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Má-Fé: uma certa arte
O Estrangeiro de Albert Camus sob uma análise sartriana
José Edelberto Araújo de Oliveira ∗
Resumo
Análise de O Estrangeiro de Albert Camus tomando como parâmetro as reflexões de JeanPaul Sartre sobre a liberdade, a partir do tema “a conduta de má-fé”. O artigo discute a opção
deste pensador pelo existencialismo e a sua Ontologia Fenomenológica, comparando trechos
do ensaio O ser e o nada. Partindo da indagação sobre o que leva uma pessoa a mentir para si
mesma, o trabalho fará, em princípio, um resgate do debate que envolve o tema da liberdade,
desde Aristóteles, Espinosa e Hegel, até chegar ao pensamento de Sartre. Expondo conceitos
como o “Ser-Em-Si” e o “Ser-Para-Si”, a consciência é caracterizada como o grande agente
das mutações que a condição de ser livre encerra.
Palavras-chave: Sartre. Existencialismo. Má-Fé. Liberdade.
Bad-Faith: a certain art. The Stranger of Albert Camus under one analyzes sartriana
Abstract
Analysis of The Stranger by Albert Camus taking as a parameter Jean Paul Sartre’s reflexions
about freedom, from the theme “Patterns of Bad Faith”. This paper discusses this thinker’s
option for the Existentialism and his Phenomenonlogical Ontology, comparing pieces of the
rehearsal of the phenomenological concept of being and nothingness. Beginning from the
inquiry about what it takes to a person to lie to himself, the work is going to do, as a principle,
a ransom of the discussion which is wrapped in the freedom theme, since Aristoteles, Spinoza
and Hegel, till reaching Sartre’s thinking. Exposing concepts like “Being-In-Itself” and
“Being-For-Itself”, conscience is characterized as the great mutations agent that the condition
of the free being holds.
Keywords: Sartre. Existentialism. Bad Faith. Freedom.
1 INTRODUÇÃO
“Um grande poeta lírico tem o poder de dar forma definida aos nossos sentimentos
mais obscuros. Isso só é possível porque sua obra, apesar de lidar com um tema
aparentemente irracional e inefável, possui uma clara organização e articulação.”
(CASSIRER, 1994, p. 273).
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Qualquer um que venha a conhecer a obra de Sartre percebe o modo indistinto como
trata a ficção e um estudo acadêmico (quando a questão é a profundidade da abordagem) e a
opção inequívoca pela existência concreta das pessoas e suas relações.
Entre os temas sartrianos, a conduta de má-fé fascina. O que leva alguém “[...] em seu
ser para poder ser de má-fé?” (SARTRE, 2001, p. 101). Como é mentir para o próprio eu?
Uma “certa arte de formar conceitos contraditórios [...]” certamente existe. (SARTRE, 2001,
p. 102, grifo nosso).
Quem leu O Estrangeiro, de Albert Camus sabe, pela via ficcional, que semelhantes
questões são postas. “Um homem que procurou a vida onde em geral a colocamos
(casamento, emprego, etc.) e que percebe de repente, lendo um catálogo de moda, o quanto
ele foi estrangeiro à sua vida (a vida tal como é considerada nos catálogos de moda).”
(CAMUS apud TODD, 1998, 166, grifo do autor).
Por que de não caminhar com Sartre usando uma obra de Camus como alegoria? O
presente artigo parte da hipótese de ser possível efetuar uma leitura de fragmentos de O
Estrangeiro tomando como parâmetro as reflexões de Sartre sobre a liberdade, a partir –
especificamente – do tema a má-fé, como exposto em O ser e o nada.
Em 1946, Sartre constata que o termo existencialista virou um modismo,
vulgarizando-se ao ponto de pouca coisa expressar, muito embora fosse uma doutrina
filosófica:
A maior parte das pessoas que utilizam este termo ficaria bem embaraçada se o
quisesse justificar: tendo-se tornado hoje uma moda, é fácil declarar-se de um
músico ou de um pintor que é existencialista. [...] A palavra tomou hoje tal amplitude
e extensão que já não significa absolutamente nada. (SARTRE, 1973, p. 10).
Diante das críticas que recebeu sobre a pertinência da caracterização do
existencialismo como espécie de humanismo, Sartre procurava se distanciar daqueles que, por
conta dos “[...] atos particulares de alguns homens [...]” (SARTRE, 1973, p. 27), estendiam o
beneplácito da reverência à humanidade, como se a mesma já fosse um projeto acabado.
“Desse humanismo de prelado, dele me livrei no dia em que compreendi que todo homem é o
homem todo.” (SARTRE, 1984, p. 51).
