organização do estado

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ORGANIZAÇÃO DO ESTADO
A Constituição Federal trata da organização do Estado brasileiro a partir do seu artigo 18,
onde dispõe que “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil
compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos
termos desta Constituição.”
Nos quatro parágrafos do artigo supracitado, a Constituição vai dispor sobre os territórios
federais, dizendo que estes integram a União, e irá tratar também da incorporação,
subdivisão, fusão e desmembramento de Estados e Municípios.
Estas disposições constitucionais tratam da base da organização do Estado brasileiro e o
caput do artigo 18 da CF, revelando o tipo de estrutura que os legisladores constituintes
elegeram para o nosso Estado: a Federação.
O conceito de Estado
Antes de adentrarmos no estudo da Federação, necessário é buscarmos o conceito de
Estado, uma vez que aquela pressupõe a existência deste. Assim, segundo Celso Ribeiro
Bastos, “Estado é a organização juridicamente soberana de um povo em um dado
território”.[1]
Tendo à frente essa conceituação de Estado, mencionaremos agora as diversas formas pelas
quais este se organiza e se estrutura. Há três regimes jurídicos distintos em que o Estado
pode se configurar e se manifestar, resultando em diferentes formas de Estado, formas de
governo e sistemas de governo.
Formas de Estado
As formas de Estado, que são as maneiras pelas quais este se estrutura dentro de seu
território, com relação a sua descentralização político-administrativa, ensejariam a ocorrência
de um Estado Unitário ou de um Estado Composto, sendo que neste último gênero se insere
a espécie denominada de Estado Federal. Este último é que examinaremos logo adiante com
maior riqueza de detalhes.
Formas de Governo
A Monarquia, oriunda do vocábulo grego monarchia, governo de um só, apresenta como
elementos caracterizadores a vitaliciedade, a hereditariedade e a irresponsabilidade do Chefe
de Estado, podendo ser absoluta ou relativa. Na primeira o poder está totalmente em mãos de
um único governante, enquanto que na segunda há uma limitação do governante em face da
existência de um texto constitucional que deve ser por ele obedecido. Esta última é também
denominada de Monarquia Constitucional e encontra existência, por exemplo, no Japão, na
Espanha, na Grã-Bretanha, e, ainda, existiu em nosso país na época do Brasil-Império.
A República, da expressão em latim res publica (coisa pública), por usa vez, representa
forma de governo bastante diferente da Monarquia, uma vez que é a verdadeira expressão do
governo do povo, pelo povo e para o povo, caracterizando-se pela eletividade dos seus
governantes, pela temporariedade de mandatos e responsabilidade do Chefe de Estado.
Temos inúmeros exemplos de governos republicanos, tais como o Brasil, os Estados Unidos,
a Alemanha etc.
Sistemas de governo
E, ainda, temos os sistemas de governo, que seriam os regimes estabelecidos para os
relacionamentos entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, podendo ser o sistema
presidencialista (exemplo: Brasil) ou o parlamentarista (exemplo: Portugal).
No presidencialismo os poderes Executivo e Legislativo são independentes. O Presidente da
República acumula as funções de chefe de Estado e chefe de governo. Ele é eleito pelo povo,
direta ou indiretamente, por tempo determinado, não havendo possibilidade de destituição
pelo Parlamento, a não ser em raras situações que possam culminar com um processo de
impeachment.
Já no Parlamentarismo há uma interdependência entre os poderes Legislativo e Executivo,
onde a chefia de Estado é exercida pelo Presidente (na República) ou pelo Monarca (na
Monarquia) e a chefia de governo é exercida pelo Primeiro Ministro. Este último não possui
mandato por prazo certo, podendo ser destituído a qualquer tempo quando não mais gozar do
apoio do Parlamento ou pela aprovação de moção de desconfiança. Neste sistema, há ainda
a possibilidade de dissolução do Parlamento pelo chefe de Estado, com a convocação de
novas eleições.
