Avaliações Externas e o Currículo do Ensino Médio: uma análise sobre as questões que envolvem Probabilidade Luciana de Castro Lugli1 Celi Espasandin Lopes2 Resumo Este texto se refere a uma pesquisa de mestrado em desenvolvimento que visa analisar questões propostas nas provas Saresp e Enem no período de 2007 a 2009 considerando como critérios para análise as recomendações presentes na produção científica em Educação Estatística a qual deve ser desenvolvida nas aulas de Matemática na Educação Básica. Para essa comunicação selecionamos uma questão de cada prova, as quais focalizam conceitos da probabilidade. Os resultados evidenciam que a formação dos estudantes apresenta lacunas no desenvolvimento do raciocínio probabilístico. Palavras-chave: Probabilidade. Ensino Médio. Currículo. Avaliação Externa. Introdução O objetivo deste trabalho é promover uma discussão sobre o desenvolvimento do Raciocínio Estatístico nos estudantes do Ensino Médio. Trata-se de um ensaio teórico constituido em exposição lógica e reflexiva (Severino, 2007) sobre questões relativas à Educação Estatística as quais tem subsidiado uma pesquisa de mestrado que busca analisar avaliações externas, em particular, provas do Enem e Saresp, que foram aplicadas nos anos de 2007 a 2009. Hoje o acesso rápido à informação é um fato indiscutível. Ao mesmo tempo em que o avanço da tecnologia nos beneficia com a facilidade ao acesso às informações, também delega à educação a responsabilidade de preparar as pessoas para lidar com situações diversificadas que se apresentam a cada dia. Tal realidade traz à Educação Matemática novos desafios. Já não basta o domínio dos números e das operações, é preciso realizar estimativas rápidas sobre 1 2 Universidade Cruzeiro do Sul – São Paulo - email: [email protected] Universidade Cruzeiro do Sul – São Paulo - email: [email protected] 2 valores e percentuais presentes diariamente nas informações. Amplia-se a necessidade de desenvolver capacidades cada vez mais diversas e especificas para desempenhar determinar funções, seja na vida pessoal ou profissional. A quantidade expressiva de informação encaminha para a necessidade de desenvolver habilidades frente à problematização sobre temáticas que precisam ser analisadas. Neste sentido adquire destaque a Estatística enquanto uma ciência de análise de dados. Assim, o currículo de matemática agrega o desenvolvimento da Educação Estatística desde os anos iniciais de escolaridade. Ganha destaque o processo de coleta, organização, representação e interpretação de dados nas aulas de matemática de todos os níveis e modalidades de ensino. As análises estatísticas se fazem cada vez mais necessárias para a leitura ampla e crítica da realidade que as pessoas vivem e que precisam modificar. O desenvolvimento das capacidades de raciocínio, da resolução de problemas, e do espírito crítico e criativo, bem como da análise e valorização das informações provenientes de diferentes fontes faz-se crucial na formação dos estudantes (LOPES, 2008, p. 58). Estes pontos mencionados acima devem ser trabalhados com nossos estudantes, para que eles possam tomar decisões em suas vidas e principalmente beneficiarem-se dessa formação em suas ações. O aluno é parte integrante de uma sociedade, em que constantemente somos solicitados a decidir um caminho em nossas vidas, em todas as áreas do conhecimento. Com a facilidade de acesso, seleção e processamento de informações, nossos alunos passam a descobrir novas fronteiras do conhecimento. Em meados dos anos 1980 e primeira metade dos anos 1990, iniciou-se um processo de revisão das funções tradicionalmente duais da Educação Secundária, que se buscava um perfil mais condizente com as características da produção pós industrial. A reforma baseou-se e inspirou-se principalmente por causa das mudanças econômicas e tecnológicas (BRASIL, 1999, p. 71). Com a integração econômica, social, cultural e políticas, das nações pelo mundo, bem como a facilidade e o desenvolvimento da comunicação pelo mundo não podemos então deixar de pensar que o legado da Educação, não irá atender a estas mudanças, e que ela (a educação) seja um dos polos transformadores de nossos estudantes e futuros cidadãos. Assim, a Educação Matemática e Estatística se fazem necessárias e devem estar voltadas para o desenvolvimento das diferentes formas de raciocínio que são presentes nessas áreas. A resolução de problemas