PRODUÇÃO TEXTUAL NO ENSINO SUPERIOR: UMA EXPERIÊNCIA INTERDISCIPLINAR. Lurdete Cadorin Biava, [email protected], Eliane Salete Bareta Gonçalves, [email protected] - Centro Federal de Educação tecnológica de Santa Catarina (CEFET/SC) Resumo: Este texto tem como propósito discorrer sobre a experiência referente à produção textual nos cursos superiores do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina - Automação Industrial e Design de Produto. Integrando o conjunto do currículo do primeiro semestre dos cursos, e tratada de forma interdisciplinar, a unidade curricular contribui no desenvolvimento do Projeto Integrador, o principal instrumento pedagógico dos cursos, e na apresentação da documentação escrita do mesmo. Discorre-se assim como a unidade curricular contribui, não só na construção efetiva do texto acadêmico/científico, mas também na iniciação científica, visto que o Projeto Integrador como principal instrumento consolida a necessidade da boa escritura a partir do momento em que necessita da sistematização da pesquisa. Essa experiência vem sendo desenvolvida há quatro anos e vem mostrando resultados muito positivos, tais como publicações em eventos. Palavras-chaves: Cursos superiores. Interdisciplinaridade, Produção textual, Projeto integrador. 1 INTRODUÇÃO As transformações que ocorrem na sociedade estão relacionadas com as possibilidades de comunicação, constituídas pelos sistemas mundiais de informação – dada a desenfreada inovação tecnológica –, pelo próprio mundo do trabalho que desencadeia novos conhecimentos, pelo desenvolvimento das ciências e, ainda, pela disseminação dos saberes. O processo de comunicação, tanto na teoria quanto na prática, constitui, assim, a tônica em todas as áreas do conhecimento. Tão importante quanto desenvolver ciência é documentar o processo da atividade científica, pois sem comunicação não há ciência (DIAS, 2007). O ato de documentar e de publicar os processos utilizados em uma pesquisa e os conhecimentos que ela envolve garante a socialização do conhecimento, bem como, importante destacar, respalda a garantia de autoria. Só para lembrar, se Santos Dumont tivesse registrado seu invento, hoje, não seriam os americanos os pais da aviação. Por isso, os iniciantes da produção/pesquisa científica devem ser estimulados a documentar seus trabalhos, inserindo-se na comunicação informal, inicialmente, para, à medida que a experiência cresce, aumentar também a divulgação e a credibilidade de sua produção, passando a compor o grupo que utiliza a comunicação formal (MEADOWS, 1974, apud DIAS, 2007). E para utilizar esse recurso, constitui fator relevante ter certo domínio da linguagem verbal. Para isso é importante que essa iniciação já aconteça com métodos e processos reconhecidos no meio científico, a fim de desenvolver o hábito da qualidade, da credibilidade e da originalidade do conhecimento produzido. Segundo Santos (2004), todavia, geralmente não se percebe que desenvolver ciência demanda, além da habilidade de produzir conhecimentos, a habilidade de apresentá-los por escrito. Isso requer uma ação teórica e uma ação prática, ambas indissociáveis no indivíduo, segundo o mesmo autor. A pesquisa científica, para Pinto (apud Santos, 2004, p. 18), não constitui uma atividade acidental de procedimento humano, mas uma forma de ação, que lhe é natural, porque realiza uma exigência de sua essência, a de se aperfeiçoar, a de progredir no desenvolvimento de sua humanização, jungindo as forças cegas da natureza aos seus desígnios conscientes. E, para Garvey (apud DIAS, 2007), a comunicação inicia-se muito antes da publicação de um artigo, ela tem início ainda no momento da concepção de uma idéia a ser desenvolvida até que os resultados sejam divulgados e se estabeleçam como conhecimento científico produzido. Todavia, isso não se concretiza se não houver uma motivação, cujo início pode estar nos desafios propostos aos iniciantes nesse processo. Partindo desses princípios, os Cursos Superiores de Tecnologia em Automação Industrial e em Design de Produto, do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina (CEFET/SC), unidade Florianópolis, inseriram em suas matrizes curriculares o Projeto Integrador, que visa à integração das unidades curriculares dos módulos por meio de um projeto de pesquisa e que constitui o principal instrumento pedagógico dos Cursos, no qual os estudantes, a partir de um tema estabelecido, sistematizam a pesquisa, desenvolvem experiências, congregando