direito internacional público

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DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
ORIGEM DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
Origens históricas do Direito Internacional Público
O Direito Internacional Público vem, ao longo do tempo, desde a época provável de seu nascimento,
ganhando novos contornos e evoluindo pari passu ao avanço da sociedade internacional. Sem se poder
determinar uma data precisa para o seu nascimento, tem-se como certo que o Direito Internacional Público é
fruto de inúmeros fátores sociais, políticos, econômicos e religiosos da Idade Média. Não obstante, na
Antigüidade Clássica não existia um Direito Internacional propriamente dito, mas apenas um Direito que se
aplicava às relações entre cidades vizinhas, de língua comum, da mesma raça e com a mesma religião, como
se dava com as anfictionias gregas (que eram ligas pacificas de caráter religioso, cuja finalidade era evitar as
guerras e julgar as infrações à santidade dos templos) e com as confederações etruscas. Mas afora esses
casos, não existia um Direito propriamente internacional entre nações estrangeiras, porque não existia lei
comum entre tais nações, nem sequer igualdade jurídica entre elas.
A evolução do Direito Internacional durou vários séculos e se desenvolveu de forma quase que desordenada.
Suas primeiras e mais singelas manifestações aparecem quando dos intercâmbios que passam a existir entre
os vários feudos da Idade Média e das alianças que celebravam entre si, muitas delas relacionadas às
questões de segurança externa. Todos os tratados, nesse período, passaram a ser celebrados sob a égide da
Igreja e do Papado e as decisões do Papa passaram a ser respeitadas em todo o continente, principalmente
naquilo que dizia respeito à esfera espiritual de homens e mulheres. Nesse mesmo momento histórico
formam-se as Cidades-Estados italianas, já no quadro da transição para a Idade Moderna, as quais passaram
a manter freqüentes intercâmbios políticos e econômicos entre si, dando início ao esboço dos contornos
normativos de um Direito menos doméstico e mais internacional já nesse período.
Foi o holandês Hugo Grotius quem deu ênfase ao direito das gentes como ciência, despertando o interesse
dos principais círculos cultos europeus com suas obras. Sua contribuição o tornou mundialmente conhecido
como o pai do Direito Internacional e do Direito Natural, não obstante os primeiros passos da disciplina
terem sido dados pelo dominicano espanhol Francisco de Vitória e pelo jesuíta espanhol Francisco Suárez.
Contudo, foi tão-somente a partir do final do século XVI e início do século XVII que o Direito Internacional
Público aparece como ciência autônoma e sistematizada, principalmente a partir dos tratados de Westfália
dos quais Hugo Grotius participou na qualidade de Embaixador do Rei da Suécia, concluídos em 24 de
outubro de 1648, que colocaram fim à Guerra dos Trinta Anos, conflito religioso entre católicos e
protestantes que teve como bloco vitorioso o dos protestantes, fortalecido pela França.
Tais instrumentos internacionais, Tratado de Múnster, assinado por Estados católicos, e Tratado de
Osnabruck, assinado pelos protestantes envolvidos no litígio, demarcam a nova era do Direito Internacional
Público moderno. Pelo fato de, pela primeira vez, se ter reconhecido, no plano internacional, o princípio da
igualdade formal dos Estados. Então, mais do que colocar fim à Guerra dos Trinta Anos, os tratados de
Westfália criaram um “sistema pluralista e secular de uma sociedade de Estados independentes, substituindo,
desde então, a ordem providencial e hierarquizada da Idade Média. Assim é que muitos autores consideram
que antes da Paz de Westfália não existia um Direito Internacional propriamente dito, como se conhece nos
dias atuais, não obstante já se conhecer, desde o século XVI, a codificação das leis marítimas, a instalação de
embaixadas permanentes, a formação de exércitos permanentes, bem como as navegações e as conquistas.
Antes dos tratados de Westfália não existia uma sociedade internacional com poder para sujeitar os Estados
ao cumprimento de suas regras de conduta. Portanto, a Paz de Westfália pode ser considerada como um
verdadeiro “divisor de águas” na história do Direito Internacional Público, momento em que se
desprenderam as regras fundamentais que passaram a presidir as relações entre os Estados europeus,
reconhecendo ao princípio da igualdade absoluta dos Estados o caráter de regra internacional fundamental.
Além disso, este fato histórico teve grande importância internacional por marcar o surgimento do que hoje
conhecemos por Estado moderno, que a partir desse momento passou a tornar-se o ator mais importante do
Direito Internacional. O Estado nasceria, então, com a característica fundamental de possuir, como elemento
essencial de sua existência, uma base territorial sob a qual se assenta a sua massa demográfica de indivíduos.
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O Congresso de Viena (1815) foi, depois dos tratados de Westfãlia, os segundo grande marco do Direito
Internacional. O Congresso marcou o fim das guerras napoleônicas e estabeleceu um novo sistema
multilateral de cooperação politica e econômica na Europa, além de ter agregado novos princípios de Direito
Internacional, como a proibição do tráfico de negros, a liberdade irrestrita de navegação nos rios
internacionais da região e as primeiras regras do protocolo diplomático. Os principais aspectos perduraram
até quase o início da Primeira Guerra Mundial. Essas novas características do Direito Internacional vieram a
intensificar-se finda a Segunda Guerra, que ensangüentou a Europa entre 1939 a 1945.
Em conclusão, a afirmação histórica do direito das gentes e, conseqüeütemente, a prova de sua existência,
decorreu da convicção e do reconhecimento por parte dos Estados-membros da sociedade internacional de
que os preceitos do Direito Ïnternacional obrigam tanto interna como internacionalmente, devendo os
Estados, de boa-fé, respeitar (e exigir que se respeite) aquilo que contrataram no cenário exterior.
As tendências evolutivas do Direito Internacional
O Direito Internacional Público moderno é fruto de um desenvolvimento histórico que abrange atualmente
algumas tendências, umas positivas e outras já nem tanto. Tais tendências podem ser agrupadas, segundo
Jorge Miranda, em oito momentos distintos: a universalização; a regionalização; a institucionalização; a
funcionalização; a humanização; a objetivação; a codificação; e, finalmente, a jurisdicionalização.
A universalização tem o seu foco voltado para a autodeterminação dos povos, decorrente da desagregação,
primeiramente dos impérios marítimos europeus, depois do império continental soviético e, mais
recentemente, a alguns movimentos de independência, como foi o caso de Timor Leste. A unive rsalização
então significa que o Direito Internacional não é mais um Direito euro-americano, mas sim um Direito
Internacional universal.
À universalização segue-se a regionalização, com a conseqüente criação de espaços regionais por razões
econômicas, políticas, estratégicas ou culturais, dentro dos qúais as várias comunidades políticas e os vários
Estados encontram formas de solidariedade e de cooperação bem mais qualificadas, de cujo exemplo mais
avançado é a União Européia.
Com a institucionalízação o Direito Internacional deixa de ser um direito das relações bilaterais ou
multilaterais entre os Estados para se tornar um direito cada vez mais presente nos organismos
internacionais, na Organização das Nações Unidas, bem como em suas agências especializadas podendo até
mesmo chegar á criação de um órgão supranacional com poderes decisórios, como é o caso da União
Furopéia.
A funcionalização aparece relacionada com a institucionalização, num duplo sentido. Primeiro porque o
Direito Internacional passa a extravasar cada vez mais o âmbito das meras relações externas e entre os
Estados e penetra, cada vez mais, em quaisquer matérias relativas tanto ao Direito interno como ao próprio
contexto das relações internacionais. No plano do Direito interno assume tarefas de regulamentação e de
solução de problemas, como à saúde, o trabalho, o ambiente etc. Em segundo lugar, essa funcionalização
acompanha a criação de organismos internacionais capazes de permitir essa solução, uma espécie ministérios
internacionais que fazem o complemento dos ministérios nacionais.
Com a humanização, o Direito Internacional ganha uma face humanizadora com o nascimento do Direito
Internacional dos Direitos Humanos, notadamente com a arquitetura normativa de proteção de direitos
nascida no pós-Segunda Guerra., desde a Carta das Nações Unidas (1945), desenvolvendo-se com a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e com os inúmeros tratados internacionais de proteção
dos direitos humanos surgidos no cenário internacional após esse período.
Esta tendência de humanização do Direito Internacional provém de três momentos históricos conexos. O
primeiro nasce com a definição internacional ou a consagração internacional dos direitos humanos. A
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, passa a ser considerada como um código de ética
universal de direitos humanos, que fomenta a criação de grandes pactos e convenções internacionais, de
documentos e de textos especializados das Nações Unidas e de suas agências especializadas. O segundo, que
tem o seu início com a Convenção Européia dos Direitos do Homem (1950) passando para a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos (1969), é a consagração de um direito de queixa, ou de um direito de
recurso, ou de comunicação dos cidadãos contra o seu Estado perante as instâncias internacionais; trata-se da
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necessária sujeição dos órgãos do Estado às decisões provenientes de órgãosjurisdicionais internacionais
ainda crescentes, criados por tratados também ratificados pelos mesmos Estados de que são cidadãos as
pessoas queixosas. Por fim, o terceiro momento é a criação da Justiça Penal Internacional com origem nos
Tribunais de Nuremberg e Tóquio, e mais recentemente nos Tribunais para crimes cometidos no território da
Ex-Iugoslávia e de Ruanda. Com a criação do Tribunal Penal Internacional, o Direito Internacional dos
Direitos Humanos se desenvolve, se concretiza e se enriquece, alargando-se cada vez mais o seu âmbito de
proteção.
A objetivação, ou seja, a superação definitiva do dogma “voluntarista”, segundo o qual a vontade dos atores
internacionais é o fundamento único da existência do Direito Internacional Público. Neste momento histórico
pelo qual passa a humanidade, presencia-se cada vez mais a formação de regras internacionais livres e
independentes da vontade dos Estados desde a positivação da norma pacta sunt servanda pela Convenção
Viena sobre Direitos dos Tratados de 1969, justificando e fortalecendo a existência e validade de inúmeros
tratados internacionais de proteção dos direitos humanos presentes na atualidade.
O papel crescente dos tratados multilaterais passa a dar suporte ao desenvolvimento de um verdadeiro regime
de tratados, principalmente no que tange as reservas, em que a vontade dos Estados tem cada vez menos
importância perante a função objetiva das normas do moderno Direito Internacional.
Característca dessde desenvolvimento histórico é a codificação do Direito Internacional, segundo prescreve
art. 13, §1º, alínea a, da Carta das Nações Unidas, de 1945, um dos propósitos da Assembléia Geral da ONU
é o de “incentivar o desenvolvimento progressivo do direito internacional e sua codificação”. Para a
realização de tais finalidades, a ONU tem impulsionado os trabalhos das suas Comissões de Direito
Internacional e de Direitos Humanos. Foram vários os textos internacionais contemporâneos concluídos sob
os auspícios de tais comissões, como as grandes convenções modernas de Direito Internacional Público e de
Direito Internacional dos Direitos Humanos.
A jurisdicionalização, como oitava tendência do Direito Internacional contemporâneo colocada pelo
constitucionalista português, passa a ser a conseqüência lógica da acumulação de todas as outras tendências.
Na medida em que se desenvolvem as regras de proteção internacional dos direitos humanos, avulta de
importância a criação de tribunais internacionais de variada natureza para decidirem sobre as mais diversas
questões envolvendo aspectos ligados à violações de direitos humanos. Procura-se, cada vez mais, superar os
regimes das cláusulas facultativas, rumo à institucionalização e imposição da jurisdição internacional
obrigatória.
O Direito Internacional Público nos dias atuais
O Direito Internacional Público, dentre todos os ramos jurídicos, é o que atualmente mais tem se
desenvolvido, principalmente depois da mudança do cenário internacional pós-Segunda Guerra, quando
começam a aparecer, com mais vigor, as Organizações Internacionais intergovernamentais, seguidas de uma
avalanche de tratados, versando sobre matérias das mais diversas como a terra, o mar, os fundos marinhos, o
espaço ultraterrestre etc. Ademais, matérias novíssimas como a proteção internacional dos direitos humanos,
o direito internacional do meio ambiente e o direito penal internacional, que estão na pauta do dia da agenda
internacional, também vêm trazendo grandes mudanças para o Direito Internacional Público contemporâneo.
Por outro lado, questões de ordem econômica, política e técnica também repercutem no Direito Internacional
Público. A formação e desenvolvimento de blocos regionais, ao lado das políticas mundiais de expansão de
mercados, têm trazido conseqüências nem sempre tão felizes para a ordem internacional atual, a começar
pelos problemas que têm gerado nos países em desenvolvimento relativamente às dificuldades de negociação
com países economicamente mais fortes, sem falar nos percalços para os pagamentos de dívidas avalizadas
pelo sistema financeiro internacional, e assim por diante.
O Direito Internacional Público passa, assim, por um duplo problema visto sob esse ângulo: é atingido por
regulamentos (nem sempre jurídicos) alheios ao sem âmbito próprio de atuação e, ao mesmo tempo, passa a
ter que interagir com eles e tentar (quando possível) regulamentá-los. Trata-se de conseqüência do fenômeno
conhecido como globalização.
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CONCEITO, DENOMINAÇÕES E DIVISÕES
Conceito
Sinteticamente, o Direito Internacional Público pode ser definido como a disciplina jurídica da sociedade
internacional.
Numa definição mais abrangente (e mais técnica), o Direito Internacional Público pode ser conceituado
como o conjunto de princípios e regras jurídicas (costumeiras e convencionais) que disciplinam e regem a
atuação e a conduta da sociedade internacional (formada pelos Estados, pelas organizações internacionais
intergovernamentais e também pelos indivíduos), visando alcançar as metas comuns da humanidade e, em
última análise, a paz, a segurança e a estabilidade das relações internacionais.
O critério utilizado para a formulação desse conceito não se prende exclusivamente aos sujeitos
intervenientes da disciplina, pois conceituar o Direito Internacional Público a partir dos seus sujeitos não é de
boa técnica. Não são os seus sujeitos que definem o seu conceito, pois o que são sujeitos e quem sejam esses
sujeitos o próprio Direito Internacional Público é que estabelece.
O conceito proposto também não se liga, unicamente, à matéria regulada pelo Direito Internacional (ou seja,
ao seu objeto). Não se pode concordar com a afirmação de que o Direito Internacional Público regula
matérias da alçada externa do Estado, em contraposição ao Direito interno, que regula matérias
exclusivamente domésticas. Esta visão é ultrapassada e não encontra eco na sistemática contemporânea das
normas internacionais, que estão a regular, cada vez mais, assuntos que até então eram considerados da
alçada doméstica do Estado, como direitos humanos, meio ambiente etc.
Este engano bastante comum entre os autores surge em decorrência de uma leitura simplória do adjetivo
internacional integrante da denominação da disciplina. A expressão “internacional” é, às vezes, bastante
enganadora, não sugerindo, no caso em tela, que o Direito Internacional Público deva reger tão-somente
aspectos externos, ou seja, internacionais, das relações entre Estados. A expressão refere-se às normas de
regência, e não é matéria por elas reguladas, que podem ser perfeitamente matérias da alçada interna.
Também não se relaciona, o conceito proposto, à função das fontes normativas do Direito Internacional
Público, das quais se destacam os tratados internacionais.
Segundo essa concepção formalista que não se liga nem aos sujeitos, nem à matéria da disciplina é Direito
Internacional Público tudo o que provém de uma fonte internacional. A falha mais grave deste critério formal
é considerar apenas o conjunto de normas jurídicas criadas pelo Direito Internacional Público, fazendo tábula
rasa das outras fontes dessa disciplina que não lhe são privativas, como os costumes e os princípios gerais de
direito.
Como se percebe, os três critérios de definição descritos acima, quando utilizados isoladamente, são
insuficientes para conceituar com precisão o Direito Internacional Público.
Critérios:
a) critério dos sujeitos intervenientes - o Direito Internacional Público disciplina e rege a atuação e a conduta
da sociedade internacional (formada pelos Estados, pelas organizações internacionais intergovernamentais e
também pelos indivíduos);
b) critério das matérias reguladas - o Direito Internacional Público visa alcançar as metas comuns da
humanidade e, em última análise, a paz, a segurança e a estabilidade das relações internacionais;
c) critério das fontes normativas - o Direito Internacional Público consubstancia-se num conjunto de
princípios e regras jurídicas, costumeiras e convencionais.
Estatisticamente, o critério dos sujeitos intervenientes é ainda o mais utilizado doutrinariamente na
conceituação do Direito Internacional Público. Não é de hoje que essa disciplina vem sendo conceituada
como o conjunto de regras e princípios que regem apenas as relações interestatais, ou seja, um complexo de
normas que regulam tão-somente a conduta recíproca dos Estados.
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Para Rousseau, o Direito Internacional “é o ramo do direito que rege os Estados nas suas relações
respectivas”. Trata-se do conceito clássico (positivista e restritivo) de Direito Internacional Público, baseado
na chamada corrente estatal, segundo a qual somente os Estados podem ser sujeitos de Direito Internacional,
de modo que somente eles são capazes de contrair direitos e obrigações estabelecidos pela ordem jurídica
internacional.
Esta doutrina, nega que os indivíduos possam ser sujeitos de Direito Internacional, sob o fundamento de que
o direito das gentes somente regula as relações entre os Estados, jamais podendo chegar até os indivíduos,
sem que haja uma prévia transformação de suas normas em Direito interno. Assim, dentro desta definição
tradicional, os benefícios ou obrigações porventura reconhecidos ou impostos a outras instituições, que não o
Estado, são considerados como sendo meramente derivativos, visto terem sido adquiridos em virtude da
relação ou dependência que tiveram com o Estado respectivo, único sujeito internacionalmente válido.
Tal concepção tradicional do Direito Internacional Público deve ser hodiernamente afastada, por não mais
corresponder à realidade atual das relações internacionais.
Na atualidade, o Direito Internacional não mais se circunscreve ás relações entre os Estados, exclusivamente,
e tampouco regula matérias da alçada unicamente exterior dos Estados. Tem ele, hoje, um alcance muito
mais amplo, visto que se ocupa da conduta dos Estados e dos organismos internacionais e de suas relações
entre si, assim como de algumas de suas relações com as pessoas naturais ou jurídicas, regulando matérias
externas e internas de interesse da sociedade internacional.
O Direito Internacional Público figura num primeiro momento como um conjunto de regras e princípios que
disciplinam tanto as relações jurídicas dos Estados entre si, bem como destes e outras entidades
internacionais, como também em relação aos indivíduos. Assim, também podem ser considerados sujeitos de
Direito Internacional Público na atualidade, além dos Estados soberanos, as organizações internacionais
intergovernamentais, bem como os indivíduos, embora o campo de atuação destes últimos seja mais
limitado, sem, contudo, perder ou restar diminuída sua importância.
Num segundo momento, o Direito Internacional Público (composto por estes sujeitos) disciplina e
regulamenta assuntos que não se circunscrevem ao âmbito propriamente exterior dos Estados, tratando
atualmente de matérias que, até então, eram consideradas de competência da sua exclusiva jurisdição interna.
Ainda que o conceito contemporâneo de Direito Internacional Público não se prenda exclusivamente aos
seus sujeitos intervenientes, tais sujeitos são importantes para se entender o funcionamento da sociedade
internacional. Esta nova concepção teve início logo depois da segunda grande guerra, quando a sociedade
internacional passou de modo sistemático a considerar o indivíduo como “sujeito de Direito Internacional”, a
considerar o fenômeno da inserção do indivíduo em uma vasta comunidade mundial, dentre os quais os
sujeitos passaram a ser também os indivíduos.
A personalidade dos indivíduos, no plano internacional, é limitada, contudo, em certas ocasiões,
principalmente no que diz respeito a crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio, têm os
indivíduos, assim como os Estados, responsabilidade no plano internacional. Nestes casos, os indivíduos
passam a ser punidos como tais, e não em nome do Estado do qual fazem parte.
Neste novo cenário, passam os indivíduos a ter direitos e obri gaçóes, de modo que não mais se pode afirmar
que somente os Estados é que são praticantes de ilícitos internacionais. Os Estados deixaram de ser os únicos
atores da vida internacional, e passaram a compartilhar esta condição com as organizações internacionais e
também com os próprios indivíduos. As pessoas, nesse contexto, passam também a ser um dos sujeitos
diretos do Direito Internacional, detendo inclusive capacidade processual para fazer valer seus direitos,
podendo mesmo atuar de forma direta perante organismos ou tribunais internacionais. Isto não significa,
contudo, que os Estados deixaram de ter personalidade internacional. O que se entende é que, agora, eles
somente não são mais os únicos a deter esta característica.
Daí o entendimento contemporâneo de ser o Direito Internacional Público (sob o prisma do critério dos
sujeitos intervenientes) aquele ramo do direito capaz de regular as relações interestatais, bem como as
relações envolvendo as organizações internacionais e também os individuos, ainda que a atuação destes
últimos seja mais limitada no cenário internacional.
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Denominações
São variadas as denominações que a disciplina vem recebendo através dos tempos, tendo sido a primeira
delas a expressão jus gentium, utilizada no século VII, por Isidoro de Sevilha, nas suas Etimologias. Ojus
gentium era formado por normas privadas do Direito Romano, relacionadas aos estrangeiros e às facilidades
comerciais que os romanos lhes concediam. A expressão era também empregada, no Direito público, para
designar as relações recíprocas entre as Cidades-Estados.
A terminologia moderna Direito Internacional, ainda utilizada indistintamente com a expressão direito das
gentes (law of nations, nos países anglo-americanos; droit des gens, em francês, diritto internazionaie, em
italiano, ou Vôlkerrecht, no alemão), sedimentou-se na prática internacional e é utilizada em todo o planeta.
O adjetivo internacional surge, em 1780, com jurista inglêsJeremias Bentham, no seu livro An introduction
to the principies of moral and legisiation, para diferenciar o direito que cuida das relações entre Estados
(internationai law) do direito nacional (national law) e do direito municipal (municipal law).
Com esta nova denominação, o Direito Internacional passa a desenvolver-se a partir do início do século XIX
segundo os novos cânones do positivismo jurídico. Posteriormente adicionou-se o termo “público” à
expressão “direito internacional” no intuito de diferenciá-lo do Direito Internacional Privado, cujas normas
resolvem prioritariamente conflitos de leis no espaço em relação a casos concretos sub judice com conexão
internacional. Direito verdadeiramente internacional é o Direito Internacional Público, uma vez que o Direito
Internacional Privado é, em última análise, um Direito Privado Internacional, que é Direito interno quanto à
origem.
Na prática internacional e nos livros de doutrina não é de rigor a utilização do qualificativo “público” na
designação do Direito Internacional Público, pois, quando se fala em direito internacional já se subentende o
direito internacional público. Em contrapartida, a palavra qualificadora “privado” não está dispensada da
designação do direito internacional privado, devendo aparecer expressão a fim de distinguí-lo do direito
internacional público.
Entre o Direito Internacional Público e o Privado existem pontos de aproximação importantes, a exemplo da
proteção jurídica do estrangeiro, que lhe garante a liberdade, a propriedade e o exercício dos direitos civis.
Curiosamente, um desses direitos também pode derivar do outro, como é o caso de as situações regidas pelo
Direito Internacional Privado terem sido criadas por tratados os quais, por sua vez, são disciplinados pelo
Direito Internacional Público, podendo-se dizer, neste caso, ter havido a criação da norma de um pelo direito
do outro.
Não obstante a expressão Direito Internacional Público ser a mais empregada, tanto na doutrina como na
prática das relações internacionais, não se descarta chamálo de direito das gentes, terminologia advinda do
direito francês: droit des gens.
Divisões
Muitas divisões, desde a época de Hugo Grotius, têm sido adotadas para o Direito Internacional Público.
Muitos autores já o dividiram sob dois aspectos distintos: um teórico ou doutrinário e o outro prático ou
positivo. Este último dividir-se-ia em Direito Internacional Público convencional consubstanciado em
tratados celebrados pelos Estados entre si e Direito Internacional Público costumeiro decorrente da prática
internacional, uniforme e constante, respeitada pelos Estados como se fosse lei.Esta divisão encontra-se
atualmente superada. Outras divisões foram apresentadas. Mas todas são muito antigas e sem relevância para
o estudo do Direito Internacional Público contemporâneo.
Hoje o Direito Internacional Público deve se entendido como uma unidade harmônica de normas (escritas ou
costumeiras) reguladoras das atividades dos Estados, das Organizações Internacionais e dos próprios
indivíduos, no plano internacional.
Aplicação internacional e interna
A aplicação interna do Direito Internacional não significa deixar de aplicar as normas do ordenamento
jurídico interno de determinado Estado. Mas, apesar disso, existem importantes diferenças na aplicação do
Direito Internacional nas relações envolvendo o Direito interno e naquelas envolvendo as relações
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internacionais.
Enquanto o Direito interno se consubstancia no conjunto de normas em vigor em um dado Estado, o Direito
Internacional é toda norma jurídica não pertencente a uma ordem interna. Assim, no plano externo, o Direito
Internacional é aquele que regula e rege as relações dos Estados entre si, bem como o complexo das
atividades envolvendo as organizações internacionais em suas relações mútuas, bem como os indivíduos.
No plano do Direito interno, entretanto, esse panorama muda na medida em que as Constituições estatais
prevêem regras específicas de aplicação interna do Direito Internacional, como a necessidade de referendum
parlamentar dos tratados ou sua promulgação e publicação internas, o que pode variar de país para país.
Da mesma forma, variado é o tipo de aplicação do Direito Internacional pelos tribunais internos estatais. A
tendência do constitucionalismo moderno, é a de permitir a aplicação imediata do Direito Internacional pelos
juizes e tribunais nacionais, sem a necessidade de norma interna que os materialize e lhes dê aplicabilidade.
Trata-se da consagração da doutrina monista internacionalista no que tange às relações do Direito
Internacional com o Direito interno dos Estados.
No plano internacional, o sistema jurídico internacional é o contexto no qual se aplica a norma específica de
Direito Internacional, todos os fatores pertinentes do caso são determinados pelo direito das gentes, sem
importar se a norma tem ou não precedentes sobre as demais normas. No plano interno, por outro lado, o
contexto para a aplicação dessa norma é o sistema jurídico interno baixo o comando constitucional que ali
opera. E assim, uma mesma aplicação do Direito Internacional, feita em planos e contextos distintos, poderá
levar tanto os tribunais internos como os tribunais internacionais a julgamentos opostos.
Daí a importância de se aclarar qual o contexto interno ou internacional, perante o qual uma demanda é
deflagrada, e qual norma é hierarquicamente superior (a interna ou a internacional) na aplicação de um caso
concreto, sendo de se recordar aqui o art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de
maio de 1969, que consagra expressamente a supremacia do direito internacional sobre o Direito interno
estatal, na medida em que proíbe um Estado de invocar disposição do seu Direito interno como justificativa
para o descumprimento de uma norma internacional. Assim, havendo conflito entre o Direito Internacional e
o Direito interno estatal perante a jurisdição de um tribunal ou de um tribunal interno, o problema se resolve
sob a base da supremacia do Direito Internacional. Neste contexto, a falta de cumprimento dos preceitos do
direito das gentes acarreta a responsabilidade internacional do Estado infrator.
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SOCIEDADE E COMUNIDADE INTERNACIONAL
O que é o Direito Internacional Público?
Desde os primórdios da Humanidade o homem já se apresentava como ser perfeitamente constituído, com
características fundamentais e na posse de qualidades comuns que transcendiam as divisões que o mundo
viria a sofrer. O agrupamento de seres humanos pelas várias regiões do planeta fomentou a criação de blocos
de indivíduos com características sociais, culturais, políticas etc., em quase tudo comuns. Desse agrupamento
humano (cuja origem primitiva é a família) nasce sempre na comunidade ligada por um laço espontâneo e
subjetivo de identidade. Na medida em que essa dada comunidade humana passa a ultrapassar os
impedimentos físicos que o planeta lhe impõe montanhas, florestas, desertos, mares etc., descobrindo a
existência de outras comunidades espalhadas pelos quatro cantos da Terra, surge a necessidade da
coexistência entre elas. A civilização passa a ter por característica a luta contra as dificuldades dessa
coexistência. Por isso, desde o momento em que o homem passou a conviver em sociedade, com todas as
implicações que esta lhe impõe, tornou-se necessária a criação de determinadas normas de conduta a fim de
reger a vida em grupo harmonizando e regulamentando os interesses mútuos.
O Direito, entretanto, em decorrência de sua evolução, passa a não mais se contentar em reger situações
limitadas às fronteiras territoriais da sociedade que, modernamente, é representada pela figura do Estado.
Assim como as comunidades de indivíduos não são iguais, o mesmo acontece com os Estados, cujas
características variam segundo vários fatores econômicos, sociais, políticos, culturais, comerciais, religiosos,
geográficos etc. À medida que estes se multiplicam e na medida em que crescem os intercâmbios
internacionais, nos diversos e mais variados setores da vida humana, o direito transcende os limites
territoriais da soberania estatal rumo a criação de um sistema de normas jurídicas capaz de coordenar vários
interesses estatais simultâneos, de forma a que possam os Estados, em seu conjunto, alcançar suas
finalidades e interesses recíprocos.
O Direito vai deixando de somente regular questões internas para também disciplinar atividades que
transcendem os limites físicos dos Estados, criando um conjunto de normas capazes de realizar esse mister.
Esse sistema de normas jurídicas que visa disciplinar e regulamentar as atividades exteriores da sociedade
dos Estados e também, das Organizações Internacionais e dos próprios indivíduos é o que se chama de
Direito Internacional Público ou Direito das Gentes.
Sociedade e comunidade
O Direito Internacional Público disciplina e rege prioritariainente a sociedade internacional, formada por
Estados e Organizações Internacionais intergovernamentais, com reflexos voltados também para a atuação
dos indivíduos no plano internacional. No entanto, a noção de sociedade internacional não é de todo clara.
A realidade atual do Direito Internacional, com a multiplicação de organizações internacionais e de outras
coletividades chamadas de não-estatais, passa ao largo daquela realidade até então presente no cenário
internacional do entre-guerras, que entendia esta mesma sociedade internacional como o conjunto de nações
civilizadas. O conceito de sociedade internacional é, assim, um conceito em mutação, que poderá ser
modificado no futuro com a presença de novos atores das relações internacionais. A formação de uma
comunidade pressupõe um laço espontâneo e subjetivo de identidade familiar, social, cultural, religioso etc.,
entre os seus partícipes, em que não exista dominação de uns em detrimento de outros, em tudo diferindo da
existência de uma sociedade.
A sociedade internacional reveste-se de características diametralmente opostas às de uma comunidade. Nesta
última, seus membros “estão unidos apesar de tudo quanto os separa”, ao passo que na sociedade eles
“permanecem separados apesar de tudo quanto fazem para se unir”. A formação da sociedade internacional
se baseia na idéia de vontade dos seus participes (ainda que não espontânea), visando a determinados
objetivos e finalidades comuns. Mas se tais vínculos ou finalidades comuns não lograrem êxito, é mais fácil
para os seus componentes desligarem-se da sociedade a fim de buscar outras alternativas que atendam os
seus interesses no cenário internacional. Tal desligamento seria certamente mais dificultoso de existir num
campo no qual os laços que unem uma comunidade se apresentam.
