1 Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014 www.labem.uff.br

Propaganda
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
O desenvolvimento do raciocínio estatístico nos alunos do ensino médio verificado nas
avaliações em larga escala 1
Luciana de Castro Lugli2
FMU e EE Godofredo Furtado
Celi Espasandin Lopes3
Universidade Cruzeiro do Sul
Resumo: Este artigo foi gerado após a realização de uma pesquisa de mestrado desenvolvida onde
o foco foi a analise de questões propostas nas provas Saresp e Enem no período de 2007 a 2009
considerando como critérios para análise as recomendações presentes na produção científica em
Educação Estatística a qual deve ser desenvolvida nas aulas de Matemática na Educação Básica.
Nossa preocupação é voltada para a Educação Estatística, que se diferencia da Educação
Matemática, pela forma como deve ser conduzida pelos professores, devemos nos preocupar com
esta diferença, por causa da metodologia que deve ser utilizada em cada caso. Nesta comunicação
também nos preocupamos com as avaliações externas que vem ocorrendo no país, principalmente
para o Ensino Médio. Para essa comunicação selecionamos apenas duas questões para análise, que
focalizam conceitos da probabilidade; mostrando também a linha de análise realizada na pesquisa
de mestrado. Os resultados evidenciam que a formação dos estudantes apresenta lacunas no
desenvolvimento do raciocínio probabilístico.
Palavras-chave: Probabilidade; Estatística; Educação; Avaliação Externa.
Introdução
O objetivo deste artigo é promover uma discussão sobre o desenvolvimento do Raciocínio
Estatístico nos estudantes do Ensino Médio. Trata-se de um ensaio teórico constituido em
exposição lógica e reflexiva (Severino, 2007) sobre questões relativas à educação estatística as quais
tem subsidiado uma pesquisa de mestrado que busca analisar avaliações externas, em particular,
provas do Enem e Saresp, que foram aplicadas nos anos de 2007 a 2009.
Hoje o acesso rápido à informação é um fato indiscutível. Ao mesmo tempo em que o
avanço da tecnologia nos beneficia com a facilidade ao acesso às informações, também delega à
educação a responsabilidade de preparar as pessoas para lidar com situações diversificadas que se
apresentam a cada dia.
Tal realidade traz à Educação Matemática novos desafios. Já não basta o domínio dos
números e das operações, é preciso realizar estimativas rápidas sobre valores e percentuais
presentes diariamente nas informações. Amplia-se a necessidade de desenvolver capacidades cada
Este artigo é uma adaptação do texto apresentado para a UFSCAR da apresentação no II ENREDE – II
Encontro da rede de professores, pesquisadores e licenciados de Física e de Matemática
2 Mestre no Ensino de Ciências e Matemática – professora da FMU e EE Godofredo Furtado – email:
[email protected]
3 Doutora em Educação pela FE/UNICAMP – Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Ensino
de Ciências e Matemática da Universidade Cruzeiro do Sul – email: [email protected].
1
1
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
vez mais diversas e especificas para desempenhar determinar funções, seja na vida pessoal ou
profissional.
A quantidade expressiva de informação encaminha para a necessidade de desenvolver
habilidades frente à problematização sobre temáticas que precisam ser analisadas. Neste sentido
adquire destaque a Estatística enquanto uma ciência de análise de dados. Assim, o currículo de
matemática agrega o desenvolvimento da Educação Estatística desde os anos iniciais de
escolaridade.
Ganha destaque o processo de coleta, organização, representação e interpretação de dados
nas aulas de matemática de todos os níveis e modalidades de ensino. As análises estatísticas se
fazem cada vez mais necessárias para a leitura ampla e crítica da realidade que as pessoas vivem e
que precisam modificar. O desenvolvimento das capacidades de raciocínio, da resolução de
problemas, e do espírito crítico e criativo, bem como da análise e valorização das informações
provenientes de diferentes fontes faz-se crucial na formação dos estudantes (LOPES, 2008, p. 58).