O existencialismo sartriano propõe ao homem uma maratona em busca de si mesmo.
Diferente de inúmeras outras abordagens, nega-se a anterioridade de uma “natureza humana”,
de uma “essência” fundamental, de uma “centelha divina”. “[...] A existência precede a
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essência [...].” (SARTRE, 1973, p. 11). A condição de ser gente, o ato de existir contingencia
as concepções do discurso antropo-ontológico.
Que significará aqui o dizer-se que a existência precede a essência? Significa que o
homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se
define. O homem tal como concebe o existencialista, se não é definível, é porque
primeiramente não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se
fizer. (SARTRE, 1973, p. 12).
A tradição do pensamento ocidental herdou a dualidade aristotélica da “potência” e do
“ato”: a própria existência das coisas seria distinta da possibilidade de realização que cada
instante encerra. Somente num momento especial e perfeito - a enteléquia - a ação de um
homem poderia completar a imensa “vocação humana” que cada um carregaria. Na visão
sartriana, a relação “potência x ato” simplesmente não existe. “O gênio de Proust não é nem a
obra considerada isoladamente nem o poder subjetivo de produzi-la: é a obra considerada
como conjunto das manifestações da pessoa. Por isso, enfim, podemos igualmente rejeitar o
dualismo da aparência e da essência.” (SARTRE, 2001, p. 16).
O existencialismo é a escolha do indivíduo concreto. Somente o homem é capaz de dar
sentido às coisas, ao mundo. “Aquilo a que chamamos, com razão, nossa verdade, sempre o
contemplamos apenas num contexto de signos que datam o nosso saber.” (MERLEAUPONTY, 1991, p. 42). A consciência é livre para significar.
A peste (de 1946) talvez seja o romance mais popular de Camus. Contudo, antes
mesmo de conhecer pessoalmente Sartre, ele já havia escrito O Estrangeiro e O mito de sísifo
(1941 e 1942, respectivamente). Neste último, surge um ensaio sobre a condição absurda da
existência que teima em não permitir uma análise racional por mais lúcida que possa parecer.
Sísifo é condenado a rolar uma pedra montanha acima e, toda vez que está próximo do cimo,
quase concluindo a tarefa, a vê retornar para o ponto de partida, prolongando indefinidamente
o seu esforço.
No mesmo ano da publicação de O ser e o nada (1943), obra de fôlego acadêmico, e
recebida como “[...] a ontologia da consciência entendida como o ser no mundo [...]”
(ABBAGNANO, 1984, p. 178), Sartre pessoalmente encontra-se com Camus. Antes, pelos
jornais, cada um já tinha resenhado alguma obra do outro. Camus escreve um artigo sobre A
náusea ainda na Argélia e afirma que “[...] um romance não é mais do que uma filosofia
colocada em imagens [...]” (CAMUS apud TOOD, 1998, p. 210); Sartre dedica um ensaio de
vinte páginas criticando O Estrangeiro:
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Ou então seria, à maneira de “Zadig” e de “Cândido”, um curto romance de
moralista com uma discreta ponta de sátira e com retratos irônicos, que, apesar da
contribuição dos existencialistas alemães e dos romancistas americanos, continua
muito próximo, no fundo, de um conto de Voltaire. (SARTRE apud TODD, 1998, p. 323).
O Estrangeiro é um livro estranho, não menos brilhante. Narrado na primeira pessoa, a
trama desenvolve-se na Argélia colonial da primeira metade do século passado. Meursault
descreve o funeral da mãe, a sua vida absolutamente banal de pied-noir (literalmente, “pé
preto” - colono francês nascido no Norte da África), como termina por assassinar um árabe
durante um passeio na praia e a sua condenação à pena capital. Nada de atmosferas
enigmáticas, enredos sombrios, análises psicológicas intricadas de personagens: tudo é dito
numa linearidade e clareza que chega mesmo a impressionar. E o porquê de ser um livro
estranho? Bem, parece que falta alguma coisa; o encaixe dos acontecimentos provoca no
leitor um incômodo, uma sensação de que um sentido metafórico maior fora perdido em
algum trecho do texto. A apatia de Meursault para com o curso da própria vida é revoltante.
Dominado por uma absurda indiferença, ele permanece alheio a tudo (num estado de quase
catalepsia emocional). O autor explora a questão da indiferença (por exemplo) relatando a
conversa entre o protagonista e o patrão sobre a possibilidade de viver em Paris:
Tencionava instalar um escritório em Paris, para tratar diretamente com as grandes
companhias e perguntou-me se eu estava disposto a ir para lá. [...] Perguntou-me
depois se eu não gostava de uma mudança de vida. Respondi que nunca se muda de
vida, que, em todos os casos, todas as vidas se equivaliam e que a minha aqui não
me desagradava. (CAMUS, 1972, p. 58).
