Artigo Original Análise crítica dos exames iniciais de seguimento pós-tireoidectomia total por carcinoma bem André Bandiera de Oliveira Santos diferenciado de tireóide de baixo risco Analysis of the initial follow-up exams after total thyroidectomy for well-differentiated, low risk thyroid cancer RESUMO Introdução: a incidência do câncer de tireóide tem aumentado nos últimos anos devido ao aumento do diagnóstico precoce. Considerando a tireoidectomia total como parte do tratamento, o seguimento é realizado inicialmente com a pesquisa de corpo inteiro (PCI), dosagem sérica de tireoglobulina (Tg) estimulada pelo hormônio tíreo-estimulante (TSH) e sem estímulo. Objetivo: análise da importância relativa dos três exames na detecção de doença e indicação de terapia complementar conforme conduta do serviço. Pacientes e Método: Estudados retrospectivamente os dados (gênero, idade, tipo histológico, tamanho do tumor, PCI e Tg com e sem estímulo de TSH) referentes aos pacientes operados por carcinoma bem diferenciado de tireóide entre 1999 e 2004, excluindo tipos histológicos mais agressivos, tumores > 4cm, extensão extratireoidiana e dosagem positiva para anticorpos antiTg. Os pacientes foram analisados em dois grupos (tumores com menos de 1cm e entre 1 e 4cm), sendo calculada sensibilidade dos exames em relação ao padrão-ouro (PCI associado a Tg estimulada). Resultados: dos 85 pacientes, 81 eram mulheres e quatro eram homens, com idade média 44 anos. A sensibilidade da PCI e da Tg sem estímulo foi de 26,9%, enquanto a da Tg estimulada foi de 92,2%. Entre os tumores < 1cm, a sensibilidade da PCI foi de 16,6%, a da Tg sem estímulo foi de 33,3% e a da Tg com estímulo de TSH foi de 100%. Discussão: O carcinoma bem diferenciado de tireóide tem excelente prognóstico para o grupo de baixo risco. A tireoglobulina estimulada foi o exame mais sensível em todos os grupos, com sensibilidade de 100% nos tumores menores que 1cm. A interpretação dos exames de seguimento deve ser individualizada e a indicação de ablação de restos tireóideos não deve ser aplicada em todos os pacientes. ABSTRACT 1 Raquel Ajub Moysés1 André de Souza Potenza2 José de Souza Brandão Neto2 Milton Inoue2 Gustavo Nunes Bento2 Climério Pereira Nascimento2 Carlos Eugênio Nabuco de Araújo2 Simone Elisa Dutenhefner3 Pedro Michaluart Jr.4 Alberto Rossetti Ferraz5. Introduction: the incidence of thyroid cancer has been rising in the last years due to the improvement of early diagnosis. Considering the total thyroidectomy as part of the treatment, the follow-up can be performed with total body scan and thyroglobulin measurement, with and without TSH stimulation. Objective: to analyze the relative importance of each exam in detecting disease and the indication of complementary therapy as routine. Patients and methods: retrospective review of patients` charts, which underwent total thyroidectomy as part of the treatment for well-differentiated thyroid cancer, including gender, age, histologic subtype, size of tumor, total body scan, thyroglobulin with and without TSH stimulus. The patients with aggressive histologic subtypes, tumors > 4cm, extrathyroid extension, and anti-thyroglobulin antibodies were excluded. The patients were analyzed in two groups – tumors <1cm and between 1 and 4cm. The sensibility of each exam was calculated in relation to gold-standard total body scan associated with thyroglobulin. Results : 85 patients were studied, being 81 women and 4 men, with median age of 44 years-old. The sensibility of Tg without stimulus and total body scan were 26.9% and the sensibility of stimulated Tg was 92.2%. The sensibility of total body scan, Tg without stimulus and Tg with TSH stimulus was, respectively, 16.6%, 33.3% and 100%. Discussion: the well-differentiated thyroid cancer has excellent prognosis in the low-risk group. Stimulated thyroglobulin was the most sensitive exam in all groups, with a sensibility of 100% in the group with tumors < 1cm. Follow-up exams interpretation must be individualized and the ablation must not be applied for all patients. Key words: Thyroid cancer; follow-up; total body scan; thyroglobulin. Descritores: Câncer de tireóide; seguimento; tireoglobulina; pesquisa de corpo inteiro. INTRODUÇÃO