O que existe, portanto, no âmbito internacional, é uma sociedade de Estados (e Organizações Internacionais
que suportam mutuamente enquanto isso lhes convém e enquanto isso lhes interessa. Trata-se de uma relação
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de suportabilidade, nada mais do que isso. Não se vislumbra, neste panorama, uma comunidade estatal unida
por um laço espontâneo e subjetivo de identidade, sem dominação de uns em relação aos outros ou sem
demais interesses.
Apesar de a expressão comunidade internacional não ser ainda aceita pela doutrina mais abalizada, a mesma
ainda continua a ser utilizada em vários instrumentos internacionais. De qualquer forma, o que existe entre
os Estados, em tese, é uma simples convivência, com uma ação de esforços comuns entre os associados,
estruturada na idéia de coordenação, sem qualquer espécie de subordinação (contrariamente do que ocorre no
plano do Direito interno). Assim, o que existe de concreto, sem embargo dos avanços nos campos científico
e tecnológico, de que é exemplo a rapidez dos meios de comunicação, é a existência de uma sociedade
internacional em franco desenvolvimento, integrada por Estados, por Organizações Internacionais
intergovernamentais e também pelos próprios indivíduos. Aliás, pertencer a sociedade internacional é uma
coisa; ser sujeito de direito das gentes é outra bem diferente. Assim, não se pode perder de vista que a
sociedade internacional é formada por um complexo muito mais amplo de atores que os pertencentes ao
Direito Internacional na categoria de sujeitos.
Ordem jurídica da sociedade internacional
Não pertence ao conceito de “ordem jurídica” a idéia de centralização de poder, não obstante tal
centralização existir no plano do Direito interno dos Estados. Portanto, a inexistência de um poder
centralizador no Direito Internacional faz nascer a idéia de que a ordem jurídica da sociedade internacional é
descentralizada, uma vez que em tal âmbito jurídico, ao contrário do sistema jurídico interno, não existe
centralização de poder, bem como uma autoridade com poder de impor aos Estados suas decisões. Inexiste
no plano internacional os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, uma vez que o “Judiciário”
internacional depende do aceite dos Estados para que possa atuar, ao contrário do que ocorre no âmbito
interno, em que o poder jurisdicional advém de um órgão autônomo e independente, o que faz com que o
direito das gentes desconheça, sob o aspecto formal, o princípio da hierarquia das leis, o que só é
compreensível sob o aspecto material e, mesmo assim, com um núcleo de regras advindas do costume.
A subordinação na ordem interna dá lugar à coordenação na ordem internacional, motivo pelo qual a vontade
ou consentimento dos Estados ainda é o motor da sociedade internacional contemporânea. Salvo no que
tange ao fundamento do Direito Internacional que não pode ficar à mercê da vontade isolada dos Estados, o
regime de consentimento estatal é bastante claro na ordem jurídica externa, podendo ser bem visualizado na
hipótese em que um Estado rechaça a jurisdição de um tribunal internacional ou quando não se submete à
eventual decisão internacional. A vontade do Estado apenas sucumbe caso tenha ele anteriormente
reconhecido a possibilidade de a vontade coletiva de outros Estados ser vinculante em relação a si, tal como
ocorre em relação à votação nas assembléias de organizações internacionais, quando se trata de assuntos de
menor interesse. Portanto, a ordem jurídica da sociedade internacional difere da ordem interna estatal por
estar estruturada de forma horizontal, sem conhecer poder central autônomo com capacidade de criação de
suas normas jurídicas e que garanta a sua efetiva aplicação, como ocorre no âmbito do ordenamento jurídico
interno.
Do ponto de vista formal, a diferença da sociedade internacional para a ordem interna baseia-se na sua
estrutura, em que não existe um território determinado, dentro da qual vive certa população, coordenada por
um poder soberano. Se comparada a população de um Estado com os Estados pertencentes à sociedade
internacional, ver-se-á que, enquanto aqueles devem submeter-se aos ditames provenientes do poder central
existente no Direito interno, estes últimos não se submetem senão à própria coordenação dos seus interesses
recíprocos, sem qualquer relação de verticalidade entre eles, o que não significa que não haja qualquer
sanção para os Estados faltosos em cumprimento das normas do direito das gentes.
Do ponto de vista material, a sociedade internacional jamais se igualará à sociedade de pessoas ou, até, à
comunidade destas no Direito interno, uma vez que as matérias que disciplina provêm de um conjunto de
Estados com poderes soberanos limitados em razão da própria idéia de descentralização, e não de uma
vontade única eleita pélos seus sujeitos para reger-lhes a conduta ou até mesmo a eles imposta. A ordem
jurídica da sociedade internacional é descentralizada, mas ao mesmo tempo organizada pela lógica da
coordenação ou cooperação, que gradativamente vai tomando o espaço do antigo sistema de justaposição, em
virtude de cada vez mais em voga doutrina da interdependência, segundo a qual, os Estados, nas suas
relações internacionais, dependem menos de si próprios e mais da grande aldeia global que está à sua volta.
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FUNDAMENTOS DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
Saber qual o fundamento do Direito Internacional Público significa desvendar de onde vem a sua
legitimidade e sua obrigatoriedade, ou os motivos que justificam e dão causa a essa legitimidade e
obrigatoriedade. Significa perquirir de onde de quais fatos ou valores emana a imposição de respeito de suas
normas e princípios.
O que se busca saber não são os motivos de fato, filosóficos, políticos, sociais, econômicos, históricos ou
religiosos de sua observância, mas sim as razões jurídicas capazes de explicar o por quê da aceitação e
obrigatoriedade do Direito Internacional por parte de toda a sociedade internacional.
O fundamento do Direito Internacional não se confunde com as suas fontes, estas buscam determinar de onde
provêm ou podem vir a provir as regras jurídicas internacionais determinando do que se compõe o Direito
Internacional Público, enquanto aquele estabelece os fatos que atribuem ao Direito Internacional
obrigatoriedade no mundo jurídico.
Esta matéria passou a ter importância com a chamada Escola Espanhola do Direito Internacional,
notadamente com os ensinamentos dos teólogos Francisco de Vitória e de Francisco Suárez, hoje
reconhecidos como os maiores precursores do Direito Internacional, de onde emanaram as doutrinas que
pretendem responder a questão sobre o fundamento desse Direito, com seus desdobramentos e
conseqüências.’
Doutrinas
A questão do fundamento do Direito Internacional Público tem sido, desde longo tempo, objeto de inúmeros
estudos, existindo várias doutrinas que buscam demonstrar o fundamento jurídico de sua obrigatoriedade e
eficácia, a doutrina da autolimitaçdo, do direito estatal externo, dos direitos fundamentais dos Estados, da
vontade coletiva dos Estados, do consentimento das nações, a da norma fundamental, da solidariedade social,
a da opinião dominante, as jusnaturalistas etc. Todas elas, entretanto, podem ser enquadradas em duas
principais correntes: a voluntarista (as cinco primeiras) e a objetivista (as quatro últimas).
Doutrina voluntarista
Para a corrente voluntarista, de base notadamente positivista, a obrigatoriedade do Direito Internacional
decorre sempre do consentimento (vontade) comum dos Estados, da mesma maneira que o Direito interno
funda-se no assentimento dos cidadãos. Trata-se de positivismo cujas bases teóricas encontram guarida em
Bynkershoek, posteriormente desenvolvida por Moser e Martens, pelo fato de serem as regras adotadas pelos
Estados (os tratados internacionais) produto exclusivo de seu consentimento.
Esse consentimento estatal pode ainda provir, além dos tratados, numa vontade tácita, pela aceitação do
costume internacional, ou ainda das normas do ordenamento jurídico interno. Ou seja, de acordo com a
concepção voluntarista, o Direito Internacional Público é obrigatório porque os Estados, expressa ou
tacitamente, assim o desejam e querem. O seu fundamento encontra suporte na vontade coletiva dos Estados
ou no consentimento mútuo destes, sem qualquer predomínio da vontade individual de qualquer Estado sobre
os outros.
Essa doutrina não é nova e, segundo Verdross, encontra suas raízes históricas no Direito Romano, onde todo
acordo internacional se tornava irrevogável pela vontade dos contratantes.
Existem também algumas variantes da doutrina voluntarista. Para alguns autores o Direito Internacional
Público se funda na vontade metafísica dos Estados, que impõe limitações ao seu poder absoluto, obrigando
o Estado para consigo próprio. Trata-se da teoria da autolimitação, defendida pelos adeptos da doutrina dos
freios e contrapesos (checks and balances). O Estado reconhece a existência de uma ordem internacional,
sem contudo reconhecer que esta ordem advém de um poder (ou de uma força) superior. O Estado, ao aceitar
a existência do ordenamento jurídico internacional, não se submete a outra coisa senão à sua própria vontade.
Portanto, segundo esta concepção, sendo o Estado “o senhor absoluto do seu poder, a vinculação
internacional assumida perante outros interlocutores só é viável se e na medida em que tenha sido aceite pelo
próprio Estado”.
Esta teoria, entretanto, não é imune a críticas. A primeira delas é a de que não explica como um novo Estado,
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que surge no cenário internacional, pode estar obrigado por tratado internacional, norma costumeira ou
principio geral do direito de cuja formação ele não participou com o produto da sua vontade.
Em segundo lugar se o Direito Internacional encontra o seu fundamento de obrigatoriedade na vontade
coletiva dos Estados, basta que um deles, de um momento para o outro, se retire da coletividade ou
modifique a sua vontade original para que a validade do Direito lnternacional fique comprometida, o que
ocasionaria grave insegurança às relações internacionais. É um completo contra-senso admitir uma
obrigatoriedade condicionada à vontade dos Estados. Admitir a validade deste entendimento seria admitir o
desaparecimento do Direito Internacional pela vontade dos Estados, o que não é justificável e admissível,
sendo um erro “basear o direito sobre a mera vontade do Estado”. Ora, nenhum Estado pode, unilateralmente,
modificar o Direito Internacional, submetido que está a princípios superiores à sua vontade, integrantes da
ordem jurídica internacional. Defender o voluntarismo é, pois, permitir que os Estados possam a qualquer
momento desligar-se unilateralmente das normas jurídicas internacionais, sem que se possa falar em
responsabilidade, nem, tampouco, em violação do Direito Internacional.
Esta doutrina voluntarista, de índole subjetivista, não explica o fundamento do Direito Internacional, cujas
normas existem independentemente da vontade dos Estados e, em vários casos, contra essa própria vontade.
O reconhecimento do indivíduo como sujeito de Direito Internacional já impõe o abandono dos dogmas
positivistas, ultrapassados e juridicamente infundados, do dualismo de sujeitos nos planos interno e
internacional e da vontade dos Estados como fundamento último de existência da ordem jurídica
internacional.
Doutrina objetivista
Do fato evidente de ser o voluntarismo incapaz de resolver o problema do fundamento do Direito
Internacional, nasceu a necessidade de se encontrar um princípio transcendente e objetivo que viesse a por
temor na questão. Nascida nos últimos anos do século XIX, como reação dos filósofos, sociólogos e
internacionalistas contra as idéias voluntaristas, a corrente objetivista apregoa que a obrigatoriedade do
Direito Internacional advém da existência de princípios e normas superiores aos do ordenamento jurídico
estatal, uma vez que a sobrevivência da sociedade internacional depende de valores superiores que devem ter
prevalência sobre as vontades e os interesses domésticos dos Estados.
Tal doutrina se baseia em razões de ordem objetiva e tem como suporte e fundamento o direito natural, as
teorias sociológicas do direito e o normativismo jurídico kelseniano. Contudo, a compreensão desses
elementos quando somados (direito natural, teorias sociológicas e normativismo jurídico) não é fácil,
havendo quem entenda que o fundamento último de obrigatoriedade do Direito Internacional é apenas o
direito natural, único capaz de explicar (à exceção dos tratados) a obrigatoriedade dos costumes e dos
princípios gerais de direito.
Para a doutrina objetivista a legitimidade e obrigatoriedade do Direito Internacional devem ser procuradas
fora do âmbito de vontade dos Estados, ou seja, na realidade da vida internacional e nas normas que
disciplinam e regem as relações internacionais, que são autônomas e independentes de qualquer decisão
estatal.
Dentre os autores mais conhecidos, o Direito não é um produto da vontade humana, mas uma necessidade
advinda de fatores sociais.
Esta doutrina, contudo, também é passível de críticas, na medida em que minimiza (e, à vezes, até aniquila) a
vontade soberana dos Estados, que também tem o seu papel contributivo na criação das regras de Direito
Internacional.
Fundamento do Direito Internacional na regra pacta sunt servanda
Uma terceira corrente, mais moderna e consagrada por instrumentos internacionais, acredita que o
fundamento mais concreto da aceitação generalizada do Direito Internacional Público, dentre as inúmeras
doutrinas que procuram explicar a razão de ser desse direito, emana do entendimento de que o Direito
Internacional se baseia em princípios jurídicos alçados a um patamar superior ao da vontade dos Estados,
mas sem que se deixe totalmente de lado a vontade desses mesmos Estados.
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Em verdade, trata-se de uma teoria objetivista temperada, por também levar em consideração a manifestação
de vontade dos Estados. Afinal de contas, um Estado ratifica um tratado internacional pela sua própria
vontade, mas tem que cumprir o tratado ratificado de boa-fé, sem se desviar desse propósito, a menos que o
denuncie e então, novamente, aparece a vontade do Estado, hábil a retirá-lo do compromisso que
anteriormente assumira.
Esse tipo de consentimento é chamado de perceptivo em contraposição ao consentimento criativo, que cria
normatividade jurídica concreta, pois nasce e ganha forma em virtude da pura razão humana, ou se apóia, em
menor ou maior medida, num imperativo ético, onde o sistema estatal passa a não mais ter a prerrogativa de
manipulação.
Esta teoria abandona o esquema piramidal kelseniano do ordenamentojurídico, retirando o caráter de mera
hipótese da norma fundamental que justifica a existência e a validade do Direito Internacional, para atribuirlhe caráter de regra objetiva e demonstrada - pacta sunt servanda - que impõe aos Estados o dever de
respeitar a sua palavra e de cumprir com a obrigação aceita no livre e pleno exercício de sua soberania.
A razão primordial é a conservação da própria sociedade internacional, uma vez que, para a existência desta,
é necessário a existência anterior de um direito. Em última análise, pode-se dizer que a sua finalidade é
salvaguardar o bem comum da sociedade internacional, por meio da manutenção da harmonia e das boas
relações entre todos os povos.
Tal doutrina tem merecido o crédito e o respeito de grande parte dos autores contemporâneos, notadamente
os da escola italiana de Direito Internacional, cujas bases teóricas encontram supedâneo nas regras do direito
natural.
O grande expoente da escola vienense Alfred von Verdross, a esse respeito, assim lecionou: “Não é a
vontade como tal, quer a de um Estado, quer a comum de todos ou de vários Estados, que faz nascer o direito
internacional; a força obrigatória deste decorre da regra objetiva pacta sunt servanda que impõe aos Estados
o respeito da palavra dada.
Outro internacionalista, como mesmo ponto de vista, foi o mestre da escola italiana Dionisio Anzilotti, que
via na norma pacta sunt servanda segundo a qual as partes têm o dever de cumprir e respeitar aquilo que foi
acordado no plano internacional, o fundamento jurídico único e absoluto do Direito Internacional Público,
que serviria de critério para diferencar as normas internacionais de todas as demais normas.
Outras escolas também destacaram a importância do pacta sunt servanda, ainda que de modo diverso. Para
Kelsen, por exemplo, o pacta sunt servanda é a regra costumeira eminente resultante da norma fundamental,
da qual deriva a obrigatoriedade dos tratados. Kelsen ao advogar a tese monista internacionalista, viu-se
obrigado a também encontrar na regra pacta sunt servanda o fundamento do Direito Internacional Público,
seria desnecessário adotando-se o posicionamento monista nacionalista, segundo o qual a vontade dos
Estados justificaria a obrigatoriedade do direito das gentes.
Esta idéia, baseada na regra pacta sunt servanda, foi definitivamente consagrada, em 1969, quando da adoção
da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que positivou tal princípio, inclusive com o próprio
nome de pacta sunt servanda, no seu art. 26, nos seguintes termos: “Todo tratado em vigor obriga as partes e
deve ser cumprido por elas de boa-fé”. Mas a regra já tinha sido anteriormente expressada, no Protocolo de
17 de janeiro de 1871, da Conferência de Londres, na qual ficou declarado “que é princípio essencial do
direito das gentes que nenhuma potência possa livrar-se dos compromissos de um tratado, nem modificar as
estipulações, senão como resultado do assentimento das partes contratantes, por meio de entendimento
amigável”. A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, consagrou nos seus arts. 53 e 64 a noção de
jus cogens como normas imperativas de Direito Internacional geral, reconhecidas pela sociedade
internacional dos Estados no seu conjunto, em relação a qual nenhuma derrogação, em regra, é permitida.
Normas de Direito Internacional geral são normas, em princípio, costumeiras nada impedindo que,
posteriormente, venham ser positivadas em tratados. São costumeiras pelo fato de ser praticamente
impossível existir norma internacional da qual sejam partes todos os Estados do mundo. Esse conjunto de
normas imperativas, capazes de eivar de nulidade eventual tratado que com elas conflite, demonstram a
aceitação geral, pela Convenção de Viena de 1969, de alguns dos princípios do direito natural. Tais regras de
jus cogens impõem, pois, limitações à autonomia da vontade dos Estados, o que se justifica na medida em
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que visam a proteção dos interesses individuais dos Estados, bem como na proteção destes contra suas
próprias fraquezas ou contra as desigualdades do bargaining power.
A vontade coletiva dos Estados, como simples ato jurídico, não pode constituir o fundamento do Direito
Internacional Público. Se o Estado externa a sua vontade, manifestando o seu consentimento, assim o faz em
virtude da existência de um princípio anterior que lhe concede este poder. Como o direito não é produto
exclusivo da vontade do Estado, mas antes, lhe é anterior, o que o Estado faz é apenas reconhecer, por meio
de normas jurídicas, a sua obrigatoriedade, tanto no plano interno, como no plano internacional. E se o
Estado apenas reconhece esta obrigatoriedade, é porque consagra que o direito é uno, e também que, por
meio de um princípio geral anterior, lhe concedeu o poder de gerar normas jurídicas de cunho obrigatório.
Se este princípio emanado da ordem jurídica internacional - pacta sunt servanda, representado pela norma
última, da qual derivam todas as normas jurídicas, lhe é anterior, não se pode olvidar que do sistema
internacional é que advém a obrigatoriedade do Direito interno. É desta norma última, ou suprema - norma
fundamental suprema, que derivam todas as demais normas jurídicas e de onde estas retiram o seu
fundamento de validade. A norma fundamental ou suprema é, por conseguinte, superior a todo o direito
positivo, ou seja, aquela cuja validade não pertence a nenhuma outra ordem, a nenhum outro sistema de
regras positivas, porque não foi “criada” de acordo com as prescrições de qualquer outra norma jurídica. Por
conseqüência, não se vislumbra dualidade de sistemas, mas sim uma unidade advinda da supremacia do
Direito Internacional. O ato jurídico estatal, assim, nada mais é do que a aplicação permitida de um direito
preexistente e superior à sua vontade.
O Direito Internacional Público, consubstancia-se num conjunto de regras jurídicas superiores à vontade dos
Estados, regras estas que lhes impõem sua correta observância e o seu fiel cumprimento, coordenando-lhes
dentro de um sistema jurídico único. Por conseguinte, a eficácia do Direito Internacional depende, em grande
parte, da existência de um conjunto de regras estatais que se amoldem às exigências da ordem internacional e
facilitem sua aplicabilidade. É essencial, ademais, que os ordenamentos internos, em caso de conflito, não
obstem a aplicação das normas internacionais, que serão sempre superiores aos seus comandos. Nesta ordem
de idéias é que se entende que a ordem jurídica estatal deve obediência e respeito às regras estabelecidas pelo
ordenamento internacional, que lhe é superior e lhe impõe sua correta observância.
Bibliografia: MAZZUOLLI, Valério de Oliveira. CURSO DE DIREITO INTERNACIONAL
PÚBLICO.
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FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
FONTE X FUNDAMENTO
As Fontes são os modos pelos quais o direito se manifesta. Através delas surgirão as normas jurídicas
relacionadas a determinados sistemas. Para Virally, a expressão “fontes de direito” encontra-se
tradicionalmente limitada aos métodos de criação das normas jurídicas, das regras gerais e permanentes
capazes de serem aplicadas, repetidamente, sem nenhum limite.
Os Fundamentos são circunstâncias que dão obrigatoriedade ao sistema jurídico. Por exemplo, a Lex
Mercatoria, a jurisprudência e os contratos-tipo são fontes; o comércio internacional é fundamento.
Touscoz enuncia existirem estreitas interdependências entre as diversas fontes do Direito Internacional.
Referindo-se às fontes enumeradas pelo artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, afirma que é
cômodo distinguir estas diferentes fontes do Direito, cujos regimes são diferentes, mas é importante
sublinhar que elas mantêm estreitas e complexas relaçôes que revelam a unidade fundamental do Direito
Internacional.
CLASSIFICAÇÃO DAS FONTES - Há conflito de posições entre os doutrinadores.
Para Accioly, há três fontes de Direito Internacional:
fonte real: é a fundamental (princípios gerais de direito);
fontes formais ou positivas: dão positividade ao direito objetivo preexistente, sendo, em geral, sancionadas
pelo Poder Público (costumes e os tratados internacionais);
fontes auxiliares: são aquelas que ajudam na compreensão do sistema jurídico, também chamadas indiretas
(doutrina e jurisprudência dos Estados, legislação interna dos Estados e sentenças arbitrais).
Segundo Mello, são fontes:
concepção positivista-voluntarista: são fontes do Direito Internacional somente as que emanam da vontade
comum dos Estados-membros da Sociedade Internacional. Exemplo: tratados internacionais são tidos como
fonte expressa e o costume internacional como fonte tácita;
concepção objetivista: elaborada por autores como Accioly e Sully, as fontes seriam formais ou materiais.
Segundo Meira Mattos, teríamos:
fontes formais: seriam aquelas caracterizadas pela exteriorização da vontade das partes. Exemplo: os
tratados-lei, os costumes, os princípios gerais do direito, as decisões das organizações internacionais e a
eqüidade;
fontes materiais: aquelas que tratariam do fundo (conteúdo) de determinado sistema jurídico. Seriam, no
Direito Internacional, o contrato, a doutrina, a analogia e a opinião pública.
FONTES SEGUNDO O ESTATUTO DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA
A Corte Internacional de Justiça é o principal tribunal judiciário de natureza permanente da Sociedade
Internacional. Seu Estatuto, tomado literalmente, enumera apenas as normas de direito a ela obrigatórias, não
tendo, a rigor, nenhum outro alcance. Contudo, pelo fato de ter jurisdição ilimitada, segundo seu artigo 36, a
enumeração dessas fontes torna-se um referencial para qualquer estudo em Direito Internacional. Pela leitura
do artigo 38, podemos vislumbrar a presença de fontes principais e secundárias.
Estatuto da Corte Internacional de Justiça - Artigo 38
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem
submetidas, aplicará:
a) as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente
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reconhecidas pelos Estados litigantes;
b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito;
c) os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas;
d) sob ressalva da disposição do art. 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos juristas mais qualificados das
diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo et bono, se as
partes com isto concordarem.
Fontes Principais
Convenções internacionais gerais ou especiais, com regras especialmente aceitas pelos Estados litigantes;
Costume internacional, como prova de prática geral, aceita como sendo direito;
Princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas.
Fontes Auxiliares ou Secundárias
Decisões judiciárias e doutrina dos juristas mais qualificados;
Eqüidade, caso haja o consentimento das partes;
Atos unilaterais, apesar de não terem sido previstos no Estatuto da Corte como fontes, os mesmos têm sido
aceitos como tal. Exemplo típico de utilização de Ato Unilateral para fundamentar processos perante a CJJ
encontrou-se na ação recentemente proposta pela Austrália, contra a realização de testes nucleares por parte
da França no Atol de Mururoa, com base em declaração do presidente francês, em 1973, de que não mais
realizaria testes nucleares no Pacífico Sul.
HIERARQUIA DAS FONTES
Como ressalta Brownlie, as alíneas não foram ordenadas de modo a representar uma hierarquia, porém o
legislador pretendeu dar-lhes uma ordem, tendo mesmo a palavra “sucessivamente” sido utilizada num dos
projetos. Embora a CIJ não tenha estabelecido hierarquia entre as fontes apresentadas, a prática internacional
evidencia hierarquia baseada no aforismo “lei especial derroga lei geral”. Além do mais, a prioridade da
alínea a — “as convenções internacionais (...)“ —, segundo o mesmo autor, é explicável pelo fato de se
referir a uma fonte de obrigações mútuas para as partes.
OUTRAS FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL
Em cada ordenamento, ao lado da fonte direta, temos fontes indiretas que podem ser distinguidas em fontes
reconhecidas, como o costume, e fontes delegadas, como o regulamento com relação à Lei. Tais fontes
reconhecidas do Direito Internacional não só se encontram discriminadas no artigo 38 do Estatuto da CIJ,
mas são também resultado de posicionamentos doutrinários e da prática internacional.
COSTUME INTERNACIONAL
Estatuto da Corte Internacional de Justiça - Artigo 38
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem
submetidas, aplicará: (...)
b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito;
Como preceitua Virally, o costume, que é o produto direto das necessidades da vida internacional, surge
quando os Estados adquirem o hábito de adotar, em relação a dada e repetida situação, uma atividade
determinada, à qual se atribui significado jurídico.
Costume
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É o conjunto de normas consagradas pelo longo uso e observadas na ordem internacional como obrigatorias.
Observa-se na definição o aspecto temporal que assume a prática, para ser caracterizada como costume, não
sendo, via de regra, delimitado o tempo necessário para tanto, desde que a uniformidade e a generalidade da
prática sejam demonstradas. Tal fato é um dos obstáculos à aplicação do costume como fonte do Direito
Internacional. Ressalta-se, ainda, o caráter impositivo e obrigatório da prática, para ser considerada costume.
Costume x Uso
Para Bobbio, o principal problema de uma teoria do costume é determinar em que ponto uma norma
consuetudinária jurídica distingue-se de uma norma consuetudinária não jurídica, ou seja, através de que
processo uma simples norma de costume, ou uso, torna-se uma norma jurídica. Conclui que uma norma
consuetudinária torna-se jurídica quando vem a fazer parte de um ordenamento jurídico, tornando-se, desta
forma, obrigatória.
Costume é norma jurídica obrigatória. Se não for cumprido, acarreta uma sanção, que é a ação de
responsabilidade internacional.
Já o uso não tem essa característica, pois é prática não obrigatória para os sujeito internacionais e que,
quando violada, não acarreta sanções.
É o elemento normativo, ligado à certeza de se conformar com as exigências de Direito, que distingue o
costume do uso.
Elementos
Elemento Material: é o uso geral (prática/multiplicação de precedentes), seguido por parcela da Sociedade
Internacional, com a convicção de que é obrigatório. Os precedentes podem emanar de todos os sujeitos da
ordem internacional. Uma série de precedentes pode constituir uma prática, mas não é suficiente para
estabelecer a existência de um costume; este implica a existência de um elemento psicológico, a convicção
dispersa pelos sujeitos de Direito de que a prática é obrigatória. A convicção da obrigatoriedade reporta-se
não a qualquer psicologia coletiva, mas à interpretação funcional e normativa da vontade manifestada por
sujeitos de Direito Internacional ou pelos seus órgãos.O uso exige tempo e repetição de comportamentos,
seja por ação ou por omissão e o requisito tradicional de duração não é um fim em si mesmo, senão um meio
para demonstrar a generalidade e uniformidade de determinada prática estatal.
Elemento Subjetivo: é a opinio júris, expressão da consciência coletiva da Sociedade Internacional,
aceitando o costume como um novo direito. E a convicção, por parte dos criadores dos precedentes de que,
ao estabelecê-los, estão aplicando uma regra jurídica. Atualmente, tal elemento é mais importante que o
elemento material na caracterização do costume, o que permite uma maior defesa dos Estados do Terceiro
Mundo que consideram que uma norma costumeira só será válida se receber o consentimento de todos os
Estados soberanos. A existência de um elemento subjetivo, está implícita no próprio conceito de opinio juris
sive necessttatis. O Estado interessado deve sentir que cumpre o que supõe ser uma obrigação jurídica. Nem
a freqüência, nem o caráter habitual dos atos, é, em si, suficiente.
Fundamento - é apresentado por três teorias:
Teoria Voluntarista (Escola Positivista): o fundamento do costume encontra-se no consentimento tácito dos
Estados. Autores como Virally, afirmam estar o Estado obrigado por uma regra consuetudinária se não
adotou uma persistente atitude de oposição a ela durante o período de sua formação. Os novos Estados ficam
obrigados por todas as regras de Direito Internacional Consuetudinário que se aplicam indiferentemente a
todos os Estados independentes desde que não tenham apresentado reservas, expressas e determinadas,
quando entrarem em relações internacionais normais. Brownlie, por sua vez, afirma poder um Estado
subtrair-se à força obrigatória de um costume durante o seu processo de formação. Tal teoria peca por não
considerar ser o costume uma prática evolutiva. Segundo Jorge Miranda, as doutrinas voluntaristas estão
ultrapassadas e nem sequer fornecem uma base segura para a compreensão de costumes locais ou bilaterais.
Teoria da Consciência Jurídica Coletiva (Escola Histórica Alemã - Von Savigny): sustenta a existência de
um espírito do povo. O costume não seria elaborado, mas sim “descoberto”. Todos os povos, em seu foro
íntimo, teriam noção de razão, justiça e solidariedade, ou seja, haveria uma consciência jurídica coletiva. No
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entanto, tal afirmativa é vaga e insuficiente, por exemplo, para justificar o princípio que afirma que todo
Estado que obtém sua independência, tornando-se ente soberano na Sociedade Internacional, passaria por
uma fase de inexistência de obrigações, seria substituída paulatinamente pelos costumes a que este Estado
aderisse e pela celebração de tratados, constituindo, desta forma, obrigações internacionais.
Teoria Sociológica: o costume seria produto da vida social, que viria a atender as necessidades sociais. E a
teoria que prevalece atualmente, pois vê o costume como produto da evolução da sociedade.
Características
É prática comum, que resulta da repetição uniforme de certos atos da vida internacional.
É prática obrigatória, ou seja, o costume é direito, em conseqüência de ser respeitado por toda a Sociedade
Internacional.
É prática evolutiva, ou seja, possui plasticidade, que lhe permite adequar-se às novas circunstâncias da vida
social.
Prova
Segundo Brownlie, em princípio, presume-se que um tribunal conhece o Direito, podendo aplicar o costume
mesmo que este não tenha sido expressamente alegado.
Na prática, quem invocar um costume tem o ônus da prova, cuja natureza irá variar de acordo com o objeto e
com a forma que revestirem as alegações, ou seja, em litígio internacional, cabe à parte que o alega provar
sua existência.
