UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO Validação de propostas de educação em saúde ocular comunitária aplicadas a profissionais de saúde em centros de atenção primária FABIANO CADE JORGE RIBEIRÃO PRETO 2010 FABIANO CADE JORGE Validação de propostas de educação em saúde ocular comunitária aplicadas a profissionais de saúde em centros de atenção primária Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo para obtenção do Título de Mestre em Ciências Médicas. Área de Concentração: Mecanismos Fisiopatológicos nos Sistemas Visual e Áudio-Vestibular Orientador: Prof. Dr. Jayter Silva de Paula RIBEIRÃO PRETO 2010 AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. FICHA CATALOGRÁFICA Jorge, Fabiano Cade Validação de propostas de educação em saúde ocular comunitária aplicadas a profissionais de saúde em centros de atenção primária. Ribeirão Preto, 2010. 66p.: il.; 30 cm Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP. Área de Concentração: Mecanismos Fisiopatológicos nos Sistemas Visual e Áudio-Vestibular. Orientador: Paula, Jayter Silva de 1. Saúde Ocular Comunitária; 2. Prevenção da Cegueira; 3. Saúde da Família. Apoio Financeiro: O presente projeto contou com auxílio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sob o número de identificação Proc. No. 409470/2006-6 e da Capes- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Dedicatória À minha esposa Clara, pelo seu amor, compreensão e dedicação, por sempre me incentivar e ser fundamental para minha evolução profissional. À minha família, por sempre me apoiar, Ernesto, Tânia, Italo, Stefano, Louise e Dulce. Ao meu avô Milton Cade, meu exemplo. AGRADECIMENTOS Este trabalho não poderia ter sido realizado sem as pessoas que estiveram ao meu lado nesses últimos anos no Hospital das Clínicas da FMRP-USP, professores, funcionários, residentes e pacientes, a todos o meu abrangente “muito obrigado”. Agradeço, especialmente, ao Professor Jayter que, sempre de forma acolhedora, exerceu muito além do seu papel de orientador, foi o meu mentor com paciência e sabedoria, um verdadeiro mestre sempre disposto a ensinar e capaz de vibrar com a evolução do seu aluno, um amigo e conselheiro. Agradeço ao Professor Eduardo, por tudo o que fez por mim desde quando cheguei a Ribeirão Preto, exemplo de profissional e professor, excepcional ser humano, responsável por muitas das minhas escolhas profissionais. À Professora Maria de Lourdes, por suas palavras sábias, pelo carinho, pelo incentivo, por sua dedicação e disponibilidade. Aos meus amigos de residência, Carlos, Dante, Rafael, Ana, Márcia, Sarah e Karina, sem os quais teria sido impossível o desenvolvimento deste trabalho, pois me deram o suporte e o apoio necessário para as práticas de campo. Agradeço ao João Marcello, que juntos trabalhamos intensamente neste projeto. Luciana e Érika, pela dedicação a este trabalho e ajuda fundamental. Ao José Afonso e ao Weverton, grandes amigos que tanto me ajudaram neste último ano, abrindo as portas de suas casas. Agradeço aos funcionários do Departamento de Oftalmologia, principalmente à Cecília, sempre prestativa, que se dispôs a me ajudar nesta fase final do trabalho. Não poderia deixar de incluir a minha esposa Clara, minha maior incentivadora, que pacientemente acompanha todos os meus projetos profissionais e gentilmente revisou esta dissertação. LISTA DE ABREVIATURAS Lista de Abreviaturas CSE-FMRP-USP- Centro de Saúde Escola da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo BAV- Baixa Acuidade Visual FMRP-USP- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo IAPB- International Agency for Prevention of Blindness NSF- Núcleos do Programa Saúde da Família OMS- Organização Mundial de Saúde PCR- Protocolos Clínicos Regulatórios PTO- Programa de Treinamento em Oftalmologia SUS- Sistema Único de Saúde UNICAMP- Universidade Estadual de Campinas UBS- Unidades Básicas de Saúde LISTA DE FIGURAS Lista de Figuras Figura 1: Número de pacientes referenciados a partir de centros de atenção primária para o serviço oftalmológico de referência, antes e depois do processo educacional (PTO). Legendas: 1. Baixa visão encaminhada para esclarecimento; 2. Vícios de refração; 3. Quadros de Olho Vermelho (excluindo hipóteses relacionadas a conjuntivites); 4. Retinopatias ou pedidos de fundoscopia; 5. Glaucoma; 6. Alterações de anexos oculares; 7. Catarata; 8. Exame físico normal; 9. Conjuntivites; 10. Outros motivos não especificados ................................................................. 35 Figura 2: Distribuição do nível de concordância, dada pelo número de casos de pacientes advindos dos NSF, nos dois momentos do estudo................................................................................................. 36 Figura 3: Distribuição do nível de concordância, dada pelo número de casos de pacientes advindos de outras UBS, nos dois momentos do estudo............................................................................................ 37 Figura 4: Distribuição do número bruto de fichas encaminhadas ao serviço oftalmológico de referência, antes e após o PTO............................... 38 Figura 5: Distribuição por faixa etária das fichas encaminhadas para atendimento oftalmológico, no município de Ribeirão Preto, em agosto de 2007...................................................................................39 LISTA DE TABELAS Lista de Tabelas Tabela 1: Distribuição do número de questões respondidas corretamente de um total de 20 pontos possíveis do questionário, por agente comunitário, nos momentos pré e pós PTO. Legendas: EPM erro padrão da média........................................................................ 34 Tabela 2: Resultado do Teste Kappa para a análise de concordância entre as diversas categorias estudadas. Os valores de Kappa apresentados se referem ao valor bruto para cada grupo, com base nas categorias diagnósticas, em cada momento do estudo. NSF – Núcleo Saúde da Família; UBS – Unidade Básica de Saúde; PTO – Programa de Treinamento Oftalmológico .................................................................................... 37 Tabela 3: Distribuição dos diagnósticos por categorias das fichas de referência para atendimento oftalmológico, de acordo com a origem, no município de Ribeirão Preto, no mês de agosto de 2007. .................................................................................................41 Tabela 4: Sumário do protocolo clínico e de regulação relacionando os cenários propostos com as hipóteses diagnósticas consideradas de maior impacto local........................................................................ 42 RESUMO Resumo JORGE,F.C. Validação de propostas de educação em saúde ocular comunitária aplicadas a profissionais de saúde em centros de atenção primária. 66f. Dissertação de Mestrado - Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2010. O objetivo do presente estudo foi o de avaliar a atuação do oftalmologista como modificador das práticas da saúde ocular, através da comparação da qualidade das fichas de referências provenientes de centros primários de saúde antes e após um programa de treinamento em oftalmologia (PTO), e o impacto deste processo educacional nos profissionais da atenção básica de saúde. Foi realizado, retrospectivamente, o estudo de prontuários médicos de pacientes referenciados para um serviço público de oftalmologia, em Ribeirão Preto, região Sudeste do Brasil. A amostra foi composta por fichas de referências de pacientes provenientes de atendimentos em quatro Núcleos do Programa Saúde da Família (NSF) em dois momentos de estudo, antes (M1 fevereiro e março/ 2007) e depois do PTO (M2 – outubro e novembro/ 2007), e por outros pacientes advindos, no mesmo período, de quatro Unidades Básicas de Saúde (UBS) que não receberam o PTO. A hipótese diagnóstica dos encaminhamentos foi comparada com os diagnósticos estabelecidos no centro de referência pelo especialista e foram avaliados os principais diagnósticos referenciados. A avaliação do impacto do processo educacional deu-se complementarmente por meio de um questionário básico aplicado aos agentes comunitários de saúde, antes e após o PTO. Duzentos e quarenta e seis casos foram estudados, 53 provenientes dos NSF e 193 de outras UBS. Após o PTO, o número de referências advindas dos NSF foi significativamente menor que antes do PTO (8/138 e 45/108, respectivamente; P<0.0001 – teste exato de Fisher). As taxas de concordância (kappa) dos diagnósticos dos NSF, quando comparados com os firmados pelo oftalmologista, foram maiores que os das UBS nos dois momentos do estudo, porém nenhuma comparação mostrou significância estatística (0,47 e 0,25 em M1 e 0,50 e 0,37 em M2, para NSF e UBS, respectivamente). Na análise comparativa, não se observaram diferenças significantes com relação às respostas dos agentes comunitários de saúde, entre M1 e M2 (P= 0,586, teste t pareado). Apesar de os níveis de concordância não apresentarem diferenças significantes, observou-se uma tendência de maior número de acerto diagnóstico nas fichas de referência advindas dos centros submetidos a seis meses do PTO. Além disso, o PTO pode estar relacionado com o menor número de encaminhamentos pelos NSF em estudo, provavelmente devido à melhor condução local dos problemas oculares. Palavras-chave: Saúde Ocular Comunitária; Prevenção da Cegueira; Saúde da Família. ABSTRACT Abstract JORGE, F.C. Validation of an educational process based on community eye health competence among practitioners of primary health centers. 