Dilemas do ensino superior brasileiro e impactos na formação e exercício profissional do serviço social frente aos ataques do capitalismo Andreia Agda Silva Honorato 123 Resumo Este artigo é resultado de contínuos debates que tem como fruto um processo de reflexão objetivado pelo compromisso ético político profissional no sentido de um posicionamento que se contrapõe as amarras do sistema capitalista perverso. Apresenta-se aqui elementos de análise sobre a Educação, o Ensino Superior no Brasil e os rebatimentos do capitalismo que opera na lógica da educação como mercadoria e alunos como clientes deste mercado. Assim, o enfoque deste artigo direciona-se aos impactos desse dilema na formação superior no curso de Serviço Social, também no estágio obrigatório curricular (concebido na Colombia como prática profissional) enquanto elemento constitutivo da formação profissional, bem como os dilemas presentes no exercício profissional contemporâneo. Palavras-chave: Formação e exercício profissional, crise do capital, mercantilização do ensino superior, projeto ético político profissional. Abstract This article is the result of ongoing discussions that have fruit as a process of reflection objectified by professional ethical political commitment to a position that opposes the shackles of the evil capitalist system. Here is presented the analysis elements on Education, Higher Education in Brazil and the repercussions of capitalism that operates on the logic of education as a commodity and students as customers in this market. Thus, the focus of this article directs to the impact of this dilemma in higher education in the course of Social Service, also in curricular practical stage (designed in Colombia as a profession) as a constitutive element of vocational training, as well as the dilemmas present in professional practice contemporary. Key words: Training and professional practice, crisis of capital, commodification of higher education, ethical political professional project. 123 Assistente Social. Mestre em Serviço Social pela PUC São Paulo. Doutoranda pela PUC SP. Especialista em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes. Supervisora Técnica. Docente no curso de Serviço Social da Universidade Camilo Castelo Branco - UNICASTELO e UNIESP Mauá – Fama SP – Brasil. andreiah_ [email protected] Reflexionando las disciplinas 331 Introdução Hoje, o grande dilema sobre o ensino superior no Brasil é que se tornou um grande negócio para os empresários investir e, com isso, a educação que deveria ter outros valores passa a ser prioritariamente valor de negócio, de investimento e lucro para investidores. Neste cenário muda-se o perfil do alunado que ingressa na graduação, concomitantemente, torna-se notório a ausência de esforços para a qualidade do ensino prestado, afinal, sucateiam também as condições de trabalho do docente. De acordo com dados do MEC – Ministério da Educação e Cultura (2010) o ensino superior brasileiro conta com 2377 instituições de ensino e, dessas, 2100 referem-se a instituições privadas. No ano 2000 eram 1004 o número total de instituições de ensino superior no Brasil e, este número dobrou na década seguinte. O que levou a este cenário? No governo de Fernando Henrique Cardoso com o seu ministro da educação Paulo Renato de Souza, as instituições de ensino tiveram a liberdade de mudar seu status de “sem fins lucrativos” para “fins lucrativos” e, a partir daí os empresários passaram a investir mais nesse setor conforme pontuamos acima. Assim, estes elementos de análise fazem parte de uma série de outros que provocam no cenário nacional alguns dilemas que nos provocam preocupações e inquietações. Já nos cursos de Serviço Social que formam assistentes sociais (nome dado aos profissionais trabalhadores sociais no Brasil) é também alarmante a crescente quantidade de ofertas e, contudo, os desafios frente a falta de preocupação e dedicação para a qualidade que se faz necessária para uma formação digna e compactuada com as diretrizes curriculares da profissão, bem como com os órgãos representativos e, acima de tudo, com o Código de Ética do assistente social. Nesta quadra histórica contemporânea, vê-se que muitos aspectos da formação requer atenção para que ocorram de acordo com as