Sistemas de informação em saúde: considerações gerais

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Artigo de Revisão
J. Health Inform. 2010 Jan-Mar; 2(1): 20-4
Sistemas de informação em saúde: considerações gerais
Health information system: general considerations
Heimar de Fátima Marin1
Descritores: Sistema de informação
em saúde; Informática médica;
Tecnologia da informação
RESUMO
Keywords: Health information
system; Medical informatics;
Information technology
ABSTRACT
Autor correspondente: Heimar de
Fátima Marin
E-mail: [email protected]
1
O artigo apresenta alguns conceitos e exemplos em sistemas de informação em saúde, destacando a
importância dos dados, informações e conhecimento utilizados na área de saúde para sustentar o
planejamento, o aperfeiçoamento e o processo decisório dos múltiplos profissionais da área da saúde
envolvidos no atendimento aos pacientes e usuários do sistema.
The article presents general concepts and examples related to health information systems, highlighting
the importance of data, information, and knowledge in health care to support planning and
improve the decision making process providers use in their clinical practice and as users of health
system.
Professora Titular, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Brasil.
Artigo recebido: 10/01/2010
Aprovado: 23/03/2010
www.jhi-sbis.saude.ws
Marin HF.
INTRODUÇÃO
Os Sistemas de informação em saúde (SIS) podem
ser definidos como um conjunto de componentes interrelacionados que coletam, processam, armazenam e
distribuem a informação para apoiar o processo de
tomada de decisão e auxiliar no controle das
organizações de saúde. Assim, os sistemas de informação
em saúde congregam um conjunto de dados,
informações e conhecimento utilizados na área de saúde
para sustentar o planejamento, o aperfeiçoamento e o
processo decisório dos múltiplos profissionais da área
da saúde envolvidos no atendimento aos pacientes e
usuários do sistema de saúde.
Diversos termos têm sido usados para descrever
sistemas de informação em saúde computadorizados
ou informatizados, tais como, registros eletrônicos de
saúde e registro médico eletrônico(1). Ambos são usados
praticamente como sinônimos e são bem comuns na
literatura, apresentando também aspectos semelhantes
quanto à definição. Porém, via de regra, os termos
Sistemas de Informação em Saúde e Registro Eletrônico
de Saúde são termos usados para descrever sistemas
mais gerais, com conceitos mais globais, enquanto que o
termo Registro Médico de Saúde representa um sistema
mais específico, um registro mais localizado.
Como premissa básica, o sistema de informação em
saúde deve contribuir para a melhoria da qualidade, da
eficiência e da eficácia do atendimento em saúde,
possibilitando a realização de pesquisa, o fornecimento
de evidência e auxiliando no processo de ensino. Assim,
como finalidades principais, pode-se afirmar que um
SIS deve servir para gerenciar a informação que os
profissionais de saúde precisam para desempenhar as
atividades com efetividade e eficiência, facilitar a
comunicação, integrar a informação e coordenar as ações
entre os múltiplos membros da equipe profissional de
atendimento, fornecendo recursos para apoio financeiro
e administrativo(2).
A eficiência está relacionada à otimização do uso de
recursos para a realização dos diversos processos
desempenhados pelos profissionais, quer seja no cuidado
direto, quer seja na administração. Eficiência melhora os
processos e a efetividade deve facilitar o entendimento
sobre como os usuários querem ser atendidos,
fornecendo assim, indicações sobre como os processos
devem ser planejados ou mesmo revistos para atingir as
metas pretendidas.
Entendendo que o sistema de informação em saúde
é composto de várias soluções em termos de
desenvolvimento de sistemas informatizados, pode-se
citar, a critério de exemplos, os sistemas de enfermagem,
sistemas de farmácia e nutrição e sistemas de
contabilidade como soluções para promover a eficiência
dos processos de saúde. Por outro lado, os sistemas de
cobrança e de previsão orçamentária são exemplos de
soluções para maximizar os benefícios dos serviços
prestados, promovendo maior eficácia. Já os sistemas
21
de telemedicina e de imagem e os sistemas especialistas ou
de apoio à decisão, são excelentes exemplos de soluções
para auxiliarem na obtenção de maior efetividade,
promovendo melhores práticas para melhoria do
atendimento.
