Modalidade do trabalho: Relatório técnico-científico Evento: XXI Jornada de Pesquisa CESÁREA EM CADELA COM HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA1 Guilherme Hammarstrom Dobler2, Fernando Silveiro Ferreira Da Cruz3. 1 Relato de caso acompanhado no Hospital Veterinário da Unijuí. Acadêmico do Curso de Medicina Veterinária do Departamento de Estudos Agrários e do Curso de Ciências Biológicas do Departamento de Ciências da Vida, Unijuí, Ijuí, RS, Brasil. 3 Professor Doutor do Curso de Medicina Veterinária do Departamento de Estudos Agrários, Unijuí, Ijuí, RS, Brasil. 2 INTRODUÇÃO Anatomicamente o músculo diafragma separa a cavidade abdominal e a torácica, este músculo é um importante instrumento para haver adequada ventilação pulmonar (GIBSON; BRISSON; SEARS, 2005). Os músculos costal, esternal e lombar partem do diafragma resultando em um forte tendão central (MILLER, 2012). O diafragma possui uma superfície adjacente aos pulmões sendo coberta por uma fáscia endotelial e pela pleura que se organiza continuamente ao mediastino (TOBERGTE; CURTIS, 2013). O músculo diafragma contrai durante a inspiração pressionando caudalmente as vísceras e consequentemente desloca a parede abdominal para fora e simultaneamente por razão da contração dos músculos do diafragma, ocorre uma expansão do tórax caudal (DE TROYER et al., 1981). As hérnias diafragmáticas podem ter diferentes origens, entre as mais comuns estão hérnia diafragmática traumática, hérnia peritoneopericárdica e hérnia pleuroperitoneal (HARRINGTON, 1933; CUNHA et al., 2000; JÚNIOR, 2000). Cerca de 85% das hérnias em pequenos animais são de origem traumática, 5-10% tem origem congênita, a margem restante é devido a razões desconhecidas (GARSON; DODMAN; BAKER, 1980). Os sinais clínicos relacionados com hérnia diafragmática são na grande maioria associados com a falha do fole torácico para a produção da pressão inspiratória negativa adequada, sinal que pode ser observado por acentuada taquipneia ou dispnéia (MACKLEM, 1981). Por ordem da hérnia diafragmática, o sistema cardíaco pode apresentar tamponamento cardíaco, insuficiência cardíaca congestiva do lado direito e uma grande variedade de efeitos hemodinâmicos (HARRINGTON, 1933; CUNHA et al., 2000). Em casos de cirurgias invasivas, geralmente, se faz necessária a realização da medicação préanestésica (MUIIOZ-CUEVAS et al., 1992; OLESKOVICZ; MORAES, 2009)&#8288;. A recomendação para este procedimento é o uso fármacos opioides e tranquilizantes o que caracteriza a neuroleptoanalgesia. Este procedimento farmacológico costuma ser seguro, pois, os tranquilizantes aumentam a sedação e analgesia fornecida pelo fármaco opioide, além disso, potencializa os efeitos dos fármacos utilizados durante o procedimento cirúrgico (CORSSEN; DOMINO; SWEET, 1964; MCDOWELL; DUNDEE, 1971). Apesar dos efeitos vantajosos que a neuroleptoanalgesia tem demonstrado, existem ocasiões cirúrgico-hospitalares em que se faz necessária a adoção de protocolos alternativos. Partindo do pressuposto, o presente relato tem como objetivo descrever o caso de um cão da raça Dachshund, fêmea, diagnosticado com hérnia diafragmática e a comumente realização de cesárea. Modalidade do trabalho: Relatório técnico-científico Evento: XXI Jornada de Pesquisa METODOLOGIA Foi atendido no HV-UNIJUÍ um canino, fêmea, da raça Dachshund, com 3 anos de idade, peso corporal de 6,6 Kg, atendido no dia 8 de junho de 2015 no Hospital Veterinário da Unijuí. Na anamnese, o proprietário relatou que há cerca de sete dias anteriores a data de consulta observou o animal apático e taquipneico. De acordo com proprietário, o animal não tem se alimentado bem e verificou acentuado emagrecimento e desidratação. Durante a consulta foi relatado que foi fornecido ao cão corticoide e cálcio injetáveis. Além de ter dificuldades para se alimentar o cão apenas tomava água quando fornecida através de seringa. Segundo o proprietário, o animal urinou e defecou normalmente, negava tosse, espirro, síncope, convulsão, secreção ocular e vomito, apenas relatou secreção serosa nasal. Informou ainda, que o animal recebeu três doses de vacinas e vermífugo e que o animal entrou no cio há dois meses anteriores a consulta ocorrendo o acasalamento e estando prenha no momento da consulta. No exame clínico, notou-se desidratação, mucosas pálidas, tempo de perfusão capilar (TPC) de dois segundos, frequência cardíaca de 112 bpm (batimentos por minuto), frequência respiratória de 60 mpm (movimentos por minuto) apresentando silêncio acústico no lobo direito e temperatura retal de 36,5 ºC. Foi realizado exame bioquímico, apresentando alteração de ALT (alanina transaminase) e FA (fosfatase alcalina), também foi realizado exame sanguíneo, sendo identificadas alterações da série vermelha (eritrócitos, hemoglobina e hematócrito) e da série branca (leucócitos totais, neutrófilos não segmentados e segmentados e plaquetas). Foi realizado raio-x de posição latero-lateral da cavidade torácica e abdominal constatando a presença de fetos nas cavidades torácica e abdominal do cão. Com o intuito de melhorar o estado de saúde do animal tornar os fetos viáveis foi realizada a cirurgia (herniorrafia e cesária). Para a realização da cirurgia foi utilizado Isoflurano diluído em oxigênio a 