Pela concepção anglo-saxônica, o costume poderá ser comprovado numa prática generalizada ou num
consenso na doutrina, ou ainda em decisões anteriores, quer da CIJ quer de outros tribunais internacionais, já
que a escolha abordagem parece depender da natureza das questões e da discricionariedade do Tribunal.
Akehurst afirma que a prova deve ser procurada na atual prática dos diversos Estados, da qual é possível se
ter uma idéia geral através da consulta de material publicado sob forma de boletins informativos, versando
sobre medidas por eles adotadas, e declarações ao parlamento por parte dos representantes governamentais.
Tal posição também é com partilhada por Mello e Rezek, segundo os quais o costume será provado não só
através dos chamados atos executórios, que são os atos dos diversos órgãos estatais judiciários, legislativos e
executivos, mas também daqueles que compõem a prática diplomática, como as declarações políticas e
correspondência internacional, e ainda pelos textos legais e decisões judiciárias que disponham sobre tema
de interesse de Direito Internacional.
Boson reconhece que a prova decorrerá da verificação de um número razoável de precedentes inequívocos,
manifestados pelo Estado a que são atribuídos, para Akehurst, quando não existe qualquer prova “contra”
uma alegada norma consuetudinária, um pequeno número de práticas é suficiente para criar tal tipo de
norma, ainda que esta prática implique alguns Estados e tenha tido pouca duração.
Aréchaga, por fim, afirma ter a Corte Internacional de Justiça adotado, nos últimos tempos, um enfoque
“inovador e potencialmente fecundo”, afastando-se das posições extremas da heterodoxia jurídica, pois, em
lugar de insistir a prova estrita do consentimento do Estado demandado como defendido pela Escola
Positivista, buscando o consenso geral dos Estados. Descarta, assim, a concepção voluntarista e coloca em
uma perspectiva mais ampla certos pronunciamentos anteriores relativos ao costume regional e local. Aceita,
em certas circunstâncias, o valor normativo de uma prática consolidada em um breve espaço de tempo,
admitindo-se, desta forma, que o desenvolvimento do costume deve medir-se pelo ritmo da vida
contemporânea e não pelo que “se tem estabelecido desde um tempo muito longo e imemorial”.
Interpretação
Não há método preciso de interpretação dos costumes, ao contrário do que ocorre com os tratados. Há
princípios normalmente aceitos: costume especial derroga o geral e costume posterior derroga o anterior.
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Decadência
Os costumes são fonte de Direito Internacional que não têm meio de prova pacífico, muito menos método de
interpretação. Apesar de terem tido sua importância reduzida nos julgamentos da Corte Internacional de
Justiça, ainda hoje, há áreas do Direito Internacional regulamentadas basicamente pelo Costume
Internacional, com a responsabilidade internacional dos Estados, as imunidades dos Estados e até mesmo a
concessão de independência a povos e países colonizados em que se aboliu a legitimida dos títulos de
dominação colonial.
Nos últimos anos, tem-se manifestado uma tendênci para se codificar o costume, como se nota pela conclusã
das Convenções de Viena sobre Relações e Imunidades Diplomáticas (1961), de Relações e Imunidades
Consulares (1963) e do Direito dos Tratados (1969), além da Convenção de Montego Bay sobre o Direito do
Mar (1982). São evidentes as vantagens conseguidas pela codificação do Direito Consuetudinário através de
tratados, à medida que as normas se tornam mais precisas e acessíveis e os novos Estados se mostram mais
dispostos a acatar normas de cuja elaboração tenham participado, mas, em contrapartida, a codificação tem o
inconveniente de fixar os costumes e de tornar a sua evolução mais difícil.
PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO
Estatuto da Corte Internacional de Justiça - Artigo 38
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem
submetidas, aplicará: (...)
c) os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas;
Os princípios gerais de direito têm a finalidade de preencher lacunas do Direito, sendo elemento subsidiário
para a decisão da CIJ, apresentando-se ou como princípios gerais comuns à ordem interna e internacional,
como o pacta sunt servanda, o princípio da boa-fé e do direito adquirido, ou como princípios gerais de
Direito Internacional.
PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO INTERNACIONAL
Aréchaga considera os princípios gerais de Direito Internacional a mais notável inovação da Carta das
Nações Unidas, que tanto no seu artigo 2º quanto na Resolução n. 2.625 (XXV), de 1970, identificaria os
seguintes princípios fundamentais nas relações entre os Estados:
Abstenção, em suas relações internacionais, de recorrer a ameaça ou uso da força, ou qualquer outra forma
incompatível com os propósitos das Nações Unidas, contra a integridade territorial ou a pendência política de
outro Estado. Pela Resolução, o uso da força é ilegítimo, salvo se for aplicado como uma sanção ordenada ou
autorizada por um órgão ou organização internacional competente, ou sej a, exercido como ato lícito de
legítima defesa, pois até o Pacto da Liga das Nações o emprego da força pelos Estados era lícito; a força
armada era descrita como um recurso de última instância que os Estados podiam utilizar discricionariamente
como meio para solucionar as controversias ou para alcançar outros fins de apoio a sua diplomacia. O Pacto
introduziu limitações parciais no direito dos Estados de “recorrer à guerra” e as partes do Tratado
BriandKellog condenaram “o recurso da guerra para a solução das controvérsias internacionais” e
renunciaram a ela “como instrumento de política nacional, em suas mútuas relações”.
Proíbe-se não apenas o uso, mas também a ameaça do uso da força, esclarecendo-se tratar aqui da força
armada, e não outras formas de pressão econômica ou política. As represálias armadas, a agressão indireta e
o uso da força contra povos que exercem seu direito à livre determinação também são consideradas
ilegítimas.
Solução pacífica dos litígios internacionais.
Não-intervenção em assuntos de jurisdição interna. Tal princípio, originário dos Estados latino-americanos,
contou com uma resistência inicial por parte dos Estados Unidos, que afirmavam que tal princípio vincularia
apenas a ONU. Tal posição não logrou êxito, pois, ao proclamar a igualdade soberana dos Estados, a Carta
das Nações Unidas proibiu que um Estado se ingerisse nos assuntos internos de outro.
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Cooperação.
Igualdade de direitos e livre determinação dos povos. Manifesta-se através da necessidade de levar em
consideração os desejos livremente expressos pelos povos, segundo expresso na Resolução n. 2.625, in Jine:
Em virtude do princípio da igualdade de direitos e da livre determinação dos povos, consagrado na Carta das
Nações Unidas, todos os povos têm direito de determinar livremente, sem ingerência externa, sua condição
política, e de procurar seu desenvolvimento econômico, social e cultural e todo o Estado tem o dever de
respeitar este direito, em conformidade com as disposições da Carta.
Durante muitos anos, a livre determinação dos povos era considerada mais como um postulado políticomoral do que um princípio jurídico propriamente dito. A partir de 1945, tal princípio se converteu na
principal base jurídica no processo de descolonização, culminando com a Declaração sobre a Independência
dos Povos Coloniais.
O estabelecimento de um Estado soberano e independente, a livre associação ou integração com um Estado
independente ou a aquisição de qualquer outra condição política livremente decidida por um povo
constituem formas de exercício do direito de livre determinação deste povo. Tal princípio sofre restrições,
ligadas ao fato de se considerar que certa população constitui-se ou não em um povo ou se viola o princípio
do respeito à integridade territorial e à unidade nacional dos Estados, ao fomentar movimentos insurretos e
de secessão, que poderiam levar a uma fragmentação dos Estados. Autoriza-se, por fim, os Estados a darem
apoio moral e material aos povos que estejam lutando pelo seu direito à livre determinação.
Igualdade soberana
Cumprimento em boa-fé das obrigações contraídas pelos Estados. Segundo Charles Rousseau teríamos
princípios comuns à ordem jurídica interna e à ordem jurídica internacional. Os primeiros seriam os
princípios gerais de direito propriamente ditos, os quais dividem-se em: princípios reativos ao nascimento
das obrigações, como o das obrigações nascidas de atos unilaterais; princípios relativos à execução das
obrigações, como o pacta sunt servanda; princípios relativos ao exercício de direitos, como o do abuso de
direito e respeito ao direito adquirido; princípios relativos à extinção das obrigações, como o da prescrição
liberatória. Os princípios especiais da ordem jurídica internacional, ou princípios gerais de Direito
Internacional, seriam os princípios aplicáveis especificamente às relações entre Estados que distinguir-se-iam
tanto das regras convencionais quanto dos costumes e seriam:
Primado do Direito Internacional sobre a lei interna, tal princípio foi qualificado como geralmente
reconhecido em Direito das Gentes pela Corte Permanente de Justiça Internacional - CPJJ, através do Aviso
Consultivo relativo às Comunidades Greco-búlgaras, de 31.07.1930.
Respeito à independência dos Estados: estabelecido pelo Caso Dorten do Tribunal de Comércio de
Luxemburgo, em 08.03.1930.
Continuidade dos Estados: reconhecido na sentença arbitral no Caso Tinoco, em 18.10.1923.
Responsabilidade Internacional: cujo princípio geral de que a indenização deveria ser apreciada a partir da
data de realização efetiva do prejuízo, surge partir da Sentença Arbitral no Caso Florestas Rhodope (Grécia),
em 29.03.1933.
Patrimônio comum da humanidade: surgiu a partir da Declaração da Assembléia Geral da ONU sobre os
princípios que regulam os Fundos Marinhos e Oceânicos, que enunciou que nenhum Estado nem pessoa,
natural ou jurídica, reivindicará, exercerá ou adquirirá direitos com respeito à zona ou seus recursos, que
sejam incompatíveis com o regime internacional que há de estabelecer-se e com os princípios da presente
Declaração.
Tornou-se internacionalmente conhecido a partir da Conferência de Montego Bay, de 1992, a respeito da
delimitação do mar territorial. Nesse evento, duas posições se destacaram: a européia, que pregava três
milhas, e a dos Estados mais recentes, que pregavam 200 milhas. O resultado da conferência foi a
estipulação de 12 milhas, com área contígua de 24 milhas. Uma das cláusulas estabelecidas na Conferência
foi a de que tudo que ficar no fundo do mar, fora das 12 milhas territoriais de cada país, será patrimônio da
humanidade. A partir do momento em que o Brasil aceitou as condições estipuladas nesta Conferência,
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iniciou-se a pressão pela internacionalização da Amazônia pelo Grupo dos Sete. Isso significa que a
Amazônia deveria ser preservada como santuário ecológico. A idéia é que nós não atingimos o nível ideal de
desenvolvimento econômico por nossa única e exclusiva culpa e que não temos, por isso, condição de
explorar a Amazônia, que deveria ser administrada por uma autoridade supranacional. Por outro lado, é
sabido que as riquezas da Amazônia, rastreadas por satélite poderiam alterar, a longo prazo, o quadro de
dominação do Grupo dos Sete.
Yusuf destaca como princípio geral de Direito Internacional a igualdade soberana entre os Estados. Para esse
autor, a idéia de igualdade entre os Estados com o princípio geral de Direito Internacional é um resultado da
própria noção de soberania, que emergiu, após o colapso do Império Sacro Romano, com a idéia de Estado
nacional, consagrado no Tratado de Osnabrück (um dos que compuseram a Paz de Westphalia). Para Yusuf,
apesar da idéia de igualdade corresponder, para os jusnaturalistas, a um direito natural, a desigualdade entre
os Estados tem levado alguns juristas não só a expressarem dúvida acerca da existência de tal princípio, mas,
também, a negarem a sua existência por completo.
Uma distinção normalmente feita na doutrina é a entre igualdade legal e capacidade legal para exercer
direitos, ou seja, entre o fato de serem as mesmas regras aplicáveis a todos os Estados (igualdade legal) e o
fato de que todos os Estados devem possuir os mesmos direitos e as mesmas obrigações (capacidade legal
para exercer direitos), insinuando que todos os Estados têm direitos iguais ou idênticos, mas que nem todos
possuem, uma oportunidade igual para a aquisição de direitos.
A Carta das Nações Unidas ignora a capacidade legal dos Estados para exercer direitos, pois, apesar de o
princípio tradicional de igualdade não ter sido abandonado, foi de tal forma “modificado” que o tratamento
igual de Estados desiguais (igualdade formal e abstrata) termina por eliminar as reais desigualdades que
existem entre estes mesmos Estados, já que igualdade entre Estados e até mesmo entre individuos so podera
ser exercida quando houver algum de comparação patrimonial entre os mesmos.
Segundo a Escola Soviética, teríamos ainda: princípio da não-agressão, princípio do desarmamento, principio
da proibiçao de propaganda de guerra e princípio da autodeterminação dos povos.
Brownlie atesta que na prática os tribunais exibem nesta matéria uma discricionariedade considerável. Assim
sendo, os princípios gerais de Direito dividiriam-se em:
Princípios gerais de Direito na prática dos tribunais: tribunais arbitrais (responsabilidade do Estado por atos
cometidos pelos seus representantes legais), CIJ e sua antecessora (obrigação de reparação em virtude da
violação de um compromisso internacional, não ser juiz em causa própria, litispendência, res judicata e
vários princípios reguladores do processo judicial).
Princípios gerais do Direito Internacional: princípio do consentimento, reciprocidade, igualdade dos Estados,
caráter definitivo das decisões arbitrais e das resoluções de litígios, validade jurídica dos acordos, boa-fé,
jurisdição interna e liberdade dos mares.
JURISPRUDÊNCIA E DOUTRINA
Estatuto da Corte Internacional de Justiça - Artigo 38
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem
submetidas, aplicará: (...)
d) sob ressalva da disposição do art. 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos juristas mais qualificados das
diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.
Artigo 59 - A decisão da Corte não tem força vinculativa senão para as partes em litígio e em relação a esse
caso concreto.
De acordo com o art. 38, 1, d, do Estatuto da CIJ, jurisprudência e doutrina funcionam como meio auxiliar.
Não são normas de expressão de Direito, mas instrumentos úteis ao seu correto entendimento e aplicação,
objetivando uma boa interpretação da norma internacional.
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Jurisprudência
Trata-se, a priori, das decisões judiciais originárias da própria CIJ, mas inclui, ainda, decisões judiciais de
outros tribunais internacionais, decisões arbitrais, pareceres da CIJ, laudos e relatórios dos diversos
mediadores das comissões de conciliação internacional, apesar de, segundo o artigo 59 do Estatuto da Corte
Internacional de Justiça, a decisão não ser obrigatória senão para as partes em litígio e em relação a esse caso
específico. Ou seja, os tribunais internacionais não são obrigados a seguir as decisões judiciais anteriores.
Para Virally, é através de tais decisões que os princípios gerais de Direito se incorporam à prática do Direito
Internacional, apesar de não terem força vinculante para outros tribunais. Brownlie, pondera que, em bom
rigor, a jurisprudência não constitui uma fonte formal, mas, pelo menos em alguns exemplos, é considerada
uma prova autorizada do estado do Direito.
Doutrina
A Doutrina no Estatuto da Corte, artigo 38, reflete um pensamento eurocêntrico, quando afirma que válida é
a doutrina dos juristas mais qualificados, os quais seriam, é claro, os europeus. Atualmente, é muito difícil
obter-se o consenso ordinário, pelo fato de haver muitos novos entes na Sociedade Internacional. Por isso a
doutrina é raramente invocada na CIJ. Quando é citada, restringe-se aos votos vencidos, nos quais a doutrina
é denominada “opinião geral” ou “doutrina dominante”.
EQÜIDADE E ANALOGIA
Não são propriamente fontes de direito, mas métodos de raciocínio jurídico, utilizados quando há lacunas nas
normas ou inexistência de normas que disciplinem o assunto. Não são obrigatórias para os sujeitos de Direito
Internacional e são muito pouco utilizadas.
Eqüidade
Estatuto da Corte Internacional de Justiça - Artigo 38
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem
submetidas (...).
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo et bono, se as
partes com isto concordarem.
Para Charles Rousseau, é a aplicação dos princípios de justiça a um determinado caso. Para ele, a eqüidade
deriva de dois sistemas, o romano-germânico (surgindo a partir da Lei Aebutia destinada a combater o
excesso do formalismo jurídico) e o da cominon law (originária da jurisdição do chanceler, fundada não no
costume ou na lei escrita, mas nos imperativos de consciência).
Para o sistema romano-germânico, a eqüidde só vale como solução de litígio se as partes expressamente
concederem poderes ao juiz para que decida com base nela. O Estatuto da CIJ também prevê esta
necessidade. Já Akehurst afirma que juízes ou árbitros podem sempre utilizar a eqüidade para “interpretar”
ou “preencher lacunas” no Direito, mesmo sem expressa autorização para tal feito, não podendo, contudo,
tornarem uma decisão em que a eqüidade se “sobreponha” a todas as outras normas, a não ser que para isso
tenham sido expressamente autorizados.
Caso um processo seja julgado única e exclusivamente com base na eqüidade, sem concordância das partes
envolvidas, será nulo por excesso de competência de poderes.
São três as funções da eqüidade:
infra legeni - Corrige o direito positivo. Essa função foi muito utilizada com relação às reparações de guerra.
O juiz podia corrigir o direito positivo imposto via tratado e que fosse impossível de ser cumprido;
contra legem - Afasta o direito positivo, quando são elaboradas leis injustas para determinado sujeito de DI;
praeter legem - É a função básica da eqüidade, que consiste em suprir lacunas no direito positivo.
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A eqüidade tem perdido sua força, pela falta de confiança nos julgadores. Desta forma, as decisões
internacionais raramente são aplicadas em função de uma teoria geral e sistemática de eqüidade.
Analogia
A analogia consiste em fazer valer para determinada situação de fato, a norma jurídica concebida para
aplicar-se a uma situação semelhante. Por si só, a analogia não pode suprir as lacunas do direito. O artigo 38
do Estatuto da CIJ não falou da analogia. É importante, com relação à analogia, a questão da soberania. Não
se pode construir pela analogia restrições à soberania dos Estados, nem obrigar um Estado ou ente da
Sociedade Internacional a submeter-se a determinado juízo internacional. Também não é obrigatória para os
sujeitos de Direito Internacional.
OPINIÃO PÚBLICA
É a maneira de pensar, sentir e agir dos componentes da população de um Estado. Para alguns autores é fonte
de Direito Internacional, uma vez que a população é um dos elementos importantes do Estado. Meira Matos
é o único autor que inclui a opinião pública entre as fontes do Direito Internacional.
ATOS UNILATERAIS
Para Rousseau, atos unilaterais são a manifestação de vontade de um sujeito de Direito Internacional
suficiente para produzir efeitos jurídicos. São espécie do gênero ato jurídico internacional, sendo definido
por Von Liszt como a declaração de vontade, encaminhada a produzir um efeito internacional (criação,
modificação, extinção de uma relação jurídica), devendo ser feita por órgão estatal devidamente autorizado
para tal, declarando-se de uma maneira expressa ou tácita ou por meio de atos manifestos. Para Virally,
devem ser atos jurídicos de significação internacional ou atos realizados com a intenção de afetar as relações
jurídicas internacionais.
Para ter eficácia, o ato unilateral deve atender a duas condições: deve ser público, de conhecimento da
Sociedade Internacional; e deve haver intenção do Estado que elabora este ato de se obrigar. Não é possível
fazer-se ato unilateral obrigando outro Estado.
Os atos unilaterais podem ser:
Tácitos – é o caso do silêncio, significando que o sujeito de Direito Internacional, ao não se manifestar em
relação a determinado ato unilateral, acata esse mesmo ato. Para isto é necessário que o ato unilateral tácito
atenda a três condições: o Estado interessado deve conhecer o fato; objeto do ato unilateral deve ser um
interesse jurídico; deve ser concedido um prazo razoável para que o Estado interessado se manifeste.
Expressos - podem ser protesto ou renúncia/reconhecimento.
Protesto:o sujeito de Direito Internacional não aceita a manifestação de vontade do outro sujeito de Direito
Internacional. Seu propósito é prevenir que uma situação que se possa alegar contra o Estado que esteja
protestando contra ela, privando-a de todo efeito legalmente válido. A eficácia do protesto depende de sua
continuidade. Um exemplo é o protesto da Argentina contra a posse das Ilhas Malvinas (Falklands), que é
forma de evitar que o Reino Unido requeira à CIJ reembolso de despesas de guerra e, ainda, declaração de
que a Argentina aceitou o domínio da Inglaterra sobre as ilhas.
Renúncia/reconhecimento: o sujeito de Direito Internacional aceita o ato, renunciando a seu direito ou
aceitando reconhecer o direito da outra parte. Exemplo: aceitação de independência de Estado,
reconhecimento de situação de fato.
Um ato unilateral pode ser revogado ou anulado por quem o realiza. Assim sendo, caso confira direitos a
uma terceira pessoa, estes só serão considerados definitivos quando não exista mais a possibilidade de
revogação ou anulação. No que concerne ao regime jurídico dos atos unilaterais, diversas são as decisões
internacionais que lhe atribuem valor jurídico.
Mais recentemente o litígio envolvendo os atóis de Mururoa e Fangatufa, no Pacífico Sul, que foram alvo de
testes nucleares franceses, contrariando os interesses da Austrália, Nova Zelândia e demais Estados daquela
região, que propuseram ação junto a CIJ, baseados num ato francês, de1974, através do qual a França
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declarou, unilateralmente, que não mais realizaria testes no Pacífico Sul. Em1995, a França declarou que
realizaria oito testes nucleares nos atóis de Mururoa e Fangatufa. A Nova Zelândia imediatamente pediu a
abertura do processo e indicação de medidas provisórias, com base na noção de Patrimônio Comum da
Humanidade, já que os testes introduziriam materiais radioativos no meio ambiente marinho do Pacífico Sul.
Antes mesmo de qualquer medida da CIJ, a França realizou dois testes nucleares, em 06.09.1995 e em
11.09.1995. A decisão foi proferida em 22.09.1995 e, por 12 votos a 3, esse Tribunal desconsiderou o pedido
da Nova Zelândia, justificando sua decisão com o argumento de que a França havia se obrigado,
unilateralmente, a não realizar explosões atmosféricas e os testes anunciados eram subterrâneos.
DECISÕES DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS
São normas originárias de uma Organização Internacional, que se tornam obrigatórias para os seus Estadosmembros, independentemente de sua ratificação. As organizações internacionais não possuem meios para
garantir a eficácia de suas decisões, até mesmo porque a maior parte dos seus órgãos é composta por
representantes dos Estados-membros e muitas vezes os atos de tais órgãos não são mais do que atos dos
Estados neles representados. As organizações internacionais, contudo, costumam possuir pelo menos um
órgão que não é integrado por representantes dos Estados-membros e cuja prática é capaz de constituir uma
fonte de Direito. Desta forma, a eficácia se originaria do princípio da boa-fé, havendo organizações
internacionais mais eficazes que outras.
A União Européia, por exemplo, criou tribunal que obriga os Estados a acatarem suas decisões, estando
sujeitos a diversas sanções caso se recusem a cumpri-las. Há outras organizações internacionais, por outro
lado, cuja eficácia das decisões depende mais da vontade política de seus membros que de um fator jurídico.
Esse é o caso da ONU, mesmo tendo em sua Carta constitutiva o seguinte dispositivo:
Carta das Nações Unidas
Artigo 39 - O Conselho de Segurança determinará a existência de qualquer ameaça à paz, ruptura da paz ou
ato de agressão, e fará recomendações ou decidirá que medidas deverão ser tomadas (...).
Virally justifica tal posição afirmando que como consequência do princípio da soberania tais resoluções
geralmente não têm força obrigatória para os membros das Nações Unidas. As resoluções da Assembléia
Geral que incorporam declarações de direitos ou de princípios não são, por si mesmas, atos criadores de
novas normas de Direito Internacional, pois a Assembléia Geral não tem poder legislativo.
Classificação
Direito primário: Origina-se dos tratados, ou seja, da competência que os Estados delegaram diretamente
para as organizações internacionais.
Direito secundário: Atos que se originam dos órgãos criados no seio das organizações internacionais.
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PESSOAS INTERNACIONAIS
São os destinatários das normas internacionais. Nesse sentido, inserem-se os Estados, as organizações
internacionais, a pessoa humana e, modernamente, tem sido reivindicada a capacidade das empresas
transnacionais e, em alguns casos, até mesmo das organizações não-governamentais.
ESTADO
É o contingente humano a viver sob alguma forma de regramento, dentro de certa área territorial.
O Estado possui personalidade jurídica originária. Dele emanam as normas de Direito Internacional da
Sociedade Internacional.
O Estado possui realidade física: povo e território. Da manifestação de sua vontade nascem os demais
sujeitos de Direito Internacional.
As ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS
Têm personalidade internacional recente, tendo surgido a partir da Liga das Nações, que foi a primeira
organização internacional. Proliferaram após a Segunda Grande Guerra.
A personalidade jurídica das organizações internacionais é derivada, por carecerem da dimensão material, da
realidade física, presente nos Estados. Constituem realidade jurídica. Sua existência apóia-se nos tratados
que as constituem, que são fruto de elaboração jurídica que resulta da manifestação da vontade dos Estados
na Sociedade Internacional. Assim, as organizações internacionais derivam de instrumento jurídico e da
vontade dos Estados, elas existem a partir da materialização de uma vontade cooperativa dos Estados, sendo
sujeitos mediatos ou secundários do Direito Internacional, porque dependem da vontade dos seus membros
para a sua existência e para a concretitude e eficácia dos objetivos por ela perseguidos.
Os tratados que criam as organizações internacionais são mais importantes para elas do que as constituições
dos Estados. Isso porque se o tratado for extinto a organização internacional deixará de ter existência jurídica
na SI, enquanto, mesmo não tendo constituição, os Estados ainda serão caracterizados como Estados.
A PESSOA HUMANA
Para a maioria dos autores, a pessoa humana não possui personalidade internacional por não poder se
envolver, a título próprio, na produção do acervo normativo internacional, somente se envolvendo enquanto
representantes dos Estados e organizações internacionais. Além disso, não dispõe de prerrogativa ampla para
reclamar nos foros internacionais, só podendo fazê-lo quando houver vínculo de sujeição entre ela e o Estado
Soberano ao qual está vinculada pela sua nacionalidade. Tal posição não é pacífica, pois, a partir do
momento em que há tribunais internacionais que aceitam suas reclamações (Corte Internacional dos Direitos
Humanos nos EUA e União Européia), poderá exercer sua personalidade.
Exceção interessante registrou-se no Tribunal Internacional de Nuremberg, que condenou nazistas por crimes
contra a humanidade. Quando de sua instauração houve muitos protestos dos juristas, em virtude de
sacrifício da correta formulação do raciocínio jurídico em nome de imperativos éticos e morais. Não se levou
em conta que os militares nazistas cometeram atos ilícitos na ordem jurídica internacional, mas lícitos na
ordem jurídica nacional.
AS EMPRESAS TRANSNACIONAIS
As empresas são regidas pelo ordenamento jurídico do local onde foram registradas, sendo subordinadas a
esse ordenamento. Para determinar o que define a transnacionalidade de determinada empresa, deve-se
recorrer ao Relatório Preliminar do Secretariado das Nações Unidas à Comissão das Sociedades que remete
sua classificação, dentre outros, ao número de filiais no estrangeiro, à composição do capital, à parte que
assume o volume das exportações no acervo global dos negócios, à nacionalidade dos dirigentes e ao espírito
da sua ação. No caso das empresas transnacionais, há exceções interessantes:
Cláusula de arbitragem: em 1965 foi concluída uma Convenção, sob a égide do Banco Mundial, que criou
um Centro Internacional de Conciliação e Arbitragem, onde, havendo conflito entre o Estado e a empresa, tal
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seria julgado por um tribunal arbitral. Por esta Convenção, as transnacionais poderiam apresentar ao Centro
reclamações sobre os investimentos efetuados nos Estados, desde que tal jurisdição seja por estes aceita.
Itaipu Binacional: é caso singular de empresa transnacional, que, por artifício jurídico foi constituída como
pessoa jurídica de Direito Privado Binacional, em l974. As leis serão aplicadas de acordo com a
nacionalidade e domicílio das partes. Mesmo que um paraguaio trabalhe na parte brasileira, será regido pelas
leis trabalhistas paraguaias. Apesar da contribuição das empresas transnacionais para o progresso e bem-estar
do Estado-hospedeiro, é certo que, se sua atuação não for objeto de qualquer controle, com certeza
transformar-se-ão em elemento de pressão sobre a autonomia de decisão destes mesmos Estados.
As ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS —ONGS
Tais instituições são uma característica da Nova Ordem Internacional, sendo constituídas por particulares de
diversas nacionalidades, e não por Estados, que não possuindo fins lucrativos. destinam-se a ações de
solidariedade internacional.
Seitenfus define-as como organizações privadas, movidas pela solidariedade transnacional, sem fins
lucrativos.
Nguyen Quoc Dinh define-as como instituições criadas por iniciativa privada ou mista, com exclusão de
qualquer acordo intergovernamental, que agregam pessoas privadas ou públicas, suscetíveis de influenciar o
desenvolvimento das relações internacionais. As ONGs executam projetos avaliados em mais de sete bilhões
de dólares por ano. Graças à flexibilidade das suas estruturas, a sua capacidade para mobilizar fundos
privados e ao seu pessoal extremamente dedicado, as ONGs dispõem de um vasto potencial que pode servir à
causa do desenvolvimento. No decurso dos últimos 10 anos, o número de ONGs e a influência que elas
exercem aumentaram. Criaram novas redes em nível mundial e desempenharam um papel crucial nas
grandes conferências internacionais efetuadas ao longo da década de 90.
Autores, como João Mota de Campos, a apresentam como uma das espécies do gênero organizações
internacionais. O certo é que estas não possuem personalidade jurídica de Direito Internacional, sendo
sujeitos apenas de direito interno, apesar de sua atuação extrapolar os limites territoriais e jurisdicionais dos
Estados soberanos.
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OS ESTADOS
Para Liszt Estado no sentido do Direito Internacional, é a pessoa jurídica independente dentro dos limites de
um território, é a comunidade humana, que habita um território determinado e está governada por um poder
soberano independente.
Classificação:
1 - Estados Simples - possuem poder único e centralizado, em que há uma maior força do governo central,
como no caso da França. O objetivo final de um Estado é sempre ser um Estado simples.
2 - Estados Compostos - têm estrutura complexa sem grande centralização do poder. Podem ser: Estados
compostos por coordenção, Estados compostos por subordinação e Estados divididos.
Estados Compostos por Coordenação - os entes têm a mesma estrutura, havendo equilíbrio nas forças que
formam esta estrutura complexa. Classificam-se em:
Estado Federal: caracteriza-se pela união de vários Estados que perdem a soberania para a União Federal,
como no caso dos EUA (1787), Alemanha (1867), Suíça (1874) e Brasil (1891). De acordo com a
Constituição desse Estado Federal, os Estados-membros que o compuserem terão maior ou menor
capacidade de agir na Sociedade Internacional. Os Estados Federais são vistos como Estados Simples na
Sociedade Internacional, como se observa pelas palavras de Ferreira Filho: no plano internacional, o Estado
Federal aparece como um só Estado. Apenas o aspecto unitário é visível. Assim é o Estado Federal quem
goza de personalidade jurídica, em termos de Direito Internacional. Por isso é tão somente ele que mantém
relações internacionais com outros Estados, com organizações internacionais, enfim, com as outras pessoas
jurídicas, reconhecidas como tais pelo Direito Internacional Público.
