Divindade de Jesus e Tradição apostolica

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TERCEIRA EDIÇÃO
/--
OBRAS
DE
CAMILLO CASTELLO BRANCO
EDIÇÃO POPULAR
XIIII
DIVINDADE DE JESUS
OBRAS DE CAMILLO CASTELLO BRANCO
Edição popular, em volumes in-8.o de 200 a
impressa em bom papel, typo elzevir
300 paginas^
200 réis em brochura e 300 réis encadernado
VOIíUMES FUBIiICADOS
— Coisas espantosas.
2 — As três irmans.
3 — A engeitada.
4 — Doze casamentos
5 — O esqueleto.
6 — O bera
o mal.
7 — O senhor do Paço de Ninães.
—
Anathema.
8
9 — A mulher
10 — Cavar em ruinas.
He 12 — Correspondência epis1
felizes.
e
fatal.
tolar.
13
14
15
16
— Divindade de Jesus.
— A doida do Candal.
— Duas horas de
leitura.
— Fanny.
—
Minho
—
22 — Agulha em palheiro.
olho de vidro.
23 —
24 — Annos de prosa.
—
Os brilhantes do brasileiro.
25
26 — A bruxa do Monte-Cordova.
27 — Carlota Angela.
28 — Quatro horas innoeentes.
29 — As virtudes antigas.
do Doutor Negro.
30 — A
31 — Estrellas propicias.
—
A
do regicida.
32
33 e 34 — O demónio do ouro.
35 — O regicida.
do arcediago.
36 — A
37 — A neta do arcediago.
38 — Delictos da Mocidade.
39 — Onde está a felicidade ?
40 — Um homem de brios.
41 — Memorias de Guilherme do
Amaral.
44 — Mysterios de Lis42, 43
boa.
45 e 46 — Livro negro de padre
Diniz.
47 e 48 — O judeu.
49 — Duas épocas da vida.
50 — Estrellas funestas.
51 — Lagrimas abençoada».
52 — Lueta de gigantes.
Novellas do
17, 18 e 19
Horas de paz.
20 e 21
filha
e
53 e 54
— Memorias
do cár-
cere.
5556-
Mysterios de Fafe.
Coração, cabeça e estômago.
57585960616263646566-
O
O
O
O
que fazem mulheres.
retrato de Kicardina.
sangue.
santo da montanha
Vingança.
Vinte horas de liteira.
A queda d 'um anjo.
Scenas da Foz.
Scenas contemporâneas.
O romance d 'um rapaz po-
bre.
6768-
Aventuras de Bazilio Fernandes Enxertado.
Noites de Lamego.
Scenas innoeentes da comedia humana.
Os Martyres.
—
70
71
72-
Um
73
A
livro.
Sereia.
Esboços de
74
apreciaçõe»
litterarias.
filha
75
76
Cousas leves e pesadas.
Theatro I
Agostinho de
filha
77
Ceuta.
O marquez de
Torres-Novas.
Theatro: II
Poesia ou dinheiro ?
Justiça.
Espinhos e flores.
Purgatório e Paraizo.
78
:
—
—
—
— Theatro
:
—
—
III
—
—O
—
Morga-
—
do de Fafe em Lisboa.
O
Morgado de Fafe amoroso»
— O ultimo acto. — Abençoadas lagrimas
—
Theatro IV — O condem79
nado. — Como os anjos se
vincam. — Entre a flauta e
a viola.
80
Theatro
V — O LobisHomem. — A Morgadinha
1
:
:
de Val-d'Amores.
DITUADE
DE JESUS
E
TRADIÇÃO APOSTÓLICA
POR
CAMILLO CASTELLO BRANCO
SÓCIO
Gom
DA ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS DE LISBOA
utna earta dirigida ao auetor
PELO SNR.
VISCONDE
nmm
^''^gt^g^^
TERCEIRA EDIÇÃO
LISBOA
PARCERIA ANTÓNIO MARIA PEREIRA
LIVRARIA EDITORA
44 a 5i
Bua Augusta—
1913
iVlODELO
DA
ESXANTIí:
especialmente construída para esta edição, em pitch-pine envernisado
com porta envidraçada
80 volumes a 300
Estante
24?^000
6|>000
réis
30|»000
Estante separadamente 6|>000
réis.
1913
OFPICINAS TYPOGRAPHICA E DE ENCADERNAÇÃO
Movidas a electricidade
RARCERIA
Rua
A.
Augusta, 44, 46
NI.
e
PEREIRA
48, í.» e 2.«
LISBOA
andar
Se eu obedecesse á consciência, que me está
dizendo quanto por demais é encarecido o merecimento d'esta obrinha, na carta que o snr.
Visconde de Azevedo se dignou dirigir-me com
o propósito de animar- me a escriptos de maior
vuíto, privaria o leitor de saborear-se nas pa-
ginas mais vigorosas e sublimes que vão n'este
livro, e
que decerto não são minhas.
snr. Visconde de Azevedo.
Pertencem ao
vem, espelhando a nobilissima alma
esclarecida intelligencia do modesto escriptor
Elias ahi
e
que, nas raras vezes que se amostra ao publico
com
as suas pensadas e primorosas lucubra-
sempre quão bom seria para as
pátrias que o snr. Visconde de Azevedo
ções, revela
letras
vivesse nas estreitezas da
má
fortuna, para en-
do seu alto
espirito pela moeda cerceada com que os trabalhos do entendimento são galardoados.
Ainda bem que não. Se por um lado as letras pátrias perdem, por outro ganhou o bem
estar do amigo a quem muito preso, e cuja vi-
tão ser obrigado a trocar as jóias
6
Divindade de Jesus
da tem sido e será sempre
tosa que a dos livros.
lição
mais provei-
Eu não cancellei d'estas paginas
que me favorecem, e não ouso já
gêam, que tanto
seria
dizer lison-
desprimorar o caracter
sério e justiceiro de S. Ex.*
que os preso, por que
os louvores
me
:
conservo-os por
nobilitam e defen-
dem.
Camillo Castello Branco.
.
.
.
Snr. Camillo Castello Branco.
Dignou-se V. dedicar-me o excellente livro
que escreveu em defeza da divindade de Jesus
Christo e ainda que para agradecer-lhe esta
singular honra que V. me dispensou, eu mal
;
encontre expressões eguaes ao subido valor
d'ella,
nem
porisso deixarei de significar a V.
o sentimento de satisfação, que excitou em
mim o ver que me foi dedicado este novo monumento sustentador da minha f^, profunda-
mente
christan, o qual ao
mesmo tempo que
presta mais um apoio fortíssimo á crença, de
que tanto me glorio, concede ao meu nome a
luminosa aureola, com que os homens de me-
recimento, por todos reconhecido e admirado,
illustram
sempre a pessoa, a quem dedicam
qualquer das suas bellas producções
E
fallando agora a respeito do
que
direi eu,
senão o que
em
litterarias.
mesmo
livro,
outro tertipo di-
8
Divindade de Jesus
zia Voltaire,
quando
fallava das tragedias
Racine, bom, excellente^ admirável!
zendo eu
um
isto,
não
ficará a
brado extremamente
por nada
já
E
de
ainda, di-
minha voz sendo
débil, e quasi inútil
poder accrescentar á geral e uni-
sona voz, que desde ha muito tem dado a V.
um
dos primeiros logares entre os nossos mais
Comtudo nem porisso
deixarei de expor nesta carta com franqueza a
V. as rasões da respeitosa homenagem que
primorosos escriptores
?
presto a este seu óptimo livro, não por parecer-
me
que com obulo tão apoucado posso augmentar a sua muita valia, mas unicamente
para desempenhar-me da obrigação,
V.
me
em que
quiz constituir.
Depois que a minha razão se desenvolveu^
e
que pôde comprehender a philosophia das
diversas religiões, e sobre tudo examinar a sua
origem, tenho estado sempre convencido de
que todos quantos, nascendo e educando-se
christãos, atacavam o christianismo, quer o fizessem com argumentos graves
com
chufas e sarcasmos, faziam
muito
dade.
e sisudos,
máo
Não
com
quer
isso
um
presente ao seu paiz e á humani-
digo isto por seguir a opinião dos
que afíirmam
que os
filhos
devem sempre
abraçar a crença religiosa de seus pães
;
opi-
9
Divindade de Jesus
nião
esta.^
quando muito, poderia somente
que,
no carvoeiro, de quem nos
ser tolerável
o chistoso poeta Paulino Cabral
um
:
não
falia
é decerto
verdadeiro christão aquelle, que tem
modo
tão grosseiro de pensar, contra o qual se pro-
nuncia expressamente S. Paulo quando estabelece que a
fé
em
Jesus Ghristo é
uma
sujei-
ção da ràzâo humana á palavra divina, mas
uma
— rationabile obsequium
sujeição rasoavel
— Estas
palavras do apostolo mostram clara-
mente que
elle
não ensinava, nem queria uma
mas sim uma fé esclarecida por
luzes, que devem guiar a nossa intel-
irracional,
fé
todas as
ligencia na indagação da verdade.
Não
é pois filha doeste erróneo e
acanhado
motivo a minha convicção sobre tão grave e
elevado assumpto; nem mesmo, pensando assim, podia eu ser
bom
não
começasse por condemnar os próprios apóstolos, que pregaram a todo o império romano
uma
religião
lógico, se primeiro
diametralmente contraria e op-
posta ao antigo paganismo; o
outro,
e
sem rodeios o
direi a V.
segundo eu a comprehendo,
frangivel
e
meu motivo
é
A
é
religião,
o único laço in-
permanente, que pôde servir de
prisão segura e firme ás tendências dissolventes
da humanidade,
e
o único centro
commum,
10
Divindade de Jesus
solido
bem
e
equilibrado, para. onde
podem
sem risco de se perderem no caminho os raios diversissimos, que partem da immensa peripheria social. Sem religião será sempre a existência da sociedade humana tão precária como o vento, tão ephemera como a
débil flor do campo, porque se achará sem a
só base, que lhe pode sustentar uma illimitada
duração. A crença religiosa assiste não só na
intelligencia do homem, mas também no seu
coração; consola-o e anima-o no abatimento
da desgraça, modera-o e o regula no deslumbramento da prosperidade; ella passa do in-
convergir,
dividuo á familia, e da familia á sociedade; e
sendo o ponto
commum, em que
todos concor-
dam, torna a sociedade essencialmente homogénea, e por consequência
também
os indiví-
duos essencialmente benévolos uns para com
os outros; e eis-aqui,
meu
amigo, explicada a
rasão de haver affirmado Montesquieu que a
religião
não
fazia
somente a nossa felicidade
na outra vida, mas que
já
mesmo
neste
mundo
a estabelecia.
As
leis
conter os
humanas podem temporariamente
homens nos limites do dever, mas,
susceptíveis sempre de se
garem, ou
sophisttiarem,
romperem, proster-
não podem por
si
sós
11
Divindade de Jesus
constituir
uma
sociedade.
A
longa e regular permanência da
baseada
religião pelo contrario
fé, que vê nella uma
mente do próprio Deus,
na
lei
e,
dimanada
como
directa-
Elle,
perma-
nente e immutavel, n'essa permanência e im-
mutabilidade offerece ao
homem
a idónea e se-
gura fiança de estabilidade, que as
podem
nas lhe não
ofFerecer,
leis
sem
e
huma-
a qual
o
seu animo jamais encontrará a tranquilla e perfeita
confiança,
trabalhar
em
dade. Se
isto
de que tanto necessita para
proveito seu, e da
mesma
socie-
assim não fosse, porventura
me
atrevera a perguntar a V. qual seria o negociante,
em
ou Banco commercial, que
se mettesse
grandes especulações, e arriscasse conside-
ráveis fundos na occasião
rigos e alterações
politica ? V.
em que
previsse pe-
imminentes á ordem
de certo
me
civil e
responderia apontan-
do-me para os grandes cataclysmos bolsaes,
que infelizmente se tem visto e vêem nas mais
famosas praças commerciaes da
terra; cataclys-
mos, cuja primeira origem raríssimas vezes
procede de causa superior e inevitável, mas
provem quasi sempre ou da malicia dos
homens, ou da insuííiciencia das suas leis; e é
esta mais uma prova de grande porte para. a
antes
minha consideração. Entendo eu que todo o
12
Divindade de Jesus
orbe terrestre é
uma grande
qual cada
sível;
um
com
tribue
praça commercial, a
de nós explora, e para onde con-
a porção de trabalho,
que nos
mas, apenas vemos introduzir- se
é pos-
n'ella
a
e a desordem, paramos immediatamente com a nossa exploração e trabalho; e
confusão
d'aqui se segue necessariamente que a
tal
pra-
ça de cada vez se confunda e desordene mais.
A
uma
estes males, e a
eguaes
e
infinidade de outros
ainda maiores, acode a religião
com
o principio immutavel da caridade divina, que
nos communica
;
e inabalável,
como
a rocha
marpesia, nos sustenta e dá sempre a precisa
força'para resistirmos
cia
ás
com
ondas amiudadas
invencível constâne furiosas,
que no
tempestuoso mar das paixões humanas promet-
tem tantas vezes dar cabo da sociedade, corrompendo-a primeiro para depois a destruir.
A
religião,
dos,
consolando os pobres
e os desvali-
anima-os a percorrerem corajosamente a
carreira trabalhosa d'esta vida terrena, porque
lhes assegura, na eternidade da que hade vir^
a infallivel recompensa do seu soífrimento e
resignada conformidade
tos da"^ Providencia
com
os motivos occul-
divina; ao
mesmo tempo
que,
ameaçando os
sam
das suas riquezas e poder, lhes apresenta a
ricos e poderosos,
que abu-
13
Divindade de Jesus
amapga do castigo sem
certeza
qual tem de curvar-se
privilegio
um
fim, debaixo
do
dia o seu desgraçado
de prevaricação, que n'este
mundo
souberam por tantas vezes e tão comesinhamente prorogar. FJstas ameaças incessantes são
na verdade muito desagradáveis a homens
af-
comprarem metade do mundo com o
seu dinheiro, e a esmagarem a outra metade
a
feitos
E
em
com
a
ellas
que o verdadeiro christianismo
sua força.
o seu
principio
amado
pelos
talvez
parte devido a
foi
desde
mais geralmente seguido e
pequenos, que pelos grandes; e
cabe observar aqui de passagem que entre todas as religiões conhecidas somente a do divi-
no Jesus estabeleceu
feita e
entre os
homens a
per-
verdadeira liberdade, declarando a egual-
dade absoluta de
cos para
com
que tinham os
fra-
os fortes.
E' pois evidente
que na
direitos
em
todo o ponto para
mim
religião verdadeira e pura, estabelecida
pelo divino Nazareno, consiste o enérgico cen-
cohesão que por tantos séculos tem con-
tro de
servado o grande globo social europeo, sem
que as poderosas forças perturbadoras que o
revolvem, o tenham até hoje podido dissolver.
A
juizo;
historia ahi está para confirmar
o
meu
vejam-se attentamente os annaes dos po-
14
Divindade de Jesus
VOS mais cultos e civilisados da antiguidade, e
ver-se-ha
como
todos
própria corrupção.
elles
acabaram pela sua
Os Egypcios,
os Persas, os
Gregos, e pode sem receio dizer-se que tam-
bém
tra
os antigos
Romanos, não deveram a ou-
cousa a extincção das suas nacionalidades.
Os Romanos estavam
já
completamente cor-
ruptos e perdidos quando Jesus Christo appare-
ceu sobre a
no,
terra, e
não
foi
mas sim o elemento
o elemento roma-
christão,
quem pôde
regenerar as nações modernas, herdeiras do
arruinado império dos Cezares, e sustental-as
até aos nossos dias
em um
e successivo, posto
progresso constante
que algumas vezes lento e
quasi imperceptível.
As gentes barbaras que vieram estabelecerse nas diversas províncias do velho império
romano,
já
desfeito
em
pedaços pela própria
podridão, conquistando-lhe o território e reco-
Ihendo-lhe a herança, teriam sem duvida con-
servado a sua barbárie natural,
costumes de
um
nem
as leis e
povo, que detestavam, pode-
riam servir para as amansar, domesticar e
lisar, se
o
christianismo se
civi-
não mettera de per-
meio entre conquistadores e conquistados, e
não fora adoçando e polindo a grosseira rudeza
dos primeiros, inoculando nelles a philosophia
:
Divindade de Jesus
nova
15
fecunda, que o doloroso sacrificio do
e
Calvário tornara praticamente applicavel a to-
dos os individuos, de que se compõe a
humana
sociedade, ricos e pobres, sábios e ignorantes,
poderosos
e desvalidos.
O
próprio Voltaire,
em
um momento de
enthusiasmo poético,
o seu
indisputavelmente superior, se
espirito,
e
quando
desembaraçou por um pouco das paixões do
orgulho e da vaidade, que infelizmente o trouxeram oífuscado por espaço de uma tão longa
vida, na sua bellissima tragedia de Alzira for-
mulou esta verdade sublime, pondo na boca de
Gusmão, que perdoa a Zamor seu assassino
pouco antes de expirar, as seguintes palavras
«Nossas diversas
religiões
contempla
«A tua te mandou assassinar-me,
«Que te ame ordena a minha, e te
;
perdoe.»
Mal pensava o encarniçado inimigo do
chris-
tianismo que nestas palavras admiráveis dei-
xava para sempre dada a mais lógica e eloquente resposta aos seus innumeraveis escriptos,
e á
sua travada guerra de sessenta annos
contra a religião do Crucificado.
Se o pantheismo materialista dos Gregos e
salvar da sua ultima ruina
estes dois povos, que tanto excederam em ci-
Romanos não pôde
16
Divindade de Jesus
vilisação a todos os outros da antiguidade
;
se
o magismo pérsico, pão obstante apoiar-se no
famoso
Zend-Avesla do celebre Zoroas-
livro
não pôde valer á vasta monarchia de Cyro
para que não fosse aniquilada pela invasão de
tro,
poucos milhares de Macedonios se o budhismo, e o brahmanismo não poderam desde os
tempos mais remotos até hoje fazer dos chins,
;
dos japonezes e dos indios senão
de selvagens sujeitos a
ganisação
sustenta,
uma
politica,
como
uma
uma
espécie
certa forma de or-
que ha tantos séculos os
se fossem
vermes, no meio de
perpetua e miserável corrupção; se o ma-
hometismo, apesar do seu autor
ter
appare-
cido muito depois de Jesus Christo, de cuja divina missão nada
com tudo
quiz saber, tem
em que
em que todo
parece-me ficar sendo uma
conservado por doze séculos os povos,
predomina, no estado mephitico,
o mundo os
vê,
cousa evidentíssima que só no christianismo
se
encontram elementos verdadeiros, que á so-
ciedade possam dar progresso que nunca retrograde, e liberdade que nunca se licenceie.
Não
foi moda no século pasmado
com exageração gongorica os ma-
ignoro que
engrandecer
que regiam as nações oriende quem acabo de fallar, quanto entre
gníficos governos,
taes,
17
Divindade de Jesus
ellas se
cias,
achavam adiantadas
as artes e as scien-
sobre tudo na China, e
eram
cultos religiosos
como
os seus
respeitáveis pela sua su-
blime moral, e até pela sua prodigiosa velhice
;
pois, lançadas
bem
as contas, se é verda-
de o que disseram alguns escriptores europeus,
a religião indo-china é muito mais antiga que
o próprio Adão. Estes prestigios históricos,
com que certos sábios nos quizeram embair,
tem-se desvanecido nestes derradeiros tempos;
e
quem
desejar saber quaes são os bons go-
vernos que aquellas pobres gentes desfrutam,
a felicidade que lhes doura a vida, o augmento de sciencias e artes que por lá vae, e os excellentes resultados práticos
que
ali
se
colhem
das revelações de Vichnu, e da moral de Confucius, pergunte aos inglezes e francezes,
em
que
nossos dias tem frequentado, e detidamen-
te visto aquelles paizes,
que descobriram
tas maravilhas.
qual é o
nelles a respeito
Também
bom
arranjo
de todas es-
o mahometismo par-
tilhou quinhão avultado nesta laudatoria teima
philosophica do século anterior; pretendeu-se
dar por verdade histórica demonstrada que as
nações christans na edade media eram barbaras por excellencia, e que, se
ção havia,
e
alguma
civilisa-
amenidade de costumes, mister
18
Divindade de Jesus
os
era procural-as entre os Árabes, dos quaes
europeus as receberam, durante o longo contacto,
que com os mesmos Árabes tiveram,
nas porfiadas guerras das cruzadas no
na lucta secular, que
já
existiu quasi
já
oriente,,
sem
in-
terrupção, na peninsula ibérica.
Não quero
que
ella se
contradizer esta asserção,
bem
podia contestar, comparando, por
exemplo, a corte de Carlos Magno, e mesmo,
nos pontos essenciaes, a de Constantinopla^
com
tes
as de
Bagdad
concordar
de Córdova; quererei an-
e
em que
os Árabes
excedian>
muito aos europeus d'aquelle tempo na extensão do seu commercio, na abundância e gran-
deza dos seus inventos
e artes, e até
n^
cultu-
ra das letras e dos costumes, sem que desta
minha concordância possa deduzir-se cousa al-
guma
contra o
meu
propósito. Se naquellas
cousas se achasse a prova de superioridade
essencial, já os antigos
pagãos a haveriam da-
do muito maior, pois ninguém
ja,
sem
precisar para isso de
scientifica,
ha,
que não ve-
uma grande
quanto a civilisação grega e a ro-
mana excederam
neste género á cultura chris-
tan da edade media.
A
escola voltaireana, que-
rendo a todo o custo desmoronar o
nismo,
e
luz
mostrar por meio destas
christia-
torcidas.
19
Divindade de Jesus
comparações com outros cultos e seitas religiosas, mesmo as mais absurdas, qual era a
insufficiencia e inutilidade delle,
como
religião
exclusivamente promotora da verdadeira
feli-
cidade e progresso da raça humana, confundiu
cega, ou maliciosamente as idéas de
lisação real e solida,
te
uma
civi-
que não consiste somen-
no gozo material de bellezas
e
amenidades
egualmente materiaes, mas cujo principio fun-
damental só do racional elemento pode vir á
sociedade, dando -lhe o seu verdadeiro
de
existir, e
modo
estabelecendo nella as relações de
homens uns aos outros
mutuamente se devem. Ora se esie principio não
benevolência, que os
tiver a sua
se
não
for
origem
e
permanente
o seu apoio
e immutavel,
em
Deus, e
como EUe,
ficará sujeito ás inconstancias e variações
manas
;
hu-
em um tempo resultados
produzirá em outro miseráveis
e se produzir
fascinantes, os
e desgraçadíssimos. E' assim
que nas vastas
e
melancólicas solidões do Sahara o terrível e
em montões enordo deserto em um lo-
abrasador Simun agglomera
mes
as areias ardentes
gar,
donde, quando novas fúrias o excitam, as
desloca e dispersa, para tornal-as a amontoar
d'ali
do
a muitas legoas de distancia; e os olhos
viajante,
que
em
duas occasiões diversas
20
Divindade de Jesus
houvessem observado aquelle mesmo
sitio, fi-
cariam espantados ao ver as longas e eleva-
em outro tempo ali enuma cordilheira immensa,
agora tristemente mudadas em plaino árido e dedissimas collinas, que
contraram formando
solado. Eis-aqui, segundo eu penso, a causa
por que a civilisação árabe se extinguiu do
mesmo modo, que
povos todas as
se extinguiram nos antigos
civilisações,
que a precederam;
em quanto que a civilisação christan, apezar
mesmo da prolongada incubação em que a reteve a grossa e duríssima crusta da edade
me-
nunca chegou a extinguir- se, antes conservou sempre vivaz o elemento immorredouro
da sua original essência.
Todas as vezes que os homens livremente
dia,
respirarem o ar vivificante da religião christan
apoiada na revelação divina, a alma se lhes
expanderá pelas regiões do
é necessariamente
sua
crença, e
chamada
infinito,
para onde
pela exegética da
daqui ha-de sempre nascer pro-
gresso e civilisação.
Todas
as outras crenças
apoiam ou somente na palavra dos homens ou em falsas divindades, ainda mais variáveis e extravagantes que os próprios homens,
podem sim durar por algum tempo e mesmo
que
se
por tempo dilatado
;
podem também
escoradas
21
Divindade de Jesus
na philosophia e nas
leis
humanas,
mais es-
e
força material, chegar a
pecialmente na
certo ponto de civilisação e de progresso
;
um
mas
nunca poderão passar além de uma meta limitada, e ou viverão uma vida imperfeita e pou-
ou perecerão completamente. Como a
sua exegética percorre um pequeno horizonte,
falta-lhes o meio principal de illustrarem a alco
feliz,
ma do homem,
e
va
e a virtude,
de que tanto carece para resis-
tir
ao tormentoso choque das paixões, quando
estas,
atacando
de lhe communicarem a
em
sei-
grandes massas a socieda-
de, se generalisam por toda ella.
Assim essa
sociedade, não crendo no infinito, que os seus
directores
alguma
ou
lhe occultam,
ou
lhe
negam,
e
sem
esperança no futuro providencial, que
desconhece;
em quanto
ainda conserva
um
resto de vigor, estorce-se entre as ruinas, es-
trebucha no meio da corrupção, e a
final ter-
mina pela morte, sem haver para ella verdadeiro elemento restaurador, que lhe possa conservar a vida.
Muito bem é sabido de V. que os philosophos mais sábios e virtuosos da antiguidade comprehenderam o quanto a sociedade hu-
mana
te
necessitava de
uma
religião
revelada; e que, conhecendo
divinamen-
elles
o vasio
22
Divindade de Jesus
monstruoso do paganismo idolatra, nunca com
tudo se atreveram a formular similhante revelação, cônscios da sua incompetência para mi-
a prever e desejal-a.
Quem
lêr
com
apenas
nistério tão alto, contentando-se
com
as obras de Platão, e principalmente
attenção
quem
es-
tudar na vida de Sócrates as suas acções e as
suas palavras, hade forçosamente convencer-
que
se de
estes
grandes espiritos preludiaram
a Jesus Christo, e quasi que o adivinharam.
Tal era todavia o seu amor á humanidade, que
apezar de conhecerem claramente a
falsa. e es-
que o seu paiz seguia, nenhum
pregou jamais contra ella, antes sabemos
religião,
téril
delles
que sacrificaram aos deoses,
messas a estes
dirigidas,
cidadãos. Por que seria
blico
que mostravam
e
cumpriram pro-
como faziam
tamanho
outros
respeito pu-
estes philosophos a
uma
religião,
cuja futilidade absurda perfeitamente
sabiam
Era porque estavam convencidos de
?
que não tendo na sua mão nem a
força,
nem
os
meios de estabelecer entre os seus compatriotas
uma
religião,
em que
estes cressem,
como
emanada de Deus, mais valia conservar-lhes a
em que elles criam, embora grosseira e falsa
em si mesma, que deixal-os totalmente sem algu-
ma
crença
;
porque para
um
povo que não crê
23
Divindade de Jesus
«m
Deus não ha religião possivel, e para o que
crê em Deus é só possivel a religião, que
^lle profundamente creia vir-lhe desse mesmo
Deus.
Platão, depois de haver meditado por largos
annos nesta gravissima matéria, disse que era
difíicil conhecer a Deus claramente, e mais difficil
ainda fazel-o conhecer ao povo. Se de entre
os philosophos seguidores da sua doutrina vie-
ram
os primeiros gentios illustrados, que
em
grande numero abraçaram o christianismo, é
porque viram por este realisada a grande idéa
regeneradora da humanidade, que o espirito
transcendente e justo do seu admirável mestre
tão antecipadamente aventara,
sem outro auxi-
que o da sua esclarecida e recta rasão,
€ quando muito o de uma imperfeitíssima noticia da religião hebraica. Alguém poderá di-
lio mais,
zer que
nem
todos os platónicos adoptaram o
christianismo, e que até alguns delles
houveram
que o combatessem,
seja verdade,
e eu não negarei que isto
porque os homens, ainda os mais
sábios e intelligentes, soíTrem ás vezes suas per-
turbações no giro, que devem fazer pela orbi-
do bem pensar, parecendo-se nisto com os
planetas, que também soffrem perturbações
em algum modo similhantes áquellas, apartanta
24
Divindade de Jesus
do-se mais ou
menos do curso
regular das
suas orbitas; porem todos os astrónomos con-
cordam em que
taes irregularidades
servem
para confirmar a regra, e não para a destruir.
Estas perturbações, que nos planetas procedem
de attrações reciprocas entre os corpos planetários,
já
procedem nos homens
das suas aífeições,
já
já
dos seus ódios,
dos seus interesses, já
finalmente de qualquer insignificante bellisca-
dura na sua vaidade.
Desta complicação de
causas nasce o serem muito mais numerosas^
e difificeis de explicar as perturbações
que as planetárias,
e estou
bem
humanas,
persuadido de
que V. se não recusaria a ajudar-me na despeza, que eu tinha de fazer em dar um grande
premio pecuniário ao astrónomo, a quem o
me explicar,
por exemplo, no planeta Júpiter, uma perturbação, que lá se visse similhante nem mais
nem menos á que o presente século já viu no
houvesse promettido, para este
minha intima convicção
Platão vivessem no tempo
celebre Lamennais. E'
que se Sócrates e
de Jesus Christo, teriam seguido a sua doutrina, e sido companheiros de S. Paulo em a propagar,
porque nella achariam a auctoridade
divina,
que debalde tanto procuraram, para
poderem ensinar aos homens uma
religião
no-
26
Divindade de Jesus
mas boa
va,
e verdadeira,
em que
estes po-
dessem e devessem crer. Nem outra foi a causa, que fez christãos os Clementes, os Justinos,
Origenes, os TertuUianos, os Agostinhos, e
os
tantos outros philosophos e
sábios illustres,
que abrilhantam os primeiros séculos da egre^
ja christan.