SISTEMA POLITICO – Democracia ou autocracia
O conceito de Estado Unitário
O Estado Unitário é caracterizado pela centralização do poder, pela existência de uma única
unidade de emanação de poder político interno.A produção legislativa fica a cargo de um
único poder central, com aplicação sobre todo o território nacional.
O conceito de Estado Federal
A Federação, que merecerá agora a maior parte da nossa atenção, é subespécie do Estado
composto ou complexo, do qual fazem parte também a União pessoal (união de dois ou mais
Estados sob o governo de um único monarca), a União Real (união de dois ou mais Estados
sob a regência do mesmo monarca, mas cada reino mantendo a sua organização interna) e a
Confederação (união de Estados soberanos, que conservam sua soberania, para consecução
de fins comuns).
Na Federação há a união de dois ou mais Estados que formam um novo ser estatal, onde
este é soberano e aqueles possuem somente autonomia política.
Soberania e autonomia
Distinção entre soberania e autonomia: Um Estado soberano é aquele cujo poder
não está limitado pelo Direito. A soberania de um Estado lhe coloca em posição de igualdade
com outros Estados no cenário internacional, e, ao mesmo tempo, em posição de
superioridade dentro do seu limite territorial com relação ao demais poderes internos.(Interno
e externo)
A autonomia, por seu turno, é aquele conjunto de competências atribuídas a uma
pessoa, que pode exercê-las dentro de certos limites. Uma unidade autônoma não é
soberana, porque ela é limitada pelo Direito. Ela exerce os seus poderes dentro de uma
moldura cujos limites são definidos pela Constituição de um Estado.
Soberania e autonomia
Origem da Federação
A origem da formação do Estado federal deita suas raízes na história da concepção dos
Estados Unidos da América. Em 1776, as antigas treze colônias da Inglaterra na América do
Norte, ao tornarem-se independentes, resolveram unir esforços para a criação de uma
abrangente entidade central que pudesse representá-las e defendê-las em assuntos de
interesse comum de todas as colônias, criando assim, em 1778, uma espécie de
Confederação de Estados independentes. Esta união foi firmada por um documento
denominado de Artigos da Confederação, que entrou em vigor a partir de 1781, cujo texto
guardava semelhança com as Constituições dos Estados, as quais já dispunham sobre:
separação de poderes, Congresso Bicameral e Declaração de Direitos (Bill of Rights).
No entanto, a Confederação não teve vida longa. Isto porque o liame que unia os Estados,
independentes e soberanos, era muito vulnerável, e o poder central que fora criado não se
mostrou capaz de atender os anseios das unidades confederadas, pois a unidade central
existente era apenas uma assembléia de representantes dos Estados, sem autoridade sobre
os indivíduos de cada Estado e desprovida de soberania.[2]
Assim, em 14 de Maio de 1787, na cidade de Filadélfia, reunidos em uma convenção, para
rever o pacto formado entre as antigas colônias, os Estados decidiram aprovar uma nova
carta, a Constituição dos Estados Unidos da América.
A Constituição Federal do EUA, então, fixou as bases sobre a qual se assentaria o novo
Estado federativo norte-americano, estabelecendo um novo pacto entre os Estados antes
soberanos e independentes que, agora, abdicavam desses poderes em prol do novo poder
central. Dentro dessa nova união, a Federação, os Estados gozavam somente de autonomia.
As entidades que comporiam a Federação norte-americana, portanto, seriam o poder central
(a União) e as unidades federadas (os Estados). “A supremacia do poder federal veio com a
aceitação pelos Estados da Constituição Federal, impondo a superioridade da União, em face
da legislação dos Estados, como também da legislação federal”.[3]
Traços comuns das federações
Embora cada Federação, atualmente, tenha as suas próprias características, todas elas, para
que assim sejam classificadas, possuem alguns traços comuns, sem os quais o Estado se
afastaria do conceito básico de Federação. Luiz Alberto David Araújo organizou, em excelente
trabalho doutrinário[4], esses característicos do Estado federal, procurando demonstrar todos
os elementos que deve integrar o conceito genérico de Federação. Estas características
comuns, portanto, podem assim ser elencadas:
(1) a existência de pelo menos duas ordens jurídicas distintas, a central e a periférica; (2)
autonomia das unidades federadas, revelada pela repartição constitucional de competências;
(3) rigidez da Constituição Federal;
(4) indissolubilidade do pacto federativo;
(5) possibilidade de manifestação de vontade das unidades parciais, de maneira isonômica,
por meio de representantes no Senado Federal;
(6) a existência de um órgão guardião da Constituição;
(7) possibilidade de intervenção federal nos Estados para a manutenção do pacto federativo.