66f. Master (Dissertation) – School of Medicine of Ribeirão Preto, University of São Paulo, Ribeirão Preto, 2010. The purpose of this study was to evaluate the quality of medical diagnosis of ophthalmologic disorders in referrals from primary health care to an ophthalmologic public service before and after an ophthalmological training program (OTP) and the impact of this educational process on the primary health practitioners. We performed a retrospective study of medical records of patients referred consecutively to an ophthalmologic public service, in the southeastern Brazil. The sample consisted of referrals from four local family health programs (NSF) before (M1 – February and March/ 2007) and after (M2 – October and November/ 2007) OTP, and also of referrals from four primary health care units (UBS). The presumptive diagnosis of referrals was compared with the diagnosis established in the ophthalmologic referral center. Description of major diagnosis and managements was studied as well. Also, a questionnaire was applied to assess the learned impact in the community health agents, before and after OTP. Two hundred forty six cases were studied, 53 from NSF and 193 from UBS. After OTP, NSF had a significantly lower number of referrals than before OTP (8/138 and 45/108, respectively; P<0.0001 – Fisher Exact test). The agreement index (kappa) of NSF, regarding comparison of all diagnosis in referrals with those established by a specialist, was higher than those observed in UBS, however with no statistical significance (0.47 and 0,25 in M1 and 0.50 and 0,37 in M2, for NSF and UBS, respectively). The comparison of corrected answers of the community agents between M1 and M2 did not display statistical significance (P=0.586, t test). Referrals of NSF that underwent six months of the OTP showed higher number of agreement than those of UBS, however this difference did not reach statistical significance. OTP may be related with the observation of a lower number of referrals from NSF to the ophthalmologic center, probably as a result of better local management of the ocular disorders. Key words: Community eye health, Blindness prevention, Family health care. ÍNDICE 1- INTRODUÇÃO.................................................................................................. 17 1.1. 1.2. 1.3. 1.4. 1.5. Generalidades...................................................................................................18 Educação em saúde e promoção da saúde......................................................19 Promoção da saúde ocular ...............................................................................20 Atenção primária e prevenção da cegueira ......................................................22 Justificativas......................................................................................................23 2- OBJETIVOS ..................................................................................................... 24 3- MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................. 26 3.1. Determinação da área .......................................................................................27 3.2. Determinação da população..............................................................................27 3.3. Delineamento do trabalho..................................................................................27 3.3.1. Educação Continuada e a formação de multiplicadores ........................27 3.3.2. Instrumentos de informação populacional..............................................28 3.3.3. Validação dos encaminhamentos à Unidade Distrital de Saúde............28 3.3.4. Avaliação dos agentes comunitários de saúde ......................................29 3.3.5. Determinação do perfil da demanda oftalmológica ................................29 3.4. Análise estatística.............................................................................................30 4- RESULTADOS ................................................................................................. 31 4.1. Educação em saúde ..........................................................................................32 4.2. Instrumentos de validação .................................................................................33 4.2.1. Avaliação do conhecimento adquirido pelos Agentes Comunitários de Saúde .....................................................................................................33 4.2.2. Comparação dos diagnósticos das fichas de encaminhamento ............34 4.3. Perfil da demanda oftalmológica ........................................................................38 4.4. Desenvolvimento de um protocolo clínico e de regulação oftalmológico...........41 5- DISCUSSÃO..................................................................................................... 43 6- CONCLUSÕES................................................................................................. 51 7- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 54 8- ANEXOS........................................................................................................... 58 1- INTRODUÇÃO Introdução 18 1.1. Generalidades Dados mundiais a respeito da prevalência e incidência de cegueira e visão subnormal evidenciam a necessidade de implantação de iniciativas de caráter preventivo e de promoção da saúde ocular. Em 1995, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou a primeira estimativa de cegueira em termos globais, estimando-se a existência de 38 milhões de pessoas cegas e de 110 milhões apresentando visão deficiente e risco acentuado de se tornarem cegas (THYLEFORS et al., 1995). Uma estimativa mais recente apresentou um número superior a 160 milhões com visão deficiente no ano de 2002 (RESNIKOF et al., 2004). A perda da capacidade visual implica no detrimento da qualidade de vida, decorrente de restrições ocupacionais, econômicas, sociais e psicológicas. Para a sociedade representa encargo oneroso e perda de força de trabalho (TEMPORINI; KARA JOSÉ, 1995). Não obstante, cabe salientar que a maioria das afecções e agravos oculares conducentes à cegueira é passível de ser evitada. Entre as principais causas de cegueira na América Latina situam-se os vícios de refração, catarata, glaucoma, retinopatia diabética, degeneração macular senil e retinopatia da prematuridade (VERDAGUER, 1998). A dificuldade de acesso dos usuários aos provedores de saúde reflete, em uma região, o nível de assistência médica fornecida à população, sendo um dos determinantes do perfil de cegueira do local. As barreiras ao acesso decorrem de problemas com recursos humanos e tecnológicos por parte dos provedores e do distanciamento geográfico, cultural, cognitivo e comportamental dos usuários dos serviços de saúde (IAPB, 1994). Dentro desse espectro, a atenção primária consiste em um importante caminho a ser percorrido, primordialmente à custa de esforços dos promotores de saúde. Introdução 19 Dentre esses esforços, as ações de promoção da saúde e de educação em saúde assumem importância decisiva. O planejamento de tais ações, contudo, requer a correta compreensão do significado de ambas as expressões mencionadas e de seus elementos constituintes. 