deverá ser uma metodologia que 3 promoverá a transformação nas formas de pensar, criar e construção coletivamente o conhecimento. O ensino da estatística e a da probabilidade vem sendo muito estimulado, principalmente por causa de suas aplicações no mundo atual. Mas se faz em um paradigma marcado pelo abandono da memorização de fórmulas e algoritmos, no qual se focar nas conexões entre educação estatística e a leitura de múlitplos contextos. Nosso objetivo é que os estudantes passem a ser críticos em relação às informações disponíveis na sociedade, e que consigam entender e se comunicar com base nas informações apresentadas (Carvalho apud Shaughenessy, 2003). O pensamento crítico na educação matemática é analisado nas ideias de Ole Skovsmose (2001). Ele protagonizou o movimento chamado Educação Matemática Crítica. Neste movimento tem como centro das idéias, a questão da democracia. Ele critica as tendências existentes na década de 1980, de domesticação dos estudantes; e argumenta que é essencial que a educação matemática busque caminhos que a desviem da norma predominante de domesticação e propõe uma alternativa baseada nos moldes desenvolvidos nas universidades de Roskilde e Aalborg, onde lá a principal atividade do estudante não é frequentar aulas, mas sim gerar e desenvolver projetos com base em interações com professores e com delimitações preestabelecidas. Skovsmose enfatiza a questão da democracia, e reflete a respeito de educar o ser humano de forma democrática, e que a matemática tem um importante papel a desempenhar, na medida em que é a “porta de entrada” para uma sociedade impregnada pela tecnologia, que gera uma sociedade baseada em uma total integração de tecnologia de informação. Estamos numa era em que a informática se tornou parte integrante da sociedade, e que com as inovações tecnológicas, a facilidade ao acesso das informações é um fato incontestável. Os estudantes no decorrer do Ensino Médio precisam discutir criticar, analisar, os dados, bem como os resultados contidos em jornais, revistas, meios de comunicação em geral, que estão disponíveis hoje no mundo. Nesta linha de raciocínio, a Educação Estatística aproxima-se da Educação Crítica. Skovsmose já destacava a importância da Educação Crítica, dentro da Educação Matemática, para a preparação dos alunos para exercerem a cidadania, usando a Matemática como um instrumento de análise das características críticas de relevância social. Como a Educação Estatística diferencia-se da Educação Matemática na medida em que a Estatística leva em consideração alguns aspectos que são peculiares à 4 Estatística, e que nem sempre estão presentes na Matemática, e também como é uma ciência que está em constante desenvolvimento, tanto nos seus conteúdos, quanto na forma de utilização, por causa do avanço tecnológico, a necessidade de interpretações das informações baseadas em dados reais é cada vez mais frequente, e com isso torna-se imprescindível que nossos estudantes, tenham uma compreensão crítica destas informações (Wodewtzki et al, 2010, p. 70). A importância do ensino de estatística e probabilidade Todos os dias, jornais, revistas, a TV, o rádio, enfim todos os meios de comunicação, nos mostram informações estatística, sobre praticamente todos os assuntos que estão ao nosso redor, com isso, e por isso, devemos formar cidadãos críticos, e que consigam interpretar estes dados que estão ao nosso redor. A importância da matemática e da estatística se tornam cada vez indispensáveis e possuem uma relação muito íntima com o mundo real, por isso, é preciso que os alunos também percebam que a Matemática e a Estatística, são um sistema de códigos e regras que as tornam uma linguagem de comunicação de ideias e que permitem modelar esta realidade, bem como interpretá-la. Os alunos devem ter a capacidade de conseguir se comunicar, compreender os dados que os cercam, bem como que eles devem ter a habilidade para resolver problemas, e principalmente que eles consigam aperfeiçoar o conhecimento e os valores que os cercam, para que possam trabalhar de modo cooperativo (BRASIL, 1999). Para a apropriação e para o desenvolvimento de habilidades que caracterizem o pensamento matemático e o pensamento estatístico, é necessário que: • Na parte de matemática se priorize a qualidade do processo e não a quantidade de conteúdos a serem trabalhados, e com isso devemos dar importância principalmente ao sistema