Estes pontos mencionados acima devem ser trabalhados com nossos estudantes, para que
eles possam tomar decisões em suas vidas e principalmente beneficiarem-se dessa formação em
suas ações. O aluno é parte integrante de uma sociedade, em que constantemente somos
solicitados a decidir um caminho em nossas vidas, em todas as áreas do conhecimento. Com a
facilidade de acesso, seleção e processamento de informações, nossos alunos passam a descobrir
novas fronteiras do conhecimento.
Em meados dos anos 1980 e primeira metade dos anos 1990, iniciou-se um processo de
revisão das funções tradicionalmente duais da Educação Secundária, que se buscava um perfil
mais condizente com as características da produção pós industrial. A reforma baseou-se e inspirouse principalmente por causa das mudanças econômicas e tecnológicas (BRASIL, 1999, p. 71).
Com a integração econômica, social, cultural e políticas, das nações pelo mundo, bem como a
facilidade e o desenvolvimento da comunicação pelo mundo não podemos então deixar de pensar
que o legado da Educação, não irá atender a estas mudanças, e que ela (a educação) seja um dos
polos transformadores de nossos estudantes e futuros cidadãos. Assim, a Educação Matemática e
Estatística se fazem necessárias e devem estar voltadas para o desenvolvimento das diferentes
formas de raciocínio que são presentes nessas áreas. A resolução de problemas deverá ser uma
metodologia que promoverá a transformação nas formas de pensar, criar e construção
coletivamente o conhecimento.
O ensino da estatística e a da probabilidade vem sendo muito estimulado, principalmente
por causa de suas aplicações no mundo atual. Mas se faz em um paradigma marcado pelo
abandono da memorização de fórmulas e algoritmos, no qual se focar nas conexões entre educação
estatística e a leitura de múlitplos contextos. Nosso objetivo é que os estudantes passem a ser
críticos em relação às informações disponíveis na sociedade, e que consigam entender e se
comunicar com base nas informações apresentadas (Carvalho apud Shaughenessy, 2003).
O pensamento crítico na educação matemática é analisado nas ideias de Ole Skovsmose
(2001). Ele protagonizou o movimento chamado Educação Matemática Crítica. Neste movimento
tem como centro das idéias, a questão da democracia. Ele critica as tendências existentes na década
de 1980, de domesticação dos estudantes; e argumenta que é essencial que a educação matemática
busque caminhos que a desviem da norma predominante de domesticação e propõe uma
2
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
alternativa baseada nos moldes desenvolvidos nas universidades de Roskilde e Aalborg, onde lá a
principal atividade do estudante não é frequentar aulas, mas sim gerar e desenvolver projetos com
base em interações com professores e com delimitações preestabelecidas. Skovsmose enfatiza a
questão da democracia, e reflete a respeito de educar o ser humano de forma democrática, e que a
matemática tem um importante papel a desempenhar, na medida em que é a “porta de entrada”
para uma sociedade impregnada pela tecnologia, que gera uma sociedade baseada em uma total
integração de tecnologia de informação.
Estamos numa era em que a informática se tornou parte integrante da sociedade, e que com
as inovações tecnológicas, a facilidade ao acesso das informações é um fato incontestável. Os
estudantes no decorrer do Ensino Médio precisam discutir criticar, analisar, os dados, bem como
os resultados contidos em jornais, revistas, meios de comunicação em geral, que estão disponíveis
hoje no mundo.
Nesta linha de raciocínio, a Educação Estatística aproxima-se da Educação Crítica.
Skovsmose já destacava a importância da Educação Crítica, dentro da Educação Matemática, para
a preparação dos alunos para exercerem a cidadania, usando a Matemática como um instrumento
de análise das características críticas de relevância social. Como a Educação Estatística diferenciase da Educação Matemática na medida em que a Estatística leva em consideração alguns aspectos
que são peculiares à Estatística, e que nem sempre estão presentes na Matemática, e também como
é uma ciência que está em constante desenvolvimento, tanto nos seus conteúdos, quanto na forma
de utilização, por causa do avanço tecnológico, a necessidade de interpretações das informações
baseadas em dados reais é cada vez mais frequente, e com isso torna-se imprescindível que nossos
estudantes, tenham uma compreensão crítica destas informações (Wodewtzki et al, 2010, p. 70).