O mesmo Meursault, mais adiante, manifesta novamente a indiferença diante da
possibilidade de ferir um homem: “Pensei neste instante que disparar ou não disparar, era tudo
o mesmo.” (CAMUS, 1972, p. 76).
Camus, num prefácio para O Estrangeiro (datado de 1955), refletindo sobre a
sociedade humana, comentou do risco real de alguém ser mesmo sentenciado à morte depois
de não chorar durante o enterro da própria mãe. O paradoxo da vida é o tema central da obra.
Meursault é a própria antítese do homem que se incomoda com a busca de novos valores após
o abandono dos juízos pré-estabelecidos. Viver por viver (sem a consciência) imune a tudo e
todos, assim como Meursault vaga pelo texto de Camus, não é uma opção, não é uma
possibilidade dentro da abordagem existencialista sartriana.
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2 SARTRE E A LIBERDADE
Comecei minha vida como hei de acabá-la, sem dúvida: no meio dos livros.”
(SARTRE, 1984, p. 30). Assim, em As palavras, uma obra memorialista de 1964, o quase
sexagenário Sartre comentava uma das opções que abraçou.
A questão da liberdade (ou a sensação da falta dela) permeia grandes debates. Uma
análise histórica da Filosofia revela que a reflexão sobre o tema está sempre presente.
Aristóteles (1973) julgava livre o homem que pudesse escolher entre uma ação ou outra, entre
a vontade de querer fazer alguma coisa ou não:
Parece, pois como já ficou dito, que o homem é um princípio motor de ações; ora a
deliberação gira em torno das coisas a serem feitas pelo próprio agente, e as ações
têm em vista outra coisa que não elas mesmas. Com efeito, o fim não pode ser
objeto de deliberação, mas apenas o meio. (ARISTÓTELES, 1973, p. 286).
No século XVII, Baruch de Espinosa enxergava cada homem dissolvido numa
totalidade denominada “Natureza” e a liberdade de agir, a liberdade de escolher precisava
estar necessariamente em harmonia com este todo:
A alma compreende que todas as coisas são necessárias [...] e que são determinadas
a existir e a operar por encadeamento infinito de causas [...]. Da mesma maneira,
ainda, vemos que ninguém tem pena de uma criança por ela não saber falar,
caminhar, raciocinar e, finalmente, por viver tantos anos quase sem consciência de
si. Mas, se a maior parte dos homens nascesse adulta e só uma ou outra criança,
então cada um teria pena das crianças. É que, neste caso, consideraria a infância não
como coisa natural e necessária, mas como um vício ou falta da Natureza.
(ESPINOSA, 1973, p. 289-290).
Georg Wilhelm Friedrich Hegel não ficou famoso por cativar pela clareza da sua obra.
Contudo, surpreendentemente, com uma didática invejável, deixou para a posteridade a
distinção entre a liberdade individual e a opção de agir em conformidade com uma
perspectiva totalizante:
No pensar, Eu sou livre; porque não estou em um Outro, mas pura e simplesmente
fico em mim mesmo, e o objeto, que para mim é a essência, é meu ser-para-mim, em
unidade indivisa; e meu movimento de conceitos é um movimento em mim mesmo.
[...] Como é sabido, chama-se estoicismo essa liberdade da consciência-em-si,
quando surgiu em sua manifestação consciente na história do espírito. [...] Uma
coisa só tem essencialidade, ou só é verdadeira e boa para ela, à medida que a
consciência aí se comporta como essência pensante.[...] A liberdade no pensamento
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tem somente o puro pensamento por sua verdade sem a implementação da vida. Por
isso é ainda só o conceito de liberdade, não a própria liberdade viva. (HEGEL, 2000,
p. 135-136).
Basicamente, nos três fragmentos acima, a liberdade, ou é refletida a partir do
indivíduo que se manifesta particularmente dentro de uma racionalidade ou é captada como a
ação deste mesmo indivíduo sob a égide de condições postas para outros essencialmente
semelhantes.
Em Sartre, em si mesmas as coisas são imutáveis, estáticas, desprovidas de
consciência, não interagem. A consciência - o “Para-si” sartriano – é o grande agente da
liberdade pela capacidade de ser mutável, por ser um posicionamento e “[...] não há
consciência que não seja posicionamento [...]” (SARTRE, 2001, p. 22).