1.2. Educação em saúde e promoção da saúde Entende-se por educação em saúde quaisquer combinações de experiências de aprendizagem, planejadas para facilitar ações voluntárias conducentes à saúde. O termo "combinação" enfatiza a importância de aplicar, aos múltiplos determinantes do comportamento, várias experiências de aprendizagem e intervenções educativas. O planejamento distingue a educação em saúde de experiências acidentais de aprendizagem. A ação voluntária significa a conduta adotada por um indivíduo, grupo ou comunidade, para alcançar um efeito intencional de saúde (GREEN; KREUTER, 1991). As ações de educação em saúde, portanto, apresentam o propósito de transformar conhecimentos, atitudes e condutas existentes, visando à promoção e preservação da saúde (CANDEIAS, 1997). Aplicando-se tais conceitos a programas de prevenção da cegueira, temse que as ações educativas constroem a base para a promoção da saúde ocular, prevenção de afecções e preservação do sistema visual, na medida em que aumentam a capacidade dos indivíduos na tomada de decisões a respeito de comportamentos que influenciarão seu nível de saúde ocular. A pouca habilidade em criar condições propiciadoras da motivação de indivíduos pela busca da solução de problemas oculares foi destacada, por Sommer, como um dos obstáculos importantes a serem ultrapassados em programas de prevenção da cegueira (SOMMER, 1989). Promoção em saúde significa uma combinação de medidas educacionais e estruturais (ambientais e financeiras), que apresenta o objetivo primordial de incentivar estilos saudáveis de vida, mantendo o nível de saúde Introdução 20 das populações de maneira eficaz, ética e socialmente justa (OMS, 1986; GREEN; KREUTER, 1991). O termo "combinação" é empregado, nesse contexto, em relação às forças da dinâmica social que incidem em determinada situação, extrapolando o ambiente físico e os serviços de saúde oferecidos à população. Assim, a cultura, as normas e o ambiente sócio-econômico compõem interações complexas, que, atuando na conduta, originam as condições de vida do indivíduo (GREEN; KREUTER, 1991). A promoção da saúde se identifica com a prevenção primária, porém propõe atividades dirigidas ao bem-estar de um indivíduo ou grupo saudáveis. Busca reduzir o risco da ocorrência de moléstia, injúria, incapacidade, deficiência ou de outro evento indesejável (TANNAHILL, 1985). Consideram-se promoção de saúde, portanto, as intervenções que visam à proteção ou melhoria do nível de saúde do indivíduo e da população, incluindo-se a educação em saúde nesse contexto, na medida em que o apoio e a aceitação de modificações ou inovações dependem da preparação realizada por processos educativos. Apresenta caráter multidisciplinar, integrando subsídios de diferentes áreas do conhecimento - educação, psicologia, sociologia, "marketing", entre outras (MACDONALD; BUNTON, 1993). A atuação de profissionais de saúde em ambas as dimensões mudança do comportamento individual e do comportamento organizacional envolve esforços bastante diversificados que, por sua complexidade, podem oferecer limitações importantes ao alcance de objetivos (CANDEIAS, 1997). 1.3. Promoção da saúde ocular A prevenção de estados conducentes à cegueira e à incapacidade visual, assim como a promoção da saúde ocular, situa-se entre as ações prioritárias de programas de oftalmologia de caráter comunitário. Reconhecese, contudo, a dificuldade de adoção da conduta adequada pelo indivíduo no Introdução 21 que diz respeito à promoção da saúde ocular, à prevenção de agravos e recuperação de patologias e distúrbios visuais (KARA-JOSÉ et al., 1990; TEMPORINI, 1992; KARA-JOSÉ et al., 1996; PRADO et al., 1997; TEMPORINI; KARA JOSÉ; KARA JOSÉ Jr., 1997). Influências restritivas à tomada de decisão em saúde ocular originam-se de fatores psicossócio-culturais e do ambiente, ou seja, de conhecimentos, crenças, valores, percepções e padrões sócio-econômicos, integrados ao contexto cultural (TEMPORINI, 1991; ROCHA et al., 1997). Há necessidade, portanto, de se desenvolverem esforços educativos, como parte de programas e projetos de promoção da saúde ocular, que visam a capacitar indivíduos e comunidades a aumentarem o controle sobre os determinantes da saúde ocular (OMS, 1986). A promoção da saúde ocular atenta para importante aspecto da qualidade de vida - o indivíduo deve apresentar capacidade visual que lhe permita o desenvolvimento de potencialidades e a participação na sociedade. Na organização dessa modalidade de programa é necessário prever e implantar estratégias, visando garantir a manutenção da saúde ocular, bem como a prevenção da ocorrência de doenças ou agravos. Entre as ações de promoção da saúde ocular situam-se as medidas gerais de educação em saúde, nutrição, aconselhamento genético, moradia adequada e saneamento do meio (LEAVELL; CLARK, 1976; TEMPORINI; KARA JOSÉ, 1995). A efetivação dessas medidas de intervenção, contudo, depende de ações referentes à: 1. Mobilização e otimização de recursos humanos, materiais, financeiros e institucionais; 2. Participação multiprofissional e multissetorial; 3. Participação do grupo ou população-alvo no planejamento, execução e avaliação das ações; 4. Avaliação sistemática e periódica do processo e do produto alcançados; Introdução 22 5. Realização de pesquisas regionais para dimensionar a magnitude dos problemas e obter subsídios para o estabelecimento de linhas de ação compatíveis com a realidade (TEMPORINI, 1991). A participação do oftalmologista em programa de promoção da saúde ocular deve ser estimulada, de forma a que se perceba a existência de atividades que independem da capacidade individual, por integrarem uma problemática situacional e conjuntural (DELGADO; KARA JOSÉ, 1996; RIAD; DART; COOLING, 2003). A formação de pessoal, que possa atuar como agentes de saúde ocular comunitária, ultrapassa os limites da atuação de oftalmologistas, e abrange outros profissionais de saúde de nível superior, principalmente médicos generalistas e especializados em saúde comunitária e/ou familiar. 1.4. Atenção primária e prevenção da cegueira A atenção primária é considerada a assistência essencial à saúde, baseada em tecnologia e métodos científicos práticos e socialmente aceitáveis, devendo ser acessível a todos os indivíduos na sua comunidade e estar determinada pelos recursos financeiros disponíveis (DECLARAÇÃO DE ALMAATA, 1978). A oftalmologia preventiva, ou saúde ocular comunitária, dentro do âmbito de atenção primária à saúde, deve ser adequada ao perfil epidemiológico da região, disponível a todos, ter credibilidade e poder ser fornecida a baixo custo (KUPFER, 1983). Interessante ressaltar que, fora os aspectos preventivos, propriamente ditos, é importante proceder à solução dos problemas detectados, se necessário utilizando todos os níveis de atenção. A medicina curativa bem feita e os processos de reabilitação, complementares às medidas preventivas, são importantes componentes na luta contra a cegueira (KUPFER, 1987). Introdução 23 1.5. Justificativas O serviço de Oftalmologia do Centro de Saúde Escola (CSE) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), uma unidade de referência para diversas unidades básicas de saúde (UBS), é um espaço utilizado para formação de alunos de medicina e médicos residentes e tem papel central no desenvolvimento de competências em saúde pública local. Diante desse panorama e do exposto anteriormente será possível: • Aplicar, coordenar e desenvolver as diversas frentes de educação permanente propostas para as unidades básicas de atendimento envolvidas; • Facilitar o acesso dos usuários a outros níveis hierárquicos do sistema de saúde; • Melhorar a assistência em termos de atendimentos oftalmológicos prestados à população local. 2- OBJETIVOS 25 Objetivos 1. Avaliar a atuação do oftalmologista no processo de mudança das práticas de saúde ocular, através da análise da concordância entre os diagnósticos oftalmológicos estabelecidos nas fichas de referências encaminhadas por profissionais dos NSF e aqueles estabelecidos pelo oftalmologista da Unidade Distrital de Saúde Sumarezinho - CSE-FMRP-USP, antes (M1) e após (M2) o programa de treinamento em oftalmologia (PTO). 2. Comparar os níveis de concordância observados nos diagnósticos propostos pelos profissionais dos NSF submetidos ao PTO com aqueles observados nos diagnósticos estabelecidos por profissionais de outras UBS do mesmo distrito, no mesmo período. 3. Avaliar a assimilação de conhecimentos oftalmológicos pelos Agentes Comunitários de Saúde após a execução dos diversos instrumentos educacionais propostos. 4. Descrever o perfil da demanda oftalmológica existente no município de Ribeirão Preto, através da análise das fichas de encaminhamento referenciadas aos setores de regulação e agendamento municipais. 5. Desenvolver um protocolo clínico e de regulação com base nas hipóteses diagnósticas predominantemente observadas nas fichas de referências estudadas. 