de numeração, medidas, grandezas, o qual chamamos de bloco de números e operações, como segundo bloco, teríamos a parte de funções, que tem um papel importante no auxílio da interpretação, leitura e construção de gráficos, o comportamento de certos fenômeno do cotidiano. Outros blocos também importantes para o ensino de matemática são: a Trigonometria, a Geometria. • Na parte de Estatística, podemos falar da Análise de dados e probabilidade, em que se trabalham os seguintes conceitos: o Incerteza e probabilidade associadas aos chamados fenômenos 5 aleatórios, presentes no mundo atual. E neste caso os alunos precisam entender os conceitos relacionados com a incerteza, chance, probabilidade, que aparecem diariamente em nossas vidas. o Estudo da Estatística que viabiliza um questionamento que pode ser respondido com a coleta de dados, organização e representação. Através deste ponto conseguir criar e compreender a construção e a representação de tabelas e gráficos mais elaborados. o E finalmente a Inferência Estatística, que está presente em todas as áreas. Temos a necessidade de se fazer inferências a partir dos dados que temos em mãos, isto é, devemos conseguir tirar conclusões gerais, a partir de casos particulares, fazermos predições com base numa amostra da população. A aleatoriedade é um ponto presente na vida de qualquer cidadão, bem como a tomada de decisão e a necessidade de se fazer previsões, de se interpretar gráficos e tabelas, bem como entender as informações estatísticas que aparecem nas diversas mídias existentes. Conforme Garfield apud Wodwotzki (2010, p. 71), há dois objetivos de aprendizagem que podemos distinguir em nossos estudantes: • De ele ser capaz de atuar como membro educado da sociedade, em uma sociedade repleta de informação. • De ele ter uma boa base de entendimento dos termos, ideias e técnicas estatísticas. Wodewotzki et al (2010 p. 72) acreditam que não seja possível ensinar o pensamento estatístico diretamente aos alunos, para eles há um entendimento na possibilidade de se trabalhar na valorização de hábitos mentais que permitirão aos não estatísticos uma melhor compreensão ao tratamento de informações, no relacionamento dos dados e por fim que os estudantes consigam obter alguma significação com estes dados. Concordamos com este pensamento, e achamos importante que nossos alunos consigam compreender a “variabilidade dos dados” em qualquer processo existente, que eles consigam também através de um processo investigativo: formular questões; coletar dados; analisar estes dados, e, interpretar estes dados. Lembrando que normalmente o estatístico já experiente, compreende bem o papel da variabilidade nos problemas existentes, e nosso aluno iniciante provavelmente não irá conseguir fazer estas ligações, mas isto na verdade exige certa experiencia, que será conseguida ao longo de sua 6 formação, em seu desenvolvimento. A compreensão da variabilidade dos dados é um ponto fundamental para a prática deste processo, pois isto é que irá muitas vezes gerar nestes alunos, a formulação de algumas questões estatísticas, que são diferentes de formulações determinísticas (muito usadas na Matemática). Devemos ter em mente que o fundamental para eles é que o principal objetivo da análise estatística é ter e dar uma confiança nesta “variabilidade” nos dados; e por isso, os alunos do ensino médio devem aprender também quais são os modelos probabilísticos, e os tipos de distribuições existentes, bem como selecionar e quantificar as amostras. Raciocínios Probabilístico e Estatístico A partir da década de 1980, a estatística e a probabilidade passaram a serem recomendadas para integrar o currículo de Matemática desde os anos iniciais de escolaridade em vários países do mundo (LOPES, 1998). A quantidade de dados gerados na e pela sociedade atual, principalmente por causa do avanço da tecnologia e da facilidade de obtenção de informação, gerou a necessidade de se reestruturar as propostas curriculares em Matemática. Embora este movimento tenha ocorrido mundiamente ao final da década de 70, os aspectos relacionados ao ensino da Estatística e da Probabilidade naEducação Básica ganharam destaque quando o National Council of Teachers of Mathematics (NCTM) publicou em 1979 o documento “Agenda para ação”. A partir de então as pesquisas em Educação Estatística ampliaram-se no mundo inteiro, educadores matemáticos, psicólogos e estatísticos