conhecimentos trabalhados nos módulos, e documentam processos e resultados, os quais são apresentados em defesa pública no final do semestre e divulgados em eventos dos cursos. Ao utilizar como ponto de partida o Projeto Integrador, estimula-se e desenvolve-se toda a produção textual do primeiro semestre dos referidos cursos. Este artigo propõe-se, assim, a apresentar a prática de produção dos textos técnico/científicos utilizada nos referidos Cursos. Além de uma breve abordagem sobre alguns pressupostos teóricos, serão apresentadas as dinâmicas de trabalho adotadas no primeiro módulo dos Cursos – semestre em que é trabalhada a unidade curricular referente à produção textual - e os resultados obtidos com elas. 2 AS EXIGÊNCIAS DOS NOVOS AMBIENTES DE APRENDIZAGEM As tecnologias de informação e de comunicação e os novos ambientes do conhecimento desencadeados por elas exigiram um novo mecanismo para lidar com a educação. A autonomia intelectual, em detrimento do conhecimento instrumental, define o novo modo de pensar e trabalhar a educação. Enfocar a construção do conhecimento, com ênfase na participação do aluno e na sua ação no processo, pensa-se ser a melhor forma de conduzir o estudante ao desenvolvimento intelectual. Não é possível pensar a educação fragmentada, ao contrário, é preciso considerar que as pessoas constroem esquemas de conhecimento cujos elementos inter-relacionam-se e, conseqüentemente, geram novos saberes (BIAVA, MARTINS E SIELSKI, 2006). Nesse sentido, vale considerar o que coloca Morin (1991, apud CRUZ, 2001, p. 17) sobre a complexidade do mundo de hoje, que exige uma matriz epistemológica complexa e pluridimensional e um currículo em movimento que, por certo, deve estimular o indivíduo a encontrar e a estabelecer conexões na informação, em busca da autonomia. A escola deve comprometer-se no acompanhamento desse processo, garantindo um ambiente pedagógico centrado nos questionamentos e no acesso às informações, possibilitando abertura para as imprevisões, não mais centrar-se em saberes pré-determinados e certos, visto que “professores aprendem ao mesmo tempo que os estudantes e atualizam continuamente tanto saberes ‘disciplinares’ quanto suas competências pedagógicas” (Lévy, 2000). A educação deixou, então, de ser unidirecional, dando ênfase à argumentação, à discussão e ao debate, em um ambiente em que os problemas propostos são complexos e contextualizados; a informação passou a ser bidirecional, colaborativa e interdisciplinar (BIAVA, 2001). Em se tratando de ensino superior, considerar esse novo contexto significa relevar a principal característica desse nível, a formação profissional. Se forem dadas ao acadêmico condições favoráveis a sua ação e se lhe forem oportunizados desafios, ele será despertado para a curiosidade, para a descoberta, para a busca e, conseqüentemente, para a autonomia e para a aprendizagem permanente, o que o transformará em cidadão agente, atuante e modificador. Nesse processo, a prática de desenvolvimento de projetos que integram todas as unidades curriculares muito contribui. Com a democratização do conhecimento, vale acrescentar, a linguagem escrita, com clareza, precisão, objetividade, tornou-se ferramenta essencial para sua propagação, e dominá-la deve constituir uma das virtudes de um pesquisador. Sem linguagem não há ciência, porquanto, citando a metáfora de Rubem Alves (2004, p.101), “as palavras são os olhos da ciência”. Visto que esta nasceu, segundo o mesmo autor, da desconfiança dos sentidos e, por isso, só pode ser vista com o auxílio das palavras, ela pode ser descrita como um strip-tease da realidade por meio de palavras, ao final do qual as pessoas vêem uma linguagem (que pode ser vista com os olhos da razão, segundo os filósofos gregos); uma linguagem com cujas palavras o cientista brinca; todavia, não com qualquer palavra (ALVES, 2004). No nível superior, convém ponderar, segundo Santos (2004), pede-se a construção da ciência, compreendida por “um conteúdo básico, instrumental, cuja validade pode ser facilmente superada pela velocidade da geração de novas informações, e um hábito: [...] o de pensar por conta própria, de buscar conteúdos novos, de investigar, de pesquisar” (SANTOS, 2004, p. 17) e de realizar a articulação desses conhecimentos. Para fortalecer ou iniciar esse hábito no acadêmico há que estimulá-lo à produção da ciência; todavia, essa prática só se consolida a partir do momento em que haja um motivo para tal, neste caso, o Projeto Integrador o é, visto que é tratado como uma prática interdisciplinar. 