A importância do ensino de estatística e probabilidade
Todos os dias, jornais, revistas, a TV, o rádio, enfim todos os meios de comunicação, nos
mostram informações estatística, sobre praticamente todos os assuntos que estão ao nosso redor,
com isso, e por isso, devemos formar cidadãos críticos, e que consigam interpretar estes dados que
estão ao nosso redor.
A importância da matemática e da estatística se tornam cada vez indispensáveis e possuem
uma relação muito íntima com o mundo real, por isso, é preciso que os alunos também percebam
que a Matemática e a Estatística, são um sistema de códigos e regras que as tornam uma
linguagem de comunicação de ideias e que permitem modelar esta realidade, bem como
interpretá-la.
Os alunos devem ter a capacidade de conseguir se comunicar, compreender os dados que
os cercam, bem como que eles devem ter a habilidade para resolver problemas, e principalmente
que eles consigam aperfeiçoar o conhecimento e os valores que os cercam, para que possam
trabalhar de modo cooperativo (BRASIL, 1999). Para a apropriação e para o desenvolvimento de
habilidades que caracterizem o pensamento matemático e o pensamento estatístico, é necessário
que:

Na parte de matemática se priorize a qualidade do processo e não a quantidade de
conteúdos a serem trabalhados, e com isso devemos dar importância principalmente ao sistema
de numeração, medidas, grandezas, o qual chamamos de bloco de números e operações, como
segundo bloco, teríamos a parte de funções, que tem um papel importante no auxílio da
3
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
interpretação, leitura e construção de gráficos, o comportamento de certos fenômeno do
cotidiano. Outros blocos também importantes para o ensino de matemática são: a
Trigonometria, a Geometria.

Na parte de Estatística, podemos falar da Análise de dados e probabilidade, em que se
trabalham os seguintes conceitos:
▪ Incerteza e probabilidade associadas aos chamados fenômenos aleatórios, presentes
no mundo atual. E neste caso os alunos precisam entender os conceitos
relacionados com a incerteza, chance, probabilidade, que aparecem diariamente em
nossas vidas.
▪ Estudo da Estatística que viabiliza um questionamento que pode ser respondido
com a coleta de dados, organização e representação. Através deste ponto conseguir
criar e compreender a construção e a representação de tabelas e gráficos mais
elaborados.
▪ E finalmente a Inferência Estatística, que está presente em todas as áreas.
Temos a necessidade de se fazer inferências a partir dos dados que temos em mãos, isto é,
devemos conseguir tirar conclusões gerais, a partir de casos particulares, fazermos predições com
base numa amostra da população.
A aleatoriedade é um ponto presente na vida de qualquer cidadão, bem como a tomada de
decisão e a necessidade de se fazer previsões, de se interpretar gráficos e tabelas, bem como
entender as informações estatísticas que aparecem nas diversas mídias existentes. Conforme
Garfield apud Wodwotzki (2010, p. 71), há dois objetivos de aprendizagem que podemos
distinguir em nossos estudantes:

De ele ser capaz de atuar como membro educado da sociedade, em uma sociedade
repleta de informação.
 De ele ter uma boa base de entendimento dos termos, ideias e técnicas estatísticas.