Examinaremos agora cada uma dessas características:
(1) A co-existência do poder central com vontades parciais autônomas é o cerne do pacto
federativo, é o objeto do acordo federalista. A Federação reconhece e pressupõe a
convivência dessas distintas esferas de poderes, sem as quais não haveria sentido em se
falar em Estado federal, pois aí estaríamos diante de outra forma de Estado.
(2) As unidades federadas devem ter a possibilidade de exercer certas competências com
autonomia, ou seja, as vontades parciais devem ter o poder de se auto-organizar, de realizar,
de se manifestar livremente sobre certos assuntos, sem a interferência da vontade central.
Esta é a parcela de autonomia que, obrigatoriamente, os Estados federados devem possuir
para seja caracterizada a Federação. E esta autonomia se verifica pela repartição de
competências atribuídas pela Constituição Federal, variando somente o grau ou o critério de
descentralização. Não se trata, portanto, de distribuição de competências pelo poder central,
mas sim de competências concedidas pela Constituição Federal, para que não haja
interferência de uma esfera de poder sobre a outra. Por isto, ainda, tampouco estas
competências podem advir de leis ordinárias, para que não possam ser suprimidas ou
modificadas ao talante do poder federal, o que quebraria a estabilidade do pacto federativo.
(3) O Estado Federal, necessariamente, possui como documento que o institui e o organiza a
Constituição Federal. E esta é imprescindível, uma vez que ela é que determina as bases em
que se assenta a Federação. É o acordo de vontades, contrato escrito, que regerá a vida de
todas as partes envolvidas no pacto federativo. Desta premissa surge a outra característica
comum a todas as federações, qual seja, a rigidez constitucional. Por isto, não basta a
existência da Constituição, ela tem que ser rígida, assim conceituada como aquele documento
que exige um processo mais solene e dificultoso para a sua alteração do que aquele previsto
para as leis infraconstitucionais. Esta rigidez se constitui em garantia do pacto federal, de
modo que este restará protegido de uma tentativa de alteração, sem que realmente haja um
forte desejo da sociedade nesse sentido. Inclusive, há autores que defendem que esta rigidez
deve estar alçada à condição de cláusula pétrea, não podendo a Federação ser abolida em
nenhuma hipótese.
(4) A indissolubilidade seria outro elemento sine qua non da Federação, pois a proibição
dirigida aos seus membros de dela se retirar é parte intangível, implícita e integrante do pacto
federativo. Seria impensável uma Federação em que qualquer um dos seus integrantes
pudesse deixá-la a qualquer tempo. As unidades federadas, quando da aquiescência ao pacto
federativo, deixam de ter soberania e, por via de conseqüência, também abdicam do poder de
se afastar da Federação. Nisto reside a diferença nuclear entre esta e a Confederação, ou
seja, nesta última os Estados ainda reservam para si o direito de secessão, o que não se
verifica na federação.
(5) A possibilidade dos Estados membros de participar na formação da vontade central é
ínsita ao pacto federal. Quando do nascimento do Estado federativo, os seus membros já
exercem esta vontade ao criar o órgão central. Esta característica irá, necessariamente,
permear todas as manifestações do governo central. Este age em nome de todos os
componentes da federação e, por isto, a sua manifestação se dá com a participação ou
aprovação dos Estados membros, que se perfaz com a eleição de representantes perante o
Senado Federal. O órgão legislativo federal, portanto, deve contar com representantes do
povo (Câmara do Deputados) e com representantes dos Estados (Senado). E esta
participação das unidades federadas deve contar com número igual de representantes.
