo que a sistematização dos trabalhos nós teremos que fazer lá, porque não sabemos sequer ainda o número de entidade que deverão comparecer, a respeito do pedido feito pela assistência. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, eu voto de acordo com a sugestão do Deputado João de Deus, na qual ele sugere que duas pessoas... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas veja bem, nós estaríamos abrindo uma concessão e estaríamos estabelecendo uma restrição que me parece, no meu modo de ver, não seria adequada, porque nós estaríamos discriminando aquelas outras que tivessem propostas a fazer ou perguntas a fazer e não tivessem ocasião. O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – Sr. Presidente, então eu sugiro um determinado tempo para que os ouvintes possam se pronunciar. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaria ainda de discutir essa questão porque ela traz implicações, nós poderemos ter aqui uma assistência de 50 pessoas e todos eles quererem... O SR. CONSTITUINTE VINGT ROSADO: – Pela ordem de inscrição, Sr. Presidente, nós temos 10 minutos, por exemplo, para os ouvintes, ainda fazerem as suas indagações, eles podem se inscrever com o Secretário da nossa Comissão, evidentemente que dentro de um limite. Se tem 50, mas se só se inscreveram 10, os 10 primeiros terão oportunidade. Eu acho que essa é uma questão a ser resolvida democraticamente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Estou de acordo, desde que haja essa limitação de tempo. Qual foi a proposta do Constituinte lberê, seja de quantos minutos? A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – O tempo restante; isto é, nós usamos o nosso tempo com os pronunciamentos dos Constituintes e o tempo que sobrar seria aberto ao debate. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Inaudível, (fora do microfone). Concordo em que a assistência possa ser, por liberalidade ouvida, fazendo também as suas indagações, desde que haja realmente a limitação de tempo, porque podem ser poucos e pode ocorrer que sejam muitos. Então, desde que haja uma limitação de tempo, isso não prejudicaria a marcha normal dos trabalhadores dos Constituintes. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem, então tem primazia os Srs. Constituintes, após a exposição da nossa debatedora, nesta manhã, nós então ouviremos os Srs. Constituintes inscritos e a partir daí, ouviremos as pessoas que também quiserem fazer as suas perguntas. Peço a nossa Assessoria que providencie, então, a inscrição das pessoas que gostarão de formular suas perguntas. Concedo a palavra à nossa expositora desta manhã, que tem prazo de até 30 minutos para fazer sua exposição. A SRA. ELEONORA M. OLIVEIRA: – Em primeiro lugar, eu gostaria de cumprimentar a Mesa Diretora, o Sr. Presidente, os Constituintes aqui presentes e em especial as duas Constituintes Eunice Michiles e Rita Camata, as mulheres aqui presentes, que eu acho de suma importância, e agradecer ao Conselho Nacional da Produção feminina por ter proporcionado que eu, como pessoa do movimento feminista, esteja aqui presente para colocar algumas questões que eu julgo de suma importância sejam discutidas nesta Subcomissão. Eu estou aqui em primeiro lugar, como mulher como feminista, como cidadã, mãe de dois filhos e eu sou professora da Universidade Federal da Paraíba, da área de ciências sociais, atualmente deslocada para a área de ciências de São Paulo, USP e Membro do Coletivo Feminista de Sexualidade e Saúde de São Paulo. Deve ser importante, sem dúvida nenhuma, discutir nesta Comissão que se dê ao menos à proteção à mãe e, à gestante e à família. Pri meiramente é uma questão que não podemos, nós mulheres, pensar na proteção à mãe, à gestante e à família, sem tocar no direito à escolha da maternidade. Esta maternidade optada é aquela maternidade que vai gerar decorrências na vida da mulher e na vida dos filhos que esta mulher colocar no mundo. A outra questão importante é que gostaríamos que fosse discutida a saúde de uma nova forma, de uma forma reconceituada. Não a saúde como produção de doenças, ou seja, só pensar na gestante, na mulher é após a produção de alguma doença e após considerar o parto ou a gestação como um estado doentio da mulher. Nisto a gente considera que reconceituar a saúde significa, para nós, pensar a saúde como algo dinâmico e indivisível, quando se mantém as condições de equilíbri o entre o estilo de vida de cada indivíduo, idade e sexo e as condições do meio ambiente no qual este indivíduo está inserido e fundamentalmente após esta reconceituação, ver a saúde do ponto de vista integral, considerando três aspectos, bio, psíquico e social. Então o que nós mulheres entendemos pelo aspecto bio? O aspecto bio nos dá a integridade da biologia da mulher. O aspecto psíquico, tem que considerar toda a parte emocional, toda a parte psíquica, toda a parte sensível, toda a sorte de tensões, em que nós mulheres vivemos, ao longo do nosso processo reprodutivo, ao longo de nossa história de vida. E o aspecto social? Evidentemente que nós mulheres não podemos pensar na integralidade da saúde, sem pensar no aspecto social, ou seja as condições sociais em que a mulher, hoje no Brasil, está inserida. Posto isto, vou introduzir uma nova questão que é a questão da sexualidade, porque nós não gostaríamos que esta Comissão deixasse de pensar na questão da sexualidade, na questão da sexualidade articulada com a questão da saúde. Por quê? Isto porque nós queremos descolar a sexualidade, unicamente do ponto de vista reprodutivo. E eu acho que é de suma importância discuti r essa questão da reprodução, do descolamento da sexualidade feminina, na questão da reprodução, nesta Comissão, posto que eu já coloquei anteriormente do direito à livre maternidade. Ou seja, a escolha de opção. E o que nós entendemos como direito à maternidade livre? O direito à maternidade livre, não é só um direito à escolha, mas para que este direito à escolha seja realmente possível, o que nós temos colocado como fundamental? Não é apenas ter ou não ter filhos ou apenas interromper uma gravidez indesejada, não é isso. É exatamente que o Estado assuma os direitos que a ele cabe enquanto mantenedor da saúde da mulher, e quais são esses di reitos? Propiciar à mulher o acesso a todos os métodos e a informação sobre os métodos contraceptivos e não só as informações sobre os métodos, mais acesso aos métodos, propriamente ditos, para que a mulher possa, não só, depois de ter acesso às informa- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) ções, optar por um desses métodos e ter na rede pública o método adequado, escolhido pela mulher ou pelo casal. É isso por quê? Porque o método, o acesso às informações sobre os métodos, passa pelo direito que a mulher tem reivindicado ao longo de muitos anos, na história do movimento de mulheres, no Brasil, o direito à informação sobre seu corpo. A informação sobre seu corpo diz, basicamente, como funciona esse corpo, porque a mulher que adquire, que conquista essas informações, ela está conquistando um patamar no direito à cidadania, porque ela vai modificar a relação com os médicos da rede pública do INAMPS, na Previdência Social. Ela vai poder se colocar como cidadã, reivindicando melhoria na qualidade da prestação dos serviços da rede pública. O acesso aos métodos fará com que a mulher escolha juntamente com marido, com seu companheiro, o método que melhor adequar à sua condição biopsíquica e social. E, escolhido este método, ela poderá ter uma maternidade opcional, uma maternidade mais saudável e colocar no mundo filhos desejados e não filhos indesejados. A outra questão fundamental é a questão do pré-natal digno em todas as redes de saúde deste País. Nós temos hoje, a nível de um programa de saúde, o PAISME, que todos os Senhores, de uma forma ou de outra, já devem ter acesso, pelo menos é o que se constou nesse programa, Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher. Este Programa é fruto das lulas do movimento de mulheres e o princípio, a filosofia que norteou esse Programa é a filosofia que nós mulheres reivindicamos no tratamento à nossa saúde. Agora, eu pergunto por que esse Programa não foi implantado? Por que esse Programa não foi implantado no maior Estado do País que é o Estado de São Paulo? Ele não foi implantado porque não lhe foi dada uma força política suficiente para que ele fosse implantado. Ele ficou na amarras da burocracia estatal. E a sua implantação, apenas no Estado de Goiás e no Estado de São Paulo, foi absolutamente embrionária. Mas nós reivindicamos aqui e sustentamos o PAISME como um programa fruto das nossas reivindicações, programa esse onde os princípios e filosofias são aqueles que nós estamos defendendo hoje aqui. E é difícil, nós sabemos, um programa dessa monta ser implantado num País tão grande como este, com toda a falta de recursos. E eu estou falando aqui, também porque faço parte da Comissão Nacional de Estudos dos Direitos da Reprodução Humana, ligado ao Ministério da Saúde, uma Comissão que assessora o Ministério da Saúde nas questões pertinentes à saúde e à sexualidade. A outra questão fundamental que nós gostaríamos de colocar aqui é a questão da interrupção da gravidez indesejada, prevista rio art. 128 do nosso Código Penal, que fosse regulamentada pela rede pública a partir de um parecer do eminente jurista, Dr. José Carlos Dias, de São Paulo, dado na última reunião do mês passado da Comissão Nacional de Estudo dos Direitos Reprodutivos, que recupera a credibilidade da queixa policial como o primeiro passo para que a mulher estuprada e a mãe que corre risco de vida pudessem fazer um aborto e acobertasse o médico que o fizesse, porque essa questão tem sido muito polemizada. É uma questão difícil, é uma questão que consideramos difícil, mas consideramos de suma importância para que esta nova Constituição que vai ser outorgada neste País não deixe para trás coisas que já deveriam estar em andamento. A outra questão é a interrupção de uma gravidez indesejada a nível terapêutico, que não é prevista no Código Penal. Isto nós consideramos importantíssimo que seja discutido com toda a seriedade, porque cabe à mãe e ao pai, ou ao casal, a decisão de ter ou não um filho que não foi diagnosticado anteriormente como um filho com problemas graves de saúde e isso é possível pelo exame do líquido amniótico e nós temos alguns centros de saúde que fazem com muita competência, embora na rede pública isso ainda esteja absolutamente aquém dos nossos desejos. A outra questão que eu gostaria de colocar é a questão do aborto como saúde pública. Gostaria de colocar como discussão, porque é importante que toda sociedade civil hoje discuta, para que e sociedade civil se manifeste. Acho que é esta a minha função aqui e não poderia pensar em discutir uma questão tão importante como a proteção à mãe, à gestante e à família, sem passar por cima da exigência que o Movimento de Mulheres tem feito para que as Comissões que abordem essas questões discutam. A questão da saúde para mim, hoje, é uma questão que tem que ser vista de uma forma integralizada, porque nós mulheres estamos já cansadas de sermos particularizadas e definidas como fragmentos doentes. Então, nós vamos tratar da menopausa, nós vamos tratar da adolescência e nós vamos tratar da fase reprodutiva da mulher como fases doentias dessa mulher? Essas fases reprodutivas não são fases doentias, são fases saudáveis da mulher. E para que seja considerada como saudável, é necessário que se reconceitue a saúde neste País. A reconceituação, para nós, parte desse ponto de vista da visão integralizada, considerando os aspectos biopsíquicos e sociais, porque, a partir do momento em que você considera que a mulher não pode ter um parto natural, que na rede pública não pode favorecer, implantar um parto natural, porque o parto tem que ser ou cesariana, para favorecer uma quantidade enorme da indústria de cesáreas neste País, porque nós temos dados que comprovam a indústria de cesárea neste País e isso não pode continuar existindo, não pode continuar sendo uma prática neste País, porque as seqüelas que se deixa no corpo da mulher são enormes. Tanto se deixa seqüelas pela prática de cesárea, como se deixa seqüelas pela prática de aborto mal feito, porque o aborto hoje neste País é clandestino e é exatamente pelas condições em que ele é feito que nós mulheres estamos chamando a atenção para isso. E estamos chamando a atenção não é nem pelo número exorbitante de mulheres que morrem em função do aborto mal feito, mas exatamente pelas seqüelas que deixam a nível de saúde no nosso corpo. Então, esta Subcomissão, que trata da maternidade, não pode deixar de considerar essas questões. Por último, gostaria de colocar uma questão que para nós é fundamental, que é o seguinte: Recuperar, para nós mulheres, o saber sobre nosso corpo, que nos foi expropriado há séculos e 92 séculos na história deste País pela Medicina. Recuperando este saber sobre nosso corpo, estamos também recuperando o controle sobre ele. Porque um País onde não se tem acesso ao saber, em todos os níveis, é um País de ignorantes, um País de analfabetos e um País sem cidadania. E nós estamos aqui reivindicando, através da saúde, o direito à cidadania, a cidadania plena. E a cidadania plena não é apenas o direito de voto, que nós mulheres já conquistamos, mas é o direito de decidirmos não só sobre o que afeta o nosso corpo, mas o direito de decidirmos sobre as condições e a qualidade da prestação do serviço público neste País. E queria dar um testemunho aqui, porque eu trabalho com a saúde, embora não seja médica, mas trabalho há 15 anos com a saúde da mulher e no ambulatório do qual faço parte, que se chama Coletivo Feminista de Sexualidade e Saúde, nós prestamos consultoria tanto para a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, na implantação do PAISME, como ao Ministério da Saúde. E o que acontece? O que nós vemos hoje na rede pública? O que vemos, primeiramente, a nível dos métodos contraceptivos, é a total falta de existência desses métodos. Por exemplo, o diafragma já existe na rede pública, mas não há médicos capacitados para medir o diafragma. E é um método que não tem a menor seqüela e não tem a menor contra-indicação para a mulher. E estou colocando isso, porque eu queria colocar, como mulher aqui, uma questão que nos parece fundamental e a coloco de dentro de mim, coloco isso não a nível teórico, mas a nível de dentro, de emoção, porque o que acontece é o seguinte: Os métodos falham, não são tão eficazes como se diz a nível da ciência. E, se os métodos falham, o que é dado à mulher de possibilidade de escolha a não ter o filho? Para que esse filho nasça é necessário que o Estado dê todas as condições, não só para o nascimento desse filho a nível de pré-natal, a nível de acompanhamento médico desse filho, como da mulher, mas, do ponto de vista geral, do ponto de vista social, do ponto de vista da educação, do ponto de vista da moradia, do ponto de vista do emprego. Mas, neste momento, nós mulheres aqui reivindicamos o que nos toca do ponto de vista da saúde. Eu ficaria no momento por aqui, absolutamente disponível para responder qualquer pergunta ou qualquer esclarecimento, reforçando meu agradecimento por poder estar aqui, pela primeira vez, como militante do Movimento de Mulheres. O SR. PRESIDENTE (Roberto Augusto): – Está inscrita, primeiramente, a Constituinte Eunice Michiles. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Quero, em primeiro lugar, em relação à exposição do Dr. Barbato, fazer apenas considerações, não serão propriamente perguntas ou questões. Nós sabemos, por dados da UNICEF, que 65% das mortes infantis do Terceiro Mundo não acontecem no Brasil. E que no Brasil, pelo menos 60% de todas as crianças sofrem de algum grau de desnutrição. E eu gostaria de ouvir de V. Sª que nós temos que pensar no Brasil não em São Paulo, Rio, Manaus etc., mas no Brasil, como um todo. Então, não adianta sofisticar, não adianta querer as coisas perfeitas, se elas atingem ou podem atingir apenas uma amostragem Então, nós 93 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) temos que ter realmente os pés no chão, precisamos saber aquilo que pode atender a toda a população a que se destina, de uma maneira prática e que realmente chegue lá. Senão nós ficaríamos sempre naquela coisa de amostra grátis. Então, queria apenas lembrar o seguinte: acho que a desnutrição no Brasil é muito mais em função do desconhecimento das pessoas, especialmente das mães de famílias, do que mesmo da nossa pobreza, da nossa carência. Numa ocasião, eu tive oportunidade de fazer um discurso no Senado, falando sobre sugestões alternativas de alimentação e em alguns dos apartes os Senadores diziam assim: eu acho que nós temos realmente é que aumentar o nosso salário mínimo, que é um salário indigno. Nós temos que realmente partir para uma Reforma Agrária, enfim outros métodos corretos, mas que vão acontecer quando? Quando nós chegaremos a isso? E, como mulher e mãe de família, que procura uma coisa mais prática, eu faria a seguinte pergunta: não seria o caso de nós deflagrarmos neste País um grande, um correto, um bem estruturado programa de educação alimentar. Veja bem por que eu digo isto: esteve aqui conosco há uns dois anos, o Secretário de Saúde do município de Matão, São Paulo, que expôs em poucas palavras o seguinte: que um dos prefeitos anteriores ao atual tinha se proposto a não fazer pontes, não fazer nada, mas alimentar a população. Arranjou uma vaca mecânica e começou a distribuir leite de soja para todo mundo. Evidentemente, no início, houve uma rejeição porque o gosto não é bom, mas e começou a melhorar o gosto do leite de soja. Resumindo a estória, o prefeito, do qual ele era Secretário de Saúde, não pode modificar aquele programa tal já era a aceitação de toda a população e que este era um programa que tinha chegado ao seguinte resultado: é o município brasileiro de menor mortalidade infantil, compatível com os níveis da Suíça. Então, isso me faz pensar: o que nos falta para conseguirmos esse resultado no resto do País Estive também presente num programa que se desenvolvia, não tenho certeza se desenvolve hoje, em Santarém, em que uma nutricionista que estava ociosa, porque o marido tinha sido transferido para lá e ela não tinha conseguido emprego, resolveu pegar 150 famílias e aplicar um programa de alimentação baseado apenas em farelo de trigo e aproveitar aquilo que tinha, como, por exemplo, folha do que se chama lá de gerimum, folhas de batata-doce e acrescentar aos hábitos alimentares já existentes no Pará, não mudar nada, mas acrescer aquilo. E ela tinha fotografias, que tive oportunidade de mostrar aqui no Senado, realmente fantásticas, em que crianças de um estado caquético, não sei se é assim que se diz em medicina, mas pelo menos como aquelas crianças de Biafra, completamente desnutridas, quase à morte, em 45 dias já mostravam uma melhora palpável, em 60 ou 70 dias estavam quase que no peso normal. Então vejam, parece-me que a questão é um pouco de criatividade, é um pouco de você ter uma decisão política de fazer uma coisa um pouco diferente. E parece-me ainda que nós ficamos muito naquela de não querermos tomar medidas simples, porque parece que não apelam à inteligência das pessoas. Aí é que acho que nós deveríamos ter a coragem de indicar para o Brasil medidas que pudessem alcançar o Brasil inteiro. Só para terminar, para não ser muito prolixa, eu gostaria de dizer o seguinte V. Sª conhece Lábria, parece que citou que conhece Lábria eu estava num comício, agora nesta campanha, ao meiodia, e percebi uma senhora com um neném de um lado e outro de outro, ela batia palma assim, com os dois nenéns no colo. Fiquei pensando: puxa, como é que essa senhora traz duas crianças recémnascidas para um comício ao meio-dia. Desci do palanque e perguntei a ela: como está o neném? Como é que vai? E ela disse: está bem. Mas eu perguntei: que idade eles têm? E ela disse: um ano e quatro meses. Crianças que não pesavam mais do que três quilos e que eu julgava recém-nascidos. Eu perguntei: o que você dá de alimento para eles? Ela disse: ah! Eu dava mingau de maisena, mas agora faltou o dinheiro e a gente não está dando mais nada. Eu só dou chá. Ora, chá! Realmente eles não podiam se desenvolver. Eu perguntei: você não tem cará na sua casa? Porque você não faz um mingauzinho de cará bem cozidinho, passa numa peneira? Ela disse: Eu não, eu vou dar é comida de panela para o meu filho. Então vejam que é pura questão de informação. Então, a minha consulta seria: V. Sª concorda com esse pensamento? Não acha que isso seria talvez uma solução prática para nós tentarmos resolver o problema da subnutrição no Brasil? E uma outra pergunta: não seria o caso, talvez, já legislando aqui nesta Comissão, de nós indicarmos o acréscimo, por exemplo, de farinha de milho ao pão? Nós pagamos um subsídio altíssimo pelo trigo, quando temos milho, quando temos o cará, quando temos a macaxeira, que poderiam tornar o pão mais nutritivo e muito mais barato. Ou até, quem sabe acrescer vitaminas. Tem vitamina A, tem vitamina C. Sei lá, no próprio leite ou na margarina, como acontece em outros países, em que se pudesse, assim, ao grosso da grande população, se levar um pouco mais de nutrição. Era a questão que eu queria encaminhar a V. Sª. Agora, então, a Drª Eleonora, para concordar em gênero, número e grau, em quase tudo que foi colocado, especialmente na responsabilidade que tem o Estado de levar aos casais, ou quando o casal não concordar, à mulher, o direito e a possibilidade de conhecer os métodos anticonceptivos e ter o acesso, também, porque só conhecer não vai resolver nada. Estamos de pleno acordo. Agora, já que V. Sª faz parte do Conselho que dá assessoria ao Ministério da Saúde, eu quero mandar um recado: amostra grátis não vai resolver, quer dizer, enquanto nós ficarmos com esta preocupação de fazer tudo perfeito, perfeitíssimo, com psicólogo, com não sei o que, com não sei mais o que, quando é que nós vamos chegar aos barrancos do Amazonas? Quando é que nós vamos chegar realmente às populações que precisam disso? Nós temos que simplificar, como, por exemplo, no México em que você compra o anticonceptivo no supermercado, onde você agiliza a coisa. Se- não, vai ficar toda a vida numa conversa muito bonita, mas sem nenhum resultado prático. Desculpe-me o alongamento. O SR. DANIEL BARBATO: – Nobre Constituinte, eu fico emocionado, primeiro porque tenho uma simpatia muito grande pelo Médio Purus. Em segundo lugar, o que falta, Constituinte, é uma vontade política para a implantação de um programa, porque está provado em Medicina que sem educação, sem alimentação e sem uma atividade física, a vida não vale a pena ser vivida. V Ex.ª deu vários exemplos de pessoas que, pela nutrição simplória recuperaram a sua saúde. A saúde é mantida por esses fatores principais: a saúde e a atividade física. A vida sedentária e a má alimentação levam a pessoa humana a patologias gravíssimas. Não digo essa alimentação rica. Essa alimentação rica, no fim, mata a pessoa, mas uma bem balanceada recupera o indivíduo, dá saúde, dá condição de trabalho. Constituinte, eu estive num simpósio, agora, sobre acidentes de trabalho, com a presença de autoridades do Ministério e todas se preocuparam em dizer da proteção ao trabalhador. Proteção com máscaras, com roupas especiais, com luvas, etc, e se esqueceram de uma coisa fundamental, a que me referi lá, que é a alimentação do trabalhador na prevenção do acidente de trabalho. É muito triste sabermos, quando ouvimos, – porque a minha atividade principal é junto à comunidade – um trabalhador falar assim: Dr. Barbato, eu vim chorando para o meu trabalho, hoje, porque na hora em que eu fui pegar o ônibus a mulher gritava para mim: você não vai deixar dinheiro para fazer o almoço? E, Constituinte, a realidade é que eu tenho visto acidentes de trabalhadores que caem em cima de uma serra por fome. Com o que nós temos que nos preocupar, nobre Constituinte, é com a qualidade de vida do homem, é com a alimentação. O Estado tem – através de trabalhos, atividades sociais ou outro tipo de trabalho, como participação do meio empresarial – que desenvolver essa educação da alimentação e propiciar nas fábricas, nos locais de trabalho, a alimentação do trabalhador. Isso é fundamental. Porque não temos que ser pessimistas em relação a este País. Este País tem tudo, tem inclusive qualidade de recursos humanos para propiciar o desenvolvimento desse programa a nível nacional, mas falta vontade política. O Ministério da Saúde conta com o INAN, que está aí, na W3 Norte, pronto para entrar em atividade. Mas os homens têm suas obrigações burocráticas e resolvem seus problemas, planejam programas no Amazonas, em Mato Grosso, no Pará, em gabinetes. Nós temos que sair em campo; ver a necessidade de cada região. Quanto material natural lá no Amazonas tem que pode ser aproveitado, pode ser industrializado. É com isso que nós temos que nos preocupar. É qualidade de vida do casal. Vamos ser sinceros na nossa simplicidade, não vamos nos preocupar em instalar computador em Tabatinga. Vamos pôr médicos, assistentes sociais, vamos pôr nutricionistas com competência. Mas, Constituinte, em nível médico, as pessoas altamente qualificadas na área médica não traba- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) Iham junto ao paciente. Nós temos enfermeiras fabulosas. Mas todas estão no planejamento e são colocados auxiliares de enfermagem feitas lá no hospital. Mas vamos qualificar, vamos profissionalizar. É o que está faltando neste País. Mas na profissionalização existem duas coisas: existe vontade e capacidade. E a Medicina é, sobretudo, amor. Nós temos que trabalhar com competência. É tão fácil! Tenho um programa aqui no CEUB, feito por mim, pessoalmente, com algumas famílias. Mas essa família não fica um mês comigo porque eu arranjo emprego para o marido, arranjo escola para as crianças. Eles não parasitam, porque o homem, sempre que está parasitando, ele dentro de si sente vergonha de não estar produzindo alguma coisa e receber as coisas. V. Ex.ª compreendeu, Constituinte? E eu fico emocionado pelas suas palavras. Não é à-toa que eu gosto do Amazonas. A SRª ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Eu vou levar a sugestão para a Comissão e é uma questão que a própria Comissão também coloca. Basta de amostra grátis. E, em função disso, não só a Comissão, porque a Comissão ainda é precária, é muito embrionária. A questão que eu coloquei anteriormente é que o que falta é que o Estado assuma realmente como dever seu a defesa da integralidade das condições de saúde neste País, porque não basta ele apenas ter um discurso. Não basta, muda um governo e acaba tudo. É como se você coloca um paralelepípedo aqui, vem o outro e diz: não, eu vou tirar porque não me interessa. Então, eu ponho o paralelepípedo na rua de cá. Aí, no prazo de quatro anos vem o outro e tira. Assim, fica um quadrado vicioso. Então, o que nós colocamos, por exemplo, em São Paulo, é a grande questão dos postos de saúde, tanto estaduais como municipais, faltam tantos recursos. E, se em São Paulo falta, eu morei 8 e 9 anos na Paraíba, em João Pessoa, o que se dirá nos Estados mais pobres deste País? O que acontece, não têm recursos humanos ou, se têm recursos humanos, eles não estão capacitados para desempenhar aquelas determinadas funções, não têm recursos materiais, não têm espéculo, não têm mesa. Se têm espéculo não têm a mesa, se têm a mesa, não têm a luva; enfim, falta tudo. Aspirina têm demais, mas a aspirina não vai resolver a questão da maternidade. E eu estou discutindo o problema do ponto de vista da maternidade, porque as outras questões eu concordo com V. Ex.ª. Então, qual têm sido a sugestão do Movimento de mulheres? E que conselho nacional, como canal entre o movimento e o Estado e entre o movimento e as comissões constituintes, têm servido e têm encampado, que descentralize o serviço de saúde, descentralize tanto a nível estadual como municipal. Mas se essa descentralização é apenas burocrática, ela não vai dar em nada, têm que haver recursos humanos, recursos financeiros, para que possa ser implementada a melhoria da qualidade da prestação de serviço. Essa é uma questão. Na questão do DIU, evidentemente, que quando nós, encampados por esta Subcomissão, reivindicamos que o DIU seja incluído nas normas do Ministério da Saúde, e ele já foi aprovado, nós reivindicamos que sejam dadas condições nos centros de saúde deste País, não só nos grandes centros, mas que reformule esse elefante branco – me desculpe o termo – que se têm aí. Então, na questão do DIU não só se dê condições de infra-estrutura para a colocação do DIU, mas dê acompanhamento àquela mulher que optou pelo DIU, porque todos nós sabemos que o DIU não se dá meramente na sua colocação, têm que haver um acompanhamento. E a outra questão é educativa. Não se pode pensar na saúde, hoje, sem pensá-la do ponto de vista educativo. E a educação não se faz apenas de grupos de mulheres para grupos de mulheres, de centros de saúde para centros de saúde, elas têm que ser uma campanha educativa a nível da mídia, da televisão, porque, senão, não vai chegar às mulheres dos vários rincões deste País. E não é só isso, a questão das cartilhas, também, que são excelente material educativo que funciona na educação do casal e que nos ajuda na escolha, mas do ponto de vista da prevenção da saúde, de como se prevenir a doença. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Concordo, plenamente. Inclusive, se nós perguntássemos a qualquer mulher do Brasil, em qualquer ponto do Brasil, como é que foi o capítulo da novela de ontem, ela sabe. Então, isso significa que nós podemos alcançar o grande público através da televisão, e isso é muito fácil. Só acrescentando, o que na questão do aborto eu esqueci, na interrupção da gravidez, eu concordo, plenamente e voltarei, se o Relator colocar no seu parecer a questão do aborto terapêutico, o aborto por má formação fetal, incluindo aí inclusive a AIDS que ainda hoje é alguma coisa recente e concreta. A SRª ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Também. O SR. PRESIDENTE: (Nelson Aguiar) – Nós temos 4 Constituintes inscritos, concedo a palavra, pelo prazo de até 5 minutos, ao nosso companheiro João de Deus. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS: – É um prazer estar aqui e, eu tenho, a meu ver, que o problema que nós encontramos da má formação da massa, inicialmente, que eu não sei o termo que V. Sª citou... O SR. DANIEL BARBATO: – Encefálica. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS: – Encefálica, e também da desnutrição que geraria esse problema da má formação, seria mais um problema de ignorância, num primeiro momento, e a falta de um esclarecimento das autoridades. Num segundo seria a má assistência dispensada pelas autoridades. No primeiro caso, seria o não aproveitamento daquela área que é disponível para o pai, para a mãe, para que eles plantem e tenham os gêneros de subsistência de primeira necessidade. Eu digo isso, porque conheço no Rio Grande do Sul, pessoas que têm áreas produtivas e não produzem e estão morrendo de inanição. Em segundo lugar, é o caso da assistência. Não existe um saneamento básico por parte das autoridades, uma assistência médica e tampouco por parte dessas autoridades as condições mínimas de sobrevivência dadas por elas para essas pessoas. Então, nós encontramos numa cidade do Rio Grande 94 do Sul, como Vacaria, nós encontramos um prefeito dinâmico, um prefeito com uma visão muito grande da necessidade da população carente e que, conforme dizia a Constituinte Eunice Michiles, implantou a vaca mecânica, como também é implantada no Rio Grande do Sul. Além da vaca mecânica, ele saiu para distribuir para as populações carentes: carne, mandioca e outros gêneros de primeira necessidade e nós vimos que, nessa cidade de Vacaria, o desenvolvimento foi muito grande, as crianças começaram a produzir muito mais na escola e terminou o problema de doenças endêmicas que, geralmente, nós encontramos em outros municípios do nosso Estado. Então, eu penso, e não sei se seria uma pergunta, mas é mais um complemento àquilo que V. Sª e a nobre Constituinte disseram que o que precisa hoje no Brasil é esclarecimento. O que precisa hoje no Brasil é uma assistência por parte das autoridades e por parte dos Governos, tanto municipal, como o estadual, e o federal, para que eles não venham apenas a usar o elemento como motivo de voto, mas que eles possam usar esse elemento para que ele possa produzir no País e a nossa Nação possa se desenvolver, conforme V. Sª falou. Nobre Palestrante, V. Sª falou sobre a indústria da Cesariana e do aborto. A respeito do aborto, eu pertenço à liga do Antiaborto. Acho que ninguém tem direito de tirar a vida, ninguém tem direito de tocar em um ser que não tem como se defender, que não tem oportunidade de dizer "Mamãe, não faça isso! Papai, me dê uma oportunidade de vida! Há seqüelas que a mulher recebeu e que são produzidas nessas clínicas, elas são menores do que o mal que é feito para o feto, que desde o primeiro momento da concepção, ele tem uma expectativa de vida. Concordo, plenamente, que haja aborto, casos específicos que é o da terapêutica, o da má formação. A partir daí, eu acho que nós não temos direito e seria o mesmo problema que nós temos hoje procurado de todas as maneiras, diminuir as violências que nós encontramos dentro das cidades. Por que nós procuramos diminuir as violências dentro das cidades? É porque nós encontramos marginais, assassinos, facínoras que atentam contra mim e contra a minha família, contra a sociedade em geral. Mas nós temos condições de nos armar, pegar um revólver e até atirar contra esse elemento. Agora, um menino ou uma menina que poderá ser, quem sabe, um estadista dentro de poucos anos, ele não tem a oportunidade de se levantar e dizer: "Por favor, me dêem uma oportunidade de me defender e ao menos de viver". O controle sobre o corpo, concordo que haja controle sobre o corpo. Mas, nós temos que pensar que esse controle pode criar problemas seriíssimos na estrutura da família e do matrimônio. Se há uma concepção e o marido deseja, nós temos que ver que as ligas feministas avançaram tanto, mas nós vamos procurar, com todo respeito, e eu penso que não é o seu caso, eu acho que uma mulher que é feliz e uma mulher que tem o seu casamento estável, uma mulher que tem o amor do seu esposo e que ama os seus filhos depois de crescidos e que estão naquela fase de chamar, "mamãe me dá isso, papai, me dá aquilo", uma mulher que está nessas condições, ela jamais pertencerá – e eu sei que com 95 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) isso eu não estarei lhe ofendendo porque, certamente, V. Sª não é a pessoa de quem estou falando – V. Sª jamais pertencerá a essas ligas que são favoráveis ao aborto, a essas ligas que são favoráveis ao divórcio, a essas ligas que são favoráveis à desestruturação da família e do casamento. Quero agradecer a oportunidade e dizer que o meu pensamento, eu sou sincero, eu sou religioso e acho que tudo o que a Nação hoje está recebendo é fruto da moral dos seus cidadãos. Se nós hoje moralizarmos, se nós hoje modificarmos o nosso pensamento a respeito daqueles que estão morrendo, a respeito daqueles que estão em necessidade, daqueles que estão clamando por alguma coisa, eu tenho certeza que o problema maior da nossa Nação não é só procurarmos, politicamente, resolver os problemas, mas o problema da nossa Nação hoje é espiritual. Este é o maior problema da nossa Nação, porque os valores espirituais foram esquecidos, os valores espirituais foram substituídos por desejos próprios e por um tipo de participação diabólica, vejam bem, diabólica, participação diabólica por movimentos que se levantaram no Brasil, procurando desestruturar tudo aquilo de bom dentro da nossa concepção espiritualista. Este é o meu pensamento. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Está inscrita a nobre Constituinte Rita Camata. Antes, porém, dou a palavra ao Sr. Palestrante, a fim de que ele dê sua resposta. O SR. DANIEL BARBATO: – Nobre Constituinte, V. Ex.ª traduziu bem a idéia do que é um potencial de uma população sadia e, sem dúvida alguma, a educação e a alimentação qualificam e aumentam a produtividade de uma região. Nós tivemos na terra da nobre Constituinte Eunice Michiles, e vimos lá nos seringais, 37 seringais nos quais trabalhamos, o aumento da produtividade pelo tratamento que nós fizemos da anemia verminótica, pela introdução da orientação alimentar. Nós falávamos com cada casal como dirigir a alimentação em função daquilo que eles dispunham lá. E quando nós voltamos de Boa Vista, perto da Boca do Acre, nós parávamos à noite, porque não podíamos viajar de barco, por causa das toras, ouvíamos a beleza da descrição dos pais sobre a melhoria da saúde dos filhos e melhoria da capacidade de trabalho do pai, o próprio encarregado do seringal, porque o dono do seringal mora em Manaus e deixa o encarregado lá, e pela melhoria na assistência médica e alimentar, eles puderam aumentar a produção e ganhar mais. Aí está o grande segredo da população brasileira. Nós precisamos ocupar este País, mas com uma população sadia e não parasitada pela anemia verminótica, que está espalhada por este País todo. É por isso que eu trabalho com amor e me dedico mais a essa atividade, já disse aqui, do que à minha atividade nas universidades, onde tenho os meus assistentes que tomam conta do trabalho. Agora é a tal coisa, Sr. Constituinte, nós, que somos os privilegiados, temos obrigação de contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira. Ninguém vai segurar este País, quando essa população for sadia, quando não tivermos muita preocupação com a parte higiênica. Nós temos que educar, temos que sair de casa em casa, agredir. A população tem que sentir que existe um serviço médico assistencial no Brasil, e o nobre Constituinte sabe disso, por profissão, o médico dá muito da sua saúde para a saúde dos outros. Nós encurtamos muito da nossa vida, porque vemos muitos sofrimentos. É muito triste V. Ex.ª ser chamado para fazer um parto lá naqueles seringais, vai-se aparamentado com material todo e com assepsia. E quando vai examinar a pessoa que está fazendo força há 3 dias, orientada por uma parteira prática, chega-se a um diagnóstico triste de que a dor que ela estava sentindo, depois de examinar, depois de fazer testes, vários testes, depois de 1 hora, chega-se à conclusão de que aquela dor era determinada pela fome que ela estava sentindo, eu chorei com aquela paciente. E o que fiz? Eu a levei para Lábria e 1 mês depois é que ela foi ter a criança, mas bem alimentada. É por tudo isso que eu estou aqui. Imagino que a minha pressão agora deve estar a 22/12 pela emoção. Obrigado. A SRª ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Respondendo as questões levantadas pelo Constituinte, a primeira delas é a seguinte: Quando eu disse do controle da reivindicação de nós mulheres, do controle sobre o nosso corpo ele está inserido em alguns pontos que eu acho fundamentais. Primeiro: o controle sobre o corpo é o controle sobre o funcionamento do próprio corpo, e o controle do que seja a menstruação, é o controle do que seja a fase reprodutiva, é o controle do que seja qual é o período fértil, qual é o período de ovulação que nós mulheres temos e o que venha a ser a menopausa. E que nós temos que desmedicalizar essas fases, ou seja, tirá-las do contexto de doença e passálas para um contexto de saúde, um contexto de que isso é o que nos dá vida. Essa é a primeira questão do controle sobre o corpo. O controle sobre o nosso corpo é para impedir que ele continue sendo matéria-prima de laboratório, tanto de laboratórios farmacêuticos, como de laboratórios de pesquisas que nos usam para testar a eficácia ou não de medicamentos que poderão vir a surgir, que poderão vir, futuramente, com medicamentos contraceptivos. Então, nós queremos decidir sobre isso. Portanto, é por isso que nós precisamos ter essas informações, é por isso que precisamos ter o controle sobre o nosso corpo para impedir que nós sejamos mutiladas, como tem acontecido nos hospitais do INAMPS, em que se faz histerectomia da mulher, ou seja, que se tira o útero da mulher para ela deixar de ser histérica, para ela deixar de ter a histeria própria da mulher, porque a histerectomia, se formos ver no Aurélio, a palavra histerectomia é ligada à histeria e à retirada do útero. Então, a relação que podemos fazer é que a menstruação, os órgãos ginecológicos, os órgãos que nos dão vida, que nos dão vitalidade, que nos propiciam gerar a vida, são aqueles órgãos que nos dão histeria. Portanto, temos que ser mutiladas. E uma mulher que tenha controle sobre o seu corpo, ela tem condição, independente da classe social a qual pertença, porque eu trabalho com mulheres de periferia, tanto em João Pessoa, como em Belo Horizonte, onde eu já morei, como em São Paulo; então, não depende da classe social para você dizer que uma mulher é ignorante e que não tem condição de ter acesso a X ou Y de informação. Assim, o controle sobre o nosso corpo vai exigir e vai nos permitir que possamos, numa consulta médica, de um médico do INAMPS, poder perguntar a ele – "Doutor que remédio é esse que o Senhor está me dando –?" Porque quem vai tomar sou eu. Há casos e casos que podem ser considerados como chacota, quando a mulher chega ao consultório de um médico do INAMPS e diz – "Dr. eu estou fria" e ele diz – "Então, torna esse antibiótico que a senhora melhora". Ou então diz – "Toma essa aspirina que a senhora melhora." E ela não estava querendo remédio, ela estava pedindo, sim, um espaço para ela conversar sobre as condições de vida dela, sobre as condições de saúde, de sua sexualidade psíquica. E além disso o controle sobre o nosso corpo permite, sim, que nós mulheres fiscalizemos, que nós possamos fiscalizar a qualidade de Serviço Público de Saúde, que nós possamos fiscalizar a implantação de um programa de assistência integral de saúde da mulher, que nós possamos exigir melhor qualidade de serviço, porque esse serviço vai ser executado no nosso corpo. A cesariana que é feita, desculpe-me nobre Constituinte, não é no seu corpo, ela é feita no meu corpo; o aborto que é feito com sonda, com gargalo de cerveja, com galho de mamona, com prego enferrujado é feito no corpo da mulher, é feito no corpo da mulher e é, portanto... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – O aborto é crime, Senhora? A SRª ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Mas ele é feito no País, ele mata... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Por isso ele é crime... A SRª ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – A mulher que tem o controle sobre o seu corpo... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Não vejo novidade nenhuma aí, ele é crime. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – ...poderá ter a possibilidade de recorrer a um aborto clandestino, como último método... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – E nenhum outro aborto, porque ele é crime. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Não queremos que o aborto seja um método contraceptivo, ele é o ultimo recurso de que a mulher lança mão, e eu acho que nós não podemos... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Se não for o terapêutico e nem para casos previstos no Código Penal... A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Que é o artigo 128: por estupro e para preservar as condições da saúde da mãe... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Ele é crime. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Eu sei que ele é crime, e é exatamente por ele ser crime que a sociedade brasileira, hoje, tira o véu da hipocrisia e discute essa questão... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Para liberá-lo? A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Não, pode até ser que não! Mas ela tira o véu da hipo- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) crisia de todos os segmentos sociais, médicos, mulheres, doutores, deputados, senadores, secretários de saúde neste País, ministros, ela arranca o véu. E quem exigiu que arrancasse o véu, que depredasse o véu? Fomos nós mulheres que lançamos essa questão como parte de um direito que nós temos sobre o nosso corpo. Então, ele pode ser legalizado ou não, mas ele tem que ser assumido a nível da sociedade civil e não como um direito à vida. O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Concordo. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – E não como um direito à vida e sim como uma questão de saúde pública neste País. Nós não podemos continuar fechando os olhos. A posição de legalizar ou não é em outra situação, é em outro momento... O SR. JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Nesse momento é o que estamos discutindo. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Nesse momento é a discussão, mas não cabe aqui legislar sobre isso, decidir sobre isso... Apenas gostaria de complementar a minha fala, sobre a questão das seqüelas. As seqüelas deixadas do ponto de vista do abuso da cesárea, neste País, são muito grandes. Se se abusa, tem alguém lucrando com esse abuso, que não somos nós mulheres. A outra questão, por que se faz a cesárea e se laqueia a mulher, se laqueia e se esteriliza, sem a autorização dela? Porque a esterilização consentida pela mulher é uma questão, mas uma cesárea que laqueia a mulher, é um abuso. Então, o controle é muito mais, quando eu digo, do ponto de vista da nossa saúde, do ponto de vista de desestruturar a família, porque para pensar na discussão de desestruturar a família, eu faço uma pergunta: qual é a família que nós temos hoje neste País? Qual é a família que nós podemos pensar como família organicamente estruturada? É aquela família que não reconhece os filhos, que são considerados numa constituição patriarcal, ilegítimos? É não considerar aquela menina que por não ter tido condição de acesso à informação, não ter tido condição de fazer um aborto, que é clandestino, ela é mãe solteira, esse filho é discriminado na sociedade, esse filho é discriminado na escola, a mulher passa a ser discriminada? Então, é nesse aspecto que eu endosso, como militante de todos os movimentos de mulheres, essa proposta do Conselho Nacional da Condição Feminina, que o fez baseado nas reivindicações de reuniões de mulheres. A família instituída, civil ou naturalmente, tem o direito à proteção do Estado e à efetivação de condições que permitam a realização pessoal dos seus membros. Então, acho que temos que ter muito discernimento, que não é o controle sobre o nosso corpo que vai fazer com que a família no Brasil seja desestruturada. Acho que ele, sim, vai fazer com se reestruture uma nova concepção de família em nosso País, onde homens e mulheres têm plenos direitos de igualdade, tanto na decisão, como na participação de todos os problemas referentes àquele núcleo familiar constituído, natural ou não. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Estou inscrito, Sr. Presidente, e estava conversando com a Constituinte Michiles sobre o assunto que foi colocado agora, esse último assunto, que a mulher tem o direito do seu corpo, ela até concordou comigo. Foi apresentado aqui pelo Dr. Barbato. Dr. João Evangelista e outros a maneira pela qual a mulher pode controlar o seu corpo, saber quando deve assumir gravidez ou não. O método que ele apresentou, digo sinceramente: antes de vir para a Constituinte, eu era a favor de que, por problema de violência e por problema de risco de vida para a mãe, deveria haver o aborto. Depois daquela apresentação por slides e também das palestras, mais pelas do Dr. Barbato, estou propenso a mudar minha idéia. Por quê? Porque, foi comprovado aqui, por palestras de homens médicos que quem tem direito ao corpo não só da mulher mas do próprio homem para a Medicina é o próprio médico, não o homem ou a mulher. Mas, no caso da mulher querer ter o direito sobre o seu corpo, é muito fácil pelo que foi apresentado aqui. Acredito no que foi exposto. V. Ex.ª não estava presente, de que, num plano incluindo alguma coisa, porque o plano dela não é perfeito, não há nada perfeito, perfeito só há um Ser supremo, que é Deus – pelo que ele apresentou, com algum acréscimo, podemos chegar a um método melhor, para não violar a saúde da mulher com pílulas, ficou comprovado isso aqui, pelo Método Billings, que ficou comprovado por duas equipes de médicos que aqui estiveram, com 97% um, e outro com 98,5% de chances de aproveitamento Este médico, aqui presente, disse algo que está ressoando no meu coração, na minha alma, vou lutar por isso ainda que não consiga, mas, espero que consigamos isso. Que ele está há 5 anos, com 30 equipes no Brasil, e ele, com essa equipe, conscientizará as famílias, o homem e a mulher desse problema da gravidez que provoca o aborto. Porque estou há 27 anos casado e no início existia aquela tabelinha, que não é como essa que foi apresentada aqui. Assim mesmo ainda há a possibilidade da mulher não ficar grávida. E, há outro problema importante, a televisão está anunciando a AIDS, preventivos, abertamente, para até criança ouvir hoje criança sabe mais do que adulto. Eu estava dizendo para a Constituinte que aquele método que foi apresentado aqui, o Billings, se for levado numa conscientização federal, estadual e municipal e da sociedade no Brasil, no período da falha que foi apresentado, é um período muito pequeno, como também à mulher da roça, porque ela vai poder usar a tabela, porque a tabela não será como foi apresentada para uma pessoa da cidade, a mulher vai ter o controle do seu corpo, quando ou não, desejar a gravidez. E, no dia do período, que é pequeno, este preventivo que está sendo usado como a camisinha, na televisão, poderá ser usado, se o homem ou a mulher deseja ter a relação. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Eu apresentei à Subcomissão dos Direitos da Mulher uma proposta. Acho que todas as sociedades humanas, através do seu sistema jurídico, 96 vem apresentando uma preocupação comum que é a proteção à vida, eu tenho muito medo de qualquer tendência de governo ou de sociedade, para se dar à vida um valor relativo, para mim a vida tem um valor absoluto, quer dizer, um valor individual, a vida é da pessoa, é do ser humano, a vida é a minha vida. Por isso, apresentei à Subcomissão uma proposta que, naturalmente, vai ser discutida, redigida da seguinte forma – não me preocupei muito com a forma, mas com o conteúdo: "à sociedade e ao Estado incumbe assegurar o direito à vida – e coloquei – a partir da concepção". Entendo que temos que determinar um momento, a partir de um momento, de um dado instante em que a vida deve ser protegida. Ora, se não há vida sem concepção, levei a minha proposta a partir da concepção. Acho que uma das coisas que vêm preocupando as sociedades humanas, os movimentos de defesa dos direitos da pessoa em todo o mundo é exatamente essa, de repente começam a aparecer outros valores na sociedade pelos quais as pessoas lutam e o valor à vida vai ficando em segundo plano. Foi lembrado aqui por um dos conferencistas o que ocorreu na Alemanha, em 1934, até quando os exércitos aliados entraram no campo de concentração e encontraram o resultado do holocausto contra os judeus. Mas, começou como? Começou com os métodos que defendiam a teoria da sociogenética, os médicos de Hitler que chegavam à conclusão de que as pessoas portadoras de deficiências deveriam ser eliminadas e passaram a eliminá-las. Lá na frente começaram a eliminar crianças que nasciam com um simples defeito na orelha. Mais adiante, começaram a matar meninos que faziam xixi na cama e terminaram destruindo 100 milhões de judeus, por quê? Porque passou-se a dar um valor relativo à vida. Penso eu que o direito a vida da pessoa é que deve significar a condicionante para todas as ações humanas, todos os nossos atos humanos em sociedade devem estar condicionados por este vetor, o direito à vida e aí me parece que esta proposta que estou fazendo tem ligações, com respeito à questão da interrupção da gravidez. Eu queria que a Srª me ajudasse a situar este pensamento com respeito à proposta que encaminhamos. A SRª CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Se me permitem uma palavra. Seria um desagravo às feministas a maneira como o Constituinte João de Deus Antunes se referiu a elas. Quando me perguntam se eu sou feminista, eu sempre pergunto: "o que é ser feminista?" Porque, se ser feminista é defender uma participação maior, mais efetiva da mulher, o crescimento da mulher, a sua participação a nível da lei, a nível de participação na sociedade, eu sou feminista. Agora, se ser feminista é declarar guerra ao homem, eu não o sou. Agora, eu só queria dizer ao Constituinte João de Deus Antunes o seguinte: ai de nós se não fosse a coragem das feministas. Nós estaríamos ainda hoje lutando pelo voto. (Palmas.) Estaríamos ainda hoje discutindo se a mulher teria ou não o direito ao voto, porque foi uma feminista corajosa que encostou este velho Senado aqui, 97 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) há anos. e conseguiu o voto da mulher. Agora, evidentemente às vezes se diz: é a mulher mal-amada. Eu não sou uma mulher mal-amada. Eu sou uma mulher divorciada, sim, mas não me considerei nem um dia uma mulher mal-amada. Tenho uma família bem estabelecida, com cinco netos maravilhosos. Não me considero incluída nesse caso de que a mulher que é bem-amada é aquela que é submissa, aquela que não luta por seus direitos, aquela que não fala sobre si. Quando me perguntavam, nas minhas palestras sobre o direito da mulher, se o casamento antigamente era mais bem sucedido, eu respondia que sim, porque havia um chefe, um mandava e outro obedecia. Ora, é simples: No tempo em que eu pegava uma chibata e dizia para o meu filho: "ou você me obedece ou te bato", é claro que ele me obedecia. Agora, hoje, quando são duas cabeças adultas pensantes, a relação ficou mais difícil, é óbvio. Mas quando essa relação existe, ela é maravilhosa, ela é perfeita, que não é uma relação daquela de que um manda e outro obedece. Apenas para desagravar um pouquinho. No resto, estou de acordo com o Senhor, acho que existem mulheres fantásticas, maravilhosas, amadas, que sabem amar e lutam pelo direito da mulher, porque aí de nós se não lutarmos. Ninguém vem nos trazer de bandeja o direito à nossa participação, ou direito algum. Foi pela luta dessas mulheres corajosas que nós conseguimos aquilo que já conseguimos. Muito obrigada. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte. O SR. CONSTITUINTE JOÃO DE DEUS ANTUNES: – Quero dizer-lhe que talvez eu tenha sido infeliz em não me ter referido especificamente a respeito do aborto. Eu acho que as mulheres devem lutar, como lutaram pelo voto e por outras coisas mais que elas talvez não tenham o direito de fazer como nos homens fazemos. Agora, eu me referi especificamente a essas que lutam pela legalização dessa morte, que é o aborto, desse crime que querem oficializar. Se nós hoje estamos lutando pela pena de morte para matar esses facínoras, bandidos que matam e atentam contra as nossas famílias, nós também temos que repensar um pouco e ver que esses que estão hoje lutando a favor da legalização do aborto também são assassinos em potencial. Eu quero lhe dizer que eu não tive a intenção de feri-la, especificamente nessa parte, nem a V. Ex.ª nem a ninguém aqui dentro. Eu sou sincero. Agora, a respeito do aborto, se for preciso brigar, eu brigo. Muito obrigado. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Agora eu vou primeiro agradecer à Constituinte Eunice Michiles as palavras não só pela parte que me cabe, como feminista, que está na luta, mas por todas as mulheres. Ouso aqui agradecer em nome de todas as mulheres brasileiras que estão na luta e que não têm a oportunidade de estarem aqui neste debate tão produtivo, para que a gente possa conhecer e debater as idéias. Eu também diria que sou uma mulher divorciada, tenho dois filhos maravilhosos e me julgo absolutamente bem amada, feliz e saudável, tendo autonomia sobre a minha própria vida, decidindo sobre os meus projetos de vida. Sobre essa questão que a nobre Constituinte colocou, de mal amada, bem amada, eu acho que é uma questão já muito discutida e a gente vai ter que discuti-la nesse amplo debate da Constituinte. Em relação à questão colocada pelo nobre Constituinte, à sociedade. Excelência, incumbe assegurar o direito à vida a partir da concepção. Em primeira mão, eu não concordaria com essa formulação, porque é muito difícil discutir o momento em que o embrião passa a ter vida ou não. Então, discutir o direito à vida para definir essas questões tão polêmicas que se têm discutido hoje, da interrupção de uma gravidez indesejada, é muito complicado, porque é uma discussão teosófica, é uma discussão pela qual eu tenho todo o respeito por ela e assumo discuti-la. Mas eu acho, como V. Ex.ª próprio disse, que é muito difícil estabelecer qual é o momento em que pode passar a ser considerado como vida. São posições divergentes que nós temos a nível da sociedade brasileira. Então esse debate serve para isso. Eu preferiria, na minha opinião, na minha posição, colocar como direito do cidadão, porque o direito do cidadão é abrangente àquele cidadão que participa, que decide e que tem direitos garantidos por esta Constituinte. Respeitando a posição de V. Ex.