3. MATERIAL E MÉTODOS Material e Métodos 27 3.1. Determinação da área A área geográfica de atuação das atividades de oftalmologia pertinentes ficou limitada ao Distrito Oeste de Ribeirão Preto - CSE – Unidade Distrital de Saúde Sumarezinho. Tal abrangência incluiu uma Unidade Distrital (CSE) e quatro Unidades de Saúde da Família (NSF). O presente trabalho está de acordo com os preceitos éticos básicos do Centro de Atenção Primária e Saúde da Família da FMRP – USP, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética local, protocolo no 220/CPE-CSE-FMRP-USP, em 13/03/2007 (Anexo 1). 3.2. Determinação da população A população estimada do Distrito foi de 136.906 habitantes para o ano de 2004, sendo que a população estimada atendida pelos quatro NSF (denominados NSF I, II, IV e V) foi de 14.760 habitantes. 3.3. Delineamento do trabalho 3.3.1. Educação continuada e a formação de multiplicadores A formação de multiplicadores foi pautada na educação continuada, de longo prazo, através de exposições teóricas de temas especialmente selecionados com relevância clínica para a Atenção Primária à Saúde. Um curso foi ministrado por oftalmologistas do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FMRP-USP. Foram 12 aulas com duração aproximada de 90 minutos, para os médicos e enfermeiros dos quatro NSF, além de profissionais de saúde atuantes na unidade distrital de saúde (CSE). Tal curso foi proposto intimamente de acordo com os preceitos do Ministério da Saúde e de projetos de saúde ocular da OMS. Material e Métodos 28 Outro pilar da educação em saúde foi a Consultoria de Oftalmologia nas unidades de Saúde da Família. Realizaram-se visitas semanais a essas unidades, pelo especialista, para discussão in loco com os profissionais de saúde. Dessa forma, os profissionais tiveram a oportunidade de discutir casos, realizar e treinar exames básicos oftalmológicos, além de participar de grupos e outras atividades na comunidade. Acrescente-se que tal treinamento se fundamentou nas seguintes competências: • Acuidade visual; • Campo visual de confrontação; • Inspeção externa; • Reflexos: vermelho, pupilar e de sensibilidade; • Teste de cobertura; • Fundoscopia direta. Sendo assim, buscou-se a formação básica desses profissionais, os quais poderiam atuar como multiplicadores do conhecimento local, na medida em que podem perpetuar a formação e o treinamento de auxiliares de enfermagem, assistentes sociais, agentes comunitários de saúde e outros atuantes no contato com a comunidade. 3.3.2. Instrumentos de informação populacional Além do processo de formação de multiplicadores, apontamos a necessidade de incentivar a educação popular, com trocas de saberes com a comunidade, estimulando o diálogo e a transmissão de conhecimento. Para a discussão de temas relevantes com a comunidade, propusemos a criação de instrumentos de informação populacional, distribuídos durante os atendimentos individuais ou em grupos, na unidade ou no domicílio, pelos integrantes da equipe. 3.3.3. Validação dos encaminhamentos à Unidade Distrital de Saúde Após a formação e treinamento dos profissionais de Saúde da Família, o processo de aprendizado foi avaliado através de métodos de validação do Material e Métodos 29 conhecimento adquirido, utilizando a análise dos casos oftalmológicos encaminhados ao CSE, por meio de guias de referências. As guias de referência são utilizadas pela Secretaria Municipal de Saúde de Ribeirão Preto para referenciar pacientes para outros níveis hierárquicos do Sistema Público de Saúde. As guias de referência encaminhadas pelos profissionais dos NSF foram analisadas quanto à sua procedência e às principais suspeitas diagnósticas. Tais hipóteses diagnósticas levantadas pelos profissionais do Núcleo foram comparadas com os diagnósticos firmados pelo oftalmologista, predeterminadas. avaliando O a mesmo concordância procedimento de foi classes realizado diagnósticas para os encaminhamentos procedentes de outras UBS do distrito oeste do CSE, não submetidas ao processo educacional. Adicionalmente, foram avaliadas, comparativamente, as fichas de referência advindas anteriormente ao processo de educação continuada dada aos NSF, de ambas as origens. 3.3.4. Avaliação dos agentes comunitários de saúde Foi criado um instrumento (questionário) que estimou o grau de conhecimento dos agentes comunitários de saúde (Anexo 2), uma vez que foi aplicado antes e após a educação continuada dos médicos e enfermeiros, possibilitando a avaliação da formação dos multiplicadores. Tal instrumento continha questões referentes á saúde ocular básica, além de avaliação de competências. 3.3.5. Determinação do perfil da demanda oftalmológica Foram analisadas todas as guias de referências enviadas de 49 unidades de saúde do município de Ribeirão Preto, recebidas no mês de agosto de 2007. Após a exclusão das guias de referência que não possuíam o mínimo de informação para o estudo, as demais foram avaliadas quanto à sua procedência, ao perfil da população encaminhada (faixa etária e sexo) e às principais suspeitas diagnósticas. Material e Métodos 30 3.4. Análise estatística Os dados foram interpretados utilizando-se recursos de estatística descritiva, com determinação de proporções e médias. As comparações foram realizadas por testes t pareado (amostras com dados pareados, obedientes a uma distribuição normal) e por testes baseados em tabelas de contingência para as proporções. O teste Kappa foi utilizado de forma complementar, para análise de concordância das classes diagnósticas. 4. RESULTADOS Resultados 32 4.1. Educação em saúde Em 2007, com o intuito de capacitar os profissionais de saúde da região, foi realizado um curso baseado em tópicos de Saúde Ocular Comunitária, por docentes e médicos da Oftalmologia e da Medicina Preventiva da FMRP-USP, além de convidados externos, com aulas teóricas e práticas, nas principais áreas do conhecimento básico de oftalmologia, a saber: • Anatomia do olho e anexos – exame físico; • Ações básicas e educação em oftalmologia; • Manejo básico de doenças e acidentes oftalmológicos; • Acuidade visual e problemas visuais na infância; • O olho vermelho; • Traumas oculares; • Tracoma; • Hanseníase; • Glaucoma; • Cataratas; • Afecções retinianas – quando suspeitar e o que fazer; • Manifestações oculares de doenças sistêmicas; • Programa de prevenção à cegueira. Nesse mesmo ano foi realizado um trabalho de consultoria presencial nos quatro NSF, com o treinamento teórico-prático dos profissionais de saúde locais em oftalmologia básica (seis meses de visitas quinzenais, de aproximadamente 90 minutos), os quais tiveram a oportunidade de desenvolver habilidades em exames e diagnóstico oftalmológicos e discutir casos atendidos na semana com o oftalmologista. Quando necessário, o atendimento ocorria com a presença destes pacientes, com o objetivo de aprimorar a abordagem prática ao paciente oftalmológico. Paralelamente, desenvolveu-se um manual Resultados 33 voltado aos agentes comunitários de saúde (Anexo 3) e também à população, visando o adequado entendimento dos problemas oftalmológicos corriqueiros. Tal manual se prestou também como guia para as atividades de campo dos agentes e como referencial para condutas locais. 4.2. Instrumentos de validação 4.2.1. Avaliação do conhecimento adquirido pelos Agentes Comunitários de Saúde Dois questionários idênticos, com tópicos básicos de oftalmologia (Anexo 2), foram aplicados a esses profissionais nos dois momentos do estudo, de forma a poder se comparar a evolução do conhecimento adquirido ao final do projeto. Na análise comparativa não se observaram diferenças significantes, com relação às respostas dos mesmos profissionais, entre os momentos pré e pós PTO (p= 0,586, teste t pareado) (Tabela 1). Resultados 34 Tabela 1. Distribuição do número de questões respondidas corretamente de um total de 20 pontos possíveis do questionário, por agente comunitário, nos momentos pré e pós PTO. Legendas: EPM - erro padrão da média. Núcleo I Núcleo III Núcleo IV Núcleo V Conhecimento Pré Conhecimento Pós Agente 1 Agente 2 Agente 3 15 11 14 17 15 14 Agente 4 Agente 5 Agente 6 14 15 12 12 11 13 Agente 7 Agente 8 Agente 9 10 13 8 12 12 8 Agente 10 Agente 11 Agente 12 13 14 15 13 15 16 12,8±0,64 13,2±0,71 MÉDIA ±EPM 4.2.2. Comparação dos diagnósticos das fichas de encaminhamento Foi realizada a avaliação preliminar comparativa da qualidade dos diagnósticos clínicos oftalmológicos entre os casos referenciados a partir dos NSF e os provenientes de outras UBS. A