[...] A consciência não tem “conteúdo”. [...] O primeiro passo de uma filosofia deve
ser, portanto, expulsar coisas da consciência e restabelecer a verdadeira relação entre
esta e o mundo, a saber, a consciência como consciência posicional do mundo.
(SARTRE, 2001, p.22, grifo do autor).
O “Para-si” é um vazio, uma consciência sem conteúdo, um nada (diferente do “Emsi”, as coisas). Criar conteúdos é a possibilidade fundamental de mover-se com liberdade,
uma vez que a consciência precisa determinar-se (continuamente, caso queira continuar
consciência) a não ser uma coisa estática, um “Em-si” fechado, incomunicável, isolado, sem a
dimensão do outro. Os diferentes modos de ser de cada um são a própria manifestação da
liberdade. “Todas as minhas ‘maneiras de ser’ manifestam igualmente a liberdade, pois todas
são maneiras de ser meu próprio nada.” (SARTRE, 2001, p. 550). A consciência é o próprio
nada movendo-se, completando-se, assumindo conteúdos e descartando-os, enchendo-se e
esvaziando-se.
Diferente da moral de Immanuel Kant, a liberdade não condiciona o Homem para “[...]
a mais digna intenção da existência [...]” (KANT, 1974, p. 205). Embora reconheça que “[...]
a moral kantiana é o primeiro grande sistema ético que substitui o ser pelo fazer como valor
supremo da ação [...]” (SARTRE, 2001, p.535), Sartre distancia-se da imagem idealizada de
um homem moral. Cada indivíduo agirá modificando o mundo e desenvolvendo conexões
com os demais indivíduos.
A consciência é a grande reveladora, desveladora do homem real; aquele que vive a
experiência existencial no curso dos dias e constrói possibilidades. Quando se decide por não
ser uma coisa (um “Em-si”), algo desprovido de uma consciência capaz de interagir, a
possibilidade de acolher a si mesmo (enquanto singularidade) é evidenciada. Só quando
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abandona todos os moldes pré-humanos (daí o idealismo de certos projetos de vida), ele pode
optar por construir – com absoluta liberdade – a ele mesmo. É uma escolha de si que se
estende para a escolha de todos os demais homens: gente de verdade que anda na rua, que
carrega contradições entre o que diz e o que faz, que primeiro existe para depois se justificar
quanto a suas origens e quanto àquilo que identifica como conhecimento.
Partindo dos dois pressupostos mencionados en passant logo acima (o pressuposto
ontológico – no que toca a gênese do próprio ser - e pressuposto epistemológico – que tenta
responder sobre a constituição do conhecimento, respectivamente), a constatação de que a
moral é também uma decorrência, um engenho da vocação à liberdade do próprio homem,
torna-se evidente. Um verdadeiro primado do ser (enquanto ser) em oposição a qualquer visão
essencialista.
3 A MÁ-FÉ
“[...] Perdera um pouco o hábito de me interrogar a mim mesmo e era difícil dar-lhe
uma resposta.” (CAMUS, 1972, p. 85). Sentir-se vazio é angustiante. Um sentimento de
pouca precisão invade a alma e, muitas vezes, torna-se indizível. O homem vive de
perspectiva em perspectiva, sempre contemplando de um ponto, de uma janela, um horizonte
que consegue imaginar. O futuro é algo necessário já que define o tipo de horizonte que será
visto e é uma construção do presente. Quando se antecipa aos fatos, o homem faz opções,
sabe que decide no momento porque é livre para tal.
Nem sempre usado, há também, é verdade, o abrigo alternativo e consagrado da
“condição de impotência” frente ao futuro, que poderá funcionar perfeitamente como um
placebo. Quando uma deidade ou a crença num destino emergem, por exemplo, a simples
conjectura da perda de um cenário assim pode ser desestruturante. Em O Estrangeiro, por
exemplo, Meursault relata e muito bem identifica a ancoragem existencial que o juiz de
instrução faz (sem a possibilidade do “além”, sem algo constituído na exterioridade do ser da
consciência, ele é uma nulidade):
Mas ele interrompeu-me e exortou-me pela primeira vez, olhando-me de alto e
perguntando-me se eu acreditava em Deus. Respondi que não. Sentou-se
indignadamente. Disse-me que era impossível, que todos os homens acreditavam em
Deus, mesmo os que não O queriam ver. A convicção dele era essa e, se um dia
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duvidasse, a vida deixaria de ter sentido. – Quer o senhor – exclamou – que a minha
vida deixe de ter sentido? (CAMUS, 1972, p. 90, grifo nosso).