ª, com todo o respeito que me cabe, como mulher, como cidadã, eu acho que nós só vamos conseguir discutir o aborto do ponto de vista de saúde pública. Discuti-lo do ponto de vista do direito à vida, nós vamos ficar aqui eu diria que quase eternamente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu só queria dizer que eu não questionei a questão do aborto. Quando eu formulei essa questão, eu não pensei em nenhum aspecto da vida, numa fórmula de suprimir a vida. Eu acho é o seguinte: se hoje a sociedade brasileira desenvolve uma verdadeira campanha no sentido de que a mulher e o homem naturalmente tenham o direito a melhor acesso à saúde, a melhor alimentação, a fim de proteger inclusive o direito da criança, a criança que está no ventre, está preocupada com essa vida. A SRA. CONSTITUINTE ELEONORA M. DE OLIVEIRA: –Sem dúvida! O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu levei a esse ponto, a partir da concepção, por entender que não haverá vida sem concepção. A vida é interrompida a partir do primeiro instante; o processo da vida não teria como prosseguir. Então haveria que me definir por um dado momento, já que formulei essa questão, que acho de fundamental importância. E eu quero dizer à senhora que eu fui longe na n i vestigação que fiz sobre essa questão de valor absoluto e valor relativo à vida. É muito perigoso o que está ocorrendo em nosso País hoje, porque se não se quer respeitar a criança que está no ventre, já não se tem respeito à criança que já nasceu. Talvez seja esta uma das dramáticas conseqüências da forma co- mo a sociedade está vendo hoje a chamada criança abandonada. Estão com peninha delas alguns, outros estão querendo dar este ou aquele tipo de proteção. Se nós sairmos hoje a qualquer lixão da cidade grande, nós vamos encontrar essas crianças a quem o direito à vida está sendo negado. Por quê? Porque o valor absoluto à vida não está sendo respeitado. Ela, sim, ela, criança, que sabe que a sua vida tem um valor absoluto para ela, e ela tem intuição disso, está procurando sobreviver de qualquer forma, comendo o resto que a sociedade joga no lixo, e está assaltando, furtando, roubando, esta procurando sobreviver, porque o que está em jogo é a sua vida. Para a sociedade, a vida dessa criança está tendo apenas um valor relativo. Encerrando, tive alguma experiência. identificando-me agora para a senhora: fui Presidente da FUNABEM, e entrei lá para ver se estruturava aquela instituição. E percebi que aquilo é muito grave, porque é um órgão que satisfaz aos interesses da sociedade brasileira, e não da criança. A sociedade que quer ficar livre da criança que está criando problema, tem uma solução: mandá-la para as instituições da FUNABEM. Então ela é uma ótima instituição para a sociedade e terrível para as crianças deste País. Então este valor relativo me preocupa, porque, se hoje transigimos desta forma, amanhã chegaremos até à pena de morte. Temos alguns Constituintes favoráveis, em decorrência dos crimes que vêm sendo praticados por pessoas, mas essas mesmas pessoas não estão levando em conta a brutalidade do crime que o Estado está praticando com a criança, transformando-aem marginal, para depois colocá-la num pelotão de fuzilamento, destruindo sua vida. Não sei se esse Estado injusto tem o direito de buscar essa forma de fazer justiça. Estou absolutamente certo de que não. Eu haveria de optar por um dado momento: se a partir da concepção, se a partir de determinado mês da gravidez. Só acho que se a sociedade e o Estado não têm meios nem interesse de proteger a vida da criança no ventre materno, a vida dessa criança pósnascimento já fica sem proteção. E talvez por aí a gente encontre uma das causas. Estava eu no Rio de Janeiro vendo o concurso dos cães de luxo, e sai de lá apavorado – presidindo a FUNABEM naquela época – de ver que as cachorrinhas tratadas com todo o desvelo, colocadas ao abrigo de qualquer sofrimento, de qualquer aflição, de qualquer violência, estavam lá desfilando, muitas delas com um toque de fita lá no alto do cabelo amarrado na cauda. Que gracinha! E ali perto, no lixão da Lapa, no centro do Rio de Janeiro, as crianças sobrevivendo, muitas delas morando nas galerias de um casarão desgraçado, imundo e úmido, que a gente cansou de visitar. Esta coisa me apavora. Confesso à Senhora que com a responsabilidade que a gente tem como pai, como cidadão e agora como Constituinte de encontrar caminhos para a solução desses problemas, fico apavorado com a transigência com respeito ao fato de a partir de que momento eu vou ter de procurar proteger o direito do cidadão à vida. A SRª ELEONORA M. OLIVEIRA: – Eu queria fazer mais uma colocação aqui dentro desta discussão, que é a seguinte: quando a gente coloca o direito à escolha, estamos colocando, como já disse anteriormente, e reforcei, estamos reivin- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dicando o direito à educação sobre o corpo, a informação e a educação sobre os métodos contraceptivos, porque uma mulher que tem acesso aos métodos, que tem condições de escolher qual o método que melhor lhe serve frente àqueles 3 aspectos que coloquei: bio, psíquico e social – no meio em que ela está inserida – essa mulher tem condições, ela está dando o primeiro passo... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Para mim, essa é uma posição controversa. A SRA. ELIONORA M. OLIVEIRA: – Ela está dando o primeiro passo para garantir o seu direito à vida. E quando ela opta por ter um filho, quando ela opta por querer engravidar para ter um filho, essa mulher vai garantir o direito daquele que ela escolheu e optou por trazê-lo ao mundo. Essa mulher, que tem todos esses direitos colocados por mim anteriormente, e recolocados agora, dificilmente terá de lançar mão do aborto para interromper uma gravidez indesejável. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem! A SRA. ELIONORA M. OLIVEIRA: – Temos atualmente, no Código Penal, o art. 128 que prevê que no caso de estupro e no caso de risco de vida da mãe, é permitido o aborto. O que acontece? Ele não é regulamentado pela rede pública. Temos pareceres de eminentes juristas, como citei aqui, Dr. José Carlos Dias e outros tantos, temos o parecer da advogada do Conselho Nacional da Condição Feminina, Dra. lales, que já se pronunciou sobre a recuperação da credibilidade da fala da mulher e da credibilidade da polícia. Quando a mulher vai à Delegacia e presta queixa do estupro, essa mulher, não pode levar a termo uma gravidez, em decorrência de um estupro. A relação dessa mulher com esse filho são relações complicadíssimas, são relações difíceis de serem levadas, porque o estuprador estuprou, engravidou e se mandou. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Quem dizer a V. Sª de que minha solidariedade às mulheres na busca de todo este campo do Direito é imensa. Estou, a partir da minha casa, absolutamente solidário com essa busca e aplaudindo todas as conquistas que as mulheres têm colocado. Apenas pedi que todos nós situemos o nosso pensamento e façamos uma reflexão desapaixonada com respeito à questão do direito à vida. A vida não é minha, a vida da criança que está lá não é minha, não é também da mãe, a vida é da criança. Acho que todos os meios que ela tiver de lançar mão para evitar a concepção que ela não quer, concepção irresponsável, ela deve fazer o aborto. Mas a partir da concepção, penso que aquela vida já não é mais dela. A vida, para mim, é do indivíduo, é daquele que a tem. E essa eu tenho a obrigação de respeitar, porque se não respeito isto, a partir de lá, passo a não respeitar a do cidadão que está sentado do meu lado. Então eu perguntaria: Qual é a diferença? Esse apenas dentro da sociedade em que ele exige, da sociedade organizada, ele incorporou ao seu modo de ser direitos, valores, aprendeu a defender seus direitos; o ser de lá, não, ainda não; o ser de lá está ainda numa dependência. Com tristeza, ouvi de um colega médico dizer para mim uma coisa: Deputado, no primeiro mês de vida não há nenhuma diferença entre uma criança que está nascendo e um filho de jacaré". Só que eu disse para ele: "o Senhor não deita com nenhum jacaré para gerar filho". É ser humano, é gente. Talvez eu não tenha ainda uma idéia absolutamente clara. Parece-me que um ponto com o qual não posso transigir é o de que o direito à vida é um direito absoluto. Estão inscritos os Constituintes lberê Ferreira, Eraldo Tinoco e uma ilustre visitante, que pela primeira vez nos dá a honra de estar aqui: é a Constituinte Benedita da Silva. S. Ex.ª vai ter que se retirar. Se os Constituintes inscritos em primeiro lugar não se importarem, posso ceder-lhe a vez. (Pausa.) Não havendo objeção do Plenário, vamos ouvir a Constituinte Benedita da Silva. A SRA. CONSTITUINTE BENEDITA DA SILVA: – Quero agradecer aos Constituintes a atenção, porque aqui temos que ser polivalentes, temos que nos multiplicar na medida em que precisamos estar numa série de Subcomissões, não só prestando nosso testemunho, mas apreendendo, porque estamos aqui num exercício enorme, e este tema "família" é um tema que realmente chama a atenção de todos nós, mas que ainda não tivemos tempo de discuti-lo. Temos alguns conceitos de família que nos parece fugir à questão da normalidade brasileira. Uma coisa podemos considerar normal, a nível do formal, mas a realidade em que estamos vivendo é outra. Então, hoje, a família brasileira tem uma série de direitos que lhe foram usurpados até por um processo histórico, e entendemos perfeitamente isso. Na questão da evolução de todos os ganhos que a sociedade tem tido até hoje no conceito estabelecido pela família, a mulher tem uma desvantagem, e existe até uma defasagem a nível do Direito, dentro dessa chamada concepção de família. E nesse sentido temos procurado dar uma contribuição, e esta contribuição passa até pelo espírito muito mais da solidariedade de entender essa defasagem e de se fazer justiça num determinado momento, e até colocamos a questão da lei da vantagem. Queremos colocar uma coisa que para nós é importante neste momento, a nível da questão da família que se está discutindo. Pensamos que a família pertence a uma classe social diferenciada com todos os seus complexos. A família não é uma família em que se estabeleceu o que deveria ser um homem, uma mulher, um filho, dois, três ou quatro. O conceito de família para nós passa também pela responsabilidade que cada um de nós assume de estarmos juntos, decidindo sobre nossas vidas. E neste sentido é que vemos essa família. Mas até num processo a nível da questão do Direito, ficamos institucionalizando as coisas que consideramos como coisas que poderiam ser até mais livres. Observamos que a questão do casamento passa pela mulher como um rolo compressor dos mais fortes, e aí, ela não tendo o que chamamos de casamento institucionalizado, vamos institucionalizar a nossa relação, e nesse sentido ela tem uma perda enorme. 98 Então, diante dessa situação, ela é vista de uma maneira totalmente diferente da que as outras mulheres são vistas; ela não era uma mulher decente, ela era uma mulher imoral, era uma mulher que a gente não dava muita atenção. Porém, Srs. Constituintes, essa mulher, de uma maneira ou de outra, pertence à família de cada um de nós: é mãe, é filha, é avó, é a companheira, é a esposa, e muitas das vezes falta-lhe a solidariedade de entender os seus momentos, as suas necessidades. E aí ficamos muito preocupadas quando estamos tratando da questão da família. Nós nos prendemos a um determinado tema, que tem sido por demais polêmico e não avançamos na discussão do direito de exercer plenamente uma cidadania, onde questão e tema envolvem toda uma visão filosófica, ética, moral, religiosa e coisas mais, e fazemos uma reflexão por um ângulo e não a fazemos por um outro. Estamos cristalizando posições em termos do Sim ou Não, quando a realidade brasileira nos aponta para um outro caminho que talvez ainda não tenhamos encontrado, mas que é preciso discutir. Ficamos perplexos diante de uma situação dessas, não dizendo que estamos favoráveis ou contra alguma coisa. Apontamos caminhos e soluções para casos tais, como presenciamos em todo trabalho comunitário que se desenvolve com as nossas crianças que pertencem à nossa família e que já são violentadas no seu lar. Essa violência não passa única e simplesmente pelo que podemos chamar de violência uterina. Na medida em que essa criança é estuprada pelo seu pai, pelo seu irmão, pelo primo, ela tem que conviver com toda essa situação. A violência se dá muito mais na criança do sexo feminino. Ficamos pensando, no trabalho que faço a nível da família constituída hoje na nossa sociedade, nas favelas onde as filhas que conheço carregam um, dois ou três filhos do seu próprio pai que mora na casa com sua mãe. É opressão, é violência! Como iremos tratar dessas questões? Como iremos tratar de questões como a que chamamos de gravidez de risco, se não refletirmos em torno do que significa ser vida? Vida, para nós, dentro da nossa visão filosófica, moral, cristã nos impede de fazer um aborto ou coisa parecida. Mas toda a sociedade está enquadrada exatamente nessa ética, nessa moral, nessa ercem neste momento, enquanto Constituintes, em garantir que haja alternativas que possam resolver situações tais que não atinjam indiretamente a nós, mas que atingem um número considerável de mulheres que estão sendo violentadas a cada dia? Não devemos cristalizar as posições nem fechar os caminhos que possam levar a uma alternativa. Só devemos trabalhar isso a nível da questão do Direito, não dá para trabalhar de outra forma. Temos o dever, hoje, neste momento constitucional, de garantir um avanço a nível desta discussão. Gostaríamos de fazer o nosso apelo de mulher, o nosso apelo de mãe, de avó, o nosso apelo de companheira, de esposa, o nosso apelo de irmã e de uma pessoa que vive a sua vida e tem todas as experiências de uma evangélica, de uma mulher que crê na vida, de uma mulher que defende a vida, que tem uma reflexão que leve em consideração todo esse complexo social em que cada uma de nós está vivendo. E a partir daí pensamos que vamos amadurecer e dar oportu- 99 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) nidade àqueles que, de uma maneira ou de outra, hoje estamos representando, e que querem ver inscrito na Constituição pelo menos algum artigo, algum parágrafo que lhe dê o direito de exercer a sua cidadania, de ter a sua garantia a nível de uma política de saúde que possa atender a mulher em toda a sua plenitude. Não podemos isolá-la desse processo. Não podemos deixar de reconhecer que quando estamos falando da vida, uma vida que está no útero de uma pessoa, temos de entender também todo o complexo que envolve essa pessoa. E a partir daí, então, vamos poder escrever com todas as letras tudo aquilo. E se, no final de todas as discussões entre nós, não chegarmos a um denominador comum, é muito importante que determinados temas levemos para o grande debate, o debate que se dará no seio da sociedade. Pode ser com perdas ou com ganhos, mas que não fechemos totalmente as portas, garantindo pelo menos, dada a situação que hoje já podemos visualizar, que não haja um retrocesso. Se não podemos avançar, que não haja também um fechamento das portas para a conquista que já tivemos, a nível de alternativas, e que possam atender mulheres no caso de estupro, que possam atender mulheres no caso de gravidez de risco. Nós, mulheres, sabemos o que isto significa para nós. (Muito bem! Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Roberto Augusto): – Pela ordem de inscrição, concedo a palavra ao nobre Constituinte lberê Ferreira. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, eu praticamente não tenho nenhum questionamento a fazer aos Srs. Conferencistas no dia de hoje. De certa forma concordo com tudo o que foi dito e explanado aqui. Eu queria inicialmente. Sr. Presidente, reportar-me aqui à feliz intervenção da nobre Constituinte Eunice Michiles, quando S. Ex.ª falou da importância da educação, fazendo com que o Governo inclusive possa levar um programa de educação alimentar a bom termo. Não somente concordo com a nobre Constituinte Eunice Michiles, como acho que é fundamental que nesta Constituinte possamos reestruturar realmente todo o processo educativo. Nós não devemos tratar somente do problema da educação alimentar, mas da educação sob todos os níveis, sob todos os aspectos, a educação no que diz respeito à saúde, à higiene, à alimentação, a tudo, enfim, porque a base de tudo isso é realmente a educação. Eu ouvi com muita atenção os questionamentos que foram feitos pelos Constituintes, inclusive o do Constituinte João de Deus Antunes, que disse que os valores estavam sendo substituídos pela televisão, pelo rádio, pelos jornais. Sempre nós voltamos ao problema da educação, da informação. As pessoas que trocam os seus valores pelos da televisão e do rádio, são pessoas que não têm realmente instrução, são pessoas que não tiveram acesso à educação, e sem consistência ficam realmente mudando de posição. Acho por isso mesmo que a educação é fundamental às mulheres para os meios anticonceptivos, enfim, tudo isso é fundamental a que tenhamos uma educação, um processo de informação em nosso País. Eu ouvi o Dr. Barbato falar da importância da alimentação. Eu queria apenas mostrar, concordando exatamente com ele, a importância do processo educativo. Eu tive oportunidade de, no meu Estado, dirigindo a Superintendência da LBA, coordenar um programa de creche para atendimento às crianças filhos de trabalhadores que estavam na emergência, na época de uma grande seca do Nordeste. E para as primeiras creches que nós fizemos tivemos de contratar pessoas que seriam encarregadas dessas creches, pessoas que recebiam orientação, que eram preparadas para trabalhar com as crianças. Mas como as coisas do Brasil sempre acontecem assim, em pouco tempo veio uma outra contra-ordem dizendo que era para instalar a creche, mandar comida, e não havia mais dinheiro para preparar as pessoas. E então tivemos a oportunidade de ver a diferença de uma creche – e eu falo em creche porque é um outro assunto que nós vamos debater aqui – que tinha uma monitora, que tinha uma pessoa preparada, que tinha recebido a orientação, que tinha criatividade, e de outra que era dirigida por uma leiga. Essas que eram dirigidas por leigas, depois de um certo tempo se transformaram num verdadeiro depósito de crianças. Nessa hora, nós vemos que a alimentação é necessária, mas é fundamental que tenham também instrução. Com toda deficiência de recursos, não tinha mais dinheiro para comprar pasta, escova, as outras improvisavam: tiravam a raspa do juá e faziam pasta, que tinha um valor fundamental. Elas improvisavam brinquedos, introduziam hábitos alimentares diferentes de outros que tinham na região, isso corroborando com o que foi dito pela nossa Constituinte Eunice Michiles. Então eu queria com isso mostrar a importância que tem realmente, e eu concordo inteiramente com a nossa Constituinte, a educação, a instrução na nossa sociedade. Queria dar uma palavra em favor também da luta das mulheres em busca dos seus direitos. Eu sou do Rio Grande do Norte. No Rio Grande do Norte foi onde essas primeiras conquistas se evidenciaram. Primeiro foi o voto feminino. A primeira prefeita constitucional foi eleita no Rio Grande do Norte; a primeira deputada foi também eleita no Rio Grande do Norte. Isto me vincula de certa forma à luta das mulheres para encontrar maior espaço na nossa sociedade. No que diz respeito ao assunto que realmente polarizou o debate, apesar de que talvez nem sequer vá constar do texto constitucional, que é o aborto, é evidente que eu, até hoje, me tenho posicionado a favor do aborto terapêutico, quando ocorre o risco de vida, e também na interrupção da gravidez por estupro. Não tenho uma posição firmada no que diz respeito ao aborto pela má formação fetal. Mas estou de acordo com a Constituinte Benedita da Silva, que falou há poucos instantes. Eu acho que nós não devemos fechar inteiramente essa questão. Eu acho que é uma questão tão séria, que envolve tantos problemas que envolve tanta coisa, que é necessário que nós possamos continuar. Não é possível que daqui para o dia seis tenhamos que esgotar o assunto, e tenhamos que dizer "sim" ou "não" a uma questão que mexe com tanta gente e com toda a nossa sociedade. (Palmas.) Então eu queria fazer estas colocações, esperando que estes debates possam continuar. Eu acho que nós estamos tendo não somente debates interessantes, importantes para a nossa Subcomissão, mas nós estamos também num processo de aprendizagem permanente, ouvindo pessoas que estão trazendo as suas posições, as suas opiniões, pessoas dos mais diversos segmentos da sociedade. Então nós não podemos ver somente sob uma ótica, nós estamos ouvindo as pessoas que convivem com os problemas sob diferentes óticas. E isso é importante para que possamos realmente ter uma posição firmada, e com isso apresentarmos, oferecermos à sociedade brasileira um texto constitucional mais próximo da aspiração de toda a nossa comunidade. Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – A minha interferência, neste momento, não é na qualidade de Relator. Eu gostei muito das colocações da Drª Eleonora, quando ela coloca o problema do direito ao corpo, o direito que a mulher tem sobre o seu corpo como um direito do cidadão. E talvez essas questões tenham que ser assumidas, exclusivamente pelas entidades feministas, porque é possível que esses aspectos não digam respeito tão inteiramente às pessoas de sexo masculino. Mas sob esse ângulo, dentro desta ótica, eu até posso inscrever-me no Conselho dos Direitos da Mulher, porque me coloco inteiramente favorável a esse tipo de enfoque. E aqui, só para descontrair um pouco, dei a ela razão não só pelo aspecto poético, mas até pela afirmação do poeta popular, quando indaga: "quem sou eu para ter direitos exclusivos sobre ela?". De sorte que, dentro desta ótica, é evidente que tudo passa pelo processo educacional. As colocações do Dr. Daniel estão perfeitamente incluídas neste contexto, sempre dediquei a minha atividade profissional ao setor da educação, pois considero que o problema número um do País é educacional. Vejam bem: eu tinha feito esta anotação, a Drª Eleonora, numa resposta, disse quase exatamente o que eu tinha escrito. Quem conhece perfeitamente o funcionamento, os mecanismos biológicos, quem tem capacidade para decidir o momento da concepção, é evidente que não precisará nunca recorrer a um aborto, por exemplo, porque terá exercido uma decisão que não lhe permitiu uma gravidez. Agora, dentro desta colocação, eu concordo inteiramente. E acho que aí está o caminho para ser seguido. É evidente que este não é um caminho que vá ser indicado na Constituição. Como a maioria dos problemas brasileiros, não é o texto constitucional que vai resolver isso, porque se o texto constitucional pura e simplesmente resolvesse o problema, nós não teríamos quatro, cinco ou sete milhões – o número aí varia conforme a fonte estatística – de crianças inteiramente fora do processo educacional, fora da escola, marginalizadas. A Constituição, desde 1891, já previa a educação como sendo obrigatória. Isso nunca foi cumprido e não se tem sequer nos textos legais, a possibilidade de argüir quem é responsável por isso. De sorte que, mesmo considerando todas essas questões, eu vou mais diretamente a essa questão do aborto terapêutico ou do aborto provocado por uma violência. Ninguém, senão as pessoas ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) diretamente envolvidas nesta questão, pode, de bom juízo, decidir a esse respeito. (Palmas.) Eu considero esse um aspecto semelhante ao problema da eutanásia, que é também uma grande questão moral que se discute. Na questão da eutanásia talvez as coisas sejam mais fáceis, porque uma pessoa que está em vida vegetativa, muitas vezes sem nenhuma chance de recuperação, às vezes anos a fio em cima de um leito, ela traz uma história, ela traz um conjunto até de emoções inter-relacionadas com as outras pessoas, e a tendência natural é que ninguém quer a prática da eutanásia num parente, num amigo, numa pessoa próxima, sempre na esperança de uma melhora, quando do ponto de vista científico está inteiramente fora de possibilidade de melhorar. Mas esse conjunto de coisas faz com que as pessoas pensem: vamos nos agarrar ao último fio de esperança. Agora, vamos considerar nas pessoas que estão diretamente ligadas a nós, por exemplo, uma gravidez provocada por um estupro. Muito bem, é a defesa à vida, eu concordo com essa concepção. A defesa à vida deve ser um princípio geral pelo qual se deve lutar em todos os aspectos. Vamos colocar isso um pouco em nós mesmos, que o fruto daquela gravidez provocada de uma forma violenta vá trazer pela sua vida afora, se aquela vida vingar, tantas e tantas conseqüências. Eu acredito que só a pessoa envolvida na questão é que pode decidir isso. Não sei qual seria a minha posição se uma filha minha, se minha mulher surgisse grávida dentro de um processo desses, eu não sei. E olhem que não tenho preconceitos exagerados. Eu, por exemplo, tenho uma filha adotiva, filha de mãe solteira; eu lhe dei o meu nome, o nome da minha mulher: procuro ser tão liberal que na época que pude, em função de condições legais, adotá-la, ela já tinha compreensão de que não era minha filha, e já conhecia toda a história. Eu deixei então que ela decidisse qual o nome que ela queria usar, e, para grande alegria e contentamento meu, ela quis usar o meu nome. De sorte que não tenho esse tipo de preconceito, mas eu não fui atingido por um problema dessa ordem. Se for, como eu me colocaria diante de uma lei que impedisse inteiramente uma decisão consciente de não dar continuidade àquela formação biológica? Então, considerando a questão sob esse ângulo, é a minha opinião pessoal, e fiz questão de diferenciar a minha posição pessoal da de Relator, porque tenho compromisso com esta Comissão, vou, no meu parecer, traduzir ao máximo possível as opiniões médias. Mas dentro da minha convicção pessoal, não vejo como a lei possa proibir uma decisão dessa envergadura. Concordo que esse não é um detalhe para surgir no texto constitucional. Estamos aqui repensando a sociedade, e naturalmente que os debates, as idéias, as proposições aqui discutidas podem não refletir no texto constitucional, mas poderão refletir nos textos ordinários subseqüentes. Então acho que a discussão é plenamente válida. Acredito que esta decisão só pode ser tomada pelas pessoas envolvidas. É a mesma questão da gravidez de risco. Quem pode tomar essa decisão se não as pessoas envolvidas? Conheço casos de pessoas que assumiram o risco e que se deram bem. Também todos nós conhecemos decisões cujo resultado foi negativo, muitas vezes perdendo-se a vida do feto, da criança, e perdendo-se, também, a vida da mãe. Quantos e quantos casos a literatura médica não registra essas questões? Como nós decidirmos que não? Não pode é de uma contravenção fazerse um aborto terapêutico; a mulher tem que assumir todo o risco; isso poderá refletir inclusive na sua descendência. Se ela tiver outros filhos que precisam da sua vida, da sua companhia, da sua assistência não estamos valorizando um aspecto, mas desprezando outro? Então, na minha convicção, a lei não pode tirar a possibilidade de que as pessoas informadas, culturalmente em condições, possam tomar essas decisões, ou seja, nós não podemos, em absoluto, fazer – e aí concordo inteiramente com a colocação da Constituinte Benedita da Silva – com que a nossa convicção impeça outras pessoas de tornarem decisões que lhes digam respeito única e exclusivamente. Vejam que tudo isso eu falo dentro de uma concepção e de uma filosofia de vida que tenho. Acho que o direito e a liberdade de cada um cessa na hora em que interfere no direito e na liberdade do seu próximo. E é dentro dessa concepção que depois de muito refletir, de muito analisar, de conversar, de indagar, neste presente momento, tenho a minha convicção de que o aborto não deve ser genericamente legalizado. Disso estou convencido, porque do contrário nós estaríamos permitindo que se produzisse uma verdadeira desorganização da sociedade, a promiscuidade, a indústria, tudo isso iria naturalmente influenciar o comportamento coletivo. Mas nos casos em que isto represente um risco, ou represente um dano moral grave de uma gravidez adquirida contra a vontade da mulher, acho que a lei não pode proibir. Esta é a minha opinião, e, nesse aspecto, eu concordo com as colocações da Drª Eleonora, como concordo, também, com as colocações do Dr. Daniel Barbato. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BONKOSKI: – Sr Presidente, quero fazer algumas observações sobre todo o tema já desenvolvido, analisando todos esses direitos expostos no movimento das mulheres brasileiras. Quero deixar bem claro, Drª Eleonora e senhoras presentes aqui, minha ilustre Constituinte Eunice Michiles, que tenho defendido através dos anos direitos iguais para a mulher, direitos que se caracterizam sempre pela harmonia, pelo diálogo. Existe um certo machismo: para onde o homem vai, a mulher tem que ir. Eu assim não concordo. Acho que tudo deve ser em função de um entendimento, onde se observe o melhor para o casal. E para que haja esse entendimento, é evidente que se exige um nível cultural, um nível instrutivo para o homem e para a mulher. Um exemplo. quando os meus filhos eram pequenos, eu fazia a minha programação de fim de semana em comum acordo com a minha esposa, para qualquer lugar. Na medida que eles foram adquirindo a primeira adolescência, a segunda adolescência, eu passei a exercer o diálogo com eles, perguntando: interessa a vocês fazerem um fim de semana na praia, ou no campo, ou coisa parecida? Então tem que se caracterizar todos os direitos dentro do diálogo. Temos que ser realistas, nós vivemos num País subdesenvolvido. 