avaliação foi feita por meio do estudo retrospectivo de prontuários médicos, comparando-se a concordância da hipótese diagnóstica dos profissionais de saúde e o diagnóstico estabelecido pelo oftalmologista da rede pública de saúde (CSE), antes e seis meses após o início do processo educacional (Fevereiro/ Março e Outubro/ Novembro – 2007, respectivamente). Foram estudados e analisados 246 prontuários, 53 provenientes dos NSF e 193 provenientes de outras UBS, que não receberam o PTO. Todas as Resultados 35 hipóteses diagnósticas foram agrupadas em 10 categorias principais, com base nas descrições mais comuns e quando possível com a classificação internacional de doenças (CID X). As duas categorias diagnósticas com maior percentual de encaminhamento foram, respectivamente, vícios refrativos (35,7%) e dificuldade visual para esclarecimento especializado (32,5%). O número total de pacientes encaminhados, de acordo com a hipótese diagnóstica, se encontra categorizados na Figura 1. Figura 1. Número de pacientes referenciados a partir de centros de atenção primária para o serviço oftalmológico de referência, antes e depois do processo educacional (PTO). Legendas: 1. Baixa visão encaminhada para esclarecimento; 2. Vícios de refração; 3. Quadros de Olho Vermelho (excluindo hipóteses relacionadas a conjuntivites); 4. Retinopatias ou pedidos de fundoscopia; 5. Glaucoma; 6. Alterações de anexos oculares; 7. Catarata; 8. Exame físico normal; 9. Conjuntivites; 10. Outros motivos não especificados. Com base nas 10 categorias diagnósticas descritas acima, com ou sem o seu agrupamento, procedeu-se ao teste de concordância Kappa (k). Os estudos de concordância mostraram melhores resultados para as fichas advindas dos NSF (47% e 50%, nos momentos pré e pós-PTO, respectivamente - Figura 2) do que para as advindas de outras unidades (25% Resultados 36 e 37% nos momentos pré e pós-PTO, respectivamente - Figura 3), porém sem significância estatística (p=0,332). O teste Kappa demonstrou baixa concordância para as categorias analisadas em todos os grupos (k variando de 0,013 a 0,273; p>0,05) (vide quadros demonstrativos de cada origem e momento na Tabela 2). Por outro lado, a análise bruta do número de encaminhamentos mostrou que os NSF encaminharam proporcionalmente menos pacientes que as outras UBS após o processo educacional. No momento pré-PTO, os NSF encaminharam 45 pacientes e as outras UBS 63, totalizando 108 encaminhamentos. Após o PTO, 138 pacientes foram encaminhados, sendo que oito eram provenientes dos NSF e 130 de outras UBS (P<0,0001 - Teste exato de Fisher) (Figura 4). Figura 2. Distribuição do nível de concordância, dada pelo número de casos de pacientes advindos dos NSF, nos dois momentos do estudo. Resultados 37 Figura 3. Distribuição do nível de concordância, dada pelo número de casos de pacientes advindos de outras UBS, nos dois momentos do estudo. Tabela 2. Resultado do Teste Kappa para a análise da concordância entre as diversas categorias estudadas. Os valores de Kappa apresentados se referem ao valor bruto para cada grupo, com base nas categorias diagnósticas, em cada momento do estudo. NSF - Núcleo Saúde da Família; UBS - Unidade Básica de Saúde; PTO - Programa de Treinamento Oftalmológico. NSF Kappa geral P geral Kappa - IC 95% Pré-PTO 0.13 0.318 -0.125 / 0.385 Pós-PTO 0.273 0.196 -0.14 / 0.686 Pré-PTO 0.098 0.11 -0.022 / 0.218 Pós-PTO 0.013 0.71 -0.057 / 0.084 UBS IC 95% = Intervalo de Confiança 95% Resultados 38 Figura 4. Distribuição do número bruto de fichas encaminhadas ao serviço oftalmológico de referência, antes e após o PTO. Antes do PTO, 55,5% dos casos atendidos na unidade de referência oftalmológica receberam a prescrição de óculos e 29,6% destes foram encaminhados a outras especialidades médicas. No momento pós-PTO, 58,7% dos pacientes obtiveram prescrição de óculos e 35,5% foram encaminhados a outra especialidade. 4.3. Perfil da demanda oftalmológica Foram analisadas 2780 guias de referências advindas de 49 unidades de saúde do município de Ribeirão Preto, recebidas no mês de agosto de 2007, referentes ao período máximo de seis meses da data do encaminhamento local. Deve-se esclarecer que 1447 guias não foram incluídas, por não apresentarem o mínimo de informação necessária a este estudo. A UBS que mais referenciou casos oftalmológicos no período estudado foi a do bairro Vila Virgínia (7,5%), seguida do Parque Ribeirão (7,3%), Resultados 39 respectivamente com 100 e 97 encaminhamentos. Em 9,9% não foi possível identificar a procedência da guia de referência. Os quatro NSF estudados foram responsáveis por apenas 2,3% dos encaminhamentos, totalizando 31 guias de referência, sendo que os NSF que mais realizaram encaminhamentos foram o NSF I (9) e o NSF IV (8). Quanto ao perfil dos usuários encaminhados, 66% eram do sexo feminino, mantendo a mesma proporção entre as guias de referência analisadas dos NSF (68%) e das demais Unidades de saúde (66%). Em relação à faixa etária dos usuários, 31% tinham idade entre 40 e 59 anos, seguidos dos maiores de 60 anos, com 21%. Em relação à idade e ao sexo, os usuários apresentavam predominância do sexo feminino em todas as faixas etárias, exceto em menores de cinco anos, onde prevaleceu o sexo masculino, conforme gráfico abaixo (Figura 5). Figura 5. Distribuição por faixa etária e sexo das fichas encaminhadas para atendimento oftalmológico, no município de Ribeirão Preto, em agosto de 2007. Resultados 40 As hipóteses diagnósticas existentes nas guias de referência que motivaram os encaminhamentos realizados pelos profissionais da Atenção Básica foram divididas nas seguintes categorias diagnósticas: Problemas Retinianos (incluindo solicitação de fundoscopia e investigação de retinopatia diabética e hipertensiva); Vícios de Refração; Deficiência Visual (quando não havia registro explícito do diagnóstico); Catarata; Cefaléia; Conjuntivites; Olho Vermelho; Trauma Ocular; Dor Ocular; Glaucoma; Pterígio; Distúrbio de Pálpebras e Anexos; Estrabismo; Outros diagnósticos (não especificados anteriormente); Sem informação. Dentre os encaminhamentos analisados, a causa mais encontrada foi de “erros de refração” (23%), seguida de “deficiência visual” (20%) e “problemas retinianos” (4,1%). Ressalta-se que cerca de 40% dos casos encaminhados pelas unidades de saúde foram categorizados como “Sem Informação”, ou seja, não havia registro da causa que motivou a avaliação oftalmológica. Nesta categoria foram incluídos todos os registros de siglas como “A/E”, “a esclarecer”, ou quando não havia a descrição do que motivou a consulta. Todas as outras categorias somaram 12,3% de encaminhamentos. Em relação aos encaminhamentos procedentes dos quatro NSF, 68% das guias de referência foram categorizadas como “sem informação”, seguidas de erros de refração, com 19%,e logo após deficiência visual, olho vermelho, problemas retinianos e pterígio, com um encaminhamento de cada categoria (Tabela 3). Resultados 41 Tabela 3. Distribuição dos diagnósticos por categorias das fichas de referência para atendimento oftalmológico, de acordo com a origem, no município de Ribeirão Preto, no mês de agosto de 2007. Diagnóstico que gerou o encaminhamento NSF Outras UBS TOTAL N (%) N (%) (%) Catarata - - 31 2,4 2,3 Cefaléia - - 18 1,4 1,4 Conjuntivite - - 17 1,3 1,3 Deficiência Visual 1 3,2 272 20,9 20,5 - - 10 0,8 0,8 Dor ocular - - 5 0,4 0,4 Erro de Refração 6 19,4 302 23,2 23,1 Estrabismo - - 16 1,2 1,2 Glaucoma - - 7 0,5 0,5 Olho vermelho 1 3,2 4 0,3 0,4 Outros - - 29 2,2 2,2 Problemas Retinianos 1 3,2 54 4,1 4,1 Pterígio 1 3,2 26 2,0 2,0 Sem informação 21 67,7 508 39 39,7 - - 3 0,2 0,2 31 2,3 1302 97,7 100 Distúrbio de Pálpebras e anexos Trauma Ocular Total 4.4. Desenvolvimento oftalmológico de um protocolo clínico e de regulação O desenvolvimento de protocolos clínicos regulatórios (PCR) e condutas terapêuticas em oftalmologia básica foi baseado na tentativa de resolução dos problemas oftalmológicos mais frequentes, dentre os analisados no projeto, os quais foram agrupados no tema “Dificuldade Visual”. O PCR foi desenvolvido em oficinas multidisciplinares, das quais participaram profissionais da rede Resultados 42 básica de saúde, médicos reguladores e especialistas de diferentes áreas da universidade. Para tanto, foram representadas as mais variadas afecções oftalmológicas, agrupadas por afinidade de apresentação e relacionadas ao tema principal, em algoritmos de conduta para facilitar a identificação e a intervenção dos profissionais de saúde que os utilizarem (Anexo 4). Foram estabelecidos cinco cenários considerando