Todavia, muitos não suportam a angústia do vazio e assumem a “má-fé”. Conduzir-se com
“má-fé” significa mentir para si mesmo. “O ser humano não é somente o ser pelo qual se
revelam negatividades no mundo. É também o que pode tomar atitudes negativas com relação
a si. [...] ‘A consciência é um ser para o qual, em seu ser, acha-se a consciência do nada de
seu ser’.” (SARTRE, 2001, p. 92).
Como é possível mentir para si? Na ironia, por exemplo, o homem “[...] afirma para
negar e nega para afirmar [...]” (SARTRE, 2001, p. 92), ou seja, exterioriza a consciência de
algo que verdadeiramente será negado ou nega aquilo que precisará ser positivado de forma
inversa. Sendo a consciência para Sartre um não-ser das coisas, a atitude de manifestar esta
nadificação provoca – quando em sentido contrário - a impressão de deixar-se enganar, sem
que de fato isto jamais ocorra. Após onze meses, em O Estrangeiro, novamente o juiz que
fazia a instrução do processo de Meursault, já habituado com ateísmo do réu, ironicamente
dizia “[...] por hoje acabou, senhor Anticristo [...]” (CAMUS, 1972, p.93): ele (o juiz) sabia
que tudo estava apenas começando (mesmo falando “hoje”) já que o julgamento aconteceria
ainda e, naturalmente, não acreditava que estivesse diante do próprio Anticristo. O indivíduo
irônico o é para outrem, dentro dele tudo permanece “equilibrado”. Na “má-fé” não existe a
exteriorização da forma irônica; ocorre um voltar-se para si, ocorre uma interiorização: “[...]
de tal ordem que a consciência volte sua negação para si, em vez de dirigi-la para fora.”
(SARTRE, 2001, p. 93).
Maria ficou comigo e combinamos almoçar juntos. [...] Quando se riu, voltei a sentir
desejo por ela. Instantes depois, perguntou-me se eu a amava. Respondi-lhe que não
queria dizer nada, mas que me parecia que não. Ficou com um ar triste. Mas, ao
preparar o almoço, e sem que viesse a propósito, voltou a rir-se de tal forma que a
beijei outra vez. (CAMUS, 1972, p. 50-51).
No trecho acima, temos um exemplo de “má-fé” tal como Sartre a pinta. Maria, a
namorada de Meursault (após o banho de mar) o acompanha até à casa dele. Sente, assim
como ele, um desejo, uma atração física forte. Na manhã seguinte, vestindo um dos pijamas
do amante, entre um riso e outro, integrada ao ambiente, após questioná-lo sobre o tipo de
laço afetivo que poderia envolvê-los, descobre-se desapontada com a franqueza dele. Assume
um ar melancólico para depois substituí-lo pela euforia. Através de alguma química
misteriosa, Maria barra a dimensão que as palavras de Meursault encerra, pára de interagir
com as revelações do exterior e molda, acomoda uma verdade própria, individual; ela passará
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a perceber o amante apenas provido dos elementos que vão ao encontro do tal molde interior,
ou seja, para que a má-fé se sustente, se mantenha como uma inverdade/mentira da própria
consciência voltada para si, ela acreditará no que concebeu e, como que usando uma lente,
selecionará o que está no seu exterior para que a contradição não venha à superfície: a vida
será como ela não é desde que a absoluta liberdade humana, para diferenciar-se das coisas,
seja comprometida.
Sartre (2001) também procura fazer uma distinção entre a “má-fé” e a mentira,
propriamente dita. Por mentira referencia à intenção manifesta de fraudar, adulterar, exagerar
o verdadeiro. A mentira é manifestada para o exterior da consciência, para além dos limites
das possibilidades do ”Para-si”, para aquilo que designa de transcendente. A intenção do
mentiroso visa à consciência alheia e, intimamente, não fará ajuste na forma como opera a sua
percepção, já que a sua verdade não é afetada. O mentiroso intenciona turvar a maneira como
o mundo é percebido por uma consciência semelhante à sua, porém, o que é importante,
mantém-se isolado e não se deixa contaminar pela própria inverdade que propala (poderá até
agir com o propósito de fortalecer a mentira, porém sabe que mente). Durante uma conversa
com o seu advogado, Meursault explica que a sua “[...] natureza era feita de tal modo que as
[...] necessidades físicas perturbavam freqüentemente os [...] sentimentos [...]”. (CAMUS,
1972, p. 86), daí a razão de não ter chorado no funeral da mãe: “[...] estava muito cansado e
com muito sono [...] não dei lá muito bem pelo que se passou.” (CAMUS, 1972, p. 86). A
verdade do cliente mostra-se insuficiente para os propósitos da defesa, “[...] isso não chega
[...]” (CAMUS, 1972, p. 86), é necessário fazê-lo “[...] prometer que não diria isto na
audiência [...].” (CAMUS, 1972, p. 85).