tem se dedicado a investigar o ensino e a aprendizagem da combinatória, probabilidade e estatística e também, produzido materiais didáticos que subsidiem o trabalho docente. Com o crescimento e o desenvolvimento da estatística e da probabilidade nas escolas de educação básica, sentimos a necessidade em se fazer a distinção entre a Educação Estatística e a Educação Matemática, bem como explicar a diferença entre o raciocínio matemático e o raciocínio estatístico. Percebe-se que há uma alteração na visão tradicional do ensino de Estatística, considerada por muito tempo apenas como um tópico da Matemática (apenas com enfase em cálculos, fórmulas e procedimentos) e hoje elas já tem estão considerando disciplinas separadas, já há uma distinção entre Estatística e Matemática (GARFIELD e GAL, 1999). À medida que notamos a diferenciação entre a Matemática e a Estatística percebemos a importância de se abordar integradamente a Probabilidade e a Estatística, 7 integrando as diferentes formas de raciocínio matemático e raciocínio estatístico. O desenvolvimento dessas formas de pensar é que possibilitam aos estudantes a realização da análise de dados e consequentemente a tomada de decisão. Garfield e Gal (1999) distinguiram as duas disciplinas através de quatro pontos: Para a Estatística, os dados são vistos como números num contexto, e o contexto motiva os procedimentos, que são a base para a interpretação dos resultados. A indeterminação dos resultados ou a confusão dos dados distingue uma investigação estatística de uma exploração matemática mais precisa e com uma natureza mais finita. Os conceitos e os procedimentos matemáticos são usados em parte para resolver os problemas estatísticos, mas estes não são limitados por eles. O fundamental nos problemas estatísticos, é que, pela sua natureza, não têm uma única solução e não podem ser avaliados como totalmente errados nem certos, devem ser avaliados em termos de qualidade do raciocínio, da adequação dos métodos utilizados à natureza dos dados existentes. (Gal e Garfield apud Garfield e Gal, 1999, p. 208) Observa-se nessas considerações que se tais aspectos forem colocados em foco na Educação Matemática e Estatística propriciaremos aos estudantes habidades e competências para: ler, interpretar, levantar e verificar hipóteses, interpretar e argumentar. Gal e Garfield (1999) apresentam como objetivos para a instrução estatística: Entender o propósito e a lógica de investigação. Neste ponto, é importante que os estudantes entendam como as investigações estatísticas são conduzidas, e como as grandes ideias apoiam as metodologias para questionamentos baseados em informação. Entender o processo de investigação estatística. Neste caso, é necessário que os estudantes comecem a entender a natureza e os processos envolvidos em uma investigação estatística, e as considerações que interferem no modelo de um plano para a coleta de dados, assim como o reconhecimento do como, do quando e do por que, do uso de ferramentas estatísticas para o auxílio de um processo investigativo. 8 Aprimorar Habilidades Procedimentais. Os alunos devem ter a capacidade de organizar os dados, computar os índices necessários, ou construir e representar tabelas, gráficos e diagramas. Entender as relações matemáticaa. Os alunos deveriam desenvolver um entendimento intuitivo e formal das principais ideias matemáticas que estão implícitas em representações estatísticas, procedimentos ou conceitos. Incluindo aqui, o entendimento da relação entre síntese estatística, representação gráfica e os dados brutos que serviram de base. Entender Probabilidade e Chance. Neste caso, o importante, é que os estudantes consigam entender os conceitos e as palavras relacionadas a chance, incerteza e probabilidade, que aparecem constantemente em nossas vidas. Desenvolver habilidades interpretativas e alfabetização estatística. Neste ponto, os alunos devem aprender a interpretar resultados, e devem estar cientes de possíveis tendências ou limitações que a generalização dos dados provoca. Eles devem na verdade, conseguir fazer o questionamento crítico e reflexivo sobre os argumentos apresentados nas sínteses estatísticas. Desenvolver habilidades para comunicação estatística. Aqui, seria importante, que os estudantes conseguissem se comunicar efetivamente quando estiverem com os dados das investigações estatísticas nas mãos, isto é, que eles conseguissem