as hipóteses diagnósticas mais comuns (Tabela 4). Tabela 4. Sumário do protocolo clínico e de regulação relacionando os cenários propostos com as hipóteses diagnósticas consideradas de maior impacto local. Cenários BAV* de início insidioso e indolor Diagnósticos Erros de refração ou catarata BAV discreta associada à secreção e hiperemia difusa de início agudo (menor Conjuntivites que 3 dias) BAV moderada a grave associada à dor intensa e hiperemia pericerática BAV discreta associada à sensação de corpo estranho ocular e hiperemia focal BAV discreta associada à sensação de corpo estranho e hiperemia difusa *BAV= baixa acuidade visual Glaucoma, úlcera de córnea, uveíte, inflamações orbitárias ou endoftalmites Pterígeo ou pinguécula Corpo estranho em superfície ocular 5. DISCUSSÃO Discussão 44 O termo saúde ocular primária comunitária pode ser definido como o conjunto de medidas, ações e intervenções relacionadas à oftalmologia, com foco na prevenção da cegueira, aplicadas à comunidade, incluindo seguimento e reabilitação de inúmeras condições oculares (RIAD; DART; COOLING, 2003). Esse tipo de abordagem permanece subestimada em diversas partes do mundo e, apesar do variável estímulo governamental, ainda pode-se encontrar no Brasil as dificuldades de acesso e contato de pacientes com o oftalmologista de ponta, principal ator no cenário ideal da saúde ocular comunitária. As barreiras ao acesso a serviços oftalmológicos têm sido apontadas como um dos responsáveis pelo elevado número de pessoas com impedimento visual em diferentes populações, ou seja, a dificuldade em receber um atendimento oftalmológico pode influenciar no perfil da saúde ocular de populações, mesmo em países considerados desenvolvidos economicamente, como os Estados Unidos da América (VITALE; COTH; SPERDUTO, 2006). Norte-americanos que não possuem seguro saúde consultam o serviço oftalmológico em menor proporção que canadenses ou cidadãos americanos com seguro saúde, o que aumenta a preocupação com a saúde ocular por parte da população não favorecida economicamente (ZHANG et al., 2008). Alguns relatos, depoimentos e artigos veiculados pelo governo, unidades de ensino, profissionais da área de saúde e população geral apontam para a necessidade de formação mais generalista do profissional médico, para a atuação próxima à comunidade. Indicam também, como maior opção, a Universidade Pública, a qual seria responsável por atender as demandas de socialização do conhecimento e buscar soluções para os problemas da comunidade onde se insere (artigo 196, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Tal formação generalista não significa, obviamente, o menor privilégio ou extinção das especialidades médicas. Tais especialidades, dentre elas a oftalmologia, têm seu campo de atuação bem definido e ainda precisam de apoio formativo, estrutural e financeiro para oferecer o atendimento adequado à Discussão 45 sociedade. Deve-se considerar, dessa forma, que o melhor aprendizado geral do médico atenderá inúmeras iniciativas da comunidade e do governo, tais como os NSF do SUS. No Brasil, a educação e a saúde sempre foram consideradas fundamentais para o desenvolvimento da sociedade de forma mais igualitária. À Universidade cabe não só formar profissionais e cientistas aptos a lidar com os objetos específicos de sua área de conhecimento, mas, também, aptos a lidar com a diversidade e heterogeneidade de situações complexas. O desenvolvimento de competências requer vivência de variadas situações. O desequilíbrio entre as condições sociais, o acesso ao atendimento clínico e a dificuldade na realização de avaliações, exames e procedimentos impostos pela fragmentação do sistema de saúde, resultam em generalizada insatisfação, atraso diagnóstico, e desperdício de recursos financeiros (LOVALHO, 2004). Algumas competências gerais e específicas podem ser desenvolvidas a partir do trabalho em cursos específicos ou em um conjunto amplo de atividades de ensino. Os recursos cognitivos utilizados por profissionais formados podem advir de conhecimentos teóricos, práticos, valores, julgamentos, habilidades, percepções, avaliações e estimativas. Tais fatores ocorrem com maior frequência e intensidade na vivência do aprendizado junto à população. De forma semelhante, a atuação de oftalmologistas também em proximidade com unidades de atendimento comunitário, tais como centros distritais de saúde e programas comunitários, poderá melhorar a formação desse profissional, capacitando-o a criar e desenvolver atitudes de promoção da saúde ocular. Após a implantação do programa de educação continuada destinado a médicos e enfermeiros que atuam em unidades de Saúde da Família, em questão neste estudo, esperou-se maior domínio dos conhecimentos referentes à saúde ocular básica, com atendimento de melhor qualidade aos usuários portadores de afecções oftalmológicas, diagnósticos mais precoces, Discussão 46 tratamentos atualizados e ações direcionadas para a prevenção e o tratamento adequado de afecções oculares prevalentes na Atenção Primária. Esperou-se também melhor integração dos serviços de atenção primária, secundária e terciária, e atendimento das necessidades reais das unidades descritas. Com os resultados obtidos, observou-se, de forma subjetiva, pelos participantes, que o profissional da área básica se tornou mais competente, resultado que não pode ser comprovado pelos processos de validação aqui propostos. Tanto as medidas de concordância (valores kappa menores de 0,4), tomadas como representantes da fixação do conhecimento fornecido, como as do conhecimento transmitido aos agentes comunitários que, dentre 20 questões, responderam corretamente em média 12,8 ± 0,64 e 13,2 ± 0,71, respectivamente, nos momentos pré e pós PTO (tomado como ponto de análise da manutenção, propagação e até multiplicação daquele conhecimento), não atingiram níveis de significância estatística. Dessa forma, poder-se-ia concluir que as atuações teóricas e teóricopráticas “in loco” não alcançaram o proposto inicialmente, pelo menos da forma como realizadas e da forma como foram medidas neste estudo. Interessante ressaltar que, a despeito desses dados, comprovou-se com significância estatística que esse processo educacional resultou em menor número de encaminhamentos dos NSF (45 pacientes antes e 8 após o PTO), comparativamente àqueles advindos de outras UBS (63 pré e 130 pós PTO). Tal resultado é de grande importância dentro do contexto da presente proposta e se deve, provavelmente, ao melhor manejo de casos oftalmológicos no âmbito da própria unidade de saúde (no caso, cada NSF). Uma vez sendo imprescindível a participação e dedicação do oftalmologista neste processo, é necessária boa aceitação pela equipe em treinamento quanto à presença de um novo profissional no NSF. O contato quase semanal com o especialista pode ser encarado, equivocadamente, como uma presença estranha para aquelas pessoas que estão juntas no dia a dia. Cabe ao oftalmologista contornar essa situação e deixar explícito que o seu Discussão 47 trabalho visa a melhoria geral na qualidade do atendimento à população, em benefício de todas as esferas do sistema de saúde. Poder-se-á vislumbrar, dessa forma, a formação do profissional da atenção básica de saúde como um multiplicador dos conhecimentos incorporados por meio dos treinamentos, sendo possível a elaboração de medidas preventivas gerais, como orientação e educação da população, ou específicas, como campanhas, a fim de mudar pontos problemáticos de saúde ocular. A atuação de um agente comunitário de saúde mais preparado para reconhecer as deficiências visuais dos pacientes em sua área de trabalho, também tem papel fundamental na promoção da saúde ocular e educação da população. O elevado número de pacientes referenciados para o serviço de oftalmologia ratifica a necessidade de um efetivo e mais organizado fluxo de atendimento para a população. Este montante coloca a oftalmologia como uma das especialidades médicas mais concorridas e com o acesso indubitavelmente problemático, haja vista que o número de serviços especializados não é capaz de suprir toda essa demanda de atendimentos. O perfil da demanda oftalmológica na região de Ribeirão Preto evidenciou maior número de encaminhamentos de pacientes com mais de 40 anos. Esses dados corroboram estimativas da prevalência da cegueira, impedimentos visuais e principais problemas oftalmológicos presentes em populações de países com características demográficas, sociais e econômicas semelhantes ao Brasil (RESNIKOFF et al., 2004). Isso significa um acréscimo