Confederações: são associações de Estados independentes que se obrigam, por meio de um tratado
internacional, a gerir em comum todos os seus negócios internacionais, principalmente no tocante ao fato de
assegurar a defesa comum. Como exemplos temos a dos Países Baixos (1579-1795), a Confederação dos
Estados Norte-americanos (1781 -1787), a Confederação Helvética (1815-1866), a Confederação da
Alemanha do Norte (1867-1870), e, mais recentemente, a Senegâmbia (Senegal e Gâmbia). Os Estadosmembros são sujeitos de Direito Internacional e a sua capacidade de exercício so sofrerá as limitações
impostas pelo Tratado da Confedera ção. Permitem o direito de secessão, ou seja, a possibilidade de se
separar do resto dos membros da confederação. As confederações não são muito comuns hoje em dia, pois
em geral ocultam a tentativa de anexação de um Estado por outro.
Uniões de Estados: é uma forma de associação de Estados monárquicos que se caracteriza pela presença de
um mesmo soberano em dois ou mais Estados. Tais Estados conservariam a sua plena capacidade
internacional, não possuindo, desta forma, a União personalidade jurídica internacional. Como só eram
possíveis nos Estados monárquicos, como Portugal e Espanha na chamada União Ibérica (1580-1640), a
União da Grã-Bretanha com Hanover (1714-1837) ou a da Bélgica e o Congo (1885-1908), e em função da
perda da importância do poder trionárquico, a união de Estados, também conhecida como União Pessoal,
tornou-se hoje uma referência histórica.
União incorporada: surge quando um Estado, em função de conflitos bélicos, passa a exercer domínio sobre
o outro. Foi o que aconteceu na formação do Reino Unido, que resultou da incorporação, por parte da
Inglaterra, do País de Gales, da Escócia e da Irlanda - esta última desincorporou-se em 1921. Também
designada como União Real, esta possuirá personalidade jurídica internacional.
A Commonwealth - a Comunidade Britânica não é um Estado, mas uma formação sul generis de exdomínios, protetorados, dependências e colônias britânicas que foram obtendo independência, mas optaram
por manter um vínculo com a coroa britânica, sem prejuízo de estes poderem ter, inclusive, instituições
republicanas. A coroa é representada por governadores gerais, escolhidos pelos próprios Estados, e a sua
representação na Grã-Bretanha é exercida por um Alto-Comissário. Tal ente, todavia, não possui
personalidade internacional; os assuntos de interesse comum são tratados em conferências periódicas dos
Primeiros-Ministros ou dos Chefes de Estado.
Estados Compostos por Subordinação - há hierarquia de poder, ou seja, relação de poder nas forças.
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Estados vassalos: eram Estados que, apesar de dominados pelo Império Otomano, mantinham alguma
autonomia. No entanto, pagavam tributos e deviam prestar auxílio militar a esse império. Os tratados eram
obrigatórios aos vassalos, porém, estes gozavam de personalidade internacional distinta da do Estado
suserano. Tal conceito, hoje em dia, tem apenas valor histórico.
Protetorados: caracterizam-se pela subordinação, estabelecida por tratado internacional, de um Estado a
outro com a obrigação do Estado protetor de oferecer sua proteção ao Estado protegido, recebendo, em
contrapartida, a faculdade de dirigir, completa ou parcialmente, a gestão das relações internacionais do
segundo e, em alguns casos, mesmo a sua política interna. O rompimento do protetorado se deu, em geral,
por meio de guerra. Os tratados celebrados pelo protetor não eram obrigatórios para os protegidos, ao
contrário da relação entre o Estado vassalo e o Estado suserano. Exemplos significativos de tal relação foram
as do protetorado da França e da Espanha sobre o Marrocos e da França sobre a Tunísia. Um dos últimos
protetorados de que se teve notícia foi o do Sultanato de Brunei, protegido pelo Reino Unido.
Estados clientes: eram Estados da América Central que entregavam a administração de sua alfândega, seu
exército e de parcela do seu serviço público para os EUA. Foram muito comuns até a década de 20, com
destaque para os tratados celebrados entre os EUA e Cuba, Haiti, Panamá, Honduras, República Dominicana
e Nicarágua.
Estados satélites: tinham situação semelhante à dos Estados clientes, mas estavam vinculados à União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, que desapareceram com o esfacelamento da URSS.
Estados exíguos: em virtude de terem território muito pequeno, não podem exercer, em todos os aspectos,
sua soberania, subordinando-se, em geral, ao Estado que lhe é limítrofe. Não possuem moeda própria e, até a
década de 90, não podiam participar plenamente da ONU. São Estados exíguos: San Marino (Itália), Andorra
(França/Espanha) e Mônaco (França).
Estados associados: aqueles que atingiram a independência, mas, sem terem meios para mantê-la,
encontram-se subordinados a outros Estados, como Porto Rico (EUA), e Ilhas Cook (Austrália).
3 - Estados Divididos - Surgiram com o fim da Segunda Grande Guerra. Caracterizam-se por dois sistemas
de poder, com tensão entre eles, sem, contudo, chegar a uma guerra civil. São exemplos: Alemanha, Vietnã e
Coréia (a única que ainda permanece dividida).
ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ESTADO
São elementos do Estado: o povo e o território (elementos materiais); e o poder (elemento formal). A
presença dos elementos materiais distingue Estados de organizações internacionais.
PODER
Para Burdeau, o poder seria o próprio Estado, como uma expressão ordenada de convivência, que deverá
preponderar nesse grupo. O poder é abstrato, não sendo afetado pela modificação dos outros agentes ou
elementos do Estado. Por isso se diz que o poder é a manifestação do Estado. A França, por exemplo, perdeu
uma grande parcela de seu território, na Segunda Grande Guerra, mas não deixou de ser França.
Governo x Soberania - ambos são manifestação do poder do Estado.
Governo: o poder, via governo, é expressão dinâmica de ordem pública, coordenando o funcionamento do
Estado.
Soberania: é um poder estatal supremo e independente em relação ao poder dos outros Estados. Diz respeito
à relação de um Estado com os outros Estados da Sociedade Internacional. É quantidade de poder, expressa
de três formas:
Soberania interna: caracteriza-se pela predominância do poder do Estado sem nenhum contraste e nenhuma
limitação por outro poder. Caso haja disputa pela soberania interna (conflito de domínio), teremos uma
guerra civil.
Soberania externa: caracteriza-se por não haver dependência nem subordinação de um Estado ao outro em
27
suas relações recíprocas, devendo haver igualdade. Não é o fato de um Estado ser invadido por outro que faz
com que deixe de ser Estado. Apenas perde parte de sua soberania externa.
Soberania nacional: é o direito do povo escolher seus próprios governantes, através do voto nas eleições.
Ainda que uma dessas soberanias sofra alguma restrição, o Estado não deixará de ter seu elemento essencial,
o poder. Para Bobbio, a expressão muito genérica “poder soberano” refere-se àquele conjunto de órgãos
pelos quais um ordenamento normativo é posto, conservado e se faz aplicar.
POVO
Povo x População x Nação
População: expressão numérica do conjunto de pessoas que vivem num Estado, incluindo nacionais e
estrangeiros.
Nação: comunidade de base histórico-cultural, como no caso dos curdos, palestinos e ciganos.
Povo: conjunto de pessoas que se unem para constituir um Estado, criando um vínculo jurídico-político de
natureza permanente.
Nacionalidade x Naturalidade x Cidadania
Nacionalidade: vínculo jurídico-político que une o indivíduo ao Estado.
Naturalidade: vínculo material-geográfico. Nem sempre são naturais do Brasil aqueles que possuem
nacionalidade brasileira.
Cidadania: refere-se ao exercício de direitos políticos de determinado povo. Nem sempre o nacional poderá
exercer plenamente a cidadania, como no caso do naturalizado brasileiro que não poderá, por exemplo,
candidatar-se ao cargo de Presidente da República.
TERRITÓRIO
É a porção da superfície do globo terrestre sobre a qual o Estado exerce seus direitos de soberania.
Forma:s
Território íntegro ou compacto: a porção da superfície da terra é compacta, como no caso do Brasil. A
maior parte dos Estados da Sociedade Internacional possuem território íntegro.
Território desmembrado ou dividido: a porção da superfície terrestre é formada por partes. É o que
acontece com o território dos EUA, que tem o Alasca separado do território dos demais Estados-membros
pelo Canadá.
Território encravado: cercado inteiramente pela superfície de outro Estado, sem ter qualquer saída para o
mar, como no caso do Lesoto em relação à África do Sul, e de San Marino e da cidade-Estado do Vaticano,
em relação à Itália.
DOMÍNIOS
O território dos Estados apresenta-se em diversos aspectos físicos, os chamados domínios, que podem ser:
terrestre, fluvial, lacustre, aéreo e marítimo, além do domínio público internacional.”
DOMÍNIO TERRESTRE
Formado pelo solo e subsolo do Estado. O Estado tem o direito de marcar materialmente ou indicar
concretamente os seus limites. Os limites poderão ser naturais (arcifínios). que acompanham acidentes
geográficos do solo, ou artificiais (intelectuais ou matemáticos), que seguem uma linha astronômica.
A demarcação é o ato de assinalar a linha divisória de determinado Estado. Pode ser realizada
unilateralmente pelo Estado, mas somente será definitiva quando for aprovada pelos governos dos Estados
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limítrofes.
Pode ser feita por postes, bóias, balizas, marcos ou por acidentes geográficos do solo do Estado. Por
exemplo: pode ser estipulada em uma cordilheira, tanto pela linha de máxima altura (Europa, Alpes), quanto
por divisor de águas.
Demarcação na América Latina
Os traçados fronteiriços resultam de acontecimentos históricos ou de tratados entre os Estados. Na América
Latina, utilizou-se artifício jurídico original, também utilizado na demarcação africana e que é o uti
possidetis. O uti possidetis é interdito possessório, criado no Direito Romano, com o objetivo de defender a
posse de determinado território. No caso da América Latina, antes de ele ser aplicado, tivemos dois tratados
que regulamentaram a sua demarcação territorial entre Portugal e Espanha.
Tratado de Tordesilhas - Celebrado em 1497, através da interferência do Papa, pondo fim ao litígio entre
Espanha e Portugal. Por este Tratado, tudo que fosse descoberto dentro do espaço de 370 léguas do
arquipélago de Cabo Verde seria de Portugal e a partir dessa distância, seria território espanhol.
Tratado de Madri - Em 13.01.1750, foi feita uma revisão do Tratado de Tordesilhas através do Tratado de
Madri, pelo qual, contrariando o Tratado de Utrecht (1715), seria considerado português tudo o que havia
sido ocupado por Portugal até aquela data, consagrando, pela primeira vez, o uti possidetis na América e
legalizando a ocupação e alargamento da colônia feito por bandeirantes, religiosos e colonos. Formalmente,
o Tratado de Madri foi substituído pelo Tratado de Santo Idelfonso (1777). pelo qual foi feita uma revisão
das fronteiras, conservando Portugal, para o Brasil, as fronteiras oeste e norte obtidas pelo Tratado de Madri,
deslocando a divisória sul para o leste, com a passagem de Sete Povos das Missões à soberania espanhola.
Em 1801 Portugal e Espanha travam a Guerra de las Naranjas, tendo Portugal retomado o território dos Sete
Povos e encerrado o conflito com a celebração do Tratado de Badajós, que não revalidou o Tratado de Santo
Idelfonso nem qualquer outro tratado de limites anterior. Quando as nações hispano-americanas se libertaram
do vínculo colonial, a partir de 1811, não havia, pois, nenhum tratado em vigor sobre fronteira, firmando-se,
pouco a pouco, a doutrina da não-validade do Tratado de Santo Idelfonso e do conseqüente recurso ao uti
possidetis. Em 1848, durante a Conferência de Lima, ao procurar uma saída para os conflitos demarcatórios
nas ex-colônias portuguesas e espanholas, tentou-se reavivar o uti possidetis, mesmo sabendo-se que este só
poderia ser utilizado em caso de conflito entre os Estados. Apesar disso, os governantes de origem espanhola
decidiram fixar, como limites dos novos Estados, aqueles existentes à época do direito colonial nas
circunscrições administrativas espanholas. Tal argumento não foi aceito pelo representante do Brasil (Barão
do Rio Branco), que, em 1857, propôs a implantação do uti possidetis de fato, ou seja, toda a porção da
superfície terrestre que os novos Estados possuíssem até aquela data seria incorporada, definitivamente, ao
seu território, sendo esta a sua argumentação: O Tratado de 1777 foi roto e anulado pela guerra
superveniente, em 1801, entre Portugal e Espanha, e assim ficou para sempre, não sendo restaurado pelo
Tratado de Paz assinado em Badajós aos 6 dias do mês de junho do mesmo ano. (...) O Governo de S.M. o
Imperador do Brasil, reconhecendo a falta de direito escrito para a demarcação de suas raias com os Estados
vizinhos, tem adotado e proposto as únicas bases razoáveis e equitativas que podem ser invocadas: ‘uti
possidetis’ onde esse existe e as estipulações do Tratado de 1777, onde elas se conformam ou não, vão de
encontro às possessões atuais de uma e outra parte
DOMÍNIO FLUVIAL
Os rios podem ser:
rios nacionais: aqueles cujo leito corre inteiramente dentro do território de determinado Estado. Este exerce
plena soberania, não tendo obrigação de conceder direito de passagem inocente a embarcações estrangeiras;
rios internacionais: aqueles que cruzam diversos Estados. Podem ser contínuos, quando correm pela
fronteira dos Estados, como o Rio Paraná, a divisória é feita pelo talvegue (leito mais profundo do rio) ou, no
caso de este não poder ser estabelecido, pelo ponto médio entre as duas margens ou sucessivos, quando seu
leito atravessa o território de diversos Estados sucessivamente. Cada Estado exerce plena soberania sobre o
leito do rio enquanto este estiver dentro de seu território. No caso das pontes, quando separam dois Estados,
o limite será a média transversal entre os dois extremos, independentemente dos limites do rio.
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DOMÍNIO LACUSTRE E MARES INTERNOS
Deve-se verificar o diâmetro do lago. Se for maior que seis milhas, cada Estado marginal exercerá sua
soberania até três milhas da margem. O restante será domínio comum desses Estados.
DOMÍNIO AÉREO
Ë constituído pelo espaço aéreo e espaço extra-atmosférico. O espaço aéreo é a massa de ar atmosférica
situada acima do território do Estado. Não há normas que concedam direito de passagem inocente a
aeronaves no espaço aéreo estatal. Estas são determinadas por tratados bilaterais ou permissões avulsas. Na
aviação comercial, deve ser concedida prévia autorização estatal para que se possa trafegar em seu espaço
aéreo. Os aviões particulares, em geral. recebem permissão avulsa para trafegar sobre tal território. Para os
aviões militares, não há tratados internacionais que prevejam a possibilidade de tráfego permanente pelo
território de outro Estado. Quando tal acontece, por necessidade premente, deverá haver autorização prévia
para tanto, sob pena de ser forçado a aterrissar. Se o avião militar invadir o espaço aéreo e for abatido, a
responsabilidade será do Estado de sua bandeira.
Dentro do espaço aéreo, foram celebrados alguns tratados internacionais:
Convenção de Varsóvia - Datada de 1929, diz respeito à responsabilidade do transportador em caso de
acidentes causados por falha técnica ou mecânica ou, ainda, por omissão da empresa ou de seus prepostos.
Dessa convenção surgiu a “caixa-preta”, que serve para verificar de quem é a responsabilidade pelo acidente
e aí reside a sua maior importância.
Convenções de Chicago - Compõe-se de três convenções internacionais.
A primeira instituiu uma organização internacional objetivando estabelecer regras para a aviação: a
Organização da Viação Civil e Comercial - OACI.
A segunda promoveu a uniformização das regras sobre transporte aéreo, através das quais foram instituídas
cinco liberdades: duas liberdades técnicas (liberdade de sobrevôo em território e de escala
técnica/emergência) e três liberdades comerciais propriamente ditas (a primeira acerca do direito de uma
empresa aérea de embarcar e desembarcar seus nacionais para outro Estado, a segunda relacionada à
possibilidade de embarque e desembarque de nacionais de outros Estados que não os contratantes e a terceira
referindo-se à possibilidade de uma empresa embarcar e desembarcar nacionais para um terceiro Estado.
A última das Convenções de Chicago estipulou a nacionalidade das aeronaves, que é estipulada a partir do
registro da matrícula da aeronave. A importância da nacionalidade das aeronaves reside no fato de que o
Estado que a concede é co-responsável, juntamente com a empresa proprietária do avião, e, além disso,
estipula-se a jurisdição a ser aplicada em alto-mar, através da teoria do espaço ficto.
Protocolo de Montreal - Adveio da comoção generalizada que ocorreu quando um avião comercial coreano
foi abatido por aviões militares soviéticos em 1983, enquanto sobrevoava o território deste Estado. Por este
instrumento internacional, as partes acordaram que qualquer Estado poderia interceptar aeronaves que
adentrassem o seu espaço aéreo; no caso de aeronave civil ou comercial, deveriam forçar o seu pouso, jamais
abatê-las. Já no espaço extra-atmosférico, a necessidade de regulamentação surgiu com a colocação em
órbita do primeiro satélite artificial, o Sputnik, em 1949, acentuando-se com a corrida à Lua. Foram
celebrados dois acordos internacionais sobre a matéria.
Tratado sobre o Espaço Exterior - Celebrado em 1967, durante a corrida espacial entre EUA e URSS.
Assegurou acesso livre a qualquer Estado ao espaço exterior, sendo este insuscetível de apropriação ou
anexação. Além disso, afirmou-se que as incursões no espaço exterior serão prerrogativas dos Estados
soberanos, ou seja, não poderá ser feito por organizações internacionais e empresas transnacionais.
Tratado da Lua - Foi celebrado em 1979. Estabelece que a Lua só poderá ser utilizada para fins pacíficos,
proibindo-se a colocação de engenhos nucleares ou de qualquer arma de destruição em massa. Tal tratado foi
celebrado quando os EUA queriam implantar o projeto Guerra nas Estrelas. Foi tratado estratégico para
diminuir gastos da URSS e dos EUA.
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DOMÍNIO MARÍTIMO
Já foi objeto de uma série de controvérsias que tendem a serem solucionadas pela Convenção das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar, celebrada em 1982 em Montego Bay, que somente entrou em vigor em
16.11.1994 (com a ocorrência do depósito mínimo de 40 instrumentos de ratificação). A Convenção cria
limites para os diversos espaços do domínio marítimo.
Mar Territorial - Inclui as águas (leito do mar) + subsolo + espaço aéreo sobrejacente. A extensão do mar
territorial já era discutida por Grotius, no século XVI. Para ele, era a extensão sobre a qual o Estado pudesse
exercer seu domínio. No século XVIII, o holandês Bvnkershoek falou que seria a distância de um tiro de
canhão (até três milhas). Esse princípio prevaleceu até o século XX. Com os progressos militares e a
Segunda Grande Guerra, tentou-se fazer uma nova convenção internacional a respeito do assunto, em 1959.
Os Estados resolveram estabelecer unilateralmente o limite que mais lhes interessasse (16, 200 milhas etc.).
A Convenção de Montego Bay estabeleceu um limite uniformemente aceito pelos Estados da Sociedade
Internacional. Para ela, é mar territorial a faixa de 12 milhas marítimas contadas a partir da linha de base da
costa, que corresponde à noção de onde termina a terra e começa o mar, contada na maré baixa. Nessas
milhas, há direitos soberanos. A única restrição é o “direito de passagem inocente”. que é concessão
obrigatória dada pelo Estado aos navios que trafegam. Observe-se que somente será passagem inocente se
for contínua e rápida. Além disso, o Estado pode estabelecer rotas marítimas obrigatórias para a passagem
inocente.
Com relação ao direito de passagem inocente, a Convenção de Montego Bay não impõe grandes restrições.
Quanto aos submarinos, foi estabelecido que somente poderão navegar na superfície do mar na área de mar
territorial.
Há arquipélagos que pertencem à soberania do Estado e ficam fora do mar territorial (por exemplo, Fernando
de Noronha) e que, por conseguinte, também possuem mar territorial em sua volta.
Se a distância entre os dois Estados for menor que 12 milhas, será adotado o critério da eqüidistância.
Exemplo: França e Espanha ficam a urna distância de 20 milhas o mar territorial será de 10 milhas para cada
um.
Zona Contígua - É a faixa adjacente ao mar territorial de igual largura. Sobre ela o Estado exerce soberania
no que tange à fiscalização sanitária, alfandegária e de imigração. Essa faixa tem limite máximo de 12 milhas
(será de 24 milhas, a partir da linha de base).
Zona Econômica Exclusiva - É a faixa adjacente ao mar territorial, distante dele 180 milhas (e de 200
milhas da linha de base). Nela, há soberania para exploração, conservação, aproveitamento e gestão de
recursos naturais. Antigamente, o Brasil tinha 200 milhas de mar territorial e 300 milhas de zona econômica
exclusiva. Tais limites foram estabelecidos unilateralmente e não eram obedecidos pela Sociedade
Internacional.
Plataforma Continental - É a planície submarina que vai gradativamente se aprofundando até o limite de
200 metros de profundidade. O Estado tem direito soberano exclusivo de exploração dos recursos em sua
plataforma continental. Há duas formas de fixar o limite dessa plataforma continental, de acordo com a
Convenção de Montego Bay:
Se o Estado atingir o limite de 200 metros de profundidade rapidamente. como é o caso da Oceania,
considerar-se-á o limite de 200 milhas.
Se o mar se aprofunda lentamente, como é o caso do Brasil, o limite de profundidade continuará sendo de
200 metros, mas a faixa alcançará, no máximo, 350 milhas de largura. A grande importância da plataforma
continental reside na garantia de exploração exclusiva dos recursos naturais.
Alto Mar - É direito público internacional. Nenhum Estado terá domínio exclusivo sobre o alto mar. Tal
posição já foi manifestada em 1958 na Convenção da ONU sobre o Alto Mar e foi confirmada pela
Convenção de Montego Bay. Pelo princípio da liberdade dos mares, a navegação, o sobrevôo, a colocação de
cabos submarinos, as investigações científicas, a pesca e a construção de ilhas artificiais para fins pacíficos
são amplamente permitidos. Além disso, os Estados podem exercer o direito de perseguição em alto mar de
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navios privados estrangeiros, e aprisioná-los, desde que tal perseguição tenha se iniciado em suas águas
territoriais e que não tenha havido interrupção na perseguição; direito de visita e busca, que consiste na
parada de navios mercantes, mesmo em alto mar, para verificar os papéis de bordo e inspecionar o navio e
sua carga, antes que adentrem no domínio marítimo do Estado; e direito de verificação do pavilhão, que
consiste na faculdade de verificar-se os documentos que comprovam a nacionalidade do navio.
Há limites, todavia, a esta regra fundamental de liberdade dos mares, resultantes tanto de regras de direito
costumeiro quanto de tratados internacionais, com destaque para:
Repressão à pirataria: pirataria é todo ato de violência ou pilhagem cometido em alto mar por um navio
particular. Neste caso, não vige o princípio da liberdade dos mares, podendo tais navios serem perseguidos
pelos navios de guerra de qualquer Estado, sendo sua tripulação julgada segundo as leis do Estado captor.
Proteção dos cabos submarinos e oleodutos: da mesma forma que a Convenção reconhece aos Estados o
direito de colocar cabos submarinos e oleodutos em alto mar, também lhes impõe a obrigação de evitar a
ruptura ou deterioração por navios que ostentem o seu pavilhão.
Regulamentação da pesca: por meio de tratados bilaterais ou rnultilaterais pode-se restringir a pesca de
determinada espécie, mesmo em alto mar, no intuito de preservar a sua existência.
Defesa contra a poluição: são definidos regimes jurídicos que impõem obrigações aos Estados no tocante à
poluição causada tanto por navios quanto por degetos lançados ao mar a partir de embarcações, aeronaves,
plataformas e outras construções.
Repressão do comércio de escravos: prática ainda presente, principalmente no Oceano Índico. A
Convenção prevê que todo Estado deve tomar as necessárias medidas destinadas a impedir e punir o
transporte de escravos.
Repressão das emissões de radiofusão e televisão a partir do alto mar: à exceção das transmissões de
chamadas de socorro.
Estreitos e Canais - são corredores cujas águas facilitam o trânsito entre dois espaços marítimos. A
diferença entre os dois é que os estreitos são corredores naturais, enquanto os canais são obras do engenho
humano, artificiais.
Com relação aos estreitos, há soberania dos Estados limítrofes, existindo direito de passagem em trânsito
(permissão para a passagem de navios e aeronaves, diferentemente do direito de passagem inocente, que se
restringe a navios e embarcações).
Para os canais, ficou estabelecido que prevalecerá o domínio jurídico ditado pela soberania que o tenha
construído em seu território. Exceção: a Alemanha teve de ceder a sua soberania sobre o Canal de Kiel, que
liga o Mar do Norte ao Báltico, quando perdeu a Segunda Grande Guerra. Ali são cobradas taxas módicas
para travessia.
Os Canais de Suez e do Panamá foram financiados por outros Estados que não aqueles que deveriam possuir
soberania. Canal de Suez foi feito em 1869 e até 1956 ficou sob o jugo da França. Foi expropriado
unilateralmente pelo Egito, durante o governo de Nasser, havendo, inicialrnente, protesto militar da França e
do Reino Unido. O controle definitivo do Canal pelo Egito foi aprovado na Conferência de Londres, e
confirmado pelo Conselho de Segurança da ONU. Israel, no entanto, invadiu o Egito e tomou o domínio do
canal, sem que o Egito pudesse pedir proteção à Sociedade Internacional, já que havia expropriado o canal
unilateralmente. O canal ficou fechado durante muitos anos e foi reaberto após a assinatura do Tratado de
Paz entre Egito e Israel, quando Israel reconheceu a soberania do Egito.
O Canal do Panamá foi construído quando o movimento guerrilheiro da Colômbia, financiado em sua
independência pelos EUA, comprometeu-se a, obtida a independência, ceder o canal e a faixa de 10 milhas
ao norte e ao sul do canal em caráter perpétuo aos EUA, através do Tratado de Hat-Pauncehofe, 1901. O
Panamá sempre pediu a revisão desse tratado, que só ocorreu em 1977, quando os EUA comprometeram-se a
passar a administração do Canal do Panamá para este país, a partir do ano 2000, entretanto, não se falou da
área contígua.
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A internacionalização do Canal de Kiel resultou dos artigos 380 a 386 do Tratado de Versalhes de 1919,
denunciado unilateralmente pela Alemanha em 1936 e restabelecido em 1945.
DOMÍNIO PÚBLICO
São os espaços cuja utilização suscita interesse de mais de um Estado soberano na Sociedade Internacional.
Neles não foi definido ainda a quem pertence a jurisdição, sendo relativamente inexplorados. São dois: Pólo
Norte e Antártica.
Pólo Norte - Não suscita muito interesse na Sociedade Internacional, por se constituir apenas de águas
marinhas perenemente congeladas. Recebe tratamento semelhante ao conferido ao alto-mar. O Pólo Norte
está aberto à exploração. Só há um instrumento jurídico importante relativamente ao Pólo Norte, consistente
na Teoria dos Setores, que consiste em uma série de atos unilaterais dos Estados limítrofes, como Rússia,
Noruega, Canadá e Dinamarca (Groenlândia), que proclamam soberania em relação às ilhas próximas do
Circulo Polar Artico. Não houve contestação pelos demais Estados. A maior importância do Pólo Norte
consiste em servir de corredor aéreo alternativo para linhas européias em direção ao Extremo Oriente.
Antártida - É uma ilha gigantesca, coberta de gelo em quase toda a sua extensão, mas que possui superfície,
motivo pelo qual desperta maior interesse da Sociedade Internacional, com a conseqüente celebração de
tratados internacionais:
Tratado da Antártida - Celebrado em Washington, em 1959, instituiu regime jurídico de não-militarização
da Antártica. Estipulou-se a realização de reuniões periódicas, para intercâmbio de informações científicas.
O Brasil aderiu ao tratado em 1975 e realizou sua primeira expedição à Antártida no período de dezembro de
1982 a março de 1983 (Barão de Tefé). Foi aceito nas reuniões periódicas a partir de setembro de 1983. Há
pressuposto de que, participando dessas reuniões, há alguma soberania sobre o local. Entretanto, não está
definitivamente decidida a questão da soberania sobre a Antártida, pois uma outra teoria diz que a soberania
é dos Estados limítrofes e outra, ainda, crê ser a soberania de quem descobriu a Antártida.
Convenção de Camberra - Celebrada em 1980, diz respeito à conservação de recursos naturais vivos dos
mares adjacentes à Antártida (fonte alternativa de alimentação).
Protocolo de Madri - Celebrado em 1991, é o principal instrumento jurídico que trata da Antártida. Por ele,
os Estados assumiram o compromisso de preservar a Antártida de qualquer exploração de recursos minerais
por um período de 50 anos, ou seja, até o ano de 2041.
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RECONHECIMENTO DE ESTADO E DE GOVERNO
I - RECONHECIMENTO DE ESTADO
É o ato pelo qual os Estados já existentes constatam a existência de um novo membro da Sociedade
Internacional. O reconhecimento de Estado é dado, via de regra, a pedido do Estado que surgiu, o qual
notifica as potências da Sociedade Internacional, requerendo o reconhecimento. Tal instituto teve
importância fundamental até meados deste século, sendo considerado imprescindível para a configuração do
ente como Estado. Hoje, a maioria dos autores não considera imprescindível o reconhecimento. Basta reunir
as características essenciais (povo + território + soberania) para ser Estado.
Requisitos:
Possuir governo independente e autônomo na conduta dos negócios estrangeiros (requisito volátil).
O governo deve ter autoridade efetiva dentro de seu território, congregando as forças ali existentes.
Deve possuir território delimitado.
Exemplo: Na Palestina houve grande preocupação de se realizar eleições para que o governo de Yasser
Arafat demonstrasse sua autoridade, podendo ser reconhecido como Estado. (Estado artificial.)
Natureza Jurídica
Teoria Constitutiva (Openheim e Jellinek) - A personalidade do Estado seria constituída a partir do
reconhecimento do Estado. Tal teoria justifica a idéia de que o ente deveria primeiramente ser reconhecido
pela Metrópole, refletindo um pensamento eurocêntrico.
Teoria Declaratória (Scelle e Aciolly) - reconhecimento é simples ato de constatação de um Estado
preexistente. O ente seria Estado desde que reunisse os elementos essenciais para tanto.
Teoria Mista (Lauterpacht) - Por um lado o reconhecimento constata um fato (elemento declaratório da
teoria), mas por outro lado a partir desse reconhecimento se estabelece uma relação de direitos, e deveres
desse novo Estado com aquele que o reconhece.
Reconhecimento por Estado
É ato unilateral (manifestação da vontade de um único ente da Sociedade Internacional);
É ato irrevogavel, mas não é perpétuo. Se o Estado perder os elementos que o caracterizam como tal, deixará
de sê-lo. Exemplo: A Ilha de Nauru, não terá mais território daqui a algum tempo, dada a exploração de
minerais.
