O ESTUDO DA SOCIOLOGIA Por que estudar a sociedade em que vivemos? Não basta vivê-la? É possível conhecer a sociedade cientificamente? A Sociologia serve para quê? Essas são perguntas que muitos fazem quando encontram essa disciplina na grade curricular. E as perguntas não param aí. Vamos procurar respondê-las no decorrer de nossos estudos. O que se pode dizer, inicialmente, é que a Sociologia, assim como as demais ciências humanas (História, Ciência Política, Economia, Antropologia, etc.), tem como objetivo compreender e explicar as permanências e as transformações que ocorrem nas sociedades humanas e até indicar algumas pistas sobre os rumos das mudanças. Através dos tempos, os seres humanos buscam suprir suas necessidades básicas mediante a produção não só de alimentos, abrigo e vestuário, mas também de normas, valores, costumes, propriedades, desigualdades, conflitos, arte e explicações sobre a vida e sobre o mundo. Viver em sociedade é participar dessa produção. Ao fazê-lo, acabamos produzindo a história das pessoas, dos grupos e das classes sociais. Por isso, a Sociologia tem uma estreita relação com a História. Basta dizer que precisamos de ambas para explicar a existência da própria Sociologia. Mas qual é o campo de estudo específico da Sociologia? Para entender os elementos essenciais da sociedade em que vivemos, os sociólogos procuram dar respostas a questões como estas: . Por que as pessoas agem e pensam desta forma e não de outra? . Por que nos relacionamos uns com os outros de determinada maneira, normalmente padronizada? . Por que existe tanta desigualdade e desemprego em nosso cotidiano? . Por que existem a política e as relações de poder na sociedade? . Quais são nossos direitos e o que significa cidadania? . Por que existem movimentos sociais com interesses tão diversos? Esses movimentos são revolucionários ou apenas reformadores? . O que é cultura? Qual a relação entre cultura e ideologia? Como elas estão presentes nos meios de comunicação de massa? A Sociologia nos ajuda a entender melhor essas e outras questões que envolvem nosso cotidiano, sejam elas de caráter pessoal, grupal, ou, ainda, relativas à sociedade à qual pertencemos ou a todas as sociedades. Mas o fundamental da Sociologia é nos fornecer conceitos e outras ferramentas para analisar as questões sociais e individuais de um modo mais sistemático e consistente, indo além do senso comum. Para Pierre Bourdieu, sociólogo francês contemporâneo, a Sociologia, quando se coloca numa posição crítica, incomoda muito, porque, como outras ciências humanas, revela aspectos da sociedade que certos indivíduos ou grupos se empenham em ocultar, Se esses indivíduos e grupos procuram impedir que determinados atos e fenômenos sejam conhecidos do público, de alguma forma o esclarecimento de tais fatos pode perturbar seus interesses ou mesmo concepções, explicações e convicções. Ora, uma das preocupações da Sociologia é justamente formar indivíduos autônomos, que se transformem em pensadores independentes, capazes de analisar o noticiário, as novelas da televisão, os programas do dia-a-dia e as entrevistas das autoridades, percebendo o que se oculta nos discursos e formando o próprio pensamento e julgamento sobre os fatos, ou, ainda mais importante, que tenham a capacidade de fazer as próprias perguntas para alcançar um conhecimento mais preciso da sociedade à qual pertencem. Como bem lembrou o sociólogo estadunidense Charles Wright Mills, a Sociologia contribui também para desenvolver nossa imaginação sociológica, isto é, a capacidade de analisar nossas vivências cotidianas e estabelecer as relações entre elas e as situações mais amplas que nos condicionam e nos limitam, mas que também explicam o que acontece com nossa vida. Parafraseando Alfred N. Whitehead, podemos dizer que a Sociologia tem por objetivo fazer com que as pessoas possam ver e analisar o bosque e as árvores ao mesmo tempo. A produção social do conhecimento Todo conhecimento se desenvolve socialmente. Se quisermos conhecer e compreender como pensavam as pessoas de determinada época, precisamos saber em que meio social elas viveram, pois o pensamento de um período da história é criado pelos indivíduos em grupos ou classes, reagindo e respondendo a situações históricas de seu tempo. Se quisermos saber por que os indivíduos, grupos e classes pensam de determinada forma, por que explicam a sociedade deste ou daquele ponto de vista, precisaremos entender como os membros dessas sociedades se organizaram e se organizam para suprir suas necessidades, relacionar-se e discutir as questões que envolvem as relações sociais, as normas, os valores, os costumes, as