2.1 A interdisciplinaridade A prática escolar não satisfaz as necessidades e as demandas da sociedade, nem acompanha a velocidade das mudanças sociais, direcionando o foco para os projetos das pessoas e não mais para os conteúdos. Vale considerar o que expressa Cruz (2001, p. 16): A insatisfação com a excessiva fragmentação a que o trabalho disciplinar tem conduzido é responsável pelo aparente consenso em torno da necessidade da interdisciplinaridade, vista como incremento das relações entre as disciplinas. Cresce a consciência da organização do trabalho escolar em torno de objetivos que transcendam os limites e os objetos das diferentes disciplinas e isso tem contribuído para situar a idéia da transdisciplinaridade no centro das atenções [...]. A interdisciplinaridade dos saberes tem, então, o poder de conduzir o indivíduo ao verdadeiro conhecimento. Nesse sentido, é impensável, como colocam Jantsch e Bianchetti (1995), que uma instituição faça da transmissão do conhecimento sua função principal ou reduza o ensino à simples transmissão de conhecimento, numa época de tantas e tão rápidas transformações. Segundo esses autores, a fragmentação do conhecimento leva o homem a não ter domínio sobre o próprio conhecimento produzido, o que compromete a produção do mesmo. Impende observar também o princípio da complexidade descrito por Morin (2001) que, ao contrariar o conhecimento tradicional, privilegia uma nova postura no tratamento dado à construção dos saberes. No lugar de conhecer a realidade a partir de sua fragmentação, é mais fácil compreendê-la a partir da correlação dos conhecimentos dos fenômenos de forma integrada. Para Trindade (apud Belloni, 2001, p. 22), o indivíduo, para sobreviver na sociedade e integrar-se ao mercado de trabalho do século XXI, precisa desenvolver uma série de capacidades novas, desde autogestão, resolução de problemas, adaptabilidade e flexibilidade diante de diferentes tarefas, auto-aprendizagem, até assumir responsabilidades e trabalhar em grupo de modo cooperativo e pouco hierarquizado. É no contexto dessas considerações que os Cursos Superiores de Tecnologia em Automação Industrial e em Design de Produto do CEFET/SC adotam como prática pedagógica o desenvolvimento de projetos integradores que contemplam o desenvolvimento do raciocínio complexo, a partir das relações que precisam ser estabelecidas entre os conhecimentos de todas as unidades curriculares de cada semestre do Curso. Num trabalho em que a aplicação dos conhecimentos sobrepõese aos conteúdos propriamente ditos, é possível observar as atitudes e acompanhar o desenvolvimento das habilidades necessárias à construção das competências exigidas num profissional da área (BIAVA, MARTINS E SIELSKI, 2006). 3 A MATRIZ CURRICULAR DOS CURSOS DE TECNOLOGIA EM AUTOMAÇÃO INDUSTRIAL E EM DESIGN DE PRODUTO Os cursos em questão, com duração de sete a oito semestres, estruturados numa matriz curricular cuja concepção foi balizada na integração de conhecimentos e ações, privilegia um pequeno número de unidades curriculares no semestre, o que possibilita um trabalho interdisciplinar. Contemplam a unidade referente à produção textual para dar conta da verbalização necessária não só à inserção do acadêmico no mundo do trabalho, mas também à democratização do conhecimento. A saber, a comunicação se manifesta pela linguagem, e as diferentes formas de expressão constituem o desenvolvimento da atividade consciente, dadas as complexas operações exigidas na busca das informações recebidas, na análise, na síntese das mesmas e na organização da sua divulgação. No caso da expressão escrita, caracterizada pela seleção das unidades lingüísticas – as palavras – e pela organização das mesmas na formação do enunciado – a organização estrutural e lógica –, a estrutura consciente do pensamento garante a construção dos saberes. Em se tratando do texto técnico/científico, esse sistema lógico da linguagem permite ao acadêmico extrapolar os limites do sensorial, à medida que os fenômenos são racionalmente explicitados. A unidade curricular referente à produção textual, assim, em ambos os cursos, compromete-se com as formas oral e escrita de disseminação dos conhecimentos e saberes construídos ao longo dos semestres. E é apoiando-se no instrumento pedagógico mais importante do curso que viabiliza a aplicação das técnicas de comunicação. 