ARTIGO_OPINIAO_Promover a leitura junto das crianças e dos

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Promover a leitura junto das crianças e dos jovens
A leitura não é algo de inato, adquire-se progressivamente ao longo da vida e necessita de modelos
de aprendizagem e de tempo, constituindo um percurso muito cuidadoso, sem passos em falso. E
esse caminho inicia-se o mais cedo possível. “O pressuposto aqui é que a leitura é uma prática
social – no sentido em que é construída nas relações entre os indivíduos – que é uma prática
situada, que está para além das instâncias texto-leitor, sendo antes o resultado de uma acção
orquestrada por um conjunto vasto de agentes e discursos que participam na definição do que conta
como leitura, quais as características socialmente válidas para se ser leitor, como se debe ler e o
que se debe ler” (Dionísio, 2000).
Os estudos (investigação) apontam para uma benéfica relação prematura com os livros e com a
leitura, que se inicia necessariamente de forma afectiva, com a família como mediadora. Durkin,
citada por Bernice Cullinan, refere-se às crianças “paper and pencil”, como aquelas que têm alguém
para responder às suas perguntas. Contar histórias, ler em voz alta, ler diante dos filhos, ter uma
biblioteca em casa, comprar e oferecer livros, ir com os filhos a livrarias e bibliotecas e seleccionar
os livros adequados, são tarefas que os primeiros mediadores de leitura, os pais, podem fazer. É
necessário que as bibliotecas em rede incluam projectos de leitura prematura, envolvendo os país e
instituições diversas. Dou aqui o exemplo do projecto “1,2,3, vamos ler outra vez”, que está prestes
a iniciar-se no concelho de Carregal do Sal e que envolve a Rede Concelhia de Bibliotecas e o
Centro de Saúde, já referido em reflexão anterior, e que pretende o relacionamento com os livros, do
grupo etário dos 0 aos 2 anos, através do envolvimento parental e no qual me incluo como
colaborador.
O objectivo final é a autonomia do leitor, num continuum em que diferentes mediadores intervêm.
Clay, citado por Cullinan, refere-se à “literacia emergente”, isto é, a ideia de que aprender a ler e
escrever se inicia muito cedo na vida e segue progressivamente.
“Aprende-se, primeiro, o processo mecânico a partir do código de escrita, depois a sintaxe e numa
terceira fase, a forma como as inscrições nesse código servem para conhecer, de uma forma
profunda, imaginativa e prática, a nossa identidade e o mundo que nos rodeia. Essa terceira etapa é
a mais difícil, a mais perigosa e a mais poderosa” (Manguel, 2006). O autor compara a história de
Pinóquio, “que aprendeu a ler, mas não se transformou num leitor, porque, apesar de ter aprendido a
descodificar o alfabeto, não aprendeu a ler em profundidade, a entrar num livro e a explorá-lo até
aos seus limites” e relaciona-a com a de Alice (no País das Maravilhas) : “no seu mundo, a
linguagem recupera a sua ambiguidade essencial e qualquer palavra pode usar-se para dizer o que
o falante deseja”. Conclui que ”enquanto no mundo de Pinóquio o significado de uma história
impressa é inequívoco, no mundo de Alice o significado de qualquer palavra depende da vontade do
seu leitor”. Aprender a ler consiste em adquirir os meios para se apropriar de um texto.
Sendo a leitura essencial “para viver a vida na sua plenitude” e “ para se beneficiar do conhecimento
acumulado da civilização” (Cullinnan, 2000), na inversão dessa curva descendente, cujo ponto mais
baixo corresponde ao final do 3ºciclo, o papel da escola e da biblioteca escolar adquire, ao longo da
formação dos jovens, papel essencial. “A escola é um lugar de iniciação ao mundo dos adultos e
educar é um processo lento e difícil e Pinóquio só poderá aprender se não tiver pressa e só se
converterá num indivíduo pleno através do esforço pleno para aprender” (Manguel, 2006). Diz ainda
o mesmo autor que “é bastante fácil ser superficialmente letrado, seguir uma comédia televisiva,
entender a mensagem de um anúncio publicitário, ler um slogan ou usar um computador. Mas para
chegar mais longe e de uma forma mais profunda, para ter a coragem de enfrentar medos, dúvidas e
segredos ocultos, para questionar o funcionamento da sociedade, necessitamos de aprender a ler
de outra maneira, que nos permita aprender a pensar.”