argumentar, criticar, questionar e usar os resultados, bem como construir argumentos racionais baseados nas informações e observações. (Gal e Garfield, 1997, pp.208-210) Assim, de acordo com Garfield apud Wodewotzki (2010, p. 72) o raciocínio estatístico é definido como o modo com a qual uma pessoa faz uso da razão, com relação às ideias estatísticas e como ele compreende as informações estatísticas, interpretando os dados, representando-os graficamente, construindo tabelas, etc. O raciocínio estatístico também abrange as seguintes concepções: variabilidade, distribuição, chance, incerteza, aleatoriedade, probabilidade, amostragem; que induz a inferências e interpretações acerca dos resultados. Dessa forma, podemos destacar as interfaces da Probabilidade e da Estatística, 9 percebendo que o desenvolvimento do raciocínio estatístico e do raciocínio probabilístico ocorrem de forma interseccionada. Lopes apud Gal (2008) destaca a necessidade das pessoas serem alfabetizadas em Probabilidade, adquirindo sensibilidade à linguagem do acaso em lidar com as muitas formas, verbais e numéricas, nas quais a Probabilidade é comunicada. Para este autor os elementos de disponibilidade à literacia probabilística incluem sentimentos pessoais quanto à incerteza e ao risco, à postura crítica, às crenças e atitudes. Assim, para desenvolver o pensamento probabilístico é preciso possibitar aos alunos realizar atividades de ensino as quais permitam o entendimento de chance e de eventos aleatórios (LOPES, 2008). Percebemos que o Ensino de Estatística e Probabilidade é realmente de fundamental importância para nossos estudantes, e que estes assuntos não podem ser tratados como mais um conteúdo a ser introduzido nos currículos de nossas escolas. Não podemos pensar também que estes conteúdos sejam ensinados de maneira descontextualizada e mecânica (GONÇALVES, 2008). Devemos incentivar nossos alunos ao entendimento destes aspectos. Avaliações em larga escala A partir da década de 1990, é que se percebe a nível nacional uma preocupação com alguns estudos exploratórios, e a implantação de um sistema nacional de avaliação da educação básica brasileira. Dada a constituição tríplice das redes de ensino (municipal, estadual e federal), é importante que estas avaliações aconteçam, para garantir a hegemonia e qualidade na educação. Há hoje também outra vertente, que é a da avaliação de políticas públicas educacionais e avaliação de programas, onde estudos estão sendo feitos para avaliar a política nacional de educação, que enfoca a seletividade da educação, e estes estudos abrem outro leque de possibilidades, numa direção bem difetente da avaliação de desempenho por testes que eram utilizados prioritariamente entre 1978 a 1982 (GATTI, 2009). A nível Federal, além do SAEB e da Prova Brasil, temos o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), com sua 1ª Edição em 1998, mas sua popularição veio em 2004, quando o Ministério da Educação instituiu o PROUNI (Programa Universidade para Todos) com a concessão de bolsas de estudo nas Instituições de Ensino Superior, vinculadas à nota obtida no Exame do ENEM (INEP, 2010). 10 Em São Paulo, inicia-se a avaliação dos estudantes das Escolas Padrão, inicialmente em 306 escolas no Estado, ampliando-se posteriormente para mil. A partir de 1995, institui-se no Estado de São Paulo, o SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), que vem sendo realizado até hoje, com avaliações periódicas em séries sucessivas, e fazendo equalizações para que se possa comparar o desempenho destes alunos (GATTI, 1990). Neste contexto, em que as avaliações em larga escala no país vêm se desenvolvendo, iremos discutir aqui as propostas de avaliação tanto do SARESP quanto do ENEM. Para o ENEM o modelo de avaliação foi desenvolvido com ênfase nas estruturas mentais e não somente na memorização das ideiais. O ENEM focaliza as competências e habilidades básicas desenvolvidas, transformadas e fortalecidas com a mediação da escola. A estrutura da Matriz de competências e habilidades do ENEM há também a preocupação com a seleção, organização, e interpertação dos dados e informações representadas nas diferentes formas, bem como a tomada de decisões e o enfrentamento das situações problema (BRASIL, 2006). O SARESP também se baseia no Sistema de Matrizes Curriculares de referência, que constituem os parâmetros para a realização, e para a elaboração