3.1 O Projeto Integrador Como toda ação educativa é concebida a partir de um pressuposto pedagógico – quer seja intuitivamente, ou não, fundamentado em teorias validadas – que define o papel do professor, do aluno, do conhecimento e da tecnologia, os Cursos Superiores de Tecnologia em Automação Industrial e em Design de Produto do CEFET/SC propõem o Projeto Integrador – concebido como instrumento pedagógico – em todos os módulos (semestres) do curso. Trata-se de projetos desenvolvidos em equipe, resultantes da integração de todos os estudos correspondentes às unidades curriculares do módulo em curso e dos estudos anteriores, cuja abordagem concentra-se na construção dos conhecimentos e no exercício para o desenvolvimento de habilidades e atitudes necessárias para tornarem-se evidentes as competências avaliadas em cada módulo. O Projeto Integrador proposto nos referidos Cursos tem como foco “integrar” conhecimentos e habilidades construídos pelos acadêmicos ao longo de cada fase do Curso, dar significado ao processo de aprendizagem e, também, aproximar o mundo acadêmico do mundo do trabalho, além de incentivar a iniciação científica (BIAVA, MARTINS E SIELSKI). Implica todos esses fatores, por meio dos desafios – momentos de análise, reflexão, avaliação, comparação, criação, graus de exigência, capacidade de expressão, oral e escrita, espírito de equipe, busca de soluções, compreensão de fenômenos, entre outros – que são apresentados aos acadêmicos do Curso. E é nos textos desenvolvidos para o Projeto Integrador que se encontra o estímulo para o desenvolvimento dessa habilidade, dado o grau de exigência, a dimensão do projeto e, principalmente, a relação com o contexto do próprio acadêmico e a possibilidade de ele produzir o seu próprio discurso, deixando de ser a produção escrita um simples exercício prático sem significação, uma mera exigência do professor. Enquanto as outras unidades curriculares “cuidam” do conteúdo referente à área específica, a unidade referente à produção textual orienta a expressão escrita – na realização da pesquisa exploratória, dos fichamentos, na elaboração do anteprojeto, do projeto, do relatório, do artigo – e a expressão oral – na apresentação do andamento do projeto e na defesa final do mesmo –, as quais envolvem as diferentes etapas do processo. É nesse “caminhar juntos”, no dizer de Marcondes Filho (apud VILALBA, 2006), que a habilidade de produção textual desenvolve-se. Sendo assim, durante todo o Curso, do acadêmico é exigido um processo que lhe permite, não só lidar com o conhecimento técnico ou metodológico, mas também ampliar a criatividade, ter visão e imaginação, fazer conexões entre idéias e conceitos e valorizar a iniciação científica. Para dar conta disso, cumpre observar, não são suficientes os conhecimentos e o exercício para o desenvolvimento de habilidades e atitudes necessárias à construção das competências, faz-se necessário também o compromisso dos acadêmicos com as atividades extraclasse de pesquisa, de aplicação de metodologia e de experimentação dos saberes. Os Cursos propõem, dessa forma, práticas que ajudam a construir coletivamente o fazer de sala de aula. Isso aproxima o mundo acadêmico do mundo do trabalho e dá significado ao processo de aprendizagem, além de integrar os conhecimentos e as habilidades construídas pelos estudantes ao longo de cada semestre e de incentivar a iniciação científica. Vale destacar aqui o que cita Paulo Freire (2000, p. 24), que o formando deve, desde o princípio mesmo de sua experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da produção do saber, convencer-se definitivamente de que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção. Acrescenta-se ainda que, quando o estudante escreve, ele pensa; assim, desenvolver um projeto e sistematizar os conhecimentos gerados pelo processo contribui para o desenvolvimento das capacidades intelectuais. O projeto, no primeiro módulo, convém lembrar, fundamenta-se na pesquisa científica, a qual subsidia o estudo e, conseqüentemente, dá suporte metodológico para o prosseguimento nessa iniciação em todos os módulos posteriores. 