tradições e a religiosidade. Ou seja, deveremos entender como são criadas as instituições sociais, políticas e econômicas que permitem certa estabilidade social. Na maioria das sociedades, há indivíduos e grupos que defendem a manutenção da situação existente, o status quo, porque este atende a seus interesses. Assim, procuram apoiar e desenvolver formas de explicação da realidade que justifiquem a necessidade de conservar a sociedade tal como está. Há pessoas, entretanto, que querem mudar a situação existente, pois não pensam que a sociedade à qual pertencem seja boa para elas e para os outros. Tais pessoas procuram explicar a realidade social destacando os problemas dela e as possibilidades de mudança para uma forma de organização que assegure mais igualdade entre os indivíduos. Aqueles que querem manter a situação existente normalmente são os que detêm o poder na sociedade; aqueles que lutam para mudá-la são os que estão em situação subalterna. Além do conflito no campo político e econômico, há um conflito de idéias entre os diferentes grupos sociais. Mas as idéias e formas de conhecimento nunca são radicalmente opostas; elas coincidem em alguns pontos e em outros não, e é isso que mantém aberta a possibilidade de diálogo. A Sociologia é uma dessas formas de conhecimento, resultado das condições sociais, econômicas e políticas do tempo em que se desenvolveu. Ela nasceu em resposta à necessidade de explicar e entender as transformações que começaram a ocorrer no mundo ocidental entre o final do século XVIII e o início do século XIX, decorrentes da emergência e do desenvolvimento da sociedade capitalista. Naquela época, a produção de alimentos e de objetos artesanais, que se concentrava no campo, passou a se deslocar para as cidades, onde começavam a se desenvolver as indústrias. Essa mudança desencadeou importantes transformações no modo de vida dos diferentes grupos sociais, afetando as relações familiares e de trabalho, estruturando as normas e valores em novas bases, menos religiosas, e estimulando o desenvolvimento de novas idéias. Grandes transformações políticas também ocorreram, no contexto do que se chama de Revolução Industrial, impulsionadas por movimentos como o da Independência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa. Procurando entender essas transformações e mostrar caminhos para a resolução dos problemas por elas gerados, muitos pensadores escreveram e divulgaram suas teorias sobre a sociedade anterior e sobre a constituição da nova sociedade, que estava vivendo tantas incertezas. Criaram-se assim as bases sobre as quais a Sociologia viria a se desenvolver como uma ciência específica. Entre o final do século XIX e início do século XX, os estudiosos que mais iriam influenciar o posterior desenvolvimento da Sociologia concentravam-se fundamentalmente em três países: França, Alemanha e Estados Unidos. Na França, vários autores desenvolveram trabalhos sociológicos importantes; entre eles, Frédéric Le Play (1806-1882), René Worms (1869-1926) e Gabriel Tarde (1843-1904). O mais expressivo deles, porém, foi Émile Durkheim (1858-1917), que procurou sistematicamente definir o caráter científico da Sociologia, inaugurando uma corrente que por muito tempo seria hegemônica entre os sociólogos franceses. Na Alemanha, destacaram-se os estudos sociológicos de George Simmel (1858-1918), Ferdinand Tõnnies (18551936), Werner Sombart (1863-1941), Alfred Weber (1868-1958) e Max Weber (1864-1920), este último o mais conhecido deles, pela extensão e influência de sua obra. Nos Estados Unidos da América, a Sociologia desenvolveu-se desde o final do século XIX e início do XX nas universidades de Chicago, de Colúmbia e de Harvard, principalmente. Muitos foram os sociólogos que se destacaram; entre eles, Robert E. Park (1864-1944) e George H. Mead (1863-1932). No decorrer do século XX, a Sociologia tornou-se uma disciplina mundialmente reconhecida. Os sociólogos estão presentes não só nas universidades, mas também nos meios de comunicação, discutindo questões específicas ou gerais que envolvem a vida em sociedade. Os mais destacados, independentemente do país de origem, dão cursos e conferências em centros universitários de todos os continentes e têm seus livros traduzidos em muitos idiomas. No Brasil, a Sociologia tem alcançado uma visibilidade muito grande, seja por causa da presença em todo o território nacional de institutos de pesquisa social ou cursos de graduação e de pós-graduação, seja pela atuação de sociólogos em muitos órgãos públicos e privados ou nos meios de comunicação de massa. Assim, a Sociologia e os sociólogos estão presentes no cotidiano do país.