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Publicação do Curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina / Ano 13 - Nº 38 / 2º Semestre 2013
Políticas públicas, cooperação internacional e organizações não governamentais: o
caso da Comissão Internacional da Baleia
José Blanes Sala; Raquel Rivera Soldera
Introdução
A caça de baleias foi uma atividade
importante
para
o
desenvolvimento
econômico mundial, sendo muito lucrativa
durante os séculos XIX e XX para países
como o Japão, Noruega, Inglaterra,
Alemanha, Panamá, África do Sul, Brasil,
Chile e Estados Unidos. No entanto, a falta de
preocupação com a proteção e conservação
das baleias acarretou uma drástica redução no
número destes animais. Neste contexto, foi
criada em 1946 a Comissão Internacional da
Baleia, com o objetivo de regulamentar a caça
de baleias e definir números, espécies e locais
de caça para cada país.
Com o surgimento da preocupação
com a proteção ambiental, que tem início na
década de 1960, e a descoberta do petróleo e
de produtos sintéticos que substituíam o óleo
de baleia, em 1986 entrou em vigor uma
moratória à caça comercial de baleias,
estabelecida pela Comissão Internacional da
Baleia. Contudo, devido a uma série de
interesses econômicos e culturais, a moratória
é contestada por países que possuem
interesses na retomada da caça comercial de
baleias.
Os
animais
marinhos
são
transnacionais, e os cetáceos migram de uma
região para outra através dos mares para
alimentação e reprodução. Por esse motivo,
sua conservação depende de esforços
integrados entre os países que os abrigam.
Assim, enquanto países como os Estados
Unidos, Austrália, Canadá, Brasil, Chile,
África do Sul e Argentina investem na criação
de áreas protegidas para as baleias,
quantidades inimagináveis desses animais
continuam sendo abatidas em outras partes do
mundo. Dessa forma, não há dúvidas de que o
futuro das baleias depende do estabelecimento
e da efetivação de acordos internacionais, que
garantam a sua proteção e conservação.
Neste cenário, é importante analisar a
cooperação internacional no estabelecimento
de políticas públicas visando a preservação
ambiental, considerando as organizações não
governamentais (ONGs) como atores
internacionais que cada vez mais vêm
conquistando
espaço
nos
processos
decisórios, influenciando a agenda mundial e
participando diretamente da chamada
governança global.
Políticas públicas
Uma política pública é o resultado da
atividade política, onde decisões coletivas são
tomadas por diversos grupos que compõem a
sociedade.
Esses
grupos
apresentam
interesses, valores e objetivos divergentes.
O processo de elaboração de
políticas públicas também é conhecido como
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ciclo de políticas públicas, e compreende
algumas etapas: identificação do problema,
formação da agenda (agenda setting),
formulação de alternativas, tomada de
decisão, implementação, monitoramento e
avaliação da política pública. Importante
destacar que, na prática, tais etapas nem
sempre seguem este ciclo de maneira exata,
ocorrendo
muitas
vezes
de
forma
desordenada, onde as etapas se misturam e as
sequências se alternam (SECCHI, 2010;
SARAVIA, 2006).
Dye (apud SOUZA, 2006, p. 24)
define política pública como “o que o governo
escolhe ou não fazer”. Já Lowi (apud
SOUZA, 2006, p. 28) afirma que “cada tipo
de política pública vai encontrar diferentes
formas de apoio e de rejeição e que disputas
em torno de sua decisão passam por arenas
diferenciadas”. Assim, cada política pública
causa pontos ou grupos de veto e de apoio
diferentes, que são processados dentro do
sistema político também de maneira diferente
(SOUZA, 2006).
A formação da agenda, ou agenda
setting, é o segundo estágio do processo de
formação de uma política pública. Tem início
no momento em que a demanda sobre a qual o
governo decidiu agir torna-se uma questão
política, ou issue, em inglês (RODRIGUES,
2010).
Apesar de não haver consenso
conceitual quanto a uma definição de política
pública, há uma concordância de que o seu
estabelecimento advém da tentativa de
resolução de um problema, considerado
relevante de maneira coletiva. Assim,
podemos dizer que o problema público é a
essência conceitual de políticas públicas
(SECCHI, 2010).
Alguns
atores
que
estão
constantemente preocupados em identificar
problemas públicos são os agentes políticos,
os partidos políticos e as ONGs (SECCHI,
2010). No entanto, um problema só se torna
público quando, além de ser considerado um
problema relevante para a coletividade,
conquista a atenção e o interesse de algum
ator político na resolução deste problema.