Wodewotzki et al (2010 p. 72) acreditam que não seja possível ensinar o pensamento
estatístico diretamente aos alunos, para eles há um entendimento na possibilidade de se trabalhar
na valorização de hábitos mentais que permitirão aos não estatísticos uma melhor compreensão ao
tratamento de informações, no relacionamento dos dados e por fim que os estudantes consigam
obter alguma significação com estes dados. Concordamos com este pensamento, e achamos
importante que nossos alunos consigam compreender a “variabilidade dos dados” em qualquer
processo existente, que eles consigam também através de um processo investigativo: formular
questões; coletar dados; analisar estes dados, e, interpretar estes dados. Lembrando que
normalmente o estatístico já experiente, compreende bem o papel da variabilidade nos problemas
existentes, e nosso aluno iniciante provavelmente não irá conseguir fazer estas ligações, mas isto
na verdade exige certa experiencia, que será conseguida ao longo de sua formação, em seu
desenvolvimento. A compreensão da variabilidade dos dados é um ponto fundamental para a
prática deste processo, pois isto é que irá muitas vezes gerar nestes alunos, a formulação de
algumas questões estatísticas, que são diferentes de formulações determinísticas (muito usadas na
Matemática). Devemos ter em mente que o fundamental para eles é que o principal objetivo da
análise estatística é ter e dar uma confiança nesta “variabilidade” nos dados; e por isso, os alunos
do ensino médio devem aprender também quais são os modelos probabilísticos, e os tipos de
distribuições existentes, bem como selecionar e quantificar as amostras.
4
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
Raciocínios Probabilístico e Estatístico
A partir da década de 1980, a estatística e a probabilidade passaram a serem recomendadas
para integrar o currículo de Matemática desde os anos iniciais de escolaridade em vários países do
mundo (LOPES, 1998). A quantidade de dados gerados na e pela sociedade atual, principalmente
por causa do avanço da tecnologia e da facilidade de obtenção de informação, gerou a necessidade
de se reestruturar as propostas curriculares em Matemática. Embora este movimento tenha
ocorrido mundiamente ao final da década de 70, os aspectos relacionados ao ensino da Estatística e
da Probabilidade naEducação Básica ganharam destaque quando o National Council of Teachers
of Mathematics (NCTM) publicou em 1979 o documento “Agenda para ação”. A partir de então as
pesquisas em Educação Estatística ampliaram-se no mundo inteiro, educadores matemáticos,
psicólogos e estatísticos tem se dedicado a investigar o ensino e a aprendizagem da combinatória,
probabilidade e estatística e também, produzido materiais didáticos que subsidiem o trabalho
docente.
Com o crescimento e o desenvolvimento da estatística e da probabilidade nas escolas de
educação básica, sentimos a necessidade em se fazer a distinção entre a Educação Estatística e a
Educação Matemática, bem como explicar a diferença entre o raciocínio matemático e o raciocínio
estatístico. Percebe-se que há uma alteração na visão tradicional do ensino de Estatística,
considerada por muito tempo apenas como um tópico da Matemática (apenas com enfase em
cálculos, fórmulas e procedimentos) e hoje elas já tem estão considerando disciplinas separadas, já
há uma distinção entre Estatística e Matemática (GARFIELD e GAL, 1999).
À medida que notamos a diferenciação entre a Matemática e a Estatística percebemos a
importância de se abordar integradamente a Probabilidade e a Estatística, integrando as diferentes
formas de raciocínio matemático e raciocínio estatístico. O desenvolvimento dessas formas de
pensar é que possibilitam aos estudantes a realização da análise de dados e consequentemente a
tomada de decisão.
Garfield e Gal (1999) distinguiram as duas disciplinas através de quatro pontos:
 Para a Estatística, os dados são vistos como números num contexto, e o contexto
motiva os procedimentos, que são a base para a interpretação dos resultados.
 A indeterminação dos resultados ou a confusão dos dados distingue uma
investigação estatística de uma exploração matemática mais precisa e com uma
natureza mais finita.
 Os conceitos e os procedimentos matemáticos são usados em parte para resolver
os problemas estatísticos, mas estes não são limitados por eles.
 O fundamental nos problemas estatísticos, é que, pela sua natureza, não têm uma
única solução e não podem ser avaliados como totalmente errados nem certos,
devem ser avaliados em termos de qualidade do raciocínio, da adequação dos
métodos utilizados à natureza dos dados existentes. (Gal e Garfield apud Garfield e
Gal, 1999, p. 208)
Observa-se nessas considerações que se tais aspectos forem colocados em foco na Educação
Matemática e Estatística propriciaremos aos estudantes habidades e competências para: ler,
interpretar, levantar e verificar hipóteses, interpretar e argumentar.