É ato discricionário. O Estado faz o reconhecimento “quando bem entende”.
É ato retroativo, tendo em vista a teoria de que o reconhecimento é apenas uma constatação.
Reconhecimento por Organização Internacional
Somente prevalece perante a organização internacional, cuja personalidade jurídica é distinta da dos Estados
que a compõem. Não obriga os Estados-membros da organização internacional. Exemplo: O reconhecimento
pela ONU da Bósnia e Croácia não obriga o Brasil.
Formas de Reconhecimento:
Reconhecimento Tácito
Individual: Envio ou recepção de agentes diplomáticos.
Coletivo: Quando diversos Estados assinam um tratado que não aborda o reconhecimento, e do qual faz
parte o Estado a ser reconhecido, este será reconhecido tacitamente pelos outros, pelo simples fato de assinar
o tratado.
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Reconhecimento Expresso
Individual: Um Estado, por um ato qualquer, reconhece expressamente a existência do Estado. Pode ser
feito de três formas:
Tratado de reconhecimento: Exemplo: Portugal em relação ao Brasil, quando de sua independencia.
Tratado de amizade: Exemplo: A Rússia celebrou tais tratados em relação às repúblicas que surgiram da
queda do império soviético, uma vez que as reconhecer como Estados seria inconstitucional. No tratado de
amizade celebrado com a Lituânia, em nenhum momento a Rússia a reconhece com Estado. Ressalte-se que,
embora tais tratados não tenham sido expressamente de reconhecimento, foram reconhecidos como tal pela
SI.
Notas diplomáticas unilaterais: Um exemplo é a nota do Brasil à Croácia, em 1992, reconhecendo
expressamente sua independência e conclamando-a para estabelecer representação diplomática no Brasil.
Coletiva: Celebração de tratados por vários Estados reconhecendo um outro Estado. Exemplo: Leste
Europeu em relação ao Vietnã.
Para alguns autores temos, ainda: reconhecimento de facto e reconhecimento de jure.
Reconhecimento de facto: É provisório e revogável.
Reconhecimento de jure: É definitivo e irrevogável. Tal classificação não é científica, pois todo
reconhecimento é irrevogável.
Reconhecimento por imposição de tratado de paz: Um exemplo é o Tratado de Versalhes, que impôs o
reconhecimento pela Alemanha da Polônia e Tchecoslováquia como Estados. Não surtiu efeitos.
II - RECONHECIMENTO DE GOVERNO
O Estado já existe e torna-se necessário o reconhecimento do governo quando há ruptura na ordem política
do Estado, em que há violação do sistema constitucional do Estado. Para alguns autores franceses, o
reconhecimento de governo somente seria obrigatório se houvesse auxílio externo de outro Estado, para que
se modificasse a ordem constitucional do Estado. Para a maioria dos autores, entretanto, o reconhecimento
do governo é obrigatório sempre que há mudança de governo por meios inconstitucionais.
Formas de Governo
Governo de Fato - nele, atinge-se o poder através de meios inconstitucionais. Há violação da norma
constitucional e a autoridade é mantida pela força. Muitos autores, acreditam na necessidade de seu
reconhecimento.
Governo de Direito - é caracterizado pela mudança do governo por meios constitucionais (os órgãos
previstos na Constituição daquele Estado permanecem). Ocorre de maneira jurídica e não precisa ser
reconhecido pela Sociedade Internacional. Exemplo: Governo Fernando Henrique Cardoso.
Prática Internacional
A prática internacional não considera a existência de obrigatoriedade de qualquer Estado reconhecer o
governo de outro Estado. Trata-se de ato discricionário dos Estados (é ato político apenas). Se determinado
governo possui requisitos mínimos que o consagrem como legítimo representante do poder, é
automaticamente reconhecido.
Requisitos:
Efetividade: Deve-se verificar se o governo contém controle da máquina administrativa e aquiescência da
população.
Cumprimento das obrigações internacionais assumidas pelo governo: tal requisito decorre do Princípio
da Continuidade do Estado.
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O aparecimento do novo governo se dá conforme o Direito Internacional: O mais importante é que
respeite as normas já existentes na Sociedade Internacional (não pode, por exemplo, haver genocídio em seu
surgimento).
Formas de Reconhecimento
São as mesmas do reconhecimento de Estado, expressas e tácitas, podendo cada uma delas ser coletiva ou
individual. Exemplos de reconhecimento tácito individual e coletivo, respectivamente: um Estado mantém
relações diplomáticas com o outro, e o Estado com o novo governo ingressa em organização internacional.
Reconhecimento de Governo no Exílio
A teoria subjacente a tal reconhecimento é de que governo é aquele que efetivamente exerce seu poder sobre
o Estado. A partir do momento em que o governo no território do Estado não exerce este poder, surgiria a
figura do governo no exílio, que somente seria válida quando este manifestasse constantemente esforços para
voltar ao poder ou assumi-lo.
Ocorreu durante a Segunda Grande Guerra, quando a França foi invadida pelos alemães, impondo o governo
de Vichy. Houve resistência ao governo de alemães, com governo de De Gaulle, exilado na Inglatena.
No Irã, quando da deposição do Xá Reza Pahlevi, houve uma espécie de governo no exílio durante os
primeiros seis meses. Posteriormente o Xá deixou de ter interesse em retornar ao poder.
No Haiti, o presidente eleito não pôde tomar posse e houve governo no exílio, nos EUA. Após, tomou posse
com auxílio americano.
Doutrinas - na América, em virtude da instabilidade política contante, criaram-se diversas doutrinas para
caracterizar a figura do reconhecimento de governo.
Doutrina Jefferson: Datada de 1792, foi criada especificamente para o reconhecimento da forma de governo
originária da Revolução Francesa. Por ela, o reconhecimento será dado a um governo em virtude de ter apoio
popular. Tal teoria apresentou-se contraditória, uma vez que, no século XIX, os Estados Unidos não
reconheceram o governo de Soares, no México, que dispunha de apoio popular.
Doutrina Tobar: Datada de 1907 e criada pelo equatoriano Tobar, que disse que somente deveria ser
reconhecido o governo que tivesse legitimidade constitucional (forma jurídica).
Doutrina Wilson: Datada de 1913, época da Revolução Mexicana. Somente deveria ser reconhecido o
governo como legitimidade constitucional. Além disso, não poderiam ser eleitos chefes de governo os líderes
da Revolução, muito menos seus ascendentes, descendentes e colaterais.
Doutrina Betancourt: Datada de 1959, foi criada pelo Presidente venezuelano para suas relações exteriores.
Por ela, seriam rompidas as relações diplomáticas com governos alterados por modificações
inconstitucionais. A Venezuela rompeu ligações diplomáticas com o Brasil em 1964, com Argentina em
1966 e com o Peru em 1968. Tal doutrina caiu em desuso com a queda de Betancourt, por golpe militar na
Venezuela.
Doutrina Estrada: Adotada pelo México, que se recusaria a reconhecer qualquer forma de governo, mesmo
que de jure, pois considerava o próprio ato de reconhecimento como intervenção ilícita nos assuntos internos
do Estado.
Doutrina Larreta: Datada de 1976, apregoava a necessidade de intervenção coletiva de todos os Estados da
América sobre aqueles governos ditatoriais surgidos de revolução (golpes de Estado).
De todas essas teorias, a melhor é a de Tohar.
Bibliografia: SILVA, Roberto Luiz. DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO.
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TRATADOS INTERNACIONAIS
Os tratados são instrumentos jurídicos essenciais para a Sociedade Internacional, por abordarem as matérias
mais importantes entre os Estados. Além disso, são a forma mais democrática de manifestação da vontade na
Sociedade Internacional.
A essência dos tratados constitui-se na fonte específica de uma obrigação de Direito Internacional contraída
voluntariamente por uma pessoa internacional a favor de outra ou outras e que dá origem, por sua vez, a
direitos recíprocos.
Os tratados constituem o principal instrumento de cooperação em relações internacionais. A tecnologia
moderna, as comunicações e o comércio aumentaram, mais do que nunca, a interdependência entre os
Estados e a disposição destes para aceitarem regras internacionais sobre um grande número de questões de
interesse comum, sendo tais normas usualmente recolhidas em tratados que se assemelham, freqüentemente,
aos contratos dos sistemas jurídicos nacionais, mas também assumem funções que, nos ordenamentos
nacionais, são desempenhadas por atos legislativos, por certificados de transferência de título ou pelos
estatutos de uma sociedade. Em certa medida, os tratados substituem o direito consuetudinário. Assim,
sempre que é possível obter acordo acerca das normas costumeiras, procede-se a sua codificação através de
um tratado.
Autores clássicos, como von Liszt, conceituam tratado internacional como o acordo entre dois ou mais
Estados sobre direitos próprios de soberania. Virally, em seu conceito, estende às organizações
internacionais a capacidade para celebrar tratados, ao afirmar que tratado é qualquer acordo internacional
celebrado por dois ou mais Estados ou outras pessoas internacionais e que está regido pelo Direito
Internacional.
Para Rezek, tratado é um acordo formal concluído entre sujeitos de direito internacional público e destinado
a produzir efeitos jurídicos. Trata-se de conceito bastante genérico, pelo qual o termo “acordo” tem por
essência uma noção que conduz, simultaneamente, a distinguí-lo do ato jurídico unilateral e a entendê-lo
resultante da livre manifestação das partes, sendo “formal” por se exprimir com precisão em determinado
momento histórico, ter em seu teor contornos bem definidos e ser voltado, essencialmente, “a produzir
efeitos jurídicos”, já que tal não pode ser visto senão na sua dupla qualidade de ato jurídico e de norma.
A maioria dos autores prefere o conceito positivado, encontrado na Convenção de Viena sobre o Direito de
Tratados entre Estados, de 1969. Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados - Tratado é o acordo
internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um
instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação
particular.
Acordo internacional, por ter na Sociedade Internacional o seu âmbito de aplicação.
Celebrado por escrito possuindo, desta forma, maior precisão, que conduz a uma maior certeza com relação
ao conteúdo do Direito. Para muitos doutrinadores, não seria nulo o chamado “tratado oral”, celebrado
através de acordo de cavalheiros ou troca de notas diplomáticas. Esse tipo de tratado, no entanto, não é
comum.
Celebrado por Estados. Não se excluem, no entanto, os outros sujeitos de Direito Internacional, pois, a
própria Convenção de Viena reconhece a validade dos acordos celebrados por outros sujeitos que não
Estados. Tais acordos serão válidos, desde que os requisitos para sua celebracão sejam observados.
Consubstanciando-se em um ou mais instrumentos, sendo todos perfeitamente válidos. Pode ser escrito em
um ou mais idiomas. Hoje, é usual celebrar os tratados em tantos idiomas quantos forem os países que
contratam. Antigamente, usava-se o Latim como língua universal; posteriormente, adotou-se o Francês e o
Inglês. A ONU, por exemplo, utiliza seus seis idiomas oficiais, enquanto a União Européia vale-se dos seus
onze idiomas oficiais. Em geral. Se dois Estados fazem um tratado, este é transcrito em três idiomas, sendo o
terceiro fonte de interpretação.
TERMINOLOGIA
Apesar das diferenças terminológicas não serem de fundamental importância para determinar se um
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instrumento jurídico é ou não um Tratado Internacional, pois, para tanto, basta que ele se insira no conceito
apresentado pela Convenção de Viena, utiliza-se uma vasta lista de “títulos alternativos para caracterizá-lo
em contextos especiais. Os mais comuns são:
Tratados: são acordos internacionais de natureza solene. Exemplo: tratados de paz, como o Tratado de
Versalhes.
Convenções: são acordos Internacionais que criam normas gerais acerca de determinada matéria de Direito
Internacional. Exemplo: Convenção de Viena.
Declarações: são acordos internacionais que firmam princípios jurídicos para a Sociedade Internacional.
Exemplo: Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Atos: são acordos internacionais que estabelecem regras de direito. Exemplo: Ato de Berlim de 1885, sobre
divisão dos Estados africanos pelos europeus.
Pactos: foram muito utilizados após a Primeira Guerra Mundial, por influência do presidente americano
Woodrow Wilson, para quem o “pacto” seria a “terminologia para uma nova era”. Tal termo caiu em desuso.
Exemplo: Pacto da Liga das Nações.
Estatutos: são tratados coletivos, geralmente relacionados à criação e funcionamento de tribunais
internacionais permanentes. Exemplo: Estatuto da Corte Internacional de Justiça.
Acordos: são tratados de cunho econômico, financeiro, social e, às vezes, cultural, como no caso do Acordo
Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio e do Acordo Nuclear Brasil-Alemanha.
Modus Yivendi: acordo internacional temporário celebrado por troca de notas diplomáticas. (Essas trocas de
notas têm cunho administrativo.) Como exemplo temos o Modus Vivendi sobre a navegação do rio Reno,
celebrado entre Alemanha, Suíça e França na fase intermediária entre guerras, acerca de arrecadação
alfandegária, e o Modus Vivendi firmado em La Paz em março de 1903, ou seja, antes da assinatura do
Tratado de Petrópolis, que assegurou uma suspensão das hostilidades entre o governo da Bolívia e o dos
revolucionários acrianos, e permitiu ao Brasil a ocupação administrativa e militar do território sob litígio.
Concordata: acordo internacional celebrado entre a Santa Sé e os demais Estados da Sociedade
Internacional, a respeito das relações entre ela e eles. A concordata, no entanto, não é o único instrumento
convencional celebrado pela Santa Sé nas suas relações exteriores, como bem o provam os Acordos de
Latrão.
Protocolo Conferência: é a ata da conferência, como a Ata final que incorpora os resultados da Rodada
Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do Gatt — Protocolo de Marraqueche.
Protocolo Acordo: é um tratado que cria normas jurídicas complementares a um tratado principal, como no
caso do Protocolo de Brasília para a Solução de Controvérsias no Mercosul.
Compromisso: acordo internacional que trata dos litígios internacional é da forma como serão solucionados
- compromisso arbitral.
Carta: acordo internacional que cria direitos e deveres para os membros da Sociedade Internacional.
Exemplos: Carta da ONU e da OEA, instrumentos de criação de organização internacional, em geral.
Convênio: acordo internacional celebrado no domínio de matéria cultural ou transportes. Exemplo:
Convênio Brasil-Alemanha de intercâmbio de estudantes.
Arranjo: acordo internacional que visa a regulamentar a aplicação de um tratado anterior.
Acordo de Cavalheiros: afirma a existência de normas morais relacionadas a um programa de ação política
conjunta entre as partes contratantes. Por ser negociado em nome pessoal dos estadistas, fundado sobre a
honra e condicionado, no tempo, à permanência de seus atores no poder, o acordo de cavalheiros não pode
ser entendido como um tratado internacional, não criando desta forma, qualquer efeito jurídico para os
Estados.
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Pactum de Negotiando: é uma obrigação que os sujeitos de Direito Internacional assumem de iniciar
negociações de boa-fé, com a finalidade de concluir tratado a respeito de matéria conflituosa. Não havendo
conciliação, pode ser celebrado acordo internacional para divisão entre os Estados (por organização
internacional). Exemplo: Pactum para o início de negociações entre palestinos e judeus.
Pactum de Contrahendo: é um acordo concluído pelos sujeitos de Direito Internacional com compromisso
de celebrar um acordo final sobre a matéria em litígio. É o chamado tratado preliminar.
FUNDAMENTO DOS TRATADOS
Baseiam-se na norma pacta sunt servanda. Todos os tratados devem ser cumpridos pelas partes. A
Convenção de Viena, em seu artigo 26, consagra, desta forma, tal princípio.
Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados - Artigo 26. Todo tratado em vigor obriga as partes e
deve ser cumprido por elas de boa-fé.
EFEITO DOS TRATADOS
Limitam-se as partes contratantes, não podendo haver imposição de obrigações a um terceiro Estado. Há, no
entanto, duas exceções à regra:
Trazem efeitos para terceiros os chamados tratados dispositivos ou tratados reais, que abordam questões
territoriais que trarão reflexos para a Sociedade Internacional. Por exemplo, o Tratado de Petrópolis, de
l7.ll.1903, que resultou na cessão de um território de 191.000 km2 (Acre) pela Bolívia ao Brasil, que, ao
alterar a soberania sobre aquela faixa territorial, antes pertencente à Bolívia, levou todos, de nacionais
bolivianos a empresas transnacionais, a adequarem-se à nova jurisdição, no caso a brasileira.
Os tratados constitutivos ou semilegislativos são aqueles concluídos por um grupo de Estados, em nome do
interesse internacional, tendo como objeto um terceiro Estado, como no caso do Tratado de Viena, de 1815,
celebrado pelas oito potências européias, que, dentre outras decisões, declarou a Suíça como neutra
permanentemente, salientando-se o fato de que tal Estado nem foi parte na elaboração deste tratado, somente
aderindo ao mesmo alguns anos mais tarde. Aréchaga cita ainda os tratados que estabelecem a liberdade de
navegação através de rios e canais em favor de todos os Estados ou de barcos de todas as bandeiras.
Quando da análise, pela Comissão de Direito Internacional em 1964, levantou-se a figura do acordo colateral
celebrado, por um lado, pelas partes contratantes no tratado e, por outro, por um terceiro Estado, que deveria
manifestar expressa ou implicitamente o seu consentimento. Isso foi objeto de diversas críticas, levando a
mesma Comissão, em 1966, a abandonar essa figura, ao suprimir a necessidade de aceite expresso ou
implícito do terceiro Estado.
Não têm efeito retroativo. Como bem informa a Convenção de Viena, somente produzem efeito para um
Estado depois que é ratificado. Se o Brasil aderir à Convenção de Viena, só poderá alegar corrupção dos
tratados celebrados daí em diante. Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados Artigo 28. A não ser
que uma intenção diferente resulte do tratado, ou salvo disposição em contrário, as disposições de um tratado
não obrigam uma parte em relação a um fato ou ato anterior ou a uma situação que deixou de existir antes da
entrada em vigor do tratado em relação a essa parte.
IDIOMAS
Os tratados podem ser celebrados em tantas línguas quantas forem as das partes contratantes; pode ser
indicado um terceiro idioma ou um idioma comum (universal) ou, ainda, em tantas línguas quantas forem as
das partes contratantes e num terceiro idioma, que só será considerado autêntico para a interpretação e
solução de controvérsias. A partir de Luís XIV, foi introduzido paulatinamente o uso do Francês nas
negociações e resoluções dos congressos internacionais. Até o século XII se havia empregado o Latim; a
partir daí e até o século XIII o Italiano. Atualmente temos o inglês como idioma mais utilizado na celebração
dos tratados internacionais.
INTERPRETAÇÃO DOS TRATADOS
O processo de interpretação deve começar pela análise das disposições específicas do tratado relativas à
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questão em controvérsia, sendo seus termos interpretados segundo os conceitos jurídicos que prevaleciam no
momento de sua celebração.
Por exemplo, no caso de um tratado conferir a um Estado direitos sobre o mar territorial, este deverá ser
interpretado à luz do conceito de mar territorial em vigor no momento de sua conclusão, e não incorporar
uma noção mais ampla utilizada posteriormente, como a apresentada pela Convenção de Montego Bay. Na
interpretação, em geral, busca-se o exato sentido da norma jurídica expressa. Há três sistemas básicos no
âmbito internacional:
Interpretação autêntica: a ser realizada pelo governo das partes contratantes que se reúnem para tanto. Não
é feita unilateralmente. Em geral surgem novos acordos, chamados Acordos de Interpretação. Esse tipo de
interpretação é obrigatório para o direito interno.
Interpretação jurisdicional: efetivada por um tribunal arbitral, especialmente criado para a solução de um
conflito específico, que é submetido à sua apreciação. Não pode se constituir em jurisprudência
internacional, servindo apenas como subsídio para a solução de litígios análogos.
Interpretação judiciária: provém de organismos internacionais de jurisdição permanente, como a Corte
Internacional de Justiça. As sentenças emanadas da CIJ servem. subsidíariamente, como fonte de
interpretação.
Métodos de Interpretação
Interpretação literal: muito utilizada quando a influência do Positivismo sobre o Direito Internacional era
mais sensível (interpretação ipsis literis).
Hermenêutico: leva em consideração nao so os artigos, preâmbulo e anexos, mas ainda o contexto no qual
foi elaborado o acordo internacional (pesquisa histórica dos trabalhos realizados para a elaboração do
tratado). Tal método, mesmo encontrando fortes resistências doutrinárias, encontra-se consagrado no artigo
31 da Convenção de Viena.
Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados Artigo 31.
1. Um tratado deve ser interpretado de boa-fé, segundo o sentido comum dos termos do tratado em seu
contexto e à luz de seu objeto e finalidade.
2. Para fins de interpretação de um tratado, o contexto compreende, além do texto, seu preâmbulo e anexos:
a) qualquer acordo relativo ao tratado e feito entre todas as partes por ocasião da conclusão dos tratados;
b) qualquer instrumento estabelecido por uma ou várias partes por ocasião da conclusão do tratado e aceito
pelas outras partes como instrumento relativo ao tratado.
3. Será levado em consideração, juntamente com o contexto:
a) qualquer acordo posterior entre as partes relativo à interpretação do tratado ou à aplicação de suas
disposições;
b) qualquer prática seguida posteriormente na aplicação do tratado pela qual se estabeleça o acordo das
partes relativo à sua interpretação;
c) qualquer regra pertinente de direito internacional aplicável às relações entre as partes.
4. Um termo será entendido em sentido especial se estiver estabelecido que essa era a intenção das partes.
CLASSIFICAÇÃO DOS TRATADOS
Tratados Bilaterais x Tratados Multilaterais
Tratados bilaterais são aqueles que envolvem apenas duas partes, enquanto nos multilaterais, também
chamados de coletivos, participam três ou mais partes, sendo firmados, geralmente, por um número
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importante de Estados, independentemente de sua importancia politica e abertos a adesão de outros.
Tratados Abertos x Tratados Fechados
Tratados abertos possuem cláusula de adesão. Outros sujeitos de Direito Internacional podem fazer parte do
tratado. A maior parte dos tratados atualmente possui esta cláusula. Já os tratados fechados não contém essa
cláusula de adesão, incluindo somente as partes contratantes.
Tratados - Lei x Tratados - Contrato x Tratados - Constituição:
Tal distinção foi consagrada por Charles Rousseau e, mesmo recebendo sérias críticas de Kelsen Aréchaga e
Virallv, é de inegável contribuição para a elaboração de uma teoria geral do Direito Internacional Público.
Nos tratados-lei, a vontade das partes contratantes tem conteúdo idêntico (exemplo: na Carta da ONU todos
queriam a paz, a melhoria do nível sócio-político-econômica da Sociedade Internacional).
Nos tratados-contrato, as vontades dos Estados-partes têm conteúdo diferente (exemplos: Acordo Nuclear
Brasil-Alemanha, em que o Brasil se comprometeu a fornecer urânio enriquecido em troca de tecnologia
nuclear “de ponta”, Tratados comerciais de exportação-importação).
Para muitos autores essa classificação não faz sentido, uma vez que um tratado pode conter os dois aspectos,
como o tratado em que um Estado fornece armamento aeronáutico e outro fornece armamento terrestre para
que um terceiro Estado se defenda.
Os tratados-constituição são celebrados pelos sujeitos da SI que visam a institucionalizar um processo
Internacional de criação de uma entidade que possua órgãos e poderes próprios e vontade independente dos
Estados que a originaram. Exemplo: tratados que criam as organizações internacionais, como a Carta da
ONU e o Tratado de Assunção - Mercosul.
Von Liszt classifica os tratados de acordo com o seu conteúdo (constitutivos de estatutos jurídicos ou
reguladores de relações jurídicas), seus objetivos (tratados políticos ou tratados sociais, estes afetando
somente relações econômicas), e número de partes contratantes (particulares ou coletivos).
Jorge Miranda classifica, ainda, os tratados em: solenes x não solenes; exeqüíveis por si mesmos x não
exeqüíveis; perpétuos x temporários; principais x acessórios e públicos x secretos.
ESTRUTURA DOS TRATADOS
Os tratados internacionais, são acordos formais celebrados pelos Estados ou por organizações internacionais.
E essa forma dos instrumentos internacionais pressupõe sempre uma estrutura, ainda que esta não seja
hermética e possa variar de instrumento para instrumento. Tradicionalmente, sem levar em conta as
variações de forma que cada instrumento pode apresentar em particular, pode-se dizer que os tratados
internacionais em geral são formados pelas seguintes partes:
a) o título, indica a matéria tratada pelo acordo ou, mais amplamente, o assunto nele versado;
b) o preâmbulo ou exórdio, é o enunciado das finalidades do tratado e a enumeração das partes contratantes,
é dizer, os Estados ou as organizações internacionais que concluem o tratado, com a menção das credenciais
dos representantes dos Estados. Em regra, as partes são indicadas pelo título abreviado do Chefe de Estado,
ficando assim comprovada sua capacidade para a mantença de relações internacionais.
c) os considerandos, indicam as intenções das partes em relação à celebração do acordo e também a
eventual vinculação de tais partes com o acordado, sua compatibilidade com o regime convencional anterior,
etc. Por meio deles se enunciam os motivos e as finalidades do acordo, fazendo-se conhecer toda a filosofia
da diplomacia que na sua conclusão esteve empenhada. Os considerandos podem variar de tratado para
tratado, não existindo um número mínimo deles em cada instrumento, tudo dependendo da complexidade e
da importância do tema versado no acordo;
d) o articulado (ou dispositivo), considerado a principal parte do instrumento convencional, composto por
uma seqüência de artigos numerados, onde se estabelecem (em linguagem jurídica) todas as cláusulas de
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operatividade do acordo, variando sua extensão de tratado para tratado. Após o corpo do tratado e de suas
disposições de direito subjetivo, seguem-se as cláusulas finais (de natureza adjetiva) relativas à ratificação e
à troca dos seus instrumentos, à sua entrada em vigor, à possibilidade de denúncia ou prorrogação, eventual
prazo de vigência, possibilidade de adesão, de revisão etc. Depois do articulado é ainda de regra a menção do
testemunho (“em fé do que ) dos plenipotenciários relativamente ao acordado;
e) o fecho, que especifica o local e a data da celebração do tratado, o idioma em que o mesmo se acha
redigido e o número de exemplares originais. Com a referência ao local e à data de celebração, o instrumento
está apto a receber a assinatura do representante do Estado e o selo de lacre;
f) a assinatura do Chefe de Estado, do Ministro das Relações Exteriores, ou de outra autoridade que tenha
representado o Presidente da República na celebração do instrumento, desde que detentor dos plenos
poderes. Nos atos bilaterais a assinatura obedece ao sistema de alternância ou de inversão, que consiste em
cada parte apor sua assinatura em primeiro lugar no exemplar que ficará em seu poder, o que evita o
problema da precedência de assinaturas de um Estado em relação ao outro. Para os tratados muitilaterais
têm-se utilizado a aposição das assinaturas em ordem alfabética dos nomes das partes, o que poderá variar
em função da língua em que se encontra redigido o instrumento. Durante muito tempo o sistema das
assinaturas em ordem alfabética seguiu a nomenclatura francesa dos respectivos países. Não se descarta,
também, a possibilidade de sorteio relativamente à ordem das assinaturas, efetuado geralmente no início da
conferência destinada às negociações do tratado.
g)o selo de lacre, onde se apõem as armas das altas partes contratantes, selando então o compromisso entre
elas.
O texto do tratado também pode conter, eventualmente, alguns anexos ou apêndices, dependendo da
necessidade de alguma outra explicação pós-textual, bem como de algum outro complemento que se faça
necessário. Os anexos e apêndices, contrariamente do preâmbulo, integram o tratado e os seus dispositivos
têm natureza de norma jurídica convencional.
CONDIÇÕES DE VALIDADE DOS TRATADOS
São quase as mesmas dos atos jurídicos em geral:
Capacidade das Partes - diz respeito ao poder ou faculdade jurídica para celebrar tratados em forma geral
ou para celebrar determinadas classes de tratados. Têm capacidade:
a) Os Estados soberanos: todo Estado independente.
b) As Organizações Internacionais: desde que tenham pôderes para tal. A faculdade para celebrar tratados é
uma conseqüência importante da aplicação da doutrina dos poderes implícitos como princípio de
interpretação das atribuições jurídicas que têm as Organizações Internacionais. O reconhecimento da
existência desta faculdade, todavia, não lhe dá poderes para celebrar tratados alheios às suas funções.
c) Os beligerantes: segundo Rezek, não há o que impeça um Estado de reconhecer, num governo exilado,
numa autoridade insurreta, num movimento de libertação, a legitimidade que outros Estados ali não
reconhecem e de, consequentemente pactuar com tal potência. Para alguns autores, até mesmo os
movimentos de libertação, como a Organização para Libertação da Palestina - OLP, teriam capacidade para
celebrar tratados.
d) A Santa Sé: não lhe faltam, embora muito peculiares, os elementos conformadores da qualidade estatal: ali
existe um território de cerca de 44 hectares, uma popujação que se estima de menos de mil pessoas e um
governo independente daquele do Estado italiano ou de qualquer outro.
e) Outros sujeitos de Direito Internacional que tenham expressamente garantido esse direito, por exemplo
Estados-membros de uma federação. No Brasil, os Estados Membros o Distrito Federal e os Municípios
podem celebrar tratados de financiamento, desde que tenham aval do Senado Federal. Deve-se salientar que
isso não ocorre em todos os Estados federados, pois a Lei Federal alemã concede às suas unidades federadas
uma capacidade contratual bem resumida em termos de relações internacionais, enquanto que nos EUA, por
exemplo, há uma série de restrições constitucionais aos poderes dos Estados-membros.
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Constituição dos Estados Unidos da América Artigo 1 — Seção X — Restrições aos Estados - Nenhum
Estado poderá celebrar tratados nem entrar em aliança ou confederação; conceder cartas de corso e de
represálias; cunhar moedas e emitir documentos de crédito; admitir como moeda legal para o pagamento de
dívidas senão as de ouro e prata; aprovar decretos de proscrições, leis retroativas ou que prejudique a
obrigatoriedade dos contratos, ou conferir títulos de nobreza.
Rezek ilustra que as empresas, tanto privadas quanto públicas, pouco importando sua dimensão econômica
ou sua eventual multinacionalidade, não têm personalidade jurídica de Direito Internacional, carecendo de
capacidade para celebrar tratados.
Habilitação dos Agentes Signatários - os representantes do Estado devem estar de posse de instrumento de
plenos poderes. No caso das organizações internacionais, segundo Parry, à falta de disposições explícitas que
deleguem a faculdade de celebrar tratados a determinado órgão, se reconhece tal poder aos órgãos plenários.
A habilitação é feita perante o secretário da conferência e torna os representantes estatais plenipotenciários.
Há, contudo, entes que não necessitam da apresentação desse documento. De acordo com a Convenção de
Viena, são eles:
Chefes de Estado e de governo, ministros das relações exteriores, em sentido lato, para qualquer ato
internacional.
Chefes de missões diplomáticas, a quem é conferida uma competência ex officio perante o Estado onde
esteja acreditado, mesmo assim, apenas no caso de tratados bilaterais (celebrados entre o Estado que
representa e o Estado onde está exercendo suas atividades).