Vale lembrar que todo e qualquer atendimento em
saúde pressupõe o envolvimento e a participação de
múltiplos profissionais: médicos, enfermeiros,
nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas e outros. As
atividades de atendimento ao paciente também são
realizadas em diferentes lugares, tais como sala de cirurgia,
enfermarias, ambulatórios, unidades de cuidado intensivo
(UTI) e casas de repouso, dentre outros.
Para viabilizar tais atividades em saúde, múltiplas
informações sobre o estado do paciente são necessárias.
Por outro lado, os procedimentos realizados por cada
profissional também geram outras tantas informações, que
vão garantir a continuidade do processo de cuidado. São
fontes diferentes de dados, gerando conseqüentemente
diferentes informações. Para tanto, estes dados precisam
ser agregados e organizados de modo a produzir um
contexto que servirá de apoio para tomada de decisão
sobre os tipos de tratamento, aos quais o paciente deverá
ser submetido, orientando todo o processo de atendimento
à saúde de um indivíduo e da população.
Oriundo de fontes variadas e usado com múltiplos
propósitos, o dado clínico tem como característica
predominante a heterogeneidade, muitas vezes não
adequada aos tradicionais sistemas de informações, onde
a integração nem sempre é privilegiada.
Ainda, ao considerar as características de um sistema
de saúde tradicional, pode-se dizer que a predominância,
na maioria dos países, é de um sistema fragmentado, com
ênfase nas super-especialidades e no tratamento de doenças,
tendo o hospital como centro principal de atendimento,
com alto custo e baixa qualidade(3). Neste cenário, a solução
informatizada que predomina são os sistemas
departamentais, ou seja, sistema de farmácia, sistema de
admissão, transferência e alta hospitalar, sistema de centro
cirúrgico, sistema de prescrição médica, dentre outros. Tais
sistemas nem sempre apresentam características de
integração e interoperabilidade.
O modelo de sistema de saúde mais atual que tem
sido buscado por diversos países é o modelo que possui
maior integração, onde o atendimento primário e
ambulatorial são dominantes, em contraste com o
atendimento hospitalar puro. A equipe é multidisciplinar,
os procedimentos e tratamentos baseados na melhor
prática. A organização como um todo é baseada na
informação e a solução informatizada é o Prontuário
Eletrônico do Paciente (PEP)
O Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP) surgiu então,
como uma proposta para unir todos os diferentes tipos
de dados produzidos em variados formatos, em épocas
diferentes, feitos por diferentes profissionais da equipe de
saúde. O prontuário eletrônico do paciente é um registro
que reside em um sistema especificamente desenhado para
apoiar os usuários, fornecendo acesso a um completo
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conjunto de dados, sistemas de avisos e alertas, sistemas
de apoio à decisão e outros recursos(4).
De modo geral, o princípio básico de construção
do PEP baseia-se na integração da informação. Assim,
uma vez coletada a informação, ela é registrada em
um deter minado formato para fins de
armazenamento e tal registro para a ser fisicamente
distribuído entre os hospitais, agências de seguro-saúde,
clínicas, laboratórios e demais setores envolvidos,
sendo compartilhado entre os profissionais de saúde,
de acordo com os direitos de acesso de cada um(5).
O PEP é também apresentado como recurso para
atender as atuais demandas dos serviços de saúde.
Atualmente, observa-se uma mudança nos modelos
de serviços de saúde e a tecnologia de informação
precisa, conseqüentemente, mudar para continuar
atendendo as necessidades de seus usuários.
O desafio para a criação do PEP ainda é grande,
devido à complexidade envolvida. Sistemas integrados
pressupõem não somente serviços e organizações
integradas, mas principalmente, profissionais
integrados. Este aspecto caracteriza, muitas vezes, uma
das barreiras para a adoção de um PEP.