Nenhum Estado pode ser privilegiado com mais representantes eleitos do que os outros e
nenhum Estado pode ser prejudicado com um menor número deles, para que haja harmonia e
equilíbrio no pacto federativo.
(6) Para controlar toda a distribuição de competências federativas e de modo a manter
funcionando harmoniosamente a federação, mister se faz a existência de um órgão que
dirimirá os conflitos que possam surgir neste relacionamento entre os membros do Estado
Federal. Este órgão exercerá função das mais relevantes e por isso deve ser neutro, para que
as ordens jurídicas, eventualmente em litígio, possam receber uma solução jurídica imparcial.
Este órgão deve pertencer ao Poder Judiciário, posto que este é que enfeixa em suas mãos
todas estas propriedades, capazes de estabelecer o equilíbrio desejado para o bom
funcionamento do acordo de vontades das entidades federadas. Importante dizer que a
atuação do órgão do Judiciário que exercerá esta função deverá basear suas decisões na
Constituição Federal, que é o documento onde se encontram as diretrizes para a solução de
todo e qualquer conflito federativo.
(7) Por derradeiro, temos outro importante característico comum da Federação, instrumento
de defesa do próprio pacto federal em situações de maior gravidade: é o instituto jurídicoconstitucional da intervenção federal. Por meio desta ao órgão central federal é permitido
intervir em determinado Estado federado, para que sejam combatidas certas condutas ou
omissões atentatórias ao pacto federativo. Assim, a União recebe poderes explícitos para agir
em nome dos demais Estados e decreta a intervenção federal em um Estado, objetivando
fazer cessar uma situação que esteja ameaçando a Federação. Nesta hipótese, a autonomia
do Estado membro fica temporariamente afastada, dando lugar à manifestação de poder da
vontade central, até que cesse a situação que ensejou a intervenção. É bom dizer que se trata
de situação anormal, rara e sujeita a verificação da ocorrência de diversos requisitos, tudo
lastreado nos comandos previstos no Texto Constitucional que disciplinam a matéria.
Repartição constitucional de competências
Competências são os poderes conferidos à determinada pessoa ou entidade pelos quais ela
tem a possibilidade de fazer prevalecer a sua vontade ou para realizar suas funções.
A Constituição Federal brasileira adota a técnica de repartição de competências entre as
unidades federadas tendo em vista a predominância de interesses, cabendo, assim, à União
as competências de caráter geral, aos Estados as de predominante interesse regional,
enquanto que aos Municípios caberão as competências referentes aos assuntos de interesse
local.
Assim sendo, as competências atribuídas pela Constituição Federal brasileira às entidades
federadas podem ser assim classificadas:
(I) Competências da União
(a) Materiais privativas: artigo 21;
(b) Legislativas privativas: artigo 22;
(c) Comuns: artigo 23;
(d) Legislativas concorrentes: artigo 24.
(II) Competências dos Estados
(a) Remanescentes (materiais e legislativas): artigo 25, par. 1º ;
(b) Legislativas privativas: artigo 25, pars. 2o e 3o ;
(c) Comuns: artigo 23;
(d) Legislativas concorrentes: artigo 24;
(e) Legislativas suplementares: artigo 24, par. 2o;
(f) Legislativas supletivas: artigo 24, par. 3o .
(III) Competências dos Municípios
(a) Comuns: artigo 23;
(b) Legislativas privativas: artigo 30, inciso I;
(c) Legislativa suplementar: artigo 30, inciso II
No tocante à competência residual, que na regra geral cabe aos Estados Membros e ao DF,
em matéria tributária a competência residual pertence à União, nos moldes do art. 154, I da
CF/88.
[1] In Curso de Direito Constitucional, 9a edição, Saraiva, pág. 8.
[2] Esta precariedade do pacto confederativo norte-americano é bem retratada pela expressão
cunhada na época: rope of sand. Por meio desta se queria dizer que a união entre os Estados
norte-americanos era ligada por uma “corda de areia” e por isto não teve êxito em manterem
unidas as unidades em torno da Confederação.