Representantes acreditados pelo Estado perante uma convenção. Ser acreditado é ter em mãos uma
credencial e passaporte diplomático especial, conferido por tempo limitado, que credencia seu titular a atuar
em nome do Estado.
Objeto Lícito e Possível - não se pode elaborar tratado internacional que contrarie a moral internaçional ou
que não seja possivel. Por exemplo, é impossível a celebração de tratado Brasil-EUA para extração de ouro
na Lagoa dos Patos, que sabidamente não possui ouro.
O artigo 53, da Convenção de Viena consagrou a exigência de obediência ao chamado jus cogens, que repetil
os princípios de Direito Internacional geral e não pode ser violado na celebração de tratados.
Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados - Artigo 53. É nulo o tratado que, no momento de sua
conclusão, conflita com uma norma imperativa de direito internacional geral. Para os fins da presente
Convenção uma norma imperativa de direito internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela
comunidade internacional dos Estados no seu conjunto, como norma da qual nenhuma derrogação é
permitida e que só pode ser modificada por nova norma de direito internacional geral da mesma natureza.
No conceito de jus cogens inclui-se a proibição do uso ou ameaça de força e a agressão; a prevenção e
repressão do genocídio, da pirataria, do tráfico de escravos, da discriminação racial, do terrorismo ou da
tomada de reféns. A observância de tais princípios, firmemente arraigados na Sociedade Internacional, é
exigida a todos os Estados, e sua violação afetará a todos, eivando de nulidade absoluta o ato. A função do
jus cogens é a de proteger todos os Estados contra acordos que são celebrados desafiando certos valores e
interesses gerais do conjunto de Estados da Sociedade Internacional, representando um avanço significativo
no Direito Internacional tanto do ponto de vista científico como no ponto de vista prático, não sendo uma
espécie de direito natural imutável, mas sim urna noção evolutiva.
Temos o exemplo do apartheicl que, mesmo tendo sido aceito, por longos anos, pelo Direito de um Estado,
não poderia ser objeto de um tratado, por violar uma regra de jus cogens, ou ainda o acordo pelo qual um
Estado beligerante autorizaria outro Estado beligerante, como no caso do Governo de Vichy com relação à
Alemanha Nazista, a utilizar os prisioneiros de guerra que tivesse capturado do primeiro Estado como mão
de obra forçada, para a produção de armamentos, violando a Convenção de Genebra sobre o tratarnento de
prisioneiros de guerra. Apesar do número de regras poder ser limitado, novas regras com esse caráter podem
ser aceitas e reconhecidas por meio de tratados gerais multilaterais ou Declarações da Assembléia Geral da
ONU, como as relativas à utilização de armas de destruição em massa, proteção do meio ambiente ou o
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estabelecimento de princípios mais eqüitativos para regular o comércio internacional.
Mútuo Consentimento - erro, dolo, corrupção e coação viciam os tratados, tornando-os nulos absoluta (erga
omnes) ou relativamente (anuláveis), trazendo, conseqüências maiores do que a sua extinção, pois são vícios
existentes já no momento de sua conclusão. Uma vez declarada ou reconhecida essa nulidade, o tratado é
considerado nulo ab initio e, portanto, os atos de execução também constituem nulidades, pois todos os
efeitos jurídicos de um tratado nulo devem ser eliminados e as coisas devem voltar, segundo o princípio
restítutio ad pristinun, a seu estado primitivo como se o tratado nunca tivesse existido. A diferença entre
nulidade absoluta e relativa pode definir-se, como no Direito Civil, por dois elementos estreitamente ligados
entre si:
A nulidade relativa só pode ser alegada pelo Estado vítima do erro, dolo ou corrupção; já a nulidade
absoluta pode ser alegada por qualquer Estado interessado e deve ser declarada motu proprio por um tribunal
competente ou por qualquer órgão internacional encarregado da aplicação do tratado, mesmo que não tenha
sido invocada pelas partes contratantes;
A nulidade relativa pode ser sanada por acordo expresso ou aquiescência posterior da parte interessada; a
nulidade absoluta não pode ser sanada por nenhuma conduta posterior.
Tal nulidade, entretanto, deve ser considerada algo excepcional, devendo o tratado ser considerado válido até
que se estabeleça ou declare sua nulidade com base nos seguintes fatores:
Erro: no Direito Internacional, o erro deverá ser substancialmente importante para ocasionar a anulação de
um tratado. Erros de datilografia ou mesmo de tradução não se prestam a anular um tratado. Deve-se
ressaltar que a parte que alega erro não pode ter contribuído para sua existência.
Dolo: uma parte age propositadamente para que a outra celebre o tratado ludibriada. Até hoje, não houve
alegação de erro ou dolo na celebração de tratados. Isso porque há um grande prazo para a ratificação deles.
Corrupção: é sinal de evolução a inclusão da corrupção como vício que pode gerar nulidade. Só pode ser
alegada se a manifestação do consentimento de um Estado foi obtida por meio de corrupção de seu
representante, pela ação direta ou indireta de outro Estado negociador, mesmo assim, apenas para Estados
que tenham ratificado a Convenção de Viena.
Coação: só terá validade se exercida sobre a pessoa do plenipotenciário. De acordo com a Convenção de
Viena, somente viciará a celebração do tratado o emprego de força militar. Coação política, econômica e
financeira não vicia tratados. Além disso, a força militar deve se caracterizar como injurídica. A ONU, por
exemplo, pode usar força militar para forçar a paz em determinado Estado e isso é jurídico e válido. O vício
ocorreria se outro Estado o fizesse. Nesse sentido, a Tchecoslováquia invocou, em 1973, a nulidade do
Acordo de Munique, de 29.09.1938, obtido sob a ameaça nazistade utilizar a força contra este país.
Pela Convenção de Viena se estabelece a nulidade relativa nos casos de incapacidade e de presença de erro,
dolo e corrupção, enquanto que a coação ou violação de um jus cogens motivará nulidade absoluta.
TRÂMITE DOS TRATADOS
A conjugação das fases internacionais com as fases internas de celebração de atos internacionais faz nascer
um procedimento complexo dos poderes da União, onde se agregam as vontades do Poder Executivo e do
Poder Legislativo para a perfeita formalização do acordo, o que dá um viés seguramente mais democrático
ao processo de celebração de tratados. Trata-se de tendência característica dos textos constitucionais
contemporâneos, onde a participação desses dois órgãos federais é indispensável para formar a vontade da
nação em relação ao que foi acordado internacionalmente.
TRÂMITE DA APROVAÇÃO DE TRATADOS NO BRASIL
NEGOCIAÇÃO → ASSINATURA → RATIFICAÇÃO
A Convenção de Viena, em seu art. 11, estabelece que o consentimento de um Estado em obrigar-se por um
tratado pode manifestar-se pela assinatura, pela troca dos instrumentos constitutivos do tratado, pela
ratificação, pela aceitação, pela aprovação ou adesão, ou por quaisquer outros meios, se assim acordado entre
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as partes. Embora pareça ter a Convenção aberto um leque de hipóteses em que o consentimento de um
Estado em obrigar-se se convalida, na realidade estas hipóteses estão reduzidas a somente três: a assinatura, a
ratificação e a adesão. A assinatura expressa o consentimento definitivo do Estado em obrigar-se pelo
acordo. A troca de notas e sua transmissão efetiva, também é característica dos tratados em forma
simplificada ou de procedimento breve, implica, da mesma forma, em comprometimento definitivo do
Estado, equiparando-se à assinatura. A aceitação e a aprovação, por sua vez, são termos em tudo
equivalentes à ratificação, de sorte que, ao lado da assinatura, a ratificação e a adesão são as duas ünicas
outras formas de comprometimento definitivo do Estado.
Negociação: em se tratando de tratado bilateral, não há regras preestabelecidas. É comum que o convite se
faça por meio de nota diplomática de uma parte a outra, desenvolvendo-se no território de uma das partes
contratantes. No caso de tratado rnultilateral, ocorre nos congressos e conferências internacionais, onde é
discutido o objeto do acordo internacional. Esta fase se encerra com a elaboração do texto final do tratado,
que deverá ser aprovado, segundo o artigo 9º da Convenção de Viena, por no mínimo 2/3 dos presentes, no
casos das conferências internacionais. Em alguns casos, dependendo do teor da matéria a ser pactuada, é
preciso unanimidade.
Assinatura do Tratado: tal fase teve reduzida a sua importância à medida que a ratificação foi adquirindo
prestígio na Sociedade Internacional. Atualmente serve para autenticar o texto dos tratados e para que se
inicie a contagem dos prazos para troca ou depósito dos instrumentos de ratificação.
Ratificação: e o ato unilateral com que o sujeito de Direito Internacional, signatário de um tratado, exprime
definitivamente, no plano internacional, sua vontade de obrigar-se.
Originariamente derivada do mandato do Direito Romano, a ratificação era uma mera confirmação, por parte
do mandante, de que seu agente, ao negociar o acordo, não havia excedido em suas instruções. A partir do
século XIX compreendeu-se que seria necessário aguardar um lapso, depois da etapa da assinatura, na qual
se pudesse avaliar a compatibilidade dos termos de um novo tratado com o conjunto dos compromissos e da
política do Estado e se pudesse elaborar a legislação necessária para colocá-lo em vigor. Assim, de simples
formalidade, a ratificação converteu-se num trâmite essencial pelo qual os Estados se obrigavam
mutuamente por tratados.
Autores há que admitem a figura da ratificação tácita, contanto que se evidencie por atos inequívocos, o
começo da execução do tratado, posição esta, indubitavelmente questionável. O poder competente para
realizar a ratificação é definido livremente pelo direito interno dos Estados, geralmente em sua na
Constituição.
Há três sistemas de ratificação:
Sistema da competência exclusiva do Poder Executivo: comum nos Estados absolutistas, na Alemanha
Nazista e na Itália Fascista.
Sistema de competência exclusiva do Poder Legislativo: trata-se do modelo britânico, que necessita de um
ato do parlamento para que o tratado tenha eficácia interna. E o que ocorre também nos EUA, onde há a
necessidade do consentimento expresso de 2/3 do Senado e, ainda, na Suíça, em que, se o tratado tiver prazo
de validade superior a 15 anos, terá de ser, ainda, referendado pela população, como ocorreu no caso da
adesão da Suíça à União Européia, que não foi aceita pela população.
Sistema misto: nele, há participação tanto do Poder Executivo quanto do Legislativo na ratificação. No
modelo francês, a aprovação parlamentar, através da manifestação da Assembléia Nacional e do Senado, por
meio de uma lei, constitui pressuposto da confirmação de alguns tratados, mencionados no artigo 53 de sua
Constituição.
a) Tratados Solenes e Completos
O Presidente tem competência para celebrar tratados. Ele delega poderes ao Ministério das Relações
Exteriores, que indica pessoa para representar o país (que deve ser aprovada pelo Presidente), o chamado
agente plenipotenciário.
Após negociar e assinar o tratado, o agente plenipotenciário retorna ao país e o submete à apreciação do
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Ministro das Relações Exteriores.
Se este concordar, elabora um Projeto de Mensagem ao Congresso Nacional, devidamente justificado, além
de anexar uma cópia do texto original do tratado traduzido e uma exposição de motivos, que é submetida ao
Presidente.
Se o Presidente da República concordar, transforma o projeto em Mensagem ao Congresso Nacional, que
será apresentada ao Presidente da Câmara dos Deputados, juntamente com a cópia do texto do tratado e a
exposição de motivos do Ministro das Relações Exteriores.
O Presidente da Câmara dos Deputados faz uma primeira leitura em plenário e encaminha a mensagem à
Comissão de Relações Exteriores, que irá analisar os aspectos materiais do tratado, tais como o mérito e se há
vícios de consentimento. Elabora um Projeto de Decreto Legislativo, encaminhando-o, posteriormente, à
Comissão de Constituição e Justiça e Redação - CCJ da Câmara, que analisará os aspectos relativos à sua
constitucionalidade, legalidade, juridicidade, regimentabilidade e técnica legislativa.
Se o Presidente da Câmara dos Deputados sentir necessidade de análise do Projeto por outras comissões, de
acordo com a natureza do tratado (ratione materiae), poderá encaminhá-lo para análise antes de submetê-lo
ao plenário da Câmara.
O Projeto é submetido à votação em plenário, em caráter de urgência. Nesta fase é aberta aos membros do
plenário a possibilidade de apresentação de emendas de Plenário. A aprovação se dá em sessão única, por
maioria absoluta de votos, presentes a maioria absoluta do total dos membros da Câmara dos Deputados.
O Projeto de Decreto Legislativo segue, então, para o Senado Federal, que, por maioria de votos, presente a
maioria absoluta de seus membros poderá:
a) rejeitar o projeto, enviando mensagem para o Presidente da República, o qual poderá apresentar nova
proposta;
b) aprová-lo, com emendas, o que gera o retorno do decreto legislativo para a Câmara, caso haja mudança no
mérito, a qual decide em caráter final, para que seja promulgado pelo Presidente do Senado Federal;
c) aprovar o Projeto de Decreto Legislativo sem emendas, com promulgação pelo Presidente do Senado
Federal.
O Decreto Legislativo é numerado pela Secretaria-Geral da Mesa do Senado e publicado na Seção I do
Diário Oficial da União e na Seção II do Diário do Congresso Nacional. Somente após ter o Congresso
aprovado o ato é que o governo fica autorizado a ratificá-lo, seguindo-se a troca ou depósito de tais
instrumentos.
O Decreto Legislativo é submetido à ratificação pelo Presidente da República, que tem liberdade de ratificálo ou não, em momento que julgar oportuno, por Decreto, submetendo-o à publicação no Diário Oficial da
União, bem como a uma segunda publicação, no Diário do Congresso Nacional.
Segundo entendimento do STF, a Constituição de 1988 permite que a execução dos tratados internacionais e
a sua incorporação à ordem jurídica interna decorra da conjugação de duas vontades homogêneas: a do
Congresso Nacional, mediante decreto legislativo, e do Presidente da República, enquanto Chefe de Estado,
mediante decreto, enfatizando que o decreto presidencial, que sucede a aprovação congressual do ato
internacional, e a troca (ou depósito) dos respectivos instrumentos de ratificação revelam-se, como momento
culminante do processo de incorporação desse ato internacional ao sistema jurídico doméstico, manifestações
essenciais e insuprimíveis. A aprovação congressual e a promulgação presidencial atuam, nessa condição,
como pressupostos indispensáveis da própria aplicabilidade, no plano normativo interno, da convenção
internacional celebrada pelo Brasil.
Decretos promulgatórios de tratados internacionais costumam determinar a própria vigência na data da sua
publicação. Quando silentes, fazem operar a norma da Lei de Introdução ao Código Civil, que, no caput de
seu artigo 1 .o, difere em 45 dias essa vigência. Num e noutro caso, é também este o ponto cronológico em
que começa a vigorar no plano interno o tratado, sempre que sua vigência internacional já seja fato
consumado.
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negociação → assinatura → ratificação → promulgação → publicação
Os tratados solenes podem, ainda, ser celebrados através de adesão, quando não há negociação. O Presidente
envia mensagem ao Congresso, solicitando autorização para adesão. Dada a autorização, assina a adesão e a
publica, depositando o instrumento de adesão na Secretaria do Estado responsável pelo registro.
autorização parlamentar → assinatura → publicação
b) Acordos Simples e Abreviados
Diferentemente do que ocorre nos tratados solenes, os acordos simples e abreviados contam apenas com as
fases de negociação, assinatura ou troca de notas e publicação, esta última ocorrendo na Seção do Ministério
das Relações Exteriores. Fase de assinatura ou troca de notas. Publicação no Diário Oficial da União, na
Seção do Ministério das Relações Exteriores. Não são publicados na forma de decreto ou decreto legislativo.
Exemplo:Modus Vivendi.
ACORDOS COMPLEMENTARES
Se o acordo complementar alterar cláusula do acordo internacional básico, se implicar ônus ao Tesouro
Nacional e se implicar modificação do ordenamento jurídico interno, será submetidos à aprovação do
Congresso. Exemplo: Empréstimos feitos à União, Distrito Federal, Estados-membros, Municípios,
Territórios (e também a entidades da Administração Indireta ou Descentralizada, como a UFMG) devem ser
aprovados pelo Senado Federal.
EMENDAS E RESERVAS
O artigo 39 da Convenção de Viena apresenta a regra geral relativa à emenda dos tratados, afirmando que um
tratado poderá ser emendado por acordo entre as partes. O mesmo instrumento jurídico define reserva como
significando “uma declaração unilateral, feita por um Estado, seja qual for o seu teor ou denominação, ao
assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o
efeito jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado”.
No tocante à doutrina brasileira, há três posições sobre a possibilidade de apresentação de emendas e
reservas quando da aprovação dos tratados:
Beviláquia e Trindade entendem que o Congresso deve aprovar in toto ou rejeitar in toto os acordos
internacionais.
Para Carlos Maximiliano, é possível a apresentação de emendas ou reservas, desde que as demais partes
contratantes as aceitem. Mello e Marotta Rangel afirmam ser de suma importância a distinção entre emenda
(revisão ou reforma de determinada cláusula do tratado) e reserva (suspensão da aplicação de determinada
cláusula). Mello, citando Pontes de Miranda, crê ser possível a aprovação do tratado com reserva, mas não
com emendas. Se fosse possível apresentar emendas, o Congresso estaria indiretamente participando da
elaboração do instrumento jurídico, que é de competência exclusiva do Poder Executivo. Já no que diz
respeito às reservas, tais seriam possíveis por serem um ato do Poder Executivo.
Marotta Rangel, como Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores, entende não haver
possibilidade de aprovação do tratado com reservas. Quanto às emendas, deve-se analisar caso a caso. Há
três possibilidades de emendas aos tratados internacionais: nos tratados bilaterais, se a outra parte aceitar a
emenda; nos tratados multilaterais, se as demais partes aceitarem a emenda; num tratado multilateral, mesmo
que não haja aquiescência de todas as partes contratantes, se no tratado houver cláusula específica sobre
emendas. Tal entendimento é o que vem prevalecendo ultimamente no Ministério das Relações Exteriores.
O Congresso Nacional, julga-se competente para efetuar as alterações que julgar necessárias para a
aprovação do texto do tratado internacional. CON n. 007 (31.08.1994) “(...)o Congresso Nacional, no
exercício de seu poder dever expresso no artigo 49, inciso I, da Constituição Federal, poderá aprovar, ainda
que parcialmente, tratado, acordo, convenção ou qualquer outro compromisso internacional, sobre o qual
deva se pronunciar.”
Uma vez efetuadas, as reservas passam a vigorar entre o Estado reservante e o Estado aceitante, de acordo
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com o que dispõem as modificações previstas em seu texto. Isto não significa que a relação dos outros
Estados entre si, que não formularam reservas ao texto do tratado, serão afetadas em decorrência deste fato.
Por outro lado, se um Estado faz objeção a uma reserva feita pelo outro, mas não se opõe à entrada em vigor
do tratado entre ambos (Estado objetante e Estado autor da reserva), somente as disposições a que se refere a
reserva é que não se aplicarão entre os dois, observando-se normalmente o restante do tratado que não foi
objeto de reservas. E mais, da mesma forma que o Estado autor da reserva, aceita pelos demais Estados, fica
desonerado em relação ao cumprimento das obrigações ressalvadas, é natural que as outras partes
contratantes, em homenagem ao principio da reciprocidade, também possam invocar a reserva (feita pelo
outro Estado) em seu favor, nas relações com referido Estado.
TRÂMITES INTERNACIONAIS
REGISTRO → DEPÓSITO → ADESÃO
Registro: surgiu com o Pacto da Sociedade das Nações, no procurar abolir a chamada diplomacia secreta,
dando publicidade aos acordos para toda a Sociedade Internacional e, desta forma, dando contornos escritos
ao Direito Internacional, afastando-o do conceito de mero direito costumeiro. Deve ser feito o registro do
tratado perante o Secretário-geral da ONU, que emite Certificado de Registro. Somente poderão ser
invocados como prova na Corte Internacional de Justiça —CIJ os tratados registrados na ONU. É o que
afirma o artigo 102 da Carta da ONU:
Carta das Nações Unidas Artigo 102.
1. Todo tratado e todo acordo internacional, concluídos por qualquer membro das Nações Unidas depois da
entrada em vigor da presente Carta, deverão, dentro do mais breve prazo possível, ser registrados e
publicados pelo Secretariado.
2. Nenhuma parte em qualquer tratado ou acordo internacional que não tenha sido registrado em
conformidade com as disposições do parágrafo primeiro deste artigo, poderá invocar tal tratado ou acordo
perante qualquer órgão das Nações Unidas.
Depósito: é feito no local onde foi realizada a conferência/congresso quando o Tratado é multilateral. Cada
uma das partes deposita uma ratificação na secretaria de Estado do estado no qual foi celebrado o ato. De
cada entrega, lavra-se uma ata com cópia para todas as partes signatárias. O Tratado somente será válido para
o DIP, após a troca ou depósito dos instrumentos de ratificação, entre as partes signatárias.
Adesão: Se o Estado não participou das negociações do tratado, nem tampouco o assinou, mas mesmo assim
deseja dele se tornar parte, poderá fazê-lo por meio da chamada adesão ou aceitação, se as partes originárias
do acordo houverem previsto essa possibilidade. A adesão consiste na manifestação unilateral de vontade do
Estado que exprime ex post facto o seu propósito em se tornar parte de determinado tratado que não
negociou nem assinou, ou se o assinou não o ratificou por qualquer circunstância. Os motivos que levam um
Estado a aderir a certo tratado são vários, interesse em ser parte de um ato internacional de cujas negociações
não participou; arrependimento de não ter assinado o tratado no momento oportuno; perda do prazo para a
sua ratificação etc. A natureza jurídica da adesão é idêntica à da ratificação, conota a vontade firme e
consistente do Estado de se engajar no compromisso internacional em causa. A mesma prática também se
aplica às organizações internacionais.
A adesão ou aceitação só tem lugar nos acordos multilaterais. Não se pode vislumbrar a sua existência nos
pactos bilaterais, que são naturalmente fechados às duas únicas partes que deles são signatárias. Mas poderia
se objetar existirem acordos “bilaterais” abertos à adesão futura de terceiros Estados. Neste caso, não se está
diante de um tratado propriamente bilateral, como à primeira vista aparenta ser.
Não é necessário se encontrar em vigor o tratado para que possa o Estado a ele aderir. A prática internacional
tem admitido a adesão naqueles casos em que se aguarda certo quorum de ratificações para a entrada em
vigor de um tratado. Esse quorum tem sido atingido pelas ratificações dos Estados e também pelas adesões
daqueles que de suas negociações não participaram, mas dele desejam se tornar partes.
Questão interessante é a de saber se é necessária a ratificação naqueles tratados firmados por adesão, uma
vez que aquela se apresenta, aparentemente, como desnecessária. Foi no período da Sociedade das Nações
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que a prática da adesão sujeita à ratificação teve o seu maior desenvolvimento. A doutrina, de um modo
geral, tem declarado que a ratificação é estranha à adesão. A mesma resposta, entretanto, não se encontra na
prática internacional, que tem consagrado a possibilidade de ratificação na adesão, talvez por reconhecer que
o Executivo muitas vezes não aguarda o referendum do Poder Legislativo e se apressa em aderir ao texto do
tratado anteriormente firmado por outros Estados.
A mesma orientação tem sido adotada pela Comissão de Direito Internacional (CDI) da ONU, que considera
a adesão sujeita à ratificação como “anômala”, mas freqüente. O Brasil, por sua vez, tem seguido os dois
processos de adesão: a) ora dá-se a adesão definitiva, autorizado o Executivo pelo Congresso Nacional; b)
ora faz-se a adesão ad referendum, subordinando-a à posterior manifestação do Poder Legislativo. Assim, a
conclusão que se chega é que a ratificação não tem sido estranha à adesão, sem embargo de constituir um
fato “anômalo” e bastante condenado pela doutrina internacionalista em geral.
Nem todos os tratados internacionais permitem a adesão ou a aceitação. Somente quando se cuida dos
chamados tratados abertos é que isto será possível. A adesão ou a aceitação do tratado por parte de
determinado Estado (ou organização internacional) que não participou de sua elaboração, somente será
possível quando o próprio texto do tratado, expressa ou tacitamente, assim o permitir. A adesão vem
regulada pelo art. 15 da Convenção de Viena de 1969, nos seguintes termos: “O consentimento de um Estado
em obrigar-se por um tratado manifesta-se pela adesão: quando esse tratado disponha que tal consentimento
pode ser manifestado, por esse Estado, pela adesão; quando, por outra forma, se estabeleça que os Estados
negociadores acordaram em que tal consentimento pode ser manifestado, por esse Estado, pela adesão; ou
quando todas as partes acordarem posteriormente em que tal consentimento pode ser manifestado, por esse
Estado, pela adesão.”
É condição fundamental para o Estado aderir ou aceitar o tratado com a autorização do Congresso Nacional,
tal como ocorre com o tratado assinado, que somente pode ser ratificado depois de aprovado pelo
Parlamento. Se o Presidente da República necessita da autorização do Congresso para ratificar um tratado,
parece evidente que também necessitará da mesma aprovação congressual caso deseje a ele aderir. Portanto,
o mesmo procedimento interno utilizado para aprovação de um tratado assinado, vale para a adesão ou
aceitação. O Congresso Nacional, neste caso, quando permite a adesão ao tratado, não age ad referendum,
como quando aprova um acordo internacional anteriormente assinado pelo Chefe do Executivo e permite sua
ratificação por este mesmo órgão, mas concede tecnicamente uma “autorização”, que é sempre prëvia a
qualquer manifestação de vontade do Poder Executivo. Nada impede, porém, que a adesão ao tratado seja
anterior à manifestação congressual e seja manifestada sob reserva de ratificação, quando então o Parlamento
voltará a decidir ad referendum. A prática brasileira tem seguido os dois processos: ora adere definitivamente
ao tratado, com autorização prévia do Congresso Nacional ao Poder Executivo; ora adere ad referendum,
subordinando a adesão à futura aceitação.
Depois de autorizada pelo Congresso deve o Presidente da República, tal como na ratificação, proceder ao
depósito da carta ou instrumento de adesão no organismo depositário ou no Estado designado para esse
encargo. O depositário dará então conhecimento às demais partes no acordo da adesão ali efetivada. A única
diferença da ratificação que aqui se apresenta diz respeito à impossibilidade de troca dos instrumentos de
adesão, uma vez que a troca se dá nos acordos bilaterais, os quais, são infensos à adesão, por serem
tratadosfechados. Assim, em se tratando de adesão nenhuma carta ou instrumento se troca, mas sim se
deposita na organização ou Estado designados depositários. Uma vez depositado o instrumento de adesão,
deve o Chefe do Executivo expedir decreto de promulgação com ordem de publicação do texto no Diário
Oficial da União.
No Brasil, o Presidente da República envia para o Congresso uma Mensagem, sendo elaborado um decreto
legislativo de aprovação do tratado, que é enviado ao Presidente para promulgação, ou seja, as normas
contidas em tratados internacionais não se tornam eficazes, na ordem jurídica interna, por força de uma
cláusula geral de recepção automática; pelo contrário, para que irradiem efeitos em foro doméstico, é mister
que sejam ratificadas pelo Congresso Nacional, por meio de uma lei em sentido material, lei sem sanção e
sem veto, que tem o nome de Decreto Legislativo. A vontade do Estado brasileiro relativamente a atos
internacionais, inclusive tratados e convenções, surge de um ato complexo em que se integram a vontade do
Presidente da República, que os celebra, e a do Congresso Nacional, que os ratifica.
O tratado somente será válido, para o Direito Internacional, após a troca ou depósito dos instrumentos de
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ratificação. A troca ocorre quando o tratado é bilateral e o depósito, feito no local onde foi realizada a
conferência/congresso quando o tratado é multilateral. Nesse caso, cada um dos Estados contratantes, em
lugar de trocar suas ratificações com todas as partes interessadas, deposita uma ratificação na secretaria de
Estado do país em que foi celebrada a conferência. Da entrega de cada uma das ratificações deve ser lavrada
ata, da qual se envia, por via diplomática, uma cópia autorizada a todas as potências signatárias. Para efeito
de direito brasileiro, o tratado somente será válido quando promulgado o decreto a ele referente e publicado
no Diário Oficial da União, juntamente com o decreto legislativo de sua aprovação no Congresso Nacional.
Princípio ou Direito de Reserva: é uma declaração unilateral, qualquer que seja sua redação ou
denominação feita por um Estado ao assinar ratificar(aprovar), aceitar,(aderir) com o objetivo de excluir ou
modificar os efeitos jurídicos de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado. Condições
para a validade da reserva:
Condição de Forma: Deve ser apresentada por escrito pelo Poder competente dentro do Estado para o trato
dos assuntos internacionais, isto é pelo Poder Executivo. O Poder Legislativo não pode apresentar reservas
no plano internacional.
Condição de Fundo ou regra do consentimento unânime: é a aceitação da reserva pelos outros contratantes.
NORMAS CONTRADITÓRIAS ENTRE DOIS TRATADOS
Se forem as mesmas partes contratantes, prevalece o tratado posterior. Prevalecem as normas do tratado
anterior que não confiitem com o posterior. Se forem outras partes, prevalece o tratado internacional
posterior naquilo que não for contrário ao anterior.
SISTEMAS DE REDAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS
Common Law - são redigidos de modo bastante detalhado, contendo todos os elementos e hipóteses que
podem se aplicar. A norma é fechada (self regulatory).
Civil Law (Sistema Romano Germânico) - o tratado tem um conjunto de ordenamento jurídico que serve
de “moldura” na qual se colocam as noções jurídicas básicas.
EXECUÇÃO DOS TRATADOS
Para os doutrinadores, a execução de um tratado é questão de boa-fé. Presume-se que as partes contratantes
tenham interesse e vontade de celebrar o tratado.
No Direito Internacional, só teríamos um instituto específico agarantir a execução de um tratado
internacional - a ação de responsabilidade internacional, que sujeita o Estado a julgamento por tribunal
internacional, podendo o Estado que descumprir o tratado ser condenado a pagar indenização ou sofrer outra
sanção.
Temos, ainda:
Garantia (propriamente dita): inserem-se garantias no tratado, que podem ser procedimentos técnicos ou a
criação de um regime qualquer, jurídico ou institucional. São comuns as garantias financeiras.
Cessão de parcela do território estatal: no Tratado de Frankfurt, de 1871, por exemplo, foi entregue uma
parcela de território francês à Alemanha, como garantia de indenização pelas guerras napoleônicas (Alsácia e
Lorena) ou ainda o previsto nos artigos 428 a 432 do Tratado de Versalhes. Esse tipo de garantia, todavia,
não é mais usado, pois tal cessão causaria diversos conflitos internacionais, inclusive sendo considerada uma
das causas das duas guerras mundiais.
