Imagem da Semana: Fotografia Figura 1: Fotografia de pé esquerdo Enunciado Paciente feminina, 17 anos, previamente hígida,é atendida em pronto socorro de Belo Horizonte relatando aparecimento súbito da lesão em 1º e 2º pododáctilos no dia anterior. Nega dor local ou outros sintomas; exame físico sem outras alterações. Nega contato com qualquer tipo de substância de ação local ou ingestão de medicamentos. Relata que estava de férias no sítio da família há 3 dias, mas nega contato com animais. Baseado na história clínica e na imagem da lesão, qual o diagnóstico mais provável? a) Lesão por contato com lagartas do gênero Lonomia sp. b) Lesão por contato com piolho-de-cobra c) Lesão por contato com aranhas do gênero Loxosceles sp. d) Lesão por contato com botrópicos Análise da imagem Imagem 2: Fotografia do membro inferior esquerdo, evidenciando áreas enegrecidas em 2º e 1º pododáctilos. Diagnóstico Lesão caracterizada por alterações de pigmentação em pododáctilos associada à história clínica de ausência de dor local ou sintomas sistêmicos sugere lesão por contato com piolho-decobra. O fato de a paciente ter estado em ambiente onde o artrópode pode ser encontrado reforça a suspeita. As lesões causadas por lagartas do gênero Lonomia sp produzem quadro dermatourticante caracterizado por dor imediata, ardor, prurido e queimação local, podendo também levar a quadros mais graves de discrasia sanguínea, com sangramentos extensos e coagulação intravascular disseminada. Na lesão por aranhas do gênero Loxoceles sp., o quadro se inicia após cerca de 8 a 12 horas, com dor de caráter progressivo e instala-se halo eritematoso em volta do ponto de inoculação, que progride para uma área isquêmica, formando o que se denomina tipicamente “placa marmórea”. A lesão causada por serpentes botrópicas constituem a maioria dos acidentes ofídicos no Brasil. O quadro clínico é variável com a quantidade de veneno injetada, mas a dor está sempre presente e pode ser acompanhada por eritema, equimose e edema local. Em casos graves podem se seguir insuficiência renal aguda e choque. Discussão do caso Os “piolhos-de-cobra” (ou “gongolôs” e “embuás”) são artrópodos cilíndricos da classe Diplopoda. São descritas mais de 7500 espécies que podem ser encontradas em várias regiões do globo. A característica que distingue os demais artrópodes dessa classe é a presença de segmentos duplos no tórax, com dois pares de pernas em cada um. Seu corpo tem formato cilíndrico, com consistência endurecida e possuem coloração que varia do alaranjado ao negro, passando pelo marrom. Imagem 3: “Piolho-de-cobra”. Este artropodo apresenta toxinas liberadas quando o animal se sente ameaçado ou quando é esmagado. (Fonte: Lima et. al) Os piolhos-de-cobra podem ser encontrados em ambientes escuros e úmidos, como cascas de árvores, sob folhagens ou entulhos. Para se protegerem dos predadores, quando ameaçados assumem uma posição “enrodilhada”, produzem e liberam uma secreção tóxica contendo agentes irritativos e pigmentantes. Não possuem, porém, aparelho inoculador especializado. Essa secreção, quando em contato com a pele humana, pode levar a um quadro de “necrose superficial”, evidenciada por uma pigmentação hipercrômica de aspecto cianótico, que pode ser confundida com quadros de sofrimento tissular isquêmico. O quadro, geralmente, não é acompanhado de dor local ou sintomas sistêmicos, podendo, por vezes passar despercebido pelo paciente. A alteração de coloração da região da lesão comumente é o que o leva a procurar atendimento. O tratamento consiste em limpeza local e sintomáticos, quando necessários. A pigmentação costuma desaparecer espontaneamente após alguns dias, mas pode persistir ainda por meses. Aspectos relevantes - Os “piolhos-de-cobra” são artrópodos cilíndricos da classe Diplopoda com segmentos duplos no tórax e dois pares de pernas em cada um; - Quando ameaçados produzem e liberam uma secreção tóxica contendo agentes irritativos e pigmentantes; - Pode levar a uma lesão indolor com pigmentação hipercrômica de aspecto cianótico, que pode ser confundida com quadros de sofrimento tissular isquêmico; - O tratamento consiste em limpeza local e sintomáticos; - A pigmentação costuma desaparecer após alguns dias, mas pode persistir ainda por meses. Referências - Andrade Filho A, Campolina D, Dias MB. Toxicologia na prática clínica. 2ª ed. Belo Horizonte: Folium; 2013. - Lima CAJ, Cardoso JLC, Magela A, Oliveira FGM, Talhari S, Haddad Jr V. Pigmentação exógena em pododáctilos simulando isquemia de extremidades: um desafio diagnóstico provocado por artrópodos da classe Diplopoda (“piolhos-de-cobra”). An Bras Dermatol. 2010;85(3):391-2. - Curso Toxicologia [homepage da internet]. [acesso em 2013 Ago 1]. Disponível em: http://ltc.nutes.ufrj.br/toxicologia/index.php?action=modulos.inicial - Manual de diagnóstico e tratamento de acidentes por animais peçonhentos. 2ª ed. – Brasília: Fundação Nacional de Saúde; 2001. Responsáveis Emília Valle Santos, acadêmica do 12º período de Medicina da FM-UFMG E-mail: emivalle[arroba]gmail.com Alessandra Regina da Silva Resende, acadêmica do 12º período de Medicina da FM-UFMG E-mail: resendealessandra[arroba]yahoo.com.br Orientadora Dra. Patrícia Ciruffo, médica do serviço de Toxicologia do Hospital João XXIII E-mail: patriciaciruffo[arroba]yahoo.com.br Revisores Glauber Eliazar, Luanna Monteiro