de distúrbios crônicos de visão como catarata, presbiopia, glaucoma e retinopatias. As três categorias com o maior número de encaminhamentos foram, respectivamente, casos sem causa específica ou “sem informação” (40%), “erros de refração” (23%) e “deficiência visual” (20%). De forma semelhante, um estudo realizado na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP evidenciou o diagnóstico de “baixa visão” em 47,2% do total de Discussão 48 encaminhamentos para um serviço secundário de referência (COVOLO, 2003). Compreensivelmente, um médico que não seja oftalmologista tem como primeira hipótese diagnóstica erro de refração ou uma deficiência visual inespecífica ou, simplesmente, não escreve nenhuma hipótese na ficha de referência. Estas categorias, com classificação mais abrangente, de certa forma, relacionam-se com a dificuldade em propor um diagnóstico ao paciente na atenção primária à saúde, que por vezes, pode retardar a identificação de alguma importante condição patológica. Dessa forma, o tempo entre o primeiro atendimento e o início do tratamento poderá fazer diferença quanto ao prognóstico visual de tal paciente (SOARES, 2007). Diante de tal cenário, deve-se ressaltar que a elaboração, para posterior execução, do protocolo clínico e de regulação proposto pode tornar o profissional da atenção básica mais capacitado, não obstante a dependência de um suporte teórico-prático concomitante de profissionais da especialidade, nos seus momentos iniciais. De uma forma geral, os protocolos existentes na literatura tratam apenas de elementos clínicos e são estabelecidos para organizar intervenções específicas, como em pacientes ambulatoriais, internados e em terapia intensiva. Sendo assim, os desafios não se restringem a propor intervenções clínicas e regulatórias por meio dos PCR, mas também garantir, em cooperação com profissionais e gerentes da atenção médica primária, uma atenção integral e equitativa (SANTOS et al., 2008). O desenvolvimento do PCR demanda conhecimento científico, administrativo e operacional, para que seja um produto devidamente embasado e capaz de trazer a melhoria de qualidade para o atendimento ao paciente, facilitando, portanto, o acesso do usuário ao sistema de saúde. Potencialmente, diante deste contexto e dispondo de tal ferramenta, o profissional poderá melhorar suas habilidades clínicas (SANTOS; PINTO, 2005). O presente PCR possuiu o objetivo primordial de organizar relevantes cenários oftalmológicos baseados na realidade de nossa atenção básica, Discussão 49 apesar de, obviamente, não ser abrangente o suficiente, considerando que não apresenta todas as causas de impedimento visual. Os problemas visuais, ilustrados nos diferentes cenários clínicos, representam, desde discretos sintomas até graves apresentações de doenças oculares. Ressalta-se que, se por um lado é comum o atendimento em hospitais terciários, ao paciente com discreto embaçamento da visão, devido, por exemplo, à conjuntivite viral aguda, por outro lado, pacientes com doenças graves, como uveítes, retinopatia diabética avançada e descolamento de retina, mereceriam um atendimento especializado imediato e, inúmeras vezes, a hipótese passa despercebida nas UBS, sendo referenciadas por vias de acesso mais lentas, dificultando o acesso precoce do paciente ao especialista (SOARES, 2007). Na maioria dos casos simples, os pacientes são frequentemente encaminhados diretamente da atenção primária para o serviço terciário. Entretanto, em tais casos, entende-se que o tratamento do paciente pode ser iniciado na consulta básica e com acompanhamento no mesmo local, e caso não apresente melhora, ou venha a ter alguma evolução atípica, o paciente deve ser então, referenciado para o atendimento especializado. Como outro exemplo, o paciente com sintomas de catarata, por sua vez, deve ser encaminhado para os serviços secundários ou terciários para confirmação diagnóstica e posterior tratamento cirúrgico. Além disso, quando o diagnóstico é feito corretamente pelos profissionais da atenção primária, pode-se reduzir o tempo de espera para o tratamento efetivo. Depois de sua elaboração, o protocolo clínico e de regulação precisa ser validado e provar ser capaz de promover melhor qualidade no cuidado com a saúde ocular da população. Essa melhora dependerá do melhor manejo oftalmológico pelos profissionais da atenção básica, e ocorrerá quando o paciente tiver a oportunidade de receber os cuidados oftalmológicos por profissionais confiantes e competentes para tal, no tempo e no local conveniente, sem prejuízo para a sua própria saúde (PERSAUD; JREIGE; LEBLANC, 2004a e b). Discussão 50 Além dos frutos discutidos anteriormente, o presente projeto de pesquisa contribuiu para melhorias nos equipamentos locais, na boa divulgação local do Manual Básico de Oftalmologia Para Agentes Comunitários, na assessoria dos NSF pertencentes ao distrito oeste de Ribeirão Preto, com início da conscientização técnica de alguns gestores locais para esse importante nicho de formação profissional e educação continuada. Interessante comunitários de mencionar saúde que poderá o manual servir de de apoio modelo aos para agentes instituições governamentais, inclusive em diferentes regiões do país (Anexo 3). Complementarmente, o protocolo de conduta e regulação proposto já está sendo divulgado à comunidade científica internacional e poderá, após sua implantação experimental local, ser responsável por uma evolução nessa linha de pensamento e benefício geral esperado para a população. O processo educacional não significa uma tarefa pontual, e sim um processo contínuo, no qual todas as esferas que representam o sistema de saúde devem permanecer integradas nessas ações. Todos os atores precisam estar envolvidos com os seus papéis e conscientes de suas funções e responsabilidades para com a saúde da população. 6. CONCLUSÕES Conclusões 52 1. As taxas de concordância dos diagnósticos dados por profissionais dos NSF, quando comparadas com os firmados pelo oftalmologista da Unidade Distrital de Saúde Sumarezinho - CSE-FMRP-USP, aumentaram após o PTO (M2), porém sem significância estatística (0,47 em M1 e 0,50 em M2). 2. Os níveis de concordância observados nos diagnósticos propostos pelos profissionais dos NSF submetidos ao PTO foram superiores àqueles observados nos diagnósticos estabelecidos por profissionais de outras UBS, porém nenhuma comparação mostrou significância estatística (0,47 e 0,25 em M1 e 0,50 e 0,37 em M2, para NSF e UBS, respectivamente). Por outro lado, o número de referências advindas dos NSF após o PTO foi significativamente menor que o de antes do PTO (8/138 e 45/108, respectivamente; P<0.0001). 3. Não se observaram diferenças significantes com relação à proporção de acerto das respostas dadas pelos agentes comunitários de saúde no questionário oftalmológico, entre os momentos M1 e M2 (P= 0,586). 4. As principais categorias diagnósticas referenciadas no município de Ribeirão Preto, nesse período, foram casos sem causa específica ou “sem informação” (40%), “erros de refração” (23%) e “deficiência visual” (20%). 5. Um protocolo clínico e de regulação para dificuldade visual foi desenvolvido abrangendo cinco cenários clínicos de distúrbios oculares de relevância local, a fim de aumentar a eficácia da condução dos pacientes com problemas oftalmológicos, a saber: BAV de início insidioso e indolor, BAV discreta associada à secreção e hiperemia Conclusões 53 difusa de início agudo (menor que 3 dias), BAV moderada a grave associada à dor intensa e hiperemia pericerática, BAV discreta associada à sensação de corpo estranho ocular e hiperemia focal e BAV discreta associada à sensação de corpo estranho e hiperemia difusa. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Referências Bibliográficas 55 CANDEIAS NMF. Conceitos de educação e de promoção em saúde: mudanças individuais e mudanças organizacionais. Revista Saúde Pública 1997; 31(2):209-13. COVOLO GA. Avaliação da demanda atendida num modelo de atenção secundária em saúde ocular [Dissertação]. Campinas (SP): Universidade Estadual de Campinas, 2003. 