Entrega de renda do Estado: ocorre quando há Estado-credor e Estado-devedor. Pelo Protocolo Final de
Londres (16.08.1924), a Alemanha empenhou como garantia para o pagamento das reparações da Primeira
Guerra Mundial, as rendas de aduanas e impostos sobre álcool, tabaco, cerveja e açúcar, ficando a cargo de
um Comissário, designado pela Comissão de Reparações da Liga das Nações, a sua inspeçao. Célebre em tal
desiderato foram os EUA, que, por exemplo, exigiram, em troca de ajuda na independência do Haiti, o
direito de receber taxas alfandegárias e em troca da construção do Canal do Panamá ficaram com as rendas
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da travessia por 100 anos.
Fiscalização por organisnos internacionais: como no caso das Comissões de Inspeção do Tratado de
Versalhes (art. 203 e seguintes) ou dos empréstimos dados pelo Fundo Monetário Internacional - FMI ao
Brasil, tendo como pressuposto a elaboração e cumprimento de uma Carta de Intenções.
Se, apesar dessa garantias, o Estado não cumprir o pactuado, há garantias a posteriori:
Protesto diplomático;
Sanções econômicas e financeiras: como as aplicadas quando o Brasil decretou unilateralmente moratória. O
Banco Mundial e o FMI implantaram, a posteriori, inúmeras sanções, que levaram o Brasil a ter substancial
diminuição de investimentos externos, que só retornaram ao país com a revogação de tal ato.
EXTINÇÃO DOS TRATADOS
A extinção do tratado verifica-se quando as partes contratantes não se encontram mais por ele obrigada.
Resulta via de regra, da apliçação de suas próprias disposições. Boa parte deles contém um “prazo de
duração” (termo), uma condição resolutória, ou celebram-se com cláusula de denúncia ou por um “prazo
renovável”. Estas são as chamadas causas intrinsecas de extinção dos tratados. Há ainda as causas
extrínsecas, que não se encontravam previstas no texto do tratado, nem resultaram, expressa ou
implicitamente, de dissenso subseqüente de uma das partes, sendo sim conseqüência da aplicação de regras
objetivas de Direito Internacional, como o direito implícito de denúncia, a mudança fundamental nas
circunstâncias e a violação do tratado.
A extinção de um tratado não pode ser confundida com sua revisão, pois enquanto aquela pressupõe o fim de
um tratado, esta sugere apenas sua modificação ou emenda, continuando o tratado em vigor, mesmo que não
tenha o consentimento de todas as partes contratantes.
A extinção de um tratado exime as partes contratantes do dever de continuar executando as obrigações dele
resultantes a partir da data de sua extinção, não afetando os direitos criados pela sua execução antes que se
extinga, podendo ocorrer nos seguintes casos:
a) Execução integral do tratado.
b) Consentimento mútuo: pode se dar a qualquer momento, após consulta aos outros Estados contratantes.
c) Termo: cláusula do tratado que estabelece que ele estará em vigor por um prazo predeterminado. Quando
chegar o termo, o tratado se extingue ou, desde que haja expressa previsão, poderá ser prorrogado.
d) Condição resolutória: exprime-se na forma de certo fato que se realiza ou não Quando se realiza o fato,
extingue-se o tratado o esgotamento operacional é, no caso, a condição resolutória.
e) Redução do número de partes a um número inferior ao necessário à entrada em vigor de um
tratado unilateral. A Convenção de Viena, para entrar em vigor, exigiu um mínimo de 35 partes
contratantes, caso, em algum momento, o número seja inferior a 35, ela estará automaticamente revogada.
f) Denúncia: trata-se do ato unilateral, pelo qual o Estado manifesta a sua vontade de deixar de ser parte num
acordo internacional. Só é válida nos tratados temporários se houver cláusula a respeito. Nos tratados
permanentes/perpétuos a denúncia só é valida se expressamente prevista em determinada cláusula e, mesmo
assim, é condicionada a um lapso de tempo entre a manifestação de vontade do Estado denunciante e o
rompimento efetivo do vínculo jurídico decorrente de sua condição de parte no tratado, o chamado pré-aviso.
A denúncia por uma das partes no tratado bilateral extingue o acordo, ao passo que, nos tratados multilaterais
os termos do pactuado deixam de surtir efeito tão-somente para o Estado que o denuncia, continuando a
vigorar para as outras partes não sendo o tratado não-mutalizável.
g) Ab-rogação por outro tratado: considera-se extinto um tratado quando todas as suas partes concluírem
um tratado posterior sobre o mesmo assunto.
h) Teoria da imprevisão - cláusula rebus sic stantibus: um acordo internacional seria extinto pela
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impossibilidade do cumprimento do pactuado, por extinção definitiva de seu objeto ou por alterações
circunstanciais capazes de importar a extinção de um tratado ou, alternativamente, sua suspensão ou reforma,
compreendendo eventos que a doutrina reputa estranhos à teoria da cláusula, quais o desaparecimento de
uma das soberanias pactuantes, a absoluta impossibilidade da execução, ou a força maior, que não é mais que
um obstáculo momentâneo à execução do tratado, incapaz de colocar em causa, de algum modo, sua
vitalidade. Assim, apenas os casos de impossibilidade superveniente do tratado e de alteração fundamental
das circunstâncias seriam considerados, pela Convenção de Viena, característica da teoria da imprevisão. Tal
cláusula não será aplicada nos casos de tratados sobre fronteiras e se a mudança resulta de uma violação de
uma obrigação nascida do tratado ou de outra obrigação internacional com respeito a qualquer outra parte
contratante. Além do mais, o Estado que a alega não pode ter dado causa à extinção do objeto.
Antes de seu reconhecimento pela Convenção de Viena esta cláusula nunca havia sido aceita e aplicada pela
Corte Internacional de Justiça, nem por tribunais arbitrais. Mesmo após a sua aceitação, não se aplica a
figura da condição resolutória implícita nos tratados perpétuos, senão como uma causa extrínseca de
extinção, baseada em uma regra geral de Direito Internacional costumeiro, que requer condições estritas e
bem definidas para a sua admissibilidade e que estabelece garantias de procedimento destinadas a evitar uma
aplicação unilateral deste instituto. Esta causa não funciona automaticamente sob a forma de extinguir um
tratado de maneira instantânea, nem permite a denúncia unilateral de uma das partes. Unicamente confere o
direito a reclamar a extinção do tratado a algum órgão ou corpo com competência para determinar se as
condições de aplicação da cláusula se acham presentes, não existindo, ao contrário do verificado em caso de
violação de um jus cogens, uma jurisdição obrigatória. A cláusula só é aplicável em forma excepcional e
desde que a parte que a invoca tenha provas do cumprimento de todas as condições requeridas, quais sejam:
caráter fundamental da mudança: seu efeito está diretamente relacionado com o objeto e fim do tratado,
destruindo ou transformando radicalmente sua razão de ser, transformando radicalmente o alcance das
obrigações ainda por se cumprir;
imprevisão da mudança: não sendo considerados para este efeito o desequilíbrio ou as perturbações na
economia de um Estado que prevejam, para este caso, métodos e procedimentos para remediar tal situação;
base essencial do consentimento: circunstâncias que existiam à época da celebração do tratado e cuja
subsistência foi assumida pelas partes como essencial para a continuidade do pactuado, de tal modo que na
ausência de tais circunstâncias o tratado seria extinto.
A partir da assinatura dos Tratados de Viena e de Paris, de 1815, apesar da não-participação Suíça na sua
negociação, estabeleceu-se a Zona Franca de Gex, criando uma Zona Franca no Cantão de Genebra.
Unilateralmente, quando da celebração do Tratado de Versalhes, ao final da Primeira Guerra Mundial, a
França, com o consentimento dos demais Estados signatários dos Tratados de Viena e de Paris, suprimiu as
barreiras entre os dois países, querendo cobrar impostos franceses sobre os produtos de Genebra, alegando
não só que a Suíça, por ser terceiro Estado em ambos os tratados, não deveria assentir com a sua revogação,
mas também que aí estava configurada a cláusula rebus sic stantibus. A CIJ, então Corte Permanente de
Justiça Internacional — CPJI, analisou que ali não havia rebus sic stantibus e admitiu que as estipulações
em favor de Estados terceiros podiam conferir direitos definitivos e irrevogáveis e, desta forma, a França não
poderia declarar extinta a zona franca.
i) Ruptura de relações diplomáticas ou consulares: extingue os tratados na medida em que a existência de
relações diplomáticas ou consulares seja indispensável à aplicação dos tratados.
j) Guerra: derroga os tratados existentes entre os Estados beligerantes (como os tratados de extradição),
salvo os tratados ou algumas de suas disposições referentes precisamente ao caso de guerra e os tratados
celebrados simultaneamente com outros Estados.
l) Superveniência de um jus cogens: norma imperativa de Direito Internacional geral que não admite a
derrogação por tratado. Oo artigo 64 da Convenção de Viena dispõe que, se surge uma nova norma
imperativa de Direito Internacional geral, todo o tratado existente que esteja em oposição a essa norma será
nulo e cessará a sua vigência.
OS TRATADOS NO DIREITO BRASILEIRO
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Há três instrumentos constitucionais a respeito do assunto:
Artigo 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I- resolver definitivamente sobre tratados,
acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
Artigo 52. Compete privativamente ao Senado Federal: IV - aprovar previamente, por voto secreto, após
argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente; V - autorizar
operações extremas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito federal, dos
Territórios e dos Municípios; VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito
externo e interno da União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais
entidades controladas pelo Poder Público federal; VIII - dispor sobre limites e condições para a concessão de
garantia da União em operações de crédito externo e interno;
Artigo 84. Compete privativamente ao Presidente da República: VIII - celebrar tratados, convenções e atos
internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
O CONFLITO ENTRE TRATADO E NORMA DE DIREITO INTERNO
A Constituição brasileira de 1988, em nenhum de seus dispositivos, estatuiu de forma clara qual a posição
hierárquica dos tratados comuns perante o Direito interno. Deixou esta incumbência para a opinião da
doutrina e da jurisprudência pátrias, levando a estas um problema que competia ao legislador constituinte
evitar.
Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se,
no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se
posicionam as leis ordinárias, havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional
público, mera relação de paridade normativa.
No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas
de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras
infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de antinomia com o
ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico
(‘lex posterior derogat priori’) ou, quando cabível, do critério da especialidade.
O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda,
inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados
internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre
prevalecer sobre os atos de direito internacional público.
Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil, ou aos quais o Brasil venha a aderir, não podem, em
conseqüência, versar matéria posta sob reserva constitucional de lei complementar. Em tal situação, a própria
Carta Política subordina o tratamento legislativo de determinado tema ao exclusivo domínio normativo da lei
complementar, que não pode ser substituída por qualquer outra espécie normativa infraconstitucional,
inclusive pelos atos internacionais já incorporados ao direito positivo interno.
O exame da constitucionalidade de uma lei não deve ter sua compatibilidade cingida apenas às normas
constitucionais, mas também aos compromissos assumidos pelo Estado na esfera internacional, por meio dos
tratados por ele firmados.
O problema da concorrência entre tratados internacionais e leis internas de estatura infraconstitucional, pode
ser resolvido, em princípio, de duas maneiras.
Numa, dando prevalência aos tratados sobre o direito interno infraconstitucional, garantindo ao compromisso
internacional plena vigência, sem embargo de leis posteriores que o contradigam.
Noutra, tais problemas são resolvidos garantindo-se aos tratados apenas tratamento paritário, tomando como
paradigma leis nacionais e outros diplomas de grau equivalente, ou seja, havendo conflito entre tratado e lei
interna a solução é encontrada aplicando-se o critério da lex posterior derogat priori. Desde 1977 vigora na
jurisprudência do STF este último sistema, onde o tratado, uma vez formalizado, passa a ter força de lei
ordinária, podendo, por isso, revogar as disposições em contrário, ou ser revogado (perder eficácia) diante de
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lei posterior. Em outras palavras, tratando-se de instrumentos internacionais comuns (à exceção dos tratados
de direitos humanos), a jurisprudência do STF entende ser possível a superação de um tratado em virtude da
edição de lei posterior. O chamado treaty override, revogação do tratado (expressa ou tacitamente) pela lei
posterior incompatível que ainda hoje encontra amparo na atual jurisprudência da Suprema Corte.
Sem embargo da referida omissão constitucional, relativamente ao problema do conflito entre tratados
internacionais e leis internas, a jurisprudência brasileira, durante algumas décadas, mostrou-se firme na
consagração da primazia do Direito Internacional sobre o Direito interno, posicionamento que somente veio
a ser modificado apartir de 1977, no julgamento do Recurso Extraordinário 80.004, onde ficou assentado
que, ante o conflito entre tratado internacional e lei interna, deveria prevalecer a mais recente das normas,
aplicando-se a regra lex posterior derogat prio ri.
Deixando de lado antigos precedentes de que leis internas não podem revogar tratados anteriormente
concluídos, o STF preferiu ater-se à noção de que não há prevalência hierárquica entre tratados
internacionais e leis internas, e sendo assim, um compromisso internacional pode ver-se revogado, sem
maiores conseqüências no plano do Direito interno, por legislação ordinária posterior. Não se ateve o
Tribunal ao fato de que os tratados internacionais têm sua forma própria de revogação, que é a denúncia,
nem mesmo de que o descumprimento interno de um compromisso assumido externamente acarreta a
responsabilidade internacional do Estado, além de outras graves conseqüências no plano político
internacional.
Quando a Constituição diz, no parágrafo único do seu art. 1º, que “todo o poder emana do povo, que o exerce
por meio de representantes eleitos ou diretamente”, está ela querendo atribuir ao povo brasileiro a jurisdição
originária e ao governo a jurisdição derivada em matéria de poder. Quando o Chefe do Poder Executivo
compromete a Nação no cenário internacional o faz com o poder que recebeu do povo, não havendo que se
falar que esse mesmo povo compromete-se, por meio do governo, tão-somente na ordem internacional e não
na ordem interna.
O posicionamento do STF no julgamento do Recurso Extraordinário n0 80.004, foi a de que dentro do
sistema jurídico brasileiro, onde tratados e convenções guardam estrita relação de paridade normativa com as
leis ordinárias editadas pelo Estado, a normatividade dos tratados internacionais, permite, no que concerne à
hierarquia das fontes, situá-los no mesmo plano e no mesmo grau de eficácia em que se posicionam as leis
internas.
Entendeu o STF que a Constituição brasileira da época, ao tratar de sua exclusiva competência, teria
colocado os tratados internacionais ratificados pelo Brasil no mesmo plano hierárquico das normas
infraconstitucionais, o que reflete a concepção monista moderada.
Trazendo o raciocínio para o texto constitucional atual, poderia se entender que quando a Carta de 1988 diz
competir ao STF julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância,
“quando a decisão recorrida declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal”, estaria ela igualando
(em mesmo grau hierárquico) os dois diplomas legalmente vigentes. Desta feita, em caso de conflito entre a
norma internacional e a lei interna, aplicar-se-ia o princípio geral relativo às normas de idêntico valor, isto é,
o critério cronológico, onde a norma mais recente revoga a anterior que com ela conflita. Desta forma,
qualquer tratado internacional, ratificado pelo Brasil e devidamente promulgado, passaria a fazer parte do
Direito interno com status de lei ordinária federal.
A indiscutível supremacia da ordem constitucional brasileira sobre os tratados internacionais, além de
traduzir um imperativo que decorre da própria Constituição (art. 102,III, b), reflete o sistema que, com
algumas poucas exceções, tem prevalecido no plano do direito comparado, que considera inválida a
convenção internacional que se oponha, ou que restrinja o conteúdo eficacial, ou ainda, que importe em
alteração da Lei fundamental.
A doutrina da Excelsa Corte, nesse ponto, peca pela imprecisão. Admitir que um compromisso internacional
perca vigência em virtude da edição de lei posterior que com ele conflite é permitir que um tratado possa,
unilateralmente, ser revogado por um dos seus Estados-partes. Seria fácil burlar todo o pactuado
internacionalmente se por disposições legislativas internas fosse possível modificar tais normas.
Quando um Estado assume um compromisso internacional, quem se compromete juridicamente é toda a
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Nação, toda a comunidade que integra o Estado, aí compreendidas sua população e suas autoridades (poder
estatal) assentas em seu território. Apenas por razões de ordem prática é que, tanto a população como as
autoridades estatais não atuam em conjunto, e a representação exterior do Estado recai primordialmente
sobre o Chefe do Poder Executivo, pois compete privativamente ao Presidente da República o poder de
declarar internacionalmente a vontade do Estado, e ao Poder Legislativo resolver definitivamente sobre
tratados aprovando-os ou não, segundo o que julgar mais adequado, antes da ratificação do acordo ou do
depósito dos instrumentos de ratificação no órgão competente. Assim, quando o Presidente da República
ratifica um tratado, não o faz de maneira pessoal, mas sim em nome do Estado de que é titular; quem atua, ou
seja, quem tem titularidade para comprometer a Nação no cenário internacional é o Chefe do Poder
Executivo, mas juridicamente quem está ali não é o Presidente da República, mas o Estado Brasileiro por ele
(Presidente) representado.
O objetivo de um tratado internacional é o de justamente incidir sobre situações que deverão ser observadas
no plano do ordenamento juridico interno dos Estados signatários. Aprovando um tratado internacional, o
Poder Legislativo se compromete implicitamente a não editar leis a ele contrárias.
Mirtô Fraga exemplifica: “Se o Brasil, firmou convenção com Portugal, obrigando-se a reconhecer a
portugueses, aqui residentes, os mesmos direitos do nacional, a não-edição do regulamento, por si só, já
constituiria um ilícito internacional, que teria maior gravidade se, posteriormente ao convencionado, se
editasse norma jurídica excluindo os portugueses, beneficiários da igualdade, do direito”. “É um contrasenso afirmar-se que o Tribunal deve aplicar a lei posterior contrária ao tratado e admitir-se, ao mesmo
tempo, a responsabilidade do Estado. Este é livre para contratar ou deixar de contratar. A manifestação
obrigatória do Poder Legislativo sobre os tratados assinados pelo Chefe de Estado surgiu, justamente, como
resultado da democratização do poder. Na época atual, admitir-se possa o Legislativo, por lei, contrariar o
tratado, que aprovou, é, em suma, reconhecer o predomínio das Assembléias, em franca oposição a
dispositivo constitucional que declara harmônicos e independentes os Poderes do Estado, se não há, para
tanto, expressa autorização da Lei Maior”.
Aprovado o tratado pelo Congresso, e sendo este ratificado pelo Presidente da República, suas disposições
normativas, com a publicação do texto, passam a ter plena vigência e eficácia internamente. E de tal fato
decorre a vinculação do Estado no que atine à aplicação de suas normas, devendo cada um dos seus Poderes
cumprir a parte que lhes cabe nesse processo: ao Legislativo cabe aprovar as leis necessárias, abstendo-se de
votar as que lhes sejam contrárias; ao Executivo fica a tarefa de bem e fielmente regulamentá-las, fazendo
todo o possível para o cumprimento de sua fiel execução; e ao Judiciário incumbe o papel preponderante de
aplicar os tratados internamente, bem como as leis que o regulamentam, afastando a aplicação de leis
nacionais que lhes sejam contrárias.
Se o Congresso Nacional dá sua aquiescência ao conteúdo do compromisso firmado, é porque
implicitamente reconhece que, se ratificado o acordo, está impedido de editar normas posteriores que o
contradigam. Assume o Congresso, por conseguinte, verdadeira obrigação negativa, qual seja, a de se abster
de legislar em sentido contrário às obrigações assumidas internacionalmente. Admitir, pois, que o
Legislativo possa editar lei, revogando o tratado anteriormente firmado,“é reconhecer o predomínio das
Assembléias, em oposição a comando superior que declara harmônicos e independentes os Poderes do
Estado. E caso tais leis sejam porventura editadas, elas jamais terão força para afastar a aplicação interna do
tratado anteriormente concluído, uma vez que estes últimos têm a sua forma própria de revogação, que é a
denúncia, regida pelas regras próprias do Direito Internacional Público.
Embora possua o Estado jurisdição para dizer o Direito aplicável a determinada situação de fato, deve ele
respeitar os princípios e regras acolhidos pela sociedade internacional, que em relação a ele se sobrepõem,
limitando-lhe o poder de legislar, sob pena de ver-se sujeito a medidas coercitivas que lhe venham a ser
impostas por outros Estados, bem como pela sociedade internacional organizada. O exame da
constitucionalidade das leis, pois, além de levar em conta os dispositivos constitucionais respeitantes ao caso
específico, deve também ater-se aos compromissos internacionalmente assumidos pelo Estado bem como aos
princípios de Direito Internacional geralmente aceitos pela sociedade internacional como um todo.
Por outro lado, admitir que o Estado-juiz possa declarar a revogação de um compromisso internacional, é o
mesmo que admitir que outros entes estatais, que não a figura constitucionalmente prevista do Presidente da
República, possam indiretamente denunciar o compromisso internacionalmente firmado, deixando-o sem
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eficácia e aplicabilidade na ordem jurídica interna. O juiz, ao deixar de aplicar um tratado internacional em
razão da existência de “lei posterior”, está implicitamente criando uma falsa e incongruente hierarquia entre
leis internas e tratados internacionais, que a Constituição expressamente não declara. Também, por este
motivo, está impedido o magistrado de aplicar a lei interna em detrimento do tratado internacional em vigor.
A infração ao dever de respeito aos princípios e normas de Direito Internacional consagrados, por meio dos
poderes do Estado, acarreta sua responsabilidade no plano internacional, que certamente não pode ficar
esquecida ou relegada a segundo plano quando de qualquer julgamento pelo Poder Judiciário envolvendo tais
normas. Vige assim, nesta matéria, a pacta sunt servanda, internacionalmente reconhecida como norteadora
dos compromissos exteriores do Estado, e expressamente estabelecida pelo art. 26 da Convenção de Viena
sobre o Direito dos Tratados de 1969, segundo o qual todo tratado em vigor “obriga as partes e deve ser
cumprido por elas de boa fé”.
Um certo avanço do Supremo Tribunal Federal relativamente ao tema do conflito entre tratados e leis
internas se deu com o entendimentro de ser possível considerar os tratados de direitos humanos como
documentos de caráter supralegal. Os tratados sobre direitos humanos não poderiam afrontar a supremacia da
Constituição, mas teriam lugar especial reservado no ordenamento jurídico. Equipará-los à legislação
ordinária seria subestimar o seu valor especial no contexto do sistema de proteção da pessoa humana.
A inexistência de decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal em controle tanto concentrado quanto
difuso de constitucionalidade mantém a vigência das leis no pais, as quais, contudo, não permanecerão
válidas se incompatíveis com os tratados internacionais (de direitos humanos ou comuns) de que o Brasil é
parte.
Dúvidas poderiam surgir quanto à consideração de serem os tratados comuns instrumentos de nível
supralegal no Brasil. Poderia se objetar não ter a Constituição disciplinado a hierarquia desses tratados em
confronto com as demais leis da República. Para tanto, basta verificar, num estudo comparativo, alguns
dispositivos legais brasileiros, para poder se concluir que o sistema jurídico privilegia a superioridade de
quaisquer tratados na ordem jurídica interna.
O art. 5º do Código Penal Brasileiro, desde 1940 acolhe essa tese, assim estatuindo: “Aplica-se a lei
brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no
território nacional”. Esta orientação da lei penal brasileira, de superioridade dos tratados internacionais em
relação à legislação infraconstitucional, foi seguida e reafirmada em 1941, também pelo Código de Processo
Penal, que deixou assente, no seu art. 1º, inc. I, que o “processo penal reger-se-á, em todo o erritório
brasileiro, por este Código, ressalvados os tratados, as convenções e regras de direito internacional”. Assim o
fazendo, tal disposição quis dar claramente aos tratados internacionais, em matéria processual penal, um
status normativo superior à sua própria hierarquia. Ou seja, se o direito processual penal, no Brasil, rege-se
pelo Código de Processo Penal, ressalvados os tratados, as convenções e regras de Direito Internacional, é
porque tais instrumentos e regras de direito das gentes prevalecem sobre a legislação infraconstitucional, em
relação a tais matérias. Em suma, quiseram tais normas atribuir expressamente aos tratados internacionais
firmados pelo Estado brasileiro um status de supralegalidade, eis que prevalecem sobre as legislações penal e
processual penal ordinárias, respectivamente.
Outro dispositivo na legislação brasileira, a respeito do status supralegal dos tratados comuns, é o art. 7º da
Lei n0 8.078, de 11 de setembro de 1990, Código de Proteção e Defesa do Consumidor, que assim dispõe:
“Os direitos previstos neste Código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais
de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades
administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes
e eqüidade”.
O referido dispositivo separa os tratados internacionais de que o Brasil seja signatário da legislação interna
ordinária, o queexprime a vontade do legislador pátrio em ver os compromissos internacionalmente
assumidos alçados a um grau superior ao da legislação ordinária infraconstitucional. Se a intenção do nosso
legislador fosse a de equiparar os tratados internacionais à legislação interna ordinária, não teria ele,
certamente, feito a distinção que fez. Bastava ter feito referência apenas à legislação ordinária, onde já se
incluiriam os tratados internacionais, se esta fosse a sua vontade. O dispositivo, assim, no que separou os
tratados internacionais da legislação interna ordinária, além de ter deixado claro que os tratados comuns
encontram-se numa posição hierárquica superior a toda legislação infraconstitucional, também reforçou a
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idéia de que os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos têm status de norma constitucional,
isto porque os direitos do consumidor também pertencem ao rol dos direitos humanos fundamentais
consagrados pela Carta brasileira de 1988 (art. 5º inc. XXXII).
O único dispositivo da legislação brasileira que atribui expressamente hierarquia superior aos tratados
internacionais em confronto com as demais normas de Direito interno é o art. 98 do Código Tributário
Nacional.
Nos EUA, os tratados têm hierarquia superior à Constituição dos Estados, mas não com relação à
Constituição norte-americana. Se houver conflito com norma constitucional e, mesmo com outros tipos de
acordos, prevalece a posterior. Em outros Estados, havendo conflito entre o tratado e norma constitucional, o
tratado somente será aplicado se houver reforma constitucional. É o caso da França, da Espanha e de
Portugal, os quais, quando da implementação da União Européia, realizaram reformas constitucionais para se
adaptarem ao Tratado de Maastricht. Nos Países Baixos, se o tratado posterior conflitar com a Constituição,
revoga-se a norma constitucional.
EFEITOS DA INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS NA ORDEM INTERNA
Desde que em vigor no plano internacional, os tratados ratificados pelo Estado, promulgados e publicados,
passam a integrar o arcabouço normativo interno e, conseqüentemente, a produzir efeitos na ordem
doméstica. Tais instrumentos, uma vez insertos no direito brasileiro, passam a obedecer, com pouquíssima
variação, às mesmas regras sobre vigência e eficácia aplicáveis às demais leis do País. O que aqui se
examina, portanto, é o conteúdo material dos tratados internacionais, ou seja, os seus efeitos na ordem
jurídica interna estatal.
O primeiro e mais imediato dos efeitos gerados por um tratado na ordem jurídica interna é o de revogar todas
as disposições em contrário ou incompatíveis da legislação infraconstitucional (aí compreendidas, à exceção
das emendas constitucionais, todas as demais espécies normativas que compõem o arcabouço normativo
nacional). Tudo quanto está abaixo da Constituição os tratados comuns (e não os que dispõem sobre direitos
humanos, que têm índole e nível constitucionais) revogam ou modificam, se com eles incompatível ou
expressamente em contrário. Havendo incompatibilidade entre as disposições convencionais e as normas de
Direito interno, uma vez que aquelas obedecem, em regra, aos mesmos parâmetros de vigência e eficácia das
disposições legislativas domésticas, resolve-se eventual antinomia sempre em favor do tratado, que é
hierarquicamente superior a qualquer disposição interna infraconstitucional.
A norma revogadora pode ser manifesta (expressa) ou implícita (tácita ou global). Será manifesta quando
expressamente indicar a norma a ser revogada; será implícita, por seu turno, quando a norma posterior for
incompatível com a anterior (tácita) ou quando regula inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior
(global). Essas regras valem para os tratados posteriores da mesma forma que para uma disposição
legislativa interna.
O que não pode ocorrer é o contrário: um tratado ser revogado por lei posterior. Seria um contra-senso
admitir que um compromisso internacional possa ser revogado por legislação ulterior. Seria o mesmo que
permitir que um Estado, uni-lateralmente, pudesse revogar um compromisso internacional, quando se sabe
que para isso é necessário um ato formal de denúncia. Ademais, a tese que pretende permitir a revogação do
tratado por lei interna posterior, parece não levar em conta que o descumprimento de uma obrigação
internacional acarreta a responsabilidade internacional do Estado. A crítica que se faz diz respeito à
indiferença que muitos têm tido com o problema sério da responsabilidade do Estado no âmbito
internacional.
Um outro efeito dos tratados, internamente, é o de autorizar que os particulares reclamem, perante as
instâncias judiciais ordinárias, a satisfação dos direitos neles estabelecidos e o cumprimento das obrigações
deles decorrentes. Isto, entretanto, só será possível caso se verifique, pelo conteúdo do instrumento, que o
meso tem como destinatário certo o cidadão. Um tratado de proteção dos direitos humanos, que, por sua
natureza, cria direito subjetivo ao cidadão, poderá ter o seu fiel cumprimento exigido perante uma instância
judicial interna, ao passo que um tratado dirigido única e exclusivamente ao Poder Executivo, para que
cumpra uma determinada providência ou para que mantenha certo relacionamento com determinado Estado,
certamente não pode ter sua vigência reclamada, judicialmente, por um particular. Só os demais Estados é
que teriam, nesse caso, o direito de reclamar o cumprimento do tratado violado.
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ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS
Atualmente, está ocorrendo uma proliferação de organizações internacionais, em virtude dos Estados se
encontrarem impossibilitados, por razões estruturais e políticas, de realizar seus objetivos em um quadro
determinado.
As poucas definições formais dadas a tais pessoas internacionais são insuficientes para fornecer um conceito
preciso. Assim, deve-se recorrer aos autores de Direito Internacional para se apresentar seu conceito, do qual
se extrai também suas principais características.
Segundo Sereni, organização internacional é a associação voluntária de sujeitos de Direito Internacional,
constituída por um ato internacional e disciplinada nas relações entre as partes por normas de Direito
Internacional, que se realiza em um ente de aspecto estável que possui um ordenamento jurídico interno
próprio e é dotado de órgãos e institutos próprios, por meio dos quais realiza as finalidades comuns de seus
membros, mediante funções particulares e o exercício de poderes que lhe foram conferidos.
Para Abdulah el Erian, esta seria a associação de Estados, estabelecida por tratado, possuindo uma
constituição e órgãos comuns e tendo personalidade legal distinta da dos Estados-membros.
Ricardo Seitenfus a define como uma associação voluntária entre Estados, constituída através de um tratado
que prevê um aparelhamento institucional permanente e uma personalidade jurídica distinta dos Estados que
a compõem, com o objetivo de buscar interesses comuns, através da cooperação entre seus membros.
Características
Associação voluntária de sujeitos de Direito Internacional: em regra, é formada apenas por Estados, mas
já se admite que também seja constituída por outras organizações internacionais, como foi o caso da OMC,
que, criada pelo Protocolo de Marrakesh, em 15.04.1994, teve como uma das partes signatárias a União
Européia.