Assim, a mentira não põe em jogo a intra-estrutura da consciência presente; todas as
negações que a constituem recaem sobre objetos que, por esse fato, são expulsos da
consciência; não requer, portanto, fundamento ontológico especial, e as explicações
solicitadas pela existência da negação em geral são válidas sem alteração quando
enganamos o outro. (SARTRE, 2001, p. 93).
Camus, mais de uma década após o lançamento de O Estrangeiro, analisando a
relação da mentira com o protagonista do livro, diria:
[...] Meursault não joga o jogo. A resposta é simples: ele se recusa a mentir. Mentir
não é apenas dizer o que não é verdadeiro. É também, e principalmente, dizer mais
do que é verdade, e tanto quanto o coração humano é capaz, expressar mais do que
se sente. Isto é o que nós todos fazemos, todos os dias, para simplificar a vida. Ele
diz o que ele é, ele se recusa a esconder seus sentimentos, e imediatamente a
sociedade se sente ameaçada. Pedem a ele, por exemplo, para dizer que se arrepende
do seu crime, de maneira formal. Ele responde que o que sente é muito mais
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aborrecimento do que real arrependimento. E este sentido obscuro o condena.
(CAMUS, 2002).
A conduta de má-fé exporá a intencionalidade do ser em se (auto) completar, mesmo
que a relação com uma outra consciência seja renunciada, trocada por uma “conexão” com as
coisas. O vazio da consciência, que precisa sempre se completar enquanto afirma que não é
uma coisa, poderá ser estaticamente ocupado por uma concepção de pessoa que, na prática, é
um objeto inanimado qualquer. De um momento para o outro e de forma consciente, forja-se
um outro alguém que não existe de fato e a vida assume (intimamente) cores inexistentes.
“Nada ganhamos com a psicanálise, porque ela, para suprimir a má-fé, estabeleceu entre
inconsciente e consciente uma consciência autônoma e de má-fé. Seus esforços para
estabelecer uma verdadeira dualidade [...] resulta apenas em terminologia verbal.” (SARTRE,
2001, p. 98-99, grifo nosso).
O caso da mulher que vai ao primeiro encontro com um determinado homem é o mais
clássico dos exemplos sartrianos sobre as condutas de má-fé. Nesta ilustração, a citada
mulher, de forma consciente, adulterará o que consegue apreender do parceiro, desconhecerá
como seu, como próprio do “eu” dela, o desejo que a envolve e perceberá o seu próprio corpo
como existindo independente dela mesma, um verdadeiro estranho, um autômato:
Desarmou as ações do companheiro, reduzindo-as a não ser mais do que são, ou
seja, a existir à maneira do Em-si. Mas ela se permite desfrutar do desejo, na medida
em que apreenda como não sendo o que é, ou seja, o reconheça em sua
transcendência. Por último, sem deixar de sentir profundamente a presença do
próprio corpo – talvez ao ponto de se abalar – ela se vê como não sendo o próprio
corpo e o contempla do alto, como objeto passivo, com o qual podem ocorrer certos
fatos, mas que é incapaz de provocá-los ou evitá-los, pois seus possíveis todos estão
fora. (SARTRE, 2001, p. 102, grifo do autor).
A mulher do primeiro encontro substitui interiormente a capacidade de mover-se entre
os objetos, entre as irrealidades - reconhecendo o mesmo no companheiro – pelo modo de ser
das próprias coisas (em si, estáticas). “Contempla [-se] do alto, como objeto passivo.”
(SARTRE, 2001, p. 102). Como alguém que admira uma paisagem, ela se coisifica
estabelecendo referências estanques, renunciando à liberdade de ser diferente da “[...] maneira
de ser da [s] coisa [s].” (SARTRE, 2001, p. 103). Para Sartre, a mulher fará essa unidade
porque é capaz de permutar, na base do seu se, as dimensões da “facticidade” e da
“transcendência”, ou seja, ela é capaz de transformar uma possibilidade que está além de sua
consciência (o “Para-si”) - algo que a transcende e é ilimitado – em um elemento da sua
realidade (finita e pessoal) humana e vice-versa. A unidade aqui mencionada não é uma
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síntese dialética entre “facticidade” e “transcendência”, trata-se de tomar uma pela outra: “[...]
é preciso afirmar a facticidade como sendo transcendência e a transcendência como sendo
facticidade, de modo que se possa, no momento que captamos uma, deparar bruscamente com
a outra.” (SARTRE, 2001, p. 102, grifo do autor).