[3] Janice Helena Ferreri in Por uma nova Federação, 1995, RT, pág. 18.
[4] In Por Uma Nova Federação, 1995, RT, págs. 39-52.
DIREITOS FUNDAMENTAIS
TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Conceito
“Direitos fundamentais são os considerados indispensáveis à pessoa humana, necessários
para assegurar a todos uma existência digna, livre e igual.”[1]
A definição desses direitos denominados de fundamentais envolve diferentes aspectos. Numa
acepção material, podemos afirmar que eles dizem respeito aos direitos básicos que o
indivíduo, natural e universalmente, possui em face do Estado. Depois, em acepção formal, os
direitos são considerados fundamentais quando o direito vigente em um país assim os
qualifica, normalmente estabelecendo certas garantias para que estes direitos sejam
respeitados por todos.
Outras definições
Tendo em vista a profusão de termos utilizados quando se fala sobre direitos fundamentais,
causando uma certa confusão de significados, importante se faz apresentar algumas
definições nesta seara.
Direitos fundamentais. Como já dissemos, em sua acepção formal, são aqueles direitos
básicos do indivíduo e do cidadão, reconhecidos pelo direito positivo do Estado, que exige
deste ou uma abstenção ou uma atuação no sentido de garantí-los. No Brasil, essa expressão
engloba vários direitos, tais como: os individuais, os coletivos, os difusos, os sociais, os
nacionais e os políticos.
Direitos do homem. Seriam os direitos referentes à condição do indivíduo enquanto ser
humano, que, portanto, se estendem à toda humanidade, em todos os lugares, sem limitação
temporal. Estes direitos se baseariam no conceito de direito natural, os quais não
necessitariam de serem criados pelo direito positivo, mas tão somente de serem reconhecidos
e declarados, em razão de serem verdadeiros direitos humanos, expressão esta utilizada
como sinônima de direitos do homem.
Direitos do cidadão. Esta expressão abarca dois tipos de direitos: os direitos naturais, que
seriam aqueles inerentes à própria existência humana; e os direitos civis, que pertencem ao
ser humano enquanto participante de uma coletividade social civil.
Direitos políticos. Estes se constituem naqueles direitos decorrentes da cidadania, se
subdividindo em direitos políticos positivos e negativos. Os primeiros concedem ao cidadão o
poder de participar da vida política do país por meio de diferentes formas: o voto, o plebiscito,
o referendo, a iniciativa popular de leis e por meio da propositura de ação popular. Os direitos
políticos negativos, por seu turno, permite ao cidadão se candidatar e ser votado nas eleições
para cargos públicos, representando o povo, também conhecidos como direito de
elegibilidade.
Não obstante todas essas conceituações, “a expressão direitos fundamentais é a mais
precisa. Primeiro, pela sua abrangência. O vocábulo direito serve para indicar tanto a situação
em que se pretende a defesa do cidadão perante o Estado como os interesses jurídicos de
caráter social, político ou difuso protegidos pela Constituição. De outro lado, o termo
fundamental destaca a imprescindibilidade desses direitos à condição humana.”[2]
Histórico
A história dos direitos fundamentais está diretamente ligada ao aparecimento do
constitucionalismo, no final do século XVIII, que, entretanto, herdou da idade média as idéias
de contenção do poder do Estado em favor do cidadão, sendo exemplo mais relevante neste
sentido a célebre Magna Carta, escrita na Inglaterra, em 1215, pela qual o Rei João Sem
Terra reconhecia alguns direitos dos nobres, limitando o poder do monarca.
Com a Revolução Francesa, em 1789, se acentuaram os movimentos e documentos escritos
que buscavam garantir aos cidadãos os seus direitos elementares em face da atuação do
poder público. Um dos documentos mais conhecidos neste sentido foi a denominada
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, produto daquela revolução
ocorrida em território francês.