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ANEXOS Anexos 59 ANEXO 1 COMPROVANTE DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA Anexos 60 ANEXO 2 QUESTIONÁRIOS PARA OS AGENTES COMUNITÁRIOS Nome: 1A) B) C) D) E) 2A) B) C) D) E) NSF: A cada 10 pacientes visitados, quantos usam óculos: 0-1 2-3 4-5 6-7 acima de 7 Com que freqüência os pacientes são questionados por você sobre queixas oftalmológicas: nunca em aproximadamente 25% das vezes em aproximadamente 50% das vezes em aproximadamente 75% das vezes as queixas oftalmológicas são abordadas somente quando o paciente espontaneamente pergunta sobre isso 3- Sobre os pacientes com mais de 65 anos, com que freqüência eles visitam o oftalmologista do posto de saúde: A) não sei B) nunca C) 1 vez por ano D) 1 vez a cada 2 anos E) 1 vez a cada mais de 2 anos 4A) B) C) D) E) Sobre os pacientes acima de 40 anos que são visitados, quantos utilizam óculos: não sei nenhum a minoria a maioria todos 5A) B) C) D) E) Qual é a maior queixa oftalmológica dos pacientes que são visitados por você: ardência ocular sensação de “areia” nos olhos dificuldade de enxergar pra longe dificuldade de enxergar pra perto dor ocular 6A) B) C) D) E) Dos pacientes visitados que usam óculos, de quanto em quanto tempo eles fazem a troca desses? nunca fazem 1 vez por ano a cada 2 anos a cada 5 anos não faço essa pergunta aos pacientes que visito 7- Das crianças com o diagnóstico de estrabismo (“olho torto”) que você visita, quantas fazem o tratamento com tampão e/ou óculos? A) nenhuma Anexos 61 B) C) D) E) todas a minoria a maioria não me lembro de ter visto crianças com esse problema de saúde 8A) B) C) D) E) Qual a porcentagem dos pacientes visitados que apresenta queixas oftalmológicas? quase nenhum aproximadamente 25% aproximadamente 50% aproximadamente 75% quase todos 9-Qual a porcentagem dos pacientes visitados que você acha que são cegos dos dois olhos? A) quase nenhum B) aproximadamente 25% C) aproximadamente 50% D) aproximadamente 75% E) quase todos 10- Qual a porcentagem dos pacientes visitados que você acha que são cegos de um dos dois olhos? A) quase nenhum B) aproximadamente 25% C) aproximadamente 50% D) aproximadamente 75% E) quase todos 11- Qual é o nome da estrutura transparente, que cobre a “parte colorida” e a “parte preta” do olho? A. Esclera; B. Íris; C. Pupila; D. Córnea; E. Conjuntiva. 12- A pupila (orifício negro), quando branca no idoso, pode ser qual destas doenças? A. Glaucoma; B. Hipermetropia; C. Presbiopia; D. Conjuntivite; E. Catarata. 13- O que se estima com o uso da tabela oftalmológica de optotipos (de letras, números, ou símbolos) que a cada linha abaixo, os optotipos ficam menores? A. Acuidade Visual (capacidade de visão); B. Glaucoma; C. Catarata; D. Grau do olho; E. Estrabismo. 14- Qual a principal causa de baixa visão no idoso? A. Tumor; B. Glaucoma; C. Conjuntivite; D. Catarata; E. Miopia. Anexos 62 15- Presbiopia é a dificuldade em ver: A. De perto; B. De Longe; C. De longe e perto; D. De dia; E. De noite. 16- Qual dos sinais ou sintomas abaixo são causados pela Catarata? A. Dor local; B. Cefaléia (Dor de cabeça); C. Baixa visão; D. Olho vermelho; E. Ardência ocular. 17- Qual o nome da “carnosidade” que cresce por cima da parte transparente do olho? A. Catarata; B. Glaucoma; C. Córnea; D. Calázio; E. Pterígeo. 18- Homem, 40 anos com queixa de carne crescida (“carnosidade”) no olho. Qual é a melhor alternativa? A. Orientá-lo a comprar um colírio na farmácia mais próxima; B. Orientá-lo que a “carne crescida” não é problema algum; C. Encaminhá-lo ao médico oftalmologista, pois é necessário exames com aparelhagem especial, para definir conduta. D. Encaminhá-lo ao médico oftalmologista com urgência, para cirurgia imediata; E. Encaminhá-lo ao Núcleo de Saúde da Família, mesmo sabendo que não existe alternativa para tratamento. 19- Miopia, Hipermetropia e Presbiopia, são exemplos de: A. Vícios de Refração; B. Grau da Catarata; C. Pressão alta nos olhos; D. Doenças de retina; E. Doenças das pálpebras. 20- Paciente de 48 anos, que não está conseguindo ler para perto. Qual a melhor alternativa? A. Encaminhá-lo ao médico oftalmologista com urgência, pois na maioria das vezes trata-se de doenças graves que levam a perda permanente da visão; B. Encaminhá-lo ao médico oftalmologista sem urgência, pois provavelmente um exame de óculos (exame de refração) resolverá o problema do paciente; C. Encaminhá-lo ao médico oftalmologista para tratamento cirúrgico o mais rápido possível. D. Orientar o paciente a testar e comprar óculos na ótica mais próxima; E. Testar a visão para longe. Se for boa, não encaminhá-lo. 21- Um paciente teve trauma em olho direito com arame, queixando-se de dor e baixa imediata de visão. O que fazer? A. Encaminhá-lo ao Núcleo de saúde da Família no mesmo dia; B. Encaminhá-lo ao Núcleo de saúde da Família apenas se houver piora da dor; C. Lavar abundantemente o olho com água, e encaminhá-lo ao médico após, com urgência; D. Ocluir o olho, para proteção, e agendar consulta no Núcleo de saúde da Família na próxima vaga; E. Lavar o olho e deixá-lo ocluído por 24 horas Anexos 63 22- Um paciente pedreiro deixa cair massa com cal em seu olho, apresenta dor intensa e baixa visão. O que fazer? A. Encaminhá-lo ao Núcleo de saúde da Família no mesmo dia; B. Encaminhá-lo ao Núcleo de saúde da Família apenas se houver piora da dor; C. Lavar abundantemente o olho com água, e encaminhá-lo ao médico após, com urgência; D. Ocluir o olho, para proteção, e agendar consulta no Núcleo de saúde da Família na próxima vaga; F. Lavar o olho e deixá-lo ocluído por 24 horas 23- Um paciente, 10 anos, apresenta ambos olhos vermelhos e inchados e sensação de areia ao piscar há 2 dias, a irmã mais velha apresentou o mesmo quadro há uma semana. O que fazer? A. Orientar higiene do olho, com soro fisiológico, pois deve ser conjuntivite. E agendar avaliação no Núcleo de saúde da Família para melhor avaliação; B. Orientar higiene do olho, e comprar colírio antibiótico, pois deve ser conjuntivite causada por bactéria; C. Deve ser conjuntivite, por isso é necessário que o médico prescreva o colírio, caso contrário não há como melhorar. D. Com certeza é conjuntivite, pois é a única doença que deixa o olho vermelho. Orientar higiene do olho, e agendar avaliação no Núcleo de saúde da Família. E. Não sei. 24- Mulher com 62 anos, portadora de Glaucoma, em uso de dois tipos diferentes de colírios, apresenta dor intensa em olho direito, dor de cabeça, náusea e reclama da claridade. O que fazer? A. Encaminhá-la ao Núcleo de saúde da Família, na vaga, para que o médico avalie a necessidade da mudança dos colírios; B. Encaminhá-la ao Núcleo de saúde da Família, com urgência, para mudar a receita dos colírios; C. Encaminhá-la ao Núcleo de saúde da Família, com urgência, porém será necessária a avaliação com oftalmologista no mesmo dia; D. Pode ser Glaucoma agudo, que leva a perda irreversível da visão, não havendo nada a fazer; E. Orientá-la a ingerir remédio para dor de cabeça. Caso não haja melhora, agendar consulta no Núcleo de saúde da Família. 25- Qual das doenças abaixo, está relacionada com o aumento da pressão intra-ocular? A. Catarata; B. Hipertensão arterial; C. Conjuntivite; D. Diabetes; E. Glaucoma; 26- Qual a doença sistêmica (do corpo) que mais acomete o olho? A. Diabetes; B. Pressão Alta (Hipertensão Arterial Sistêmica); C. Reumatismo; D. Gastrite; E. Câncer. 27- Por que devemos tratar uma criança com olho torto precocemente? A. Pois na criança o tratamento é mais fácil do que no adulto; B. Pois a criança aceita melhor o tratamento; C. Pois o período de desenvolvimento do olho ocorre até aproximadamente os oito anos de idade; D. Não devemos tratar precocemente, pois é muito mais fácil tratar o adulto com cirurgia; E. Não sei. 28- Qual das idades citadas abaixo seria a melhor para INICIAR o tratamento do olho torto? A. 2 meses; B. 11 meses; Anexos 64 C. 4 anos; D. 15 anos; E. Em qualquer idade. 29- Em sua visita domiciliar, a mãe queixa-se que o recém nascido de 15 dias apresenta secreção e vermelhidão ocular. Qual a melhor conduta? A. Encaminhá-la ao médico, mesmo sabendo que conjuntivite em recém nascidos não provocam problemas mais graves; B. Encaminhá-la ao médico, pois conjuntivite em recém nascidos deve ser bem avaliada, pelos riscos de seqüelas; C. Encaminhá-la ao médico se persistência dos sintomas por mais de uma semana; D. Encaminhá-la ao médico imediatamente, pois esta criança deve estar com glaucoma. E. Não encaminhá-la, pois assim como no adulto, conjuntivite tem melhora espontânea. 30- Qual das doenças abaixo pode causar lesões nos olhos? A. AIDS; B. Apendicite; C. Pneumonia; D. Depressão; E. Gota. Anexos 65 ANEXO 3 MANUAL OFTALMOLÓGICO PARA AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE Anexos 66 ANEXO 4 Fluxograma apresentado no artigo Clinical and Regulatory Protocols for the Management of Impaired Vision in a Brazilian Public Health Care Network, referente aos cenários de atuação dos profissionais da atenção básica de saúde (no prelo).