diretrizes preconizadas pela ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa – um dos órgãos que nos representa juntamente com o conjunto CFESS/CRESS – Conselho Federal de Serviço Social e Conselhos Regionais de Serviço Social, sendo um deles o cumprimento de estágio (vivência do aluno no espaço de trabalho do Serviço Social sob supervisão direta de um assistente social como supervisor de campo e, neste exercício, este aluno/a experimenta sua primeira aproximação com a prática objetivada a perceber a relação indissociável teórico metodológica). Há questões diversas e adversas sobre formação e exercício profissional no que se refere a limites e desafios ainda presentes nas décadas de 2000 e 2010 sobre o ensino do trabalho profissional e da materialização do Projeto Ético Político - PEP. Quais os limites, os desafios e as perspectivas da qualidade da formação e do exercício profissional? A princípio, cabe-nos refletir esta 332 Reflexionando las disciplinas questão a partir do contexto inserido, ou seja, em “tempo de capital fetiche”, como nos anima com este debate a professora Iamamoto (2010), como se evidenciam as artimanhas do capitalismo, seus inúmeros ataques aos direitos sociais, às mudanças no mundo do trabalho e, consequentemente, todo tipo de exploração do trabalho humano e rebatimentos em todos àqueles que vivem do trabalho? Num contexto marcado cotidianamente pela perversidade do sistema capitalista, tem-se a contrarreforma do ensino superior a partir da LDB – datada no ano de 1996, o sucateamento da educação – “mercado de certificações superiores” – o qual se apropria do campo acadêmico como fonte de interesses mercantis, concebendo os sujeitos – acadêmicos – como clientes e, neste contexto, emitindo de diversas maneiras, expressões negativas e reducionistas à formação profissional de qualidade, reduzindo também o fazer profissional em “velhas” ações tecnicistas. Assim, o debate que sustenta este artigo perpassa dos limites advindos da crise do capital rebatidos no ensino superior aos desafios existentes nos diversos espaços de atuação da prática do assistente social, provocandonos a pensar nas perspectivas e possibilidades presentes, mesmo diante de questões tão diversas, adversas e emblemáticas no binômio formação e exercício profissional. Trata-se de reflexões que trazem elementos centrais em dois pontos antagônicos: de um lado, a contrarreforma na educação, a crise estrutural do capital no plano internacional – 1973 em diante – e as estratégias estabelecidas com ataques do capitalismo para recuperar suas taxas de lucro da qual se evidencia a desresponsabilização do Estado que se torna “mínimo” para os trabalhadores e “máximo” para o capital que, de acordo com Guerra [...] pode-se dizer que as respostas contemporâneas do capital à sua crise visam a retomada das taxas de lucro, mas não é só isso – visam fragilizar a organização dos trabalhadores e aprofundar o controle sobre elas (Guerra, 2010, p. 719). Por outro lado, buscamos aqui acirrar o debate que reforça a luta da classe trabalhadora, em especial, desta categoria profissional de assistentes sociais que atua conforme seu Código de Ética Profissional, a Lei de Regulamentação da Profissão e seu Projeto Ético Político profissional, se posicionando na luta constante pelo ensino público, laico, universal, de qualidade, gratuito, presencial, de acesso e permanência a todos. Aprofundamento das questões diversas e adversas imbricadas no proceso de formação e no exercício profissional do serviço social: da lagarta à borboleta É latente os desafios ainda presentes no universo acadêmico da graduação em Serviço Social no sentido de vencermos o velho conservadorismo de uma prática pedagógica que, por um lado, pauta-se na cultura da ajuda e, de outro, naturaliza-se a pobreza. Reflexionando las disciplinas 333 Esses limites encontram-se presentes entre os acadêmicos, mas também se ampliam porque perpassam as barreiras diante da perspectiva que traz o discente – muitas vezes – para a escolha profissional “missão, caridade e benevolência”, e, pelo sucateamento do ensino superior que impõe muitos desafios ao corpo docente e, em destaque, aos profissionais que assumem a supervisão de estágio em seu campo de atuação, não favorecendo, muitas