Se compararmos o christianismo com todas
as outras
religiões,
que tem havido
até hoje
no mundo, á excepção da Moisaica, acharemos, se a parcialidade e a paixão nos não cegarem, que nenhuma delias soíTre a compara-
Sem
ção.
em uma
eu querer agora entrar
dis-
cussão theologica, o que seria impróprio desta
carta,
permitta-me
V.
dizer somente
falsidade, a extravagância, e
religiões
pelos
delias
nasceram, e que
ro,
feito
o ridiculo dessas
foram cousas sempre comprehendidas
homens de verdadeiro
dentemente depois de
me
que a
saber, que no seio
isto se
demonstra evi-
um bem
pequeno exa-
nos escriptos de Aristóteles, de Cíce-
de Luciano. Ninguém ainda poude
em
evi-
dencia provar a falsidade do christianismo, e
se espíritos illustrados e superiores, por infeli-
cidade sua, não tem querido acreditar nelle, o
mais que chegaram a alcançar
ser verdadeiro
em
tudo,
foi
a duvida de
mas nunca
a certeza
26
Divindade de Jesus
de que era
fal$o. E"*
porque somente a revela-
ção moisaica e a christan, seu complemento,
se
fundam sobre bases rasoaveis
e justas,
em-
bora cercadas de mysterios, que se não com-
prehendem,
recem
e de certas circumstancias,
que pa-
inexplicáveis, sendo nestas bases rasoa-
veis e justas
que
se
também a fé
mesmos mysterios
funda
tan para crer esses
chrise cir-
cumstancias, que por agora se lhe tornam in-
comprehensiveis; e a
isto se
quando nos recommendava o
quium, de que nesta carta
Na
se
S Paulo
rationabile obse-
já fallei.
verdade, que vinha a ser a
Christo,
gelho e
referia
fé
em
Jesus
ordenada tão expressamente no evan-
em
quanto
todos os livros do novo testamento,
ella
nos manda crer podesse demons-
mathematicamente? Quando foi recompela mathematica aos seus adeptos fé
grande ou pequena para crerem que dois e dois
fazem quatro, e que quatro e quatro fazem
trar-se
mendada
Não são por tanto os mysterios christãos,
devem comparar-se aos mysterios das
outras religiões, como pretendem os modernos
oito ?
os que
incrédulos
;
pois é claro
que se de
uma
e outra
parte se apresentam mysterios, serão todos elles
egualmente incomprehensiveis e inexpli-
cáveis.
A comparação
sim deve fazer-se, mas
27
Divindade de Jesus
dão
estabelecem
que
os
de taes mysterios esses
é entre as rasões de credibilidade, que nos
para os crermos,
tendo
Ora,
querido
humana
rasão
como revelados por Deus.
lhe
o
mesmo Deus que
ficasse
a
sendo perpetua-
seguese que a essência necessária aos mysterios é a sua incomprehensibilidade, por não serem elles outra cousa,
mente
sujeite,
relativamente aos homens, senão o exercício
continuado
d*aquella
sujeição,
ca pela constância na
fé.
Deste
que
se
modo
verifi-
os pro-
poz sempre o christianismo aos seus segui-
nunca como adivinhações, ou enygmas, que se podessem explicar ou decifrar.
dores,
Os
e
incrédulos, attribuindo este ultimo ridículo
aos mysterios sagrados, para os classificar co-
mo
destemperos de
uma
phantasia .enferma, e
concluir daqui a sua impossibilidade, não fize-
ram nem
farão
com
isso mais,
que estabelecer a
proposição monstruosa de que pode a rasão
humana comprehender
que pode o
me
finito
a rasão divina, isto
abranger o
infinito.
é,
Parece-
que os incrédulos seriam mais francos e
leaes argumentadores substituindo estas argucias
velhacas pela negação clara e
absoluta
da existência de Deus. Tudo quanto acabo de
dizer não duvido, feitos os precisos descontos,
28
livindade de Jesus
applical-o
sas
lambem aos
milagres bíblicos, os
em
relação ao giro ordinário das couno universo, quasi se podem chamar mys-
quaes,
terios.
F/
fácil
de ver que somente philosophos por
extremo engoiados ou bazofios podem sustentar,
sem que interiormente estejam
rindo,
que
a hermenêutica e a critica mais apuradas e
fi-
nas não devem achar diíferença entre a reve-
narrada pelos Testamentos Ve-
lação divina,
lho e Novo, e as revelações que se lêem nos
Vedas
e
credito;
nos Puranas; que todas merecem egual
que as Suras disparatadas do Koran
valem bem as paginas sublimes do Evangelho
e das Epistolas Apostólicas; que a moral do
Zend-Avesta, onde entre outras amabilidades
casamento dos pães com as fié tão pura e perfeita como a moral evan-
se determina o
lhas,
gélica;
que Mahomet provou a sua missão
com
evidencia e santidade igual á de Moysés e Jesus
Christo;
e
que as não
sei
quantas meta-
morphoses de Vichnu serviram de molde aos
hebreos para fundirem a encarnação do divino Messias. Não se pejaram estes chamados
philosophos de acharem parallelo entre o mysterio augusto e infinitamente transcendental da
humanisação do Verbo eterno, e as extrava-
—
29
Divindade de Jesus
gantes e ridículas transformações da segunda
pessoa da Trimurti indiatica
em
phoca,
já
em
tartaruga
inimigos do christianismo
com
as outras religiões,
gmas
e á
com
quem sabe a
sempre
se
já
em
porco, já
Esta insistência dos
em
o compararem
dando sempre aos do-
moral destas vantagem, ou pelo me-
nos egualdade
tar a
!
aquelle,
não deve espan-
regra do minta-se, núnia-se, que
pega alguma cousa; e neste caso não
porém muito o que ficou
só alguma cousa,
foi
pegado.
O
famigerado barão de Holbach, infatigável
chefe do estado maior general do grande exercito
da incredulidade do século passado, es-
forçou-se
quando pôde para provar, no seu liTractadoda Moral Universal
—
vrointitulado
tudo quanto acabo de
referir, e
para isso confun-
diu todos os bons principios philosophicos, alterou as melhores apreciações históricas, e tro-
cou as mais venerandas tradições, tirando a final de todo este Ímprobo e infeliz trabalho a
consequência única de que os Japonezes, os
Cochinchinos, os Oceanios, as tribus negras da
Africa, e os Selvagens da antiga
America então
e sempre estiveram ao par dos europeus cul-
menos, muitos aptos
para o estarem sem algum outro auxilio mais
tos
e
christãos, ou, pelo
30
Divindade de Jesus
lhes ser necessário
religiosas
bem
que o das suas velhas noções
desenvolvidas e aperfeiçoadas
me
Asseguro a V. que nunca
prehender que
atheo,
um homem
materialista,
ou
!
I
custou a com-
de talento fosse
em-
sceptico, por que,
fim, são infinitamente variados os
modos, pelos
quaes o espirito humano vê e percebe as cou-
devemos adorar submissamente o Creador, que por occultos desígnios permittiu á
creatura estes deploráveis desvios, e ao menos
conceder aos alumnos daquellas doutrinas a
sas, e
qualidade de lógicos toleráveis, visto que nada
admittem acima da sua rasão; sendo só para notar-se nelles a contradicção
quando
animam
se
pelo génio da propaganda, porque os princípios philosophicos da incerteza,
ou da duvida,
com
que adoptam, parecem-se na propagação
o fogo, que quanto mais se propaga mais des-
O
troe.
der é
que eu porém ainda não pude entencomo um deista racionalista, que crê na
do ente supremo
mesmo ente supremo e
existência
e infinito, e crê
este
infinito fez
mens revelação da sua
cando-lhes a idea do
divindade,
bem
e
que
aos ho-
communi-
do mal, pode jun-
tamente convencer-se de que esta revelação
nunca
se
verificou,
nem
verifica,
senão por
meio da rasão humana. Ora tendo
em
toda
!
!
31
Divindade de Jesus
O tempo dado esta rasão humana tão repetidas provas da sua debilidade e inconstância,
segue-se que os
mesmos homens, que por um
lado reconhecem e confessam a immensidade
e omnipotência de Deus, o
reduzem por outro
á capacidade e meios de acção de
da terra tão pequeno como
O
racionalismo,
é
um bicho
homem
o próprio
para economisar o poder
só
divino, não receia contradizer-se
Tem
bem
sido
longa esta carta,
mas V. me
desculpará o abuso, que porventura tenho
feito
da sua paciência, attendendo á necessidade
que
me achava
ções,
pelas
Renan
fez
ao seu paiz, e
vilisado,
de apontar todas as considera-
quaes
um
em
me
persuado que o senhor
grande desserviço
em
geral ao
escrevendo
um
mundo
em
particular
christão e ci-
livro, cuja doutrina, se
desgraçadamente fosse seguida, cortaria pela
raiz a religião christan;
tan
vem
mento'
a ser cousa
em que não
porque a religião chris-
nenhuma desde o mo-
crer e adorar a divindade
de Jesus. Appello para o senso intimo de todo
o homem intelligente e desapaixonado, que declare
com
franqueza,
se,
no caso de haver
si-
do desde o principio a sagrada pessoa de Jesus Ghristo conhecida unicamente tal qual nos
conta o senhor Renan, teria o christianismo
;
:
32
Divindade de Jesus
apresentado tantos prodígios de abnegação e
fé
ardente, e tão rápido progresso na propaga-
ção da sua crença; se
teria
com o sangue de
regado a sua santa
martyres, e se teria podido atravessar sempre florescente e viçoso, não direi já os seus desenove séculos, mas somente os três primeiros deseara
tantos milhões de
baixo de perseguições furiosas e quasi continuas, e exposto sempre ao desprezo e zombarias
da sociedade d'aqueiles tempos, perseguição
como
os
Ainda bem que o
li-
muitas vezes tão custosa de
tormentos e a morte
?
soffrer,
vro depois da primeira enxurrada vai cahindo
no esquecimento, que merece; e note V. que
mesmo aconteceu aos innumeraveis livros,
que foi moda no século passado escreverem-se
o
o
contra
christianismo,
quaes poucas pessoas
se
isto
claramente
já
em
da maior parte dos
hoje
tem
noticia.
Vê-
Bossuet e Voltaire
o
;
primeiro escreveu o Discurso sobre a Historia
guiado
Universal,
pelo
espirito
religioso,
o
qual lhe inspirou a magestosa sublimidade que
ainda
em
que lêem
nossos dias é admirada pelos sábios,
e
meditam aquelle grandioso
livro
o segundo escreveu o Ensaio sobre os costumes
das nações^ guiado pela incredulidade sceptica
e posto que tractou de imitar e até contrafa-
33
Divindade de Jesus
zer no que pôde ao primeiro, apenas chegou
a produzir uma obra acanhada e sêcca, a qual
ninguém leria hoje, se não brilhassem n'ella de
quando em quando algumas individuações de
factos
particulares,
cterísticos
e
alguns contrastes cara-
de tempos e de pessoas, que,
como
as chispas ao silex ferido pelo aço, nunca
tavam ao auctor da Henriada, Esta
que se observa a respeito dos
fal-
differença,
livros religiosos
e dos anti-religiosos, parece- me que se expli-
ca pelo instincto, que os homens no meio das
suas paixões e desvarios nunca perdem
mente da conservação
lhes
tar
faz
que
própria, instincto,
na religião o principio elemen-
sentir
da vida do
total-
homem
credulidade sceptica a
moral e
social, e
estéril aridez,
na
in-
que só po-
de trazer á sociedade furacões desolantes,
e
depois destes o desfalecimento e a morte.
Muito grande
é
por tanto o louvor, que a V.
tem
se deve, pelo bello e excellente livro, que
«scripto; bello pela riqueza e perfeição
tilo,
pela clareza
e lucidez
do
es-
das ideas, e pela
forma elegante e agradável; excellente porque
é um livro de cuja leitura os seus compatriotas
poderão sempre tirar utilidade, nunca prejuizo.
O nome de V., como tive a honra de indicar
no principio desta carta, titulos possuia já sobe3
34
Divindade de Jesus
jos para ser contado pela posteridade entre os
dos nossos mais distinctos e mimosos escriptoagora levanta V.
res;
um
novo padrão, diante
do qual essa mesma posteridade
se curvará res-
peitosa, recordando- se dos louros gloriosos,
que
se
ço de tantos séculos, sempre
na
com
ennobreceram os nossos avós por espa-
estrella
com
os olhos fixos
luminosa da cruz, cuja direcção e
mysteriosa influencia são as únicas forças ca-
pazes de nos segurar no presente
uma
situação
prospera e solida, e de nos preparar no futuro
um
progresso verdadeiro e successivo, o qual
sem desapparecer engolido
anarchia moral,
nem
pelas voragens da
se esqueletisar
com
tra--
balhosa caminhada pelas marasmaticas e asphyxiantes charnecas do scepticismo, nos poderá conservar a vida do tempo,
sem nos matar
a da eternidade. Nesta quadra dolorosa de in-
credulidade,
em que
muitos homens,
aliás
do-
tados de notáveis talentos e saber, e até muitas
vezes das melhores qualidades de espirito e
uma
em combater o
coração, se encarniçam por
e
inexplicável
sem
lhes
cegueira fatal
christianismo^
importarem as consequências desas-
que ao povo fazem experimentar, e a pandorica boceta que lhe oflertam,
se, o que Deus afaste, conseguirem a final des-
trosas e terríveis,
Sô
Divindade de Jesus
christianisal-o totalmente,
não hesitarei
em aííir-
mar que o livro admirável escripto por V. não
serve somente para honrar as letras portuguezas,
mas que
os seus effeitos chegarão mais
podendo
longe,
em
ser proveitosos
todas as
partes da terra, por onde se acha espalhada a
doutrina pura e santa do venerando código
promulgado no Calvário. O methodo claro,
grave, e digno com que V. escreveu, não só
responde convenientemente aos adversários do
divino martyr do Golgotha,
mas
até ensina aos
próprios defensores do crucificado
haver-se para que o excesso de
reflectido os
com
como devem
um
zelo
menos
não exponha a qualquer censura
apparencias de justiça pelos seus infatigá-
pouco escrupulosos contendores. Neste
assumpto, sempre extremamente melindroso, é
veis e
difíicil
o saber
bem
distinguir se nos illumina
o eterno pharol da inspiração celeste, ou se es-
crevemos guiados apenas pelo simples motor
da nossa rasão particular. Concluirei dizendo
a V.
que
a profunda convicção,
a
em que
estou, de
Egreja Catholica collocará o seu livro
monumentos doutrinaes, que
enriquecem, assim como a litteratura pátria
entre os valiosos
a
V.
em
illustrado tanto.
Te-
o ajuntará aos muitos outros,
ramos tão diversos
a
tem
com que
36
Divindade de Jesus
nho exposto, como prometti, as rasões da minha crença na divindade de Jesus, e da minha
veneração pelo
livro,
que a defende com tão
grande cabedal de saber, e elegância de locução; a respeito da carta dedicatória nada posso
accrescentar ao que
já disse
com um agradecimento
amor
próprio. V.
d'este
meu
dendo eu
cada
quando a agradeci
cheio na verdade de
dirigindo-m'a, teve a culpa
forçado silencio, por que, não pofazer outra cousa mais,
instante
em
relevo a magia de
que encanta a alma
e
que pôr a
um
estilo,
o coração, o risco de pa-
recer suspeito se
me
importa; trechos,
como
aquelle,
de tão alta
eloquência não carecem de elogio alheio
como o
Não
tornou inevitável.
;
são
sempre mais resplandecente, que
tudo quanto em seu louvor pode escrever-se.
sol
De
Amigo
Fov»a do Varzim
V.
atfectuoso, e obediente criado
3 de fevereiro de 1865
Visconde d*A{ei^edo,
.
CARTA
AO
SENHOR VISCONDE D^AZEVEDO
12
iRTicem
16
est,
simul consolari in vobis, per eam, quíe
ftdem vestram atque meam.
Non enim erubesco Evangelium.
Epis T. B. Pauli ad Rom. — Cap.
.
I.
12. ... para me consolar juntamente comvoseo,
por aquella vossa e minha fé que uns e outros professamos.
16
Porque eu não me envergonho do Evangelho.
RplsT. DE S.
PAm.0 AOS Rom.
— Cap.
I.
Snr. Visconde
Bosquejei, ha onze annos, uns artigos deno-
minados Divindade de Jesus, O prazer de vêl-os
-estampados não correspondeu á consolação de
sentil-os. Cuidei que havia profanado o assum-
com
communs da vida.
pto nas formas vulgares e locuções triviaes
que eu exprimia
as sensações
Reli as orações de Lacordaire, Ventura, Frayssinous,
e
Ravignan, concernentes ao
mesmo
motivo, e humildei-me, sem dezar d'amor- próprio, confessando
que o assumpto exercitado
por aquelles doutissimos propugnadores da Di-
vindade de Jesus, produzia argumentação
controversa, formulada
em linguagem
in-
explen-
40
Dioindade de Jesus
dida;
em quanto
que, por
mim, apenas
intro-
duzido, de consciência e coração, ao noviciado
dos estudos religiosos, o sublime assumpto deu
de
si
uma pouco menos
de apagada
luz, que,
assim mesmo, tinha o merecimento de não ser
absolutamente completa escuridade. Oífereceu-
se-me então pensar que,
n'este
immenso san-
ctuario, as
pequenas lâmpadas, que não alu-
miam nem
se
amostram aos olhos da humanidade, o summo Bem as vê, o supremo Senhor
as acceitará amorosamente, como da indigente
viuva acceitou a minguada oblação, e dos poderosos, em mármore e ouro, magestosos tem«
pios.
O
fervoroso desejo de intranhar a minha fé
no animo de amigos bem inclinados, que se
dispensavam d'ella, em quanto as miragens da
vida,
moça
e
enganada, lhes bastavam á lisonja
d'olhos, e o coração, de grado, se entregava
cadeia dourada das esperanças
voroso desejo, digo,
foi
carem-se os argumentos
;
— aquelle
á
fer-
grande parte no publi-
com que eu respondia
minha
conversão. Conversão chamavam alguns o que
meramente devera chamar-se reflexão. A juiza
d'outros, á minha religiosidade era hypocrisia.
Os amigos arguiam-me de inepto os inimigos
á philosophia indócil dos espantados da
;
!
41
Divindade de Jesus
de impostor; cumpria ser velhaco ou néscio
para confessar a divindade da religião do crucificado.
Que desconsolador dilemma,
snr. vis-
conde! Quer-se que Chateaubriand e Lamartine, levados por coração e intelligencia a sagra-
rem nos altares do Salvador, sejam hypocritas
ou ignorantes! Quer-se que sejam e tenham sido impostores ou mentecaptos os milhares de
antigos martyres, e os centenares d'elles que
ainda agora se deixam matar abraçados á cruz
Pois os sinceros e esclarecidos hão-de ser tão-
sómente aquelles que, sem rebuço, fazem praça
de sua irreligião ? Se doestes ha poucos ou muique
tos
se
dispensem da Divindade de Jesus
para serem honrados, é justiça
se
denegue
fé,
isto
para que
consciência e illustração aos que
fervorosamente confessam as doutrinas revela-
das pelos discípulos de Jesus Ghristo?!
Quando eu
escrevi os artigos, que
me
foram
testimunho da minha ignorância ou hypocrisia
nas praticas dos meus julgadores imprudentes,
me
estava eu dando a
nha crença. Não
túnio que
me
mim
sei se foi
fez
algum ingente
ir alliviar
cruz ao pé da cruz do
as razões da miinfor-
o pezo de minha
Homem-Deus
:
devia
de ser; umas quasi delidas reminiscências do
coração d'aquella idade
me dizem que
foi.
O
42
Divindade de Jesus
aperto da dôr espertou-me na memoria as ora-
ções da infância.
ra,
A
mãe, que eu não conhece-
devia fallar-me n'essa hora.
me
pois
A
que de-
luz,
guiou no rasto dos grandes
infelizes,
caminho do Calvário, devia de preluzir-m'a
ella ao animo conturbado e aífligido, antes que
o estudo me volvesse á serenidade da fé, e ás
fontes
novas das aguas bem-ditas da esperan-
ça. Vi então
rasgarem-se-me os horisontes da
em annos
vida
de paz. Contava
còm
a graça
divina para luctar e vencer, vencer-me a mim,
o mais inexorável inimigo que ainda
ganei-me: as paixões sopraram
do
tive.
rijas
En-
do lado
inferno; os vislumbres da graça deixei-os
apagar no coração repleto de máos sedimentos.
Volvi ás angustias antigas, ás trevas d'uma
em
cegueira,
como
que,
por vezes,
umas
os lampejos dos amauroticos,
visões,
me davam
rebates de saudade da luz perdida.
E
era
então o pensar eu comigo, snr. vis-
conde, nas razões da minha
sas
com que
fé,
razões vigoro-
a consciência se assoberbava de
Ainda agora, tão longe d*aquelie
tempo de bem agourada mudança, peço aos
meus vinte seis annos de então conta do frusua
força.
eto
das muitas
vigilias,
dadas mais ao
frio
43
Divindade de Jesus
estudo que á contemplação mystica de Jesus
Christo.
Eu não
poderia hoje, sem abandonar a seara
onde vou grangeando o suado pão da existênthesouros em que a divina providencia me deparou o pão da alma e vida
eterna. As tempestades, que eu colhi dos ven~
tos semeados, levaram-me esses thesouros, os
livros, companheiros idos como amigos, que
desanimaram de me reterem no seu grémio e
cia, reabrir os
me
lançaram de
si
com
justificado desamor.
Escassamente a memoria
turvas lembranças dos
me
restituiu
umas
meus estudos da moci-
dade, quando, pouco ha,
li
a Vida de Jesus por
Ernesto Renan, livro que V. Exc* leu attenta-
mente,
como devo
e discreto a
que
do debate illustrado
convidado pela engenhosa
inferir
foi
apreciação do snr. Pinheiro Chagas, moço,
que tão em verdura de annos,
felizes aíFoitezas
terçar na
saber do
se abalança ás
da sua muita capacidade para
mais lidada
e arriscada
arena de
homem.
Assevero a V. Exc.% com as melhores expressões da minha serenidade, que o livro do
insigne escriptor francez
nem demudou do
n'outros
tempos,
me não
esteio a
o
meu
que
desconvenceu,
se
amparara,
espirito, estonteado
44
iJivindade de Jesus
pelos repellões das philosophias antagonistas»
Direi agora
como
os Evangelhos de Nosso Se-
nhor Jesus Christo
me deram
o arrimo da ar-
vore sancta, cujas raizes, manancial da seiva
de dezenove séculos de progressiva civilisação^
a lamina hervada do famoso livro não vingou
ferir.
Nos muitos e melhores annos que me fugiram distrahidos da religião, por vezes, algumas altas idéas me surprehendiam nos ermos,
onde eu, como a fugir de mim próprio, ia esconder-me
e consultar-me.
A
necessidade de
comprehender as obras divinas mais contingentes á humanidade, guiava os meus raciocinios até ao dogma. Chegado aqui, tomava-me
o desalento, a desconfiança, e logo a inércia
da indiíferença.
Escutava a minha razão, que se oppunha
ao rompimento completo do destino humano
com o sobrenatural. A razão dizia-me em tom
consolativo: «o sentimento religioso te basta:
sabe que ha Deus, e adora-o; deixa-te
ir
nas
que os
anhelos d^outra vida, a poesia dalma que te
levanta sobre as realidades d'este mundo, são
azas
já
de
refulgentes
si
Dogmas,
de
tua
phantasia
;
a tua identificação ás coisas divinas.
e organisações
de egrejas de que
te
45
Divindade de Jesus
aproveitam? Crê, adora, assombra-te das maravilhas
do mundo, ama teus irmãos, sê feliz
redundem
pela virtude, faz que as tuas paixões
em
contentamentos duradouros, sem peçonha
de arrependimento,
Em
tecer de tua vida.
o anoi-
e espera tranquillo
quanto aos dogmas, que
repulsam as investidas da tua razão humilhada, que
montam
elles
para o bem-estar, o bem-
querer de tua alma ? Ascende
mais poderes,
em
espirito
onde
mais perto serás da origem
e
divina das coisas.»
Mas eu não
podia subir além do curto es-
paço que meus olhos alcançavam.
A
imagina-
alada para Deus, a poucas voltas, cahia
ção,
extenuada.
O meu pensar livremente era
estreita área
Um
da razão captiva.
n'uma
livro
mo-
derno explica miriíicamente o breve alcance
da minha imaginação d'aquelle tempo: «Não
é o
homem um
tico,
ser
mundo
amor e
actual
meramente
sensivel e poé-
a ultrapassar as balisas do
aspirando
material,
e
com
impulsos de
phantasia. O homem pensa ao mesmo
que
tempo
sente
quer conhecer, crer e amar
simultaneamente e por igual: não lhe abasta
que sua alma se commova e remonte faz-se;
:
Ihe mister repousal-a
mes
em
aos seus inlêvos. E*
convicções conforisto
que o
homem
46
Divindade de Jesus
almeja na religião: pede-lhe, além das exultaçóes nobres e puras, além da luz, a sympathia.
Se a
religião lhe
não resolve os problemas mo-
raes que lhe inquietam o espirito, religião de
certo não é: poderá ser,
Commove-me ao
quando muito, poesia.
contemplar a desordem das
almas elevadas que cuidam achar, no
mento
religioso
duvida
e
senti-
somente, a defeza contra a
impiedade.
.
(i)»
.
O
dogma, snr. visconde, era para os voos
descompassados do meu espirito ousado o que
deve ser para as aves de mais alto adejo o
ambiente onde o ar
religioso, acrisolado
mortífero.
é
O
instincto
no mais estreme espiritua-
lismo, parecia, cada vez mais aprofundar o vá-
cuo de minha alma.
O
pantheismo, a ubiqui-
dade de Deus, entreteve por algum espaço o
jogo das-chimeras com que a minha pobre
razão se deleitava
gava,
em que eu
;
se estorcia e fugia á
res,
em
o
uma
depois, se
hora che-
carecia de Deus, se o
animo
compressão das suas do-
meu pantheismo não me
figurava
Deus
parte alguma. Direi sinceramente a V. Exc.^
que as minhas crenças
(1)
GUIZOT
tienne» 1864.
deistas,
quando eu mais
«Méditations sur Tessence de
la Religion
chre,
47
Divindade de Jesus
em linimento de afflicme davam. Bem m'o havia dito
carecia de coiivertel-as
ções,
nada
Bossuet
*o deismo é a mascara do
:
atheismo
Appliquei aos factos as minhas cogitações
;
abstive-me de theorias especulativas, e entendi
no que
era da jurisdicção
ram muito em meu animo
do
raciocínio. Reza-
as singelas palavras
de Jesus Christo aos incrédulos de Israel: «Se
não quereis acreditar minhas palavras, vede e
considerai as minhas obras.»
Estudei
pospor,
meus
os
como
factos
sem
do Ghristianismo,
perigosos á imparcialidade dos
estudos, os formidáveis
os
syllogistas,
sectários da doutrina positiva.
Agora, darei a V. Exc* conta de minha
no dogma. Procedeu
ella
fé
immediatamente da
crença fundamental da religião christã
:
con-
venci-me da divindade de seu author.
Jesus disse que era o Messias.
Messias, Filho de Deus, propriamente Deus.
Umas
provas deu-as aos discipulos que lh'as
pediam, e outras espontaneamente ás multidões, que as não pediam.
Urgia que as prophecias se cumprissem
Jesus. Urgia
que sua vida terrena
em
se manifes-
tasse por actos de impulso sobrenatural.
Cum-
48
Divindade de Jesus
que as suas predicções se realisassem no
pria
correr dos tempos.
desde o presepe onde nasce até ao
Jesus,
sepulchro d'onde se ergue triumphante, corres-
ponde ás máximas e mínimas condições de
morte preditas no velho testamento.
v'"da e
O
novo testamento abriu-me os seus thesou-
ros de provas
;
a historia, pregão eterno pro-
ferido por bôccas insuspeitas sobre as ruinas
da nação amaldiçoada, confirma com superabundância de factos humanos a obra divina
singelamente referida nas tradições dos evangelistas.
Pareceu-me que a vida
natural de Jesus de Nazareth é
e
morte sobre-
um
dos succes-
sos mais cabalmente provados irrecusáveis, no
quem
intendimenlo de
estudar desprevenida-
mente aquella mais sublime e transformativa
phase da humanidade. Desde que esta luz da
divindade do Salvador se fez em meu espirito,
soccorri-me do dogma christão, sempre que
rebelliões
de raciocinio, duvidas reluctantes,
febres de entrar
com
dos do Creador,
a intelligencia aos segre-
me
levaram ao perigo de
achar engenhosos os philosophos racionalistas.
Os annos
se os
correram, snr. visconde
mares borrascosos;
vi
;
cavaram-
e experimentei
muitos naufrágios; nos meus deixei-me
ir
Deus-
Divindade de
49
Jestts
quando outros alijariam ao
abysmo o gravame da vida, cuidando que era
misericórdia;
e,
assim o salvarem-se de beber a tragos lentos a
morte, eu acceitei os desastres
as culpas, e
fiz
como
do meu respeito á
Deus uma anchora.