100% em volume de 1 L/min. Como fármaco analgésico, utilizou-se Tramadol 2 mg/kg via intravenosa (IV). Durante a cirurgia o animal recebeu fluidoterapia a base de Ringer Lactato na dose de 10ml/kg/hora e foi monitorado ao longo da cirurgia via oxímetro de pulso, eletrocardiograma (ECG), pressão arterial não invasiva (PANI), pressão arterial invasiva (PAI) e temperatura, permanecendo em plano adequado durante todo o procedimento, resultando em uma recuperação anestésica tranquila. No primeiro dia foram administrados no pós-operatório (PO): Cefazolina 200mg/ml 1,1ml IV/TID, ter in die (três vezes ao dia); Morfina 1% 0,26ml via subcutânea (SC)/TID; Dipirona 0,3ml IV/TID e fluidoterapia com Ringer Lactato 500ml/24h 1 microgota/2seg. No segundo dia no PO foram prescritos: Cefazolina 200mg/ml 1,1ml via IV/TID; Morfina 1% 0,26ml SC/TID; Dipirona 0,3ml IV/TID e Enrofloxacina 2,5% 1,5ml IV/BID, bis in die (duas vezes ao dia). O PO do segundo dia foi parcialmente mantido, sendo substituída somente a Morfina por Tramadol 0,8ml SC/QID, quarter in die (quatro vezes ao dia), ressalta a realização da drenagem do tórax realizada desde o primeiro dia e heparinização do acesso venoso. RESULTADOS E DISCUSSÕES De acordo com os critérios utilizados pela American Society of Anesthesiologists o animal atendido teve a avaliação pré-anéstesica categorizada em ASA V. Tal classificação foi adotada pelo paciente apresentar-se em estado agonizante com nenhuma perspectiva de sobrevivência sem a realização de procedimento cirúrgico (ASA, 2014). O protocolo cirúrgico adotado constituiu na realização da cesária e após a herniorrafia com malha cirúrgica, sendo empregada devido a falta de tecido no diafragma e pela cronicidade da lesão. A Modalidade do trabalho: Relatório técnico-científico Evento: XXI Jornada de Pesquisa malha cirúrgica tem se demonstrado como uma excelente opção para a reparação de hérnias (ALOISIO; VULCANI, 2009)&#8288;. A escolha do protocolo anestésico está relacionado ao estado clínico do animal. Para isto isoflurano foi utilizado para indução farmacológica pois é um fármaco com baixo coeficiente de partição sangue:gás, tal característica reflete especiais condições deste agente farmacológico, como biotransformação e excreção basicamente pulmonar (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI., 2011)&#8288;. Sinais clínicos como dispnéia por diminuição do volume é comum em casos de hérnia diafragmática (RAISER, 1994)&#8288;. De acordo com Mattox e Allen (1986), tal fato pode acarretar a diminuição do volume corrente e agravar a situação por “ocupação de espaço” fator qual compromete diretamente as funções respiratórias e cardiovasculares interferindo diretamente no volume corrente e retorno venoso (SULLIVAN; REID, 1990)&#8288;. &#8288; O isoflurano é anestésico de rápida metabolização tem efeitos mínimos aos fetos e a mãe tendo uma aplicação relativamente segura quando comparado com outros fármacos de efeito comutativo e acumulação transplacentária (ANDALUZ et al., 2003)&#8288;. Outro aspecto positivo do isoflurano é apresentado por Newberg; Milde; Michnfelder (1984) que demonstram que a acumulação do isoflurano no colostro de fêmeas submetidas a procedimentos cirúrgicos é inferior a outros fármacos inalatórios como halotano. A morfina foi escolhida para pós-operatório por ser um opioide agonista total mu, visto que o procedimento cirúrgico gera elevado grau álgico, e que o mesmo pode ocasionar alterações respiratórias, mantendo assim o conforto do animal e permitindo as trocas gasosas (SULLIVAN; REID, 1990)&#8288;. Após o 3º dia, foi trocada a morfina pelo tramadol, o qual é um opioide atípico por atuar em receptores mu e inibindo a recaptação de serotonina e noradrenalina (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI., 2011). A morfina tem sido relatada em vários estudos por ser excreta no colostro materno. Neste sentido, é necessário monitorar os filhotes quanto a apresentação de efeitos sedativos ou depressão respiratória (DAVIES, 1997)&#8288;. Os neonatos foram monitorados durante o pós-cirúrgico, não sendo averiguados efeitos do fármaco. A morfina foi substituída ao terceiro dia para evitar bioacumulação e significante transferência aos filhotes. CONCLUSÕES As medicações empregadas no procedimento cirúrgico permitiram a realização da cesárea com sucesso, com todos os fetos viáveis. Assim como, o tratamento pós-operatório permitiu analgesia apropriada evitando desconforto e alterações metabólicas, cardiorrespiratórias e ausência de efeitos nos fetos. PALAVRAS-CHAVE: Anestesia; Cirurgia; Prenhez; Isoflurano. REFERÊNCIAS ALOISIO, V.; VULCANI, S. Biomateriais para reparação cirúrgica da parede abdominal em animais domésticos - revisão. Arq. Ciênc. Vet. Zool. UNIPAR, v. 12, n. 2, p. 141–147, 2009. ANDALUZ, A. et al. Transplacental transfer of propofol in pregnant ewes. Veterinary Journal, v. 166, n. 2, p. 198–204, 2003. Modalidade do trabalho: Relatório técnico-científico Evento: XXI Jornada de Pesquisa ASA. ASA Physical Status Classification System. Disponível em: <http://www.asahq.org/.../asaphysical-status-classification-system/en/2>. BUSH, B. M. Interpretacão de resultados laboratoriais para clínicos de pequenos animais. 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