100 Eu apresentei um projeto à Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, que está em tramitação, que serve para o Brasil. Temos que nos preocupar com o nível cultural do nosso povo, com a qualificação profissional. O bóia-fria, como nós chamamos, é aquele que procura qualquer emprego para ganhar, talvez, nem o necessário para sua sobrevivência e da sua família. E assim acontece porque ele não tem uma profissão qualificada. A mulher, da mesma forma. Quero deixar bem claro até que ponto defendo a posição da mulher na comunidade, na sociedade brasileira. Eu quero, sr. relator antecipar uma proposta que defendi em campanha eleitoral, nos palanques, de dar uma assistência financeira para a mãe abandonada, para a mãe desquitada, para a mãe viúva, para a mãe solteira, essas quatro classes que hoje saem de casa e não tem creche perto para deixar os seus filhos, ou não tem creche no seu município; saem em busca de algo, qualquer serviço para conseguir um mínimo de alimento para os seus filhos, e conseguem com dificuldade. Como a própria doutora convive na periferia, e tem uma vivência permanente com a periferia, tem uma vivência permanente com as classes sofredoras deste País, com as favelas que são a grande maioria, então fico analisando, meditando: o nosso mal é econômicofinanceiro, mas antes deste mal, é cultural. Temos que sair para um programa organizado. Nós já falamos, já discutimos nas reuniões anteriores que temos de nos servir dos meios de comunicação. Sou homem de comunicação, tenho rádioemissora, sou um radiodifusor, tenho usado a minha rádio para esses programas. Mas nós temos que fazer isso a nível nacional. Por que tanta novela, que destrói a família? Por que nós não lançamos programas instrutivos, educativos, anticonceptivos de toda a natureza, evidentemente motivados para que despertem o interesse de quem está ouvindo de quem está assistindo? Entrando no campo do aborto, sou radicalmente contra o aborto, Drª Eleonora, mas diante de tantas apresentações, de tantos esclarecimentos, de tanta luz que nós já tivemos, hoje eu reflito sobre o aborto provocado ou por estupro, como também o terapêutico. Dr. Barbato assisti várias vezes a regressões hipnóticas. Há pouco o Presidente, nosso Constituinte Nélson Aguiar, se referia aos menores carentes, abandonados, sem nome, que nós temos aos milhões, sem escola e que são futuros marginais, futuros criminosos. Mas nós também temos criminosos economicamente estáveis, em situação até invejável. Recentemente em São Paulo, dois japoneses esfaquearam aquela criança de família economicamente boa. Então eu assisti a várias sessões dentro de clínicas especializadas de regressão hipnótica. Os traumas que cada um traz desde a vida intrauterina, talvez fruto de um estupro, pode provocar um criminoso em potencial amanhã. Por isso, meu caro relator, aquela análise da Constituinte Benedita da Silva nós temos que repensar, temos que trilhar esse caminho, analisar mais profundamente. Eu sou pelo texto frio na Constituinte da não adoção do aborto. Agora, ou pelo estupro, ou terapêutico, eles devem ser discutidos mais profundamente. Agora, eu defendo o entendimento da mulher sobre os direitos iguais, sobretudo a qualificação 101 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) profissional dentro de um nível. Tem que haver um programa nacional para esse desenvolvimento. A qualificação, a cultura, o rendimento, a retribuição do seu trabalho deve ser igual para a mulher em comparação ao homem. Por isso, Dra. Eleonora, pelo que ouvi nas suas explanações, pelo programa do Movimento das Mulheres do Brasil, que já tomei conhecimento, eu louvo esse trabalho e sou um Constituinte, um cidadão que está ao lado das mulheres na defesa de todos os seus direitos, porque todos somos iguais perante Deus, e temos que colocar Deus acima de nós. O SR. DANIEL BARBATO: – Sr. Constituinte, eu queria colocar dois pontos de vista, em relação a certos erros de expressão, em Medicina. Por exemplo: aborto terapêutico, esse termo já foi riscado da Medicina moderna. Terapia é para tratar, curar, e o aborto terapêutico mata. O que hoje se chama de aborto terapêutico é a incompatibilidade materno-fetal. E essa incompatibilidade materno-fetal está diminuindo tanto quanto mais se aperfeiçoa a parte técnica da Medicina. Existem esses problemas na Medicina, mas tornou-se raro. Hoje, levamos uma incompatibilidade maternofetal pelo espaço que quisermos, através da limitação pareteral. Outra expressão é a chamada gravidez não desejada. Exceto no estupro, toda gravidez é desejada. E esse termo também não existe. O que existe, hoje em dia, é gravidez não planejada. E hoje, com esse arsenal de que dispomos quanto à concepção, a mulher só fica grávida quando quer ou quando é incompetente na administração do seu corpo. Se queremos um corpo funcionalmente normal, equilibrado, temos que administrá -lo muito bem. O que nós temos que fazer, Sr. Constituinte, nós, educadores, é orientarmos a mulher brasileira, que não conhece o próprio ciclo menstrual, como o homem também não se conhece. Não é só educar a mulher não, o parceiro também precisa ser educado, porque não raro, Sr. Constituinte, nesse trabalho que faço na periferia de Brasília – e conheço toda a nossa periferia, não estou falando baseado em livros, estou baseado na vivência que tenho – o que nós temos que fazer e educar, é mostrar que existe um método fisiológico, que, competentemente administrado, tem uma porcentagem muito alta a ser acertada. Quando o casal é preparado, orientado e respeita aqueles dados básicos e, de época em época, de dez em dez, de quinze em quinze dias, é visitado por um agente, nós não temos dúvida que vamos obter resultados muito bons com esse dado geral. Com relação aos comprimidos, nós temos que alertar a paciente de que, além de tratar-se de hormônio, são agressivos à saúde da mulher. A mulher paga um preço muito caro, quando utiliza comprimidos e ninguém fala nisso; surge uma irritabilidade, sua pele vai ficando pardacenta e opaca. Depois, essa irritabilidade se traduz em cima do filho e do marido, além de ser acompanhada por várias lesões, cardiopatias de natureza grave, hipertensão, insuficiência cardíaca, a própria diabete e os tumores. A mulher que usa comprimido está mais sujeita a essas patologias do que as que não usam. Isto está comprovado cientificamente. Outra coisa, Sr. Constituinte, é a dificuldade de se definir quando começa a vida. Nós que trabalhamos em microscópio e fazemos a união do espermatozóide com o óvulo, mostramos para os nossos alunos que, a partir de umas 30, 36 horas após a formação do ovo, apare ce uma energia, essa energia é vida. Nós, que estamos acostumados a observar, ficamos arrepiados ao ver a vida aparecer ali. E o interessante é que, nas primeiras fases do desenvolvimento celular, a célula se multiplica sem aumentar de volume, sem receber nada da mãe, a partir de um certo momento é que ela passa a exigir o aparecimento de substâncias nutridoras para o seu desenvolvimento. Então, são conceitos que temos que estudar, temos que ser sinceros com as mulheres, mostrar para elas os prós e os contras, as vantagens e desvantagens. Agora, elas, como pessoas humanas, depois de mostrado cientificamente tudo, e não depois de dar comprimidos de forma indiscriminada, não fazer a opção delas. Esse é um direito inalienável de toda pessoa, é o respeito à sua existência como pessoa humana. O Sr. compreendeu, Constituinte? Queria chamar a atenção para isso, porque, nós que estudamos em laboratório, temos dedicação exclusiva. Eu não saio correndo para outro emprego, não tenho outro emprego, eu mostro o início da vida. O Sr. desculpe a minha veemência, mas defendo os meus pontos de vista cientificamente. Quero que uma pessoa me explique cientificamente até o aborto do estupro, um estupro com gravidez é raríssimo, em medicina. O SR. CONSTITUINTE ERWIN BANKOSKI: – Permita-me uma observação? Essa experiência do acasalamento é feita em laboratório? O SR. DANIEL BARBATO: – É! Trabalhamos no melhor laboratório de Citologia de Brasília, Sr. Constituinte. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – O Sr. veja o seguinte: se nós tivéssemos uma interpretação tão rigorosa das coisas esse tipo de experiência deveria ser proibido, porque a partir do momento em que houve essa junção, e houve energia, tinha vida, então, cancelar essa experiência seria, numa concepção mais rígida, pôr fim à vi da. (Palmas.) O SR. DANIEL BARBATO: – Mas, Sr. Constituinte, o Sr. me dê condições científicas e eu continuo a vida da pessoa. Agora, tem que me dar condições científicas. O SR. CONSTITUINTE ERWIN BANKOSKI: – Eu não discordo desse aspecto. Só estou querendo mostrar o seguinte: que esse conceito não podemos, absolutamente, a meu ver, levar às últimas conseqüências, porque existem outros aspectos que envolvem; como o aspecto do próprio íntimo da pessoa. Quer dizer, eu concordo inteiramente com todas as suas colocações menos com esse rigorismo na parte, por exemplo, de considerar que é um crime interromper uma gravidez provocada por um outro crime, que é um estupro. O SR. DANIEL BARBATO: – Sr. Constituinte, eu respeito o ponto de vista das pessoas, mesmo que elas não participem desse ambiente. O meu trabalho é um trabalho sério, eu pesquiso e os meus argumentos não são combatidos cientificamente. Eu quero um combate científico. E me coloco à disposição do Sr. para conversarmos sobre este assunto durante horas e horas, porque eu tenho um conceito de ensino: só aprende quem participa. Quem não participa não aprende. Além disso, temos que ter uma carga horária de aprendizado, sem tempo não há aprendizado. É por isso que mostro para os meus alunos tudo o que a anatomia pode mostrar para que sejam bons médicos. Eu ensino com disserações, disseco vaso por vaso, nervo por nervo, estrutura por estrutura, para que eles vejam, porque essa memorização visual raramente se encontra hoje em dia. O SR. CONSTITUINTE ERWIN BANKOSKI: – Dr. Barbato, apenas para deixar bem clara a minha posição, acredito que não fui, em nenhum momento, contra essas suas colocações. Eu me detive em analisar as conquistas e a igualdade da mulher, mas, dentro desses aspectos, estou inteiramente de acordo com o Sr. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – O nosso tempo já está bastante avançado, e temos três pessoas da assistência que se inscreveram para fazer as suas perguntas. Aqui há a idéia de estipularmos um tempo de dois minutos para cada uma. Temos a Drª Marília Largura, Professora da UnB; Ana Liese Turler, da UDF; e Carmem Maria Souto, Historiadora. Nós vamos então... O SR. CONSTITUINTE ERALDO TINOCO: – Relator – Sr. Presidente, dado o adiantado da hora, eu sugiro que as pessoas que têm i ntervenção a fazer fizessem conjuntamente e, depois, as respostas seriam dadas globalmente. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Fariam então, as três perguntas, cada uma por sua vez, e se daria oportunidade aos dois debatedores para responderem no tempo certo. Pela ordem, nós temos a Drª Marília Largura. A SRA. MARÍLIA LARGURA: – Queria me apresentar rapidamente. Sou Professora da UnB, na área de obstetrícia, sou enfermeira, parteira, e passei 25 anos da minha vida na maternidade, no berçário, defendendo concretamente a vida humana. E essa defesa da vida humana me toca e me emociona. Então, não vou falar sobre todos os assuntos que aqui foram falados, mas apenas sobre um que não foi tocado, e que acho que a Comissão tem que tomar conhecimento para decidir so bre o assunto, que é o seguinte: eu pergunto ao nobre Constituinte se S. Ex.ª sabe que milhões e milhões de dólares são injetados anualmente, no Brasil, na contracepção? Então, esse fato tem que ser estudado profundamente por esta Comissão. E eu pergunto: por que esses milhões de dólares compram as consciências dos nossos chefes de cadeiras de obstetrícia de todo o Brasil? Qual a razão? Será que eles nos querem poucos e fracos? Uma população pequena, para que possa ser dominada? Então, gostaria que a Comissão estudasse também as pesquisas feitas pelo Ministério da Saúde, no ano passado, que mostram claramente que há uma queda brutal no coeficiente de natalidade do povo brasileiro. São pesquisas feitas seriamente e que já mostram uma queda muito grande de nascimentos no Brasil. Esse aspecto, que considero de segurança nacional, deve ser encarado com seriedade por esta Comissão. Os nossos vazios territoriais, mais cedo ou mais tarde, vão ser ocupados, se não por brasi - ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) leiros, por outros povos estrangeiros. Esses vazios vão ter que ser ocupados um dia. Então, este é um assunto muito importante. Vejo que há uma confusão entre cessária, aborto, estupro, quer dizer, são coisas muito confusas que são jogadas nesta Comissão. Será que vamos ter uma visão global do povo brasileiro, ou será que vamos ficar em coisas mais particularizadas? Era isso que eu queria trazer como subsídio Comissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra a Srª Ana Lieser Toler. A SRA. ANA LIESER TOLER: – Quero me apresentar também; sou filósofa e professora universitária e, num primeiro momento, queria dizer da minha esperança ao acompanhar o trabalho desta Comissão, ao constatar a abertura que os Srs. Constituintes colocam e o espaço que abrem para se discutir essa questão. Uma questão que tem toda uma complexidade e apresenta, por um lado, muitas dificuldades e riscos e, por outro, também possibilidades de não nos cristalizarmos em posições, de todo um aprendizado. Várias intervenções aqui contribuíram para isso. Eu queria registrar, inclusive na condição de filósofa, que a reflexão que se faz, que se desenvolve, pode ser basicamente – reduzindo a uma expressão mais simples – metafísica, como era própria da filosofia medieval; uma reflexão que se faz fora do tempo, fora do espaço, ou uma reflexão como desejamos levar a frente e que acreditamos que tem que respaldar a nossa Constituição, que se desenvolve a partir de um determinado momento histórico, de uma determinada realidade social. Quer dizer, a sociedade é sempre marcada, histórica e socialmente. Bom, qual é, enfim, a realidade essencial da sociedade brasileira? Ela é uma sociedade estratificada em classes. Como a Srª que me antecedeu falou, vamos expressar a totalidade da sociedade brasileira? Ou vamos, – uma grande preocupação que temos, na questão do aborto e em todas as demais questões – elaborar uma Constituição que vai expressar o desejo e a condição de um segmento privilegiado? Por que nós estamos preocupados em que a Constituição se constitua num instrumento de transformação e que traduza os anseios da totalidade da sociedade brasileira. Na medida em que queremos estruturar uma sociedade mais igualitária e democrática, o direito de escolha, – então voltando especificamente à questão do aborto – que hoje é privilégio de um pequeno segmento de mulheres, seja estendido a todas as mulheres brasileiras, como, inclusive, condição para o exercício de cidadania plena, de qualidade de vida mais digna, enfim, como direito à saúde integral, que ela deve ter. As dificuldades que vejo na reflexão e análise do problema são de nos refugiarmos em formalismos, e também numa metafísica, e numa discussão bisantina. Quer dizer, quando é que a vida humana começa? Se nós vamos nos reportar à célula-ovo, eu posso ainda anteceder mais, porque o óvulo é uma célula, é vida também, o espermatozóide já é vida também. E, se vamos nos escorar numa defesa do valor absoluto da vida, ao mesmo tempo convivendo com a desqualificação cotidiana da vida, através de oito milhões de menores, que estão pelas nossas ruas, em torno de 70% da população, que vive em graus diferentes de desnutrição, fica difícil levarmos adiante esse discurso e essa análise. Então, na questão do aborto e, transcendendo essa questão, em todas as demais que deverão estar contempladas na nossa Constituição, eu chamaria a atenção para a elaboração de um texto constitucional que tomasse como referência a realidade da sociedade brasileira e não princípios abstratos e metafísicos que existem na estratosfera, que estão desenraizados. Era isso. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Ne lson Aguiar): – Queria passar a palavra para a Sra. Carmem Maria Souto. Mas, antes faço referência, com alegria, aos nomes de Elmar Potrates, Prefeito de Santa Leopoldina, no Estado do Espírito Santo. Uma antiga, colonial e aprazível cidade daquela terra, que deve ser visitada especialmente por aqueles que querem descanso bem sossegado, nas montanhas aprazíveis do Espírito Santo, e de Solange Amorelli, que o acompanha. Concedo a palavra à Sra. Carmem Maria Souto. A SRA. CARMEM MARIA SOUTO: – O que eu queria levantar aqui é que a discussão girou muito em torno de aborto por estupro ou terapêutico, quer dizer, quando a mãe corre o risco de vida. Isso existe na Constituição atual. Agora, eu queria que a discussão fosse além, porque existe aborto, também, quando os métodos contraceptivos falham. É indiscutível o grande número de abortos feitos neste País e a gente, mais uma vez, nesta discussão, está negando a existência de milhões de mulheres que o fazem diariamente e milhares que estão morrendo por falta de assistência. Sei que a questão do aborto não deveria entrar como texto constitucional, mas não se deveria fechar, para que isso entre como uma legislação extraordinária. Eu acho que temos que nos preocupar com isso aqui, e não cair nesse falso moralismo em que a sociedade brasileira vive até hoje, porque as coisas existem, estão aí, estão acontecendo à nossa frente e nós estamos negando. É disso que tenho medo, de que aqui fiquemos nessa discussão de falsos moralistas, de que aborto não pode, aborto pode, enquanto todos o praticam. Todos nós temos pessoas na família ou amigos que já o fizeram. A gente sabe disso e está pagando e só quem é penalizado pelo aborto é a empregada doméstica, que não vai ter condições de pagar um bom hospital, um bom médico, com toda assistência, correndo até o risco de morrer ou de ser presa caso seja surpreendida numa situação dessas. Então, é em torno disso que fica aqui a minha questão e queria levantar para os Srs. Constituintes algumas perguntas como; por que os homens penalizam o aborto? Isso é para se refletir. Os homens, penalizando o aborto, por que engravidam as mulheres tão irresponsavelmente, como acontece, e sem dividir essa responsabilidade? Porque o aborto fica sendo sempre uma responsabilidade feminina, quando deveria ser dos homens e das mulheres. E, a quem interessa a criminalização do aborto e por quê? Interessa a que grupo? A manter o quê? Estamos mantendo o quê? 102 Para mim ficam essas questões e a preocupação de não se ficar com essa discussão falso-moralista, porque existe o aborto, ele está aí, e nós o estamos negando, a não ser em casos de estupro ou terapêuticos, como já foi dito. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem. Passaremos, então, a palavra aos nossos debatedores. Mas só queria lembrar um fato: eu tenho muito medo de uma coisa que ocorre na sociedade brasileira. Há palavras que estão virando mitos. Houve tempo, neste País, em que alguém, para ser olhado de forma diferente e atingido por determinadas ações do Governo bastava ser chamado de subversivo. Então, a palavra "subversivo" tinha se transformado num mito, numa verdade absoluta para aqueles que pichavam as pessoas de subversivas. Hoje há determinadas figuras que consideram fatos. Retrocesso, por exemplo, é uma outra palavra mitificada. Ah, mas isso é um retrocesso! Antes de se examinar se de fato é um retrocesso, ela passa, para as pessoas, a significar retrocesso mesmo, só porque determinadas figuras, conhecidas neste País, acharam por bem empregar o termo retrocesso. A questão, por exemplo, do falso moralista. Acho que temos que discutir o próprio termo "falso moralista". O que significaria isso? Porque, também, nós estaríamos passando para uma avaliação subjetiva. E acho que nesta questão divergimos: a quem interessa não legalizar o aborto? Considerando, por exemplo, que nos Estados Unidos, no ano passado, fizeram cerca de 1 milhão e 800 mil abortos, e que, através da rede de clínicas hoje espalhadas por todo aquele país, correu qualquer coisa em torno de 8 bilhões de dólares, – que dariam para tirar o Brasil desse sufoco em que se encontra – considerando também que, em países da Europa, como a Inglaterra, já ocorre o desatino de se alugar mulher para ficar grávida e depois tirar o filho do seu ventre para atender determinadas indústrias de cosméticos. Então perguntaríamos: qual é o interesse que, também, está atrás da legalização? Por quê? Temos que entender que esta sociedade é capitalista, e tudo que se faz, hoje, se faz em função do uso do dinheiro. E aí é que está a grande questão que precisa ser discutida. Porque, vejam bem, talvez tivéssemos razão de encaminhar a discussão por outro caminho, a partir do instante em que tivéssemos uma rede médica neste País, dos órgãos da Previdência, colocada à disposição de todas as mulheres, para que elas pudessem se examinar, se curar e etc., etc., etc. Mas, eu fico espantado quando sei que, no meu Estado, há duas clínicas cujos médicos, com o aborto não legalizado, ficaram muito ricos e um deles foi até Secretário da Saúde. Ficou muito rico com o negócio do aborto. Também, sabemos que, lá atrás, estão as multinacionais interessadas em vender pílulas. Acho que a questão precisa ser travada dentro dessa contextura da sociedade brasileira. Se situarmos a questão só em torno de: se deve ou não fazer o aborto? Se ficarmos contra, estaremos agradando a alguém, se ficarmos favoráveis, estaremos fazendo o jogo de alguém também, e alguém que está interessado numa coisa muito grave que existe hoje: dinheiro, capital, fortuna, bem- 103 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) estar. É esta a coisa que me parece passível de uma boa discussão. A SRA. CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Sr. Presidente, numa sociedade anônima, tem mais direito a votos quem tem mais ações. No processo da reprodução humana, quem é que tem direito a voto? Com o que entra a mulher e com o que entra o homem? A mulher entra com a concepção, 9 meses de gravidez, com o aleitamento, quer dizer, tudo é por conta dela. E faria uma pergunta: com o que entra o homem? Com 10 minutos e olhe lá. Bom, estou dizendo até em tom de brincadeira, mas não seria injusto se as mulheres da Constituinte tivessem direito a 10 votos nas questões concernentes à concepção. É um assunto feminino. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mas eu acho que 50%, nobre Constituinte, tem igual parcela do amor. E, nesse caso, eu não gostaria de ver o homem, que é um companheiro do amor, ser apresentado como o réu da relação sexual e da concepção. A SRA CONSTITUINTE EUNICE MICHILES: – Mas ele é um parceiro minoritário, não há a menor dúvida, nessa questão de decidir o que deve ser feito a respeito da concepção. Agora, é claro, evidentemente, que estamos falando até em tom de brincadeira, sem nenhuma dúvida. Concordo com a moça que falou por último, de que é uma questão de decisão muito mais feminina. Se houver discordância, cabe à mulher decidir, porque é um assunto que diz respeito a ela. É muito fácil legislar quando a pimenta está nos olhos dos outros. É muito fácil se conversar e ditar regras quando aquilo não lhes atinge diretamente. Mas, é apenas em tom de brincadeira e eu não quero ocupar mais o seu tempo. Muito obrigado. O SR. CONSTITUINTE ERVIN BANKOSKI: – Sr. Presidente, queria falar rapidinho. A SRA. CARMEN MARIA SOUTO: – Fez a pergunta a nós Constituintes e eu gostaria apenas de, sucintamente, dizer alguma coisa, não só a ela mas às outras Sras. também. Ela fez uma indagação: por que o aborto é tão combatido? Simplesmente porque é crime. Eu, num pronunciamento que fiz na Assembléia Legislativa do meu Estado, em 1983, – pronunciamento que distribui para os companheiros desta Subcomissão – analisei esses aspectos. Existem, efetivamente, milhares e milhares de abortos clandestinos, como também existem seqüelas desses abortos. Agora, combatemos não pela legalização, em absoluto, é pelo esclarecimento, pela instrução, é por aquilo que já falei há pouco: levarmos a cultura, a educação, a instrução ao povo brasileiro. Os riscos que a mulher tem, ao fazer o aborto. Falou-se da empregada doméstica. Ela tem uma cultura restrita, não tem esclarecimento. Agora, o aborto que foi ventilado por aquela Senhora, dizendo que o óvulo é vida, o espermatozóide é vida, quando os dois se encontram, aí é que passa a ter uma vida humana, a partir dessa concepção. E se existe a responsabilidade da mulher na gravidez, salvo em caso de estupro, é porque existe a vontade de dois num ato sexual. Então, fica bem caracterizado que não é por ato sexual que a mulher depois vai fazer o aborto, é porque ela quis. Então, deixo bem clara a posição de que, em primeiro lugar, o aborto é crime; e em segundo lugar, os abortos clandestinos devem ser combatidos pelo esclarecimento, pela instrução e pela cultura. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Vou usar da palavra pela última vez e queria sugerir a esta Subcomissão que incorporasse ao relatório do Sr. Relator, que não cabe – vez que estamos discutindo, primeiramente, a questão de proteção à mãe, à gestante e à família – não cabe ao Estado definir ou implementar política de população. Ou seja, não cabe ao Estado definir uma política de controle da natalidade. Cabe ao Estado resguardar e respaldar um programa de assistência integral à saúde da mulher. E, dentro desse programa, um de planejamento familiar, que é do interesse da mulher. Porque o planejamento familiar cabe, única e exclusivamente, à mulher e ao homem. E, à mulher, quando for sozinha. Acho que é uma questão fundamental para se poder entender outras questões que são decorrências dessa. A outra questão que eu queria colocar, é que, em relação às pesquisas em mulheres, acho que, tanto um movimento como o Conselho Nacional da Condição Feminina, como um canal de intermediação de movimento, tem se preocupado e, na I Conferência Nacional de Saúde e Direitos da Mulher, – discussão que aconteceu aqui em Brasília, em outubro do ano passado – essa questão foi muito discutida, ficando como síntese do debate mais ou menos a seguinte questão: regulamentar, fiscalizar e controlar as pesquisas desenvolvidas em seres humanos, ou seja, as pesquisas que são feitas tendo as mulheres como cobaias, para efeito de contracepção, têm de ser fiscalizadas, regulamentadas, para que não se abuse e não se – use como eu disse primeiramente – os corpos femininos coma cobaias, como laboratórios de pesquisa. Porque também é muito perigoso, de uma forma generalizada, se proibir qualquer pesquisa ou qualquer financiamento externo para pesquisas no Brasil, para pesquisas em universidades. Acho que tem que ter cautela, temos que fiscalizar, controlar e regulamentar através do órgão público. A SRA. MARILIA LARGURA: – Só um minuto. Eu não falei desse tipo de pesquisa. Eu falei, sim, que essa pesquisa foi que provou que há queda muito grande, não em mulheres, mas a nível populacional. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Não a Srª falou em duas, falou de duas pesquisas, a primeira da universidade produzida em... A SRA. MARILIA LARGURA: – A única pesquisa que citei foi a do Ministério da Saúde, que prova que há uma queda muito grande da natalidade. Foi a única pesquisa a que me referi. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Sim, mas estou adiantado, em função dos recursos estrangeiros que a Srª disse que têm chegado às universidades. A SRA. MARILIA LARGURA: – Os recursos são para abortos e contracepção. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Exatamente, para abortos e contracepção.* A SRA. MARILIA LARGURA: – Eu quis dizer – não expliquei bem – é que esses dólares que entraram é que provocaram essa taxa grande de queda do índice de natalidade. A SRA. ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Aí discordo. Queria, por fim, recolocar as palavras da Srª Bené e as palavras da Constituinte Eunice Michiles, em função do seguinte: acho extremamente séria essa questão da discussão do aborto pela sociedade civil. Discutir o aborto não significa a legalização do aborto. Discutir a questão do aborto como saúde pública, hoje, no País no qual vivemos, onde convivemos com o problema, e assumir uma realidade concreta, como as duas colegas colocaram muito bem. Não discutir é outra vez manter a invisibilidade, a hipocrisia, a falsidade, que permeia, ao longo da História, a nossa sociedade. E não é só pelos homens. Compartilham também dessa hipocrisia muitas mulheres da sociedade brasileira. E, a questão que eu gostaria que fosse colocada, para aprofundarmos na discussão dessa questão tão polêmica do aborto, é a questão do direito à escolha. Se o aborto é proibido, aquela que o desejar fazer, por querer interromper uma gravidez por ter sido estuprada, por má formação fetal, ou por gravidez de alto risco para si, não poderá. Então, é uma questão para a qual temos que ter sensibilidade, como mulheres, para podermos também sabermos enfrentar a discussão. E, como a própria Bené falou, não polarizarmos, porque a polarização não leva a nada. É exatamente a minha colocação, quando digo que acho difícil, por mais que eu concorde com a posição em relação a ser uma discussão metafísica. Acho que é uma discussão muito difícil de ser feita, porque entra em posição absolutamente divergente, que é a posição teosófica, quando é que há vida. Acho que temos que ter uma sensibilidade, um discernimento, uma seriedade na discussão do aborto, porque ela vai permear inúmeras discussões na Subcomissão. Acho que devemos enfrentá-la pelo lado do direito à escolha. Ninguém pode ser proibido de ver o Je vous Salue Marie, e assisti-lo em salas fechadas. Então, proibe-se o aborto nas. Quem tem dinheiro está com todas as condições e quem não tem faz naquelas condições que já coloquei. Tenho uma posição, enquanto feminista, enquanto mulher, enquanto filha, enquanto mãe, em relação ao aborto, que é, sem dúvida nenhuma, a questão da legalização do aborto como direito à escolha. Mas é uma posição minha, individual. E essa questão da discussão não pode ser deslocada da questão dos direitos reprodutivos. Porque, se for deslocada da questão dos direitos reprodutivos, ela polariza e não avança. Então, era a minha última fala exatamente nesse sentido. E espero que tenha podido contribuir para alguns esclarecimentos nesta Subcomissão. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Queremos agradecer-lhe e também comunicar que o nosso conferencista teve de sair, porque é professor da universidade e tem tempo a cumprir. Vejam bem, o assunto do aborto entrou nesta Subcomissão pela porta do fundo, já que nossa proposta visava aquela outra questão, que é muito ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) mais ampla. Eu não acho que uma discussão sobre o direito à vida seja uma questão subjetiva. Não acho que seja uma indagação filosófica. A vida é um fato que resulta de um ato humano, no caso, da pessoa. A vida é um fato natural que resulta de um ato humano entre o homem e a mulher. Então, não é um fato subjetivo. Eu já coloquei a minha proposta, ela está sendo discutida e não vou retroagir. Por hora, não encontrei motivo. Quando eu coloquei lá que à sociedade cabe a obrigação de proteger o direito à vida, daqui a pouco sou ameaçado de morte e tenho que pedir proteção ao estado. O Estado tem que proteger o direito à minha vida. Eu, aqui, acho que ela deve ser protegida. Ora, se o Estado e a sociedade devem proteção ao direito à vida, eu tenho que estar perguntando: a partir de que momento, a partir de que instante? A partir de que instante essa vida tem que ser protegida? Acho que a sociedade tem que ver isto. Agora, a questão do aborto isolada. Aborto, essa dicotomia; deve ser legalizado ou não deve ser legalizado, isto é uma desinteligência. Seria uma desinteligência da nossa parte, aqui, ficar dentro desse dualismo, inclusive porque acho que o assunto aborto, nesse caso, caberia na Comissão de Ordem Econômica, porque existe o interesse pecuniário, financeiro, atrás. Caberia na Comissão dos Direitos do Homem e da Mulher. E já estou até com vontade de expulsar este assunto daqui, se puder. Caberia na Subcomissão da Saúde, da Educação e da Tecnologia. Pelo menos nessas três outras Subcomissões esse assunto haveria de caber e não ficar aqui, dentro desta coisa: deve ou não deve. Tenho muito medo quando a vida humana passa por uma valoração pecuniária, porque isto vai para o Direito, isto vai para as relações da pessoa e, hoje, nós estamos vendo o nosso sistema jurídico e quem está falando aqui é um miserável Advogado do Fórum , que tem que estar lutando com o diaa-dia dessas questões do direito e das pessoas em face da lei que temos. Nós estamos vendo que a Justiça, hoje, é paga. A sentença tem um valor pecuniário, e o indivíduo que pode contratar um bom advogado, termina tendo uma boa defesa, tendo uma boa justiça do seu lado, porque a própria Justiça, hoje, – vejam bem – tem uma valoração pecuniária. A SRA. ANA BIESI TOLER: – Da mesma forma, – com a permissão de V. Ex.ª – como quem tem recurso, quem faz parte do segmento privilegiado da nossa sociedade de classe, paga um bom médico e uma boa clínica. Em nenhum momento nós nos pronunciamos questionando o valor da vida. Nós questionamos o valor absoluto a uma vida abstrata e a contradição de se fazer um discurso em favor do valor absoluto da vida e a convivência... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Não, a partir da concepção, a vida não é abstrata. A SRA. ANA BIESI TOLER: – ...cotidiana como uma desqualificação da vida. Na medida em que aceitamos uma ordem social, que marginaliza 8 milhões de crianças, por exemplo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Por fineza, a Srª me faça a indulgência de se ater à minha proposta – direito à vida, a partir da concepção. Se é a partir da concepção, já não é mais uma vida abstrata. Já ocorreu o ato da vida. Então, já não é mais uma vida abstrata. Já é uma vida, hoje, passível de análise científica – e aqui vimos um cientista mostrando que, a partir daquele desencadeamento da concepção, já se sabe até se a criança vai ser careca ou não, aos 50 anos, e se ela vai ter ou não uma pinta no rosto, já está determinado naquele instante. Portanto, não se trata de uma análise abstrata. Abstrata seria se eu colocasse: à sociedade e ao Estado compete assegurar o direito à vida. Aí, seria uma análise abstrata. Mas, a partir do momento em que eu coloquei: a partir da concepção, estamos determinando um fato. O fato é a concepção. Este é o meu pensamento. Mas, eu só queria lembrar, rapidamente, aqui – encerrando a minha parte – e, em seguida, passarei a palavra à Srª. A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Nobre Constituinte, só queria lhe fazer uma pergunta: queria que V. Ex.ª me respondesse com honestidade, de acordo com a sua opinião... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Eu posso até estar mentindo a mim mesmo, mas só tenho falado com honestidade aqui. A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Não, não. Agora, trata-se de uma pergunta até pessoal. Se a sua mulher fosse estuprada e disso resultasse uma gravidez. V. Ex.ª criaria esse seu filho, consentiria que ela levasse a termo essa gravidez? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Depois do que eu ouvi aqui e entrei aqui, presidindo esta Subcomissão, determinado a mandar extrair essa criança, depois do que ouvi aqui, eu direi sim, com toda a honestidade, eu direi sim, porque, se eu disser não, estou abrindo mão do princípio que estou defendendo. A SRA CARMEN M. SOUTO: – Mesmo que ela quisesse. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Veja bem; eu não tenho poderes de polícia para evitar que ela pratique um ato. Eu não teria poderes para impedir que ela praticasse o aborto. Eu não teria esse poder, mas terei de dialogar com ela, para mostrar o meu ponto de vista contrário. A SRA CARMEN M. SOUTO: – Mas, se a última decisão dela for a de tirar o filho? O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Neste caso, eu não posso colocála na cadeia para impedir que o faça, mas a minha posição é contrária. Eu estou defendendo o direito à vida. Quero que a Srª veja bem: eu estou defendendo um princípio – o homem é um princípio. A partir do instante em que a Srª abre mão do seu princípio, a Srª terá que buscar uma outra posição e quero que a Srª respeite o direito de eu ter o meu princípio, inclusive de legislar sobre ele – o direito da Srª legislar contra ele. A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Mas, Sr. Constituinte, nós estamos aqui representando milhões de indivíduos e não só o Sr. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Srª falou uma coisa muito séria aí – o que eu vi, aqui, naquele filme, nas exposições científicas que 104 tivemos, com crianças despedaçadas – pedaços para cá, perna para lá, braço para lá – eu acho que esta é uma coisa, que não se trata de eu ficar nessa estória de me acomodar e não assumir uma posição. Eu tenho que assumir uma posição, contra ou favorável a isto. Eu assumi contra. A Srª me perdoe e quero que respeite a minha posição. A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Nobre Constituinte, este tipo de filme, este tipo de coisa que se mostrou aqui, que acho trágico e que o Sr. achou terrível de se mostrar, porque mostram só um lado da questão e não mostram o outro, porque também podemos começar a mostrar alguns vídeos de meninas desesperadas, se suicidando, matando as crianças depois, porque não quiseram – são horrores que nós podemos mostrar para o Sr., horrores por outro lado, por não ter feito. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Srª não poderia fazê-lo, sabe por quê? Eu fui Presidente de uma Instituição em que recebia, por dia, uma média de 10 meninas violentadas, com corrimentos, com todo o tipo de coisa – mas, quero dizer que fui Presidente dessa Instituição e, em função do exercício dessa Presidência, fui com a minha equipe levantar, em Belém do Pará, a situação da prostituição infanto-juvenil e encontramos 30 mil meninas na faixa etária de 11 a 15 anos, vivendo da prostituição comercializada, no Bairro Condor, especializado em prostituição infanto-juvenil. Atrás disto, antes de eu ficar contra ou a favor, eu estou contra o sistema, a estrutura de poder que está aí e com a qual nós estamos convivendo. A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Eu só queria dizer aqui uma coisa: esse tipo de filme – não sei se é permitido dizer, mas eu vou dizer – Hitler usava, Mussolini usava, é um tipo de coisa fascista que a nossa sociedade não pode permitir. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Mostrando como o aborto é feito? A SRA. CARMEN M. SOUTO: – Mostrando esse lado terrível, a ideologia que está por trás desses filmes e V. Ex.ª, nobre Constituinte, sabe o que está por trás. Todos nós sabemos o que há por trás, que ideologia há nesses filmes. Hitler usava esse tipo de coisa, Mussolini usava e os fascistas do Mundo inteiro não hesitarão em usar, e nós sabemos disto. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Minha nobre jovem, não vamos levar a discussão para este caminho – o que é fascista e o que não é fascista; eu estou pensando é na vida que está lá sob um regime fascista e um regime não fascista, como, por exemplo, o da União Soviética, que não concorda com a idéia do cidadão e o coloca numa clínica na Sibéria. Aquele regime não é fascista. É um regime socialista. Veja bem, um outro regime, por exemplo, como o da Albânia, que é marxista, leninista, mas também pega os adversários e arruma no fundo da cadeia até apodrecerem. Então, não vamos levar a coisa para este caminho. O que eu quero lembrar é que, tanto no regime fascista, como no socialista ou num outro tipo qualquer – e quero dizer à senhora que não sou capitalista, nem na teoria, nem na prática –, em todos eles há a questão da 105 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) vida, a vida do cidadão, que precisa ser protegida em qualquer regime. Eu coloquei aquela proposta que pode até ser considerada fascista, mas o que quero dizer é que, em qualquer regime, a vida tem que ser protegida. Acho apenas que, nesta discussão, o que cabe, agora, é uma indagação científica e não esta conversa emocional de quem é contra ou a favor porque, também, dos dois lados, estou vendo muito emocionalismo. Acho que o que cabe até, quem sabe, amanhã ou depois, para que eu tenha uma outra posição, é uma investigação científica: se esta vida, a partir da concepção, é vida mesmo, e precisa ser protegida. Até porque quando se diz: a mulher tem o direito de interromper a gravidez que está em seu ventre, é preciso entender que ela teve um companheiro, no ato do amor, e, talvez, ela esteja querendo ficar livre de um filho que o pai quer. Eu chamei a questão para este aspecto. A SRA ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – É uma decisão dos dois e, em última instância, dela. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Sim, mas a vida que está no ventre é individual e que tem que ser protegida enquanto individual e aí, agora, já estou dando o direito à mãe de decidir sobre a outra vida. Essa questão foi respondida. Digamos: uma gestação de três meses. Ela está viva, é uma criança de três meses. Então, a mãe delibera interromper a gravidez dessa criança de três meses. Lá dentro está uma vida. Eu, então, já começo a perguntar: será que a mãe, na proteção da própria vida, do seu direito, da sua liberdade, tem o direito individual de dispor sobre a outra vida? Esta questão tem que ir para discussão. A SRA ELEONORA M. DE OLIVEIRA: – Eu sei que esta questão é posta muito séria e muito profundamente e tem duas posições divergentes: a de V. Ex.ª e a minha. E dai é a sociedade, não é o senhor e nem sou eu. Eu queria só colocar que, em termos científicos, como aquele filme que foi passado aqui, existe, na mesma qualidade científica, um filme norte-americano de mulheres médicas – feministas norte-americanas – que falam mais do que o vídeo e que provam exatamente o contrário do que aquele aqui apresentado. E uma resposta a ele. Então, seria interessante que se pudesse tentar conseguir para se passar aqui. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, seria interessante, por uma razão: o filme que foi passado aqui, juntamente com os slides, não tem nada de fascista e nazista. Foram filmes feitos em abortos, detalhadamente. Agora, se há um filme que contradiz, como a Dra. está dizendo, que o traga aqui para ser exposto e que todos sejam convidados e os outros que estiveram aqui também inclusive os quatro médicos que estiveram aqui. Ainda porque a questão ideológica é subjetiva. A SRA. ELEONORA M. DE Presidente da Assembléia Legislativa, Armando OLIVEIRA: – Mas a questão é que é o Viola, Luiz Carlos Santana, Dário Martinelli, João contrário, nobre Debutado. Coser, Levi Aguiar e Salvador Bonomo. Terminados os pronunciamentos, o Senhor O SR. PRESIDENTE (Nelson Presidente suspendeu a reunião, às doze horas Aguiar): – E para lembrar o nosso amigo e trinta minutos. Às quatorze horas e trinta filósofo que dizia – ainda porque, a questão é minutos, o Senhor Presidente reabriu a sessão, biológica, é abstrata e subjetiva. reiniciando os trabalhos, concedendo a palavra aos dirigentes das entidades representativas do Nada mais havendo a tratar, vou Estado, para explanarem as reivindicações de encerrar os trabalhos da presente reunião, cada entidade e debaterem com os agradecendo a presença de todos. Constituintes. Usaram da palavra, para debater Está encerrada a reunião. com as entidades, os seguintes Constituintes: lberê Ferreira, Roberto Augusto, Cássio Cunha COMISSÃO DA FAMÍLIA, Lima e Ervin Bonkoski. Após o pronunciamento DA EDUCAÇÃO, de cada dirigente, o Senhor Presidente CULTURA E ESPORTES, concedeu a palavra, para as despedidas ao DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA povo capixaba, aos Senhores Membros da E DA COMUNICAÇÃO Subcomissão. Manifestaram-se os Constituintes Ervin Bonkoski, Antônio Câmara, lberê Ferreira, Cássio Cunha Lima e Roberto Augusto. A Subcomissão da Família, seguir, o Senhor Presidente agradeceu à do Menor e do Idoso sociedade capixaba e à Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo pelo convite à ANEXO À ATA DA 10ª REUNIÃO, Subcomissão da Família, do Menor e do idoso, EXTRAORDINÁRIA, DA SUBCOMISSÃO DA oportunidade em que puderam prestar FAMÍLIA, DO MENOR E DO IDOSO, esclarecimentos e colher subsídios à nova REALIZADA EM 30 DE ABRIL DE 1987, ÀS Constituição. Nada mais havendo a tratar, o 10:30 HORAS, NA ASSEMBLÉIA Senhor Presidente deu por encerrados os LEGISLATIVA DO ESTADO DO ESPÍRITO trabalhos, às dezoito horas e trinta minutos, cujo SANTO. ÍNTEGRA DO APANHAMENTO teor será publicado, na íntegra, no Diário da TAQUIGRÁFICO, COM PUBLICAÇÃO Assembléia Nacional Constituinte . E, para DEVIDAMENTE AUTORIZADA PELO constar, eu Antônio Carlos Pereira Fonseca, PRESIDENTE DA SUBCOMISSÃO Secretário, lavrei a presente Ata que, depois de CONSTITUINTE NELSON AGUIAR. lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente. – Constituinte Nelson Aguiar. ATA DA 10ª REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA, REALIZADA EM 30-4-87 Reunião realizada no Estado do Espírito Santo, Maio 87 Aos trinta dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta e Reunião realizada no Espírito Santo, sete, às dez horas e trinta minutos, na com equipamento precário. Sem mapa da Assembléia Legislativa do Estado do gravação e sem a identificação dos participantes. Espírito Santo, reuniu-se a Subcomissão da O SR. DILTON LÍRIO (Presidente da Família, do Menor e do Idoso, sob a Assembléia Legislativa): – Havendo número presidência do Senhor Constituinte Nelson regimental, declaro aberta a reunião da Aguiar, com a presença dos seguintes Assembléia Legislativa do Estado do Espírito constituintes: Roberto Augusto, Eraldo Santo. Tinoco, Cássio Cunha Lima, Ervin Bonkoski, Pedimos aos Srs. Deputados que lberê Ferreira, Rita Camata, Antônio Câmara tomem assento às cadeiras do nosso plenário. e com a presença dos membros da Solicitamos ao Sr. Deputado, líder do Assembléia Legislativa do Estado do PDT, Luiz Carlos Santana, e Fernando Santório, Espírito Santo. Havendo número regimental, o que introduzam no recinto deste plenário, o Senhor Presidente declarou iniciados os Deputado Presidente da Subcomissão da trabalhos e solicitou fosse dispensada a Família, do Menor e do Idoso, Nelson Aguiar, e leitura da Ata da reunião anterior, que demais constituintes que a integram. (Pausa.) foi considerada aprovada. A seguir, o Convidamos a fazer parte da Mesa o Senhor Presidente esclareceu que a nobre Constituinte Nelson Aguiar, Presidente finalidade da presente reunião é para da Subcomissão da Família, do Menor e do ouvir depoimentos e debater com as Idoso; o nobre Relator Constituinte Eraldo entidades representativas do Estado. Tinoco, e aos demais Srs. Constituintes que Prosseguindo o Senhor Presidente integram esta Comissão, a tomarem assento franqueou a palavra aos Constituintes nas primeiras cadeiras do nosso plenário. Cássio Cunha Lima, Eraldo Tinoco e Rita Além dos Deputados anunciados, Camata para fazerem discurso de Nelson Aguiar e Eraldo Tinoco, saudação ao povo capixaba. Ao término respectivamente, Presidente e Relator da dos discursos, o Senhor Presidente Subcomissão da Família, do Menor e do concedeu a palavra aos seguintes Idoso, estão presentes os deputados: Roberto Deputados Estaduais: Dilton Lírio, Augusto, Primeiro-Vice-Presidente; Cás- ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) sio Cunha Lima, Ervin Bonkoski, lberê Ferreira, Rita Camata e Antônio Câmara. Em nome da Mesa Diretora e dos deputados que compõem esta Casa, damos boas-vindas aos Srs. constituintes, esperando que esta reunião, realizada no Espírito Santo, seja proveitosa e que V. Ex.as possam, em contato com os parlamentares desta Casa e com o povo capixaba, discutir e chegar a conclusões que venham em benefício do idoso e do menor brasileiros, sobretudo ele que tem sido vítima de um processo político injusto, de um regime, de um modelo econômico que o tem relegado à própria sorte. O menor e o idoso esperam, realmente, que esta Subcomissão, tão importante, possa lhes proporcionar na nova Carta Magna aquilo que esperam dos nossos legisladores. Convido também a tomar assento no nosso plenário o Dr. Ari Lopes Ferreira, que tem sido, neste Estado, o incansável batalhador pela causa do menor. Concedo a palavra ao nobre Constituinte Nelson Aguiar para as suas considerações e o início propriamente do nosso trabalho. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Declaro aberta a 10ª reunião da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso. Sr. Presidente, Deputado Dilton Lírio, ilustres Deputados da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo, estamos aqui, acompanhados de sete colegas de Brasília, cujos os nomes já foram anunciados, para cumprir um dever de legisladores constituintes. Do dia 21 deste mês, até dia 8 do próximo mês estaremos ouvindo a sociedade civil. Não apenas na Subcomissão que tenho a honra de presidir, graças, naturalmente, à generosidade do povo capixaba e à bondade dos nossos colegas constituintes, mas estamos no âmbito de todas essas comissões e subcomissões dedicando tempo integral, ouvindo as entidades representativas da sociedade civil. Tem sido um momento muito gratificante para nós, membros da Assembléia Nacional Constituinte, estarmos vendo entidades e personalidades procedentes dos mais distantes recantos deste País comparecendo a Assembléia Nacional Constituinte, para debater os mais diferentes temas de interesse da própria sociedade com vistas à elaboração de um texto constitucional justo, democrático e que atenda às expectativas da Nação brasileira. Como seria muito difícil termos um número significativo de entidades capixabas para debater conosco, resolvemos atender o convite do Deputado Dilton Lírio e, naturalmente, da Assembléia Legislativa, para comparecermos aqui trazendo sociedade, precisa ser protegida e amparada pelo Estado. Os seus componentes precisam, como diz aquela outra faixa de empregos, salários justos para que o conjunto familiar tenha condição de contribuir efetivamente para a estabilização da sociedade dentro de um princípio de justiça, de igualdade de crescimento, de igual oportunidade para todos os cidadãos. Por isto, Sr. Presidente, ao concluir estas breves e humildes palavras, agradecemos a contribuição que, temos certeza, receberemos no dia de hoje, com a certeza de que, ao lado de tantas outras contribuições, estaremos debruçados para a elaboração de um texto legal que não represente apenas o que queremos para o Brasil de hoje, mas especialmente o que poderemos aspirar para o País, que desejamos para os nossos filhos, para os nossos netos, para as gerações futuras. Unidos poderemos, sem discriminações, sem preconceitos, sem qualquer tipo de discriminação, escrever uma Carta Magna que represente efetivamente as aspirações do Espírito Santo e de todo o Brasil, as aspirações de quem deseja um país próspero, justo, de progresso, de felicidade para todos os seus filhos. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – No encontro da tarde, quem irá falar será o povo. Queremos ouvir as entidades, a partir das 14 horas e 30 minutos. Como membros da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, da Assembléia Nacional Constituinte, gostaríamos de recolher os nomes das pessoas, das personalidades e de entidades que gostarão de, à tarde, debater conosco. Queremos registrar a presença do Padre Afonso Pastore, da Pastoral Carcerária, líder comunitário. Estão presentes, também, elementos do Movimento Nacional de Menores de Rua, representantes da Escola Aberta, aqui de Vitória, representante do IESBEM, do Estado do Espírito Santo, o representante da Funabem, o representante do Movimento de Idosos. Estão presentes os Drs. Antônio Castro, Maria Passamani, João Marcos de Faria, funcionários desta Casa que, durante onze meses, percorreram todo este Estado e, por iniciativa da Assembléia Legislativa, chegaram a elaborar um anteprojeto de Constituição completo que já tivemos a honra de entregar ao nosso Relator, através de despacho. E também já tivemos ocasião de fazer referência a este esforço da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo no plenário da Assembléia Nacional Constituinte. Está presente, como já disse, o Deputado Dilton Lírio: o nosso companheiro e amigo Dr. Ari Ferreira, que representa aqui as entidades do Voluntariado. É uma honra muito grande tê-lo aqui. Não sei se há outra entidade cujo nome devesse ser mencionado. Há pouco tive a informação que há presente um representante da Pastoral do Menor. Há um grupo de menores, que acho é o grupo mais representativo que temos neste instante, levantando os seus cartazes onde pode-se ler algumas das suas reivindicações. Vemos ali: "salário casa e educação" para demonstrar que o problema do menor não é muito simples, é um problema que demanda uma responsabilidade histórica desta Nação. Como disse o Constituinte Cássio Cunha Lima que é o nosso menor na Constituinte, nos damos a liberdade de brincar muito com o Deputado os membros desta Subcomissão, a fim de que possamos ouvir a sociedade capixaba e recolher o material que ela tem para nos encaminhar. Traçamos uma programação no sentido de agora, na parte da manhã, compareceríamos a Assembléia, apresentaríamos os membros da nossa Subcomissão, anotaríamos as entidades e personalidades que estão conosco nesta manhã e, então, a partir das 15 horas e 30 minutos até às 106 17 horas e 30 minutos, estaremos aqui para ouvir a sociedade capixaba, os Srs. parlamentares, recolhermos o material, as propostas que têm a nos encaminhar. Desta forma, gostaríamos que a Subcomissão fizesse uma saudação à Assembléia Legislativa. Vamos conceder a palavra a dois Srs. constituintes, ao mais jovem constituinte, Cássio Cunha Lima, do PMDB, da Paraíba, e ao Constituinte Eraldo Tinoco, do PFL do Estado da Bahia, que é o nosso Relator, para que, utilizando-se de um prazo de 10 minutos cada, façam uma saudação à Assembléia Legislativa do Espírito Santo, agradecendo, naturalmente, o convite, a acolhida dos nobres membros desta Assembléia. Concedo a palavra ao nobre Constituinte Cássio Cunha Lima. O SR. DILTON LÍRIO: – Peço vênia, para registrar a presença do Dr. José Caetano Magalhães, Presidente da Associação dos idosos do nosso Estado. O SR. CONSTITUINTE CÁSSIO CUNHA LIMA: – Exmº Sr. Presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo, Deputado Dilton Lírio: Exmº Constituinte Nelson Aguiar, Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso: Exmº Constituinte Eraldo Tinoco, Relator da Subcomissão; Srs. deputados estaduais; colegas deputados federais; minhas Sr as e meus Srs: Constitui-se para mim uma grande honra poder saudar, em nome dos meus companheiros, a Assembléia Legislativa do Espírito Santo, representante maior do povo deste Estado, como também a iniciativa do convite formulado à nossa Subcomissão para que possamos realizar, no dia de hoje, uma reunião ordinária, podendo ouvir e sentir de perto os reclamos, os desejos do povo capixaba, principalmente hoje, Sr. Presidente, quando vivemos um momento da mais alta relevância para a História do nosso País. Fomos eleitos a 15 de novembro próximo passado, com a honrosa tarefa de elaborar um novo pacto social, uma nova ordem jurídico-social para o nosso País. Um País sofrido, um País que convive com a crise quase permanente – crise econômica, crise social e crise política. Essa é a nossa grande responsabilidade, nos tornar representantes efetivos do anseio da população brasileira. Por esse motivo, viemos ao Espírito Santo hoje, não apenas em homenagem à história valorosa deste povo, mas principalmente em homenagem ao trabalho, ao compromisso primeiro de representar com fidelidade os seus anseios e os seus sonhos. A Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso tem esta grande tarefa de resgatar uma imensa dívida que o País possui para com as crianças e para com os idosos. O início e o fim. O início e o fim de um País, de uma história que precisa, como disse, ser resgatada a todo custo, buscando a garantia do direito à vida, ao trabalho, ao repouso tranqüilo, à habitação, à saúde e à educação. Quero registrar o meu profundo agradecimento por ter sido escolhido pelo Presidente Nelson Aguiar para representar os meus pares neste momento. Viemos ao povo capixaba, para que o Espírito Santo nos ilumine. Muito obrigado. (Palmas.) 