Quero dizer a V. Exc* que os
tormentas
me não rebataram
Evangelhos de Jesus. Nunca
acceitára
justiça
de
tufões das
das
mãos os
fui tão
desgraça-
do quando a opinião poderia cuidar que eu fosse. Tenho de meu, e do favor do céo, a felicidade da oração. Non enim erubesco Evangelium.
Li
a
Vida de JesuSj imaginada por Ernesto
Renan. Entendi que era um dos mais perigosos
livros que ainda se escreveram contra a divin-
dade do fundador do christianismo. Os Celsos,
e Porphirios, e Julianos argumentavam, syllogisavam os seus paralogismos, tiravam consequências vigorosas de principios viciosos mas
;
argumentavam.
Quem
os
lê,
naturalmente, exa-
mina como os Origenes, os Tertulianos
rillos lhes
e
Cy-
responderam, e decide entre conten-
dores que aífoitamente se defrontam na peleja.
meu
do christianismo
nascente, os pelejadores formidáveis dos primeiros séculos náo foram tão nocivos ás crenPois, a
juizo, os flagellos
ças dos galileus
como o
livro
do moderno es-
—
50
;
Divitidade de Jesus
A
criptor francez.
Vida de Jesus de Strauss^
lavor de admiráveis e por vezes engenhosasfadigas, vastas paginas lardeadas de vasta eru-
dição, posto
ça, e
que
mandado
três
vezes publicado
em Fran-
a civilisar os bárbaros, que ain-
da juravam pela divindade do crucificado, o
grave e pesado livro do professor de Tubingue
apenas abalou as crenças d'alguns que não a
leram, e se espantaram do assombroso
mo
do alemão.
O
carcaz das frechas mais hervadas contra
a religião pendia
mento o digo
lyrismo
;
— sem motejo nem encareci-
—-do
cez. Este livro é
tal
criticis-
talabarte
bom
de
do
ler-se;
estilista
fran-
tem sentimen-
os periodos são boleados a primor;
o heroe, que aconteceu chamar-se Jesus, tem
ás vezes maviosidades, innocencias, e preceitos
que vão dentro d'alma,
travagâncias de
uma
sem ao par com
e lá ficariam, se as ex-
ignara embustice não vies-
celestiaes attributos. Podia o,
ainda assim, heroe sympathico, chamar se Appolonio Thyaneu, ou Bouddha
modo
mas o
;
ficava de igual
graciosa e para muito êxito a novella
author quiz afervorar o interesse
minou Jesus o personagem,
e,
com
;
deno-
eíFeito,
ga-
nhou; auferiu d'aquelle nome augusto torrentes
de ouro, e estacou as torrentes de lagrimas
51
Divindade de Jesus
em que
muitas afflicções se desentranhavam,
invocando o nome sacratíssimo do Filho de
Deus.
Ao
lêrem-n'o, muitos espiritos, não despe-
ciendos em cultura, se dariam por satisfeitos
do recheio de notas indicativas do saber do
Em
author.
leitor veria
caso de insufficiencia de notas, o
que Renan, conforme a sua phrase,
não costuma refazer o que está bemfeito. (i) Quer
dizer que, onde elle é conciso, outros foram
prolixos.
Lá vem no
thores consultados
tem vagar de
já
:
livro
o catalogo dos au-
são muitos
cottejal-os,
nem
;
foram refutados os consultores
res de
Renan
;
o
leitor
não
cu^a de saber se
e inspirado-
volta a pagina, e vai avante na
seguridade e confiança de que o
livro,
que tem
entre mãos, é a quinta essência, a recapitula-
ção incontrastavel das escholas da razão natural.
Observei eu que o afamado livro concorreu
com
os romances do anno passado aos gabi-
netes das senhoras cuidadosas
em possuirem
as novidades da litteratura recreativa.
mas leram
a vida de Jesus,
As da-
segundo Renan
;
e
condoeram-se do aífectuoso personagem tão
(i)
Introducção, pag. 6
52
Divindade de Jesus
iniquamente suppliciado. Gompadeceram-se do
judeu crucificado, assim como, guardadas as
compadeceriam
d^algum desventuroso heroe das minhas fabulas, género phantastico, em que eu, certo, não
ouso medir-me com o inventivo membro do
distancias
entre
infelizes,
se
Instituto de França.
Como
quer que
seja,
o mais damninho e de-
pravador escripto devia ser
com
feitio
uma
vida de Jesus,
de romance, agradável
gem, commovente,
ideaes melancolias
e,
;
a espaços,
e,
em
sombreada de
por sobre tantas condi-
ções meritórias, lustrada pelo verniz
cia
com que o
lingua-
da scien-
author, ás vezes, marcheta os
seus periodos rendilhados.
Se V. Exc* m'o permitte, direi agora o que
não ousaria dizer em conversação, porque tudo
que eu pozer aqui em deslustre da sciencia e
das hypotheses de Renan, será pouco em comparação do muito que V. Kxc* allegaria contra
a má fé ou contra a insciencia do livro. Outro
sim me não desvaneço de escrever coisas novas para qualquer leitor medianamente lettrado.
Algumas das mais enérgicas refutações da
Vida de Jesus correm traduzidas, ainda bem, e
derramadas numerosamente. Eu vim tarde com
a pobreza
d'ei>te
esboço
:
tudo que eu escrever,
63
Divindade de Jesus
estava escripto;
em
para assim dizer, escripto
e,
redor do berço da nossa divina religião.
Renan quando não inventou, copiou os contradictores
da divindade de Jesus;
primitivos
Renan trasladaram
os impugnadores de
fiel-
mente os antigos defensores da origem divina do christianismo. Em quanto a mim, esta
repetição de argumentos, sempre idênticos e
sempre triumphantes, contra todos os gnósticos e ebionitas
de todos os séculos, diz gran-
demente em pró da
inteireza, solidez, e
immo-
bilidade dos principios.
Aos crentes da Cruz não
negacear ao fervor dos
phantasticas.
tos terrores
A
se lhes faz mister
fieis
com
alliciações
tragedia da Paixão incute san-
que introvertem a alma para longe
de quadros imaginários.
S.
Paulo disse
com
maviosa simplicidade: «E eu, quando fui ter
comvosco, irmãos, não fui com sublimidade de
estylo,
ou de sabedoria, a annunciar-vos o
temunho de Christo
coisa
alguma entre
;
tes-
porque julguei não saber
vós, senão a Jesus Christo,
e este crucificado. (i)o
Escreve Renan
(i)
uma
Aos Corinth. Cap.
li
larga introducção á Vi-
64
Divindade de Jesus
da de Jesus,
O
A
que
valor,
essência do livro é a introducção.
ellé
ha de
tiver,
ella
dar-lho.
O
ao que parece, reduzir Jesus
mera humanidade, despreciando a valia dos
Evangelhos, a historia coeva do Redemptor, o
critico pretende,
á
mais antigo testemunho que possuimos da sua
divindade.
Por
isso
eu disse que a introducção é a es-
sência do livro: esta é a liça do debate, a ques-
tão suprema.
Demoremos,
snr. visconde,
algum
breve espaço, n^este vestibulo que tem muito
que
vêr.
Se
em
quanto estivermos
n'elle, se
apa-
garem as lâmpadas que o philosopho nos ofíerece, não passemos além da ramalhosa introducção, que d'ahi a dentro será tudo trevas
em
labyrintho de hypotheses, nas quaes a ou-
sada blasphemia corre parelhas
Observa
um
refutador de
com o desatino.
Renan que
este
fluctuante philosopho, tendo escripto, ha muitos annos,
que a parte verdadeira dos Evange-
lhos escassamente daria
ria
uma
pagina da histo-
de Jesus, se propoz agora extrahir da con-
textura completa dos Evangelhos
em quatro centas e
signe observador, em
J^5í/5
radical
uma
Vida de
sessenta paginas.
vista
O
in-
de reforma tão
no animo do philosopho, espera que
55
Divindade de Jesus
Renan
converta pura e simplesmente aos
se
quatro Evangelhos canónicos.
em
Por
quanto, as crenças do sócio do Ins-
sobre a authenticidade dos quatro Evan-
tituto,
gelhos, são de
tal
modo
contradictorias que
é concedido determinal-as.
O seu
não
parecer de ha
muitos annos tinha o applauso de Voltaire; o
parecer de hoje não intende
seu
seita
ou
com alguma
escola.
Apalpemos o cáhos.
N'um
relanço da introducção, paginas Sy,
escreve Renan
:t...
Por ultimo, admitto como
authenticos os quatro Evangelhos canónicos.
meu
vêr,
e são,
se
procedem todos do primeiro século,
differença, dos authores que
com pouca
lhes
elle.
A
attribuem.
Com
pouca differença^ diz
Esta clausula é de minimo pezo.
A pouca
dfferença deixa perceber que a substancia, a
parte essencial dos
li
vi
os canónicos,
foi escri-
pta no primeiro século pelos quatro evangelistas.
Se Renan intendesse que as alterações e
accrescentamentos
agraves,
hoje
não
no texto primitivo foram
leria dito
com pouca
que os Evangelhos se lêem
differença
do que, no primeiro
século, continham; provável e logicamente diria:
com muita
differença, differença
que nos
leva a suppor que os milagres, e a resurrei-
56
Divindade de Jesus
ção de Jesus foram interpostos no
texto, ahi
pelo segundo ou terceiro século.
A
quasi authenticidade que Renan concede
aos Evangelhos, até certo ponto, concorda
uma
justíssima
illustres
ponderação de
um
com
dos mais
defensores do Ghristianismo :«Quc, no
decurso de dezoito séculos, se haja introduzido
algum
leve erro
em
nossos Evangelhos por des-
cuido e ignorância dos copistas, admitto;
isto^
porém, não chegaria a ser alteração substan-^
c\s\,y> (i)
Certamente, não: o mais que seria
Renan presume que
pouca
tes
differença, quasi.
foi
:
à
peii
é
prés.
o que
— com
Até aqui são convergen-
o bispo de Hermopolis e o professor de he-
braico. Insta o philosopho christão, e diz: ccA
minha intenção é demonstrar que os nossosEvangelhos nunca foram alterados, no tocante
á substancia e doutrina, moral e factos;
virtude do que, no essencial das coisas,
se
em
nossas
mãos
dos apóstolos.»
(2)
acham^
taes quaes foram nas
Quem
em
mãos
quizesse levar até
á
repetição a prova de não divergirem o philoso-
(i) Bisp<j
de Hermopolis— Defense du Christianisme,
i.*»
voi..
P. 383.
(2)
P. 383.
Bispo de Hermopolis— Defense du Christianisme, i.«vd.:
:
ÕT
Divindade de Jesus
phochristão do racionalista, poderia dizer: «Re-
nan
é tão claro e
orthodoxo como vós
sois, il-
lustre orador: o racionalista acceita a substancia
e factos
dos Evangelhos; apenas suppóe as pe-
quenas diíferenças que vós admittis,
à peu près^
elle
e
elle diz
vós dizeis: quelque Jaute légère;
á\z: fadmets; e
vós
dizeis:
jy
conseiís.
Palavras e admissões consentâneas.
De
S,
Exc* que o Evangelho de
sobra sabe V.
João sobre-excede as narrativas synopticas
em pormenores da
divindade do Salvador. As
paginas do discipulo
amado
são, por excellen-
Em
cia, os Fastos da Cruz e seus mysterios.
S.
João realça o narrador do dogma, do sacra-
mento, da metaphysica do christianismo. Por
isso
mesmo, os detrahidores da divindade de
com mais porfioso afan, se conspiraram
Ghristo,
sempre contra
a authenticidade,
vro
Não assim o author da
canónico.
do quarto
li-
Vida
de Jesus. As ailegaçóes de Renan contra a authoridade do quarto evangelho são embaralha-
das
da
com
tão negativo engenho e desconcerta-
critica,
peitar lezão
que eu chego a susno intendimento do sonoroso es-
snr. visconde,
criptor.
Eu
leio
em Renan que
«principalmente a
lei-
tura da obra (o Evangelho de S. João), é de
^S
Divindade de Jesus
molde a impressionar.
O
author. narra sempre
como testemunha presencial, e quer que o tenham em conta do apostolo João.»
E logo em seguimento: «Se esta obra realmente não é do apostolo,. ..ha n^isto uma fraude
de que não ha exemplo no mundo apostólico.»
Algumas linhas antes: «Não ouso affirmar
que o quarto Evangelho fosse inteiramente escripto por
um
antigo pastor galileu.»
Algumas paginas depois: «Não me decido
na questão material de saber que mão traçou
o quarto Evangelho; propendo a crer que os
discursos, pelo menos, não são do filho de Zebedeu; admitto, porém, que este é em verda»
de o Evangelho, segundo João.
.
E
.
na pagina seguinte: «Por ultimo, admitto
como
authenticos os quatro Evangelhos canó-
nicos.
A meu
século, e são,
procedem todos do primeiro
com pouca diíferença, dos authovêr,
res que se lhes attribuem.» (i)
Começam
a vasquejar as lâmpadas do appa-
ratoso vestíbulo, snr. visconde.
Eu
já
não
sei
desencadilhar esta meada. S. João não escre-
veu:
(i)
foi
um
sujeito
que o
Vid. pag. 25, 27, 36 e 37 da
critico se
INTRODUCÇÃO.
dispensa
69
Divindade de Jesus
de conhecer.
S.
João escreveu; mas não
es-
creveu tudo. S. João escreveu, porque era impossível, e
tal
porte.
não ha exemplo de fraudulencia de
S. João não escreveu, porque um
pescador antigo não escrevia assim.
creveu
com pouca
séria
nem
outra conjectura de
sendo
me
parece coisa
altercavel.
Se, todavia, é forçoso
ca
João não é o
diíferença. S.
author aos discursos. Isto não
João es-
S.
rir,
vejamos ainda
Renan em que
inquestionavelmente
S.
uma
João
author
o
fi-
do
Evangelho. Diz assim: «Sente-se tentação de
crer que S. João, já velho, lendo as narrativas
evangélicas divulgadas, reparou primeiro
em di-
versas inexacções,e depois azedou-se dever que
lhe não assignavam na historia de Ghristo logar
de primeira plana; pelo que, principiou a ditar
muitas cousas que
tros,
elle
sabia melhor que os ou-
no propósito de mostrar que,
relanços,
onde somente
dro.»
muitos
mencionava Pe-
se
dro, figurara elle antes de
em
Pedro
e
com Pe-
(i)
Descamba em
puerilidade esta hypothese.
imaginário João de Renan é
(i) Introd.
pag. 27.
um
O
personagem
;
60
iJivindade de Jesus
invejoso que disputa ao defuncto Pedro a pri-
masia da corrida
nem ao menos
ao sepulcro de Jesus. Aqui
se
me
otferece opportunidade
A
imaginação costu-
snr. visconde,
que eu, á terceira
de admirar o romancista.
ma
ser
mais
lógica.
De modo,
derramada introducção, que captivou a estima dos admiradores da linguagem
florente, achei-me bem, e mais intrado da minha fé racional na authenticidade dos livros da
leitura d'esta
vida de Nosso Senhor Jesus Christo.
ducção em diante, encontrei os
repugnancias irreconciliáveis
Da
intro-
dislates, e
em que
as
devia en-
redar-se o escriptor que deseja sahir a limpo
com uma
façanha perigosa, ferindo de revéz
a piedade dochristão, e abroquellando-se inha-
bilmente
dos golpes da philosophia raciona-
lista.
Por amor d^isto é que elle, uma hora, sobre^
punha Jesus a todos os homens; outra hora,
avantajava-lhe Çakya-Mouni, Marco-Aurelio,
e Espinosa,
na virtude da sinceridade,
pego dos prazeres mundanos. Por amor
que
elle, a
tão filho
e
desa-
d^isto é
pag. 248, intende que Jesus se julgava
de Deus
como
posto que se presumia
os
homem
outros homens,
extraordinário
e a pag. 254, escreve qu€ Jesus, desde muito,
61
Divindade de Jesus
se persuadira que os prophetas o tinham
em
vista quando o prophetisavam ...
Eu receio de o
ir
já
enfadando,
snr. visconde.
V. Exc* copiosamente versado nos estudos de
todas as religiões, e muito d^alma convencido
da divindade da nossa, quando
via sorrir,
e
entre
si
leu
Renan
de-
«Este livro não
dizer:
€ para debates; propriamente os
illitteratos
hão
de impugnal-o com as mesmas refutações que
o author arma contra
si.»
E
tão justo juizo
deve ser parte para que V. Exc* me vá cortando nas demasias, e eu, sem impedimento
do seu
que
me
linhas
fastio,
ouso pedir-lhe,
deixe trasladar d'este romance
que
eu, sujeitando-as á
author de quarenta e não
me
snr. visconde,
sei
umas
minha alçada de
quantos romances,
aventuro a denominal-as ineptas.
Chega Renan á resurreição de
«...
Na manhã de domingo,
Ghristo.
as mulheres
chegaram muito de madrugada ao sepulcro,
sendo Maria de Magdala a primeira. Estava a
pedra deslocada da abertura, e o corpo já não
estava no logar onde o haviam posto. Ao mesmo
tempo, os mais estranhos rumores se derramaram na communidade christã. Entre os disci-
pulos correu, qual relâmpago, o brado: «resus-
citou!»
O
amor
lhes proporcionou
em
toda ã
62
Divindade de Jesus
parte
uma
crença
Que
fácil.
passou?.
se
.
vida de Jesus, para o historiador, acabou
o seu ultimo suspiro.
giòs
que
elle
Mas
taes
eram os
.
A
com
vesti-
deixara no coração de seus disci-
pulos e d'algumas almas dedicadas que, no
espaço d'algumas semanas, ainda viveu para
elles e lhes foi
consolador.
O
seu corpo
foi
ar-
rebatado, ou o enthusiasmo, sempre crédulo,
deu brado ao conjuncto de narrativas com as
quaes se curou de estabelecer a fé e a resurreição? E' o que, á mingoa de documentos
havemos sempre
ignorar.
To-
davia, digamos que a forte imaginação de
Ma-
contradictorios,
ria
de Magdala representou n'este incidente
papel de primeira ordem. Divino
amor!
d'uma
instantes
delirante
um
poder do
em que a paixão
dá ao mundo um Deus resussagrados
citado!»
Aqui
Uma
está
como
foi a
resurreição de Jesus!
hallucinação de mulher apaixonada!
Eu
não ouso brincar, snr. visconde, com este assumpto ha blasphemação e sacrilégio em disputar aos delirios do amor de uma mulher, que
chorava suas culpas, a realidade da resurrei:
O
ção de Jesus Christo.
não pôde dar contas á
das suas
phantasias.
meu vêr^
nem á razão
francez, a
historia
Quem
assim
inventa^
õ8
Divindade de Jesus
quando não
é
romancista, argúe intermitten-
escura de recto juizo. Estes eclipses não
hão de sempre imputar-se á ignorância muitos procedem da deslealdade.
Eu devia ter parado, snr. visconde, na pas-
cia
:
sagem
doesta carta
em
que ponderei a invali-
dez das invectivas de Renan, se o eram, contra os
Não
quatro livros canónicos.
os desva-
liou? não os desceu da sua legitimidade de dezoito
séculos?
A
Não
pergunta é vã.
sei
que
outro philosopho attentasse contra a integri-
dade dos Evangelhos com tão
débil pulso e
tão estrondosas futilidades!
Pois
bem! Deixemos
raivar o temporal. Es-
ephemeras borrascas são as disputações a
que Deus abandonou o mundo. Tradidit mun-
tas
dum
disputationi.
de Renan, abre-se
humanidade
(i)
Onde cáe um
um
revoluteia
abysmo,
e
livro,
uma
e dilacera
como
parte da
alegrias de
sua alma, e as consolações das suas esperanças
em
volta
d'essa voragem. Depois, o anjo
da misericórdia divina baixa com a aza o dorso
da procella; alizam-se as vagas;
o
mar
e,
por sobre
bonançoso, baloiça-se serenamente o
(i) Eccles.
C.
lII,
II.
^4
Divindade de Jesus
esquife
em que
de salvação,
depôs quatro
livros,
o anjo do Senhor
as quatro sagradas
Me-
morias da Paixão de Jesus-Ghristo, escriptas
por homens, que viram os prodigios,
e
o suor
de sangue, a agonia, e a morte, e a resurreição
do Redemptor.
Ainda
me
falta,
snr.
visconde,
Exc* que receba benignamente
pedir a V.
a dedicatória
das meditações d'algumas horas da minha mocidade.
A's suas excellentes qualidades, que
tão fundo arnor e respeito
me
inspiram, que
hei-de eu otíerecer, senão lembranças d'alguns
em que
dias
eu, por breve tempo,
me
voltei
do lado das minhas ásperas tristezas e solidões
da alma para os hortos amenissimos, em que
a vida de V. Exc* se tem gosado, nas exultações de honrada paz e respeitada virtude
De
Port«
I
V.
?
Exc*
de Janeiro de 1865.
amigo respeitador
e creado
Camillo Castello- Branco,
DIVINDADE DE JESUS
Tu morreste por
E
nós na cruz da affroata,
o sangue derradeiro
Derramaste do
alto do madeiro,
Jesus, Filho de Deus,
VíscoNDE
d' Almeida
Garrett
Deus verdadeiro.
— O REDEMPTOR.
Conheço os homens, e affianço-te que
Jesus Ciiristo não era um homem.
NapolbAo.
PREFACIO
E' nosso intento responder á incredulidade,
que argumenta.
pondivel
:
é a
Ha uma
incredulidade irres-
que não contende.
A impugnação
olferecida,
por contendor tão
débil,
sem hombridade,
corre perigo de ser
acoimada de atrevimento.
O gigante, que se nos antepõe, chama-se
RAZÃO. E' um formidável adversário, que se
não temeria da funda de David em mãos deBossuet, ou Chateaubriand. Está com elle o exertumultuario dos que pelejam rindo
cito
:
gente
de incutir pavor aos mais robustos e intemeratos propugnadores da piedade; ferem
com
a
zombaria, e fogem á clava pezada do raciocinio
:
são os scythas da dialéctica.
Quando o
baluarte da razão estremece, desamparam-n'o
e acastellam-se
no extremo reducto, onde são
68
IHfHtidade de Jesus
invulneráveis:
a
Estes
não são
mas estrondêam a brados,
apupos, quando os caudilhos en-
os triumphadores
e palmas, e
indiíferença.
;
fraquecem.
Entáo rompem o campo amotinados,
e has-
têam facilmente o estandarte da victoria. Esta
gente chama-se Le-Brun, o atador, Meslier, o
cura de Étrépigny, e milhares,
com uns
riores de sciencia grossa, revellada
exte-
na estampa
d'alguns caracteres gregos e hebraicos,
com
que fulminam os ignorantes das linguas orientaes.
Que monta isso ?
Combatamos humildemente. Vamos sem armas, com o livro do Senhor aberto. Levemos
este ceitil
onde fulge a
baixella dos opulentos
da sciencia humana e da graça divina.
O
assumpto
dos
que succumbem. Os supremos vencedores, os
martyres, venciam com a só palavra
creio.
e vasto, e gloriosa a lucta
:
Se não vingarmos
este fervoroso anhelo
trarmos á consciência de
quem nos
de enlêr,
os
adversários não ganham.
Pouquissima gloria para quem vencer.
seita dos «racionalistas» declara que não
tem que vêr comnosco em artigos de fé. A pe-
A
leja
corre entre duas razões: a da crença phi-
Ditrindaàe de
69
Jems
sem crença. Semordaça que nos oflfe-
losophica, e a da philosophia
melhante condição é a
recem com ares de benevolência, como
se nos
dissessem:
«Se tens a sciencia universal, que abrange a
natureza das cousas, e a explicação natural dos
factos, levanta
o
cartel;
porém,
se as tuas ar-
mas sahiram das velhas armarias de Roma,
não entres na
liça,
nos intenderemos.
Onde
que, de partç a parte, não
1)
está a sciencia
que dá a explicação
natural dos factos? Tivessem-na
elles,
que os
segredos da creação viriam ao lume da agua,
que tão turva sahe das fontes da sua sabedoria.
Com
o céo,
a
em
chave d'essa sciencia abririam
elles
vez de construírem Babeis, que de-
sabam.
O
Christianismo não se esquiva á razão phi-
losophica. «E'
estudado»
um
facto; e,
— pondera
como
Fénelon.
ter sciencia para lhe intender
vel ao intendimento.
Não
é
tal,
deve ser
— Faz-se
o que
mis-
é accessi-
Roma que
inicia
unge o luctador: é a razão allumiada no estudo da natureza e do homem. A previdência
dos racionalistas irá mais longe ? Exorbita da
e
esphera do visivel e palpável? As sciencias
especulativas transcendem os limites demarca-
70
Divindade de Jesus
dos ás inducçóes iheologicas
ignora
em que
?
A humanidade
escondem os
eleúzinas cryptas
sábios o facho, a cuja luz viram a causa das
causas, a vida explicada, os designios do Crea-
dor definidos.
Sabemos sobre que
alicerces ha de o escri-
ptor christão cimentar o edifício da Fé, se intenta dar-lhe a razão por cúpula e remate.
Gumpre-lhe demonstrar a divindade de Jesus.
já vimos summa-
Tal demonstração, que
riada
em
breves provas, é hoje obrigada a dis-
pender-se
em
dilatadas satisfações á critica.
Escreveram Strauss
muitas luzes.
immudeça
A
Salvador,
e
a insciencia.
a ignorância,
religião pela
homens de
que os impugne, ou
Basta que seja acatada
sciencia
quando
legislar a iilutilidade
da
bôcca de Voltaire, o mais igno-
rante insultador, que ainda injuriou a religião
do Calvário.
Faz-se mister grande calor de
entram
nos areópagos,
e,
fé
aos que
á imitação de S.
Os areopagitas, de hoje
encaram-se, como os archontes, e, sor-
Paulo, os provocam.
em
dia,
rindo desdenhosamente, dizem:
que vem
fallar-nos de
do?»
Quem
é estef
um
«Quem
é este
Deus desconheci-
71
Divindade de Jesus
Perguntar assim equivale a vencer. Discuta- se
homem.
o
Atire-se o
machado ao
e os frUctos da arvore apodrecerão
tronco,
amanhã.
Systema que não inculca sciencia nem consciência.
Assim fizeram os incrédulos de Jerusalém
com uns pobres pescadores que alli appareceram a jurar a divindade de Jesus. Ora, deveis
saber que, no dia e logar em que esta pergunta
foi feita, oito mil almas se converteram á fé do
crucificado.
E
os convertidos sahiram depois
a oíferecer mansamente a prova de sua
feras,
fé
ás
ás fogueiras, e aos cutellos dos cezares.
DIVINDADE DE JESUS
CAPITULO
l
A razão do homem interprete dos actos de Deus
Nao
se faz mister cabedal de sciencia para dizer isto:
«E* inverosímil a divindade de Jesus.»
Não
si
é
preciso
que dispensa o
um
asserto,
de
beneplácito do
cri*
que Strauss authorrse
t3o obvio e banal,
ticismo alemão.
sem quebra de sua inteireza, diz o mesmo, em
concordância com os luminares da christandade. Religião oriunda de Deus, como tudo que procede de occultas causas indecifráveis na mente divina, humana-
A
fé,
mente examinada, é incomprehensivel.
porém, é
um
cimento que
A
origem
facto,
é,
uma
O
christianismo,
luminosa verdade,
um
aconte-
e repugna á discussão se pôde ser,
do christianismo
em Deus
afferimol-a nas
74
Jfivindade de Jeaus
provas extrínsecas,
provas testemunhaes.
As
intrínse-
vem menos de molde" ao assumpto.
cas
Pezam levemente conjecturas theorícas, se a
Cão d'um facto requer inducções d'outros factos
illucida-
— o me-
thodo experimental. Pode a razão engenhar admiráveis
instrumentos para indagar factos da alçada da observação;
mas alcançar com
que demoram além dos
elles os
limites da experiência, não vingou ainda.
A chymíca
e physica, ha
cem
annos, eram
um
com-
plexo de phenomenos, adjudicados ao serviço da alchy-
mia.
Os
Que
pratico^e theoricoschamavam-lhes «mysterios.»
a
fez
razão para
corrigir esta
absurda nomencla-
Esperou a experiência, que lentamente desvelou
tura?
o segredo rebelde á sciencia especulativa.
Estudem-se os naturalistas de ha cem annos; appro.
O
ximem-se, e refundam-se as theorias.
de Lavoisier não se antevê,
nem
espera.
descobrimento
As sciencias de
um
século, se os
com que então
fossem
desprezados
como
ineííicazes.
ram,
se manifesta-
observação seriam hoje o que eram, ha
incomprehensiveis,
íactos
Longe de nós desestimar o
lavor da razão no adian-
tamento das sciencias naturaes.
A
critica
não ha de
acoimar-nos por tamanho' paradoxo. Confessamos que o
apparecimento de
um phenomeno
excita a razão a exer-
citar-se para sujeital-o ás leis geraes.
mos,
2ão
da matéria
:
quere-
porém, que os racionalistas assintam a que a
nãó pôde, com bom
juízo,
impugnar
úm
ra-
facto da
ordem moral por não poder comprehendêl-o.