Este problema público passa, então, a compor
a agenda política deste ator político.
Por este motivo, nos estudos sobre o
ciclo de políticas públicas, a questão mais
latente é exatamente sobre o processo de
formação da agenda: por que alguns
problemas ganham espaço na agenda política,
e outros não? (RODRIGUES, 2010).
A resposta a essa questão depende de
outros fatores, como a liderança política em
vigor e as expectativas sociais, variáveis que
compõem o que Kingdon nomeia multiple
streams (múltiplos fluxos ou correntes
múltiplas, em português), onde um problema,
um fluxo político e um fluxo da política
pública
são
catalisados
pela
ação
empreendedora de um líder político
(RODRIGUES, 2010). Tais fluxos ainda
contam com a atuação de atores específicos
em cada um deles e seus respectivos
contextos, que podem se transformar em
janelas de oportunidade através da atuação de
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empreendedores de políticas (PERDICARIS,
2009).
Este modelo apresentado por
Kingdon mantém o foco em dois estágios
anteriores ao estágio de tomada de decisão: a
formação da agenda e as alternativas para a
formulação das políticas (CAPELLA, 2006).
Para Kingdon, um problema torna-se
relevante para fazer parte de uma agenda por
meio
de
três
mecanismos
básicos:
indicadores; eventos, crises e símbolos; e
feedback das ações governamentais, que
podem levar os formuladores de políticas a
visualizarem uma questão como problemática
(CAPELLA, 2006). O modelo de Kingdon
ajuda a entender a importância do contexto no
processo de definição da agenda, como
momento político, tempo, realidade e
alternativas que devem ser consideradas na
formação da agenda e da formulação das
políticas públicas.
Segundo Subirats (2006), um
problema pode não fazer parte da agenda
devido à limitação de recursos humanos e
econômicos, falta de vontade política, falta de
pressão dos grupos de interesse e da mídia.
Por outro lado, um problema pode se
converter em problema público quando
alcança a proporção de crise, não podendo ser
ignorado; quando chama a atenção da mídia;
quando adquire importância global; quando
conquista grande notoriedade pública, por ter
relação direta com temas da atualidade.
Nesta trilha, pode-se concluir que a
preocupação com a proteção ao meio
ambiente atende aos aspectos mencionados
por Subirats: apesar de ser uma questão
bastante recente, já alcançou a dimensão de
crise, chamando a atenção da mídia,
conquistando alcance global, além de atingir
notoriedade pública e ser uma temática
extremamente atual. Nas palavras de
Rodrigues (2003, p. 99): “o meio ambiente é
um dos temas que melhor exemplificam o
fenômeno da interdependência mundial (...)
porque a degradação ambiental, produzida por
países desenvolvidos e em desenvolvimento,
gera consequências globais e somente pode
ser combatida com resultados favoráveis
mediante decisões multilaterais, envolvendo a
maioria da comunidade internacional”.
Essas características, aliadas à
trajetória da caça de baleia – que resultou no
desaparecimento de inúmeras espécies de
baleia –, contribuíram para que a caça de
baleias alcançasse status de problema público,
ganhando espaço na agenda política
internacional, onde as ONGs converteram-se
em atores fundamentais nas questões
ambientais.
Cooperação internacional
Segundo Subirats et al., (2008, p.
33), “toda política pública aponta para a
resolução de um problema público
reconhecido
como
tal
na
agenda
governamental”. Com a globalização, as
atividades dos Estados estão submetidas às
relações internacionais, e, dessa forma, as
políticas exteriores são hoje entendidas como
políticas públicas. Neste cenário, os Estados,
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apesar de continuarem sendo um ator central e
insubstituível no sistema internacional,
passam a coexistir com outros atores, como as
organizações internacionais (VILANOVA,
2000).
Este
pluralismo
no
sistema
internacional, e a interação entre diferentes
atores sociais e políticos, é que atualmente
define os processos de decisão, onde a
supremacia do Estado é limitada pela
necessidade de colaboração entre os atores
públicos e privados (FERNÁNDEZ, 2000).
As
relações
de
cooperação
internacional são institucionalizadas pelas
organizações internacionais e pelas ONGs.