4 A PRÁTICA DE PRODUÇÃO TEXTUAL A prática nos referidos cursos parte de uma teoria consolidada sobre a documentação acadêmico/científica, que conduz os estudantes na iniciação à pesquisa e orienta-os quanto à importância da busca por subsídios que dêem credibilidade ao estudo e que possibilitem o acesso a novas idéias e propostas, ressaltando, também, a postura ética diante das referências de autoridade. Os acadêmicos iniciam, então, o processo com uma pesquisa exploratória sobre o tema e, posteriormente, seguem com a seleção e a análise do que de fato interessa ao estudo. Na seqüência do processo, elaboram o pré-projeto, momento em que definem o problema, os objetivos, a metodologia da pesquisa, os materiais, explicitam as necessidades e elaboram o cronograma das atividades do projeto e, em etapa final, socializam o estudo, com a documentação dos resultados (em artigo ou relatório técnico/científico) e com a defesa pública do projeto. A documentação, na vida acadêmica, conforme cita Jacobini (2003, p.16), não só deve estar presente desde o início do processo de estudo, como também pode aparecer quando: a) fixado um tema, é necessário obter informações e conhecimento sobre o mesmo a fim de ter domínio sobre ele para, assim, poder reconhecer os problemas apresentados por outros estudiosos e estabelecer visão própria sobre ele; b) estabelecido um projeto de pesquisa, buscam-se mais informações e conhecimentos para suprir as necessidades de cada etapa do projeto. Assim, a partir da definição do tema, inicia-se a produção textual que parte de uma orientação quanto à pesquisa, cuja prática compreende a elaboração de fichamentos com resumos, comentários, idéias para o devido projeto e transcrições que possam validar o estudo. Para dar conta dessa primeira etapa, os acadêmicos recebem toda a orientação sobre os princípios do trabalho acadêmico/científico e sobre a elaboração de resumos, fichamentos, resenhas científicas, descrição de processo e de produto/objeto. A partir da orientação teórica sobre a estrutura de cada uma das formas textuais, o acadêmico realiza a prática nas produções solicitadas pelos professores na própria unidade curricular - que, na maioria das vezes, referem-se às atividades realizadas nas outras unidades - e, posteriormente, na documentação do Projeto Integrador. Numa segunda etapa, os acadêmicos são orientados para a elaboração do relatório e do artigo. Nesta etapa, o texto acadêmico/científico já não lhe é mais desconhecido, contudo, ainda, não se percebe o domínio da sua estruturação. Esse processo, tanto na primeira etapa, quanto na segunda, compreende, além da escritura do texto, a sua “reescritura". E é nessa prática que todas as questões estruturais da língua são trabalhadas, como coesão, coerência, clareza, objetividade, concordância, estrutura frasal, regência, tempos verbais – questão esta importante na produção científica, dada a complexidade da utilização dos tempos verbais com que se depara o aluno na elaboração desse tipo de texto, ao descrever o planejamento do projeto, o processo, o produto ou o objeto, e ao apresentar argumentos de autoridade. Essa prática, vale considerar, garante ao aluno a aplicação real dos conhecimentos, o que lhe confere a significação da aprendizagem. Contudo, se a teoria não é aplicada em práticas anteriores à produção do artigo ou relatório, por exemplo, evidencia-se falha no documento. Constatou-se isso com a descrição de processo e de produto. Vale lembrar que, para reescrever os textos, o acadêmico depara-se com a avaliação realizada pelo professor na primeira versão, na qual lhe são apontados os problemas de redação e as possíveis soluções para esses problemas, as falhas referentes aos princípios do trabalho acadêmico, bem como as sugestões para melhorar a abordagem temática do estudo. O processo passa, dessa forma, por etapas previstas pelos professores, e a proposta de reescrever os textos – que às vezes se repete – é bem recebida pelos acadêmicos, a ponto de os próprios solicitarem-na quando, por questões casuais, a mesma não acontece. A unidade curricular referente à produção textual constitui, dessa forma, papel muito importante no projeto porque provoca o desencadeamento e a sistematização de todo o processo. Enquanto orienta a expressão escrita e a expressão oral que envolve o projeto, impulsiona a aprendizagem tanto individual quanto coletiva, porque é na organização lógica e sistemática do estudo, com a construção dos textos, que o acadêmico pensa melhor o processo e entende por que o faz. Outra unidade, supõe-se, não daria conta dessa orientação, visto que deve focar outros conteúdos. Os resultados dessas pesquisas são demonstrados, assim, na documentação gerada durante e após o processo, na forma de portfólios, modelos, relatórios, artigos, defesa do projeto, os quais expressam a correlação estabelecida entre as unidades curriculares. E é somente quando todas as unidades