“A verdade incontestável é que o acto de ler é fundamental na formação académica do aluno e que
uma considerável parcela de responsabilidade no desenvolvimento das habilidades de leitura recai
sobre a escola. Mas igualmente incontestável é a constatação de que a escola, salvo raras
excepções, tem falhado nessa tarefa” (Villiardi, 1997). Pergunta ainda a autora: “Para a formação
integral do indivíduo, o que importa é criar o hábito ou o gosto pela leitura?” A escola tem tentado
criar hábitos de leitura, mas esse hábito não tem perdurado, nem é suficiente para que se criem
leitores para toda a vida. É necessário trabalhar a leitura na escola, de uma forma mais ampla, em
actividades de pré-leitura, actividades durante a leitura e actividades após a leitura, “e que o material
sobre o qual se trabalha seja capaz de levar o aluno a descobrir a sua capacidade libertadora e
criativa.” O paradigma do manual deve ser ultrapassado pelo texto literário e as leituras obrigatórias,
“associadas à elaboração de uma interpretação correcta, que impede o aluno de ver o livro como um
instrumento de prazer”, acompanhadas por leituras paralelas, com elas relacionadas ou não, mas
que despertem o gosto pela leitura.
Cullinan cita Watkins e Edwards (1992) que acrescentam que as atitudes dos professores em
relação à leitura afectam significativamente o número de estudantes que lêem em casa. “A
mediação é uma atitude, um recurso didáctico na construção partilhada do conhecimento”
(Arizaleta, 200?). Os professores são os mediadores privilegiados entre os alunos e os livros e no
envolvimento das famílias em programas de leitura.
Que recomendações seguir para promover a leitura junto dos adolescentes? Segundo os
resultados dos estudos do NAEP, evidenciados por Searls, Meed e Ward (1985), também citados
por Cullinan, a idade é um factor determinante no tempo que os jovens ocupam a ver TV e no tempo
que ocupam em leitura autónoma e que esse mesmo tempo ocupado com a leitura decresce na
média adolescencia e volta a subir de novo um pouco mais tarde. Nesta última fase alteram-se as
leituras. Encarar-se a leitura como uma forma de ócio, compatível com muitas outras, voluntária e
nunca imposta, relacionar a leitura com outros interesses do adolescente, como a música e os
textos que a suportam, promover a partilha de leituras, respeitar os seus gostos, e as diversas
formas de leitura e suportes de leitura e envolver mediadores activos e significativos nas suas vidas,
são caminos possíveis. “Os programas comuns desenhados para promoverem a leitura nas
escolas, casas e bibliotecas, incluem o acesso a material diversificado que faz apelo a todos os
níveis etários e gostos, envolvimentoparental activo, parcerias entre a escola e outras instituições e
a colaboração entre adultos significativos nas vidas dos estudantes” (Cullinan, 2003).”Trata-se de
um trabalho pessoal que respeita a país, educadores, orientadores e professores, distintos actores
do sistema educativo que é um sistema de factores em interacção...”(Arizaleta, 200?).
Bibliografia
ARIZALETA, L. (2004). Trece ideas para aficionar a la lectura. Cadernos de literatura infantil e
juvenil, ano 17, nº 171, 2004, 30-36.
CULLINAN, B. (2000). Independent reading and school achievment. School Library Media
Research, vol. 3, 2000.
DIONÍSIO, M. L. T. (2000). Histórias da leitura. Malasartes, nº 4, 18-26.
MANGUEL, A. (2007). Como Pinóquio aprendeu a ler. Noesis, nº 68, 24-28
VILLARDI, R. (2002). Formação de leitores. Estratégias para uma metodología do gosto.
Palavras, nº 21, 23-30.
José Alberto Moreno
Reflexão sobre a promoção da leitura. Problemas e Desafios da Biblioteca Escolar, 4º Mestrado em
Gestão da Informação e Bibliotecas Escolares. Universidade Aberta, Janeiro de 2009.
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