107 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Constituinte Eraldo Tinoco. O SR. RELATOR (Eraldo Tinoco): – Exmo. Sr. Presidente Dilton Lírio, da Assembléia Legislativa do Espírito Santo; Exmo. Sr. Constituinte Nelson Aguiar, Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso; Srs. Deputados Estaduais da Assembléia Legislativa do Espírito Santo; prezados companheiros da Subcomissão; minhas senhoras e meus senhores: Pelo menos três tabus são quebrados no dia de hoje. Ao chegarmos ao Aeroporto de Vitória, deparamo-nos um cartaz com os seguintes dizeres: "Muqueca verdadeira é a capixaba, o resto é peixada". Como baiano que se orgulha da culinária daquela terra, fiquei espantado, mas a Constituinte Rita Camata convenceu-me de que realmente para entender de muqueca tenho de começar ou recomeçar no Espírito Santo. O segundo tabu, eu mesmo me encarrego de derrubar neste momento. Há uma certa mística, talvez até folclore, de que os baianos sabem e gostam de falar. Infelizmente os decepcionei neste instante. O terceiro tabu, e este é o mais importante que estamos quebrando neste momento, é aquele de que muitas pessoas procuram divulgar que a Assembléia Nacional Constituinte representa apenas interesses de elites, é afastada dos verdadeiros interesses do povo. Sr. Presidente, estamos aqui atendendo a este honroso convite da Assembléia Legislativa do Espírito Santo para demonstrar exatamente o contrário, que, como Constituintes, como homens e mulheres responsáveis pela elaboração da nova Carta Magna do nosso País, não queremos fazer um trabalho de gabinete, não queremos colocar apenas as nossas experiências, mas queremos ouvir a voz daqueles que nos elegeram e, por isto, fiquem tranqüilos aqueles que inspiraram faixa como aquela que vimos: "Sou criança, quero fazer parte das leis dest e País". Crianças do Espírito Santo, por nosso intermédio, tenham certeza que estarão não apenas fazendo parte das leis, mas estarão conosco escrevendo as leis deste País, porque a criança de hoje é o futuro da Pátria e queremos escrever uma Constituição que retrate as aspirações, os desejos e a vontade da nossa população, especialmente da população jovem. Não queremos que apenas as crianças participem deste processo. Somos também a Subcomissão do Idoso, e quantas vezes verificamos que o indivíduo que atinge a idade provecta no nosso País é deixado de lado, é esquecido, é descartado como alguém que já foi útil, mas que agora de nada mais serve senão compor, como se fosse uma peça de museu. Queremos também escrever as leis que amparem a velhice, não apenas no sentido assistencial, mas especialmente no sentido de depositarmos no idoso todo o respeito, toda a consideração que merece alguém que construiu o nosso passado e que, por isto, merece gozar dos benefícios, das benesses que o presente possa lhe oferecer. Somos também da Comissão da Família. Entendemos que a família, como célula mater da Cássio Cunha Lima, dizendo que na nossa Subcomissão estamos cuidando dos três aspectos fundamentais: dos Direitos da Mulher, e lá temos três representantes. Ali está a Constituinte Rita Camata, legítima representante do povo capixaba na Constituinte e da mulher capixaba. S. Ex.ª tem sido uma das presenças mais freqüentes no plenário daquela Subcomissão, um dos Constituintes mais pontuais no trabalho que temos realizado ali. Também temos os representantes da LBA, acabam de nos informar. De modo que estamos cuidando ali dos três aspectos fundamentais. A nossa Subcomissão vai cuidar da elaboração constitucional no tocante ao Direito da Mulher, Direito da Família. Naturalmente, as mulheres estão atentas para este fato. Quanto ao Direito do Menor, aí está um representante dos menores, o Constituinte Cássio Cunha Lima, aqui presente O Deputado Eraldo Tinoco, que está ali com alguns cabelos brancos, é o nosso representante no Direito do Idoso. Vejam bem, esta Subcomissão está com uma responsabilidade imensa. Talvez, de todas as Subcomissões temáticas da Assembléia Nacional Constituinte, das 24 Subcomissões, a maior responsabilidade recai sobre a Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso. Por quê? Porque vamos tratar de questões complexas, de questões muito difíceis. Basta pensarmos no Direito do Menor. A expectativa nacional em torno deste aspecto é imensa. Já estamos verificando que 70% das sugestões encaminhadas àquela Subcomissão são a respeito do Direito do Menor. Vamos aproveitar a sugestão do Constituinte Eraldo Tinoco para conhecermos quais as entidades e personalidades que já se encontram presentes aqui. Gostaríamos de ter os nomes, gostaríamos que os nossos assessores providenciassem isto para conhecermos quais as entidades e pessoas que estão presentes, para, então, estabelecermos um calendário na parte da tarde, a fim de garantirmos o direito à palavra a todos quantos se fizerem representar aqui para que tenham oportunidade de defender suas posições e encaminhar as suas propostas. Abrimos a palavra, inquirindo se algum membro da Assembléia Legislativa ou da nossa Subcomissão gostaria de fazer uso da palavra. Temos aí representantes de diferentes Bancadas, do PT, do PDT, do PFL, do PMDB. Concedo a palavra ao nobre Deputado Estadual Armando Viola, do PMDB. O SR. DEPUTADO ARMANDO VIOLA: – Sr. Presidente, Deputado Dilton Lírio Neto, Constituinte Nelson Aguiar, Presidente da Subcomissão da Famíl ia, do Menor e do Idoso, desejo cumprimentar os Srs. Constituintes e dizer da satisfação de todos nós, Deputados Estaduais, em receber aqueles que são os responsáveis pela elaboração da Lei Maior que irá dirigir os destinos deste País. Em V. Ex.as o povo confiou os destinos deste País na elaboração de uma Constituição, através dessa Assembléia Nacional Constituinte, tão pedida, tão sonhada ao longo dos tempos em que este País viveu sob o regime militar. É com satisfação, pois, que o nosso pequeno Estado, o Estado do Espírito Santo, e, em especial, os representantes desta Casa, recebemos os Srs. Constituintes, agradecendo, é claro, por terem trazido aqui para esta Casa através do seu Presidente, Constituinte Nelson Aguiar, este entro - samento maior entre V. Ex.as e o povo. Tenho certeza, este debate na parte da tarde deverá ser mais com as comunidades que irão, quem sabe, trazer subsídio até para aqueles que, de fato, irão fazer a Constituição, a Lei Maior deste País. Ao cumprimentá-los, eu o faço cumpri mentando também, dois capixabas, que são os Constituintes Nelson Aguiar e Rita Camata. Tenho certeza que, junto com os demais Constituintes, irão destacar esta Subcomissão para que traga frutos extraordinários à elaboração da Lei em seu todo. É, pois, Sr. Presidente, Srs. Constituintes e Srs. Deputados, que levo para o calendário de minha vida escrevendo hoje como um dia feliz dos dias felizes que já tive, por um evento de tanta importância como o que será hoje aqui realizado. Muito obrigado e boas-vindas a todos. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao nobre Líder do PDT, Luiz Carlos Santana. O SR. DEPUTADO LUIZ CARLOS SANTANA: – Sr. Presidente, demais Membros desta Mesa, Presidente e Relator da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, Srs. Constituintes, Srs. Deputados da Assembléia Legislativa do Espírito Santo. Sras , Srs., crianças do meu Brasil: É com imenso prazer que, em nome do Partido Democrático Trabalhista, recebemos em nossa Assembléia Legislativa esta Subcomissão, Subcomissão essa que, para nós, como pediatra, como pai, como filho, tem um valor muito grande, pois fala sobre o menor. E sabemos que este País só se desenvolverá, crescerá na honestidade e nas condições que dermos às nossas crianças; à educação e saúde que dermos a essas crianças, e este País só será grande quando a família for realmente respeitada, quando o trabalhador tiver salário justo para sustentar a sua família. Acima de tudo, passamos por esta vida e ficamos idosos, e esquecemos que os nossos idoso s têm valor neste País, e são jogados ai no mundo afora sem nenhuma condição de ter um final de vida feliz. A função de V. Ex. as , nobres Constituintes, é muito importante porque esta Subcomissão tem a responsabilidade de tratar da criança, da família e do idoso. Desejo que daqui do nosso Estado, o Espírito Santo, saia para a Constituição da República brasileira, algo que possa fazer com que o nosso menor sofra menos, que a nossa família, ao invés da desunião, se agrupe cada vez mais e que o nosso idoso tenha um futuro muito melhor e mais promissor para chegar ao final de sua vida com melhores condições. Muito obrigado, sejam bem-vindos. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Continua franqueada a palavra. Concedo a palavra ao Deputado Dário Martinelli. O SR. DÁRIO MARTINELLI: – Sr. Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, Sr. Relator, Sr. Presidente da Assembléia Legislativa do Espírito Santo, Srs. Constituintes, Deputados da Assembléia Legislativa do Espírito Santo, entidades que se fazem presentes a este encontro; meus Srs., minhas Sr. as . Como Vice-Líder da Bancada do PFL nesta Casa quero saudar os nobres visitantes que vêm a este Estado trazer a sua contribuição para que ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) a nossa gente se posicione e possa contribuir de maneira sólida com a nova Constituição do nosso País. Bastariam os três itens afetos a esta Subcomissão para justificar todo o procedimento de uma nova Constituição, tal a importância do que se revestem na atualidade e, especialmente, no futuro da Nação brasileira. É preciso que se pense na nossa infância porque dela vai depender, sem dúvida, os futuros passos que esta Nação haverá de ensejar. A Bancada do Partido da Frente Liberal, se fazendo presente em todos os movimentos afetos a esta Subcomissão, deseja que, não só esta Subcomissão, mas todas as outras que integram o trabalho da nova Constituição brasileira, se possam fazer presentes através de convite de nossa Assembléia Legislativa para trazer ao nosso Estado o incentivo de que estamos carecendo para posicionar este pequeno Estado que, por ser pequeno, não é diferente de nenhum dos grandes Estados da Federação, nos seus problemas e na busca da solução desses problemas. Desejamos aos ilustres visitantes, desejamos aos Constituintes capixabas Nelson Aguiar e Rita Camata, que este seja o passo que S. Ex.as , dão em benefício do nosso Estado, do nosso menor, da nossa família e do nosso idoso. Muito obri gado. (Palmas.) dúvida, é a preocupação maior, é sobre o menor que já se encontra na rua que temos a obrigação de apresentar alternativas, para que isto não venha mais acontecer neste Brasil. Um Brasil tão grande, com tanta produção, com tanta extensão e onde vemos tantos menores dormindo embaixo de pontes, sem casa para morar e sem alimento. Realmente, à tarde iremos colocar um pouco da nossa experiência, da nossa convivência nessa área. Neste primeiro momento, gostarí amos, realmente, em nome da Bancada do Partido dos Trabalhadores, parabenizar esta iniciativa e desejar que V. Ex.as sejam bastante felizes, que neste Brasil afora colham as mais diversas sugestões e consigam apresentar um estudo profundo sobre essa questão. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Presidência registra, com satisfação, as presenças dos companheiros: Sr. Mateus Rossini, Presidente do PMDB no Município de São Mateus; Sr. José Elimar Rosa, Presidente e Secretário do Sindicato dos Trabalhadores de Indústria de Produtos de Cacau do Município de Vila Velha; Sr. Helgar Dotratz, prefeito do Município de Santa Catarina e da Drª Conchita, que se encontra no plenário. O SR. LEVI AGUIAR: – Sr. Presidente, O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): peço a palavra. – Por sugestão do nobre Constituinte Eraldo Tinoco, temos ainda uma hora. Então, daremos O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): oportunidades aos Srs. Deputados e a algum – Concedo a palavra ao Sr. Deputado Levi membro de alguma entidade que queira fazer Aguiar. uso da palavra. Concedo a palavra ao nobre Deputado O SR. LEVI AGUIAR: – Sr. Presidente, João Coser, Líder do PT. demais componentes da Mesa, Sr. Deputado Federal Constituinte, nosso companheiro, Sr. O SR. DEPUTADO JOÃO COSER: – Nélson Aguiar, Presidente da Subcomissão, e Sr. Presidente da Assembléia Legislativa do demais constituintes aqui presentes, queremos, Estado do Espírito Santo, Sr. Presidente e Sr. inicialmente, em nosso pronunciamento, citar o Relator da Subcomissão da Família, do Menor e pleonasmo do grande sábio que em suas do Idoso, em nome da Bancada do Partido dos palavras teve a ousadia de assim dizer: "Quem Trabalhadores, gostaríamos de registrar e passou pela vida em brancas nuvens e em realmente saudar a presença de V. Ex.as aqui. plácido berço adormeceu, quem não sentiu o frio Para nós, do Espírito Santo, é muito importante da desgraça, quem passou pela vida e não termos o direito, a oportunidade de debater sofreu, foi espectro do homem, não foi homem, questões da Constituinte, principalmente passou pela vida e não viveu". questões que nos tocam bastante de perto, como Há poucos dias, nesta Casa de leis, foi a questão do menor, a questão da família, a apresentado um projeto de autoria de um dos questão do idoso, coisa que todo brasileiro vive, Srs. Deputados com assento nesta Casa com que todo brasileiro sente. Gostaríamos, relação à isenção das passagens em transportes também, de aproveitar esta oportunidade para coletivos para os idosos acima de sessenta e registrar que quando chegamos a esta cinco anos de idade. Começamos a fazer alguma Assembléia Legislativa, uma das nossas coisa nesta Nova República. E é mister que este primeiras decisões, foi requerer a criação de Brasil e esta Nova República sintam realmente uma Comissão do Menor nesta Assembléia. que alguma coisa está mudando nesta Pátria. Ontem à tarde ela foi constituída, e tive o Vimos nesta Casa, hoje, um jovem prazer, com o apoio de todos os parlamentares, Deputado com apenas vinte e três anos assomar de ser indicado para presidir esta Comissão. a esta tribuna e transmitir o seu pensamento: Então, já temos constituído também aqui vimos o nobre colega Deputado Constituinte, que na Assembléia Legislativa do Espírito Santo veio da Bahia, também, trazer a sua uma Comissão que vai discutir a questão do solidariedade e a sua palavra e a nossa querida menor. Deputada Federal, Srª Rita Camata, que foi para Para nós é de grande satisfação, Brasília representar o Estado de Espírito Santo estarmos recolhendo também todos os juntamente com outros constituintes que lá estão. subsídios, e vamos esperar, com a experiência Parabenizo essa Subcomissão que aqui veio, e de V. Ex.as colhida em todo o Brasil, que quero dizer, que na parte da tarde nós aqui consigamos apresentar, também aqui no Espírito estaremos apresentando também as nossas Santo, um projeto alternativo, após a aprovação sugestões. Parabéns, nobres Colegas maior na Assembléia Constituinte. constituintes, parabéns Presidente da Gostaríamos de solicitar da Assembléia Legislativa, Deputado Dilton Lírio. Presidência dessa Subcomissão que a Parabéns a todos os nossos colegas que aqui questão do menor de rua fosse tratada estão e que sem dúvida, trarão subsídios muito de forma especial, porque esta, sem importantes para esta Subcomissão. (Palmas). 108 O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A sugestão do Deputado Eraldo Tinoco, é no sentido que limitemos o tempo a 5 minutos, porque há representantes de entidades que querem aproveitar o tempo da manhã. Passamos, então, a palavra ao Deputado Estadual Salvador Bonomo, pela Liderança do PMDB. O SR. DEPUTADO SALVADOR BONOMO: – Sr. Presidente desta Casa, Deputado Dilton Lírio, Sr. Presidente da Subcomissão, Sr. Relator, Srs. constituintes, Srs. deputados estaduais, minhas Sras e meus Srs., acho que a observação feita pelo ilustre Deputado Eraldo Tinoco é absolutamente procedente. É muito importante ouvir, sobretudo as lideranças comunitárias para trazer aos constituintes de forma mais objetiva, mais concreta, a realidade cm que vivemos. Queria saudar a pessoa do Presidente da Subcomissão e do seu Relator, toda a Comissão que aqui se faz presente para debater com a sociedade capixaba um dos problemas mais graves que vive, não só a nossa sociedade, mas a sociedade brasileira. Queria ressaltar a responsabilidade que recai no momento sobre os ombros, não só dos membros desta Subcomissão, mas sobre os ombros de todos aqueles que integram a Constituinte instalada, não só em relação a este problema, que é apenas uma parcela do quadro negro em que vive a sociedade brasileira. A família está em crise porque a sociedade está em crise. Se a sociedade está em crise, isto representa apenas um reflexo. Um reflexo das injustiças, que grassaram neste País, em razão do quadro, das estruturas, por que não dizer, da infra -estrutura deste País. Devemos atentar para um outro aspecto que reputamos muito importante, o de que não basta a elaboração de uma Carta por melhor que seja, não basta uma lei bonita, uma lei justa, é necessário que haja uma prática legal, uma prática constitucional. E isto só será possível na medida em que a sociedade se organiza, na medida em que a sociedade se conscientiza, na medida em que a sociedade atua. Não basta a elaboração de uma bela Carta, esta é apenas uma porta que se abre para que se façam neste País as reformas profundas que há muito esta Nação exige, para que se estabeleça, sim, uma sociedade mais justa, uma sociedade mais fraterna, uma sociedade mais igualitária, uma sociedade mais cristã. Era o que tinha a dizer, Sr. Pre sidente. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com a palavra a nobre Constituinte Rita Camata. A SRª CONSTITUINTE RITA CAMATA: – Sr. Presidente da Assembléia Legislativa, Deputado Dilton Lírio; Sr. Constituinte Relator da Subcomissã o da Família, do Menor e do Idoso, Eraldo Tinoco; Deputados Estaduais; Companheiros Constituintes que aqui estão nos honrando com a sua presença; presidentes de entidades e instituições; Padre Afonso; prefeito de Santa Leopoldina: Sras , Srs., e crianças que aqui se encontram. Para mim, este é um momento de grande emoção. Sinto-me também no dever de dizer que o Espírito Santo está privilegiado nesta Subcomissão ao ter como Presidente um homem que sempre lutou, defendendo as causas do menor, as causas daqueles que realmente necessitam de pessoas defendendo as suas lutas. E, também, por termos a oportunidade de receber este convite do Presidente Dilton Lírio e demais Deputados desta As- 109 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) sembléia, para trazer os nossos trabalhos para junto da comunidade capixaba, da família capixaba, buscando as suas reivindicações, buscando as suas propostas. Com a certeza de que será difícil relacionar asses problemas que enfrentamos, que vivemos, que não são do presente, do passado também, isto nos traz a preocupação de que continuarão sendo uma seqüela para o futuro, não de amanhã, mas um futuro bastante remoto. Venho trazer esta minha preocupação e dizer à comunidade capixaba que sabemos que os nossos objetivos não poderão ser alcançados se não fizermos com que os debates, que estão sendo travados em Brasília, através das audiências públicas; que os trabalhos que estão sendo realizados por todas as Subcomissões, estejam ao alcance de toda a população, de toda a comunidade civil para que ela acompanhe, saiba o que está acontecendo saiba quais serão os seus direitos garantidos na Nova Constituição. Mas há uma preocupação. Há pouco dizia que as minhas propostas, não são somente relacionadas ao problema gritante que encontramos nas ruas, o problema do menor o problema do idoso, que, depois de tanto trabalho e de tanta dedicação, não tem tranqüilidade no viver, não tem acesso à saúde, não pode descansar e usufruir um pouco daquilo que ele realizou pelo crescimento e engrandecimento do nosso Estado e do nosso País; preocupa-me, também, que nós não tenhamos um trabalho voltado só para a questão da família, do menor e do idoso, um fator econômico-social que está aí, gritante, às nossas vistas. Nós precisamos de uma política, de um conjunto de idéias, um conjunto de normas que façam com que todas essas lutas e reivindicações de todas as entidades e instituições sociais do nosso País, sejam inscritas na nova Carta Constitucional. Devemos ter a consciência do conjunto, dentro do fator econômico, da procura de justiça social, da reforma agrária, da reforma tributária, de uma política de saúde que atenda os interesses do trabalhador, os interesses de todo o povo do nosso País. Também o problema da habitação, e outros, pois são inúmeros os que aqui estão e que nos enfrentamos nesta crise pela qual passa o País. Isto tudo deve refletir um conjunto harmônico, para que nós possamos ter uma Constituinte que seja uma Constituição que dê oportunidade a que nós tenhamos uma sociedade mais justa, mais humana e mais fraterna. Gostaria, desta tribuna, de registrar que o trabalho realizado pelos Deputados companheiros desta Assembléia, na proposição de emendas à Consti tuição, elas deverão ser subscrita por todos nós, Deputados Federais Constituintes, e entregues também ao Presidente da Assembléia Nacional Constituinte, para que faça com que esse trabalho possa ser distribuído a todas as Subcomissões e, com certeza, refl etir os anseios da sociedade capixaba dentro da nossa Constituição, não só através de nós, Constituintes, mas desses trabalhos que muito vão ajudar no desenrolar dos debates da Carta que será escrita. Agradeço, Sr. Presidente e Srs. Constituintes, a oportunidade de estarmos aqui junto da família capixaba, mais uma vez, trazendo o nosso compromisso de lutarmos, de sermos porta-vozes das reivindicações da luta de todos vocês. Muito obrigada e vamos, juntos construir uma Carta que possa, amanhã, ser o orgulho de nós capixabas, de nós brasileiros, do povo e de nosso País. Muito obrigada a todos que aqui estão nos prestigiando e dando sua contribuição. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Continua franqueada a palavra. Concedo a palavra ao Dr. Ary Lopes Ferreira. O SR. ARY LOPES FERREIRA: – Exmº Sr. Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, Ex.º Sr. Deputado Relator da Mesa da Subcomissão, demais membros Constituintes, Srs. Deputados Estaduais, Srs. representantes de entidades comunitárias, meus companheiros de atividade assistencial, Srs. E Sras . Cremos que esta oportunidade de participar diretamente dos trabalhos Constituintes vai marcar, de maneira indelével, a vida de cada um de nós. Por certo, haveremos de dizer aos nossos netos – e até, quem sabe, aos bisnetos – que nós aqui do Espírito Santo, aqui de Vitória, participamos da elaboração de alguns dos textos da Carta Constitucional que vigorará a partir de 1988. A nossa História hoje, a história de cada um de nós, a história de cada cidadão, hoje no exercício de seus direitos políticos, está sendo acrescida de um fator extraordinário, raro na vida de muitos milhões de cidadãos em todo este mundo conturbado. Em poucos países do Mundo, o cidadão comum pode participar da elaboração de uma Constituição da maneira pela qual hoje nos é ofertada pela Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, cujo título não deveria ser esse; acho mesmo que deveríamos chamar essa Subcomissão de Subcomissão dos Valores Humanos da Sociedade. Como representante no momento da Associação dos Dirigentes de Obras de Menores do Espírito Santo, que congrega atualmente 46 entidades assistenciais particulares, que praticam a assistência social sob a modalidade de filantropia, aproveitaremos a oportunidade que nos é oferecida para apresentar proposições concretas durante os trabalhos da tarde, que se resumem nestes pontos, que eu peço que todos anotem, pelo menos de memória, para colaborar conosco na discussão, no momento certo. Nós apresentaremos propostas tipicamente da Constituinte para o texto constitucional futuro, em relação à questão social do menor, da família do menor e da criança propriamente dita, que é o que interessa – como diz o nobre Constituinte Nelson Aguiar "o meu filho não é menor, o meu filho é uma criança, o meu neto é uma criança." Então, todos são crianças. E haveremos de apresentar propostas de legislação ordinária, porque precisamos que de pronto, de imediato, se adotem medidas concretas que beneficiem a nossa atividade assistencial. Na áre a da Constituinte propriamente dita, nós apresentaremos as seguintes proposições resumidas, só pelo título: primeiro, moderna conceituação jurídica dos direitos da criança. Segundo, estabelecimento de princípios realistas e objetivos sobre o trabalho da criança que estuda. Terceiro, novo incentivo e apoio às entidades assistenciais com imunidade tributária ampla, e não como hoje, restrita e submetida à legislações ordinárias casuísticas. Estes são os três pontos principais das proposições que faremos sobre assuntos de matéria constitucional. Aproveitando a presença de Constituintes, especialmente de Rita Camata e Nelson Aguiar va- mos apresentar duas propostas também para a legislação ordinária, que são as seguintes: 1º – incentivos fiscais do imposto de renda, nos moldes da Lei Sarney, para donativos às entidades assistenciais. A Lei Sarney permite redução do imposto de renda a pagar, com investimentos em cultura, etc. Queremos, também, donativos para as obras assistenciais filantrópicas. 2º – Reconhecimento de utilidade pública das entidades assistenciais, descentralizado para os Estados – porque atualmente é centralizado no Conselho Nacional do Serviço Social em Brasília, que é um "elefante branco"; nem é elefante, é mamute – com a eliminação da burocracia atualmente existente. Na parte da tarde, no momento próprio, apresentaremos essas proposições, escritas, formalizadas devidamente, e nos colocaremos à disposição para o debate. O que eu peço é que todos os nossos companheiros pensem nessas proposições, para reforçar e fortalecer a argumentação da defesa que faremos de cada uma delas. Obrigado a V. Ex. as , Srs. membros da Subcomissão dos Valores Humanos e da Sociedade, por essa extraordinária oportunidade que nos ofereceram nesta data. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A cada membro da nossa Subcomissão presente, vou pedir que se levante, porque essa é a vontade de nosso público, para o caso de que alguém queira se dirigir, de modo pessoal, a algum dos Srs. Constituintes. Temos, como Vice-Presidente desta Subcomissão, o nobre Constituinte Roberto Augusto, do Rio de Janeiro, e é um líder evangélico; o nobre Constituinte Eraldo Tinoco, do PFL da Bahia, é o nosso Relator; o nobre Constituinte Cássio Cunha Lima, que está acompanhado de sua esposa, Sílvia Almeida Cunha Lima; o nobre Constituinte Ervin Bonkoski, do Estado do Paraná, também acompanhado de sua esposa, Maria Roccio Rocha Bonkoski; o nobre Constituinte Iberê Ferreira, do Ri o Grande do Norte; Rita Camata não precisa apresentar: o nobre Constituinte Antônio Câmara, do PMDB do Rio Grande do Norte e ainda os nossos Assessores, que são funcionários do Senado e estão a disposição da nossa Subcomissão: Antônio Carlos Pereira Fonseca, Eugênia Maria Pereira Vitorino, José Angelo Agostini Muniz e Maria Luiza Ervilha. E, também, como companheira de viagem, que veio rever seus amigos e amigas do Espírito Santo, a Beatriz, minha companheira de alegrias e de infortúnios. Vamos sair agora, para o almoço, na parte da tarde falarão os Srs. Deputados da Assembléia Legislativa do Espírito Santo e os Srs. Deputados Constituintes, apenas quando interpelados pelos que tiverem propostas e posições a defender neste encontro. Temos, aqui, vários amigos, vários companheiros. Não temos condições de citar os nomes de todos, porque não há tempo, mas queremos saudá-los e dizer-lhes que se sintam como membros da Mesa, e estejam aqui também para darem a sua contribuição. Agradecemos as palavras que nos foram dirigidas, as referências que nos foram feitas, e queremos dizer que, estamos aqui, na expectativa de podermos contribuir com o povo capixaba, para que a sua voz se reflita naquela Subcomissão para que a sua contribuição pessoal tenha em nós o interm ediário o portador competente, para ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) fazer com que ela reflita no texto da futura Constituição do nosso País. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA (Dilton Lírio): – Convidamos os integrantes da Subcomissão da Família, do Menor do Idoso, a tomarem assento no plenário desta Casa. Convidamos o Constituinte Nelson Aguiar, Presidente da referida Subcomissão, para tomar assento à Mesa, assi m como o seu Relator. Convidamos, também, os Constituintes 1º e 2º Secretários, para tomarem assento à Mesa. Para dar início aos nossos trabalhos, convidamos os Srs. Deputados Estaduais para tomarem assento à Mesa, bem como os Presidentes de entidades de classe, e sindicatos, presentes em nossa galeria, para que tomem assento em nosso plenário, uma vez que os trabalhos serão abertos a todos. As entidades poderão fazer os seus pronunciamentos as suas reivindicações. Como fizemos na parte da manhã queremos novamente registrar a presença, nesta Casa, dos seguintes membros da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso: Presidente – Constituinte Nelson Aguiar, Primeiro -VicePresidente – Constituinte Roberto Augusto; Relator Constituinte Eraldo Tinoco, e ainda, os titulares Cássio Cunha Lima, Ervin Bronkoski, Rita Camata, Eraldo Tinoco, lberê Ferreira e o Suplente Antônio Câmara. A Presidência desta Casa, em nome de todos os Deputados que a integram mais uma vez reitera os votos de que esta Subcomissão possa colher, no Espírito Santo, valiosos subsídios para o seu trabalho. Sabemos todos nós que dentre as questões que afligem a Nação brasileira, as relativas ao menor, à família e aos idosos estão em primeiro plano, fruto do subdesenvolvimento deste País e de um modelo econômico injusto, que tem privilegiado uma minoria de brasileiros, em detrimento da marginalização de milhões que vivem em situação de penúria e miséria, nos mangues, nas favelas, nos grandes centros, ou abandonados à própria sorte neste interior do nosso Brasil. Queremos agradecer, em nome desta Casa, o esforço que esta Subcomissão faz, comparecendo ao Espírito Santo. E particular, agradecemos ao nosso companheiro Nelson Aguiar, que para honra de todos os capixabas, foi escolhido Presidente dessa importante Subcomissão. Caro Nelson, o seu trabalho nesta Assembléia Legislativa, que conhece bem e a dirigiu, ou na Funabem, a nível nacional, sempre teve uma atuação coerente e destacada em defesa do menor abandonado. Fazemos votos, companheiro Nelson Aguiar, que V. Ex.