vezes, o debate para uma pedagogia profissional que seja emancipatória, logo, na defesa intransigente dos direitos humanos. Os limites e os desafios postos na prática profissional do assistente social são latentes, por um lado, por força do poder institucional – estar entre a lógica do mercado e a defesa de seu projeto profissional – dificulta a viabilidade para que esse profissional materialize seu projeto ético-político profissional e, de outro, um viés conservador imbuído no próprio fazer profissional de alguns assistentes sociais, imputando a possibilidade de organização e mobilização política, de efetivação das competências ético-política, teórico-metodológica e técnico-operativa que deveriam dimensionar seu agir profissional. Trata-se de um cenário social que enfrenta uma crise global do sistema capitalista, o qual Milton Santos124 (2006) em seu documentário deixa claro a existência de três mundos em um só: o primeiro denominado de ‘fábula’ – tratase do mundo globalizado de modo fantasioso como o capitalismo se apresenta, ele como se fosse bom, necessário e encantador, ou seja, o consumismo sem cessar, colocando as pessoas submersas ao consumo de modo alienante e alienador; o segundo denominou de perverso, ou seja, o capitalismo como ele é, perverso e excludente o qual supravaloriza o “ter” sobre o “ser” e; o terceiro mundo denominado de possível, um mundo que ainda não existe no cotidiano do povo brasileiro – da grande massa populacional – mas que a esperança não se encontra esgotada, ao contrário, trata-se de uma transformação societária pautada na justiça e igualdade social àquela que cotidianamente percorremos na direção, mesmo estando na contramão do determinismo estabelecido. Conforme pontuado anteriormente o assistente social realiza suas atividades profissionais em um contexto marcado por diversas formas de empreendedorismo e flexibilizações que cotidianamente ganham força e mascaram a realidade. Ou seja, o capitalismo imprime forças na contínua e crescente exploração do trabalho / trabalhador, além das investidas contra a legislação trabalhista buscando destruir conquistas históricas dos trabalhadores – precarizando as condições de trabalho e prevaricando o acesso digno de direitos anteriormente conquistados. As contradições estão postas e, para tanto, cabe-nos conhecer a realidade em seu complexo movimento para nela intervir. Neste contexto, proliferam-se trabalhos voluntários, terceirizados, subcontrato, informalidade na relação de trabalho, inacessibilidade de direitos trabalhistas, ideia de empreendedorismo como mecanismo ideal em que os sujeitos devem se adequar para poder estar inserido nas transformações do mundo do trabalho, enfim, como pontua Milton Santos gravou documentário “A Globalização vista do Lado de Cá” no ano de 2006, sob direção de Silvio Tendler. Analisa os impactos da globalização, mostra a perversidade do capitalismo e os rebatimentos na vida dos sujeitos sociais. 124 334 Reflexionando las disciplinas Antunes, “o capital operou a separação entre trabalhadores e meios de produção, entre o caracol e sua concha” (Marx, apud Antunes, 2010, p. 635). Antunes acrescenta As funções produtivas e reprodutivas básicas foram radicalmente separadas entre aqueles que produzem (os trabalhadores) e aqueles que controlam (os capitalistas e seus gestores) (Antunes, 2010, p. 635). Assim, vê-se que na cena social contemporânea, muitos desafios estão postos para a classe trabalhadora e, com o exercício profissional do assistente social não seria diferente. Com base nas contribuições de Guerra (2010, p. 734) cabe ao profissional elaborar pesquisas com temas que vão ao encontro dos interesses da classe trabalhadora enquanto contraposição aos critérios estranhos às ciências humanas e sociais, alimentando assim o debate da formação e do exercício profissional e assumida como competência. A crise atual do capital, com suas novas e antigas determinações, impõe metamorfoses ao mundo do trabalho, o que exige um perfil de profissional funcional a essa etapa do capitalismo. Parto da hipótese de que as atuais configurações do ensino respondem às exigências da atual fase do capitalismo e se orienta pelas demandas do mercado de trabalho. Nesta direção, a formação profissional tem um duplo