O
Christianismo precisa ser estudado desprevenida-
mente, como
certeza
quem
estuda
ou falsidade pouco
Cumpre
assim
fallar
um
objecto abstracto, cuja
importa a quern d estuda.
ao scepticismo; se não, interrogartí^
:
75
Divindade de Jesus
Tíos logo sobre diíificuldades históricas, diíficuldades
taphysicas, difficuldades na
nenhumas
diíficuldades.
Estude-se o christianismo, se
um
isto lhes
quadra,
como
problema de geometria; mas não valha ao incrédulo
do «não comprehendo.»
a evasiva
a
me-
que nSotem
moral. Descrer é
existência dos antípodas,
mos
por
os effeitos da theoria de
O
E' injudicioso
negar
qae não comprehende-
Newton.
christianismo é divino por seu fundador.
Provam-no os factos precedentes á fundação, as
cir-
cumstancias coevas da sua origem e estabelecimento, e
o testemunho.
Ha um
milagre de todos os dias, ha mil e oito cen-
tos annos, a verifical-o: é a sua conservação. Disse Bergier aos racionalistas seus
vous bien,
et
contemporâneos
:
voyez si vos prédécesseurs ont
Exarninez-
pu
être vain-
cus sans miracieJ»
Gerações e systemas, philosophos e philosophias tudo se
foi
Cada
á voragem.
século
tem
queádo ao^abysmo
sábios,
legisladores,
tido seu idolo;
commum
cada
idolo
tem ba
das apotheoses humanas
reformadores,
tudo que teve
um
uma ephémera gloria.
O que está em pé, rodeado das muralhas divinas contra as quaes resaltam em espuma as tempestades da
grande nome,
razão
tyres,
humana,
é o estandarte da Cruz, o guião dos mar-
a estrella dos sábios civilisadores. Este é o
que é
que exacerba a sanha dos adversários da
egreja.
milagre,
Para o não confessarem, injuriam-no.
76
Divindade de Jesus
§1
O
christianismo
meramente
facto
começa com o mundo. N3o
histórico,
um
elo
successos constitutivos da vida da humanidade.
houver de seguir-lhe
é
um
na concatenacao dos
Quem
os vestigios até á origem d'onde
procede, encontra o vago do infinito.
A
historia
da hu-
manidade, para além do primeiro capitulo genésico de
Moysés, é o segredo imprescrutavel do creador.
S3o o velho testamento e o novo,
a-
um
tempo, base
e essência do christianismo. Destruir a validade da tradição escripta
gnam
foi,
máximo esforço dos que impu»
Atacam o ponto mais des-
e é o
a divindade de Jesus.
coberto e azado ás manobras da sciencia incrédula. Le-
vantam-se e abalam, contra os
philosophia,
batalha,
a
com
e
historia,
livros santos, a critica,
a chronologia,
em ordem de
a bandeira da razão na avançada. Se o ra-
ciocinio fraquêa, dá-se á critica o
a zombaria
a
quem
tom da jogralidade: è
canta a victoria. Se a negativa carece
de razão, estabelece-se o scepticismo, e pedem-se aos
crentes as provas materiaes de sua
baraçam as
gia.
illacções
da
Seja
como
for,
Se as datas em-
historia, inventa-se a chronolo-
Se os factos desfavorecem,
d'outros mais conformes á razão
Ario,
fé.
venham de
recorre-se á conjectura
humana.
Julião, de Porphirio,
de
de Helvetius, de Strauss, de Cabet, de Quinet
theorias
nubelosas ou
insultos
manifestos: seja o que
77
THvindade de Jesus
quem
e de
for
for:
tudo serve para reduzir Moysés a
mytho, Jesus Christo a homem, os evangelhos a legendas,
péssimas legendas,
tães
que sequer não poderam
«escriptas
boçaes charla-
por
altear-se ao sublime
estylo aziatico.» E' de Voltaire a censura
de Deus
livros
nem
já
dos homens eram dignos
o Espirito Santo ensinara aos discípulos
feliz
foi tido
«velhacaria estúpida» no conceito
ta de
laureado.
e
;
Gloria
do
pelo que, os
d'um
!
O que
em
con-
libertino
á religião do crucificado
!
Vol-
No toucador da velha LennSo encontrou sentimento nem
taire desprezou-a por sandia!
clos,
seu co-herdeiro
o
piedoso que lhe movesse o animo indulgente a
legado
favor da religião da pureza!
Da
porfiada
que o
resultou
canceira de invectivas aos livros santos
espirito
flexível
com agrado
do maior numero pen-
d*um jugo
os livros sagrados? Optimamente! Não ha nada mais summario! Concedamos que
existiu um homem bom chamado Jesus, egual a outro
homem bom chamado Sócrates dê-se á Judéa a gloria
desse a receber
a desoppress^o
molesto. — SSo apócriphos
;
de
produzido dois judeus de elevados espíritos: Je.
ter
sus e Philon.
Porém, os crentes, inabaláveis
disseram
:
em
sua fé raciocinada,
Negai a authoridade de todos os
livros
conhe-
e anniquilai depois a authenticidade do velho e
cidos,
novo testamento. Nós cremos que Jesus Christo é o Re-
demptor predicto e previsto no velho testamento. Rasgai os livros dos prophetas.
Rasgaram
fácil e
promptamente.
Umas coisas
somma
thos, outras symbolos, outras legendas
Não
O
:
são
my-
— nada.
obstante, reflexionemos.
velho testamento é o mais antigo testemunho da
78
I/ivindade de Jesus
existência
em
homens, e
de
nado
e
administrado
por
d'um povo
de
espago
estudam os
N^elle
orde-
quarenta
culos. E' a sua religião, a sua historia, a sua
ciplina.
homens
particularmente de
nação. E' o livro vulgar e notório
lei,
sé-
e dis-
levitas os encargos e prero-
gativas que lhes incumbem. E' o código dos magistra-
dos nos julgamentos. E' a resalva da tribu e da familia.
Ahi estão os decretos e providencias sobre a
ral,
a lithurgia, e o direito. Reis e sacerdotes
livro, e,
uma
tra e adora o sacratíssimo
mento
;
a
mo.
copiam o
vez cada anno, o lêem ao povo, á raga de
predestinação,' á amplíssima nação hebrea,
Quem
fé
que se
pros-
nome de Jehovah.
responde pela authenticidade do velho testa-
?
Respondem
os escriptores
judeus que, no largo tracto
de mil annos, se firmam na base dos
de suas
leis
livros
authenticos
e historia. Josepho, o insuspeito collabora-
dor dos que fazem repugnância á procedência directa-
mente divina de Jesus,
justifica a
authenticidade do ve-
acostado ás afFirmativas de Manethon,
lho testamento,
de Philocoro, de Apolonio, Alexandre e Polyhistor, gente
mais authorisada
em
historias dos primeiros séculos
que
Dupuis, e Helvetius, e Diderot.
Diodoro Siculo, Pompeu, Juvenal, Galerio, Tácito,,
outros muitos poetas e historiadores dão testemunho da
veracidade dos livros hebreus, como historia, como codrgo
juridico e moral,
como prenunciador dos tempos, e caução
Israel. Zombam, referindo; mas con-
da futura soberania de
juram a provar o
tando-os, isso
facto.
Se o paganismo os desconsidera,
ci-
não lhes desdoura a authenticidade. Obser-
vemos,, porém, que os reformadores da historia, quando lhes
impecem
historiadores
irrefutáveis,
pagãos ou judeus,.
79
Divindade dê Jesus
christaosou mahometanos, removem-os
A
um
biblia é
com menos-preco.
complexo de costumes,
leis,
ritos, pra-
xes, ceremonias, descripçOes, localidades, e pessoas. Esta
concatenação revê antiguidade impossível de contrafazer-se
em tempos
posteriores.
Como que
mostram por meio d'aquellas idéas vagas
se nos entre^
a infância
da
humanidade, as épocas nubelosas dos patriarchas.
Umas
pungem como
locuções
siasmam como
cânticos. E' o
lagrim.as, outras
gemer e
sorrir
enthu-
da natureza
São as primeiras lagrimas e os primeiros
primitiva.
sor-
risos.
a fabricação da biblia,
inverosímil
E'
sem espanto e
sublevação do povo, que se regulava por suas
descriptos eram,
factos
povo historiado.
mil
annos,
Quem
em
parte,
inventasse
leis.
Os
contemporâneos do
uma
historia
não ousaria dizer ás tribus de
de três
Israel:
«Ahi
estão gravadas as vicissitudes de tua errante vida, escra-
va no Egypto, no deserto, quarenta annos, favorecida
por milagres do Senhor.>^
As multidões deveram de
tada.
não
..
por
espar.tar se da historia con-
Moysés que é
um mytho mas
;
por
Esdras que, 'no intender de Spinosa, é o author do Génesis.
E por que não é Moysés? Moysés não escreveu — diz
Voltaire
— por
da como
que não tinha
O
provérbio.
tinta.
A
facécia
de saber que Cariath-Sepher, a cidade dos
séculos anterior a
foi
recebi-
phylosopho não tivera occasião
Moysés.
livros, é
dez
A vantagem da zombaria
é
dispensar o estudo.
Não
foi
Moysés
;
foi
Esdras— tinha
dito o transfuga
da synagoga.
Lê-se,
porém, na
biblia
que, antes da vinda de Es-
W
Divindade de Jesus
para
dras
Jerusalém, já
os
do o varão de Deus.
uma
tou
dígios,
(i)
de Moysés, chama-
lei
Segundo Spinosa, Esdras inven-
de patriarchas e
série
exercitavam suas
levitas
funcções, como Ih'as prescrevia a
que o povo nunca
e outra série de pro-
reis,
ouvira, e
com
o beneplácito
dos samaritanos, que nSo consentiam a mais
cante mudança nos caracteres dos
pois d'estas
de Deus.
Quando
insignifi-
santos
;
e,
de-
assignou-se mero copista da lei
invenções,
(2)
livros
o explicador de Descartes aggre-
diu a personalidade de Moysés, christaos e israelitas dei-
xaram
sem
resposta
o
arrojado
e infeliz fundador do
pantheismo; porém, o que, ha trezentos annos,
foi
dere-
como paradoxo, assumiu em nossos dias a gravidade da controvérsia. Era preciso exhumar o absurdo.
Querem outros que o velho testamento fosse escripto
Hcto
depois do reinado de Salomão.
uma hypothese desamparada da minima probabiliDe Salomão a Moysés decorrem succedimentos,
que um falsificador não ousaria coordenar sem offensa
E'
dade.
da
tradição e do
raciocínio.
<:onsignadas no Pentateuco
As
leis
civis
e religiosas
— fundamentadas na unidade
divina e na liberdade politica
—foram
sempre o regimen
da nação judaica. Estudem-se os acontecimentos desde
os Machabeus até Moysés, lêam-se, Ruth^ os Reis^ Samuelt os JuizeSf e o Livro de Jostié, Ver-se-ha a deduc-
^ão doutrinal fluindo uniforme desde o Pentateuco.
Era
impossível
a falsificação logo
que Judá e
Israel
se separaram, mediante o irritante scisma de Jeroboão.
(i)
ESDRAS.
(z) Ibld. 7, 6.
6, 18.
81
Divindade de Jeêus
Se Judá inventasse ou
pregão da vingança
tradições
inventores da
se Israel
;
a pureza das
e
Judá. Se
scisma, bradaria contra os
justificar o
lei,
manchasse
sacrificar-se-ia á vigilante
escriptas,
Jeroboão podesse
alterasse o texto, Israel daria o
nao daria testimunho publico dos
prodígios historiados por Moysés, n'estas palavras:
ses que elle mostrava eram
os
bezerros
«Aqui
Os
tendes os deuses que vos tiraram do Egypto.»
deu-
de ouro; mas
claramente confessava o milagre da passagem no mar
A
vermelho.
mentira só podia vingar sobre a base ver-
dadeira.
Os
quem
«A
lei
sublimado
judaica,
seja
Jo3o
J.
Rousseau
sempre subsistente, proclama hoje o
homem que
«Embora
pirito
Moysés
detrahidores de
os julgue:
a
a dictou.
orgulhosa philosophia ou o obcecado es-
de facção o tenha
em
conta de impostor
feliz;
o
sincero politico admira nas suas instituições o grande e
poderoso génio que preside aos estabelecimentos perduráveis», (i)
(i)
«Contracto Social» L.
2.»,
cap.
7.
82
Ditmdadé d£ Jesug
§11
Ha de
regeitar-se
tudo ou acceitar-se tudo nos livros
de Moysés.
Que
regeitam
?
Os
de suspeita, que leve
é impraticável
sem
encadeam-se.
factos
em
ferir
A
IntrusSo
um successo,
critica. Ou desva-
mira desvalidar
os olhos da
ou nenhum.
lidal-os todos,
Existem monumentos a confirmar os fastos do povo
como que
hebraico:
tência
se
contam as pulsações d'uma
de quatro mil annos.
O
Redemptor
exis-
predito veio
cumprir as profecias, e involveu-se na immensidade do
seu
mysterio; e o povo inconverso permaneceu aligado
ás suas tradições, ás cerimonias
dos seus
livros. Fica-
ram com o povo deicida as festas da Paschoa, de Pentecostes,
as
lianca, das
memorias do Tabernáculo, da Arca da
tábuas da
metálica, e do
Acodem
lei,
maná do
Sinai.
os adversários da authenticidade da Biblia:
Heródoto, Manethon, Eratostheno n3o faliam de
sés,
nem
vo: logo,
al-
da vara de Aarão, da serpente
dos seus milagres,
tal legislador,
tal
nem do
Moy-
seu famigerado po-
povo, e taes milagres foram
depois inventados.
Heródoto floreceu dez séculos depois, de Moysés; e doze
a treze séculos depois escreveram os outros. Qualquer
d*elles principia a historiar sessenta mil
annos antes. E*
a mythologia contra a qual já ninguém se despende
em
88
Divindade ds Jemis
argumentos
Isso foi
sérios.
gosto
passado,
do século
quando todas as absurdezas serviram á supina ignorância
d'uns philosophos que pareciam professal-a
de
artistas
com esmero
na arte de fabular.
Ora, não
seria justo
que a
a
nulla
em
razão, tão applaudida
decisões de historia equivoca, se exercitasse
em
authoridade de historiographos que
pela assembléa dos deuses na terra,
avaliar
começam
e organisam depois
homens?
a sociedade dos
Aquelles mesmos, escriptores coevos, chamados a depor contra as legendas mozaicas, contradizem-se
ctos
de primei-a importância
dois
séculos,
quem
;
em
prezo as chimericas e abstrusas narrativas sobre a
tica
do
tx)i
fa-
quiz escrever a historia do Egypto
das tradições populares, e deixou
soccorreu-se
em
de modo que, volvidos
des-
mys-
Apis.
Heródoto,
chamado
o pae da historia, é considerado
o enthusiasta das maravilhas
com que
elle,
nos jogos
Observemos agora
sempre o nome que elles
olympicos, extasiava os seus ouvintes.
que os philosophos— dê-se-lhes
se dao
— classificam
de mytho Moysés, e de legenda o
velho testamento: como testemunho, serve-lhes o silencio dos antigos historiadores á cerca
e dos seus authores.
tosteno é que nSo
iam á
razão, e
Em
dos livros sagrados
Heródoto, e Manethon, e Era-
ha mythos
nem
legendas: estes fal-
convencem-na. Moysés é que é mytho e
fabula por que historiou o principio do mundo, e ensartou
uma
successao de factos, quasi sempre naturaes e
comprehensiveis,
tendentes a illucidar
uma
religião ra-
cionalissima, assentada na idêa do monotheismo.
Repugnar a verdade do velho testamento, por que a
nSo contestam autographos contemporâneos, é negar
S4
Divindade de Jesus
os commentarios
xaram
de Cezar por que os gallezes nSo dei-
escriptos coevos do conquistador romano. Posto
que Moysés, primeiro
de
uma
sociedade
que nenhuns
historiador, refira
solitária,
acontecimentos
e estremada d'outras nações,
impede que
vestigios deixaram, isso não
os detractores de sua veracidade considerem
thenticos os
escriptos
menos au-
do legislador hebreu do que os
em que
commentarios de Cezar, escriptos n'um tempo
sobejavam historiadores para cada nação.
Não bastou
a seu
á critica da razão indócil cortar pela
bel-prazer, a arvore
da cruz.
deiro
Da enorme
em que
se enxertou
raiz,
o ma-
façanha desceu a subtilesas
grammaticaes, esmiuçando com paciência, egual á ignoo
rância,
Os
riada.
rantes
d'uma interpretação va-
sentido philosophico
bem que
anatomistas dos livros divinos,
tole-
na analyse de historias pagãs, não soffrem que
debaixo do seu escalpello se não mostrem sensíveis e
palpáveis os ligamentos que atam
lhes
disemos que
bolica,
fechada com o
nas visivel
elles
facto a outro.
Se
sanctuario de Jerusalém, ou ape-
na penumbra da
que desadora symbolos a
com
um
ha ahi relanços de linguagem sym-
iei
critica,
nova, redarguem-nos
e não
quando estuda racionalmente
tem
q.ue ver
e chronologica-
mente a geração anteposta á civilisação christã. Replique-se que no velho testamento são obscuridades os lapsos dos copistas, as notas explicativas amalgamadas no
texto, e interpretações falsas que traductores deixaram equivocas,
e
marcadas do
sêllo
de nossas imper-
feições.
Rossely de Lorgues, o author de /esus Christo perante o século,
que intenderam
desceu
a
responder
reagir á revolução
aos
racionalistas
de Christo com uns
:
Divindade de
Disseram
reparos exegeticos.
que
85
Jes^is
elles
que
Jerónimo tradusira de yom,
S.
tempo para
globo,
o
solidificar-se
dia,
termo
era pouquíssimo
como Moysés,
rantíssimo geólogo, contava no Génesis.
tãío
nm
O
igno-
douto chrís-
responde á sciencia dos naturalistas que a expressão
yom não demarca
um
gna
uma
espaço de tempo,
mas
desi-
revolução, cujo termo
humanos ignoram.
os cálculos
Com
o período dos nossos dias;
aos
referencia
muito antes das
santos,
livros
tríumphaes conferencias de Frayssinous, de Ventura, e
Lacordaire, ponderou Bossuet
quem
«iN3o falta
ria
da
diga que ha diíficuldades na histo-
Em
Escriptura.
não haveria, se este
sido
verdade as ha, e certamente as
livro fosse"
fabricado (como
ousam
menos
antigo, ou tivesse
dizer) por
homem
hábil e
ingenhoso que emendasse o que se faz agora reparavel.
Ha
n'elle
todavia,
des,
diíficuldades
as
quando
;
conheço que sim
;
são essas,
difficuldades suscitadas pelo curso das idaos logares variam de
nome
e estado, quan-
do as datas esquecem, e as genealogias se perdem
Pergunto agora
substancia do
:
acha-se
de nos
revela a
livros santos.
rios,
entre os
d'ahi
?
theuco,
sujeito
livro
que tem sombras
Que
Ha
escuridade no
tal
?
Não.
mesma
Tudo
.
é seguido, e o
venerável antiguida-
textos samaritano e judeu.
volta
.
differenças, dizem os adversá-
os judeus ou
depois da
.
âmago ou na
Que
inferem
Esdras fabricaram o Penta-
do captiveiro? Deve
inferir-se
pontualmente o contrario. As differenças provam
em
evidencia a antiguidade do Pentatheuco anterior a David e Salomão...
ridade
Quão
incontestável
é, pois,
a autho-
de Moysés e do Pentatheuco, se todas as objec-
ções o cimentam e consolidam
!»
CAPITULO
O
II
cumprimento das prophecias
líiissSo
de
quem
justifica
a
divina
prophetisou, e a divindade de Jesus
em quem se realisaram.
Em quatro mil annos,
decorridos desde
Adão
até ao
seu resgate, manifesta-se relevantemente Jesus Christo
nos vultos históricos da historia do povo hebreu. Aclaram-se mais os relevos dos symbolos, quando se aproJíima
a
vinda do
mulher nascerá
Reparador, de
um
filho,
quem
fora dito:
«Da
que esmagará a cabeça da
serpente.»
Dois mil annos depois d'este promettimento restaurador, recebe Abrahão, alliado de Deus, a prelibac^o
antever gerar-se
em
de
sua posteridade a vergontea divina,
á sombra da qual virão sentar-se as gerações rederaidas
da sombra da eterna morte. Jacob indica a
<éá,
como
tribu de Ju-
sanctuario da esperança redemptora, e David,
88
Divindade de Jesus
em
de
extasis
como
Além dàs
gloria,
individualisa sua própria familia
a indigitada a Abrahao pelo Senhor.
em ramo
Judá
prophecias,
um
signal personifica o salvador
distincto dos muitos
que bracejava o tronco de
o Messias, por espaço de três mil annos, é repre-
:
sentado n'uma série de personagens, analogicamente
em
gurados
Adão
Figura
emanação
filial.
pae da nova raça, e a egreja a sua
o
Abe) é o irmão e a victima
dec o seu eterno sacerdote; Isac o seu
o
seu
fi-
nascimento, vida, morte e ressurreição.
desterro
;
Melchise-
sacrificio;
Jacob
voluntário buscando sobre a terra a es-
posa fecunda e abençoada. Joseph vendido pelos seus^
escravo, preso,
perdoando, e
beneficiando seus
perse-
Moysés salvando e libertando; Josué, salvatambém, e triumphador com seus irmãos na terra
guidores.
dor
promettida;
Gedeão, o vencedor de Baal, salvando o
mundo com
debilissimas armas; Sansão pela natividade
miraculosa, escolha de esposa entre gentios, e victoriosa
David, a realeza doce e affectuosa, o
morte na cruz;
império fundado sobre ingentes contrariedades; Salomão
o triumpo e
meza do
três dias
O
a
gloria;
cordeiro
Jonas,
redemptor,
a vocação dos gentios á
a
ressurreição depois
de
de sepultura,
natural acaso podia estabelecer aquellas analogias
Concedamol-o á
critica philosophica;
porém, seja-nos
?"
re-
levado que não attribuamos ao acaso o cumprimento
das prophecias. Não
que dão
grecido o
tal
da
fé
sei
quanto pezam uns racionalistas
ao acaso, e recusam-na aos milagres. Inne-
coração,
intelligencia.
pouco vai d'ahi ao pyrronisrao bruEntão é o negarem a
historia para
negarem os prophetas, e o negarem os prophetas
negarem a divindade de Jesus Christo.
j>ara
89
Divindade de Jesus
Ir
com
os olhos d'alma ás profundezas do futuro n3o
é façanha
plicar-nos
que as sciencias tenham podido excomo ahi as ha, n5o menos in-
natural
com
theorias,
comprehensiveis que a sobreexcitação intellectiva dos
Agastase contra o dom prophetico a
videntes.
philoso-
phia sensualista, e repugna humilhar a razão á condes-
de receber como verdade a coisa inexplicá-
cendência
bem que
monumento de
historia incontroversa.
Ahi estão os
na
terra,
sem
cumprido, e assignalado por
facto
seja
vel,
israelitas
nem
rei
ha dezenove séculos dispersos
legislador.
A razão
catholica, ao
vêl-os assim tão carecedores de compaixão, e alquebra-
mão da
dos sob a
justiça
humana de
recorda as palavras de Jacob
de Judá,
nem
o
legislador
:
«O
infaustas eras,
sceptro não sahirá
da sua posteridade, até á
vinda d'aquelle que deve ser enviado e a
vos obedecerão.»
A razão
acaso,
philosophica ,
explica
quem
os po-
(i)
ponderando este maravilhoso
o derramamento da nação judaica entre
as varias nações
da
terra,
com
o facto de Tito e Ves-
jiasiano lhe anniquilarem a nacionalidade, sepultando-a
nas ruinas de Jerusalém.
as palavras de David,
Mas
a
razão catholica escuta
computando setenta semanas de
annos para a vinda do Salvador, a contar desde a
do templo
dificação
Christo
em meio da
um
sexagésima semana; escuta-o apon-
mão de Deus,
gamundeando miserável, sem altares, sem sacrifícios,
á consummação dos séculos (2).
tando
(1)
Gen.
povo, que já não está da
xLix. 10.
(2) Idem, IX. 25. e
ree-
escuta-o annunciando a morte de
;
seg
vaaté
:
90
Divindade de Jesus
A prophetisada
destruição do templo, arrasado desde
os cimentos, tem dois valores na historia: a destruição
incontestável,
baldados d'um imperador
e os esforços
romano no intento de
reedifical-o para
desmentir os pro-
phetas judaicos, e as palavras de Jesus. A razão philosophica negará a tentativa de Juliano, invertendo-lhe a
intenção
sus
:
;
ou aspará dos evangelhos as palavras de Je-
«Jerusalém, Jerusalém, que matas os prophetas, e
apedrejas os que te
!
Quantas vezes eu
como
a galinha aconche-
enviados
s2[o
hei querido reunir teus filhos,
ga os pintos com suas azas, e não tens querido? Pois
sabe que as tuas casas hao de
A
razão philosophica
globos
plo
ficar desertas.»
em que
estriba o negar
qué uns
de fogo se desentranharam das ruinas do tem-
cavadas por Juliano, o apóstata
?
E' por
padre- do quarto século lhe conta a legenda?
que algum
algum
so-
nhador de Pathmos inventaria a pia fraude, que os con-
mandaram
cilies
nos fastos da
inserir
Roma
nos annaes da christandade e
imperial
?
Certamente nao. Ammiano-Marcellino, inimigo
christãos,
Vaso
um
e grande amigo
dos
do imperador, deve dar do
solemne testemunho. Traslademos textualmente
as suas palavras
«Juliano
chamou de toda
rários, e confiou a fiscalisação
pio,
um
a parte os melhores ope-
da grande empreza a Aly-
dos seus principaes amigos, e encarregou-o de
não poupar despezas no incessante trabalho. Confluiam
de toda a parte judeus a Jerusalém, insultando os
tãos,
ameaçando-os,
violentando-os,
como
soado a hora do restabelecimento de sua
lheres
á
se
ilação.
chris-
tivesse
As mu-
despiam os mais valiosos ornatos para ajudarem
despeza da obra,
e os
judeus trabalhavam
com
as
91
Divindade de Jesus
próprias mãos, e carreavam terra nas túnicas, n5o obs-
mandar
tante
fabricar
picões,
pás,
e cestos de prata
para a piedosa obra. Cyrillo, bispo de Jerusalém, regres-
sando do desterro, encarava n'estes preparativos tranquillamente, confiado na infallibilidade dos prophetas, e
affir-
mando que em breve se viriam confirmando as prophecias.
«Ao cavarem os alicerces, arrancaram enorme pedra,
e descobriram
uma
caverna cavada
um
desceu suspenso d'uma corda
em
rocha, á qual
operário, o qual, to-
cando no fundo, entrou n'agua até ao joelho;
pando em
redor,
em cima
agua,
fmissimo pano
Chegou
uma columna
topou
da qual encontrou
:
um
e, pal-
á superfície da
livro
envolto
n'um
tomou-o, e deu signal que o içassem.
a cima; e quantos viram o livro
admiraram de
nao estar estragado; porém, maior foi o assombro de pagãos
e judeus, quando, abrindo o
começo,
em
lettras maiúsculas:
e o verbo estava
que
livro,
em Deus,
leram estas palavras, no
No principio era
e o mais
o verbo,
que se segue,
por-
este era na sua integra o Evangelho de S, Jo3ío.
«Quando Alypio
coadjuvada pelo
accelerava
governador de
ardentemente
província,
a
obra
romperam
dos alicerces frequentes línguas de fogo, e globos igrfeos
formidáveis, que, sobre
naram o
queimarem os trabalhadores, torcomo vissem que o fogo sé
logar inacessível; e
em queimar tudo, foi suspendida a empresa». ( i)
A razão philosophica declara, n'este ponto, que o his-
obstinava
toriador
deu,
coevo de Juliano conta o facto como
sem obtemperar aos
lhes pede outra resposta
siso
elle
commum.
(i)
Citação de «Fleury»
se
Nao se
aos phllosophos. Esta nao tem
pregoeiros do milagre.
— H.
Ecd. T.
4. L. 15. art. 41.
S2
Divindade d^ Jesus
§
I
Annunciaram os prophetas o Messias
e tao dentro
;
d*alma da nação hebrea se intranhara a esperança de
sua vinda que, nos derradeiros tempos, o apparecimenta
de
João Baptista suscita nos judeus a certeza de que
S.
é chegado o Christo, e os samaritanos por egual se en-
tram do
tana a
mesmo convencimento. «Eu
Jesus— que
será enviado por elle
Não
sei, diz
a samari-
o Messias está próximo, e tudo nos
quando chegar.»
se restringiram, porém, os prophetas a predizer a
O
vinda do Salvador.
retrato
que
predefinem do
elies
Messias é tao minudencioso, que impossivel seria con-
com
fundil-o
os seus contemporâneos.
Disseram que nasceria d*uma virgem
Que
Que
Que
bres
nasceria
seria
seria
em
(i).
Betlem, aldêa obscura e incógnita
da tribu de Judá e raça de David
pobre,
(2).
(3).
nova aos po-
e annunciaria a boa
(4).
Que
seria
obscuro e sem magnificência
dia se lhe prostrariam os reis
;
mas que yna
(5).
(i) Izaias, vij, 14.
(2)
Mich. V,
(3)
Gen.
(4)
Zach.
2.
X, Izai. x?,
11;
Sam.
IX, ç, 10; Izai. xi
5) Izai. uii, 4.
,
xvj; Ps. 39. Jer. xxiii.
3.