ª logre pleno êxito no seu trabalho, que auxiliado por seus ilustres Pares nesta Subcomissão, possa levar a bom termo um trabalho sério e tudo aquilo que é necessário, em benefício dos menores carentes, dos idosos e da própria família brasileira. Temos certeza de que os Constituintes brasileiros haverão de ter sensibilidade para os graves problemas que afligem nesta Nação, fazendo com que a nova Carta Magna reflita os anseios e as aspirações de todos os brasileiros. Com a palavra no nobre Constituinte Nelson Aguiar que dirigirá estes trabalhos, nesta memorável tarde no Espírito Santo. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Obrigado, nobre Deputado, gostaria de passar a palavra aos representantes das entidades presentes. Por ordem de inscrição, nós franqueamos a palavra para a entidade, representativa desta cidade, que queira usar da palavra, apresentar seus documentos e defender suas posições. De início, nós decidimos estabelecer uma sistemática para evitarmos o monólogo, e o monopólio do uso da palavra. Para que todos tenham oportunidade de usar o tempo, nós vamos de início franquear a palavra pelo espaço de 5 minutos, prorrogável por mais 2 minutos, a fim de que as instituições possam, todas elas, apresentar as suas idéias. No decorrer dos debates, todos teremos a oportunidade de questionar. Pela Pastoral da Família, temos o Padre Afonso. O Dr. Magalhães, primeiro a se inscrever, é representante do Movimento dos Idosos, e poderá usar da palavra por até cinco minutos, prorrogáveis por mais dois. (T otalmente fora do microfone.) O DR. MAGALHÃES: – Exmº Sr. Nelson Aguiar, Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, Exmº Presidente desta Casa, Sr. Dilton Lírio e demais Membros desta Comissão: Falo em nome a Associação dos Aposentados do Espírito Santo, considerando que a classe dos aposentados e pensionistas, do Estado e de todo o Brasil, tem sido até agora a classe mais abandonada deste País, porque não tinha organização, não tinha união e, por causa disso, tudo quanto era questão adversa recaía sobre ela. Por isso, durante a ditadura militar fascista, que tomou este País por mais de 20 anos, as medidas restritivas contra os aposentados foram em demasia. Deste modo, os aposentados tentaram agora com a Nova República, reorganizar-se e estão hoje constituindo a Federação Brasileira de Aposentados, com associados em todo o País. E, no Espírito Santo, nós temos a Associação dos Aposentados e Pensionistas, que está lutando pela causa dos mesmos. Há pouco tempo, fizemos um seminário nesta cidade, onde compareceram cerca de 500 aposentados, quando estabelecemos 10 comissões, cada uma delas com um coordenador e um secretário. Todos eles discutiram exaustivamente os direitos dos aposentados e pensionistas do Brasil, e, ao final, escreveram, nesta ata, as suas reivindicações mais sentidas, que foram todas catalogadas e apresentadas em detalhes no Seminário, que criou uma comissão para reduzi las todas, eram muitas. E a Assembléia Nacional Constituinte iria atender a tantos pedidos! Então, fizemos um convite aos nobres parlamentares da Assembléia Nacional Constituinte para que viessem a Vitória a fim de receberem esse documento pessoalmente, na presença do Sr. Governador do Estado, Dr. Max Mauro. De maneira que assim o fizemos, e esse documento foi solenemente entregue, na presença de uma numerosa comissão, aos parlamentares que nos deram a honra de suas presenças. Infelizmente, somente 3 compareceram. Desse modo o convite que foi extensivo a todos os parlamentares Constituintes não foi atendido a não ser por esses três parlamentares que nos deram a honra de sua presença. E, nesse documento, nós apontamos as necessidades dos aposentados ao passarem da ativa para a inatividade, de conservarem os mesmos salários, porque não é possível que homens que trabalharam durante 30, 40, 50 anos, na velhice, alquebrados, precisando de tanto, tenham descontado tanto dos seus salários. Isto é uma calamidade! Pleiteava-se, 110 então, que todo indivíduo, todo funcionário, todo cidadão ao se aposentar e cair na inatividade, com ele levasse o mesmo salário que recebia antes, e não recebesse salários baixos a título de recompensa. Outra coisa absurda que existe – e que sempre existiu neste País – é que o aposentado seja relegado a um papel secundário. Basta dizer que durante a ditadura a que me referi, dos anos 69 a 84, durante todos os meses do ano, os aposentados do País recebiam uma porcentagem de 10%. Isso não pode acontecer. Não é justo deixar os aposentados vivendo na mais negra miséria; essa é uma vergonha que o País não pode mais tolerar, sem nos referirmos a outras coisas ainda mais vergonhosas. Por exemplo: o cidadão que se aposenta com 20 salários, só recebe 10 salários; o que se aposenta com 10 salários só recebe 5 salários. O que se aposenta com 5 vai receber 3, e quem se aposenta com 3 recebe 1. E a coisa mais calamitosa deste País é o salário do Fundo Rural, é o salário pago ao trabalhador, ao homem que semeia o campo. Basta dizer que este só recebe meio salário mínimo, isto é, quatrocentos cruzados. Isto é uma vergonha! Isto é uma indignidade para este País! De modo que isto não pode ser tolerado de forma alguma. E, para não nos alongarmos mais, porque o nosso tempo é curto, solicitamos ao Sr. Presidente apenas mais cinco minutos para nos despedirmos de todos, desejando-lhes uma grande felicidade. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Agradecemos ao Dr. Magalhães pela sua palavra. Estamos prontos para receber as sugestões que V. Sª tiver para nos encaminhar. Se puder fazê-lo, será muito bom para nós. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaríamos de convidar para tomar assento no plenário a Drª Beatriz Aguiar, e as pessoas que estão em pé também poderão tomar assento nas cadeiras vagas. Concedo a palavra ao Sr. Ary Lopes Ferreira. O SR. ARY LOPES FERREIRA: – Sr. Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso; Sr. Relator; Sr. Presidente da Assembléia Legislativa, estou representando duas entidades diferentes: a Associação dos Dirigentes de Obras e Menores e a Campanha do Bem-Estar do Menor. A Associação tem alguns dias de existência e a campanha do BemEstar do Menor já tem vinte anos. Vinte anos de sofrimento com a comunidade, assistindo ao descalabro que impera em nosso Estado, em nosso País, na área governamental, no atendimento da questão inflamante do menor, da criança abandonada. Em nome da Campanha do Bem-Estar do Menor, a proposição que fazemos à Subcomissão, diz respeito ao trabalho do menor, ao trabalho da criança que estuda e da criança que precisa manter-se, ou partici par da manutenção da sua própria família. Acabamos de ter conhecimento, após a redação do texto da proposta, de um texto elaborado pela própria Subcomissão, que no inciso 12 trata justamente do trabalho do menor. O SR. NELSON AGUIAR: – Pedimos licença ao nobre orador para informá-lo de que esta proposta é do Constituinte Nélson Aguiar, dirigida à Subcomissão. O SR. ARI LOPES FERREIRA: – Retificamos, então. A proposta é do Deputado Federal e Presi - 111 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) dente da Subcomissão, Sr. Nélson Aguiar, e tem o seguinte texto: "É proibido o trabalho para o menor de 14 anos, garantindo-se-lhe a educação pelo trabalho". A nossa proposição tem o seguinte conteúdo, no sentido de serem adequados os princípios constitucionais sobre o trabalho do menor à realidade social brasileira, que comporta no continentalismo do País, duas coisas evidentemente diferentes: as situações regionais, por exemplo, do Nordeste e do Sul do País e as situações das crianças que vivem nos perímetros urbanos, nas periferias das grandes cidades e nos ambientes ru rais. Só essas duas diferenças brasileiras revelam que não é possível estabelecer uma faixa etária única um princípio único para regular o trabalho da criança nessas duas diferenças, nesses dois mundos dentro do nosso País: o mundo do Nordeste e o mundo do sul, o mundo da área urbana e o mundo da área rural. De sorte que a nossa proposição é no sentido de que os Constituintes estudem uma fórmula que contemple essas regionalidades, essas disparidades brasileiras, de modo que facilite o trabalho do menor como forma de aprendizado, e também permita o trabalho do menor para a subsistência dele ou da família, porque há menores, há crianças em estado de necessidade ajudando famílias em grave estado de necessidade. Isso é publicamente reconhecido e não precisa de comprovação. Então, proibir terminamente o trabalho do menor de 14 anos, pode significar o cerceamento do trabalho para a vida, para a sobrevivência. Este é um resumo da proposta que se faz para que, no texto constitucional, seja feita uma ressalva que se ria em termos genéricos, sem nenhuma veleidade de participar de texto constitucional com os ilustres membros: "Ressalvado o estado de necessidade – e as peculiaridades regionais, nos termos da lei, é proibido o trabalho do menor de 14 anos, garantindo-se-lhe a educação pelo trabalho". A outra proposta é da Associação de Dirigentes de Obras de Menores: "As doações de pessoas físicas e jurídicas para fins assistenciais são apenas abatidas da renda bruta para fins de Imposto de Renda". O Presidente José Sarney conseguiu uma vitória no Congresso, instituindo o benefício fiscal para os investimentos em cultura. A nossa proposta é que os legisladores estendam esse benefício fiscal às entidades assistenciais para dedução diretamente no Imposto de Renda a pagar, tornando, assim, amplo e efetivo o apoio e o incentivo às doações para as obras assistenciais filantrópicas. A outra proposta, que é tipicamente para a Constituição, é a seguinte: "tornar ampla e irrestrita a imunidade tributária que hoje na Constituição vigente é apenas imunidade por impostos, e não por tributos. Os tributos compreendem impostos, taxas, contribuições de melhoria e contribuições previdenciárias patronais". De modo que proposição, que está aqui bem explicada, é no sentido de que seja ampliada a imunidade para "imunidade tributária", e que o regulamento dessa imunidade não fique sobre o controle das áreas do Executivo: Imposto de Renda, Imposto Predial e Territorial Urbano, Imposto de Circulação de Mercadorias, mas conste de lei complementar. Então, o texto constitucional diria: "as entidades ou instituições de educação e de assistência social são imunes a tributos, nos termos de lei complementar". Com isso, se evitariam os interesses estaduais, os interesses locais e os casuísmos fiscalist as. Sabemos que há diferença entre Direito Fiscal e Direito Tributário. Os fiscalistas procuram restringir as imunidades e as vantagens tributárias. Então, a proposição é para que os legisladores-Constituintes alterem o atual texto constitucional e adotem uma redação que torne a imunidade tributária não submissa à lei ordinária, mas submissa à lei complementar. Essas são as propostas para a Constituição. Se houver oportunidade, faremos proposições para leis ordinárias. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito obrigado, Dr. Ary Lopes Ferreira. Temos, ali ao lado, nossos Secretários, Eugênia e Antônio Carlos, que receberão as propostas que forem debatidas e encaminhadas. Concedo a palavra à Sônia Deorce, da Comissão Estadual dos Meninos e Meninas de Rua. A SRª. SÔNIA DEORCE: – Gostaria de pedir aos meninos que tenham documentos para entregar, que os encaminhem à Secretária. Estou representando o Movimento Estadual Criança e Constituinte, que representa a reunião de várias entidades públicas e privadas que trabalham com a criança que, vendo a oportunidade de fazerem estudos e trazerem sugestões que melhorem a situação da criança na organização social do nosso País, começaram a reunir-se, a estudar e trouxeram suas propostas em forma de documento. Essas propostas já foram encaminhadas a Brasília e, junto com propostas de outros Estados, que constituem o documento nacional "Criança e Constituinte". As entidades do Espírito Santo endossam esse documento nacional e voltam a entregá-lo, através das crianças. A ele, juntamos aquelas propostas particulares do Espírito Santo que foram levadas ao documento nacional. Gostaria de falar apenas sobre um aspecto dessas propostas, porque vão falar também representantes do Movimento dos Meninos e Meninas de Rua e a representante da Pastoral do Menor, que dirão como compuseram, e também, a Comissão Estadual Criança e Constituinte. Nós endossamos as suas palavras. Eles vão falar mais sobre a situação do menor, sobre a ligação com a família, sobre a violência e sobre o trabalho. Assim, essas propostas deles são nossas, também, no documento. Gostaria apenas de focalizar dois aspectos que foram vistos por nós, o da saúde e da educação. A criança foi vista como um todo. A criança, no Brasil, morre aos milhões, antes de chegar aos cinco anos de idade. Então, é preciso que a Constituição garanta uma taxa de vida maior às crianças brasileiras. Por isso, propusemos medidas de garantia do Estado para assistência médica, para a mãe desde gestante, gratuita, através de postos de saúde; que esses postos de saúde pudessem ter uma participação comunitária, no sentido de que a comunidade tivesse acesso e a quem reclamar quando não estivesse sendo dada a assistência de saúde necessária. O grande problema do nosso serviço público, é que quando não recebemos o serviço, não temos a quem reclamar. Que houvesse o estabelecimento de controle de saúde através dos postos médicos, comunitários; que pudesse ser estabelecido um sistema de acompanhamento da criança desde o seu nascimento; que a mãe também tivesse, na fase de gestação, todo acompanhamento médico necessário. Outro aspecto que vimos foi o da educação. A Constituinte atual prevê educação obrigatória dos 7 aos 14 anos. Muitos estudos existem, no Brasil, provando que a garantia da educação dos 7 aos 14 anos não democratiza o nível cultural brasileiro. A criança não nasce aos 7 anos, quando ela chega a essa idade, grande parte da população brasileira já está em desvantagem. A criança nasce com zero anos; com zero anos, ela deve ter garantida a sua educação. Vem imediatamente uma grande interrogação: mas existe educação com meses? Também há uma série de estudos que podem comprovar a necessidade da assistência educativa, pedagógica à criança. Se a mãe vai ter que trabalhar, se a mãe brasileira cada vez mais se insere no mercado do trabalho; se as empresas devem ter creches, elas não serão apenas locais onde as crianças terão comida e serão limpas. Deve haver todo um trabalho educativo e pedagógico, através de estímulos, através de acompanhamento psicológico, preparação de ambiente, etc.. Depois da creche, a criança deverá ingressar no ensino pré -escolar, que também deve ser gratuito e garantido à criança. As crianças no pré -escolar, hoje em dia, somam 3,5 milhões, 14% da faixa etária de zero aos 6 anos. Mais da metade dessas crianças são de famílias que já dão o seu estímulo, que já se preocupam com todas formas educativas. A criança que não está na pré -escola não tem o seu desenvolvimento intelectual amparado, estimulado e trabalhado. Também quando chegar à primeira série, ela terá mais esse fator para afastá-la da escola, embora não seja o único. A reprovação, na primeira série, não é o único fator que a afasta da escola. É claro que tem o trabalho, ela tem a falta de escola, ela tem a impossibilidade de uma pessoa que a leve para a escola. Mas a falta da pré -escola é mais um fator que leva as crianças a serem reprovadas e aumenta a desvantagem em relação às outras pessoas. Se estamos pensando em democratizar a educação, não podemos nos esq uecer de que todas as crianças devem ter a mesma situação escolar. Se ela não recebe os estímulos em casa, se os pais são analfabetos, se ela não tem condição de consultar nada, nem de brincar porque as casas são apertadas, não têm área de lazer, não têm quintal, a escola através da situação educativa, deve promover o desenvolvimento da criança. Eu poderia me estender muito mais, mas como está no nosso documento, não vou fazê-lo. Tivemos, também, preocupação com a educação permanente, através dos meios de comunicação. Pedimos que seja preocupação dos Constituintes, que a decisão sobre a programação dos meios de comunicação seja tomada por um conselho que ouça a comunidade. Por que a comunidade deve aceitar toda a programação dos meios de comunicação, sem poder dizer se aquilo faz bem para ela, se aquilo é o que ela quer para os seus filhos se aquilo está prejudicando ou não a educação das crianças. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós, em nome da Mesa, pedimos aos oradores que ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) sejam concisos em suas propostas, uma vez que várias pessoas estão inscritas para falar, e queremos que o maior número possível das aqui presentes, possam apresentar suas propostas. Concedo a palavra ao representante da comunidade de Taboazeiro, José Alves Carneiro. S. Sª não está presente. Concedo a palavra à Associação Assistencial de São Francisco de Assis, na pessoa de Eliane Pereira Ferreira . S. Sª não está presente. Concedo a palavra ao Sr. Luís Augusto Ângelo Martins, da Associação Capixaba de Pessoas com Deficiências. O SR. LUÍS AUGUSTO ÂNGELO MARTINS: – Exmº Sr. Presidente da Subcomissão da Família, do Menor e do Idoso, Nelson Aguiar: Exm º Sr Presidente da Casa, Deputado Dilton Lírio e demais representantes Constituintes que formam esta Subcomissão: É com muita satisfação que participo desse processo democrático onde as entidades e segmentos da sociedade podem debater e buscar soluções para família, o menor e o idoso. A Associação Capixaba de Pessoas com Deficiência, do núcleo de Vila Velha, cujo objetivo é lutar pelas pessoas portadoras de deficiências, se reúne semanalmente. Diante do momento político, econômico e social que vivemos, com as claras evidências de que o idoso é considerado incapaz, portanto, um deficiente a mais na nossa sociedade, isso nos preocupa, porque já somos, no Espírito Santo, 230 mil deficientes, e, no Brasil, todos sabem, são 13 milhões de pessoas. Realmente, a problemática do idoso deve ser encarada de forma mais séria, para que num amanhã bem próximo, não tenhamos junto aos deficientes, um novo segmento da sociedade e que aquela famosa frase da nossa Constituição seja respeitada "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas", e ainda acrescentar: "idade ou ser portador de deficiência de qualquer ordem". Para a conscientização de nossa sociedade acho que através da educação poderíamos mudar esse quadro . Sugiro a inclusão, no currículo escolar, de 1º e 2º graus e de universidades, disciplinas que dessem ao indivíduo informações para ele refletir, através do trabalho, a problemática da família, do menor e do idoso e, por que não dos deficientes físicos. As sugestões, praticamente, são a inclusão no currículo, dessas matérias, tais como a municipalização do atendimento ao idoso e ao menor, através da ação da rede municipal e estadual de educação. Isso pode ser copiado de alguns países do exterior, onde as escolas de cada município ficam responsáveis pelos problemas do menor e do idoso daquela municipalidade, isso descentralizaria a problemática. Para encerrar, gostaria de aproveitar a oportunidade e pedir aos Constituintes presentes, com direito a voz em todas as Subcomissões, que se empenhassem junto a Subcomissão à discutir a problemática do deficiente e, que, juntos, garantissem o espaço devido ao seguimento das pessoas portadoras de deficiências, que é presidida pelo Constituinte lvo Lech. Pediria também a esta Subcomissão que encaminhasse as 14 propostas do Movimento a nível nacional. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao Sr. Representante do Bairro de Canaã. Pedirí amos que declinasse o seu nome para que a taquigrafia pudesse registrá -lo. O SR. LOURIVAL LOPES CUNHA: – Quero parabenizar o Sr. Deputado Ditson Lírio e como representante do Movimento do Bairro Canaã, eu gostaria de trazer a nossa proposta aos Constituintes que, honrosamente, vêm ao Espírito Santo. Nos meus 38 anos de vida não tinha visto ainda o público participar. Com relação à família, a minha proposta é desdobrada em duas: que os Constituintes estudem com carinho, inserindo na Constituição brasileira , um piso salarial para os aposentados menos favorecidos de, pelo menos, três salários mínimos. Não é que eu seja aposentado, mas o que se vê no INPS, nos carnês desse pessoal é um absurdo; segundo, dando a esses aposentados, com deficiência, passe livre, para ônibus. Porque, há poucos dias, foi aprovado, aqui nesta Casa, o passe livre para o aposentado acima de 65 anos de idade. E os aleijados que são aposentados, como fica a situação desse pessoal? Porque se sofrem um acidente de carro, se sofrem um acidente de trabalho, eles se aposentam e não têm direito ao passe. Só aposentado acima de 65 anos é que tem. Como representante do Movimento do Bairro Canaã, tive uma suspeita da lei, porque essa lei só veio mesmo a favorecer o burguês. Terceiro: que sejam corrigidos os reajustes salariais que são feitos na cesta básica do Governo. Se ele faz uma correção na cesta básica dele, ele pode colocar o marido, a mulher e dois filhos. E aquele que tem mais de dois filhos? Quer dizer, isso vem provocando a miséria, a carência e o abandono total das crianças, como é o nosso caso do Espírito Santo. Com relação ao menor: seria o caso de se instituir o banco do livro para os alunos do 2º grau, o que ainda não está inserido na Constituição. Existe o Banco do Livro para o aluno do 1º grau e não para o 2º grau. Por quê essa discriminação? Deveria ser feita uma proposta nesse sentido e estudada com carinho. Menos para os de escolas particulares, porque aquele que tem seu filho matriculado em escola particular não precisa de participar de banco de livro. Seria uma proposta aos Srs. Constituintes para que estudem com carinho, se é que vamos ter uma Constituição séria, uma Constituição digna e voltada para os anseios da sociedade brasileira. Seria uma coisa a ser inserida, a ser imposta dentro da Constituição para o nosso bem, para o bem de nossos filhos, para o bem de todos os menores da sociedade. Quando chega na 8ª série, o menor não tem condições de passar para o 2º grau. Eu mesmo faço o 2º grau, quando fui comprar um livro de Química custou 265 cruzados. E a família que recebe 1.368 cruzados, como vai dar 265 cruzados por um livro? Tenho de comprar doze livros para o 2º grau! É uma realidade que vai ter que entrar na cabeça de todo Constituinte capixaba, de todo Constituinte bra sileiro, para que obtenhamos essa mudança na nova Constituição. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao Professor Coelho Sampaio, representante da Associação dos Amigos da Criança André Luis. (Pausa.) S. Sª não está presente. Concedo a palavra ao Sr. Manoel Alves da Silva, representante da Associação dos Trabalhadores Sem-Terra. (Pausa.) 112 S. Sª não está presente. Concedo a palavra ao Sr. Ivo Santana, do Conselho Popular de Vitória. (Pausa.) S. Sª não está presente. Concedo a palavra à Professora Maria Ângela Varela Cabral da Pastoral do Menor da Arquidiocese de Vitória. Registramos com satisfação a presença da Professora Hermínia, Breda Minassi, representando o Exmº Sr. Secretário da Educação e Cultura. A SRª MARIA ÂNGELA VARELA CABRAL: – Exmº Sr. Presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo, Dilton Lírio, demais autoridades presentes, prezado público, crianças presentes, que acho falam muito mais do que qualquer um dos oradores aqui presentes. A Pastoral do Menor da Arquidiocese de Vitória, com uma trajetória de apenas dois anos e meio, tem tido a oportunidade de estar presente junto a todos aqueles movimentos e iniciativas, em prol de crianças e adolescentes, a cada vez, em número maior e empobrecidos. Quando falamos empobrecidos, isso nos preocupa muito, porque nos apresenta um processo dinâmico em que o indivíduo não está estaticamente pobre, mas um processo em que ele, a cada dia mais, é empobrecido, isso de forma proposital num sistema sócio-econômico-político que é o do nosso País. Durante toda a campanha da fraternidade, a Igreja, no Brasil, refletiu sobre alguns pontos, que considera, devem ser repensados não só durante a campanha –, durante todo o ano e mais ainda – o que, na realidade, está marginalizando esse menor. O primeiro ponto se liga muito à campanha da fraternidade, ainda do ano passado, quando refletíamos sobre a falta de terra, sobre a necessidade de uma reforma agrária onde o homem do campo tenha não só a terra, mas tenha também a oportunidade e meios para plantar, guardar seu estoque e garantia de venda de seu produto final. Essa família desiludida, de tal forma, da vida do campo vem para a cidade e aí sofre uma desilusão maior ainda. Durante esses dois anos de caminhada junto à criança, principalmente a criança da rua, temos aprendido muito e concluímos que essa criança precisa voltar à sua comunidade de origem. Temos pouco tempo para falar aqui, agora, e por isso queremos insistir mais nesse ponto. As crianças que estão na rua – e sabemos porque trabalhamos muito com elas – têm sido as crianças mais difíceis principalmente o adolescente, ele já perdeu o vínculo com a sua família, o vínculo com a sua comunidade de origem, perdeu muito daquilo de onde ele é, está hoje solto no meio da cidade, experimentando apenas a própria liberdade da rua, mas pagando muito caro por isso. A violência policial é muito grande; a polícia está de fato, desumanizada. Preocupa muito à própria Pastoral do Menor da Arquidiocese e a própria Igreja no Brasil, o empobrecimento do dom da vida que acontece a cada instante na cidade de Vitória. Se já tínhamos uma população grande nas ruas, do ano passado para cá essa população cresceu assustadoramente. Pelo fato de estar desvinculado totalmente da sua comunidade de origem e de não ter condições de revê-la, pelo fato de se sentir paupérrima, pelo fato de se sentir feia – segundo a própria criança ou adolescente – pelo fato de não saber como ganhar dinheiro para o seu sus- 113 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) tento. Temos verificado com essas crianças que o problema de sobrevivência sua e de sua família tem sido muito grande em detrimento de um lazer, de um processo de educação que ela está deixando de lado. Tudo isso faz com que juntemo-nos a todas as demais entidades que aqui passaram e irão passar, que temos de imaginar uma forma, a nível municipal, de reter as crianças nas suas comunidades. É claro que com programas alternativos para essas que ainda se encontram nas ruas, mas, de fato, a nível preventivo quanto às outras precisamos pensar. Isso só se fará na medida em que a família desse menor tiver condições de permanecer na sua comunidade. É muito importante que esta Subcomissão do Menor esteja junto com a Comissão da Família. Não adianta pensarmos no menor como uma solução isolada, temos de pensar nele inserido à família, à sua comunidade, que, cada vez mais, está empobrecida. Queríamos finalizar, dizendo aos Constituintes presentes hoje, nesta Casa, e àqueles que sempre estão aqui que a Pastoral do Menor está pronta para sentar, discutir e oferecer toda a sua experiência, sempre e quando for necessário. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Fazemos um apelo às pessoas que se encontram nas galerias para que colaborem com o máximo silêncio, a fim de que possamos ouvir todas as pessoas que desejarem fazer as suas propostas. Concedo a palavra ao Sr. Luciano Nasser Rezende, da Comissão Municipal Pró Criança. O SR. LUCIANO REZENDE: – Sras e Srs., muito boa tarde. Represento a Comissão Municipal Pró -Criança, da Prefeitura de Vitória, e vou apresentar as propostas do Movimento Estadual Meninos e Meninas de Rua. A preocupação do Movimento com o resgate dos direitos da cidadania desses meninos e meninas de rua vem desde o seu surgimento e é a motivação maior de suas ações. Durante o ano anterior, foi realizado o Encontro Nacional de Meninos e Meninas de Rua, cujo objetivo foi levantar subsídios para a nova Constituição. Desse Encontro participaram 500 meninos e meninas de 17 Estados que foram eleitos em fóruns locais e estaduais. Esses fóruns de preparação do Encontro Nacional tiveram como temática central "O Menor e a Constituinte". Dele participaram cerca de 10 mil crianças e jovens marginalizados. Além da discussão direta com meninos e meninas de rua, o Movimento vem discutindo a questão com outros segmentos organizados da população, como comunidades eclesiais de base, associações de moradores, centrais sindicais, partidos políticos, estudantes, profissionais da área de saúde, professores, jornalistas, assistentes sociais, advogados e, sobretudo, com educadores sociais de rua. O Movimento vem promovendo inúmeros debates, seminários e tem participado de outros tantos eventos, debates e encontros promovidos por outras organizações e entidades. Temos, portanto, a legitimidade de porta-voz e interlocutor dos meninos e meninas de rua do Brasil. Por isso, rogamos o direito de ser ouvidos pelo Congresso Constituinte, considerando uma questão de justiça ver nossas propostas contempladas na Carta Magna que está sendo elaborada. Vamos fazer uma pequena abordagem sobre o trabalho do menor. Quando discutimos e debatemos a questão da criança verificamos que não podemos fazê-lo de maneira isolada. A situação da criança, hoje, deve ser observada de modo amplo, que abranja a sua família e sua comunidade, como, por exemplo, a remuneração de seus país, a infra -estrutura básica do seu bairro. Não é um problema isolado. Essa a conclusão básica que chegamos em todos os nossos encontros e em todas as discussões que tivemos durante todo o tempo. Pode parecer coerente falarmos sobre o trabalho da criança, já que a criança deve ter direito ao estudo e ao lazer. Mas, frente à sociedade que vivemos, ao mercado capitalista que aí está, que cada vez mais induz a criança para a rua, temos que analisar o trabalho de maneira muito profunda, para que não deixemos que a criança seja explorada, para que nós possamos dar a essa criança, já que ele terá que trabalhar para levar algum auxílio para sua residência, que ela tenha um mínimo de condições necessárias para executar bem sua tarefa e que tenha condições dignas de trabalho. Dentro dessa proposta nós queríamos colocar que não será permitido ao menor trabalho insalubre, perigoso e penoso; e o que não será permitido o trabalho para menores de 14 anos. Nós observamos que existe, no Brasil, uma tendência muito forte em tomar medidas paliativas com relação aos problemas sociais e, dentre elas, destacamos o decreto-lei de 31 de dezembro do ano passado, quando foi instituído o trabalho para o menor, baixando dos 14 e atingindo até os 12 anos. Observem bem. A criança que já está desvinculada da família, que já está fora da escola ainda tem a possibilidade de entrar no mercado de trabalho mais cedo. Somos contrários a essa posição e desejamos dizer, ainda, com relação ao trabalho da criança – como foi dito aqui, no decreto, "as empresas deverão admitir, como assistidos, com duração de 4 horas diárias de trabalho e sem vinculação com a Previdência Social" – que além da criança entrar no mercado de trabalho mais cedo, ela ainda está desvinculada da Previdência, ou seja, mão-de-obra barata para que o sistema tenha como manter a sua máquina capitalista. Observamos, também, com relação ao trabalho da criança que, quando ele vai se aproximando da idade para ingresso no serviço militar, isso já é um obstáculo para que ele possa conseguir um trabalho. Finalizando, nós gostaríamos de propor o serviço militar não obrigatório. Porque, quando o rapaz chega próximo aos 18 anos de idade ele pede, praticamente, sua chance de conseguir um emprego, porque o empregador não vai aceitar esse rapaz que terá de ingressar no serviço militar dentro em breve e aí ele tem que permanecer na rua. O serviço militar inibe o empregador de aceitar essa criança que está na rua e dar-lhe um emprego decente. E, por último, sobre a violência, gostaríamos de propor que: seja assegurado, a qualquer pessoa, o direito de representação e de petição aos poderes públicos, em defesa de direitos ou contra abuso de autoridades; que toda pessoa seja parte legítima para se opor, impedir e denunciar o Poder Público por qualquer violência cometida contra o menor, seja pela policia, pelos familiares, pelos meios de comunicação ou terceiros, segundo regulamentação de lei. Essas nossas propostas foram debatidas durante todo o ano passado e, ainda, este ano. Gostaríamos, por último, Sr. Presidente – apenas mais 30 segundos – de fazer uma observação quanto ao Código de Menores. Queremos que seja exti nto o Código de Menores, uma vez que essa legislação não trata, em momento algum, dos direitos da criança, não possibilitando, ainda, o seu direito de defesa enquanto cidadã. Que a legislação civil, o Código Civil Brasileiro estabeleça as normas para todas as crianças, indiscriminadamente, não sendo necessário um Código específico que reforça a posição de marginalização da criança na sociedade brasileira. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Com a palavra o representante da comunidade de Taboazeiro, José Alves Carneiro. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Eu gostaria de saber o que ficou estabelecido no Regimento para que pudéssemos prosseguir neste debate. Eu queria saber da Presidência se os Constituintes não poderiam, no decorrer das exposições, também questionar as pessoas que vêm fazer as suas exposições, ou se somente poderá ser feito no final. Porque, muitas vezes, uma sugestão, uma pergunta qualquer serviria para dirimir uma dúvida, acho que seria interessante... O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Nós acatamos a questão de ordem de V. Ex.ª e achamos, realmente, interessante que tenhamos um debate, ao invés de um monólogo, V. Ex.ª e os demais Constituintes aqui presentes, poderão, quando julgarem conveniente, levantarem as questões que forem pertinentes. Estando ausente o representante de Taboazeiro, a Associação Assistencial São Francisco de Assis, por sua representante, Eliane Pereira Ferreira. (Pausa.) Ausente. Professor Aluísio Koeling, do Movimento Comunitário de Vila Velha. O SR. ALOÍSIO KROELING: – Em nome do Conselho Comunitário de Vila Velha, uma federação que engloba 55 bairros, eu gostaria de, neste momento, fazer a entrega à Subcomissão de um documento que foi discutido, em nível do município de Vila Velha. Este documento não trata só do menor e do deficiente, trata de vários problemas e tem várias sugestões para o Congresso Constituinte. Vou me restringir à entrega deste documento, mas eu gostaria de mostrar, um pouquinho, qual foi o processo de trabalho por que passou este documento. No dia 9 de fevereiro de 1984, o Conselho Comunitário de Vila Velha criou uma Comissão de Constituintes e já começou a discutir Constituinte; no dia 5 de maio do mesmo ano foi criada, a nível de Vila Velha, a Comissão Municipal Pró -Participação Popular na Constituinte; no dia 21 de abril de 1984, dia da morte de Tancredo Neves, aconteceu o 1º Seminário, com 110 pessoas no Município de Vila Velha discutindo a Constituinte; em setembro de 1984 o 2º Seminário aconteceu. Depois, em 85, foram feitas três assembléias municipais para discussão da Constituinte. Todos os nossos encontros e assembléias tiveram a participação de mais de 100 pessoas. ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) O documento que estou entregando é o resultado da assembléia realizada em 1985, quer dizer, bem antes, de se abrir, de fato, a participação popular no Congresso Constituinte. Vou fazer a entrega deste documento, acentuando que é muito importante a questão da participação popular em todo o processo. Convidaria as pessoas aqui presentes para um ato público a partir de amanhã, às 16 horas, na Praça Oito. É um abaixo assinado, de iniciativa popular. Estamos coletando 30 mil assinaturas para um projeto intitulado "Participação, controle e fiscalização do povo sobre o poder público". Quem quiser participar desse abaixo assinado será feito o lançamento amanhã às 16 horas. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedemos a palavra à Hermínia Breder, representante da Pastoral do Menor. Está presente? (Pausa.) Ausente. Eu queria saber se há outra inscrita que gostaria de fazer uso da palavra. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Concedo a palavra ao Padre Afonso Pastore. O SR. PADRE AFONSO PASTORE: – Tenho as propostas por escrito, mas eu prefiro fazer as colocações, talvez muito duras, mas que considero fundamentais. O Governo deve cuidar da pessoa, deve zelar pela família, é dela que depende a Pátria, ainda que a família não esteja constituída em normas e leis, mas sim, de fato. Que haja igualdade dos parceiros, homem e mulher. Evitar que os pais não tenham um salário digno para educar seus filhos. É aqui que está o ponto nevrálgico de nossa discussão de hoje: como é que um pai pode manter-se com a companheira e os filhos com o iníquo salário de hoje? Como a mãe faxineira, a margarida, a bóia-fria, pode compartilhar a vida materna e o insubstituível papel de educadora? Quando lhe sobra tempo, força ou um pouco de dinheiro para curso de aperfeiçoamento, lazer, para cuidar de sua saúde e mesmo dos filhos? Quero deixar bem claro: as creches são um mal; o menor de rua é uma vergonha e uma iniqüidade para todos nós. Talvez o Governo todo deveria estar na cadeia; o asilo, igualmente, é um mal detestável. Infelizmente, estamos vivendo as filosofias das multinacionais: suga-se o homem, arrancandolhe tudo e, em breve tempo, abandonando-o, deixando-o ao léo. O Governo deve dar condições aos pais de cuidarem dignamente dos filhos menores e os filhos ampararem os pais na velhice. Quando alguns pais, homem ou mulher, não tiverem condições de exercer o pátrio poder, caberá ao Governo escolher um parente, um amigo das crianças, para que cumpra essa nobre missão, dando-lhe condições econômicofinanceiras. E o mesmo se diga dos filhos quanto a seus pais idosos. Isso é missão que deveria caber, no meu entendimento, ao município, que é quem conhece a realidade concreta. Há necessidade, para tanto, de se tomar decisões fundamentais: primeiro, retirar do Executivo o despótico poder de construir obras faraônicas para imortalizar-se às custas da desgraça dos cidadãos, das famílias, dos menores e dos idosos; segundo, por dez anos investir toda a economia na educação, saneamento básico, profissionalização, orientação familiar, suspender, para tanto, a convocação das Forças Armadas, dos filhos das classes menos aquinhoadas e aplicar o dinheiro na saúde, alimentação do povo e da Pátria; de que adianta um Exército forte e um povo subnutrido? Usemos o exemplo histórico do Japão. O menor carente, o menor de rua, o velho abandonado é uma conseqüência da família incompleta, da falta de escolas, de profissionalização, da concentração de renda, de governos voltados para obras e não para a formação do povo, de um salário iníquo e de campanhas de litro de leite; suspender o pagamento da dívida externa. Não se paga a quem tem demais à custa do sacrifício dos cidadãos, se eles emprestam é porque está sobrando; cassar o mandato dos que depositam o seu dinheiro na Suíça, somas vultosas, a fim de que o Governo tenha com que educar seu povo; que tenham um salário digno e não uma situação de extrema miséria; fiscalizar a evasão clandestina do ouro, das pedras preciosas, da madeira bruta, do minério, a fim de que o Governo tenha como pagar salários dignos a todas as famílias, e ter métodos de promoção social. Para isso é necessário que tenhamos homens de coragem de acabar com os nossos brasileiros corruptos. Não adianta somente trabalhar com o menor, enquanto a família estiver abandonada, esmolando para sobreviver; somos contra o trabalho do menor até aos 14 anos. É necessário que o menor tenha escola, alimentação, lazer, preparando-se para o futuro; o casamento só poderá ser dissolvido, nos casos expressos em Iei, após a separação judicial, passados cinco anos. O aborto é um crime, um assassinato, um homicídio. Esta é a colocação que queria deixar para os nossos Constituintes. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Alguém gostaria de interpelar? (Pausa.) Temos inscrito o Dr. Roberto Mariano, da Associação dos ex-alunos. O Dr. Ary também está inscrito para contraditar uma posição já firmada. Temos a sugestão do nobre Constituinte, lberê Ferreira, no sentido de que, após a fala de cada expositor, o Constituinte que o quiser, possa fazer a sua interpelação. Acabou de falar o representante da Pastoral do Menor, que firmou duas posições que têm dado motivo a muito conflito no seio daquela Subcomissão. Uma delas é a questão do aborto; outra é a questão da dissolução da sociedade conjugal e que ele sugere um prazo de cinco anos apos a separação judicial; e firma posição no sentido de que o aborto seja considerado crime. São posições que têm suscitado muitas divergências, muitos conflitos no seio da Subcomissão. E se alguém tiver uma interpelação ou pergunta a fazer, a palavra esta franqueada. Acatamos a sugestão do nobre Constituinte lberê Ferreira, no sentido de que, após a fala de cada representante de entidade, o Constituinte possa fazer a sua interpelação. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Sr. Presidente, desejava fazer uma pergunta ao Padre Afonso. Evidentemente que não estamos aqui para expressar nossa opinião, mas levantando problemas para que possamos sair mais esclarecidos daquilo que foi afirmado. Queria apenas, se for possível, mais um esclarecimento no que diz respeito à afirmação do Padre, de que é contra as creches, de que as creches são um mal. 114 O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Gostaríamos de solicitar ao Padre Afonso que utilizasse a tribuna, de novo, para ficar de frente para o público. O SR. CONSTITUINTE IBERÊ FERREIRA: – Vejam bem, não é a minha opinião pessoal. Apenas, como estamos recebendo a visita de entidades civis, lá na nossa Subcomissão em Brasília, e como a questão da creche vem sendo levantada, tendo sido, inclusive, solicitado uma rede de creches por parte de todas as entidades que compareceram, e o Padre Adolfo foi o único – pelo menos que eu tenha escutado – que se posicionou contra as creches. Daí este Constituinte solicitar, se possível, um maior esclarecimento. O Padre Adolfo também falou que era a favor da igualdade do homem e da mulher, e do momento em que defende a igualdade dos direitos, evidentemente que aí deverá estar incluído também o trabalho da mulher. E no caso, trabalhando o homem e a mulher, a criança como ficaria? O SR. PADRE AFONSO PASTORE: – Agradeço a oportunidade de poder expor um pouco mais. A creche é fruto desses países subdesenvolvidos. O que se propõe hoje é que uma senhora, que mora num bairro pobre, possa estar com 4 ou 5 crianças das famílias que estão perto dela. Porque o que acontece quando se leva a criança para a creche é que, arrancada de seu meio, ela sofre um impacto muito grande. Depois, na creche, é alimentada, tem uma comida melhor, às vezes tem até banho de chuveiro, mas quando volta para o seu meio, para o seu barraco, para a sua favela, ela tem outro choque. Permanece na creche somente até os seis anos de idade, e quando está na idade melhor de sua vida, tem que ir para a rua, não se acostuma mais em casa. A proposta que se faz, hoje – em Minas Gerais já está em execução –, é que uma senhora do próprio bairro fique com os filhos das outras senhoras que precisam trabalhar. Quer dizer, as crianças sejam mantidas no próprio ambiente. Essa é a proposta que se faz. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Sr. Presidente, eu gostaria de aproveitar – já que o Padre ainda está na tribuna –, diante do que o nosso colega Constituinte expôs. Lá em Brasília, nos dias em que temos trabalhado na Subcomissão, compareceram dois grupos de mulheres. E a mulher, hoje, quer ter direitos que são reais, devem ser recebidos esses direitos, embora não concordemos com alguns detalhes, mas a mulher tem um espaço de trabalho. E a creche – gostaria que o Padre Adolfo voltasse a falar novamente – não daria certo? Sou casado e tenho três filhos, hoje de maior idade, mas quando pequenos foi necessária a creche. Não só as pessoas que residem nos barracos, nas favelas, recorrem à creche. Não. Há pessoas de classe média, e até acima da média, que recorrem às creches. Porque a creche, bem orientada, bem estabelecida, a meu ver, muito ao contrário do que o Sr. alega, ela ajuda a criança, enquanto a mãe vai ao trabalho, ao estudo. A mulher, hoje, tem direito a ocupar seu espaço e está lutando por isso. Compareceram à Subcomissão, por quatro vezes, dois grupos de mulheres, reivindicando, inclusive esse espaço a que ela tem direito no trabalho, na ajuda ao sustento da renda familiar, como tam- 115 ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) bém da educação de seus filhos. E a creche, como disse o Constituinte lberê Ferreira, é uma abertura e deve ser ampliada, não somente pelas instituições na sociedade, mas deve ser assessorada e orientada pelo Governo Federal, Estadual e Municipal, junto com a sociedade. Bem estabelecida, a meu ver, não irá criar esse choque que V. Sª colocou, de uma criança que chega a uma creche e quando volta para casa há um desequilíbrio. Muito pelo contrário. Acho que isso vai ser um crescimento. Até então, o testemunho que temos em todas as cidades – posso falar como um líder evangélico, como bispo de uma igreja evangélica, hoje Constituinte, andando pelo Brasil afora, que vários segmentos religiosos e outros da sociedade – onde estão estabelecidas as creches, têm sido de muita utilidade. Eu gostaria de, já que temos aqui na platéia mulheres e homens, que tomassem também a tribuna, que foi aberta a todos, para colocar suas posições. E V. Sª colocou que a creche e o asilo são um mal neste País. O SR. PADRE AFONSO PASTORE: – V. Ex.ª está se referindo apenas à creche da classe bem, do seu nível para cima, onde há possibilidade de se formar um pequeno lar, com psicólogos, professores etc. A creche de que falamos, no grande Brasil, é uma massificação imensa, é uma massa de crianças que vão sendo tiradas das mães subnutridas, dos bóias-frias, desse imenso povão brasileiro que está abandonado. Aí é que a creche não tem sentido e é o motivo de as crianças se tornarem menores abandonados. Nessa colocação que V. Ex.ª fez, de seus filhos, ou de filhos de pessoas de sua classe social, aí é possível. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Não foi só o caso de meus filhos, falei em termos gerais. Outra colocação que V. Sª fez, e que eu mesmo, que atendo pessoalmente a milhares e milhares de pessoas, sempre que esbarramos com o problema da dissolução da família, na nova opção de tanto o homem como a mulher, ter nova oportunidade e voltar a se casar, pela lei implantada, do nobre Senador Nelson Carneiro, estou apresentando uma proposta, uma emenda, para que não seja esse prazo de 3 ou 5 anos, mas que imediatamente. Já que não foram felizes naquele casamento, já que estão separados, que haja a possibilidade do divórcio, imediatamente, para no prazo de um ano voltarem a casar, para que possam ter uma vida correta diante da sociedade e diante de Deus. O SR. PADRE AFONSO PASTORE: – Se eu puder vou responder às duas. Sou contra o asilo, também não acho bom retirar-se um pai idoso de seu ambiente, do contato com seus filhos, para ser colocado num asilo, nos seus últimos anos de vida. Por melhor que o asilo seja, é sempre um rompimento com o lado afetivo, que é a grande riqueza que uma pesso a idosa possui. Quanto ao rompimento do casamento. Também sou conselheiro matrimonial, há 28 anos, neste Brasil todo. Sabemos que, logo após romper-se o casamento, há um aspecto afetivo muito estressante, muitas vezes desfaz-se um casamento precipitadamente quando, com o tempo, refazendo-se as coisas, pode-se partir para um casamento muito mais pensado, muito mais tranqüilo ao invés do impacto emocional causado pelo rompimento do casamento. O SR. CONSTITUINTE ROBERTO AUGUSTO: – Quanto ao rompimento, eu também atendo aos casais, não há tanto tempo quanto V. Sª, mas tenho uma experiência de vivência de 27 anos casado. Quando um casal chega a apresentar à Justiça o rompimento do casamento, esse rompimento já aconteceu há muito tempo. E às vezes verificamos, quando atendemos os casais – V. Sª e eu, um pastor e um bispo evangélico – que esse rompimento já aconteceu há muito tempo, estão é precisando que tentemos de uma reconciliação. Já que não há reconciliação, esse rompimento já foi feito entre os dois, somente cabendo ser estabelecido na Justiça. Muitas vezes, quando se apresentam para contar o rompimento, já vivem uma nova opção, por testemunho de ambos, como a certa. Não se deve esperar cinco anos, porque terão uma vida irregular. Quanto a esse processo, cremos e vamos lutar para que seja imediato. Respeitando, inclusive, o seu parecer. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – A Presidência solicita a síntese de nossos debatedores, no sentido de que déssemos oportunidade a todas as pessoas que estão aqui, que gostariam de fazer suas inserções. O Padre Adolfo responderá às questões. Vamos resumir o máximo possível as nossas intervenções para dar oportunidade a todos que querem tomar parte nos debates. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Está inscrita a Drª Margarida Maria Bizoto, que é advogada e Presidenta do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, no Espírito Santo, que gostaria de tomar parte dos debates. A SRA. MARGARIDA MARIA BIZOTO: – Eu queria fazer sugestões. Mas poderei também apartear. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Perfeitamente. A Srª inclusive está inscrita para falar. Vamos ouvir, então. as últimas palavras do Reverendo, se ele as têm, em resposta. O SR. JOÃO MARCOS LOPES: – Eu gostaria de apartear sobre o assunto. Meu aparte será pequeno. Procurarei ter um poder de síntese razoável. O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Pois não. O SR. JOÃO MARCOS LOPES: – Nós, como Assessores da Comissão Estadual Interpartidária Pró -Constituinte, e que tivemos a oportunidade de visitar quase todos os Municípios do Estado do Espírito Santo, a unanimidade desses Municípios, foi sugerido que se desse ao trabalhador, sobretudo o rural, a oportunidade para seus filhos de freqüentarem a escola em regime de tempo integral, vindo com isso suprir a carência da creche. E que seus filhos ficassem na escola, e que a escola lhes desse a oportunidade, não só do aprendizado, mas também a da alimentação. Essa foi a proposta de quase todos os Municípios do Estado do Espírito Santo. O SR. PADRE AFONSO PAS TORE: – Num regime de sufoco de salário mínimo, o povo não tem outro desafogo a não ser esse. Dê-se um salário digno para os pais, veremos que mudarão de idéia. E no sufoco do salário mínimo, no desespero da fome que se apela para o litro de leite. Esse é que é o drama. Dê -se um salário digno para as pessoas, que elas têm variedade de colo- cações e de busca da formação de seus filhos. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Nelson Aguiar): – Muito bem. Com a palavra a Drª Margarida Maria Bizoto. A SRA MARGARIDA MARIA BIZOTO: – Sou Presidente do Centro de Integração da Mulher. Infelizmente, por enquanto, ainda não temos nosso Conselho, nem no âmbito municipal como no estadual. Nem por isso vamos deixar de cumprimentar os presentes bem como as autoridades. Viemos trazer a nossa proposta, baseada em que o Estado do Espírito Santo fez o Encontro Estadual da Mulher para a Constituinte, e o seu relatório integrou o Encontro Federal Nacional da Mulher, realizado em Brasília, e a maioria das suas reivindicações consta da Carta da Mulher aos Constituintes. Como só disponho de 5 minutos para falar e tenho a impressão de que todos já têm esta Carta em mãos, gostaria de falar a respeito dos idosos, que é também proposta do Centro de Integração da Mulher – aposentadoria para a dona-de-casa de um salário mínimo, no mínimo. Proibição legal de despejo para os idosos: homem e mulher; aposentadoria nunca menor a um salário mínimo e igual ao salário percebido em trabalho rural nunca inferior a 75%; igualdade para o trabalho e urbano na aposentadoria também; amparo à velhice abandonada, com estímulo à participação e adaptação à sociedade; expurgo nos textos escolares de discriminações contra o idoso. Para os menores: assistência médica, psicológica e social às crianças sem família e na rua, que sofrem violências, especialmente a menina violentada; seja considerado crime inafiançável a todo aquele que explorar sexualmente o menor de 21 anos; cuidados especiais ao menor, e especialíssimo à menor de rua, pelas peculiaridades dos crimes a que est ão sujeitas no somatório comum aos meninos. O programa com o menor deve buscar um lar. Qualquer criança que ficar solta na rua, quer dizer brincando na rua sem deveres. A disciplina e o trabalho para a vida é uma conquista lenta, que deve começar desde novo. Isto é, esta forma de colocar a criança livre; vai à aula, volta, escola aberta. Embora eu não trabalhemos com crianças, no Centro de Integração da Mulher, porque não é nossa especialidade, entendemos que a criança para estudar e para formar o seu caráter, tem que ter uma disciplina. Isso de ir para a rua vender picolé, volta correndo para a escola assiste uma aula. Não conseguimos entender que isso possa ter um progresso. No fundo, talvez queiram manter essa criança como um trabalhador subalterno, de se gunda categoria, para alimentar a sociedade capitalista. Quanto às creches, o Padre que me antecedeu não deixa de ter razão. A proposta das mulheres, pelo menos do Centro de Integração da Mulher, é a seguinte: queremos creches não como um direito da mulher, mas como um direito da criança. Porque o trabalho não é um direito só do homem, é um direito também da mulher. Não queremos dizer que a criança vá ficar o dia inteiro na creche. A proposta – pelo que se luta, e sabemos que é a longo prazo – é que, aos poucos, a sociedade vá compreendendo que o homem e a mulher têm o direito e o dever de se dedicar ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE (ATAS DE COMISSÕES) à família. Também o homem não precisa trabalhar 8 ou 12 horas por dia, talvez 6 horas, e a mulher 6 horas também. Assim, haverá espaço para todo mundo, todos poderão se dedicar à família. "O homem não será impedido de ser um ausente no lar". E é exigido à maiori a dos homens que não acompanhe o desenvolvimento de seu filho. A proposta é a de que o homem também possa se dedicar ao lar. A divisão do trabalho, dentro do lar, é conhecida como reivindicação feminista. Nós entendemos que o homem pode dividir o seu trabalho do lar, porque quando ele convive dentro do lar, ele pode ajudar por exemplo, no preparo da comida, na higiene da casa, junto com a mulher. A creche será uma convivência da criança com outras crianças, com outras experiências. Não estamos propondo depósito de crianças. Está havendo um engano. Quanto ao depósito de crianças somos também contrárias. A creche é onde a criança já vai aprendendo a conviver com a comunidade com seus coleguinhas, aprendendo a dividir os seus brinquedos e o seu espaço. A creche não é só para a criança pobre. Se está entendendo a creche como um depósito de crianças, onde a mulher quer deixá-las para poder trabalhar fora – e, muitas vezes, é um trabalho tão aviltante que não vale a pena – não é esta a proposta das mulheres. Sr. Deputado Nelson, eu fui informada que, sobre o aborto, há uma proposta de S. Ex.ª de que a vida deve ser protegida desde a sua concepção. Estamos com o Sr. em número, gênero e grau. Somos contra o aborto, sim. (Palmas.) Nós temos nos manifestado, um pouco reticentes, porque entendemos que o aborto só pode vir quando houver igualdade entre o homem e a mulher; o que ainda não existe. Nós pedimos ao Sr. e toda à Subcomissão que temos duas conquistas; que são o estupro e o aborto, quando põe em risco a vida da mulher. Quando põe em risco a vida da mulher, é uma opção da mulher, muitas têm optado ao risco, têm morrido ou não, nós mesmas temos exemplos de mulheres, dentro do CIM, que optaram e que estão aí vivas, aplaudindo o sucesso de seus filhos. No caso do estupro, não é só a violência que é tida como estupro. O Sr. sabe que menor seduzida antes dos 14 anos, é estupro. No caso também da mulher deficiente física, débil mental, incapaz, também é tido como estupro. Quanto às conquistas que já temos, vamos pedir à Subcomissão que as mantenha. de que momento e de que época, a sociedade e o Estado, devem proteger o direito à vida. Ora, não teríamos vida sem concepção. Então, o momento primeiro da vida é o da concepção. Se logo a partir da concepção, a vida for interrompida, não haverá nascimento, portanto, não haverá vida. De modo que, nós fizemos essa proposta, e ela tem suscitado muitas discussões. Não tocamos na palavra aborto. Não pensamos nesse assunto, porque aborto não é assunto para a Constituição Federal, mas sim para a legislação específica. O que é assunto para a