das provas, e estas matrizes se baseiam num conjunto de descritores, que servem de guia para esta elaboração. Esta matriz esta sempre sendo revisada, no sentido de orientar a construção correta destas provas. Os referenciais utilizados, são além das Propostas Curriculares que da CENP, são considerados tamém os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN e atualmente a Proposta Curricular do Estado de São Paulo. Nota-se que esta Matriz Curricular do SARESP, tem sido elaborada para promover um balanceamento entre os conteúdos e habilidades que a maioria dos alunos domina e o que se detectou que os alunos não sabem (SEE/SP, 2003). O Currículo de Matemática no Ensino Médio O MEC em 1999 lança os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), em uma tentativa de expandir e melhorar a qualidade do Ensino na Educação Básica. Visa com esse documento uma educação baseada no domínio de competências básicas e não no acúmulo de informações, bem como tem por idéia um 11 currículo que tenha vínculos com os diversos contextos da vida dos alunos. Os referencias existentes nesta proposta, tentam direcionar e organizar o aprendizado no Ensino médio, no sentido de se produzir um conhecimento efetivo, de significado próprio, e não apenas um ensino preliminar. Percebe-se nestes Parâmetros, uma forte tentativa à ênfase à contextualização, e o desenvolvimento de conhecimentos mais amplos e abstratos, que correspondam a uma cultura geral para que os nossos alunos consigam ter uma visão maior do mundo. Outro ponto destacado no PCNEM de 1999 refere-se ao fato de que a compreensão da matemática é essencial para que o cidadão possa agir como um consumidor prudente ou que ele consiga tomar decisões em sua vida profissional e pessoal. E também que este estudante, consiga no mundo atual, cheio de mudanças por causa do fácil acesso às informações, consiga desenvolver processos de pensamento, e adquira atitudes cuja utilidade e alcance ultrapassem o âmbito da própria matemática. O documento apresenta as seguintes competências e habilidades a serem desenvolvidas em Matemática: 1. Representação e Comunicação o Ler e interpretar textos de Matemática. o Ler, interpretar e utilizar representações matemáticas (tabelas, gráficos, expressões, etc.). o Transcrever mensagens matemáticas da linguagem corrente para linguagem simbólica (equações, gráficos, diagramas, fórmulas,...). o Produzir textos matemáticos adequados. o Utilizar adequadamente os recursos tecnológicos como instrumentos de produção e de comunicação. o Utilizar corretamente instrumentos de medição e de desenho. 2. Investigação e compreensão o Identificar o problema. o Procurar selecionar e interpretar informações relativas ao problema. o Formular hipóteses e prever resultados. o Selecionar estratégias de resolução de problemas. 12 o Interpretar e criticar resultados numa situação concreta. o Distinguir e utilizar raciocínios dedutivos e indutivos. o Fazer e validar conjecturas, experimentando, recorrendo a modelos esboços, fatos conhecidos, relações e propriedades. o Discutir idéias e produzir argumentos convincentes. 3. Contextualização sócio-cultural o Desenvolver a capacidade de utilizar a Matemática na interpretação e intervenção no real. o Aplicar conhecimentos e métodos matemáticos em situações reais, em especial em outras áreas do conhecimento. o Relacionar etapas da história da Matemática com a evolução da humanidade. o Utilizar adequadamente calculadoras e computador, reconhecendo suas limitações e potencialidades. Tais competências e habilidades devem ser desenvolvidas nas disciplinas de Ciências da Natureza e Matemática. Em 2008, a Secretaria Estadual de São Paulo, publica a Proposta Curricular do Estado de SP. O objetivo é propor um currículo para os níveis de ensino fundamental e médio; em uma “tentativa” de melhoria da qualidade da aprendizagem de seus alunos. No intuito de estimular o desenvolvimento curricular, a SEE/SP toma também duas iniciativas complementares: • Realiza um amplo levantamento do acervo documental e técnico existente. • Iniciar um processo de consulta a escolas e professores referentes a práticas pedagógicas nas escolas. Os princípios centrais desta Proposta Curricular são: • A escola que aprende. • O Currículo como espaço de cultura. • As competências como eixo de aprendizagem. 