desafio: desvelar e enfrentar a crise do capital e nela as diversas formas de precarização das relações e condições de trabalho, flexibilização dos direitos e focalização das políticas sociais, que, como parte da mesma racionalidade, se expressam e condicionam exercício e formação profissionais (Guerra, 2010, p. 715). Primamos por uma formação de qualidade para que o profissional tenha condições de defender a efetivação de direitos tão violados neste país, contrapondo-se aos retrocessos que pairam sobre a realidade. Neste contexto, o Estado somente privilegia dados quantitativos abstendo-se de uma atenção qualitativa, ou seja, apenas validam o número de pessoas que ingressam no ensino superior e não na qualidade deste ensino, o que também coloca em risco toda a sociedade a qual, posteriormente, precisará dos serviços prestados por estes futuros profissionais. No contexto de precarização e desregulamentação do trabalho e redução dos direitos, é importante destacar que a discussão do estágio supervisionado se coloca, ainda, como estratégica na defesa do projeto de formação profissional em consonância com o projeto- ético político do Serviço Social. Não se trata apenas da construção operacional do fazer (organização técnica do trabalho), mas, sobretudo, da dimensão intelectiva e ontológica do trabalho, considerando aquilo que é específico ao trabalho do assistente social em seu campo de intervenção (ABESS/ CEDEPSS, 1996, p.14). De acordo com a ABEPSS, os fundamentos teórico-metodológicos e a direção ético-política refletem-se nos investimentos na formação acadêmica, que vem exigindo constante aprofundamento intelectual e aperfeiçoamento Reflexionando las disciplinas 335 das competências que envolvem o fazer profissional. Na contracorrente da formação profissional às leis do mercado, logo, a formação deve dirigir-se para a construção de alternativas e estratégias profissionais que contribuam para a defesa dos interesses da classe trabalhadora, opondo-se à redução da formação ao mero desenvolvimento da racionalidade técnico instrumental, o que exige do estágio supervisionado curricular, possibilitar experiências da realidade social e suas contradições, bem como fomentar e ampliar os horizontes da formação profissional com o desenvolvimento de competências técnico operativas, compromisso ético-político e sustentação teórico metodológica. O conteúdo da disciplina estágio supervisionado deve estar calcado nos núcleos de fundamentação da formação profissional, uma vez que tais núcleos afirmam-se como eixos articuladores da formação profissional pretendida e desdobram-se em áreas de conhecimento que, por sua vez, se traduzem pedagogicamente através do conjunto dos componentes curriculares, rompendo, assim, com a visão formalista do currículo, antes reduzida a matérias e disciplinas, propõe-se a articulação de ensino pesquisa e extensão, permitindo uma intensa convivência acadêmica entre professores, alunos e sociedade. Este é, ao mesmo tempo, um desafio político e uma exigência ética: construir um espaço por excelência do pensar crítico, da dúvida, da investigação e da busca de soluções. (ABEPSS, 1996, p. 9). Esta lógica deve permear o conteúdo das disciplinas que devem ser ofertadas, anteriormente à realização do estágio supervisionado curricular – quer obrigatório ou não obrigatório. Assim, somente tendo cumprido as disciplinas de fundamentos teórico metodológicos do Serviço Social I e II e ética profissional, pela necessidade de formação do senso crítico, amadurecimento e conhecimentos específicos básicos da profissão, é que o estudante poderá iniciar a atividade de estágio. O estágio supervisionado no curso de Serviço Social apresenta como uma de suas premissas oportunizar ao(a) estudante o estabelecimento de relações mediatas entre os conhecimentos teórico-metodológicos e o trabalho profissional, a capacitação técnico operativa e o desenvolvimento de competências necessárias ao exercício da profissão, bem como o reconhecimento do compromisso da ação profissional com as classes trabalhadoras, neste contexto político econômico cultural sob hegemonia do capital. A supervisão acadêmica está imbricada diretamente com a finalidade social da profissão, na prestação de serviços sociais, que consiste, dentre