O câncer de tireóide corresponde a cerca de 1% de todas as neoplasias humanas. Estima-se que, em 2001, 19.500 novos casos de carcinoma da tireóide tenham sido diagnosticados nos Estados Unidos. No Brasil, o câncer da tireóide representa 4,5% das neoplasias nas mulheres e 0,9% no sexo masculino. A incidência de câncer de tireóide tem aumentado nos últimos anos, principalmente devido ao diagnóstico precoce. A melhora nos métodos de imagem, em especial a ultra- sonografia, levou, nos últimos anos, a um aumento no diagnóstico de nódulos tireoidianos. Com isso, está mais comum o diagnóstico de nódulos pequenos, não evidentes ao exame clínico. Os vários tipos histopatológicos de câncer de tireóide são classificados em bem diferenciados, pouco diferenciados e indiferenciados. O grupo dos bem diferenciados inclui os carcinomas papilíferos e os foliculares, com suas variantes celulares. Esses tumores correspondem à maioria (aproximadamente 85%) dos cânceres de tireóide. (1) Especialista em Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Doutorando em Clínica Cirúrgica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2) Ex-residente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (3) Especialista em Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Médica Preceptora do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (4) Doutor em Clínica Cirúrgica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Assistente do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (5) Professor Titular de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Instituição: Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Correspondência: Av Dr Enéas de Carvalho Aguiar, 255- 8º andar, sala 8174 – São Paulo, SP. E-mail: andré[email protected] Recebido em: 20/12/2006; aceito para publicação em: 20/01/2007. 2 Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 1, p. 2 - 5, janeiro / fevereiro / março 2007 Vários estudos determinaram a divisão dos pacientes com tumores bem diferenciados de tireóide em grupos de alto e baixo risco, de acordo com critérios clínicos e anátomopatológicos, como: idade, gênero, tamanho do tumor, extensão extra-tireoidiana e grau de diferenciação histológica. Os pacientes de baixo risco apresentam prognóstico significativamente mais favorável, com mortalidade abaixo de 2%. O tratamento dos carcinomas bem diferenciados de tireóide (CBDT) é essencialmente cirúrgico. A extensão da ressecção no grupo de baixo risco é controversa, com argumentos sólidos tanto a favor de tireoidectomia total quanto parcial. O seguimento clínico desses pacientes é influenciado pela conduta cirúrgica, sendo baseado na dosagem sérica de tireoglobulina e pesquisa de corpo inteiro com iodo radioativo (PCI). Considerando-se a realização de tireoidectomia total em todos os casos, entendemos que também o seguimento deva ser apropriado ao estágio e extensão da doença. Para pacientes com tumores bem diferenciados de tireóide menores que 1cm, alguns autores propõem que sejam realizadas apenas dosagens periódicas de tireoglobulina. Também é proposto que, para pacientes de alto risco, seja realizado um exame de PCI anual por até três anos. Outros ainda retiram a reposição hormonal para a dosagem de tireoglobulina. Atualmente, com a possibilidade da utilização de hormônio tireoestimulante (TSH) recombinante, o hipotireoidismo pode ser evitado. A dosagem de tireoglobulina estimulada, descrita no início da década de 90, firmou-se como exame mais sensível preditor de recorrência tumoral; e publicações atuais mostram bons resultados, aliando sua dosagem ao estímulo do TSH recombinante. Recente revisão realizada pela American Thyroid Association propõe, como diretriz de tratamento, a ablação de restos tireoidianos em praticamente todos os casos. A pesquisa de corpo inteiro deve ser realizada uma vez após esse procedimento, não havendo a necessidade de repetição desse exame se não houver captação fora do leito tireoidiano. A tireoglobulina é reafirmada como exame importante na avaliação inicial e no seguimento, devendo ser aferida sob supressão e repetida com estímulo de TSH, se a primeira dosagem for indetectável. No Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (SCCP-HCFMUSP), o