93
Divindade de Jesus
Que a voz doeste precursor soaria no deserto (l).
Que semearia milagres e benefícios em seu caminho (2).
Que o espirito do eterno, espirito de sabedoria, de
de conselho, de força, e
intelligencia,
com
tiça
elle,
;
e o faria brilhar
porém, ao
em
mesmo tempo,
a sua omnipotência se-
sublime de doçura e humildade
ria
Que
seria ludibrio
lido e perseguido por
beleceria
Que
seu povo
(4).
sacrifícios regeitados, esta-
um somente, duradouro e puro, que
em todas as regiões da terra (5).
seria trahido por
Vendido por
um
Que, espontaneamente,
como cordeiro sem defesa,
quelie que o afoga (10).
dos seus discípulos
de pés e m3os
se
XL,
(3)
Dan.
Malach.
e
deixaria
mudo
(11).
3.
IX, 26. Izai. VI. 10;
10, 11.
(5)
Ps. XI, 12, 13.
(6)
Zach. XI, 12 13.
<7) Ibid.
XIII. 7.
(8) Ps.
(9) Izai. LIII.
I.
(10) Izai. LIII. 2.
(11) Izai.
(6).
(9).
(2) Izai. XI, XL, XLlí, Lll, Zach. IX.
(4)
con-
levar á morte,
entre as
m^os
d'a-
esbofeteado, cuspido, affrontado, cravado
seria
(i) Izai.
seria
trinta dinheiros (7).
Desamparado dos seus (8).
Calumniado por testemunho
Que
{3).
de despresos e contradições, repel-
Que, em vez dos antigos
sagrado
de temor seria
pleno resplendor de jus-
LIII,
3.
LV.
2.
Divindade de Jesus
94
Qu^
os transeuntes insultariam suas agonias tregei*
tando. (i)
Que
como
elles.
Que
Que
Que
contado
seria
entre os scelerados e suppliciado
(2)
lhe jogariam aos dados a túnica. (3)
lhe dariam
ceiro dia
fel
seria gloriosa
;
e vinagre. (4)
sua sepultura
allumiaria toda a carne
;
resuscitaria ao ter-
com
o reflexo do seu
espirito. (5)
As prophecias
realisaram-se
em
Jesus Christo.
Escutemos os philosophos.
(i) Ps.
XXI
(2) Ps.
XXI,
;
Izai.
Jérem. e Zach.
7, 8.
(3) Ibid. 8, 19.
(4J Ibid, 22.
(5} Ps.
XV,
9, 10. Izai. XI, 10. Joel XI. 28.
Izai.
XL. 9.
!
9^
Divindade de Jeaus
§11
Os
philosophos denegam
pouca
luz,
umas prophecias
por que
outras por que s3o claras demais.
tem
As muito
luminosas, no dizer dos racionalistas, foram engenhadas
depois dos successos,
por
que esclarecem as menores
miudezas e circumstancias. As outras nada tem análogo
com
os
factos, e astuta e violentamente lhes concerta-
ram as anologias
interessados
os
doxo do dom prophetico.
grosso,
se vê».
Voltaire,
disse
:
O
em
sustentar o para-
patriarcha do materialismo
«nao pôde prever-se o que nao
Este aphorismo cortou a questão.
antiga escrevera
milhares de
livros,
A impiedade
sem chegar
a con-
clusão assim redonda
Está visto que não ha ahi conciliarem-se prophetas e
Luz de mais e luz de menos sao attributos
damninhos que tornam inadmissíveis Jeremias e Ezeincrédulos.
chiel.
Havemos de
torias
de Salvador, de Strauss, e de Proudhon.
Salvador,
àspal-os da historia, e acceitar as his-
ao menos,
não lhe soffrendo o animo que
os prophetas-biblicos fossem expulsos da assemblea dos
homens de
lettras,
lembrou que se lhes concedessem
honras de poetas. Contrariaram esta benévola reclama-
ção os seus coUegas, allegando que não duvidariam cathalogar os prophetas na honrosa espécie dos vates, se
elles
cio.
tivessem existido como Homero, Tibullo, e Proper-
Redarguiu Salvador que nao havia razão
efficaz pa-
96
ra
Divindade de Jesus
negar a existência de Ageo, Zacharias, e outros poe-
tas orientaes.
verem
Ajuntou que a prova concludente de haera
existido
genérica Índole hebraica
a
em que
poetaram, pois que era essencial da poesia hebraica
in-
que ó
in-
dividualisar a divindade no povo judeu. Isto é
tendimento
O
!
povo hebreu figura Deus, ou Deus enno povo judeu, que, mais tarde,
trou exclusivamente
representando collectivamente o Messias, se suicida na
pessoa de
Jesus.
Deus, nação judaica, e Messias sSo
mythos significando uma coisa, que Salvador n^o diz o
que seja, por que elle sinceramente nSo nos leva vantagem em
sabêl-a.
em
Reposta a questão
o philosopho
na missSo
distinctos
da
de
os
videntes,
prenunciavam
Nao
ção judaica.
vinda do
Homens communs,
Israel.
in-
humanidade, sem commercio com os po-
superiores,
poética,
ajuizada e séria,
nega as coisas sobre-naturaes, e a divina
influencia
deres
controvérsia
levados de allucinaçao
glorias, delicias, e poderio á na-
com a
Deus circumscreviam
lhe promettiam senSo faustos
Messias, e ao povo de
as suas operações propheticas.
A
de o que seja a
povo redemptor,
Não quer
em vista o povo
53,
este
prediz
hebreu;
inten-
luzeiro
do mundo.
a phiiosophia que Jacob, Izaias, e Daniel
A quem
era
?
Izaias,
a morte e resurreição de Jesus.
ponto que é grave. Está entendido
com
mas não
consubstanciação de Deus no povo,
referissem ao Messias.
se
e
conforma-se aos que dizem que as
christandade
propheciastinham
no cap.
Intendamos
com
Salvador,
dois sábios de sua polpa. Jesus Christo é o po-
vo todo, ou a parte
fiel
da nação, ou o corpo collectivo
dos prophetas. São três opiniões
:
três paradoxos,
que a
;
07
ijivindade de Jesus
habilidade de Rousseau, amantissimo de theses absurdas, regeitaria
como
ineptos.
Prediz Daniel o termo dos sacrifícios antigos, a ruina
naçãío, como castigo aos deícidas. Respondem que Jesus Christo não era o desejado das nações, nem o promettido dos prophetas. Em quanto ao
do templo e da
cumprimento das prophecias, remettem a questão á natureza das coisas e á critica da historia.
«Nos
se
livros sagrados, diz
um
philosopho christão, nSo
unicamente da prosperidade temporal, rique-
tracta
zas e delicias da vida.
Um
Messias, profundamente dis-
em
do povo judaico, é annunciado
tincto
ginas dos livros inspirados. Se ahi
magnificências,
também
lhe
são
humilhações e morte. A' hora,
todas as pa-
sãío
predictas as suas
ahi
prophetisadas as
em que
era esperado,
appareceu o Messias. Não ha negal-o, não o negam os
doutores judeus, applicando-lhe,
como
impossíveis de caberem n'outro. Foram
nós, prophecias
também
predic-
tas a destruição, a ignominia, as calamidades, que, ha
dezoito
séculos,
esmagam
a
raça
israelita.
Se Jesus
Christo não era o Messias, se o crime do povo judaico
não
foi
desconhecêl-o,
como
explicar a implacável vin-
gança que o persegue ha tanto tempo?
povo, e os de todo o
e,
mundo nada
Os
annaes d'este
referem semelhante
quando o raio da desgraça os fulminou, eram
como nunca haviam sido, zelosos observantes de
todavia,
elles,
sua
lei.»
(i)
Chegados
(i)
os
tempos assignalados da redempção, a
MARET. «Tratado
sobre o Pantheismo», pag. 417.
«Religião christã illustrada pelas profecias».
JOLY.
98
Divindade de Jesus
'
divindade de Jesus já radia nos successos estranhos que
complanam
o caminho por onde o
chegar ao seu
throno.
O
rei
das nações ha-de
reino eterno
expede ao
alto
suas cúpulas perfulgentes por entre as nações, que
ba-^
queiam tocadas pela m^o da Providencia. Durante os
3.
últimos quinhentos annos anteriores á era christa, todos
em
em que o
os grandes impérios sSo absorvidos
monarchias
como
sal,
e,
;
no momento
diz o apostolo, se ergue
desprezado,
herdeiro univer-
do seio de
um
povo
as quatro monarchias arrastadas por inven-
fascinação,
civel
quatro poderosas
depõe os annaes de suas
ás
glorias
plantas do degenerado neto de Augusto.
Este^prodigioso facto anteviu-o Daniel
:
os historiado-
que o leram nas ruinas de assírios, persas, gregos e
romanos não o referiram com mais negras e trágicas ima-
res
gens.JSobreJas ossadas das quatro ingentes monarchias er-
gue-se o Filho de Maria, o operário da Galilea, o Deus, o
coroado de^espinhos,
com
n'um
o seu cortejo de infelizes,
throno J^de agonias.
Malg* podemos [sem assombro contemplar a incadeada
destruiçao|dos impérios que ruem esphacelados uns ás
mãos dos
outros.
O
quadro, porém, é providencial
nao interroga os decretos do Ente supremo
razão
frange-se
judeu
;
e
humilha-se.
Os
assírios
os gregos
do Império oriental
:
a
sobvertem o povo
ao ultrapassarem a missão, que
cumprem sem
consciência, surgem os persas a algemal-os.
se
;
con-
:
Senhoream-
propagam a sua
lín-
gua, que será a dos apóstolos, para que os livros santos
sejam depurados das Imperfeições hebraicas.
são jájuma|cadêa lançada
Os
mensageiros
retenham.
No
da
em
Os
povos
torno do sollo de Tibério.
boa-nova nSo ha barreiras que os
melo-dla fallase a linguagem do septem-
Divindade de Jesus
trião.
Os
discípulos
99
de Jesus podem annunciar que o
sceptro sahiu de Judá, conforme a predicção de Jacob.
E a
historia
de quatro mil annos será compendiada
em numerosas nações,
Omnia vestra siint^ vos au-
poucas palavras, e comprehendida
quando
S.
Paulo clamar
:
em
iem Christi, Christus autem Dei.
CAPITULO
111
Jesus
Era esperado, "desde o principio do mundo,
um
repa-
rador.
Numerosas naçSes alvoroçadas por esta esperança, fitavam uma estrella, que a tradição lhes apontava no
céo da Judea.
Affirmaram-o
Suetonio e Tácito entre os escriptores
Confirmaram-o Boulanger,
pagãos.
Volney, e Voltaire,
d^entre os mais abalisàdos inimigos da religião revelada.
«Uma
antiga e constante tradição,
diz
o historiador
dos cezares, derramada por todo o oriente annunciava
que em determinado tempo devia
minador do mundo./>
«Os
sibyllas,
no tempo de Cicero,
como
orador philosopho
(i)
da Judea o do-
romanos, diz Boulanger, posto que mui republi-
canos, esperavam,
pelas
surgir
(i)
:
se lê no livro do
um
rei,
predito
Vaticínio d'este
as calamidades de sua republica de-
Vid. de Veèpasiano.
102
Divindade de Jesus
viam dar o
signal, e a
monarchía universal a consequên-
cia.»
Escreve Voltaire: «Desde remotissimas eras, grassava
que
índios e chins o boato de
entre
occidente.
A
Europa
dizia
um
que o sábio
sábio viria do
viria
do oriente.
Todas as nações assentiram á necessidade de
bio.» Ora, a
um
sá-
Judea está coUocada ao oriente da Europa,
e ao occidente da Índia e China.
«As
tradições
sagradas
mythologicas dos tempos
e
haviam levado
n'um sublime mediador o qual
anteriores á era christã, observa Volney,
por toda Ásia a esperança
devia
;
supremo, salvador futuro,
vir, juiz
rei,
Deus, con-
quistador e legislador, a inaugurar na terra a idade do
ouro, e a redimir os
Da
noso
d'um
officina
que
espirito,
homens do império do mal.»
operário de Nazareth sahiu o lumi-
irradiou no coração dos justos,
quaes o
um
menino,
velho Simeão do templo. Aos doze annos,
creado na supersticiosa e ignorante Judea, vai á syna-
impugna
goga,
a doutrina da
lei
velha, e humilha a so-
Os ouvintes, suspensos dos lábios
dizem: «Nenhum homem fallou assim!
berba dos doutores.
d'uma
criança,
Onde apprendeu
E não
era
estas coisas o filho do carpinteiro
? !»
que
res-
como
Sócrates, e Platão, e Gicero
peitaram os desvarios supersticiosos do vulgo. Estremava-se
dos
philosophos
da gentilidade, que pregoavam
máximas de bôa vida, e as desdouravam na pratica.
«Se nao credes em minhas palavras, dizia o justo da
Galilea, crede ao menos em minhas obras.» Aos que
lhe espiavam
mal-querentes a existência milagrosa de
benefícios e abnegação,
disia:
«Quem
de vós
uma culpa ?>
Na serenidade^^^dejseu" rosto lampejavam,
me
apon-
tará
intercaden-
103
Divindade de Jesus
com
tes
vindade.
as amarguras de
homem,
os resplendores da di-
Acariciava as criancinhas
com
com branduras de
amor de filho.
Enxugava lagrimas com as consolações nunca ouvidas
da palavra humana. Coava bálsamos estranhos ás chaaos velhos
Fallava
pae.
recônditas
igas
respeito e
da alma. Desapertava os pulsos roixos
das algemas de tyrannos. Diante do pobre, admoestava
a soberba do poderoso. Diante do poderoso, ensinava ao
pobre a virtude da humildade.
sem antepor aos
de,
Ia á
presença do gran-
exteriores da pobreza a
recommen-
dação de sua divina mensagem. Abraçava os fugitivos
á
pharizaica, instrumento dé hypocritas, sepulturas
lei
branqueadas, cheias de vermes e podridão. Sustentava
as multidões famintas com o pSo que o Pae multiplica-
va debaixo de seus olhos supplicantes.
em
de luz os olhos cerrados
raio
com um
Feria
trevas desde o nasci-
mento. Levava suas palavras ao coração do surdo para
quem
a
va ao
paralytico erguer-se
linguagem humana fora
sobre o tumulo de
nova com
suas
com
Lazaro,
um
Manda-
mysterio.
o seu grabato.
Chorava
e filtrava-lhe no seio vida
divinas lagrimas. Perdoava á mulher
peccadora, que a justiça da terra apedrejava. Curvava-
se
a
lavar
os pés dos discípulos
que o seguiam
vacil-
3antes de fé e coragem.
Este justo,
se fosse
Eram predestinadas
gueram-se homens
um homem,
não
teria inimigos.
as suas inenarráveis amarguras. Era injurial-o.
e do perdão encarou-os
com
E o santo da paciência
quando
doçura, e fallou,
os viu baixaremse para o apedrejarem
:
«Por qual dos
meus benefícios quereis apedrejar-me ?»
Não era homem que a sua paixão foi um assombro
;
104
Divindade de Jesus
nunca repetido de humildade, submissão, br^indura e
constância.
Nao
homem
era
;
que as calumnias, os
dores, os supplicios nSo lhe arrancaram
um
ultrajes,
as
gemido de
cólera.
N3o
homem
era
;
que antes do trespasse de Jesus
Christo nunca o perdão baixara da cruz sobre os algozes
d'um innocente.
morrera
Sócrates
imperterrito.
um
sábio,
«Se
com espantosa coragem
e
animo
a vida e morte de Sócrates foram
a vida e morte de Jesus foi de
um
de
Deus.>
Diz Rousseau, o philosopho, a consciência alvoroçada
por
um
rapto do coração.
105
Divindade de Jesus
§
Os
do
philosophos
quem
1
passado,
século
os mestres de
os philosophos actuaes joeiraram as doutrinas de-
purando-as da impiedade torpe, disseram que Jesus fora
um
impostor.
Impostor por que se declarara enviado de seu Pae
celestial.
Impostor por que se chamara filho de Deus.
Impostor por que se dissera juiz universal de vivos e
mortos.
Sentaram-no entre Apollonius de Thyane e Mahomet, e julgaram-no.
Os
milagres do Nazareno estavam para além de de-
«Queremos ver um milagre !» diziam os
Nao viram os rabbis do século XV 111* rasgar-se o
zesete séculos.
juizes.
véo do templo; nem toldar-se de crepe o
a
der-se
pedra tumular.
provocador, e escreve
:
Holbac
fita
«Que Deus
sol
;
no céo
nem
um
fen-
olhar
impotente é este
que me não fulmina?»
A
menos blasphema, ou sabe
Concede que Jesus
grande
homem,
grande quanto podia ser
haja sido um
na sua época, e com os poucos elementos da sua edugeração immediata é
puiir
cação.
mais urbanamente a
Discorreu,
priedade,
mo
a
injuria.
propósito, sobre pobres, ricos, pro-
liberdade, tyrannia,
social, e
acabou por
communismo, christianisque a religião do cruci-
alvitrar
ficado era já insuíTiciente ás necessidades do tempo.
106
Divindade de Jesus
Senão era Deus, por que ha de
Jesus
ser
grande homem
?
Tão sublimes doutrinas havia
dogmas que confundem a razão ?
mister innublal-as
em
carregai-as de obriga-
ções e asperezas que irritam o animo? demasiar-se
em
maravilhosas artimanhas que invalidam a seriedade da
doutrina?
Onde
está o
grande homem que se não apoia
absolutamente na forca do exemplo próprio para santificar a belleza
do seu apostolado
?
Platão e Sócrates dis-
como desnecessários á implantação
da crença n'um Deus remunerador da virtude, e castipensaram
prodígios,
gador do crime. Para a grandeza de Jesus bastava-lhe
a pureza da vida e a santidade dos preceitos.
lacro
cia
O
simu-
de milagres, auxilio de impostores sem consciên-
de sua missão, damna á sublimidade da obra, quaes-
quer que fossem as consequências.
Como podem
os phi-
losophos consentir na magnitude e superioridade do impostor,
que finge o milagre para
deixa morrer
discípulos,
ineptamente como
que
elle
realçar a doutrina, e se
um
louco, odioso aos
deixa perseguidos, e escarneo das
que elle quiz enganar ?
Grande homem / Será o epytheto um novo amargo
que lhe imbebem na esponja de fel ?
O doutrinário da Judea que precisão tem de nos
turbas,
cohibir a satisfação de paixões
podem harmonizar-se com
que tão agradavelmente
os affeciivos princípios da sua
moral? Por que nos dá a sua carne e sangue, como co-
mida e bebida, se nos abasta a razão natural para nos
em sua óptima doutrinação?
Vaidade summa é essa de querer reunir o universo
em redor de sua cruz affrontosa, quando o inspirado
espiritualisarmos
!
!
107
Divindade de Jesus
Sócrates se absteve de predizer que
iria
alguém adorai-o
na sepultura
homem
é Sócrates..
Se
Jesus é impostor, por que injuriais os executores da
lei
Se Jesus n3o é Deus, maior
que pune
blasphemos
os
?
Judas de Kariot é menos
censurável que Melitus; os Herodes e Pilatos foram me-
nos intolerantes que os heliasies de Athenas. Sócrates
falia
sempre em nome da razão
que
:
julga-se impellido do
da sua inspiração; porém nao pretende
seu demónio^
o demónio inspirador lhe haja baixado do céo.
«Sê
virtuoso para ser feliz» é o resumo da sua doutrina.
Que homem, querendo vingar doutrinas de sa moem meio d'uma sociedade cancerosa de vicios e hy-
ral,
pocrisia astuciosa, começaria por atirar ás faces dos po-
derosos o sudário dos seus crimes d^elles
Respondem
:
«Seria
aquelle que,
?
á semelhança de
Jesus, curasse de captar ardilosamente a bem-querença
da plebe.»
E como é que
se prende a
bem-querença da plebe?
Favoneando-lhe as paixões. Ao
des,
como
proletário, se lhe disser-
Jesus, que soffra resignado a penúria, espe-
rançado na bem-aventurança dos que choram, o proletário
ha
íie voltar-vos
as costas,
como
a pérfido bandea-
do com os poderosos.
Jesus Christo era austero com pobres e
systema tao
irracional
ricos.
Que
para crear prosélitos, segundo a
philosophia social
Então
seguido
em que
por
era elle
grande homem f
Em
ter
con-
meios sobrenaturaes levar depoz sua cruz
milhares de martyres, uns que sahiram da pobreza, outros
que desceram do
fastígio
da
gloria
mundana, para
se encontrarem todos nas garras das feras
?
!
J08
!
Divindade de Jesus
Se Jesus era
homem, que
estúpidas gerações se
vantaram a proclamal-o Deus, e a morrer
em
le-
honra de
sua doutrina
Que
de
S.
serie
de ineptos escravos d'um preconceito, des-
Paulo até aos desgraçados que ainda agora se es-
tão deixando matar,
•
Bemdito
fosseis
sejais,
propagando a
Jesus
homem, sem
Christo,
fé
Filho
operar maravilhas,
de Deus
terieis,
!
Se
desde o
sermão da montanha, convertido a vós os grandes e os
pequenos?
O
resplendor de
vossa divindade cegou a raça pre-
varicadora que devia immolar»-vos
em redempção da
hu-
manidade. Conspiraram todos contra vós, Senhor, por
que não quiseram acceitar-vos como Deus, e não podiam acceitar-vos como homem
!
109
Divindade de Jesus
II
§
As sublimes
que fecundaram a
doutrinas,
de Jesus, onde as estudou
cia
O
dou
responde
christao
creou-as
:
«Fez-se
como
O
:
elle
?
Verbo divino nSo as estu-
creara o universo.
na escola dos essenios ou dos sadduceos»
respondem os admiradores do grande
explicarem peio
Dois
intelligen-
homem
para tudo
homem, sem dependência da divindade.
mencionam a seita dos essenios,'
historiadores
Josepho e Philon.
Nenhum
d'estes
noticiosos judeus
nos diz que a escola essenia fosse anterior ao christia-
O
nismo.
mais que pôde averiguar-se de Josepho é que
a seita foi contemporânea d^elle.
Deposta a questão contingente, se não querem darIhe
um
moralistas,
tros
que se chamasse Jesus, d'ou-
moralista,
denominados essenios, ou therapeutas
por Philon de Biblos
E'
perguntaremos o que podia
importância,
essencial
apprender
?
necessário confrontar as doutrinas de Jesus
as dos suppostos mestres
:
com
não temos inducçSes d'outia
ordem.
Jesus ensinou idéas novas para todas as seitas judaicas
:
nação
mysterio da Trindade santíssima
o
o da
;
Redempção
graça e salvação eterna
Os
;
;
o
;
o da Encar-
chamamento dos
gentios á
a resurreição dos corpos.
essenios desconheciam inteiramente semelhantes
dogmas.
berdade
Criam no destino, e negavam, por tanto, a lihumana. Os evangelhos não encerram uma
110
Divindade de Jesus
só palavra marcada de fatalismo, nem sombra de idéa
que cohiba a razão do homem no alcance do reino éter
no, por meio da pureza da vida.
Ignoraram os essenios o que fosse caridade univer.
e desconheceram a efficacia dos sacramentos.
sal,
O
bado
máximo
seu
e
;
zelo consistia
na observância do sab-
Jesus reprehendia os que observavam
menoscabando os
da
preceitos
lei
nova.
tal,
lei
Fugiam do
templo, contra os dictames de Jesus, que sacrificava no
em
Afervoravam-se
templo.
mesmo
ás
na
prescriptas
lei
purificações,
excedentes
velha. Jesus Christo aos
seus seguidores dispensava-os de todas as abluções fa-
Negavam
náticas.
os essenios obediência a
reis,
a phi-
losophos, a conquistadores, e reconheciam apenas a au-
thoridade dos seus antepassados. Jesus
recommendava
aos seus discípulos obediência propriamente aos imperadores idolatras.
Quem
descobriu nos evangelhos vislumbre da escola
judaica, separada da
Em
que
refez e
Como
de Moysés?
lei
que se assemilha o
discípulo
Em
aos mestres?
melhorou Jesus as doutrinas emprestadas?
em ensinamento
as converteu
de todo
em
todo
novo, e contraposto aos pontos capitães das seitas coe-
vas do christianismo
Os
saber
seitas.
?
conterrâneos e os parentes de Jesus deviam de
que
elle
estudara entre os essenios, ou n'outras
Se o sabiam,
o tinham visto partir e voltar
se
d'entre os therapeutas, dispersos nas ribas do mar-raorto,
por que perguntariam elles:
de Joseph
Maria? o
filho
mãe
Onde
e
?
estudou
?
— «NSo
é este o filho
de
Nao conhecemos nós seu pae
elle
o que diz
a sabedoria, se a não apprendeu ?»
?
Como
sabe
elle
111
Divindade de Jesus
Apprendel-a-ia na seita dos sadduceos
seriamente cottejar
Seita
as
?
Não se pôde
com as da
doutrinas de Jesus
que negava a immortalidade da alma; a remune-
ração das boas obras, o castigo das más, e a authori-
dade doutrinaria. Esta sscóla era
crático
de
reis,
nhedrim. Jesus
um como
de Nazareth fugia d'estas assembléas
para o centro dos seus pobres: o
iria
sentar-se
entre
falsos interpretes
A
philosophia
outra escola
:
toco aristo-
summos-sacerdotes, e membros do sa-
os
filho
do
artista
nSo
mais opulentos, degenerados e
do velho testamento.
assignou
a pharizaica.
hypotheticamente a Jesus
Os
evangelhos,
como obras
santas dos humildes discípulos de nosso Senhor Jesus
Christo,
respondem á hypothese, que revê zombaria.
Vejam a severidade com que
pharizeus.
o divino Mestre argúe os
Divindade de Jesus
§
Que decidem
em vista dos
sus
«N3o
para os
os philosophos da
seus milagres
acreditamos
milagres;
authoridade de todo o
levantamos desde
me.
humanidade de Je-
?
— respondem— e
temos
não acreditar a razão fortíssima que o
positi-
de nos ensinar. Acceitamos a
Strauss fez favor
vista
111
homem que
estiver
módio para que a
já o
comnosco
;
Diz o insigne Strauss, a respeito de milagres:
Todas as vezes que uma
e
luz se derra-
—
narrativa nos refere qualquer
acontecimento ou phenomeno, dizendo formalmente, ou
dando a perceber que
foi
o
phenomeno ou acontecimento
immediatamente produzido por Deus, ou por
duos humanos, que receberam
narrativa não
ral, tal
histórica.
Se,
pois,
podemos
d'elle
admittil-a
nos dizem que
um
indiví-
poder sobrenatu-
como narrarão
grande homem,
desde menino, sentiu e experimentou o sentimento
timo da grandeza, que lhe
foi
apanágio á idade
viril;
in-
se
nos dizem que os seus partidários, ao primeiro intuito,
como
vidar
tal
o reconheceram,
devemos mais que muito du-
da realidade de semelhante
historia.
junctura, urge que attendamos a todas as
gicas, as
sasse,
quaes defendem que
um homem
Em
leis
tal
con-
psycolo-
sentisse, pen-
e praticasse de theor diverso dos homens, ou da
sua maneira usual.»
O. arrasoado de Strauss redunda n'esta breve inferência:
— Deus
não pôde praticar acto extraordinário
dl-
Divindade de Jesus
113
verso dos que já conhecemos, cuja immutabilidade a
evidenciado
ter
cia
o
O
demonstra.
sciencia
um
testemunho
nao importa. Strauss não
:
das nações
pode
acontecimento inexplicável á sciencrê, por
que n^o conhece
phenomeno, por que a razão natural não o intende.
Pelo que, os annaes do povo de Deus, as prophecias,
a
redempção, os milagres e supplicio do justo, o apos-
não se admittem, por que não são históricos
tolado,
historia, já fica dito,
com
sobrenaturaes, não se ha de
que
é
Isto
Merece a pena
e inalteráveis
que marcam
:
o
nenhum homem
que eu psycologicamente não faço
é capaz de fazer.
Urge que aitendamos a
as quaes defendem que
A
por tanto,
um
premissa está
cla-
todas as leis psycologicas,
um homem
sentisse^ pensasse^ e
praticasse de theor diverso dos outros
Ha,
cada
a
área de acção egual á de todos os homens.
Consequência
:
ser-
:
rigorosas
leis
homem uma
ra
em Alemanha para
mundo.
das doutrinas de Strauss, á cerca dos milagres
de Jesus Christo
Ha
historia receber.
luminosa, puro alemã!
mentecapto
ser
se philosopho no restante do
íllações
como
uma necedade
é
:
interferência de Deus, e actos
homens
.
.
.
padrão no qual o creador demar-
cou a intelligencia do homem, vedando á posteridade
do
homem excedêl-o nas faculdades intelleComo ha de conciliar-se este caso com a culdo espirito humano ? Que injustiça as nações,
primeiro
ctuaes.
tura
chamadas
Em
blicada
por que
Em
cultas,
tem
feito
aos selvagens
1
resumo, a idêa do author da Vida de Jesus ^ pu-
em
183$, é que Deus não pode fazer milagres,
Deus não pode
desfazer o
que
fez.
quanto á egualdade moral dos homens,— indistinc8
114
Divindade de Jesus
Cão de attributos psycologicos
radoxal.
tório,
Como
— Strauss é nevoento,
e pa-
explicará este nivelador os raptos do audi-
na presença d'um orador?