outras questões, em conhecer e refletir com os/as estagiários/as, em pequenos grupos, a realidade profissional nos campos de estágio, reconhecer os limites e possibilidades das respostas profissionais nas diferentes organizações no enfrentamento das expressões da “questão social”, reconhecer e debater os elementos constitutivos do projeto profissional em curso nos espaços socioocupacionais e sua relação com o projeto hegemônico da profissão. Contudo, para que seja validada outra educação neste país, precisamos continuar na luta, contrapondo-se à contrarreforma da Educação que se funda 336 Reflexionando las disciplinas em plena mercantilização. Vale esclarecer que “o objetivo dessa contrarreforma foi o de transformar a natureza da Universidade, de Instituição Social para Organização Social, submetendo-a aos interesses privados empresariais, investindo na transferência de orçamento público para o privado, reforçando mecanismos de formações em massa sem visar a qualidade” (Abramides, 2006). É alarmante a expansão do ensino privado no país na década de 2000, onde novos cursos, cursos sequenciais, tele-ensino, ensino à distância se firmam no sentido de ajustar os cursos às necessidades do mercado. Gastar menos com educação, conceder um diploma em menor tempo e a consequente precarização do trabalho com menores salários sustentam a determinação do ensino como negócio, facilitando a intervenção do grande capital privado125 (Abramides, 2012). No Estado de São Paulo – território em que será explorado por esta pesquisa de doutorado – existem 57 (cinquenta e sete) universidades e faculdades que oferecem o curso de graduação em Serviço Social, destas, 4 (quatro) universidades contam também com outros campus que também oferecem o curso de graduação em Serviço Social, totalizando estes em mais 8 (oito) campus ou campi, ou seja, 65 (sessenta e cinco) cursos são oferecidos em todo o estado. Do total, apenas 2 (dois) referem-se ao ensino público e 63 (sessenta e três) ensino privado. Dessas, ainda não dispomos da quantidade de universidades que o ensino seja EaD – mesmo sabendo sobre sua existência e contrapondo-se ao mesmo na graduação. Preliminarmente, sabe-se que do total que oferece ensino presencial, alguns cursos tem em seu currículo algumas disciplinas não presenciais – normalmente no primeiro e no segundo semestre do curso, na maioria, em disciplinas não específicas da profissão (Direito, Antropologia, Filosofia, Sociologia etc). Hoje são pistas investigativas que serão percorridas e, posteriormente debatidas no percurso do doutorado. Em suma, são muitas as questões que direcionam a pesquisa no sentido de ampliar o debate sobre o binômio formação e exercício profissional, desvelando suas particularidades e privilegiando com suas análises para uma prática social renovadora. Nesta perspectiva, quanto ao nosso Código de Ética Profissional, Guerra (2007) afirma Ele traz no seu interior, determinada forma de conceber as funções do Estado e o papel das políticas sociais, como a mediação necessária para impor limites ao processo de mercantilização da vida social, normatiza a forma de estabelecer relações com o usuário dos serviços e das políticas sociais de viabilizar direitos, de organizar e mobilizar a participação dos indivíduos grupos e populações na vida das instituições, no planejamento e nas decisões institucionais e organizações na reivindicação e defesa de seus direitos (Guerra, 2007, p. 21). Aula proferida pela professora Dra. Maria Beatriz Abramides em debate no NEAM – Núcleo de Aprofundamento Marxista da PUC SP e em orientação da tese de doutorado. 125 Reflexionando las disciplinas 337 Neste sentido, como o processo de formação profissional tem efetivamente contribuído a partir de seu currículo e da própria dinâmica que envolve a formação na sua complexidade com meios para despertar nos alunos/as senso crítico e comprometimento para o exercício da profissão? Quais são os reais enfrentamos que temos no campo acadêmico quanto a fundamentação teórico-metodológica que sustenta nossa práxis? Como qualificar os estágios e, qual é a posição de supervisores de campo quanto aos limites e desafios ainda presentes no estágio supervisionado? Analisando essas questões e exigências que tornam um profissional