5
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
Gal e Garfield (1999) apresentam como objetivos para a instrução estatística:
 Entender o propósito e a lógica de investigação. Neste ponto, é importante que os
estudantes entendam como as investigações estatísticas são conduzidas, e como as
grandes ideias apoiam as metodologias para questionamentos baseados em
informação.
 Entender o processo de investigação estatística. Neste caso, é necessário que os
estudantes comecem a entender a natureza e os processos envolvidos em uma
investigação estatística, e as considerações que interferem no modelo de um plano
para a coleta de dados, assim como o reconhecimento do como, do quando e do por
que, do uso de ferramentas estatísticas para o auxílio de um processo investigativo.
 Aprimorar Habilidades Procedimentais. Os alunos devem ter a capacidade de
organizar os dados, computar os índices necessários, ou construir e representar
tabelas, gráficos e diagramas.
 Entender as relações matemáticaa. Os alunos deveriam desenvolver um
entendimento intuitivo e formal das principais ideias matemáticas que estão
implícitas em representações estatísticas, procedimentos ou conceitos. Incluindo
aqui, o entendimento da relação entre síntese estatística, representação gráfica e os
dados brutos que serviram de base.
 Entender Probabilidade e Chance. Neste caso, o importante, é que os estudantes
consigam entender os conceitos e as palavras relacionadas a chance, incerteza e
probabilidade, que aparecem constantemente em nossas vidas.
 Desenvolver habilidades interpretativas e alfabetização estatística. Neste ponto, os
alunos devem aprender a interpretar resultados, e devem estar cientes de possíveis
tendências ou limitações que a generalização dos dados provoca. Eles devem na
verdade, conseguir fazer o questionamento crítico e reflexivo sobre os argumentos
apresentados nas sínteses estatísticas.
 Desenvolver habilidades para comunicação estatística. Aqui, seria importante, que
os estudantes conseguissem se comunicar efetivamente quando estiverem com os
dados das investigações estatísticas nas mãos, isto é, que eles conseguissem
argumentar, criticar, questionar e usar os resultados, bem como construir
argumentos racionais baseados nas informações e observações. (Gal e Garfield, 1997,
pp.208-210)
Assim, de acordo com Garfield apud Wodewotzki (2010, p. 72) o raciocínio estatístico é
definido como o modo com a qual uma pessoa faz uso da razão, com relação às ideias estatísticas e
como ele compreende as informações estatísticas, interpretando os dados, representando-os
graficamente, construindo tabelas, etc. O raciocínio estatístico também abrange as seguintes
concepções: variabilidade, distribuição, chance, incerteza, aleatoriedade, probabilidade,
amostragem; que induz a inferências e interpretações acerca dos resultados.
Dessa forma, podemos destacar as interfaces da Probabilidade e da Estatística, percebendo
que o desenvolvimento do raciocínio estatístico e do raciocínio probabilístico ocorrem de forma
interseccionada. Lopes apud Gal (2008) destaca a necessidade das pessoas serem alfabetizadas em
Probabilidade, adquirindo sensibilidade à linguagem do acaso em lidar com as muitas formas,
verbais e numéricas, nas quais a Probabilidade é comunicada. Para este autor os elementos de
6
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
disponibilidade à literacia probabilística incluem sentimentos pessoais quanto à incerteza e ao
risco, à postura crítica, às crenças e atitudes.
Assim, para desenvolver o pensamento probabilístico é preciso possibitar aos alunos
realizar atividades de ensino as quais permitam o entendimento de chance e de eventos aleatórios
(LOPES, 2008).
Percebemos que o Ensino de Estatística e Probabilidade é realmente de fundamental
importância para nossos estudantes, e que estes assuntos não podem ser tratados como mais um
conteúdo a ser introduzido nos currículos de nossas escolas. Não podemos pensar também que
estes conteúdos sejam ensinados de maneira descontextualizada e mecânica (GONÇALVES, 2008).
Devemos incentivar nossos alunos ao entendimento destes aspectos.
Avaliações em larga escala
A partir da década de 1990, é que se percebe a nível nacional uma preocupação com alguns
estudos exploratórios, e a implantação de um sistema nacional de avaliação da educação básica
brasileira. Dada a constituição tríplice das redes de ensino (municipal, estadual e federal), é
importante que estas avaliações aconteçam, para garantir a hegemonia e qualidade na educação.