13 • A prioridade da competência de leitura e de escrita. • A articulação das competências para aprender. • Contextualização no mundo do trabalho. Percebe-se então o surgimento de três grandes áreas do conhecimento, para a organização dos conteúdos curriculares: • Linguagens, incluindo-se as línguas estrangeiras, a Educação Física e as Artes, como diferentes formas de expressão; • Ciências humanas, incluindo-se História, Geografia e, no caso do Ensino Médio, Filosofia; • Ciências Naturais e Matemática, uma grande área que no Ensino Médio inclui as disciplinas de Física, Química, Biologia e Matemática. No Estado de São Paulo, nas propostas curriculares a partir de 1986, a Matemática era apresentada como uma área específica (ficando em vigor até hoje). E esta nova proposta inspirou-se na anterior, mantendo assim a Matemática como um terreno específico, distinto tanto das Linguagens quanto das Ciências Naturais. A partir de idéias gerais propostas na formulação do ENEM elaboraram-se uma lista com as competências básicas a serem desenvolvidas ao longo da escola básica, que se constituem nos três eixos norteadores da ação educacional: • Eixo expressão/compreensão • Eixo argumentação/decisão • Eixo contextualização/abstração A Matemática nesta Proposta Curricular é apresentada como um sistema simbólico que se articula com a língua materna, e com isso se vê uma preocupação com o que se ensinar nas diversas séries tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. Em relação ao bloco de conteúdo tratamento de informação, a proposta curricular considera como um campo no qual se deve ir além das fronteiras da organização e análise de dados (como geralmente é abordado no Ensino fundamental), devido a sua grande ajuda à análise de dados e conseqüente necessidade de tomada de decisão tão importante nos dias de hoje. 14 Raciocínio Probabilístico no SARESP e ENEM Tanto o SARESP, quanto o ENEM, introduziram na relação de suas habilidades, itens referentes à interpretação de dados, identificação de gráficos, resolução de problemas envolvendo a ideia do princípio multiplicativo de contagem, bem como o uso de distribuições de frequência de uma variável, a obtenção de medidas de tendência central e medidas de dispersão, compreensão do carater aleatório e não determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizar os conceitos e algoritmos adequados para medidas e cálculos de probabilidade. Destacamos duas questões envolvendo racíocinio probabilístico que foram propostas nas provas SARESP e ENEM aplicadas no ano de 2008. Questão do SARESP 2008 envolvendo probabilidade simples: Em um grupo de alunos de uma classe 6 têm seus nomes iniciando com a letra M, 4 com a letra A e 3 com a letra C e 2 com a letra P. Foi combinado com a professora e o grupo que na próxima aula um dos alunos destre grupo será sorteado para expor o trabalho. Qual a probabilidade do aluno que tem o nome iniciando com a letra M ser sorteado? a) 2/10 b) 1/10 c) 2/5 d) 4/15 Respostas dos alunos: A B c d 12% 14% 31% 42% Esta questão é uma aplicação direta do conceito básico de probabilidade, na qual temos número total de alunos A = 6+4+3+2 = 15. E a probabilidade pedida dada por é: P = 6/15 = 2/5 Resposta correta ítem C Segundo Relatório pedagógico SARESP 2008, este item foi assinalado por 31% dos alunos, que consideraram esta questão como sendo de dificuldade média. E segundo este relatório pedagógico, o conceito de probabilidade exigido é quase que intuitivo e não foi compreendido por 55% dos alunos de melhor desempenho na prova. Analisando o resultado apresentado pelos estudantes nesta questão podemos considerar que o baixo desempenho deve-se a alguns fatores teórico-metodológicos. 15 Destacamos que abordar os conceitos probabilísticos com os alunos não é uma tarefa trivial e por isso, torna-se um trabalho pouco explorada nas escolas, ficando limitado, na maioria das vezes à algumas aulas do 2º. Ano do Ensino Médio. Isso decorre tanto da dificuldade de compreensão dos conceitos de aleatoriedade como da necessidade de ruptura com uma visão determinística. Um dos obstáculos para se trabalhar com a noção do acaso e incerteza, é que raramente se explora as noções intuitivas que o aluno traz e parte-se logo para uma abordagem formalizada dos conceitos. Questão do ENEM 2008: No universo pesquisado, considere que P seja o conjunto das pessoas que vivem na rua por motivos de alcoolismo/drogas e Q seja o conjunto daquelas cujo motivo para viverem na rua é a decepção