Para Matias (2005, p. 258): “as organizações
internacionais são mais um reflexo de
aumento da interdependência dos povos, a
principal forma encontrada pelos Estados para
reagir aos problemas decorrentes da atividade
transnacional – de caráter eminentemente
coletivo”.
As organizações internacionais são
interestatais, possuem estrutura com órgãos
permanentes, e os seus Estados-membros
precisam expressar sua vontade de tornaremse membros (MATIAS, 2005). Além disso, as
organizações internacionais são, ao mesmo
tempo, atores do sistema internacional, visto
que possuem uma certa autonomia relativa em
relação
aos
Estados-membros,
têm
personalidade jurídica e elaboram políticas
próprias, e mecanismo de cooperação entre
Estados e outros atores, podendo, além de
favorecer a legitimação de normas e regras,
coagir atores a respeitar normas e regras
através de pressão política, imposições
políticas em certas circunstâncias, e até o uso
de força militar quando se fizer necessário
(HERZ; HOFFMAN, 2004).
As ONGs são privadas e voluntárias,
e no âmbito internacional são constituídas por
membros individuais ou coletivos de diversos
países. Ao contrário das organizações
internacionais,
as
ONGs
não
têm
personalidade jurídica internacional, sendo
registradas como entidades sem fins
lucrativos, de acordo com a legislação
nacional de onde atuam.
As ONGs são um tipo particular de
sociedade civil global (HERZ; HOFFMAN,
2004) ou transnacional (MATIAS, 2005).
Entende-se por sociedade civil global ou
transnacional aquela que perpassa as
fronteiras do Estado, estendendo-se por todo o
globo (HERZ; HOFFMAN, 2004), mas que
preocupa-se
com
assuntos
públicos
(MATIAS, 2005). Tais características tornam
as ONGs os atores mais importantes da
sociedade civil global ou transnacional,
“permitindo que grupos de diversos países se
unam em torno dos mesmos objetivos”
(MATIAS, 2005, p. 449).
Neste cenário, as ONGs aparecem
tanto
como
colaboradoras,
como
confrontando algumas posições assumidas
pelos Estados, através de campanhas
direcionadas de maneira direta à opinião
pública global, pressionando os Estados a
mudar a política adotada ou realizar reformas
específicas (HERZ; HOFFMAN, 2004). O
fato é que a participação das ONGs nos
processos decisórios das organizações
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internacionais pode ser considerada um
elemento
democratizante
da
política
internacional, mas também pode ser vista
como um instrumento de manutenção da
hegemonia Ocidental (HERZ; HOFFMAN,
2004), fortalecendo valores considerados
“universais”, que também são adotados pela
comunidade internacional (MATIAS, 2005).
Muito se discute sobre governança
pública na literatura de administração pública
e ciências políticas, “entendida como um
modelo de interação horizontal entre atores
estatais e não estatais no processo de
construção de políticas públicas” (SECCHI,
2010, p. 93), que é efetivada com mecanismos
participativos de deliberação e avaliação das
políticas públicas. As ONGs, que fazem parte
das organizações do terceiro setor, “articulam
suas ações na busca de um interesse
primordialmente coletivo (externo ao grupo)”
(SECCHI, 2010, p. 93). Assim, pela defesa de
interesses coletivos, “as organizações do
terceiro setor são chamadas para participar
tanto na tomada de decisão como na
implementação e avaliação das políticas
públicas” (SECCHI, 2010, p. 93-94).
No entanto, as ONGs, em alguns
casos, conseguem determinar a agenda
mundial, devido ao seu poder de domínio e
divulgação da informação, criando um
discurso global unificado sobre determinados
temas – como o meio ambiente, por exemplo.
Com isso, podemos dizer que as ONGs
“estariam adquirindo a capacidade de
participar, direta ou indiretamente, na
chamada ‘governança global’” (MATIAS,
2005, p. 451).
Governança global é um conjunto de
relações intergovernamentais, caracterizado
pela interdependência dos povos e não mais a
predominância da soberania do Estado no
âmbito nacional e internacional, com uma
participação
ampliada
nos
processos
decisórios,
envolvendo
atores
não
governamentais (GONÇALVES; COSTA,
2011).
Comissão Internacional da Baleia
Durante mais de três séculos, os
produtos derivados de baleia foram itens de
primeira necessidade para a sobrevivência dos
moradores do ocidente, que iam desde a
alimentação até materiais utilizados na
construção
de
casas
e
prédios.