Há hoje também outra vertente, que é a da avaliação de políticas públicas educacionais e avaliação
de programas, onde estudos estão sendo feitos para avaliar a política nacional de educação, que
enfoca a seletividade da educação, e estes estudos abrem outro leque de possibilidades, numa
direção bem difetente da avaliação de desempenho por testes que eram utilizados prioritariamente
entre 1978 a 1982 (GATTI, 2009).
A nível Federal, além do SAEB e da Prova Brasil, temos o ENEM (Exame Nacional do
Ensino Médio), com sua 1ª Edição em 1998, mas sua popularição veio em 2004, quando o
Ministério da Educação instituiu o PROUNI (Programa Universidade para Todos) com a concessão
de bolsas de estudo nas Instituições de Ensino Superior, vinculadas à nota obtida no Exame do
ENEM (INEP, 2010).
Em São Paulo, inicia-se a avaliação dos estudantes das Escolas Padrão, inicialmente em 306
escolas no Estado, ampliando-se posteriormente para mil. A partir de 1995, institui-se no Estado de
São Paulo, o SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), que
vem sendo realizado até hoje, com avaliações periódicas em séries sucessivas, e fazendo
equalizações para que se possa comparar o desempenho destes alunos (GATTI, 1990).
Neste contexto, em que as avaliações em larga escala no país vêm se desenvolvendo, iremos
discutir aqui as propostas de avaliação tanto do SARESP quanto do ENEM.
Para o ENEM o modelo de avaliação foi desenvolvido com ênfase nas estruturas mentais e
não somente na memorização das ideiais. O ENEM focaliza as competências e habilidades básicas
desenvolvidas, transformadas e fortalecidas com a mediação da escola. A estrutura da Matriz de
competências e habilidades do ENEM há também a preocupação com a seleção, organização, e
interpertação dos dados e informações representadas nas diferentes formas, bem como a tomada
de decisões e o enfrentamento das situações problema (BRASIL, 2006).
O SARESP também se baseia no Sistema de Matrizes Curriculares de referência, que
constituem os parâmetros para a realização, e para a elaboração das provas, e estas matrizes se
baseiam num conjunto de descritores, que servem de guia para esta elaboração. Esta matriz esta
7
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
sempre sendo revisada, no sentido de orientar a construção correta destas provas. Os referenciais
utilizados, são além das Propostas Curriculares que da CENP, são considerados tamém os
Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN e atualmente a Proposta Curricular do Estado de São
Paulo. Nota-se que esta Matriz Curricular do SARESP, tem sido elaborada para promover um
balanceamento entre os conteúdos e habilidades que a maioria dos alunos domina e o que se
detectou que os alunos não sabem (SEE/SP, 2003).
Raciocínio Probabilístico no SARESP e ENEM
Tanto o SARESP, quanto o ENEM, introduziram na relação de suas habilidades, itens
referentes a interpretação de dados, identificação de gráficos, resolução de problemas envolvendo
a ideia do princípio multiplicativo de contagem, bem como o uso de distribuições de frequência de
uma variável, a obtenção de medidas de tendência central e medidas de dispersão, compreensão
do carater aleatório e não determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizar os conceitos e
algoritmos adequados para medidas e cálculos de probabilidade.
Destacamos duas questões envolvendo racíocinio probabilístico que foram propostas nas
provas SARESP e ENEM aplicadas no ano de 2008.