Pouco antes disso, porém, outro documento entrava para a história, como resultado de outra
revolução, a Americana. A Declaração de Virgínia, elaborada em 1776, procurava
estabelecer os direitos fundamentais do povo norte-americano, tais como a liberdade, a
igualdade, eleição de representantes etc.
Em 1948, logo após a 2a Guerra Mundial, a Organização das Nações Unidas fazia editar a
Declaração Universal dos Direitos do Homem, estendendo para praticamente todo o
mundo o respeito e a proteção aos direitos fundamentais do ser humano.
Paulo Bonavides, comentando sobre a importância das declarações dos direitos do homem,
enaltecendo aquela nascida na França, em mais uma lição magistral, ensina que:
“Constatou-se então com irrecusável veracidade que as declarações antecedentes de
ingleses e americanos podiam talvez ganhar em concretude, mas perdiam em espaço de
abrangência, porquanto se dirigiam a uma camada social privilegiada (os barões feudais),
quando muito a um povo ou a uma sociedade que se libertava politicamente, conforme era o
caso das antigas colônias americanas, ao passo que a Declaração francesa de 1789 tinha por
destinatário o gênero humano. Por isso mesmo, e pelas condições da época, foi a mais
abstrata de todas as formulações solenes já feitas acerca da liberdade.
O teor de universalidade da Declaração recebeu, aliás, essa justificativa lapidar de Boutmy:
Foi para ensinar o mundo que os franceses escreveram; foi para o proveito e comodidade de
seus concidadãos que os americanos redigiram suas Declarações.”[3]
As gerações dos direitos fundamentais
O reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais do homem no mundo alcançou o
seu estágio atual de uma forma lenta e gradual, passando por várias fases. Estas etapas da
evolução desses direitos são chamadas de gerações, pois foram construídas em diferentes
momentos históricos.
Essas gerações, numa primeira análise, representariam a conquista pela humanidade de três
espécies de direitos fundamentais, amparada nos ideais divulgados especialmente na
Revolução Francesa, os quais se resumiam no lema “liberdade, igualdade e fraternidade”.
Coincidentemente, cada uma dessas expressões representaria uma geração de direitos a ser
conquistada.
A primeira geração dos direitos fundamentais, então, corresponderia àqueles direitos básicos
dos indivíduos relacionados a sua liberdade, considerada em seus vários aspectos. Esta
geração encerra os postulados dos cidadãos em face da atuação do poder público, buscando
controlar e limitar os desmandos do governante, de modo que este respeite as liberdades
individuais da pessoa humana. Os direitos relativos a esta primeira geração significariam,
portanto, uma limitação do poder público, um não fazer do Estado, uma prestação negativa
em relação ao indivíduo.
A segunda geração, por sua vez, fundada no ideário da igualdade, significa uma exigência
ao poder público no sentido de que este atue em favor do cidadão, e não mais para deixar de
fazer alguma coisa. Esta necessidade de prestação positiva do Estado corresponderia aos
chamados direitos sociais dos cidadãos, direitos não mais considerados individualmente, mas
sim de caráter econômico e social, com o objetivo de garantir à sociedade melhores
condições de vida. Esta geração de direitos guarda estreito vínculo com as condições de
trabalho da população, que, com a evolução do capitalismo, se viu necessitada de regular e
garantir as novas relações de trabalho, postulando, portanto, salário mínimo digno, limitação
das horas de trabalho, aposentadoria, seguro social, férias remuneradas etc.
E, ainda, a terceira geração, que corresponderia ao terceiro elemento preconizado na
Revolução Francesa, a fraternidade, representa a evolução dos direitos fundamentais para
alcançar e proteger aqueles direitos decorrentes de uma sociedade já modernamente
organizada, que se encontra envolvida em relações de diversas naturezas, especialmente
aquelas relativas à industrialização e densa urbanização. Nesta situação, outros direitos
precisavam ser garantidos, além daqueles normalmente protegidos, uma vez que essas novas
relações devem ser consideradas coletivamente. Nesta terceira geração de direitos
fundamentais, podemos mencionar: o direito ao desenvolvimento, o direito à paz, o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, o direito à comunicação, os direitos dos
consumidores e vários outros direitos especialmente aqueles relacionados a grupos de
pessoas mais vulneráveis (a criança, o idoso, o deficiente físico etc).