tratamento padronizado é a tireoidectomia total. Após, são realizadas PCI e dosagens de tireoglobulina e anticorpo anti-tireoglobulina, estimuladas pelo TSH endógeno. A dose ablativa de I131 não é realizada em todos os casos, mas todos são submetidos a tratamento hormonal supressivo com levotiroxina. Indicamos tratamento complementar a todo paciente em que for diagnosticada captação fora do leito tireoidiano. Pacientes com captação elevada (acima de 1%) no leito são avaliados caso a caso e a indicação da ablação é feita tendo em vista seu risco baseado em dados clínicos e anátomo-patológicos. Nos casos sem necessidade de tratamento complementar, o seguimento faz-se, então, com dosagens semestrais ou anuais de tireoglobulina sob supressão hormonal e a PCI é repetida quando há suspeita clínica e/ou elevação da tireoglobulina sérica. Consideramos que, da mesma forma que o tratamento, o seguimento deve ser individualizado para os diferentes grupos de risco. Propomos nesse estudo, análise retrospectiva dos resultados de PCI, tireoglobulina com e sem estímulo de TSH com a intenção de identificar a importância relativa de cada um desses exames na detecção de doença e na indicação de terapia complementar no seguimento pós-operatório de pacientes com carcinoma bem diferenciado de tireóide de baixo risco conforme conduta do SCCP- HCFMUSP. PACIENTES E MÉTODO Foram estudados, retrospectivamente, através de análise dos prontuários médicos da Instituição, os casos de pacientes operados por CBDT no SCCP-HCFMUSP, no período de janeiro de 1999 a dezembro de 2004. Foram excluídos do estudo pacientes que apresentavam tipos histológicos mais agressivos, como carcinoma de células oxifílicas (células de Hürthle), carcinoma papilífero variante células altas ou tumores maiores de 4cm, extensão extratireoidiana e pacientes com dosagem sérica de anticorpo antitireoglobulina positiva. Os pacientes foram submetidos à tireoidectomia total seguida de PCI e dosagem de tireoglobulina pós-operatória com estímulo de TSH endógeno, conforme a rotina do serviço. Os pacientes foram avaliados de acordo com o gênero, idade, tipo histológico, tamanho do tumor, dosagem de tireoglobulina sérica com e sem estímulo de TSH e PCI. A dosagem de tireoglobulina sérica foi aferida através do método imunofluorimétrico e considerada positiva quando o resultado foi maior ou igual a 1 ng/mL, nos casos de TSH suprimido e maior ou igual a 3 ng/mL nos casos de TSH acima de 30 ìU/mL. A PCI foi realizada com administração de 2-3 mCi de iodo131 e foi considerado positivo o resultado maior do que 4 % na captação após 24 horas. Foram analisados os dados de PCI, tireoglobulina estimulada por TSH e tireoglobulina sem estímulo. A associação dos métodos PCI e tireoglobulina estimulada foi considerada o padrão-ouro para cálculo da sensibilidade e da especificidade. RESULTADOS No período estudado, foram operados 211 casos de CBDT de tamanho igual ou inferior a 4cm, sem doença extra-tireoidiana com os seguintes diagnósticos histopatológicos : Tabela 1 – Casos de CBDT operados no HCFMUSP entre 1999 e 2004, classificados por tipo histopatológico. Tipo histopatológico Número de casos Carcinoma papilífero clássico 124 (58,7%) Carcinoma papilífero variante folicular 54 (25,5%) Carcinoma folicular 19 (9,0%) Após a exclusão dos casos pelos critérios acima listados, Carcinoma de 123 células oxifílicasFoi (Hürthle) 11 (5,2%) os dados permaneceram pacientes. possível recuperar completos de 85 pacientes que perfazem o grupo a ser Carcinoma papilífero variante células altas 3 (1,4%) analisado. Desses, 81 eram do gênero feminino e 4 do masculino. A idade média foi de 44 anos. A análise dos pacientes e de seus exames de seguimento está resumida na tabela 2. Tabela 2 – Resultados dos exames iniciais de seguimento pós tireoidectomia total nos pacientes com tumores ≤4cm (total dos casos estudados). Tumores < 4 cm Positivo Negativo Total PCI 7 (8,2%) 78 (91,8%) 85 (100%) * Tireoglobulina; Valores positivos: PCI – 61 captação 4%; TG com Tg* estimulada 24 (28,2%) (71,8%)> 85 (100%) estímulo > 3; TG sem estímulo >1. Os dados foram analisados dois grupos: pacientes Tg* com TSH então suprimido 7 (8,2%)em 78 (91,8%) 85 (100%) com tumores entre 1 e 4cm e