Questão do SARESP 2008 envolvendo probabilidade simples:
Em um grupo de alunos de uma classe 6 têm seus nomes iniciando com a letra M, 4 com a letra A e
3 com a letra C e 2 com a letra P. Foi combinado com a professora e o grupo que na próxima aula
um dos alunos destre grupo será sorteado para expor o trabalho. Qual a probabilidade do aluno
que tem o nome iniciando com a letra M ser sorteado?
a) 2/10
b) 1/10
c) 2/5
d) 4/15
Respostas dos alunos:
A
b
c
d
12%
14%
31%
42%
Esta questão é uma aplicação direta do conceito básico de probabilidade, na qual temos
número total de alunos A = 6+4+3+2 = 15. E a probabilidade pedida dada por é:
P = 6/15 = 2/5  Resposta correta ítem C
Segundo Relatório pedagógico SARESP 2008, este item foi assinalado por 31% dos alunos,
que consideraram esta questão como sendo de dificuldade média. E segundo este relatório
pedagógico, o conceito de probabilidade exigido é quase que intuitivo e não foi compreendido por
55% dos alunos de melhor desempenho na prova.
Analisando o resultado apresentado pelos estudantes nesta questão podemos considerar
que o baixo desempenho deve-se a alguns fatores teórico-metodológicos. Destacamos que abordar
os conceitos probabilísticos com os alunos não é uma tarefa trivial e por isso, torna-se um trabalho
pouco explorada nas escolas, ficando limitado, na maioria das vezes à algumas aulas do 2º. Ano do
Ensino Médio. Isso decorre tanto da dificuldade de compreensão dos conceitos de aleatoriedade
como da necessidade de ruptura com uma visão determinística. Um dos obstáculos para se
trabalhar com a noção do acaso e incerteza, é que raramente se explora as noções intuitivas que o
aluno traz e parte-se logo para uma abordagem formalizada dos conceitos.
8
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
Questão do ENEM 2008:
No universo pesquisado, considere que P seja o conjunto das pessoas que vivem na rua por
motivos de alcoolismo/drogas e Q seja o conjunto daquelas cujo motivo para viverem na rua é a
decepção amorosa. Escolhendo-se ao acaso uma pessoa no grupo pesquisado e supondo-se que
seja igual a 40% a probabilidade de que essa pessoa faça parte do conjunto P ou do conjunto Q,
então a probabilidade de que ela faça parte do conjunto interseção de P e Q é igual a:
a) 12%
b) 16%
c) 20%
d) 36%
e) 52%
Respostas dos alunos
A
b
c
d
e
13%
13%
42%
15%
16%
Este ítem atingiu 13% de acerto.
Pelos dados apresentados, a porcentagem relativa ao conjunto P (alcoolismo/drogas) é de
36% e ao conjunto Q (decepção amorosa) é de 16%. Se a probabilidade da pessoa pertencer ao
conjunto P ou ao conjunto Q é de 40%, então a probabilidade de que ela faça parte de intersecção
de P e Q é de: 36% + 16% - 40% = 12%
A alternativa C atraiu 42% das respostas. Esta questão teve além do baixo índice de acerto,
ela mostra indícios que podem indicar alguma falta de adequação na aplicação do conteúdo de
probabilidade no ensino médio.
Esta questão ao ser analisada apresenta evidências relacionadas ao quanto sua resolução
requer a habilidade de reconhecer o caráter aleatório dos fenômenos naturais e a necessidade de
utilizá-lo em situações problema nos processos de contagem, representação de frequência relativas,
construção de espaços amostrais, distribuição e cálculo de probabilidades. No ENEM essa
habilidade aparece registrada como a décima quinta. Esta questão é um pouco mais complexa do
que a anterior, já que nela além do conceito intuitivo da probabilidade, temos que usar o conceito
da probabilidade com união de eventos ou regra da adição de probabilidade, onde sendo A e B
eventos de um conjunto S (universo), a P(A  B) = P(A) + P(B) – P(A  B).
Considerações finais
As representações gráficas existentes no ensino de Matemátca, bem como a análise,
construção e interpretação dos dados, a compreensão de diversos conceitos de medidas de
tendência central, medidas de dispersão, e o senso crítico em relação a informações tendenciosas,
não são simples e nem muito evidentes, disso decorre a importância dos alunos serem educados
estatisticamente e probabilisticamente desde o início da escolaridade.
A Educação Estatística deve se opôr à tradição da exatidão, e do determinismo muitas
vezes presentes nas aulas de Matemática, ela deve envolver a exploração de situações de
aprendizagem que priorizem o trabalho com estimativas, valores aproximados, aleatoriedade e
análise de variáveis.