A
influencia de Pedro, o
eremita, na Europa christa? e S. Francisco Xavier nos po-
voados idolatras? Será
moral,
o
arrojado
d'uma aspiração
Annula-se
mytho a profunda dominação
os Ímpetos vehementes
heroísmo,
gloriosa
?
a historia para se annular o sobrenatural,
o intangível ao escalpelo da razão
do
Filho
humana.
O
Christo,,
Eterno, era a luz da historia de dezoito sécu-
los.
Apague-se a
historia,
para reduzir-se o Redemptor a
proporções humanas.
Que
fica?
Ficam as sciencias naturaes: os devaneios
psycologicos da seita Strauss e Littré ficam sendo tam-
bém
sciencias naturaes.
A
philosophia faz o milagre de
amalgamar o scismar alemão com o positivismo, carne
e osso, das suas theses.
Strauss é espada de Alexandre
Por exemplo
em
todos os nós.
Jesus Christo resuscitou ao terceira
:
dia.
O
professor vibra o golpe
que não morreu
em
três
;
e não
:
«Jesus não resuscitou por
morreu por que ninguém morre
horas de cruz, especialmente no vigor dos an-
nos.»
Strauss, para não cuidarmos
que zomba comnosco,
va-nos á escola de anatomia, d'ahi lecciona-nos
siologia,
depois entrega-nos a
vor de nos explicar
cortado de chagas,
lado
a
ferro
como
é
um
le-
em phy-
chymico, que faz fa-
que se não pôde morrer
pregado de mãos e pés, rasgado o
de lança, e extenuado de transes d'um
longo martyrio.
:
116
Divindade de Jesus
Um
theologo francez reflecte assim,
como responden-
do ao philosopho
«Que
e
se faça Strauss crucificar, depois de
uma
cruel
prolongada agonia como a do jardim das Oliveiras,
depois de
uma
série
de supplicios eguaes aos que pre-
cederam a paixão do Salvador, e venha depois de
horas
failar
comnosco, que
muita curiosidade.»
(i)
Barthelemy
havemos de
(i)
— «Encycloj^.
Cath.»
ouvil-o
três
com
CAPITULO
Discípulos, apóstolos
IV
e
martyres
São os discípulos as primeiras testemunhas, que depõem sobre a divindade de Jesus Christo.
Nao é ousadia apresentarem-se no tribunal da razão
philosophica do século XIX uns desvalidos corajosos
que se affrontaram no século apostólico com os doutores da lei
com os cezares em Roma com os philoso;
;
phos do espiritualismo na Grécia.
d'este
século
são
Nem
os racionalistas
mais temerosos que os conselheiros
de Diocleciano, nem as suas armas cortam mais que os
dentes dos leões do
peito,
em nome
circo.
Paliemos ao orgulho
com
res-
dos homens de Deus, que fallaram aos
tyrannos com a coragem da santificação.
O
testimunho dos discípulos de Jesus, pregoado na
em Roma, e Grécia, revela ousadia
humana, impulsada por força divina. As débeis
Judea, na Samaria,
sobre
forças
do racionalismo de então respondiam ao
mento santo com as masmorras, com a
pitação,
com
a fogueira.
O
cruz,
com
atrevi-
a deca-
racionalismo actual respon-
de com a negação formal, e com a tortura da zombaria,
118
Uivindade de Jesus
verdadeira tortura para as almas que
ultrages feitos ao Filho de Deus,
E' a
mesma, porém, em todas
losophica: está a differença
los,
o apostolo
mando-a, e
em
em
si
recebem os
immolado no
calvário.
as épocas a razão phi-
que,
lia
dezenove sécu-
da divindade de Jesus, morria procla-
Com
vencendo.
taes condições, a victoria
induz-nos a crer quanto valia o testimunho dos discípulos então, e qual deva ser o seu quilate no apostola-
do de hoje
Os
em
dia.
que o crucificado
discípulos pregaram aos judeus
no calvário resuscitára.
Em
que conceito e veneração tinham os de
os discípulos conclamam Deus ?
Israel o
homem que
Um
innovador blasphemo, condemnado a requerimen-
da synagoga e da plebe amotinadas, companheiro de
to
morte ignominiosa entre dois malfeitores.
Que
estranha ousadia, senão loucura é esta dos dis-
cípulos que
entram
rar
em
que
surreíção do galileu,
como Deus, como
Jerusalém annuncíando a
elles
o Messias dos prophetas,
Verbo humanado, e redemptor da culpa
Que
re-
adoram e ensinam a adooriginal
como
?
provas da divindade de Jesus apresentam elles
ás multidões suspensas?
Referem os milagres de Chrísto
dizer aos seus sacerdotes
;
mas
o povo ouviu
que os milagres de Jesus eram
Além de que, os milagres eram já
testímunhados e notórios quando o Nazareno foi condemnado. As turbas que pediram o supplicío d'elle á porta de Poncio foram as mesmas que lhe bradaram «hoinfluencia diabólica.
sanna
!»
Que
nas ruas de Jerusalém.
lucravam,
mesmas provas
pois,
aos
os
discípulos
mesmos que
as
reproduzindo as
haviam testímu-
119
Divindade de Jesus
nhado, e as negavam ao Filho de Deus, para as
attri-
buirem ás virtudes magicas de potencias infernaes
?
que, o testimunho dos apóstolos, na Judea,
Pelo
cionalmente, devia nSo converter, mas sim
irritar
ra-
os âni-
mos; devia recrudescer, e n3o quebrantar, o orgulho dos
Semelhante apostolado
re-
que
vi-
sábios, a rebeldia
do
pugnava ao
d'uma nação
nham
sentir
do
contar-lhe
povo.
Filho
cara como blasphemo, e
Como
quer que
do Eterno, que
homem
seja, o
percutir nas extremas da
inteira, sobre o
de
ella crucifi-
nenhuma
conta.
brado apostólico havia de
terra.
re-
Para além dos horison-
da Judea, demoravam as naç5es gentílicas, onde a
tes
dos milagres de Jesus nao havia chegado. Ahi
noticia
nSo se conheciam as tradições hebraicas nem
A
Messias.
tara
a palavra
idêa da redempção vagamente lhes alvoro-
os espíritos,
como prophecia balbuciada
pela cons-
ciência universal.
Aqui entrarão pobres e desprotegidos os apóstolos.
Em
Athenas dirão que a sua
:athenienses
das nações cultas, é
juizo
pátria é a
Judea;
e os
hão de escarnecel-os, por que a Judea, no
um
seminário de loucuras e
•desvarios.
E,
ce,
como para confirmarem
que um judeu da
dirão
:
a opinião
que os escarne-
Galilea, filho de
um
ope-
rário de Nazareth, era divino.
Os
com que dehomem. Responderão os após-
philosophos areopagitas perguntarão
satinos se fez divinisar
tolos:— que,
dppois
Jesus Nazareno
-la pelo
tal
de vida obscura de trinta annos,
fizera prodígios, e
povo para
quem
morrera na cruz, arvora-
e entre o qual esses prodígios
foram operados.
E os athenienses continuarão a
rir,
por não intende-
120
rem
Divindade de Jtsus
um
Deus, que consente
em
ser suppliciado pelos
homens, embora o seu divino PlatSo haja escripto que
como
«assim
devida ao
veria
ser
mais
o
que,
scelerado
odioso
dos
mortaes
seria
o
hypocritamente, conquistasse a estima
homem
de bem,^ assim o mais venerável de-
o justo
que, benemérito de todas as
infeliz,
recompensas da virtude, fosse coberto de todos os opprodo crime; de maneira que, tendo por
brios
a
consciência
própria,
se visse
sua nação á pena ultima.»
si
(i)
um
Se os apóstolos impetrassem para o seu Deus
entre
as
trinta
conseguissem,
mil
apenas
condemnar por toda a
logar
divindades do Pantheon, talvez o
que em
Grécia e
Roma nSo
havia
um
sem sua apotheose, desde Saturno, que devora
os filhos, até Vénus que se faz celebrar com a devassidao das virgens. Mas a missSo dos discípulos de Jesus
crime
é destruir as crenças das nações, é arrazar o Pantheon,.
affrontar
os sacrificadores e as aras, confundir a sober-
ba dos sábios, e desprezar a
idolatria
iniranhada na
reli-
gião do povo.
Na Athenas dizem
todos,
reconhecidos
:
«Nações da Grécia, esses deuses
por
vossos
mente celebrados por vossos
sábios,
tão brilhante^
poetas, e adorados por vos-
sos avós, esses deuses todos são vãos phantasmas. Aqui vi*
(i)
De Repub.
i.
2.
Henrion (Hist. Eccl. pag.
12.
tom. i.»}
depois que cita as palavras de Platão, prosegue: «Idêa justa e
admirável que Deus inspirou no animo de
mo ponderam
muitos padres, para de
elle
nimidade.»
um
sábio pagão, co-
imagem mostrar
a rea-
mundo, com a circumstancia mais valiosa
soube soffrer e morrer, sem ostentação e sem pusilla-
lidade do Salvador do
de que
tal
Divindade de Jesus
mos testimunhar,
merece vossos
annunciar-vos o
e
Esta linguagem,
orgulho da
do povo,
Deus que
Christiim cruxifixnm.>> (i)
de toda
niia
sem
philosophia,
com
único
Jesus de Nazareth, o crucifica-
cultos; é
^os autem predicamus
do,
12 í
devia offender o
arte,
conciliar a
bem-querença
desembaraçal-o das pêas religiosas, e con-
Não curavam eshumanamente fallando, de
pedestal de outros. A lin-
vidal-o ao completo gôso das paixões.
tes revolucionários indiscretos,
apear uns Ídolos e levantar o
gua dos enviados pelo crucificado era
mes que
e
máximas, sentimentos, costumes,
ctos, tradições,
religião
d'este
dócil
ferro
de dous gu-
golpeava o pundonor dos sábios
crenças enraisadas dos indoutos. Religião, culto,
as
leis,
um tempo
a
tudo
isto
sem pompas,
mundo,
interesses, affe-
devia ser substituído por outra
por outros costumes
sem
prazeres
por outras leis contrarias á natureza in-
do homem, e pela morte radical das paixões
que então eram o viver das nações
E* coisa sabida que immensas
vencer
um
ceitos.
A
livres,
policiadas.
diíficuldades ha de
legislador politico se quizer expurgar precon-
XIV nSo pôde extirpar o
nem invocando os sentimenhumana, nem prescrevendo as rigoro-
soberania
de
Luiz
duelo d'entre os francezes,
tos
da dignidade
sas penas do código.
Um
imperador chinez, decretando
o corte dos cabellos dos seus vassallos, o mais
seguiu
foi
que
elles
lhe
cortaram os cabellos. Succèdeu o
de,
quando decretou que
os bigodes.
(i) S.
Paulo
Corinth.
i.
que con-
cedessem a cabeça; mas não
23.
mesmo
a Pedro o gran-
os seus vassalos cerceassem
!
122
Divindade de Jesus
com
E,
tudo, doze
homens humildes, sahidos d'uma
naçío desprezada, apostolando a
lei
do Filho de Deus,
que padecera e morrera como homem, intentam
revirar
a face moral do mundo, revolucional-o profundamente»
em
e refundil-o
moldes inteiramente novos
Esta empreza, tentada séculos antes, nas épocas heróicas
de Grécia e Roma, por ventura seria
mens de
em que
ho-
As nações, apenas acordadas
talento e força.
do torpor moral
fácil a
as enervara a mythologia, ou-
viriam a linguagem nova dos espíritos superiores, e adorariam
homens estranhos em vida
o indiano adorou aquelle
e palavras,
que primeiro
bem como
fez ouvir o estam-
pido da espingarda.
Porém, o século apostólico é o mais lustroso da antiguidade
explendem as
:
sciencias,
bem que
ainda nas
suas faixas infantis; reluz a eloquência já adulta; e a
com primores que ainda agora se dSo como exemphilosophos declamam nas escolas e nas praças: senado e povo discute a sabedoria como se todos
a professassem. As pompas da civilisaçao douram a mais
poesia
plo.
Os
corrompida licença, incomparável ao que a desvergonha
offerece
mais esquálido nas metrópoles da moderna
ci-
vilisação material.
Que
do
vao,
sacrifício,
Vão
pois,
das paixSes e
precizamente a zombaria e as victimas de
ser
gente que refrigera
Hão de
Roma os apóstolos
da adoração em espirito ?
fazer á Grécia e
com sangue
as sequidões da alma.
apellidal-os bárbaros, esses
homens que tem
a
sciéncia das suas escolas, os seus deuses tolerantes, as
suas flores para se toucarem nas
banquetes,
em paga de
rola aos pés
folias nocturnas, os
seus
cada cabeça de imperador, que
do novo amphitriao.
Os
anjos de
Deus que
!
123
Jjitindade de Jesus
vem
fazer
sangue
Os
Gomorrhas em ebulição de lama e
a estas
?
epicuristas,
erguendo a cabeça dos
triclinios flac-
cidos, dirão, ao perpassarem os apóstolos da temperança,
da abnegação, e da pobreza: «Que querem esses
fal-
ladores?» (i)
Esta
era a sociedade
em que
os discípulos iam pro-
clamar a divindade do Mestre.
Acompanhemos
espirito
a maravilhosa revolução operada no
em que
da sociedade,
homens da Judea,
e
ponderemos na
testimunho.
(i) Act.
se apresentam os pobres
dos Apost. XVII, i8.
eíficacia
do seu
124
Divindade de Jesus
§1
Que
recursos
accreditar
O
?
dos poderosos
A
?
tinham os apóstolos para se fazerem
ouro
?
a força
a eloquência subtil
?
o patrocínio
?
eloquência não, que as subtilezas dialécticas, e as
argucias da argumentação eram,
das philosophias escolares,
e
como
hoje, prerogativa
não podiam ser dom de
que apenas sabiam de seu
pescadores,
quando
mister,
Jesus Christo os chamou a divulgarem os preceitos do
Senhor.
O
lios
ouro
não,
de suas
que os haveres
artes, e essas
d'elles
eram os
mesmas renunciaram,
até á morte, nunca mais tiveram de seu pedra
utensíe,
d^ahi
em que
reclinassem a cabeça.
Protecção
de
mente sabiam
poderosos
não,
da existência
que os
d'elles
;
e,
ricos escassa-
quando
ram, ou tudo deram para se fazerem como
des, pobres e perseguidos, ou se
elles
os vi-
humil-
bandearam com os
per-
seguidores.
A força não, que a espada dos conquistadores do
mundo é uma palavra do coração, o seu exercito os pobresinhos,
na
Siria,
o seu estandarte a
em Roma,
cruz^,
na Grécia,
em
emblema execravel
toda a parte onde
125
Divindade de Jesus
dos mal-feitores da plebe
destina ao supplicio
se
ella
Ínfima.
E os apóstolos foram seu caminho, seu destino, sem
sciencia,
sem
sem
ouro,
força,
sem
protecção: uns poseram
olhos no levante; outros no meio-dia
outros no septen-
;
E assim separados, bem que
unidos em doutrina e aima^ nem ao menos podiam at-
triao
outros no occidente.
;
mutua do conselho
á força moral, á coadjuvação
ter-se
e alento,
que dá a unidade entre os
correligionários se-
meadores de doutrinação nova.
Supponhamos que
estes
homens inventaram Jesus
Christo e os Evangelhos.
E' crivei
que planeassem tão nesciamente a conquista
onde se annunciaram envia-
espiritual das nações cultas,
dos do Filho de Deus crucificado?
Ahi vSo de sobresalto sobre o velho mundo; chegam;
acercam-se das multidões; dizem
como
a
pobreza
quem
perseguição os dispersou
em que
vivem.
Que
;
seita
são, d'onde vSo,
e o desvalimento e
de doutrinários tao
pouco de convidarem turbas avassaladas aos
patrícios,
aos ephoros, aos sátrapas, aos poderosos de todo o sta-
da
dio
terra,
em que
sopeada da ignorância
a consciência estava captiva ou
!
Pregam dogmas incomprehensiveis,
pugnantes severidades
a
les
e,
que
suicídio
Que
desatino,
sem exemplo nem
que
dizendo-se enviados de Deus,
amarguras da vida
transitória
fúria
re-
de mor-
que o
interpretação
salve do sorriso piedoso da posteridade
E,
peor ainda,
moral. Levanta-se contra el-
humanidade. Soffrem, e insistem. Affrontam os
ídolos, e os sacerdotes.
rer,
em
I
blasphemavam
:
ás
ajuntavam merecimentos
para a condeninação eterna. Pobres impostores
!
se o
126
Divindade de Jesus
mundo
ria
:
m
os tivesse n'este infimo conceito, nSo os
como
deixal-os-ia passar escarnecidos
Os
ata
doidos.
impostores, ou, mais nobremente qualificados, os
inventores de religiões, sacrificam-se á esperança de as
radicarem,
ante-gostam
e
de fundal-as, em-
a gloria
quanto luctam com as adversidades. Nãío assim os
ventores da divindade de Jesus Christo
goam
mentira,
a
ganham
tribulações
rem da morte de mil dores por fim,
e
:
eil-os
sem
que
in-
pre-
conto, mor-
legam á posteri-
dade memoria escarnecida.
E de tantos que radiaram d'um ponto para a circumferencia da terra conhecida,
um
só nSo
linguagem diversa d*aquella que,
guas,
fallaram
seus companheiros.
apóstolos fundar
foi
que
fallasse
a centenares de
Como poderam
lé-
os
christandades e ensinar doutrinas, as
quaes, cotejadas no primeiro concilio, não destoam na
minima
regra
Não
?
se inventavam assim os códigos religiosos,
os apóstolos da vida nova
mentos
d'ella
nem
annunciavam que os mereci-
eram penas.
Inventou-se
Mahomet enviado de Deus.
Acreditou-se
entre milhões de homens.
Dava
largas
ás
paixões, pabulo infinito ás organisa-
çoes ardentes do seu clima
muitas houris no céo.
crente se
:
muitas mulheres na
E, se ainda assim,
terra,
algum
des-
dispensava d'uma bemaventurança abonada
pelo goso infinito da infinita contemplação das mulheres
formosas, o alphange tirava-lhe a alma pelo pescoço, e
á força lh'a remettia ao paraiso.
Ora
os discipulos de Jesus morriam.
«Pedro, e Paulo, e vós gloriosos apóstolos, generosos
santos,
e
illustres
martyres! por ventMra soffrestes
ta-
127
Divindade de Jesus
manhos
cSo
de
mando
ca
Christo,
um
homens
mentira odiosa,
por
?
A
resurrei-
que invocaes incessantemente, cha-
terra e cée por testimunhas, seria
uma
morríeis
por
trabalhos para enganar os
uma
em
ignóbil perfídia
vossa boc?
Quando
Christo resuscitado, sabieis que morríeis
impostor?»
128
Divindade de Jesus
§11
A
humilde entrega da
sublime dos martyres, a
fé
em abono
vida
da divindade de Jesus, nao convence
menos que a do apostolado. O sangue escrevia na
mina do cutello a ultima prova da doutrina.
crois
Je
volo7itiers les
dont
histoires
la-
les têrnoins se
font êgorger, diz Pascal.
A
christandade,
rada do
auxilio
no berço ainda, inerme e desampa-
dos poderosos, luctou contra o ferro e
fogo de dez perseguições.
Os
éditos
christ3os,
imperiaes eram
peremptórios
seja qual fôr sua condição,
:
«Que
os
sejam despojados
de seus teres e dignidades, e postos á flagellação. Todos os
litígios
contra elles instaurados sejam legitima-
NSo possam reclamar
quando ainda lhes tirem os
dos pelos juizes.
justiça, se os ul-
trajarem,
bens, e lhes cor-
rompam
as mulheres.»
Nas grandes cidades do império romano, as
açuladas pelas dignidades do estado
conclamavam, agitadas nos
circos
:
turbas,
e do sacerdócio,
«os christaos ás
fe-
ras !»
A
las
este grito de milhares de gritos, irrompiam das jau-
os leões enfuriados pelos jejuns d'algumas horas, e
preavam centenares de victimas espadanando o sangue
das entranhas
d'uns homens que haviam dito
Christo era Deus.
:
JESUS
129
Divindade de Jesus
Todavia, o paganismo, antes de entregar os christãos
á ferocidade das
feras,
submettia-os aos cathequistas
brandamente lhes insinuavam a
do polytheismo, que
adoração dos deuses, e a apostasia do galileu. Aos que
as
doutrinas
não ameigavam,
offereciam a restituição
das dignidades, e honras novas, se estes por sua posição,
como
multidões.
Sérgio Paulo e Diniz,
Respondiam ás
davam nos
catequeses
olhos das
com
cariciosas
humilde desapego dos bens da vida; iam á morte, e
cebiam-na com a
mesma compostura
re-^
e serenidade de
semblante.
Negam
cidade
alguns historiadores do nosso tempo a vera-
dos supplicios,
referidos
nas actas authenticas
dos primeiros séculos do christianismo. Ponderam que
o
mundo romano
portar barbaridade
era então policiado de mais para
com-
tamanha.
Esta maneira de inventar historia, ou inferil-a de in-
ducções pueris— contrapostas ao que se
Tácito e Petronio, e
em
lê
em
Juvenal,
centenares, respeito aos costu-
mes da Roma cezarea — dá-nos
a pensar que a civilisa-
ção arripiou carreira assombrosamente! Pois que! Se ha
dezenove séculos as regras da moral romana
compadeciam com os
sectários
atrozes
não se
supplicios infligidos aos
de Jesus Nazareno, que havemos de pensar
'das regras de moral de épocas muito posteriores, e no-*
*meadamente dos costumes do século XVIII
então a revolução franceza
?
O
Aquella carnagem
que
foi
como
se
mil e oitocentos annos depois da civilisação de Ro-
fez
ma
?
?
Pois o que estes historiadores
chamam
civilisação
não é o facto equipolenté ao que se denomina «pro-
gresso»— aperfeiçoamento moral do homem?!
Se havemos de discutir a verdade dos amphitheatros
9
130
Divindade de Jesus
dos christaos primitivos, como acceitaremos as guilhoti-
nas da carnificina de hontem
e
?
As sentenças de Marat,
Danton, e Robspierre serão menos authenticas que
os rescriptos de Sejano, de Decicr, e Galerio
?
Em todos os tempos revoluteados pela guerra do
mem ao homem, é a politica, sob capa de razão de
quem
tado,
vibra
laços d'alma e
serpes da discórdia.
as
sangue que
ella
em
Os
sepultura d'ambos.
es-
ahi
não desate. Entre irmão
e irmão, seis palmos de terra conquistáveis
se
Não ha
ho-
políticos
podem
abrir-
innovadores são
adversários que maior aluvião de inimigos provocam, se
atiram o camartelo aos alicerces do edifício antigo, e at-
tentam contra os costumes.
Os
pregoadores da divindade de Jesus inflammaram
contra
uma
cos,
si
a politica e as paixões, a tranquiiiidade do im-
e a licença de
pério,
violência,
reclamando
um
em
cada homem.
freio
intolerável.
christianismo era
Sahiram os
honra dos deuses, e
nações consubstanciadas
contra
O
os perturbadores
em Roma, um
que minavam a
em
políti-
das
prol
código severo
religião
de
sé-
culos para cimentarem a sua. Assopravam a fúria popular,
e
a fúria
d'um povo menos policiado que o de 1793,
O povo romano foi povo. Os historiado-
o de 1848.
res,
infleis
inventaram
ram os
á historia e á razão, reformaram a natureza,
a doçura dos costumes romanos, desmenti-
escriptores coevos do martyrio para nos
como imaginaria
rios
darem*
a ferocidade da perseguição aos sectá-
de Jesus. Voltaire e Gibbon haviam sido os
alvi-
treiros d*este expediente.
Podemos, sem sahir da
como explicada e natural
•
neos de Nero e Sejano.
historia
contemporânea, dar
a barbaria dos
comtempora-
:
131
Jjivindade de Jesus
Era
quando
sorte
Juliano,
apóstata,
o
se lhe atravessou funesta-
adorando, como a deus o crucificado da
Se no
Galilêa.
império.
da guerra
contra os christãos, que provocavam a
bradou
divina,
cólera
do
fortuna
a
mente,
romanos que deviam aos deuses a
dos
crença
explendida
seio
da terra se escondia algum monstro
chamado Nero,
e as bençSos publicas
gum
vam
boas entranhas como Antonino,
varão
de
al-
grita-
os políticos contra a perigosa compaixão dos gover-
nadores das províncias, por que
deixavam esmore-
elles
E assim mesmo, os piedo-
recer a guerra aos christãos.
sos
acclamavam
em
Antoninos, que ficaram
provérbio de bondade,
piedosos para todos os homens, nao poderam sêl-o
com
os discípulos de Jesus.
Adriano quer deificar
casa e
guir
nos
templos,
e
Jesus,
dá-lhe
altares
em
sua
simultaneamente manda perse-
os christ3os no Egypto. Alexandre Severo, honra-
dor de Jesus
como de todos
os deuses, prohibia
súbditos abraçassem o christianismo.
A
que os
impunha-
politica
Ihes esta doblez de caracter, pela boca das guardas pretorianas.
.
E,
com
gião,
quando a maior parte do império romano
reli-
que admoestavam destemorosamente nas praças
os motins
com argumentos
povo clamava
conciliábulos
ravam.
que
transigia
a opinião, que podiam esperar os sectários da
:
injuriosos ao
Tolle ímpios
nocturnos,
!
paganismo?
O
ímpios, por que, nos seus
matavam
crianças
e as devo-
Estes infanticidas eram os discípulos de Jesus,
dissera
«Deixai
vir a
mim
as criancinhas,
por que o reino do
céo é d'aquelles que se lhes assemelham». ímpios os
christaos,
por que, pactuados
com
os demónios, inimi-
132
Divindade de Jesus
gos figadaes dos deuses, faziam milagres para desviarem
O
o espirito do polytheismo.
também.
sábios
sao
Ghristaos
Tácito, o grave historiador, diz
homens
«A morte
mentos.
elie referindo-se
povo pensava assim, e os
dos christaos
foi
uma
brincadeira, diz
ao supplicio dos desgraçados, que Nero
arguiu de incendearem Roma. Uns, envoltos
de
atirávamos
feras,
que os
odiosos, dignos dos extremos tor-
á
em
pelles
voracidade dos cães; outros,
amarrados a postes, accenderam-os para servirem de
em
espectáculo, e compareceu
tal
posto
e
riga,
ar-
Nero emprestou os seus jardins para
chotes de noute.
uma
sobre
pessoa entrajado de au-
carroça
como nos
jogos do
circo.»
Celso espanta-se da demência dos christãos, que se
deixam
torturar até morrer.
LibaniOj
commemorando
a
elevação
de Juliano ao
«Esperavam os christãos que
império, escreve:
lhes ar-
rançassem olhos, e os degollassem, e corressem ondas
de sangue; cuidavam que o novo senhor inventaria novos
rar
tormentos, mais cruéis que a mutilação, e o tritu-
das mós, o enterramento
plicios
empregados contra
dentes.
.
.
Vendo,
em
vida, e a asfixia, sup-
elles pelos
imperadores prece-
porém, Juliano que o christianismo
augmentava com a
carnificina
de seus sectários, não
quiz exercitar contra elles os flagícios que reprovara.
Plínio,
no,
governador d'uma província, escreve a Traja-
dando conta das
torturas a
que submettera sem
pro-
veito alguns christãos.
Estas
noticias
não as deram os padres historiadoras
do Christianismo: foram os luminares da gentilidade;
os
philosophos coevos das perseguições.
tas da civilisação
Os
panegyris-
pagan desmentem os padres, e muito
!
133
Divindade d€ Jesus
de astúcia occultam as passagens dos philosophos. Sempre a
O
má
fé
Nomine christianorum
deleio
das
medalhas de
em coem Hes-
Diocleciano, essa divisa de extermínio, gravada
bre, e sculpida nas
duas columnas encontradas
panha, contradiz a historia dos falsificadores, os quaes,
testimunhas das attrocidades commettidas á luz
plení^
do seu século, não podem racionalmente acceitar a veracidade
do martyrio nos três primeiros séculos, desde
Tibério até Constantino.
Depois que Bayle, Gibbon, e Voltaire, e os da sua
raça pensadora
acoimaram de calumniosa a
ga, os racionalistas assentaram
radores de Jesus era incongruente
mas de
Galerio e Diocleciano.
historia anti-
que o martyrio dos ado-
com
as cândidas
al-
CONCLUSÃO
Ha
mil e oitocentos
como
occultava,
hoje, á
espíritos. Era nos
riam peia
fé,
pelo
tempos
E'
concepção dos mais alumiados
em que
as tribus christSs mor-
dogma, pelo mysterio. Esta coragem
Quem
d'onde lhes vinha?
tes de luz
annos que o dogma catholico se
lhes abriu na
alma enchen-
que deslumbraram a da razSo natural
que o dogma
?
fora esclarecido pelo milagre, e o mi-
lagre dera a prova do mysterio.
Os
martyres viram o milagre, ou o creram das
munhas
presenciaes
;
testi-
morreram pelo dogma, e não pedi-
ram a explicação do mysterio.
Na esphera da razão está circumscripto
razão. Se impugnamos os deveres que nos
o que é da
ella
impõe,
mais prestes refutaríamos o que dogmaticamente nos
cohibe, se o
na.
dogma
Nas mais
comprehensivel.
O
O
que
é a matéria?
que é
a vida?
humaâmago é in-
tivesse caracter de formação
claras cousas, a essência, o
136
Divindade de Jesus
O
O
O
O
O
O
O
que
é a
alma?
que é o movimento?
que
é a luz
que
é a electricidade
?
que é o pensamento
que
?