De modo geral, a tecnologia não é o problema
para se fazer a integração de sistemas de saúde e sim,
a solução. Nos últimos anos, como regra pode-se
obser var que o poder de processamento dos
computadores dobra a cada ano, diminuindo cerca
de 50% do custo. Dos recentes recursos
computacionais disponíveis, que favorecem o
desenvolvimento de um PEP, destacam-se:
- A internet e seu alto poder de conectividade,
permitindo que instituições geograficamente distantes
compartilhem seus dados;
- Os softwares de navegação, onde a busca, a
pesquisa e a transferência de informação se viabilizam
com sucesso, demonstrando potencial expansão de
mercado para a adoção de padrões;
- A intranet, que usando os mesmos formatos da
internet, oferece maior segurança e proteção dos dados.
Assim, enquanto que na década de 1980, os sistemas
de informação em saúde informatizados eram
sistemas isolados, na década de 1990 passaram a ser
mais integrados. Ou seja, já havia a possibilidade de
comunicação e integração entre sistemas localizados
em diferentes locais geográficos, em diferentes
hospitais ou serviços de atendimento em saúde. A
partir do ano 2000 e que vemos hoje, são sistemas
que buscam tirar proveito dos recursos tecnológicos
disponíveis e com isto, buscam promover a integração.
Mas, o problema ainda existe e pode continuar
existindo na próxima década. Da forma como foram
construídos e, dependendo do modelo utilizado de
implantação e distribuição, os sistemas hoje utilizados
nos mais diversos países, apresentam desafios enormes
para atingirem níveis básicos de integração e
interoperabilidade.
A interoperabilidade básica se faz mediante troca
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de padrão de mensagens entre sistemas. A
interoperabilidade funcional requer que a informação
seja legível aos humanos e descreve uma sintaxe padrão
de mensagens entre sistemas. Vale ressaltar ainda a
interoperabilidade semântica, onde a informação
compartilhada é entendida pelos sistemas, ou seja, os
sistemas realizam um acordo formal sobre os conceitos
envolvidos nas trocas e pressupõem o uso de
vocabulário padronizado nas mensagens.
Assim, para que se consiga estabelecer
interoperabilidade, é preciso que o usuário esteja
convencido do valor proposto pelos padrões e que
estes padrões (de registro, comunicação e
documentação) sejam implantados e aderidos.
Outro fator importante na área de sistemas de
informação em saúde a ser considerado é a
comunicação. Os profissionais de saúde utilizam boa
parte de seu tempo útil de trabalho em processos de
comunicação – seja escrita ou falada. Estima-se que
os médicos usam cerca de 38% e os enfermeiros 50%
do seu tempo escrevendo. Ainda, 35 a 39% dos custos
de um hospital são devido a comunicação entre os
profissionais e destes com os pacientes(6). No total,
12 a 45% do custo em saúde é atribuído aos custos
associados com o manuseio da informação.
Informação é a essência da profissão. Os
profissionais de saúde precisam de informação para
poder exercer processo de cuidado, de gerenciamento,
de avaliação. Ou seja, todas as atividades em saúde
estão relacionadas com a busca e o uso da informação.
Neste sentido, quanto melhor os sistemas
informatizados conseguem registrar, armazenar e
disponibilizar esta informação, tanto melhor será o
ato do profissional – melhor informação, maior
qualidade na tomada de decisão.
Decisão é um exercício constante da prática de
saúde. Os computadores e recursos tecnológicos
podem auxiliar de forma direta e indireta. O apoio
indireto diz respeito ao uso de sistemas de informação
hospitalar e sistemas de gerenciamento de prontuário
eletrônico do paciente, por exemplo, que fornecem a
informação que vai subsidiar o ato decisório.
O apoio direto está relacionado com o uso de
sistemas desenhados para auxiliarem na elaboração de
diagnósticos, tratamentos e até mesmo no
estabelecimento de perfis prognósticos. São os
chamados sistemas de apoio à decisão, que são
sistemas desenvolvidos para serem usados por
profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, dentistas,
psicólogos, nutricionistas e outros), como suporte no
processo de tomada de decisão. São sistemas que atuam
diretamente para diminuir a ocorrência de erros,
salvaguardando a segurança do paciente.