A “jovem coquette” (SARTRE, 2001, p. 104, grifo do autor) e seu parceiro desvela
uma outra perspectiva: a existência do outro. A conduta de má-fé também fará a unidade entre
o “Para-si” e o “Para-outro”: o “nós”. “Se a palavra ‘nós’ significa mais do que simples flatus
vocis [“sopro de voz” em latim, significando expressão sem sentido - nota do tradutor do
autor], denota um conceito que agrupa uma infinita variedade de experiências possíveis.”
(SARTRE, 2001, p. 512, grifo do autor). Toda vez que uma referência do passado é evocada
(tais como, ”ele agiu assim” ou “ele não fez aquilo”) na montagem da “má-fé” sartriana, as
relações concretas que encerram a “presença do outro” envolvem a consciência a partir da sua
própria gênese, não sendo possível assim a priori distinguir a jovem sem o companheiro, ele
desvinculado dela e quando começa e finda o “eu” de cada um.
No decurso das argumentações que faz uso em O ser e o nada sobre a “conduta de máfé”, Sartre (2001) propõe um breve exame (não tão breve assim, diga-se) sobre sua antítese: a
sinceridade. Tomará até como exemplo a figura de um garçom (entre inúmeros, sempre
presentes no seu cotidiano de bares e cafés parisienses) que, neste artigo, será substituído pela
imagem do advogado de Meursault.
Para ter o rótulo de sincero, “[...] é necessário que o homem não seja para si senão o
que é.” (SARTRE, 2001, p. 105, grifo do autor). Ora, somente as coisas são o que são,
somente elas são imutáveis (o “Em-si” de Sartre), a realidade da consciência humana é um
eterno “fazer-se”, um devir, um “Para-si” que se recusa a ser uma coisa. A consciência
“nadifica” porque nega a realidade das coisas como constitutiva única da sua natureza. Ser
sincero (então) é algo de inumano, é um ser acabado que é apropriado pela consciência, um
ideal que é abraçado. Sendo o homem aquilo que é, isto é, sendo o homem um projeto
inacabado, a “má-fé” fará a unidade entre o ser que necessariamente não é (o “Para-si”
sartriano) e o ser que assume a exigência de ser o que não é: “[...] a sinceridade mostra-se
como uma exigência e, portanto, não é estado”. (SARTRE, 2001, p. 105, grifo do autor).
No dia seguinte, um advogado veio à cadeia falar comigo. Era baixo e gordo,
bastante novo ainda, cabelos cuidadosamente penteados com fixador. Apesar do
calor (eu estava em mangas de camisa), envergava um terno escuro, um colarinho
duro, uma gravata esquisita, com grandes riscas pretas e brancas. (CAMUS, 1972, p. 84).
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No fragmento acima de O Estrangeiro, percebemos que o jovem “baixo e gordo” que
visita Meursault atende a todas as expectativas quando um advogado é esperado. Diferente do
cliente (“em mangas de camisa”), ele paramenta-se para a ocasião. Algum excesso no trajar-se
nem é notado. Caricaturalmente, “veste” um personagem muito comum: o profissional do
Direito que intercederá em favor de um acusado. “Toda a sua conduta parece uma brincadeira.
Empenha-se em encadear seus movimentos como mecanismos regidos uns pelos outros.”
(SARTRE, 2001, p. 106). Um simulacro de uma pessoa. O ar cerimonioso que determinadas
profissões possuem é uma exigência social: um advogado procede assim, fala daquela
maneira. Cuidados que encarceram o homem em algo que é e que evitam a sua fuga. Isto não
significa que, pessoalmente, no íntimo o nosso advogado seja assim, ele é capaz de
transcender ao modelo, ter sonhos (talvez queira ser juiz no futuro? queira ficar famoso com a
causa de Meursault?), porém assume a representação que faz para si e para os outros como
uma opção, um livre-arbítrio. Dessa maneira, a coisa advogado poderá ser separada
internamente do seu ser, ele poderá dizer que - embora contaminado pelo espectro de um
advogado ideal – não é o que permitem que ele seja: “[...] se [...] sou, não pode ser a maneira
do ser-Em-si [...] jamais sou qualquer de minhas atitudes ou condutas.” (SARTRE, 2001, p.
107). A consciência é dinâmica e se permite “advogado” – numa “conduta de má-fé” justamente porque se trata de alguma coisa não constitutiva do seu “Para-si”. A má-fé existe
porque o ser da liberdade é sustentado pela necessidade de (continuamente) fazer-se.