?
é o espirito vital dos phisiologistas
que é attracçao e affmidade
Como
?
?
se fazem os actos da intelligencia
?
sem negativa nem
assombro. Dao-se: recebem-se. Os dogmas da mathemaEstes factos irrespondiveis correm
Todas as abstracções, todas as chimeras
tica acceitam-se.
valem
em
matéria de sciencia
;
porém o que transcen-
de o raciocínio e entra nas demarcações do incomprehensivel é absurdo.
Nao
se
comprehendem
as obras de Deus,
mais visinhas do alcance dos olhos, e dispensa-se a
ligião
que envolve mysteriosamente os actos do
re-
crea-
dor.
Imaginai
um
astrónomo a contemplar as profundezas
do céo com o seu telescópio. Assombrado pelos orbes
iuminozos, que giram no espaço, narra enlevado as maravilhas de suas visões.
Um
ignorante, porém, olhando
ao céo, e nao vendo maravilhas novas,
mo
do astrólogo. Ora, o philosopho
gredos de
como o
Deus com
ri
do enthusias-
que perscruta os
se-
os olhos da sua desluzida razão é
ignorante que desdenha do telescópio do astró-
nomo.
O
respeitador
do dogma descortina
uma
face dos
mysterios de Deus por que a sua óptica é a revelação.
Barthélemy pondera que o observador, dotado de penetrantíssima
vista,
vê apenas alguns milhares de
estrel-
las
no firmamento: maia nada vê, por que o restante
sao
manchas mais ou menos confuzas, cujo esraaiado
137
Divindade de Jesus
alvor se desenha na profundidade da abobada azul; mas,
do miradouro d*um observatório, contempla o céo
se,
com
os
maravilhosos instrumentos que abrangem tão
prodigiosamente as distancias, o cáhos dilucida-se, céos
novos se aclaram, refulgem as constellações^ e os astros,
chamados
em
fixos
virtude da sua aparente quietação,
entrecruzam-se como
planetas
em
volta de seus soes.
ha pouco coruscar faulas de
Via-os,
pla-os agora
luz pallida,
contem-
flammejantes de formosíssimas cores. Ora, se
alguns vidros, collocados entre o céo e os olhos, podem
assim transformar-lhe a decoração, devassando-lhe tão
ingentes objectos, havemos de espantar-nos se a razão,
cujo raio visual é tão curto, não vê
fé,
gicos attrevidos, obstinados
por
em Deus
que o vêem
girar, e
em
o
que
é de
que a
terra é fixa por
O
cumulo da
vanecimentos
!
E'
religião, e
que a
conhe-
Deus, sem o auxilio da revelação, é
querer estudar o céo material
pio.
ló-
sustentar que o sol gira
não vêem mover-se. Querer estudar a
cer
o que a
allumiada pela revelação, descobre? Imitaes uns
irrisão é
a fé o
um
sem
o auxilio do telescó-
philosopho
telescópio
com
divino,
taes des-
com
cujo
auxilio attingimos o sobre-natural; e a conformidade de
razão e fé actua
escopio,
que
como
a do olho do astrónomo,
com
lhe desvela as profundezas do céo.
o te-
138
Divindade de Jesus
§1
O Deus do Christianismo é o Deus das
Deus scientiarum Dominus est, (i)
A
sciencias.
philosophia moral, a sciencia das almas, a luz
que
aproxima do foco luminoso, que a vista da razSo
nos
evica
como insupportavel
á sua fraqueza, deu-nol-a Je-
sus Christo.
Deus, e o universo e o
homem
foram assumptos pa-
ra as divagações absurdíssimas dos sábios
do paganismo,
desde Aristóteles até Cicero, desde o infimo pária até
aos príncipes da intelligencia.
A
obra divma de Jesus resgatou as sciencias, anni-
quilando a divinisaçao da matéria, e devastando as
le-
giões de génios e deuses, pela acção dos quaes tudo se
explicava.
que n^o é mister soccorrermo-nos da divin-
Allega-se
dade de Jesus para explicar o que é do
gresso, e do lavor da razão do
«Se a
fosse
sábio
ria
o
do pro-
que espancou as trevas da gentilidade não
luz
raio divino
— uma
foro,
homem.
da
religião
de Jesus
de duas coisas succederia
:
— pondera
ou a razão
um
fica-
sempre accorrentada ao carro das velhas supersti-
ções,
como na
so; ou,
(i)
índia, e então seria impossível o progres-
desprendida das superstições, cahiria no atheis-
Reg. II.
3.
:
139
Divindade de Jesus
mo, como na China, e então seguiria o caminho opposto ao progresso.»
Se nos dizem que a philosophia sem professar o atheismo, tudo esclarece, responderemos que Victor Cousin, e
Edgard Quinet, e Jouffroy, professores de philosophia,
ra
dos
dos apologistas do christianismo, nao
vestígios
firmam passo seguro: por cada impeço que evitam
um
tabelecem
A
trina.
a sua razão
olhos aos marcos miliarios da
fechando
e criticismo,
fé, aquelles,
como Lacor-
chama, «illuminados da razão obscura»
daire lhes
es-
paradoxo, ou involvem nas nuvens a dou-
com
sós
fo-
oscil-
Iam entre o deismo pantheista, e o scepticismo atheu.
Não
se sabe o
que
são,
nem
o que ensinam.
Occupam
ca-
deiras docentes, e entretém o seu tempo.
Tem
de
si
moderna philosophia o quer que
a
de analogia com
pae,
e
a
presumida
filha
de
seja
motejadora das cans de seu
excellencias
França trasladou as suas
sciencias
originaes d'ella.
A
philosophicas da
Alemanha; a Alemanha inspirou-se de Roma catholica
na parte
em que
a razão philosophica procede da razão
do catholicismo.
A
deram vaias á sciencia-mãe, desnaturaram-se
final,
de
filhos
de
si
d'ella.
Verdadeira luz do mtmdo, como Jesus
dissera, a obra
do Filho de Deus, a
religião
augus-
tissima dos martyres, dos doutos, dos incultos, dos
feitores da
humanidade, dos
a divina teligião de Jesus deu ás sciencias a sua
dade, levou-as por
mão
ao ponto de serem
E'
do
um
esforça-se
esperem-lhe os
virili-
por entre precipícios, sublimou-as
dos supremos dons do
arvore abençoada de fructos de vida.
homem
bem-
justos, e dos desgraçados,
em
filtrar-lhe
effeitos, se os
homem.
O
peçonha ás
orgulho
raízes
não experimentaram ainda.
140
O
ra,
Divindade de Jesus
christianismo recebeu o
mundo
qual
Deus
o creá-
e entregara á disputação das sciencias. (i)
Abre o universo seus vastos horisontes á sciencia,
descerra-lhe os arcanos recônditos á penetração dos lu-
minares da Grécia e Roma, e deixa-se estudar no mysterio
O
da creacão.
christianismo quer a sciencia, deleita-se estudando
as maravilhas de seu auctor;
rio.
Os
e,
comprehen-
astros do céo, e as coisas humillimas da terra
referem a gloria do Altíssimo.
silêncios
Que
se nSo pôde
á porta do tabernáculo, e adora o myste-
dêl-as, ajoelha
A
consciência intendeo os
da creaçSo.
quereis mais ouvir?
que pedis aos sabedores de
grandes e estrondosas philosophias?
Que
vos desmintam as revelações de Jesus?
Quereis que Deus vos seja entregue com a sua egreja?
E que nos
dizia
o
dais
poeta
em
inglez
troca? «Palavras, palavras»
por boca de
um
como
dos seus tristes
personagens.
O
século requer reformas
—A
zão.
Cada época tem sua
Uma
face inalterável
E' a das misérias
justiças,
— bradam
os destruidores.
immobilidade da fé empece o movimento da
ra-
face.
tem as épocas
todas.
do homem, a das desillusões, das
in-
da esterilidade dos affectos, da desgraça que en-
volve a alma
em
negros nevoeiros, e do desconforto que
faz o tédio da vida, e o escarneo da piedade..
E o mais inamovível e pungente
(i)
Ecdes.
III,
II.
característico de to-
141
Divindade de Jesus
das as épocas é o acabarem-se, o irem-se com
mo
dentro,
ellas
abys-
as gerações pervertidas pelos seus inimigos
figadaes— os sábios que immolaram á soberba do intendimento a bondade do
Pobre razão
humana
coraçãío.
!
TIÍADICÃO APOSTÓLICA
Ide, pois, e ensinai todas as gentes.
Jesus Christo,
em
S.
Mat. XXVIII,
19.
TRADIÇÃO APOSTÓLICA
A
doutrina ecclesiastica não se esquiva á alçada dos
Taciocinadores. Acceita-os, offerece-se, expõe-se ainda aos
má
paralogismos da
E' certo
fé.
que a razão
natural, ou, mais claramente en-
nunciada, a razão indócil aos dictames da fé não alcan-
ça a forma
real
como
o testimunho divino se opera
ineíficazes as forças do intendimento
cerem as causas
eíficientes
:
são
no afan de conhe-
de numerosos phenomenos
da sciencia humana. Pois se a razão é limitada no entendimento dos factos de observação, que muito se no
entendimento das causas divinas submettemos a razão
áfé?
A
tradição
nos
refere
os
Theologicamente defmimol-a
:
actos da
«um
origem divina.
testimunho que nos
assegura a verdade d'um facto, dogma, ou uso.» Exa-
minada em seus primórdios, procede de Deus ou dos homens. Pelo que, distinguimos entre tradição divina,
dição apostólica, e tradição ecclesiastica.
A
tra-
tradição após-
146
Divindade de Jesus
tolica,
ao parecer de todos os theologos, e a beneplacita
mesma
da
razSo, considera-se divina.
Os
apóstolos en-
sinaram o que immediatamente apprenderam de Jesus^
ou do
Cão
los:
espirito
do Senhor no discurso do apostolado. A por-
humana de Christo vive no doutrinamento dos discípu«Ide, e ensinai.» O Filho do homem vai com elles. A
luz radiosa
do cenáculo fez-se columna perfulgente que
lhes esclarece as veredas escuras do
A
mundo.
tradição apostólica é a fonte das aguas ipcorrupti-
Ahi está
veis.
em
eterno bronze a pagina incontroversa
da christandade catholica. Lacordaire, como visse que a
razão
que
o
plena
era o guia da philosophia, pediu
encaminhasse á fonte da
luz,
lá
também
tradição.
onde a incredulidade se teme da
dão refractária ás luzes do
raciocínio.
á razão
Achou-se
em
escuri-
147
Divindade de Jesus
§1
Deus, cuja existência é eterno acto, nao tem passado
nem
futuro;
rém, que vive
conseguinte, nãío é ele-
pelo
a tradição,
mento necessário
Deus.
á existência de
O
atravez de successiva cadêa de instantes,
sem
a
nem
A
certificar-se
estabelecer
tradição,
tradição, elo
fim
está
po-
n3ío
poderia,
unidade dos instantes,
a
da identidade de sua vida.
que ata
presente, é o vinculo
O
homem,
no tempo, e vai do ventre á sepultura
em
universal de tudo.
e harmonisa o passado
que
liga o
proporção
com o
passado ao futuro.
com
a origem: esta
O conhecimento
lei
é
da origem revela pre-
cizamente o segredo do fim.
Diz Lacordaire
<<^Se
a
sopro bafejou
homem
:
vontade creadora fecundou o nada, se divino
a face
do homem, não é á terra que o
pertence: mais altos destinos p impulsam: o so-
pro de Deus,
que
elle encerra,
mostrar-se-ha
em
sua
fi-
nal immortalidade.»
Somos
d'uma causa:
effeitos
omnipotente que nos produziu;
derem os
effeitos
esta causa é a vontade
e,
pela razão de não po-
exceder as causas, nós, emanações da
vontade omnipotente, não podemos conhecer nossa
gem, nem ainda o
fim, por
que
meiro para conhecer o segundo.
ori-
é mister conhecer o pri-
O
passado de cada
in-
dividuo que inducções lhe dá para descortinar o futuro?
Quem
de sua experiência de longos annos colheu'a pre-
148
Divindade de Jesus
vidência para a
O
effeito
O
que
iiora
vem
segredo do que
vai começar?
Van pergunta
!
está no segredo da origem; e o
não pôde antepor-se á causa.
segredo do passado tão somente pode revelar-no'lo
E por
a tradição.
que o conhecimento da origem é
isso
o conhecimento do fim, á tradição incumbe descortinar
A
o mysterio do futuro.
sciencia do
que
foi, é,
e ha
de
na tradição. As tradições históricas e religiosas
ser, está
s3o os repositórios da sciencia universal. «Despresal-as,
,
— diz
o novo Bossuet,
—é
desprezar a vida» pois que a
harmonia do passado com o presente, e do presente com
o futuro
seus
— pajtes
constituintes da vida considerada
momentos successivos
—é
a tradição
que
em
no'1-a
dá, e é impossivel substituil-a por outra qualquer pala-
nao tenha o valor, e não seja o núcleo d'um
vra que
complexo de
O
factos.
fundamento do catholicismo está na tradição con-
servadora da palavra divina.
Diz a tradição
que
oral
um
existe
de natureza eterna, o qual creára o
d'amor que
o
homem
e a creação do
A
tradição
pelo que,
vera,
em
oral
o
catholica
:
a existência de Deus,
por Deus.
acrescenta que o
preferindo
amor,
este
homem
perfeito, e
por effeito
não comprehende. Aqui estão
dogmas da doutrina
dois
Deus,
homem,
creador,
homem
repulsara
a independência e a corrupção;
segunda vez misericordioso,
resol-
sua vontade omnipotente, a restauração do ho-
mem. São
estes os
dogmas da queda e rehabilitação.
oral que o homem, submisso á
seria com Deus eternamente
e, re-
Diz mais a tradição
lei
da reparação,
;
nunciando-a, seria privado da presença de Deus. Este
é o
dogma do
juizo final.
149
Divindade de Jcsus
Porém, a palavra de Deus, lançada no tempo, e en-
homem, desmemoriado
tregue ao
devia degenerar,
brantadoras,
extinguir-se
assim
para
Cumpria á
necessariamente.
dizer,
fundir a
paixões que-
pelas
ao correr dos séculos,
e,
palavra
Providencia,
divina
em moldes
prepetuos e universaes. Foi a palavra por tanto eterni-
sada no symbolo.
Estabeleceu
Deus
entre os
homens
a tradição
sym-
bolica.
«Resolvera Deus salvar o
mundo
pelo sacrifício,
que
na sua essência encerrava os cinco termos que consti-
tuem
o mysterio do
quem
pois
se
offerece
premo dominio;
;
Deus, a
Deus
creador,
o sacrifício; a idêa de
a idêa
offerecido
a idêa
da
da queda do homem, pois que o
por todos é
pois que,
esperar
se
o
;
expiação univer-
finalmente, a idêa do juizo
homem nada
tivesse
fi-
que temer e
n'outra vida, a queda e reparação seriam pala-
vras vans.» (i)
(i)
uma
reparação pois que seria inútil expiar o
que nSo tem expiação
nal,
e do mal: a idêa de
que a victima immolada é testimunha do seu su-
sacrifício,
sal
bem
«Lacordaire.»— T.
i,
pag. 124
i50
Divindade de Jesus
^
A
tradição oral,
em
par
II
com
a tradição escripta,
no antigo mundo, complemento
mentario dos symbolos
signados
em
e indispensável
das
religiosos,
leis
foi,
com-
e ritos con-
poucas palavras nos monumentos escriptos.
Investiguemos
verdade d'este asserto na
a
religião
judaica.
Um
dos artigos fundamentaes da
mão do Senhor,
ao recebel-a da
na forma
instruído
de a praticar.
comprehendeu o sentido
no da creação
em
lei
O
espiritual da
seis dias, a
queda
é
que Moysés,
mysteriosamente
fora
filho
lei,
e o
de Jethro
phonome-
original, e a signi-
ficação mystica dos sacrifícios.
Moysés
ciãos
conhecimento das tradições os an-
iniciou no
do povo, e mandou-os transmitil-as aos mais
tuosos mestres da
vir-
entre as multidões do deserto.
lei
Posto que osphariseus adulterassem a palavra tradicional, e
com
isso
merecessem as admoestações
nação judaica sempre a teve
em
de, Christo, a
conta de infallivel se-
minário da verdade religiosa.
'
No
cripta
principio,
e ao correr de muitos annos, a
commum
era
;
lei
es-
todavia, interpretar o sentido do
que a tradição oral,
impossível comprehender a escripta, era
texto sagrado não era de todos, por
sem o quê
privilegio
fora
de poucos. A unidade da doutrina religiosa
moral' dependia da tradição,
escrever
a
lei,
com
e
que ensinava o modo de
a phraze do seu genuino sentido.
151
Divindade de Jesus
As
de
mudanças,
argumentos,
subtrações,
letras,
transposições
variedade na forma dos caracteres, supressSo
e sobreposição de vogaes quasi imperceptíveis,
tal
mis-
de significados enredava de modo a intelligencia
tura
que, se a tradição os nSo dilucidasse, eternamen-
da
lei,
te
ficariam
na escuridade de mysterio. Este mysterio,
pois, foi sujeito á intelligencia
de regras
eram prerogativas dos mestres da
fixas, as
quaes
que de viva voz as
lei
receberam.
N'esses tempos
era
tão
escrever a
diíficil
como
lei
comprehendel-a.
A Thorah primitiva (lei gravada)
nem vogaes os versos, e os
pontos
era
distinctos,
e apenas
escripta
capítulos
:
d'uma a outra palavra
sem
eram
in-
se interpu-
nham espaços confusos e irregulares.
Sem um dedo indicador de mestre, que encaminhasse
o
discípulo
compactos, a
n'este todo
seria
lei
um
inconcebível
cahos,
uma
de arabescos
pedra runica, que
poderia inspirar o mysticlsmo contemplativo,
o exercício da
•era
gras
a
intelligencia.
tradição,
Ora
que continha em
mysteriosas,
cujo
mas nunca
este dedo de mestre
si
o thesouro das re-
segredo os doutores exclusiva-
mente possuíam.
Nem
de longe podemos já agora avaliar as dificul-
dades que o judeu encontrava na
O
leitura
da sua
lei.
Pentateuco e os profetas continham certos vocá-
um
sem pena d*anathema, não poderia
ler com as letras todas. Era-lhe forçoso, para ser comprehendldo, pronunciar um grande numero de palavras
mui diversamente do texto, mudar o som de certas lebulos que
tras,
e
judeu,
suprimir-lhes
inteiramente
a
desinência.
Do
abatimento ou elevação da voz, da maior ou menor de-
:
Íõ2
Divindade de Jesus
mora nas transições d'uma a outra palavra, resultava,
sentido
diverso, accepção toda contraria, absoluta con-
fusão no texto
Do
!
ensino oral dependia tudo;
bastam
para
do
ajuizar
será sobeja prova a
e,
se estas razões
não
da tradição
oral^
predomínio
que nos dá a
lei,
escripta bastantes
séculos depois de promulgada.
Por espaço de dez séculos, a tradição oral
recurso
para a interpretação do sentido da
ção
entre os judeus, comprehendia o
oral,
mittido
de viva voz,
e
as
explicações
foi
lei.
que
o único-
A
tradi-
fô'a trans-
pelo
escriptas
mestre, cuja copia era prohibida, por que só os doutores
e
os sábios tinham a excellencia de annotar os pontos
essenciaes da doutrina.
Estes manuscrij>tos,
intitulados «cathalogo dos
terios» multiplicaram-se, ao passo
mys-
que a tradição se des-
envolveu com o progresso dos espíritos na intelligencia
das verdades reveladas.
Os
mysterios conteúdos n'este
«cathalogo>> continham as rigorosas explicações sobre a
pratica da
mem
lei,
o código de preceitos
que levavam o ho-
á sua possível perfeição, e a explicação das mais
sublimes doutrinas como fosse a essência divina, a pluralidade das pessoas
em Deus,
a creação, a incarnação»
a redempção, e a vida futura.
Os
os juizes e padres
doutores,
communicavam ao
povo estas doutrinas, e o povo, que murmurasse
desconformidade
teira
mos
ou lhes negasse, na
em
pratica, in-
obediência, era punido de morte, se á letra deveverter esta
«Cumprireis
por
d'elles,
Deus para
passagem do Deuteronomio
á
risca
o
que disseram os escolhidos
a presidência
:
seguireis suas ordens
desviar para a esquerda ou para a direita
:
e
sem
quem, de
Divindade de Jesus
lòí}
propósito deliberado, não escutar o padre ou o juiz, será
punido de morte.»
Tradição
foi
(i)
esia substancialmente transmittida pe-
chefes da Synagoga até ao
los
truição de Jerusalém.
rios
á
lei,
duar aqui,
(i)
II
século depois da des-
E o complexo d'estes commenta-
o qual seria trabalhoso e inopportuno indivi-
chamou-se o Thalmud.
Deut. C. XVII, V,
IO.
Jà4
Divindade de Jesus
III
Jesus Christo, o illuminador das intelligencias, e bál-
samo dos
corações, derramando benefícios, sobre os ho-
mens, e elevando-os, pela doutrina, á condiçSo sublime
dos dons regeneradores, quiz que
permanecessem eternos os seus benefícios em signaes
de se aproveitarem
sensíveis,
uma
que a sua divina palavra
e
sociedade
universal
fructificasse
e imperecedoura.
A
em
Egreja e
os sacramentos s3o a graça e a verdade eterna^ que
si-
gnificam Jesus Christo entre os homens até á consum-
mação dos
A
séculos.
Egreja
pois,
é,
uma
sociedade religiosa, instituída
por Jesus Christo, e depositaria da sua doutrina.
A missão
d'esta sociedade é a conservação, defeza, e
da doutrina, cuja
interpretação
identidade de fé está
submettida á auctoridade d'um apostolado permanente,
que o
Espirito
Santo
dirige,
para que até ao fim das ge-
rações sejam continuados os benefícios do Salvador, durante a sua vida mortal.
O
dogma da Redempç^o
e da Incarnação,
com
todas
as circumstancías que pertencem a este duplicado mysterío,
sao
prerogativas
que
a
Egreja recebeu de Jesus
Christo, seu fundador, por que «a Egreja é Jesus Christo na sua plenitude»
Esta
sociedade,
vida sua,
e
estabelecem
como Bossuet
a define.
constituída corpo moral, vive
exercita-se na elevadíssima esfera
as
mais
intimas relações do
d'uma
onde se
homem com
Deus.
Os membros
de
tal
corpo
sãío
os fieis ligados por la-
íôõ
Divindade de Jesus
ços
mesma
mesma
d'Lima
visíveis
d'uma semelhante
legislação,
fé, d*uma idêntica moral,
d'um mesmo culto, ed'uma
sugeição ao chefe do apostolado perpetuo, divi-
namente
instituído
depositário dos poderes espirituaes,
e da auctoridade confiada á Egreja.
O
caracter
O
narchico.
d'este
votq
é essencialmente mo-
apostolado
de todos os catholicos colloca a su-
um
premacia do poder nas mãos de
só, legitimo repre-
sentante de Jesus Christo, e chefe único e visivel de
toda a Egreja.
Estas ligações, que, sahidas da
mão de Deus,
vincu-
lam integralmente os membros do corpo universal, não
podem
quebradas no menor dos seus enlaces, sem
ser
que os
fieis
reneguem o
principio
que a Egreja repousa. Tal é a
fundamental sobre
auctoridade da
infallivel
jerarchia apostólica, prerogativa divina, legitimo exercício de auctoridade, que ninguém poderá affastar de si,
sem que as portas da Egreja lhe sejam fechadas, pela
mao d'Aquelle que disse «Quem vos ouvir, ouvír-me:
ha
;
me
e
quem
despreza,
E ainda
vos desprezar, desprezar-me-ha
também
despreza aquelle que
«Como meu Pae me
á
ora,
quem
enviou.»
:
ensinai todas as nações
até
:
me
enviou, eu vos envio.
.
.
consummação dos
Serei
séculos.
Egreja, seja entre vós estrangeiro
.
.
Ide e
comvosco todos os dias
O
que nSo escutar a
como
o
pagão e o pu-
blícano.>
Qual
é o principio vital
Esta questão é o
da Egreja?
ponto capital da controvérsia que
divide os catholicos dos protestantes
dição.
Daremos em resumo
-este
debate.
em
matéria de tra-
1Ô6
Divindade de Jetus
§
IV
Reduziremos a proposições
tes,
a doutrina dos protestan-
nos artigos que nos são indispensáveis para a con-
que deriva do
trovérsia
titulo
d este artigo.
A doutrina do Salvador edos Apóstolos, no que diz
I.
peito
res-
salvação, acha-se completamente substanciada
á
na palavra escripta. São incríveis ©s artigos da
fé,
em-
bora a Tradição nol-os transmitia, logo que a palavra escripta os não justifique manifestamente.
II.
Qualquer
leigo,
homem
ou mulher, tem o
direito
de julgar o sentido da Escriptura, e pessoalmente
inter-
pretal-a.
III.
Em
controvérsias religiosas nSo ha ahi pastores
da Egreja auctorisados pela supremacia
mos submetter
mo
Cada
a
quem
deva-
qual decide co-
lhe praz.
IV.
o
os nossos juizos.
Os
mesmo
pastores da Egreja são
homens
importa valerem-se da sua
;
e,
como
taes,
importância
em
Concilios geraes, por que a susceptibilidade do erro é a
mesma, qualquer que seja a dignidade do homem.
V. A Egreja de Jesus Christo não só pôde errar, mas
effectivamente errou, quando a idolatria, a superstição,
e outros erros condemnaveis lhe mancharam a primitiva toga d'innocencia.
VI.
O
papa é o Anti-Christo, e os seus successores
são a continuação do Anti-Christo.
Vil.
Jesus Christo não deu a S. Pedro algum
legio .sobre os seus
cripturas
privi-
companheiros de apostolado; as Es:
não nos justificam a supremacia de
S.
Pedro;
/57
Divindade de Jesus
pelo
€,
conseguinte, os bispos de
mundo
bispos de todo o
Roma
são iguaes
aos
catholico.
Qualquer d'estas sete proposições, assim francas e
desembaraçadas, bastaria para
significar a barreira inter-
posta á Reforma e ao Catholicismo.
Pareceu-nos, porém, conveniente alinhavar no
mesmo
apontoado estes pedaços rasgados do
mesmo
estendal
de heresias, que, mais ou menos cobreadas, sao aquel
que ha pouco
las
repellimos,
embuçadas n'um manto
de hypocrisia com visos de moralidade
christã. (i)
Pareceu-nos, outrosim, que mais assentariam as nossas
provas,
sem lhes desunir os argumentos e retalhar a douSendo certo que em todos os trabalhos systhema-
rios
trina.
ticos
nios,
quando fossemos ao encontro dos adversá-
da intelligencia
que
humana ha um
enlace de raciocí-
lhes dá solidez e tenacidade, é
também
evi-
dentissimo que, n'esta maneira de expor a controvérsia,
não
procuramos fazer pedaços a estatua do protestan-
tismo para mais commodamente lhe pulverisar os
fra-
gmentos.
que argue nimia affouteza contra
que se contam a centenares, diz
linguagem,
Esta
um
complexo de
seitas
menos ao
intento
dadeira
Dizem que da
fé.
espíritos.
ctimas.
tam
Assim o cremos
Cumpre
ver-
parte de lá avultam elevados
o erro
:
respeital-as
?
tem
feito illustres vi-
Tanto quanto
ellas respei-
os depositários da palavra divina.
A Reforma
(i)
que as conversões frequentes á
deu de
Referencia a
se refutou
um
no semanário
si,
a
final,
uma
escripto, sobre o
em que estes
philosophia que
«Poder temporal» que
foram publicados.
artigos
;
:
1Ô8
Divindade de Jesus
redunda nas abstracções do pantheismo.
no fim da sua missSo.
vem
cial
cesso.
Os
[despontando.
A
aurora de
O
um
O
Christo está
novo cyclo
catholicismo é já
Arios e Pelagios renascem
menos
um
so-
retro-
fervorosos
mas
esgrimidores de armas mais penetrantes. Assim
que as doutrinas lhes disparam no absurdo, acolhem-se
ao presidio da razão natural. A meia volta, acham-se
Os
racionalistas.
Origenes e Tertulianos teem de me-
com elles no campo da rebeilião franca.
Não pôde o século, infelizmente, erguer aquelles
dirse
tos
venerandos da Egreja Lusitana: todavia,
d'essas arvores magestosas,
á
vul-
sombra
que bracejaram frondes pa-
ra todos os séculos, ainda os
humildes tentam elevar-se
para aquelle alto principio d'onde descem aos pequenos
da terra a coragem que os faz grandes entre os maiores
do orgulho humano.
Os
absolutamente repellem a tradição.
protestantes
A «palavra escripta» e mais nada. Doutrinas que derivem de consenso universal, ou tradições humanas, embora tidas em conta de divinas pela egreja catholica,
abjuram-nas.
Ora, se ventilarmos á cêrea da «palavra escripta»
um
simplíssimo debate, seguramente cremos que as seitas
dissidentes,
gloria
A questão
Que
dos
e
-seus abalisados chefes,
os
de nos reduzirem á sua
é esta
«palavra
escripta»
livros sagrados,
siastico
aprenderam os protestantes
que constituem o seu código
eccle-
?