Desde que o erro humano pode ser considerado
quase sempre criativo e inesperado, o uso de
computadores e sistemas computacionais deve ser
empregado de forma a diminuir as chances de
ocorrência de erros. Assim, deve-se poder contar com
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Marin HF.
sistemas de informação que façam com que seja mais
fácil realizar as ações de forma correta e mais difícil,
da forma inadequada ou incorreta. Sendo as máquinas
dependentes e passíveis de controle e predição, é de
se esperar que sistemas desenvolvidos com esta
finalidade, sejam uma grande valia para o aumento da
qualidade no desempenho das atividades humanas.
Os Sistemas de Informação em Saúde são
reconhecidos como instrumentos que aumentam a
efetividade dos profissionais e reduzem os custos em
saúde, assim como auxiliam na promoção da
padronização do cuidado. No entanto, embora os
sistemas de prescrição médica computadorizada
existam há cerca de trinta anos, menos de 10% dos
hospitais americanos possuem um sistema deste tipo
totalmente integrado(7).
Nos Estados Unidos, um levantamento feito no
ano 2000, mostrou que a adoção de sistemas de
registros eletrônicos de saúde e prescrição eletrônica
era bastante restrita, o que parece não ter tido grandes
alterações atualmente. Embora mais de 90% dos
hospitais possuam alguma forma de uso de sistemas
computadorizados, menos de 10% dos hospitais
americanos implementaram o registro eletrônico(8) e
cerca de 16% dos médicos usavam tais registros(9).
De 2001 a 2004, somente 18% dos ambulatórios
utilizavam o registro eletrônico de saúde(10).
Em 2005, 25% dos médicos reportaram que
usavam parte ou completamente o registro eletrônico
para documentar as informações de consultas clínicas;
13% estavam com a adoção em andamento e 34%
planejavam adotar o registro eletrônico nos próximos
dois anos(11).
Ainda nos Estados Unidos, o Presidente George
Bush, em 2004, afirmou que o registro eletrônico de
saúde era um ingrediente crítico para melhoria do
atendimento em saúde à população e que no prazo
de dez anos, todo cidadão norte-americano deveria
ter seu registro de saúde informatizado. Outros países
como Austrália, Canadá, Dinamarca, França, Portugal,
Nova Zelândia e Inglaterra, apresentaram iniciativas
nacionais semelhantes. Os países em desenvolvimento
como Equador, Malásia, Kenya, Uganda, Chile e
Argentina, nos últimos anos, também estão utilizando
o registro eletrônico de saúde como solução para
documentação nacional(12-14).
O Brasil possui o terceiro maior sistema de saúde
no mundo, compreendendo sete mil hospitais, 25 mil
laboratórios, cerca de 17 mil clínicas e 125 mil
consultórios médicos. O uso de tecnologia da
informação é mais evidente para tarefas de rotina,
como agendamento, registros gerais, com cerca de 8%
dos hospitais usando sistemas computadorizados para
apoio nas atividades clínicas.
O FUTURO
Por certo, o desenvolvimento de um sistema de
informação computacional que seja capaz de coordenar
e integrar todas as informações em saúde é primordial
e essencial para garantir a qualidade de um atendimento.
Porém, o desenvolvimento deve ser muito planejado,
enfocando os setores onde será mais efetivo.
Outro fator que merece também atenção especial
e contínua é o processo educativo que deve
acompanhar qualquer processo de mudança. A
educação da equipe, do paciente, dos novos
profissionais deve ser priorizada para se alcançar o
sucesso com mais rapidez e eficiência.
O futuro pode, portanto, trazer, um sistema de
registro eletrônico de saúde desenhado para
proporcionar vantagem global da tecnologia e
aplicação de conceitos atualizados e consistentes com
o modelo de atendimento em saúde adotado; viabilizar
conectividade e cobertura geral, permitindo
acessibilidade onde o paciente estiver; utilizar uma
tecnologia que forneça aquilo que o profissional precisa
em termos de formato, conteúdo e tempo; permitir
projeção de necessidade de recursos para o
atendimento, estabelecendo métricas para avaliar o
resultado obtido, a qualidade do cuidado prestado, o
desempenho dos profissionais, as disparidades e a
eficiência do ser viço, permitindo progressivas
melhorias.
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