curriculares, de alguma forma, fazem-se presente no Projeto Integrador que o resultado atinge as expectativas daquele módulo (semestre). Tal correlação evidencia-se, dessa forma, não só na sistematização dos conhecimentos, com a construção dos textos, ao serem estabelecidas relações lógicas entre teoria, metodologia e resultado do processo, como também na exposição da evolução da pesquisa durante o processo – quando professores e acadêmicos discutem, avaliam e direcionam as etapas –, na defesa final dos projetos e nos eventos dos cursos. Acrescenta-se ainda que, além da orientação sobre a produção escrita, os acadêmicos dos Cursos Superiores de Tecnologia em Automação Industrial e em Design de Produto são orientados sobre a comunicação oral, de forma que detêm o suporte necessário não só para a defesa pública do projeto Integrador de todos os semestres do Curso, como também para a atuação profissional. Esse fazer pedagógico tem demonstrado resultados positivos em relação à iniciação à pesquisa. São exemplos os artigos publicados em Congressos e revista e as premiações em concursos, congressos e eventos tecnológicas. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Evidencia-se, na sistematização dos conhecimentos, uma evolução em relação à produção textual, tanto no que se refere à articulação dos elementos estruturais quanto à articulação dos elementos temáticos, visto que, ao serem estabelecidas relações entre os estudos teóricos e práticos, os acadêmicos necessitam da organização lógica do pensamento, além da técnica. O que se tem constatado é que essa prática não só contribui para o desenvolvimento da expressão verbal necessária à vida acadêmica e profissional, como também para o crescimento intelectual, em virtude da conscientização referente aos conhecimentos construídos. A propósito, vale ressaltar o que descreve Vilalba (2006, p.63): A despeito da importância da informação técnica e da capacidade de perceber e analisar planos mais complexos e distantes, o conhecimento pode proporcionar a formação de uma consciência sobre as possibilidades de interferência do sujeito no mundo. Essa interferência começa a existir exatamente no plano das coisas mais ‘simples’, irredutíveis. Ao atingirem as competências referentes ao Projeto Integrador, os estudantes demonstram que conhecimentos, habilidades e atitudes inerentes ao contexto da unidade curricular em questão foram desenvolvidos e que, conseqüentemente, atingiram as competências necessárias a sua atuação naquele módulo e na vida profissional. A saber, nos demais semestres dos cursos a abordagem específica de tais conhecimentos não será mais focada, passará a contemplar a transversalidade dos conhecimentos, dadas as necessidades da documentação do Projeto Integrador de cada módulo (semestre) subseqüente e do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), no caso do Curso de Design de Produto. Reconhece-se a contribuição das práticas de produção textual nos trabalhos acadêmicos nos semestres posteriores e no final do curso, nos trabalhos de conclusão, dada a boa expressão verbal dos graduandos. Não se pode olvidar, outrossim, que a contribuição da unidade curricular nos referidos cursos é reconhecida não só pela equipe docente, mas também pela discente, cuja satisfação evidencia-se nas avaliações escritas, realizadas a cada bimestre, sobre a estrutura dos cursos, o desempenho dos professores, a metodologia adotada, entre outros. O próprio acadêmico, quando se depara com outros cursos da mesma área que não oferecem essa abordagem, reconhece a validade de tal prática para a sua atuação como acadêmico e como futuro profissional. Verifica-se todavia que, se o processo não favorecer práticas imediatas da teoria referente à técnica das diferentes formas textuais, o resultado reflete a insuficiência do trabalho. Acrescenta-se, para finalizar este texto, que o trabalho coletivo, colaborativo, e as dinâmicas que desencadeiam a integração das unidades curriculares e essa interação entre acadêmicos, entre professores e acadêmicos, propondo ferramentas e métodos que possibilitam pesquisar e organizar dados e informações, transmitir e criar conhecimentos, levando o acadêmico a encontrar novos caminhos e novas soluções, têm sido a base para a produção textual no ensino superior de tecnologia dos cursos anteriormente descritos. REFERÊNCIAS ALVES, Rubem. Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação. 12. ed. 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