Instituída por ato internacional: geralmente, esse ato é denominado de tratado ou convenção. Este, além
de não ter prazo de validade, será interpretado pela organização internacional, sendo sua execução feita por
diversos outros atos, tendo tal instrumento jurídico primazia sobre outros tratados e, por fim, importância
superior à de uma Constituição para os Estados, já que um Estado pode existir, teoricamente, mesmo sem
uma Constituição, ao passo que, as organizações internacionais jamais poderão subsistir sem um tratado que
as constitua;
Ordenamento jurídico interno próprio: possui estatuto interno que regula o funcionamento de seus
órgãos;
Personalidade internacional: tal personalidade só passa a vigorar no momento que ela efetivamente entra
em funcionamento (princípio da efetividade).
Órgãos próprios: em geral é constituída por um órgão executivo, geralmente denominado conselho, um
órgão que congrega todos os Estados (assembléia) e um órgão encarregado da parte administrativa
(secretariado);
Existência de poderes próprios: fixados pelos tratados que a instituíram;
Sede própria: estabelecida através de um acordo de sede entre a organização internacional e um Estado
soberano, que faculte a instalação física de seus órgãos em algum ponto de seu território.
Critérios
Segundo o Yearbook of In ternational Organization, além das características supracitadas, uma 01, para se
caracterizar como tal, deve estar de acordo com os seguintes critérios: ter pelo menos três Estados com
direito a voto; ter estrutura formal; os funcion5rios não devem ter a mesma nacionalidade; pelo menos três
Estados devem contribuir substancialmente para a sociedade e ter objetivo internacional.
Espécies
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As organizações internacionais apresentam-se de acordo com a sua natureza e sua composição.
Quanto à sua natureza, podem ser classificadas em políticas e técnicas:
Políticas: tratam de questões conflitivas, agindo preventivamente na manutenção da paz e da segurança
iliternacionais. E o caso da Organização das Nações Unidas — ONU.
Técnicas: sua atuação está relacionada à cooperação técnica em áreas específicas. Por exemplo, a
Organização Internacional do Trabalho - OIT.
Quanto à sua composição, apresentam um alcance universal e um alcance regional:
Alcance universal: estão vocacionadas para acolher o maior número possível de Estados, sem restrições de
índole geográfica, cultural ou econômica. E o caso da ONU.
Alcance regional: constituída por pessoas internacionais identificadas entre si no aspecto geográfico,
cultural ou econômico como a União Européia, oMercosul e a Organização dos Estados Americanos - OEA.
Responsabilidade Internacional
Não existem normas específicas para a responsabilidade internacional das organizações internacionais. Em
muitos casos, elas utilizam as normas existentes para a responsabilidade dos Estados.
As organizações internacionais são passíveis de ação de responsabilidade internacional não só por atos de
seus órgãos competentes através de seus funcionários, mas ainda por atos de particulares realizados em sua
sede.
É ponto pacífico na doutrina que as organizações internacionais, como reclamantes junto a um Estado,
devem cumprir os mesmos requisitos previstos para a efetivação da proteção diplomática por parte dos
Estados, inclusive o esgotamento dos recursos internos, pois quando a organização internacional faz
pagamento de indenização, esta recai sobre todos os seus Estados-membros, uma vez que o montante é
incluído no orçamento, o qual é formado por contribuições dos Estados-membros.
Direitos
Os principais direitos que as organizações internacionais possuem são:
Direito de convenção: concluir acordos internacionais em nome próprio.
Direito de missão ou legação: manter relações com os demais sujeitos de Direito Internacional. Seus
representantes estão amparados por garantias diplomáticas, previstas já no Pacto da Sociedade das Nações.
Cada Estado-membro mantém uma representação ou uma Missão permanente junto às organizações
internacionais. No entanto, é comum que o embaixador do Estado-membro junto àquele país onde se situe
sua sede, responda igualmente pela representação Junto à organização internacional.
Direito de denúncia: é o direto qüe Estados-membros têm de retirar-se da organização, desde que tal
pressuposto esteja previsto no seu tratado instituidor, que cumpram um aviso prévio e que tenham atualizado
suas contas perante a OI, como no Tratado de Assunção, que instituiu o Mercosul.
Financiamento
Seu orçamento é constituído por cotizações (contribuições dos Estados-membros) Uma organização
internacional pode, ainda, contrair empréstimos em nome próprio. Segundo Seitenfus, o orçamento divide-se
em despesas fixas e flexíveis. As primeiras referem-se aos gastos administrativos ordinários, que permitem o
funcionamento normal da organização. As segundas vinculam-se a programas e operações específicos
(manutenção da paz, desenvolvimento econômico e social). Geralmente, a forma de financiamento estará
presente no próprio tratado constitutivo da OI.
Sociedade das Nações - SDN
Conhecida também com a denominação Liga das Nações, foi a primeira organização internacional de aspecto
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universal, constituída a partir do Tratado de Versalhes com sede em Genebra, com a reunião de 32 Estados.
A SDN chegou a contar com 54 membros no período em que atuou na Sociedade Internacional, de 1920 a
1946.
A aspiração de criar uma organização internacional de caráter geral para defesa da paz é antiga, mas antes da
Sociedade das Nações tal idéia expressou-se apenas em projetos teóricos.
No seu seio, contava com três categorias de membros:
Originários: Estados que assinaram o Tratado de Versa-lhes, com a exceção dos perdedores da Primeira
Guerra Mundial, dos quais foram extraídos quatro que possuiriam direito de veto (EUA, França, Itália e
Reino Unido).
Convidados: Estados que permaneceram neutros durante o conflito.
Admitidos: Estados com candidatura aprovada por 2/3 da Assembléia.
Desses membros, o Brasil se retirou em 1926 em função da sua discordância da entrada da Alemanha na
Liga.
Estes são os Estados que posteriormente constituíram o Eixo: Japao (pela invasão da província chinesa da
Mandchúria, sob o argumento de proteger uma fen-ovia sob sua responsabilidade) e Alemanha (a partir da
ascensão de Hitier ao podei-, denunciando os acordos anteriormente celebrados) em 1933; Itália em l937
(com a ocupação e anexação da Etiópia por Mussolini); por fim, a União Soviética em l939. Expulsa em
razão de ter invadido a Finlândia.
A sua estrutura orgânica seguiu o modelo apresentado na teoria geral:
Conselho: constituído por nove membros, cinco dos quais permanentes (EUA, França, Reino Unido, Itália e
Japão), e pelos representantes de outros quatro membros da Sociedade, designados pela Assembléia para um
mandato temporário de três anos cabendo, inicialmente tal indicação à Bélgica, Brasil, Espanha e Grécia.
Quando a Alemanha entrou na Sociedade, imediatamente reinvidicou, e lhe foi concedido, um assento
permanente, o que provocou a revolta dos demais Estados. Criou-se então o status de semipermanentes,
cujos ocupantes eram indefinidamente reelegíveis.
Assembléia: teoricamente o seu órgão supremo, era constituída por delegações de todos os Estadosmembros, cada uma dispondo do direito a um voto, podendo contar com até três representantes. Tem
competência para tratar de qualquer assunto de interesse da Sociedade.
Secretariado: sediado no Palácio das Nações, em Genebra, era o instrumento técnico da SDN, dirigido por
um Secretário-Geral.
Contava ainda com dois organismos autônomos: a Organização Internacional do Trabalho - OIT, criada no
Tratado de Versalhes, e a Corte Permanente de Justiça Internacional - CPJI, prevista no artigo 14 do Pacto,
criada em 1920 e precursora da Corte Internacional de Justiça - CIJ.
Apesar de só ter sido extinta em 1946, a partir da criação, por interferência de Woodrow Wilson, do território
livre de Dantzig, da devolução do Sarre à Alemanha, e com a deflagração da Segunda Guerra Mundial (a
partir da ocupação alemã de Dantzig), a Sociedade das Nações caiu em descrédito. Ao término do conflito
foi, efetivamente, substituída pela Organização das Nações Unidas – ONU. Tal devolução se deu a partir de
um plebiscito que, por 8 1 .4% dos votos, opinou pela sua anexação à Alemanha.
60
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS - ONU
A Organização das Nações Unidas - ONU é uma organização única de países independentes que se juntaram
voluntariamente para trabalharem para a paz mundial e para o progresso econômico e social. Foi
formalmente constituída em 24.10.1945 com 51 Estados-membros.
Declaração das Nações Unidas (01.01.1942) elaborada na Conferência de Washington, realizada após a
entrada da União Soviética e dos EUA na guerra, formando, com mais 24 países, uma aliança contra o Eixo.
Conferência de Moscou (outubro de 1943) 4 representantes da China, da União Soviética, do Reino Unido e
dos Estados Unidos encontraram-se em Moscou e acordaram estabelecer uma organização de nações para
garantir a paz uma vez terminada a guerra.
Conferência de Dumharton Oaks (agosto a outubro de 1944) 4 proposições iniciais para a futura Organização
Internacional, que teria como objetivo a manutenção da segurança.
Conferência de Yalta (janeiro de 1945) 4 o Presidente Roosevelt, o Primeiro-Ministro Churchill e o líder da
URSS Josef Stalin reuniram-se numa conferência em Yalta, na União Soviética, onde acordaram sobre o
sistema de votação a ser usado no Conselho de Segurança, decidindo, igualmente, que a Conferência das
Nações Unidas deveria ter lugar em São Francisco.
Conferência de São Francisco (25.04 a 26.06.1945) representantes de 50 países estiveram presentes na
Conferência de São Francisco. Prepararam e adotaram por unanimidade, em 26 de junho, a Carta das Nações
Unidas e as leis da nova Corte Internacional de Justiça, assinadas solenemente pelo Presidente norteamericano Harry Truman, e abertas a ratificação para os Estados aliados contra o Eixo.
24.10.1945 entrada em vigor da ONU, com sede em Nova York após o depósito dos instrumentos de
ratificação dos membros permanentes do Conselho de Segurança e da maioria dos signatários da Carta.
FINALIDADES DA ONU
Resolver os litígios no intuito de manter a paz entre os Estados;
Mobilizar a Sociedade Internacional para deter uma agressão;
Promover o respeito aos Direitos Humanos.
Carta das Nações Unidas
Artigo 1. Os propósitos das Nações Unidas são:
1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para este fim: tomar coletivamente, medidas efetivas para
evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios
pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução
das controversias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz;
2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdade de direito
e de auto-determinação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal;
3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico,
social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades
fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e
4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns.
MEMBROS
No seio da ONU temos:
Membros originários: Estados presentes à Conferência de São Francisco e aqueles que, mesmo não tendo
participado da Conferência, haviam assinado a Declaração das Nações Unidas, como é o caso da Polônia.
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Membros admitidos: Estados que apresentaram sua candidatura, após terem preenchido determinadas
condições, com decisão favorável da Assembléia Geral, após recomendação do Conselho de Segurança.
A totalidade dos membros da ONU arca com os seus gastos. Há dois tipos de orçamento: o orçamento
regular inclui as funções estabe1ecidas para o Secretariado em Nova York e para as delegações em todo o
mundo; o orçamento de manutenção de paz paga as diversas operações, com frequência em “pontos quentes”
à volta do mundo. As contribuições dos Estados-membros para ambos os orçamentos são obrigatórias. Os
membros pagam de acordo com uma escala acordada entre todos. Essa escala se baseia na capacidade do
país para pagar, rendimento nacional e população.
O sistema das Nações Unidas gasta igualmente cerca de US$4,5 bilhões por ano no desenvolvimento
econômico e social. Essa quantia é recolhida e gasta por diversos fundos e programas das Nações Unidas - o
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), o Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP) e o Programa Alimentar
Mundial (PAM) - por meio de contribuições voluntárias dos países-membros.
IDIOMAS
A ONU conta com seis idiomas oficiais (árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo), além de idiomas de
trabalho que variam de acordo com o órgão (CIJ: inglês e francês; AG/CES: inglês, francês e espanhol).
Um delegado pode falar em qualquer uma das línguas oficiais e o seu discurso será interpretado
simultaneamente para as outras línguas oficiais. A maior parte dos documentos das Nações Unidas é
igualmente publicada nas cinco línguas oficiais. Por vezes, um delegado pode escolher uma língua que nã
seja língua oficial. Em tais situações, a delegação em questão deverá proporcionar tanto a interpretação como
um texto escrito do depoimento numa das línguas oficiais.
ÓRGÃOS
Assembléia Geral - AG - é o órgão encarregado das seguintes funções:
Discutir e fazer recomendações sobre qualquer assunto/questão dentro das finalidades da ONU;
Considerar princípios gerais de cooperação na manutenção da paz e segurança internacionais;
Elaborar recomendações sobre a solução pacífica de qualquer litígio internacional;
Aprovar o orçamento da ONU;
Eleger os membros não-permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
São membros da AG todos os seus Estados-membros com direito a um voto, apesar de poderem ser
representados por até 5 delegados. Como salienta Seitenfus, quase todos os Estados formam grupos regionais
e/ou ideológicos para atuarem conjuntamente, como os ocidentais, socialistas, latino-americanos e afroasiáticos.
Nas questões processuais, exige-se maioria simples, enquanto para as questões importantes exige-se 2/3 dos
votos. São consideradas questões importantes: eleição dos membros do Conselho de Segurança e do
Conselho Econômico e Social; admissão ou expulsão de um Estado-membro.
Para exercer suas atividades, conta com o auxílio de sete comissões: política, política especial, econômica,
social, tutelar, comissão administrativa e financeira e comissão jurídica.
Sua reuniãõ anual acontece na terceira terça-feira de setembro e gera1mente é aberta por um representante do
Brasil, que pode realizar ainda reuniões extraordinárias a pedido do Secretário-Geral.
Conselho de Segurança - CS - tal órgão, tratado na Carta da ONU, é o responsável pela manutenção da paz,
segurança e regulamentação dos armamentos e litígios internacionais, além de tomar as medidas necessárias
para o cumprimento das sentenças da Corte Internacional de Justiça, utilizando-se das forças armadas
colocadas à sua disposição pelos Estados-membros.
62
Carta das Nações Unidas
Artigo 42. (...) o Conselho de Segurança (...) poderá levar a efeito, por meio de forças aéreas, navais ou
terrestres, a ação que julgar necessária para manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais. (...)
Artigo 43. 1. Todos os Membros das Nações Unidas, a fim de contribuir para a manutenção da paz e da
segurança internadonais se comprometem a proporcionar ao Conselho de Segurança, a seu pedido e de
conformidade com o acordo ou acordos especiais, forças armadas, assistência e facilidades, inclusive direitos
de passagem, necessários à manutenção da paz e segurança internacionais.
É constituído por 15 membros, sendo cinco permanentes (China, EUA, França, Grã-Bretanha e Rússia)” e 10
eleitos pela Assembléia Geral para um mandato de dois anos não-renováveis, seguindo um critério
geopolítico: cinco afro-asiáticos; dois latino-americanos; dois da Europa Ocidental e um do Leste Europeu.
O seu sistema de votação é diferenciado para questões processuais (afirmativo de nove membros) e para os
outros assuntos (afirmativo de nove membros, tendo a obrigatoriedade do voto afirmativo de todos os
membros permanentes), e é aí que surge a figura do veto, em que o voto negativo de um dos membros
permanentes do Conselho de Segurança é suficiente para a não-aprovação da questão. Como a Carta da ONU
não estabelece quais são as questões processuais, na prática, o direito de veto é utilizado em todas as
questões mais polêmicas. A abstenção ou a ausência de um dos membros permanentes numa votação não são
entendidas como veto. Para impedir a utilização demasiada do veto no Conselho de Segurança, surgiu a
figura do consenso a ser aplicado nas chamadas questões delicadas, em que o presidente do CS tira
conclusões dos debates realizados acerca de determinada controvérsia, tornando-as posições comuns, sem
submetê-las a votação. As resoluções do Conselho de Segurança não são auto apliváveis. Para ter eficácia em
no Brasil, deverão ser promulgadas por decreto.
Conselho Econômico e Social — CES/ECOSOC - é o órgão encarregado não só dos assuntos econômicos
e sociais (elaborando relatórios, estudos, recomendações, conferências e projetos de convenções sobre a
matéria), mas igualmente do respeito e proteção aos direitos humanos e liberdades fundamentais.
É composto por 54 membros, eleitos pela AG para um mandato de três anos renováveis, seguindo, como no
caso do CS, um critério geopolítico, 14 africanos, 11 asiáticos, 10 latino-americanos, 6 da Europa Ocidental
e 13 dentre os demais Estados ocidentais.
Possui ainda quatro comissões regionais:
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), com sede em Santiago do Chile;
Comissão Econômica para a Europa (CEE), com sede em Genebra;
Comissão Econômica para a Ásia e Pacífico (Cesapa), com sede em Bangkok;
Comissão Econômica para a África (CEA), com sede em Adis-Abeba.
Nas suas decisões exige-se maioria simples dos votos. Realiza duas reuniões anuais: a primeira em Genebra
e a última em Nova York.
Conselho de Tutela - CT - tal órgão, encarregado de conduzir os povos do regime de tutela para a
independência, foi extinto em 1991 e substituído pelo Comitê Especial para a Implementação da Declaração
de Independência de Povos e Países Coloniais.
Secretariado - é o órgão permanente incumbido da parte administrativa da organização e do registro e
publicação dos tratados internacionais. É composto pelo Secretário-Geral, indicado pela Assembléia Geral
mediante recomendação do Conselho de Segurança para um mandato de cinco anos, e pelo pessoal do
Secretariado, nomeados pelo Secretário-Geral com regras estabelecidas pela Assembléia Geral e critérios
previsto na própria Carta.
Carta das Nações Unidas. Artigo 101. 1. A consideração principal que prevalecerá na escolha do pessoal e
na determinação das condições de serviço será a da necessidade de assegurar o mais alto grau de eficiência,
competência e integridade. Deverá ser levada na devida conta a importância de ser a escolha do pessoal feita
63
dentro do mais amplo critério geográfico possível.
Além de exercer funções técnico-administrativas, é o Secretário-Geral o chefe administrativo da ONU,
devendo fazer relatórios à Assembléia-Geral sobre os trabalhos da organização. Tem, ainda, iniciativa
diplomática para mediar ou conciliar litígios. O Secretário-Geral pode trazer à consideração do Conselho de
Segurança qualquer problema que considere constituir uma ameaça para a paz mundial. Pode propor a
discussão de assuntos à Assembléia Geral ou a qualquer outro órgão das Nações Unidas. O Secretário-Geral
atua com freqüência como árbitro em disputas entre países-membros. Por vezes, em resultado da sua
mediação ou “bons ofícios”, os problemas são resolvidos sem necessidade de serem apresentados ao
Conselho de Segurança ou à Assembléia Geral, ou antes da escalada do problema o transformar num conflito
aberto.
Corte Internacional de Justiça – CIJ - com sede em Haia e com funcionamento regulado pelo Estatuto da
Corte Internacional de Justiça, é considerada o principal, não o único, órgão judiciário da ONU, pois seus
Estados-membros têm a possibilidade de submeter litígios a outros tribunais internacionais e mesmo um
Estado não-membro da ONU poderá submeter-lhe a solução de um litígio internacional.
A competência ratione materiae da Corte abrange todas as questões que as partes lhe submetam, em especial:
interpretação de tratados; existência de qualquer fato que, se verificado, constituiria violação de um
compromisso internacional; a natureza ou extensão da reparação devida pela ruptura de um compromisso
internacional.
É constituída por 15 juízes, eleitos pela Assembléia Geral e Conselho de Segurança, 6 dentre uma lista de
pessoas apresentadas pelos grupos nacionais da Corte Permanente de Arbitragem, por maioria absoluta para
um mandato de nove anos, renováveis, possuindo, ainda, privilégios e imunidades diplomáticas. Percebem
rendimentos equivalentes ao provento de um juiz de mais alto nível em Estados industrializados. Decidem
em sessões plenárias, com a presença mínima de nove julgadores. Caso um Estado litigante não possua um
juiz de sua nacionalidade junto à CIJ, poderá indicar um juiz ad hoc, que também é conhecido pelo termo juiz
nacional, apesar de não necessitar possuir a nacionalidade do Estado ao qual representa. Os juízes só poderão
ser destituídos do cargo por decisão unânime da Corte.
São partes na Corte Internacional de Justiça - CIJ os Estados. As organizações internacionais poderão apenas
atuar como prestadoras de informação ou solicitantes de pareceres, os quais tornar-se-ão a elas obrigatórios.
A Corte não decide sobre assunto de domínio exclusivo do Estado.
Tem-se a jurisdição contenciosa obrigatória quando ela é expressamente prevista em tratado internacional, e
jurisdição contenciosa compulsória quando o Estado, ao ratificar o Estatuto da CIJ, o tenha feito incluindo
uma cláusula facultativa a esse respeito.
A Corte possui ainda uma jurisdição consultiva, ao elaborar pareceres não obrigatórios às partes. Os ditames
podem referir-se a uma questão abstrata ou a um conflito de Direito Internacional.
Não é possível o ajuizamento unilateral de uma ação perante a CIJ, pois, de acordo com o princípio do forum
prorrogatum, o juiz só será competente para decidir se houver consentimento expresso dos litigantes. No
entanto, a partir desse ato caso a parte nao apresente sua defesa ou não compareça ao julgamento, poderã ser
julgada à revelia. De acordo com o artigo 94 da Carta da ONU, os Estados se comprometerão a cumprir a
decição da Corte, sendo acionado o Conselho de Segurança caso se recusem a cumpri-la.
Carta das Nações Unidas Artigo 94.
1. Cada membro das Nações Unidas se compromete a conformar-se com a decisão da Corte Internacional de
Justiça em qualquer caso em que for parte.
2. Se uma das partes num caso deixar de cumprir as obrigações que lhe incumbem em virtude de sentença
proferida pela Corte, a outra terá direito de recorrer ao Conselho de Segurança que poderá, se julgar
necessário, fazer recomendações ou decidir sobre medidas a serem tomadas para o cumprimento da sentença.
Os processos são submetidos à CIJ por notificação do acordo especial ou petição escrita, entregue ao
Escrivão, que, juntamente com o Presidente da Corte deverá residir em Haia. Posteriormente, o Escrivão
comunica a existência da petição aos interessados e ao Secretário-Geral da ONU, que tratará de torná-la
64
pública aos demais membros da organização. As partes serão representadas por agentes, assessorados por
consultores e advogados. Não é designado juiz relator. Cada juiz prepara seu próprio projeto de julgamento,
mas a CIJ poderá indicar medidas provisórias no intuito de preservar o direito das partes.
O processo passa por uma fase escrita (comunicações Corte/partes através de memórias, contramemórias e
réplicas) e uma fase oral, marcada por uma audiência pública onde se ouvem testemunhas e peritos e,
posteriormente, os agentes, consultores e advogados dos litigantes. As deliberações serão privativas e
secretas, e as sentenças, definitivas e inapeláveis, apesar de deverem declarar as razões da decisão. Só será
possível a revisão da sentença se surgir um fato novo de desconhecimento tanto das partes quanto da Corte, e
apenas dentro do prazo de seis meses após o seu conhecimento. Nenhum pedido de revisão poderá ser
solicitado após transcorrido dez anos da publicação da sentença.
ORGANIZAÇÕES NTERNACIONAIS ESPECIALIZADAS DA ONU
Organização Internacional do Trabalho – OIT
Fundo Monetário Nacional – FMI
Banco Internacional para Recontrução e Desnvolvimento – BIRD
Organização Mundial da Saúde – OMS
Organização Mundial do Comércio – OMC
Organização das Nações Unidas para alimentação e Agrcultura – FAO
Organizações das Nações Unidas para a Educação, Cência e cultura – Unesco
Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento – CNUCED/UNCTAD
Outras Organizções Especialidas
ORGANIZAÇÕES REGIONAIS
CONDIÇÕES: Países com código comum para se comunicar, valores basicos compatíveis + previsibilidade
de comportamento e elite que não se sinta ameaçada pela integração
ETAPAS DE INTEGRAÇÃO: Processo político entre governos nacionais visando a redução de barreiras
que limitam o comércio recíproco. E imprescindível mudanças coordenadas em âmbito político, econômico e
social nos países envolvidos em tal processo.
Área de Tarifas Preferenciais
Redução parcial das Tarifas Alfandegárias não necessariamente a todos os produtos
Área de Livre Comércio
Abolição total das Tarifas que incidam no comércio intra-área
Uniformização de normas de controle de qualidade e de padronização de produtos
Certificados de origem - unificação da política tarifária para que não haja desvios de comércio’
União Aduaneira
Unificação da estrutura tarifária relativa a terceiros países
Mínimo de harmonização das políticas fiscal, monetária e cambial
Mercado Comum
União aduaneira + livre locomoção dos fatores de produção
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Criação de uma legislação comum
Unificação do sistema previdenciário e tributário e das leis trabalhistas
Sincronização das políticas econômicas em geral
União Econômica/Monetária
Unificação das políticas monetária, fiscal e cambial dos países-membros
Moeda única + banco central independente
Autoridade supranacional
ORGANIZAÇÕES EUROPÉIAS
Maiores avanços em termos de organizações internacionais em virtude não só da necessidade de recuperação
após a Segunda Guerra Mundial, mas também de um ambiente cultural favorável a esse tipo de iniciativa.
União Européia — UE
A União Européia, organização internacional constituída, atualmente, por 15 Estados, objetiva promover o
progresso econômico e social entre os povos europeus, por meio da criação de um espaço comum pelo
estabelecimento de uma união econômica e monetária, com moeda única, o Euro, fortalecer a identidade
européia e desenvolver uma estreita cooperação nos campos da liberdade, justiça e segurança.
Caracteriza-se por um sistema institucional único no seu gênero. o qual a distingue das organizações
internacionais clássicas. Ao subscreverem os Tratados de Paris (1951) e de Roma (1957), os Estadosmembros passaram a autorizar diversos atos de delegação de soberania em benefício de órgãos
independentes, os quais representam, simultaneamente, os interesses nacionais e comunitários, estando
interligados por relações de complementarídade de que decorre o processo de decisão. Pelo Tratado de Fusão
(1967), as Comunidades Européias unificaram seus órgãos decisórios, sendo prevista, a partir do Ato Único
Europeu (1986). a realização do mercado interno a partir de 01.01.1993 e sua transformação em união
econômica e monetária com a celebração do Tratado de Maastricht (1992). Na eminência da entrada dos
Estados do Leste Europeu celebrou-se o Tratado de Amsterdam (1997). Por fim, celebrou-se o Tratado de
Nice (2001), prevendo uma estrutura organizacional para um ente que incorpore 27 Estados, o fim da
vigência da Comunidade Européia do Carvão e do Aço - Ceca (a partir de 2002) e a tomada de medidas
relativas à violação dos princípios comunitários e de cooperação judiciária (Eurojust).
Na União Européia, o processo de decisão associa mais especificamente a Comissão das Comunidades
Européias, que elabora propostas e executa as ações adotadas, o Parlamento Europeu, que se pronuncia sobre
essas propostas, e o Conselho, que adota a decisão final. O Tribunal de Justiça e O Tribunal de Primeira
Instância garantem o respeito ao Direito Comunitário. O Tribunal de Contas controla a gestão financeira da
União. O Comitê Economico e Social e o Comitê Consultivo Ceca dispõem de uma competência consultiva.
Atuam, ainda, o Banco Europeu de investimentos, como instituição financeira, o Comitê das Regiões, como
órgão de implementação das políticas comunitárias junto às autoridades regionais e locais, o Provedor de
Justiça (ombudsman), como órgão de defesa do cidadão europeu perante atos de má administração por parte
dos organismos ou instituições comunitárias, e o instituto Monetário Europeu, corno condutor do processo de
unificação monetária.
Bibliografia:
MAZZUOLLI, Valério de Oliveira. CURSO DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. 2007.
SILVA, Roberto Luiz. DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. 2005.
66
ADMISSÃO E EXCLUSÃO DE ESTRANGEIROS DO/NO TERRITÓRIO NACIONAL
É princípio corrente em Direito Internacional Público: Um Estado não é obrigado a aceitar em seu território o ingresso
de estrangeiro.
Admitir ou expulsar é uma condição lógica e necessária ã soberania e independência do Estado – discricionariedade.
Estrangeiro – basta que a pessoa se locomova da jurisdição do Estado a que pertence e passe à jurisdição de outro sem
integrar a massa dos nacionais deste Estado (a palavra estrangeiro pode ser substituída por população).
Passaporte – permite aos Estados controlar a entrada ou ingresso de estrangeiros no território nacional.
Estrangeiro – não tem ânimo definitivo de permanência.
Imigrante – tem ânimo definitivo de permanência.
EXCLUSÃO DE ESTRANGEIRO
ASILO
Consigna-se no direito de permitir que, em seu território, o Estado exerça poderes, sua jurisdição exclusiva. Há dois
tipos de asilo: o asilo territorial e o diplomático.
Asilo Territorial é o acolhimento pelo Estado de estrangeiro perseguido por motivo de dissidência política, delitos de
opinião e crimes de direito penal comum.
Asilo Diplomático é a forma provisória de asilo político. Não há reciprocidade de tratamento entre os Estados. É
concedido aos estrangeiros perseguidos no seu próprio território, sendo feito, em geral pela própria representação
diplomática, onde se circunscreve a presença do estrangeiro. Ocorre uma ficção jurídica de extraterritorialidade.
Pressupostos: natureza política do delito, estado de urgência (atualidade de perseguição) e não auxílio dos
representantes diplomáticos para que a pessoa adentre em sua embaixada.
Uma vez adentrado o limite jurídico do Estado, o embaixador requer o salvo-conduto (licença pedida ao Estado para
que o asilado possa se retirar em condições de segurança do seu território).
DEPORTAÇÃO
É a exclusão do estrangeiro do âmbito territorial do Estado onde se encontra, pelo fato de ali ter adentrado de forma
irregular (clandestina), ou, mesmo tendo adentrado de forma regular, a sua estadia tenha se tornado irregular. É
competência da Polícia Federal, que acompanha a pessoa até a alfândega, não há envolvimento da cúpula do governo.
EXPULSÃO
É a exclusão do estrangeiro, por iniciativa do Estado em que se encontra, em função da prática dos seguintes atos:
atentar contra a segurança nacional, a ordem pública ou social, a oralidade pública ou a economia popular, praticar
fraude a fim de obter sua entrada ou permanência no Estado, não se reto\irar do país quando passível de deportação,
entregar-se a vadiagem ou mendicância, desrespeitar proibição expressamente prevista a estrangeiros.
EXTRADIÇÃO
É o ato pelo qual um Estado entrega uma pessoa que se encontra em seu território às autoridades de outro Estado, a fim
de que seja julgada pelos delitos nele cometidos ou para que cumpra pena por um delito pelo qual já foi julgada. Nesse
caso, é imprescindível haver sentença condenatória irrecorrível contra o réu ou mandado de prisão.
A extradição se justifica pelo interesse da justiça de que a pessoa não seja subtraída às conseqüências do delito por ela
cometido e pela solidariedade dos Estados contra o crime no intuito de manter a ordem social na Sociedade
Internacional.
Bibliografia:
SILVA, Roberto Luiz. DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. 2005.
67
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