amorosa. Escolhendo-se ao acaso uma pessoa no grupo pesquisado e supondo-se que seja igual a 40% a probabilidade de que essa pessoa faça parte do conjunto P ou do conjunto Q, então a probabilidade de que ela faça parte do conjunto interseção de P e Q é igual a: a) 12% b) 16% c) 20% d) 36% e) 52% Respostas dos alunos A b c d e 13% 13% 42% 15% 16% Este ítem atingiu 13% de acerto. Pelos dados apresentados, a porcentagem relativa ao conjunto P (alcoolismo/drogas) é de 36% e ao conjunto Q (decepção amorosa) é de 16%. Se a probabilidade da pessoa pertencer ao conjunto P ou ao conjunto Q é de 40%, então a probabilidade de que ela faça parte de intersecção de P e Q é de: 36% + 16% - 40% = 12% A alternativa C atraiu 42% das respostas. Esta questão teve além do baixo índice de acerto, ela mostra indícios que podem indicar alguma falta de adequação na aplicação do conteúdo de probabilidade no ensino médio. Esta questão ao ser analisada apresenta evidências relacionadas ao quanto sua resolução requer a habilidade de reconhecer o caráter aleatório dos fenômenos naturais e a necessidade de utilizá-lo em situações problema nos processos de contagem, representação de frequência relativas, construção de espaços amostrais, distribuição e 16 cálculo de probabilidades. No ENEM essa habilidade aparece registrada como a décima quinta. Esta questão é um pouco mais complexa do que a anterior, já que nela além do conceito intuitivo da probabilidade, temos que usar o conceito da probabilidade com união de eventos ou regra da adição de probabilidade, onde sendo A e B eventos de um conjunto S (universo), a P(A ∪ B) = P(A) + P(B) – P(A ∩ B). Considerações finais As representações gráficas existentes no ensino de Matemática, bem como a análise, construção e interpretação dos dados, a compreensão de diversos conceitos de medidas de tendência central, medidas de dispersão, e o senso crítico em relação a informações tendenciosas, não são simples e nem muito evidentes, disso decorre a importância dos alunos serem educados estatisticamente e probabilisticamente desde o início da escolaridade. A Educação Estatística deve se opôr à tradição da exatidão, e do determinismo muitas vezes presentes nas aulas de Matemática, ela deve envolver a exploração de situações de aprendizagem que priorizem o trabalho com estimativas, valores aproximados, aleatoriedade e análise de variáveis. Nas questões das provas de 2008 do SARESP e ENEM, destacadas neste artigo, observamos que o conteúdo solicitado, não era de um alto grau de complexidade, em nenhuma das duas questões, mas nenhuma das duas questões teve a porcentagem de acerto alta. O desenvolvimento do pensamento probabilístico e estatístico ainda vem sendo pouco explorado na educação básica brasileira. Para que a compreensão da noção de probabilidade e a aptidão para o cálculo da probabilidade sejam adquiridas é preciso que os alunos vivenciem a realização de experimentos probabilisticos, problematizem situações aleatórias, registrem observações, retirem conclusões e solucionem problemas. Um trabalho integrado de Educação Matemática e Educação Estatística faz-se necessário para que todos os estudantes possam adquirir conhecimentos os quais lhes são essenciais para a realização de atividades diárias e particularmente, para o desenvolvimento do pensamento científico. Todas as pessoas têm direito a ser alfabetizada probabilisticamente e estatisticamente e cada escola propriciar tal formação. Achamos também que como o Tratamento de informações bem como as 17 questões de Probabilidade, são itens importantíssimos, e que completam a atualização curricular de qualquer proposta sugerida, e não faltam justificativas para se explorar mais estes itens. E como os índices de acerto nas questões apresentadas foram muito baixos, deveríamos realmente explorar mais estas idéias. Principalmente se pensarmos que o planejamento escolar deve seguir um parâmetro curricular e ele deve ser articulado justamente com a diversidade dos contextos escolares existentes, então este eixo ligado ao Tratamento da informação, como é um eixo rico, ele merece um papel de destaque no sentido de desenvolver idéias de argumentação/decisão de nossos estudantes. Referências BRASIL. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Secretaria da Educação Básica. Brasília: MEC, 2006. _____. Parâmetros Curriculares Nacionais. 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