(CASTELLUCCI JUNIOR, 2009). Nesta
época, não havia qualquer preocupação com o
esgotamento dos recursos naturais, e o único
objetivo existente era a matança do maior
número de baleias possível. Como
consequência dessa exploração abusiva e
depredatória, em meados de 1930, foi
observado um decréscimo no número de
baleias em âmbito mundial (PALAZZO;
PALAZZO JR., 1989). Como não houve
qualquer medida para garantir o mínimo de
sobrevivência da espécie, o resultado foi o
desaparecimento de muitas espécies de
baleias
neste
período
(PALAZZO;
PALAZZO JR., 1989).
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Diante deste cenário de caça
desenfreada no mundo todo, em dezembro de
1946 foi firmada a Convenção Internacional
para a Regulamentação da Pesca da Baleia,
com o objetivo de regulamentar a caça de
baleias para assegurar a conservação e o
aumento da espécie, evitando uma crise geral
de ordem econômica e alimentar e
salvaguardando, assim, as espécies de baleias
para as gerações futuras. Através desta
Convenção
foi
criada
a
Comissão
Internacional
da
Baleia
(CIB),
ou
International Whaling Commission (IWC, em
inglês), em 2 de dezembro de 1946, para
implementar os objetivos econômicos e
ambientais previstos neste tratado.
Com o despertar para as questões
ambientais na década de 1960, a população
mundial já demonstrava sua insatisfação com
a caça de baleias, através da realização de
protestos (PALAZZO; PALAZZO JR., 2011).
Com a descoberta do petróleo e,
posteriormente, de uma grande variedade de
substâncias vegetais e produtos sintéticos em
substituição ao óleo de baleia, a caça tornouse totalmente dispensável, já na década de
1970 (PALAZZO; PALAZZO JR.,1989).
Neste cenário, em 1982 a Comissão
Internacional da Baleia aprovou uma
resolução proibindo a caça comercial de
baleias a partir do ano de 1986. Tal moratória
ainda é discutida nos dias de hoje nas
reuniões da Comissão Internacional da Baleia,
haja vista que alguns países têm interesse na
retomada comercial da caça de baleias.
Atualmente, apenas o Japão sustenta
atividades de caça de baleia de alguma escala,
enquanto a Noruega e a Islândia continuam
caçando baleias em suas próprias águas,
utilizando-se de uma objeção formal à
moratória
adotada
pela
Comissão
Internacional da Baleia em 1986, com o
objetivo de exportar carne e gordura extraídas
das baleias para o Japão (PALAZZO;
PALAZZO JR., 2011).
Atualmente,
a
Comissão
Internacional da Baleia é composta por 89
Estados-membros, cuja participação não é
restrita aos países com algum envolvimento
na atividade baleeira, e adota o princípio de
“um Estado por voto”, respeitando o princípio
da igualdade de soberania entre os Estados no
processo decisório.
Até o momento, foram adotados três
Santuários para Baleias pela Comissão
Internacional da Baleia: no Oceano Sul
(mantido até 1955), no Oceano Índico, e no
Oceano Austral (ambos em vigor). Existem
propostas para que sejam criados Santuários
para Baleias no Atlântico Sul, proposto pelo
Brasil, em conjunto com a Argentina, e no
Pacífico Sul, proposto pela Austrália e Nova
Zelândia. Contudo, no processo de aprovação
desses Santuários, os países conservacionistas
obtêm uma maioria simples, mas não
alcançam a maioria qualificada de ¾ dos
votos devido à influência do Japão, que tem
cooptado países pequenos, que têm voto na
Comissão Internacional da Baleia, para
integrar o bloco baleeiro japonês, formado por
várias ilhas do Caribe, ilhotas do Pacífico, e
alguns dos países mais pobres da África,
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como Ilhas Salomão, Grenada, Kiribati,
Nauru, Suriname e Gabão, oferecendo ajuda
financeira para que esses países votem
alinhados com o Japão nas reuniões da
Comissão (PALAZZO; PALAZZO JR.,
2011).
Neste cenário, a dificuldade de
aprovação da proposta de criação de um
Santuário de Baleias no Atlântico Sul enuncia
um dos maiores desafios nas ações de
conservação das baleias e da biodiversidade
marinha, que relaciona-se diretamente à
necessidade de articulação e cooperação
internacional para a efetivação e respeito às
Convenções e legislações, nacionais e
internacionais, de proteção ao meio ambiente,
além de questionar o papel dos órgãos
intergovernamentais
criados
para
a
conservação ambiental, como é o caso da
Comissão Internacional da Baleia.