pacientes com tumores menores PCI +aTg* estimulada 26 (30,5%) 59 (69,5%) 85 (100%) ou iguais 1 cm (tabelas 3 e 4). Tabela 3 – Resultados dos exames iniciais de seguimento pós 3 tireoidectomia total nos pacientes com tumores ≤1cm. Tumores < 1cm Positivo Negativo Total PCI 2 (6,2%) 30 (93,8%) 32 (100%) Tg estimulada 12 (37,5%) (62,5%) 32>(100%) Valores positivos: PCI captação > 4%; Tg20 com estímulo 3; Tg sem estímulo >1 Tg com TSH suprimido 4 (12,5%) 28 (87,5%) 32 (100%) Tabela 4 – Resultados dos exames iniciais de seguimento pós PCI + Tg estimulada 12 (37,5%) 20 (62,5%) 32 (100%) tireoidectomia total nos pacientes com tumores entre 1 e 4cm. Tumores entre 1 e 4cm Positivo Negativo Total PCI 5 (9,4%) 48 (90,6%) 53 (100%) Tg estimulada 12 (22,6%) 41 (77,4%) 53 (100%) Valores positivos: PCI captação > 4%; TG com estímulo > 3; TG sem Tg com 50 (94,4%) 53 (100%) estímulo >1TSH suprimido 3 (5,6%) PCI + Tg estimulada (5,6%) ao padrão-ouro, 50 (94,4%) 53 (100%) A sensibilidade da PCI em3relação em todos os casos estudados, foi de 26,9%. O mesmo valor (26,9%) de sensibilidade foi encontrado para tireoglobulina sem estímulo de TSH. Já a sensibilidade de tireoglobulina estimulada pelo TSH foi de 92,2% No grupo de pacientes com tumores entre 1 e 4cm, a sensibilidade da PCI foi de 35,0%. A sensibilidade da tireoglobulina sem estímulo de TSH foi de 21,4% e a da tireoglobulina com estímulo, de TSH foi de 85,7%. Entre os pacientes com tumores menores que 1cm, a sensibilidade da PCI foi de 16,6%. A sensibilidade da tireoglobulina sem estímulo de TSH foi de 33,3% e a da tireoglobulina com estímulo de TSH foi de 100%. Em todos os casos em que a dosagem de tireogloulina sem estímulo foi positiva, observamos que a dosagem com estímulo também o foi. Não se observaram casos com captação na PCI igual a zero. DISCUSSÃO O câncer bem diferenciado de tireóide tem, em geral, comportamento pouco agressivo. Vários fatores que influenciam a evolução foram identificados com o objetivo de categorizaremse pacientes em relação ao prognóstico. Dessa forma, foi identificado um grupo de pacientes em que se espera evolução favorável e baixa mortalidade relacionada à doença, ao qual denominamos grupo de baixo risco. Os principais fatores prognósticos envolvidos são a idade, metástases a distância, extensão extra-tireoideana, gênero, grau de diferenciação histológica, tamanho do tumor e radicalidade da ressecção, que foram agrupados em diferentes índices prognósticos por vários serviços. Nessas casuísticas, foi observada sobrevida de 85 a 92,5% para os pacientes de baixo risco. A partir dessa análise, alguns Serviços, como o Memorial Sloan Kettering Cancer Center, propuseram conduta diferenciada para o grupo de baixo risco, com tireoidectomia parcial. A extensão da cirurgia é assunto controverso na literatura. Em nosso Serviço realizamos a tireoidectomia total, que é adotada por muitos dos grandes centros, sob a argumentação de que muitos carcinomas papilíferos podem ser multifocais ou bilaterais. Schlumberger argumenta que a retirada de toda a glândula facilita a ablação com I131. Essa prática facilitaria o 4 seguimento pós-terapêutico com tireoglobulina e diminuiria os índices de recidiva. O seguimento pós-operatório, associado ou não a radioiodoterapia, é baseado na PCI e dosagem periódica de tireoglobulina com e sem estímulo de TSH. É também realizada, em alguns serviços, PCI anual por tempo de seguimento variável, associada à dosagem de tireoglobulina. No entanto, não há consenso entre os protocolos propostos na literatura. A tendência atual é a valorização da tireoglobulina como marcador, estimulada e não estimulada em detrimento da realização peródica de PCI. No SCCP – HCFMUSP, realizamos, para o grupo em estudo, PCI e dosagem de tireoglobulina com estímulo e sem estímulo de TSH. Da mesma forma que para o tratamento, acreditamos que o seguimento deva ser individualizado para os grupos de baixo e alto risco. Analisamos, portanto, os resultados dos exames de seguimento dos pacientes com tumor de baixo risco. Nossa casuística mostra que o exame mais sensível, individualmente, é a tireoglobulina com estímulo de TSH (sensibilidade de 92,2%), o que está de acordo com a literatura, enquanto que a PCI e a