Nas questões das provas de 2008 do SARESP e ENEM, destacadas neste artigo,
observamos que o conteúdo solicitado, não era de um alto grau de complexidade, em nenhuma
das duas questões, mas nenhuma das duas questões teve a porcentagem de acerto alta. O
desenvolvimento do pensamento probabilístico e estatístico ainda vem sendo pouco explorado na
9
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
educação básica brasileira. Para que a compreensão da noção de probabilidade e a aptidão para o
cálculo da probabilidade sejam adquiridas é preciso que os alunos vivenciem a realização de
experimentos probabilisticos, problematizem situações aleatórias, registrem observações, retirem
conclusões e solucionem problemas.
Um trabalho integrado de Educação Matemática e Educação Estatística faz-se necessário
para que todos os estudantes possam adquirir conhecimentos os quais lhes são essenciais para a
realização de atividades diárias e particularmente, para o desenvolvimento do pensamento
científico. Todas as pessoas têm direito a ser alfabetizada probabilisticamente e estatisticamente e
cada escola propriciar tal formação.
Referências
BRASIL. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias. Secretaria da Educação Básica. Brasília: MEC, 2006.
_____. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Brasília:
MEC, 1999.
_____. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. ENEM.
Brasília. Disponível em: http://historico.enem.inep.gov.br/. Acesso em: 09 ago.2010.
CARVALHO, Carolina. Literacia Estatística. In: I Seminário de Ensino de Matemática – 14ª
Conferência, Campinas: São Paulo, 2003. pp 22-25.
GAL, Iddo; GARFIELD, Joan. Assessment and statistics education: current challenges and
directions. International Statistical Review, 1999. v.67(1). pp.1-12.
GARFIELD, Joan.; GAL, Iddo. Teaching and assessing statistical reasoning. In: STIFF, Lee.;
CURCIO, Frances. Developing mathematical reasoning in grades K-12. Reston/VA: NCTM, 1999.
pp. 207-219.
GATTI , Bernardete A. Avaliação de sistemas educacionais no Brasil. Sísifo. In Revista de Ciencias em
Educação, n. 9 – Maio/Agosto - Lisboa Portugal: 2009. pp.7-18
GONÇALVES, Harryson Junio Lessa; A educação estatística no ensino fundamentel brasileiro, 2008. IN:
Colloquium Humanarum, Presidente Prudento: São Paulo, v.5 n. 1 2008. pp.1-9.
LOPES, Celi E. Reflexões teórico-metodológicas para a Educação Estatística. IN: LOPES, Celi E.; CURI,
Edda. Pesquisas em Educação Matemática: um encontro entre a teoria e a prática.São Carlos/SP:
Pedro & João Editores, 2008, pp. 67-86.
_____. A Probabilidade e a Estatística no ensino fundamental: Uma análise curricular. Campinas:
Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. Dissertação de Mestrado. 1998.
SÃO
PAULO.
Conhecendo
os
resultados
do
Saresp.
Disponível
em:
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/Downloads/saresp/saresp2003_cap1.pdf. Acesso em 09
ago. 2010.
SEVERINO, Antônio J. Metodologia do trabalho c ientífico. São Paulo: Cortez, 2007.
SOUZA, Antonio Carlos; Lopes, Celi E. A construção de ideias estatística na educação infantil, 16º
Congresso de Leituras do Brasil, Campinas/SP, 2007.
10
Boletim do LABEM, ano 5, n. 9, jul/dez de 2014
www.labem.uff.br
SKOVSMOSE, Ole. Educação Matemática critica: A questão da Democracia. Campinas/SP: Editora
Papirus, 2010.
WODEWTZKI Maria Lucia et al. Temas contemporâneos as aulas de Estatística: Um caminho para
combinar aprendizagem e reflexões políticas. In: LOPES, Celi.; COUTINHO, Cileda.; ALMOULOUD,
Saddo Ag. Estudos e reflexões sobre educação estatística. Campinas/SP: Mercado e Letras, 2010.
11
Download