Deve ser mencionada, por derradeiro, uma quarta geração de direitos fundamentais,
identificada por vários autores, que decorreria da atual globalização desses direitos, tais como
a democracia, o direito à informação e ao pluralismo.
CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Considerando a maneira como os direitos fundamentais nasceram, bem como os valores que
busca garantir, eles podem ser analisados sob várias óticas e deles serem extraídas algumas
características que lhe são comuns.
As características dos direitos fundamentais podem então ser assim resumidas: historicidade;
universalidade; relatividade; e irrenunciabilidade.
1. Historicidade. Os direitos fundamentais são resultados de um longo processo histórico, de
uma lenta evolução. Eles não nasceram em uma data específica e nem foram engendrados
em um único país, embora alguns momentos da história e certos Estados podem ser
mencionados como relevantes e que contribuíram fortemente para a sua origem e seu
fortalecimento.
Em verdade, porém, esses direitos do ser humano deitam suas raízes mais longínquas no
cristianismo, que contribuiu enormemente para que o homem fosse visto e tratado de forma
isonômica, uma vez que a doutrina cristã prega que o homem foi criado à imagem e
semelhança de Deus, valorizando assim a criação divina e permitindo-lhe que adquirisse
respeito e fosse tratado de forma digna.
Nessa evolução histórica, vieram as várias declarações de direitos do homem, como as já
mencionadas Magna Charta Libertatum (1215), a Declaração americana (1776), a francesa
(1789), e a Declaração da ONU (1948), que, certamente, influenciaram o surgimento das
proteções jurídicas dos direitos fundamentais em outros países.
E essa evolução ainda se encontra em andamento, posto que à medida que a humanidade
avança outros direitos necessitam ser garantidos e outras tantas violações desses direitos
precisam ser coibidas. Por tudo isso é que se diz que a historicidade é uma característica dos
direitos fundamentais.
2. Universalidade. A sentido dessa característica dos direitos fundamentais é que estes se
destinam a todos os homens. A sua essência por si própria já rejeita a idéia de discriminação
na aplicação e garantia desses direitos básicos. Um dos seus objetivos mesmo é de garantir
que todos os homens tenham acesso aos direitos fundamentais, num tratamento isonômico
que lhe peculiariza, que deve ser universal.
3. Relatividade. Esta característica decorre da idéia de que os direitos fundamentais não
podem ser tidos como absolutos, de aplicação ilimitada. Ao se exercitar tais direitos, muitas
vezes um deles conflitará com outro. O direito de propriedade, por exemplo, esbarra no direito
público da desapropriação. O exercício do direito de informação pode encontrar óbice no
direito à imagem. E assim por diante. Alexandre de Moraes diz que “quando houver conflito
entre dois ou mais direitos ou garantias fundamentais, o intérprete deve utilizar-se do princípio
da concordância prática ou da harmonização, de forma a coordenar e combinar os bens
jurídicos em conflito, evitando o sacrifício total de uns em relação aos outros, realizando uma
redução proporcional ao âmbito de alcance de cada qual (contradição dos princípios), sempre
em busca do verdadeiro significado da norma e da harmonia do texto constitucional com a sua
finalidade precípua.”[4]
4. Irrenunciabilidade. Uma marca dos direitos fundamentais é que os seus destinatários não
podem a eles renunciar. Têm a faculdade de escolher o momento de exercê-los, em certas
hipóteses, mas nunca de dispor dos mesmos de forma definitiva.
[1] Rodrigo César Rebello Pinho in Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, 2a
edição, Saraiva, São Paulo, pág. 60.
[2] Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior in Curso de Direito Constitucional,
5a edição, pág. 80.
[3] In Curso de Direito Constitucional, 11a edição, pág. 516.
[4] In Direito Constitucional, 11a edição, pág. 61.
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