tireoglobulina sem estímulo têm sensibilidade de 26,9%. Em estudos anteriores, foi comparada a eficácia das dosagens de tireoglobulina sérica com e sem estímulo de TSH e a PCI. Verificou-se que a tireoglobulina sem estímulo e a PCI são exames complementares e que a dosagem de tireoglobulina com TSH alto é mais sensível. Selecionamos como padrão-ouro, para a avaliação pósoperatória, a PCI em conjunto com a tireoglobulina estimulada por TSH. Os métodos aqui considerados como padrão-ouro para o seguimento desses pacientes são os mais aceitos na literatura. Avaliamos separadamente os pacientes com tumores menores que 1cm, grupo cada vez mais freqüente na prática clínica devido ao aumento no diagnóstico precoce pela popularização do ultra-som e ao seu aperfeiçoamento tecnológico. Nesse grupo, não houve casos em que a PCI fosse positiva com tireoglobulina estimulada negativa, sendo assim a sensibilidade da tireoglobulina estimulada pelo TSH foi de 100%, enquanto a da PCI foi de 16,6% e a da tireoglobulina sem estímulo de TSH foi de 33,3%. É ainda importante observar que, nessa casuística de avaliação inicial, nenhum paciente comprovadamente apresentou doença residual ou extra-tireoidiana detectável, no entanto, todos tiveram PCI com alguma captação residual no leito. Essa observação faz questionar a relevância clínica desses achados e a necessidade de ablação do leito tireoidiano com iodo em todos os casos. É bem documentado que, após a realização da tireoidectomia total, existe alguma captação residual no leito tireoidiano e também que a tireoglobulina sérica é baixa, mas não necessariamente indetectável. Esse fato corriqueiro não se deve à má técnica operatória, mas a células tireoidianas normais que se encontram no leito da glândula. Portanto, a interpretação dos exames de seguimento deve ser criteriosa e individualizada e acreditamos que a dose terapêutica de iodo radioativo não deve ser administrada para todos os pacientes. Em nosso Serviço, não é realizada terapia adjuvante para pacientes de baixo risco que apresentam captação residual em leito tireoidiano de até 4% da dose de I131, sem captação fora do leito tireoidiano e dosagem de tireoglobulina sérica inferior a 1ng/mL, sem estímulo de TSH ou inferior a 3ng/mL sob estímulo de TSH. Ainda com o objetivo de aumentar a sensibilidade na detecção precoce de doença residual ou recidivada, em estudo recente, foi avaliada a dosagem sérica de RNA mensageiro da tireoglobulina, que parece ser promissora, mesmo quando há presença de anticorpos anti-tireoglobulina. Parece claro que a dosagem de tireoglobulina com estímulo de TSH e a dosagem do RNA mensageiro de tireoglobulina são exames mais sensíveis, mas não está evidente ainda o significado clínico desses achados, especialmente analisados face ao comportamento relativamente favorável da maioria desses casos. Dessa forma, a imposição de hipotireoidismo ou de um custo adicional importante para esses pacientes, especialmente os de tumor menor que 1cm parece-nos questionável. Estudo definitivo sobre o assunto deve ser duplo cego, aleatório, com a avaliação de sobrevida relacionada à doença ou sobrevida livre de doença, o que necessitaria de grande número de casos e muitos anos de acompanhamento. A resposta desta questão pode ser elaborada tendo em vista os avanços em biologia molecular, em especial os marcadores de agressividade, como a expressão de BRAF, que recentemente foram descritos31. Os avanços recentes que aumentaram a sensibilidade dos métodos e da possibilidade de TSH recombinante têm-se mostrado extremamente úteis nos seguimento de pacientes de alto risco. No entanto, no grupo de baixo risco, mais numeroso, a utilização da tireoglobulina sem estímulo poderia ser suficiente. REFERÊNCIAS 1. Hundahl SA, Cady B, Cunningham MP, Mazzaferri E, McKee RF, Rosai J, Shah JP, Fremgen AM, Stewart AK, Hölzer S. Initial results from a prospective cohort study of 5583 cases of thyroid carcinoma treated in the united states during 1996. U.S. and German Thyroid Cancer Study Group. An American College of Surgeons Commission on Cancer Patient Care Evaluation study. Cancer. 2000;89(1):202-17. 2. Schlumberger M, Baudin E, Travagli JP. 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