Nas
reuniões
da
Comissão
Internacional da Baleia, as ONGs participam
dos processos decisórios na qualidade de
observadoras, visto que muitas possuem
expertise sobre questões relacionadas aos
cetáceos. Essa capacidade de fornecer
informações específicas faz com que as ONGs
sejam ouvidas e acabem por influenciar na
produção de normas e aprovação de políticas
também no âmbito da Comissão Internacional
da Baleia.
A informação e o conhecimento
técnico aliados ao apoio popular é que
permitem a participação das ONGs no
processo de tomada de decisões internacionais
(MATIAS, 2005). Como exemplo da
influência das ONGs na Comissão
Internacional da Baleia, podemos citar o
processo de estabelecimento da moratória da
caça comercial de baleias, cuja decisão teve
grande influência de uma campanha contra a
caça de baleias realizada pela organização
não-governamental internacional Greenpeace,
que chocou a opinião pública mundial com
imagens da caça desses mamíferos, em 1975
(HERZ; HOFFMAN, 2004). Com isso, o
apoio
público
colaborou
para
a
implementação da decisão pela moratória da
caça comercial de baleias.
A influência das ONGs sobre a
opinião pública faz com que seja possível
“exercer uma pressão política capaz de afetar
o comportamento dos demais atores do
cenário global” (MATIAS, 2005, p. 452).
Mas além desta atuação indireta, as ONGs
também atuam de maneira direta. No caso da
Comissão Internacional da Baleia, além de
influenciarem
o
processo
decisório,
monitoram o cumprimento dos acordos
estabelecidos, como a atuação das ONGs
internacionais Greenpeace e Sea Shepherd
Conservation Society.
Considerações finais
No atual cenário mundial em que
vivemos, não há como se analisar decisões
políticas sem considerar aspectos de ordem
global, como a sociedade global e a
governança global, já que assuntos de
interesse coletivo cada vez mais assumem
posição de importância na agenda mundial.
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Este cenário acarreta uma reorganização do
papel e da interação entre Estado, instituições
políticas, econômicas e sociais, e organismos
internacionais, onde os Estados, apesar de
continuarem sendo um ator central e
insubstituível no sistema internacional,
passam a coexistir com outros atores, como as
organizações
internacionais,
assumindo
compromissos de caráter internacional através
do estabelecimento de acordos, convenções e
tratados.
A preservação do meio ambiente é
atualmente um dos principais temas da
agenda das reuniões internacionais, e as
ONGs, hoje um dos atores mais importantes
da sociedade civil global, apresentam cada
vez mais informação e conhecimento técnico,
que acabam influenciando o processo
decisório internacional. Além disso, devido ao
seu poder de domínio e divulgação da
informação, que resultam na sua capacidade
de influenciar a opinião pública, as ONGs
conseguem determinar a agenda mundial,
despontando como atores fundamentais de
proteção às legislações ambientais nacionais e
internacionais, em um ambiente cada vez
mais influenciado por forças e interesses
diversos e conflituosos.
No
âmbito
da
Comissão
Internacional da Baleia, atualmente integrada
por dois grupos de países com interesses
opostos, a participação das ONGs nos
processos decisórios tem se mostrado cada
vez mais primordial para a garantia e
efetivação da proteção dos cetáceos, que
migram de uma região para outra através dos
mares para alimentação e reprodução, e cuja
conservação depende de esforços integrados
entre os países que os abrigam.
Enquanto a cooperação internacional
não se mostra realmente eficaz nos processos
de governança global ambiental, a atuação das
ONGs se faz cada vez mais necessária, uma
vez que, por questões diplomáticas, nem
sempre os Estados estão dispostos a assumir
posições firmes na proteção ambiental, se
houver a possibilidade de serem prejudicados
em
outras
questões
internacionais,
especialmente as de cunho comercial e
econômico.
José Blanes Sala é professor adjunto da
Universidade Federal do ABC. Doutor e
Mestre em Direito Internacional pela
Universidade de São Paulo. Graduado em
Direito pela Universidade de São Paulo. Email: [email protected].
Raquel Rivera Soldera é graduada em
Administração pelo Centro Universitário
Fundação Santo André e em Direito pela
Universidade Municipal de São Caetano do
Sul (USCS). Mestranda em Ciências
Humanas e Sociais pela Universidade Federal
do ABC. E-mail: [email protected].
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