Em suma, “[...] que é a sinceridade senão precisamente um fenômeno de má-fé? Não
mostramos [...] que a má-fé almeja constituir a realidade humana como ser que é o que não é e
não é o que é?” (SARTRE 2001, p. 110).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Assim, quanto mais pensava, mais coisas esquecidas ia tirando da memória.
Compreendi então que o homem que houvesse vivido um único dia poderia sem custo passar
cem anos numa prisão. Teria recordações suficientes para não se entediar.” (CAMUS, 1972,
p. 103).
A conduta de má-fé fascina quando convida para uma dimensão transcendente. A
possibilidade de uma infinitude – sem correspondente concreto e daí idealizado – habitará a
condição de finito que o ser se abriga quando descobre a solidão e a responsabilidade perante
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a liberdade que constrói. “[...] A existência precede a essência, ou, se se quiser, temos de
partir da subjetividade [...]” (SARTRE, 1973, p. 11) num jogo irônico em que o transcendente
chega como possibilidade de escolha, travestido como algo constitutivo do próprio impulso de
liberdade. “[...] A ambigüidade necessária à má-fé advém da afirmação de que sou minha
transcendência à maneira de ser da coisa.” (SARTRE, 2001, p. 103, grifo do autor).
Em O Estrangeiro, Meursault é o protótipo de um homem sem perspectiva
transcendente, daí o absurdo, o (pseudo) cinismo, o algo que não é humano identificado nele.
Ele não se envolve nem se deixa envolver pelo mundo. Abrigado em si mesmo, separa-se de
tudo e não se revela, não se compromete com as revelações que sua própria consciência
poderia proporcionar. Nesse sentido, não adere à má-fé porque “[...] o problema essência da
má-fé [é] um problema de crença.” (SARTRE, 2001, p. 115).
Sartre caracteriza a má-fé como fé. A estruturação do ser que se deixa conduzir pela
má-fé é, desde o início, uma atitude de adesão integral, sem maiores questionamentos: caso a
proposta fosse a disposição de se constituir de má-fé antecipadamente, o fenômeno seria o do
cinismo e não má-fé; caso a adesão fosse uma opção clara e sincera por um tipo de conduta
específica, o nome dela seria boa-fé e não má-fé. A má-fé, enquanto decisão, está presente em
todo um processo e não diz respeito a uma parte dele (a partir de tal ponto ou até certo limite):
Assim, a má-fé, em seu projeto primitivo, e desde sua aparição, decide sobre a
natureza exata de suas exigências, se delineia inteira na resolução de não pedir
demais, dá-se por satisfeita quando mal persuadida, força por decisão suas adesões a
verdades incertas. Esse projeto inicial de má-fé é uma decisão de má-fé sobre a
natureza da fé. (SARTRE, 2001, p. 116, grifo do autor).
O Estrangeiro permite uma abordagem sartriana com base nas reflexões sobre a
“liberdade”, tendo como fio condutor o tema da “má-fé”, porque Meursault (o “nosso herói”,
como a ele se referia o próprio autor) não aceitou mentir. Embora o conceito “mentira” dentro da ontologia sartriana (como já exposto quando do desenvolvimento dos principais
elementos do conceito “má-fé”) – seja diferente do uso livre que Camus faz da palavra
“mentir”, percebe-se, claramente, a coadunação dos pensadores quanto ao sentido: o “mentir”
de Camus iguala-se ao “fugir” de Sartre. E, fugir de quem ou do quê? “O ato primeiro da máfé é para fugir do que não se pode fugir, fugir do que se é.” (SARTRE, 2001, p. 118, grifo
nosso). Ser o que se é - sem deixar de reconhecer os impulsos próprios do inconsciente – é
muito mais do que o ritualismo de algumas condutas, como a do advogado de Meursault; é
mais do que julgar-se capaz de filtrar este ou aquele componente do ser de outrem que se
manifesta, como Maria fez com Meursault e a mulher do primeiro encontro, com o parceiro;
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é algo mais do que a disposição para a sinceridade, como a imagem do homossexual que
exemplifica a argumentação sobre o “[...] intolerável sentimento de culpa.” (SARTRE, 2001,
p.110). Ser o que se é é explorar o vazio do presente, é admitir limitações, é permitir as
infinitas possibilidades que a liberdade desvela.
REFERÊNCIAS
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Lisboa: Presença, 1984. v. 14. 249 p.
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1972. 156 p. (Os imortais da literatura universal, 49).
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JOSÉ EDELBERTO ARAÚJO DE OLIVEIRA
∗
Licenciado em Filosofia pela Faculdade Batista Brasileira e Professor da mesma instituição.
E-mail: [email protected]
Artigo recebido para publicação em 03/03/2005.
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