de fato habilitado para atuar nas expressões da questão social, dotado de formação intelectual crítica e criativa, bem como capaz de reafirmar em seu cotidiano profissional a defesa intransigente dos direitos humanos, reconhecendo e comprometendo-se com valores e princípios norteadores do código de ética profissional de modo a materializá-lo junto aos sujeitos sociais numa atuação não apenas sobre a realidade, mas na realidade, outra questão que fica é: Como superar a presença significativa de intervenções ainda pautadas no senso comum, no preconceito, e no tecnicismo? Como pontua Iamamoto (2008) “em uma prática social reduzida a qualquer atividade; ao fazer quantificadamente mensurável e de uma prática profissional apreendida na sua imediaticidade, naturalizando a vida social e coisificando sua própria prática”. Eis que desafios permanecem na década de 2010 com questões diversas e adversas na contramão do que defendemos. E o que defendemos, senão aos princípios que demarcam uma direção política ao Serviço Social brasileiro? Os referidos princípios compõem nosso Projeto Ético Político profissional e tem sua materialidade no Código de Ética do assistente social. São os princípios fundamentais: • Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes; • Autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais; • Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo; • Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras; Defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida; • Posicionamento em favor da equidade e justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática; • Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e a discussões das diferenças; 338 Reflexionando las disciplinas • Garantia do pluralismo, através do respeito às correntes profissionais democráticas existentes e suas expressões teóricas, e compromisso com o constante aprimoramento intelectual; • Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação, exploração de classe, etnia e gênero; • Articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que partilhem os princípios deste Código e com a luta geral dos/as trabalhadores/as; • Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional e; • Exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física. (Brasil, Código de ética do/a assistente social. Lei 8.662/93 de regulamentação da profissão). Em suma, este debate busca de um lado, provocar o leitor para refletir sobre os impactos do capitalismo na educação e na formação do assistente social, mas, por outro lado, refletir sobre o lugar privilegiado que este trabalhador social ocupa na realidade e sobre a realidade dos sujeitos sociais; realidade esta, complexa, contraditória e em constante movimento no qual o profissional é requisitado a repensar sua própria prática, situando-a a um complexo mais amplo societário, ou seja, no desvendamento do real para além do imediato, nas formas de produção e reprodução das relações sociais da vida cotidiana. Este é um convite para descortinar o que está posto e, também, de ampliar a análise sobre os desafios, limites e possibilidades existentes na formação e no exercício profissional do Serviço Social – ‘ Pensar a educação para além do capital’. Finaliza-se este texto com contribuições da professora Iamamoto (2008, p.13) É tempo de “fertilizar o debate profissional (...) perseguindo os caminhos da renovação”. Bibliografía Abramides, Maria Beatriz Costa - O. (2006). Projeto Ético-Político Profissional do Serviço Social Brasileiro-Tese de Doutorado-PUCSP. ABESS/CEDEPSS. (1996). Proposta Básica para o Projeto de Formação Profissional Novos subsídios para o debate. Rio de Janeiro: ABESS/CEDEPSS. Antunes, R. (2010). A Crise, o desemprego e alguns desafios atuais. Revista Serviço Social e Sociedade, (104), 632-636. Reflexionando las disciplinas 339 Brasil. (1993). Código de Ética do Assistente Social. Lei 8662/93 de regulamentação da profissão (3ª edição). Brasilia: CFESS. Cfess. (2008). Resolução 533, de 29 de setembro de 2008. Regulamenta o Estágio Supervisionado. Guerra, Y. (2010). A formação profissional frente aos desafios da intervenção e das atuais configurações do ensino público, privado e a distância. 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