Suppondo que um dos
munho
regeitarão a
fé.
livros
da Escriptura dá
testi-
de todos os outros, qual é a «palavra escripta» que
justifica a authenticidade d'esse livro abonatorio
?
lo9
Divindíide de Jesus
N3o
existe essa palavra escripta;
não obstante, as
reformadas receberam a tradição da Egreja
egrejas
mana
e,
ro-
ao escolherem os livros do seu código ecclesiastico.
Esta
uma repugnante
é
incoherencia que denota os
frágeis alicerces da Reforma.
como
E
terpretaç;lo
possível o contrario, se a genuína ín-
seria
da palavra escripta é contra a palavra es-
cripta dos protestantes
Como
consta da
i.^
dor e dos Apóstolos,
?
!
proposição, a doutrina do Salva-
em
tudo o que diz respeito á
sal-
mas não será cegueisemelhante máxima contrariada pela
vação, está consignada na escriptura;
ra prestar credito a
própria escriptura
Paulo
S.
plícito
é,
?
!
quanto podemos desejar que o
seja, ex-
:
<<E por tanto,
meus
irmãOvS,
permanecei firmes; e con-
que aprendestes de nossas palavras,
servai as tradições
ou mediante nossas cartas.»
(i)
«Em nome de N. S. Jesus Christo, meus irmãos, ordenamos que fujais aquelles d'entre vós cujo procedimento desregrado não é o que lhes ensina a tradição,
que receberam de nós.» (2)
«Eu vos louvo, meus irmãos, por vos ser lembrado em
tudo, e guardadas as tradições que vos dei.» (3)
(1/ Itaque, fratres, state, et tenete traditiones,
sive
Cap.
(2)
tri
quas
didicistis,
per sermonem, sive per epistolam nostram. 2. «Thessal».
2. V.
14.
Denuntiamvís autem vobis,
fratres, in
nomine Domini nos-
Jesus Christi, ut subtrahatis vos ab omni fratre ambulante
inordinate, et
bis. 2.
(3)
non secundum traditionem, quam acceperunt á no-
Thessal. C.
3.
Corinth. Cap.
2.
V.
6.
v, 2,
160
Divindade de Jesus
Não
textos
é mister fatigar a inteiligencia na versão d'estes
comprehender que
para
S.
Paulo ensinara
ver-
balmente aos de Corintho e Thessalonia doutrinas, que
suas cartas não
mencionavam.
que
reconhece-se
o
E,
ao
mesmo tempo,
recommendava
Apostolo
observância tanto para o que fora
dito,
igual
como para
que
o
fora escripto.
S. Paulo,
escrevendo a seu discípulo Thimoteo, obser-
que transmitta aos homens, capazes de
va-lhe
rem os outros, o deposito de doutrina que
lo
lhe
instruí-
elle discípu-
na presença de muitas testimunhas.
ouvira
Este deposito
doutrinal
(i)
não é a tradição escripta, que
essa era de todos, e ninguém, por mais elevado na gerarchia ecclesiastica, se arrogava o thesouro peculiar dos
livros sagrados.
O
deposito era a tradição oral cuja per-
petuidade é providenciada pelas admoestações do Apostolo, repetidas vezes, ás
Egrejas d'Epheso, de Corintho,
€ Thessalonia.
O
que
que
pta, é
se collige das razoes tiradas da palavra escriS.
Paulo não favorece os hiresiarcas: repre-
hende-os como fizera aos de Thessalonia,
mento desregrado dessoava da moral da
haviam recebido.
O
é
Evangelho de
S. João,
em
cujo proceditradição,
qus
suas ultimas palavras,
testimunho insubornavel das cavilosas interpretações
dos reformistas.
«Jesus operou outras muitas coisas, as quaes, minu-
(i)
Et que audisti a
me
per muitos testes, hoc
commenda
delibus hominibus, qui idonei erunt, et aiios docere. Ep. 2.
2. V. 2.
«•
•
fi-
C.
1
16
Divindade de Jesus
mundo
ciosamente contadas, n3o bastaria o
para conter
os livros escriptos.» (i)
que
crivei
E'
homem-Deus,
mano
que
palavra de Jesus, a significação do
semente lançada no
a
seio do género
cahisse na voragem do esquecimento
?
!
E' crivei
o Evangelista as considera, fossem benefícios pre-
cisos á primeira geração dos filhos da
para a geração do século
XVI?
lei
nova, e inúteis
1
Sustentam os protestantes— quanto é possível á
fé sustentar princípios
mem
hu-
tao amplas, tão multiplicadas
obras de Jesus,
as
como
a
absurdos
ou mulher, tem o
sentido da Escriptura.
direito
Os
— que qualquer
má
leigo, ho-
de interpretar e julgar o
anabaptistas, ramificação d'a-
quelle tronco regado por sangue precioso no coração da
Alemanha, affirmavam que aos mais ignorantes concedera o Altíssimo mais penetrante espirito de interprepor isso que João de Leide, cansado das sa-
tação.. E'
turnaes de
Munster,
presentado
por
jornaleiros a
em que
devassidão
o verdadeiro culto era re-
libérrima, balia á porta dos
mendigar a versão genuina das palavras de
Jesus Christo.
As palavras da Escriptura desmentem rigorosamente
estas asserções extravagantes.
«E' de
cular.
saber,
primeiro
que tudo, que nenhuma
da Escriptura se explica por interpretação
phecia
.
.
por
pro-
parti-
que os santos homens de Deus fallaram
inspirados pelo Espirito Santo.» (2)
(i)
Sunt antem
et alia multa, qua^ faclt
bantur per singula, nec ipsum arbitror
eos, qui scribendi sunt, libros.
(2)
Hoc primum
C.
intelligentes
21
Jesus quae
mundum
— v.
si scri-
capere posse
25.
quod omnis profecia Scriptu.
;
:
162
Divmdadé de Jfsus
Confessando os protestantes que sem o dom do EsSanto é impossível interpretar as escripturas
pirito
piradas
por
elle,
como
que a reforma traduz
é
mento dos seguintes textos de
S.
Paulo
dom de
«Este recebe do Espirito Santo o
dom da
sabedoria: aquelie o
dom da
prophecia.
com,
faliar
sciencia, e aqueiie outro o
ora
.
ins-
o senti-
só
é
que opera, distribuindo a cada
um
um
mesmo
o
espirito
os dons que lhe
praz.» (i)
Na
do texto ha esta supposiçSo unica-
intelligencia
mente rasoavel
:
dom da
o
mente concedido
interpretação
foi
singular-
aos apóstolos^ pastores, e doutores (2)
expressamente designados
por
Deus columnas da sua
Egreja.
Com
que
dom do
dar
recto juizo ousarão os protestantes appelliEspirito
de contradição, que
uma
d'entre
tem, a ponto de não haver
elles
multiplicadas
membros
esteja
Escriptura
?!
dom
Santo aquelie especialíssimo
seitas,
n'uma
d'accordo
totalidade
de
interpretação
da
cuja
só
Confessam os protestantes que sem o dom do Espidas Escripturas
rito
Santo é
mas
as suas egrejas contradizem-se, guerream-se, e des-
acreditam-se
ineíficaz
da
ciosas
intelligencia
a
primasia de entendimento
uma
sendo impossível a cada
tar-se
rae
na
a
inspirada
pelo
própria interpretatione
.
.
de boa
Espirito Santo,
non
fit.
Non enim
fé,
;
e,
repu-
poderemos nós
voluntate
huma-
sed Espiritu Sancto inspirati, locuti sunt sancti Dei homi-
nes. S. Pedro. 2 Epist.
(1)' i.«»
(2)
d'ellas,
Gap.
Corinth. Gap. IX,
I.
II,
Ephes. Gap. IV, V. 11.
V. 20, 21.
20.
:
168
Divindade de Jesus
concluir
que nem o seu
avaliar,
e
clero,
nem
Escri-
Acresce ainda sobre estes argumentos de prova
ptura.
moral, aquelle que julgamos irrespondivel
da
letra
podem
os seus leigos
menos dar como julgado o sentido da
— o da
própria
contheudo nos textos que vamos
Escriptura,
mencionando.
Se nos dissessem, que, nos primeiros annos do Chrispor todo o
tianismo,
mais curiosos
em
século
apostólico,
um
dos leigos
escutar os juizos d'aquelles
em
cujas
mãos eram frequentes as Escripturas— se nos dissessem
que esse leigo comprehendêra habilmente uma passa-
gem de
com bem pouca repuNovo Testamento viria em
contrario da nossa crença com a seguinte passagem
«Ora um ethiope eunuco, que era dos primeiros offignância.
ciaes
acredital-o-iamos
isaias,
E,
com
tudo,
o
Candace, rainha da Ethiopia, e superinten-
de
dente geral do seu
viera a Jerusalém por fazer
erário,
sua adoração.
«E quando
já
voltava,
ia
assentado no seu coche,
lendo no propheta Isaias.
«Então disse o ethiope a Filippe
ra
ci'este
«Correu^ logo Filippe;
propheta
esids
aqui á bei-
Isaias,
e,
ouvindo que o eunuco
disse-lhe:
Tu
lia
crês que entendes o
no
que
lendo?
«Elle
7iào
:— chega
coche.
lhe respondeu
:
Como poderei eu
houver alguém que m'o explique ?
E rogou
a Filippe
que montasse, e se assentasse com
elle.» (i)
(i) Act. CVlll
— V.
e^itendel-o^ se
I
28 e seg.
164
Divindade de Jesus
Notemos que
eunuco era
o
dade e
iliustraçao.
pretes
da
homem que
reunia santi-
Comparemol-o, depois, com os
consoante
Escriptura,
o
inter-
protestantismo os
admitte, nas pessoas dos seus sacerdotes e sacerdotisas.
Nao
como havemos de
sei
estribar a nossa fé
na virtu-
de e illustração de taes interpretes. Querem-nos parecer
mais idóneos S. Jerónimo, Calmet, e Duhamel,
Quando
cisaram
os próprios discipulos de Jesus Christo pre-
quando aos
próprios
indispensável
inteliigencia
das
Escripturas
;
Apóstolos enviou o Mestre a luz
no entendimento
d'ellas, (i)
não será ju-
duvidar d'uns ingenhos que se mculcam subti-
dicioso
no
lisados
rito
na
interprete
espirito
de sua razão, e menoscabam o espi-
de Deus inspirador e
antigos
Dizer
conselheiro dos interpretes
?
que Jesus Christo
tradictorias,
inspira as interpretações con-
que sSo a base das egrejas reformadas, é
blasphemar.
íi)
CXXIV
Tunc
apernit
V. 45.
illis
sensum ut
intelligerent scripturas.
Luc,
Divhidade de Jesus
V
§
Sustentam os protestantes
nas controvérsias
A
Escripturas, e
Escriptura contraria taes
«Assim como
.
.
máximas claramente com
enviado por
fui
:
meu
do Filho, e do Espirito Santo.»
«Quem
vos escuta, é a
me despreza
que me enviou.»
despreza,
aquelle
;
No estudo das
e
trilho
do Pa-
mim que escuta: quem vos
quem me despreza, despreza
humanas, a razSo individual
dos mestres, e subir mais alto
na investigação da verdade.
sSo sempre escuras
em nome
(2)
(3)
sciencias
pode affastar-se do
bora
Pae, eu vos en-
(i)
«Ide, pois, e ensinai todos os povos,
dre,
proclamam a
escripta juiz sufficiente nas disputas religiosas.
estes textos, colhidos entre muitos
vio.
da submissão,
a negativa
aos pastores da Egreja. Re-
religiosas,
mettem os contendores ás
palavra
Í0'f)
Mas verdades
reveladais
no seu sanctuario mysterioso, em-
a viva luz da mais transcendente razão as queira
esclarecer.
Jesus Christo, que
caprichoso
em
aquelles que
(i) S.
J.
não viera a
máximas
deviam
XX, v.
interpretal-o tanto
21.
xxvm,
instituir
(2: S.
Mat. c.
(3) S.
Luc. c. X, V. 16.
V.
um
incomprehensiveis,
19.
código
apontou
quanto convi-
;
lf)6
Divindade de Jesus
,
nha á salvação dos homens de boa vontade. Taes deda genuina interpretação da palavra divina
positários
são os appellidados
:
«Delegados de Jesus Christo, Dis-
pensadores dos mysterios de Deus.» Convictos de sua
soberana missão, os Apóstolos, zelosos propagadores da
doutrina, declaram
anathema ao
anjo,
que descesse do
céo a annunciar preceitos diversos do que elles tinham
ensinado.
Se quereis
um exemplo
da auctoridade que os pasto-
da Egreja receberam de Jesus Christo para julgar
res
as heresias e condemnal-as, lede os actos dos Apóstolos
no cap.
XV —
«Ora alguns que tinham vindo da Judéa ensinavam
esta
doutrina aos irmãos:
gundo a
Se não
sois circumcizos, se-
pratica da Lei de Moysés, não podeis ser sal-
vos. Paulo e
Bernabé, vivamente sublevados contra
el-
juntamente com alguns dos adversá-
les,
decidiram
rios,
a Jerusalém, para, na presença dos Apóstolos, pro-
ir,
porem a sua questão. Reuniram-se,
os
para
padres
resolver
pois, os
pendência,
esta
Apóstolos e
e,
depois de
muito examinada de parte a parte, Pedro levantou-se e
deu o seu
Vemos,
ja,
juizo.»
pois,
a decisão de Pedro curvar á obediência os
to judeus
como
digar texto
tra
na primeira questão ventilada na Egre-
em
gentios.
Onde
que lhes abone a
fieis,
irão os protestantes
má
controvérsias religiosas
?
fé
tan-
men-
da sua razão arbi-
Se a palavra escripta
máxima fundamental da Reforma, quem,
cego como o orgulho humano, suspeitará cavilosa
repelle
a
tão
in-
venção, que se não peja de estribar no Evangelho, diametralniente opposto ?!
:
167
Divindade de Jesus
Os
respondem a esta invectiva dos
protestantes
com presença de
tholicos
«Não ha duvida que
infalliveis
E,
mas, mortos
;
comtudo,
S.
espirito
um
tanto para
as decisões dos apóstolos
elles,
ca-
riso:
eram
cessou a infalibillidade.»
Paulo, o infallivel nas suas doutrinas,
segundo o argumento dos protestantes, deixa de o ser
na carta aos de Epheso, que tão luminosamente destroe
o
débil recurso dos adversários do Catholicismo
mesmo, (Jesus Christo) deu
«Elle
tolos, Prophetas,
um com
á sua Egreja Após-
Evangelistas, pastores e doutores, cada
sua missão, a fim de cooperarem para a perfei-
ção dos santos, para as funcções do seu magistério, para
a edificação do corpo de Jesus Christo, até que todos
cheguemos á unidade d'uma mesma
fé,
e
d'um mesmo
conhecimento do Filho de Deus, á perfeição do
ho-
mem ...
e que não sejamos como creanças, e pessoas
volúveis,
que se deixam
levar por todos os ventos das
opiniões mundanas, por trapaças de homens, e pela astúcia
que
elles
tem de
arrastar ao erro artificiosamente.»
bem coordenada a missão d*um tribunal,
complexo de homens com vários encargos, que deve
Ahi
ser
está
continuado
em quanto
^ressões da heresia.
a Egreja luctar contra as ag-
168
Divinda/ie de Jesus
VI
§
Affirmam os protestantes, que não podemos confiada-
mente
jurar nas palavras da Egreja e dos concilies ge-
raes sobre decisões de fé, e de moral, por
res
que os pasto-
da Egreja são homens^ podem enganar-se, e por con*
sequencia enganar-nos, se lhes prestamos inteiro credito»
A
conclusão que sua
é—que,
'Cipios
rir
má
vontade lhes dá de taes prin-
para maior segurança, devemos só adhe-
á palavra de
Deus
escripta.
Depois d'uma determinação assim enfática e suasória^
devemos de boa fé consentir em que os protestantes
não são homens^ não se enganam, nem podem enganarnos com suas decisões
!
Tem
o arbitrio doestas estrava-
que o levam a galhofar em assumptos muita
e até não sabemos se b riso será a mais judicio-
gancias,
sérios,
sa illação de suas primícias.
Que
importa
Egreja de
Jesus
a illustre
Christo
assemblêa dos pastores da
com Calvino a
comparada
trovejar as suas inauferíveis conclusões
Quem falia ahi
um quaker, ou um
clara infallivel
o acreditam
O
em
da
infallibilidade
anglicano, ou
um
?
da Egreja, quando
anabaptista se de-
relação áquelles poucos sectários
que
?
absurdo, pelo menos, tem a particularidade de ser
faceto,
e
não sabemos por que operação providencial
estes parallelos não
os argumentos de
podem
uma
já hoje ser estabelecidos con^
lógica escorreita e grave.
169
Divindade de Jesus
Dizer que a Egreja pôde enganar-se, é
ir
de encontro-
ao Evangelho de Jesus Christo, que expressamente contraria
uma
não
vas,
asserção. Estas sSo, entre outras, as pro-
tal
pedidas
ao
livre arbítrio,
mas extrahidas da
«palavra escripta:»
«E eu também
te digo
esta pedra edificarei a
prevalecerão
que
minha
tu és Pedro, e
Egreja, contra a qual não
as portas do inferno.» (Math. Cap.
XVI,
i8.)
v.
As portas
do
Egreja, se esta,
de
doutrina
prevalecido contra a
teriam
vez, se tivesse desviado da fé e
Jesus Christo
catholica
Egreja
inferno
alguma
;
mas
o divino fundador da
predisse e prometteu o contrario: logo
ou taes promessas nunca foram
um
falso propheta,
da pelo
e
nome do
ensinai
ou Christo era
:
a todos os povos, baptisando-os
em
Padre, e do Filho, e do Espirito Santo, ensi-
nando-lhes a
mandei
feitas,
ou nunca a sua Egreja será mancha-
erro.
«Ide,
á
que sobre
observância
e confiai,
que eu
consummaçâo dos
de
tudo aquillo que vos eu
serei
sempre comvosco até
séculos.» (Math. Cap.
XXV 111,
v.
t9, 20.)
Os
protestantes estão d^accordo
infallibilidade
com
os catholicos na
das doutrinas dos Apóstolos, e dão como
perservados d*erro os
fieis
que os ouviram, por
isso
que
Jesus Christo promettera acompanhar os depositários
da doutrina até á consummaçâo dos séculos.
E' evidente,
porém, que a promessa do Salvador não
poderia cumprir-se integralmente nos apóstolos a
quem
Jesus Christo não prometteu simultaneamente vida que
discorresse atravez das gerações até á ultima.
lidade da doutrina, coadjuvada
A
infallibi.-
pela vontade do Altissi-
110
Divindade de Jesus
mo, devia transmittir legado celeste áquelles que foram
enviados para erismar iodas as nações.
Os
pulos,
homens
únicos
apostólicos, que, depois dos discí-
pregaram o Evangelho de Jesus Christo a todas
as nações, foram os bispos, e os pastores da Egreja Catholica
Romana,
os seus delegados ás nações idola-
e
que abraçaram a
tras,
fé.
Ora, se os apóstolos eram
promessas de
Christo,
infalliveis
conclue
a
em
virtude das
menos
intelligencia
versada na theologia, que a Egreja dos Apóstolos, nos
séculos posteriores,
em
man-
virtude d'aquella promessa,
teve cunho de infallibilidade, garantido pela permanência
da doutrina.
«Eu
supplicarei a
que
consolador,
Cap. XIV,
V.
«Quando
meu
esteja
Pae, e
um
outro
i6.)
este espirito de verdade descer, toda a ver-
dade vos será ensinada por
V.
vos dará
elle
cot.vosco eternamente.» (Joan.
(Joan.
elle.»-^
Cap.
XVI,
13.)
Os
tural
:
apóstolos,
mas
vilegiou-os
como homens, eram
falliveis
dom particular de ensiiiar a
no dom da infallibilidade. Não
o
de seu na-
verdade, pri-
nos pergunte
o espirito de sophisma se a dadiva do Espitito Santo
exclusivo dos apóstolos: respondemos que não.
rito
de verdade, como espirito de sanctificação,
ramado sobre todos os
mento é promessa
fieis
:
preferiria,
se o
mesmo
espi-
foi
der-
o espirito de ensina-
especial d'aquelles
to elegera entre as multidões,
ma
mas
que Jesus Chris-
osquaes precisamente nao
espirito illuminasse
com
intensidade de luz as intelligencias de todas.
iriam, fora do
mundo,
do divino Mestre?
foi
O
a mes-
Onde
os apóstolos propagar a doutrina
—
:
171
Divindade de Jesus
Jesus Christo prometteu a coexistência eterna do Es-
Verdade na pessoa dos apóstolos. Estes,
pirito de
certo,
não vieram atravez das gerações até ao extremo dia da
humanidade para que
Jesus Christo tivesse
no
cessão
o eternamente da promessa de
n'elles o
A
seu complemento.
da palavra escripta
rigor
foi feita
con-
á serie de
successores d'aquelles primeiros que ouviram a promessa
do Redemptor, e a tomaram desde logo como garantia
para
E'
que succederam
^no seu
augus-
sublimemente expressiva a prophecia de
Isaias,
si,
e para aquelles
to ministério.
•*-
Cjuando prediz a descida do Espirito Santo sobre a Egreja
de Jesus Christo
<'Meu espirito que é comtigo, e minhas palavras que
puz em tua boca, não serão da tua boca arrebatadas,
nem da
boca da tua posteridade^
nem da boca
dos des-
cendentes de teus descendentes para todo'o sempre
diz o Senhor.» (Isaias
A
sas,
Cap. LIX,
v. 21.)
divina Providencia, depois de tão solemnes promes-
não permittiria que os missionários da sua
institui-
rás sagrada, os successores do santo congresso dos apóstolos,
abandonados, e árbitros da sua missão sem fé nem
authoridade, proclamassem o erro contra a
rigorosa
Egreja
romana,
e a fé con-
de seus predecessores. Concluimos por
tra a sã doutrina
illacão
fé,
das paTavras
sob
a
de Jesus Christo, que a
inspiração infallivel do Espirito
Santo e da divina Providencia, nunca pôde. nos passados tempos,
nem
poderá nos tempos futuros, ser aban-
donada ao ensino do
Thimotheo,
Egreja
a
seu
erro contra a moral, e a fé.
temeroso- de
que,
em
sua ausência, a
cargo desvairasse nos conselhos, que de
viva voz recebera, escrevia:
172
Divindade de Jesus
<'Escrevo-vos, nSío obstante
bem cedo
estar
comvosco;
para que, se a demora fosse grande, soubésseis por que
maneira devereis proceder na casa de Deus, que é a
Egreja do
Deus
vivo,
de.» (Thim. Cap.
Ill,
columna e fundamento da verdav.
14, 15.)
Admittida a infallibilidade da Egreja de Jesus no seu
começo, é necessária consequência proclamar scismaticos
e heréticos aquelles que, separados d'ella, se não pejam
de divinisar o
vre arbítrio.
espirito
de seita sobre a apotheose do
li-
173
Divindade de Jesus
§VII
Quem
se impozer a utilíssima tarefa de estudar a re-
em
forma lutherana
profícuos
ás
todas as suas ramificações irrecon-
o tronco, chegará precisamente aos mais
com
ciliáveis
resultados do estudo,
que sao a sabedoria, e
extremas consequências d'um
falso
systema^ que s3o
o desengano.
mancebo
Mais d'um
mesmo tempo
religioso fora
inerte,
d'esta geração analytica, e ao
me tem
dito
que o seu
espirito
regenerado na leitura dos livros phisolophi-
cos do século XVlll. Confessam a inanidade de crença
em que
os deixou a sciencia túrgida dos antigos padres;
sendo que os modernos philosophos proclamam a
di-
vindade do christianismo, antes de syndicarem as provas nas formulas da Biblia, ou nos argumentos imperiosos do raciocínio.
Estas
as
illações,
mesmas que
colhidas de
princípios absurdos,
s3o
affluem da leitura imparcial das razões
do protestantismo contra as razões da Egreja catholica.
Leiam-se,
e
na
dissequem-se
raiz
que medrou pela
seiva da mentira; profunde-se o principio do erro,
quem lhe não
consente
uma
argumente-se com o Evangelho aberto,
se não pejou de arrogar-se o Evangelho
capricho de frade despeitado
(i)
como
só de suas consequências;
(i),
já
que a reforma
em abono d'um
e felizmente o joelho
Epytheto expressivo d'um príncipe, que vivera protesta»te
è ha pouco expirou cathoHco.
174
Divindade de Jesus
do homem, que procura saber o seu destino, curvar-se-
ha no sanctuario das verdades eternas, confiadas por
Jesus Christo ao seu representante.
Nao sejamos tímidos em
assoalhar ao sol da
gencia os retalhos dispersos da reforma.
que o
intelli-
Não haja medo
racionalista insipiente vacille entre os caracteres
da verdade catholica e da mentira protestante, Nao se
bom
arreceie o
christão
em
prejudicar a sa doutrina de
Roma, expondo-a aos que passam indifferentes para que
a comparem com a de Inglaterra, para que a comparem
com a de todo o mundo, e com a de todos aquelles que
bem doutrinado
julgam
mais
alguma
religiosa.
o
que nao tem doutrina
por isso, que, por pouco, proseguiremos na franca
E',
apresentação d'um ou outro argumento dos protestantes
que valha
a
pena de ser rebatido. Temos procurado a
clareza nas formas d'este trabalho árido e
hoje entre catholicos reputado frioieira
se
já
faz
pena
lyse de
mesmo
;
sentir a precisão de invocar o espirito de ana-
algum de nossos
de Babylonia,
lha de Luthero, essa
graças,
se
tremenda
leitores para
que decida since2.
prós-
como poderiamos denominar
mae fecundíssima de erros e
a
fi-
des-
quizessemos figural-a a realidade d'aquella
visão do Evangelista na ilha de Pathmos.
Se com o
espirito
pedimos a causa
com
fos-
por que
ramente entre a Egreja pura de Jesus Christo, e
iitídda
obri-
Quizeramos que o assumpto em discussão
gatório.
de lealdade e desejo de saber, lhe
radical da sua separação,
inabalável firmeza de caracter,
respondem,
que a Egreja de Je-
sus Christo, na sua totalidade, nao só podia resvalar ao
despenhadeiro do
lou,
erro,
mas que effectivamente
resva-
desde que, infeccionada d'erros, e surperstiçao, e
ido-
:
175
IHcindade de Jesus
latria,
forçara a consciência dos protestantes a sak7r da
Babylonia.
centro de
como
irrisórias, e
vas á esposa
Estas suas ordinárias expressões,
de todas as menos insolentes, invecti-
Jesus Christo, sSo a arma que mais
de
dextramente jogam, eé por ventura aquelia que Voltaire
melhor jogou como legitima herança provinda de seus
mestres. São consequências filliadas e rigorosas. Depois
do
arbitrio o
livre
scisma
lismo; e o sarcasmo
depois do scisma o raciona-
;
ultimamente como complemento da
embora apadrinhado por homens, que lhe
destruição,
deram aquelle pomposo nome da philosophia.
Não fecharemos ainda
mos que a serpente do
a Biblia,
erro
se
em quanto
presentir-
refugia nas suas pá-
ginas.
Em
Daniel
— cap.
«No tempo de
nunca destruído,
vo,
taes
um
45— lê-se:
II, v.
reis,
o
reino,
rei
do céo creará
que não passará
que pulverisará todos os
um
reino,
a outro po-
reinos, e subsistirá eterna-
mente.»
Concedem
os protestantes ser esta a predição do Rei-
no espiritual de Jesus Christo, nunca destruído, e
etcr-
7ianie7ite existente.
Fortaleçamos a predição com palavras do
mesmo
pro-
pheta
«Eu
via estas coisas
em uma
visão nocturna, e vi o Fi-
lho do homem, que vinha entre as nuvens do céo, e
abrangia
d'elle
o
ultimo dos dias. Vieram á sua prezença, e
receberam o poder, 3 honra e o
reino; e todos os
povos, e todas as tribus, e todas as linguas o serviram:
o
seu
poder
usurpado,
V.
nem
13, 14.)
é
um
poder eterno, que nunca lhe será
o seu reino destruído.» (Dan.
Cap.
Vil
Divindade de Jesus
17()
«Elle será grande, e chamar-se-ha o Filho do Altíssi-
O
mo.
pae
:
Senhor Deus dar-lhe-ha o throno de David, seu
reinará eternamente sobre a casa de Jacob, e seu
reino será infinito.» (Luc.
Cap.
I, v.
32, 33.)
São evidentes e clarissimas as palavras do texto, e
cremos que accumulal-as não augmentaria a sua força
A
de prova.
Egreja de Jesus Christo, que, segundo o
estylo da Escriptura é o seu
Remo
Espiritual,
de a sua fundação, destinada á perpetuidade,
como nação
tuída
foi,
des-
e consti-
indestructivel entre todas as nações
perecedoras.
Articulam os protestantes:
«Nós também
que
affirmamos
a
Egreja de Jesus
Christo é perpetua e indestructivel.»
bem
Pois
acceitamos a benevolência da sua confis-
:
são.
Onde
é que estava a Egreja perpetua e indestructi-
vel antes da
Reforma protestante?
«Nos séculos
— existia
uma
mas
nismo;
anteriores á
Reforma— respondem
elles
Egreja christã, que ensinava o Christia-
impura, corrupta^ idólatra, e supersti-
era
ciosa.»
Paliar
é uma
d'uma EGREJA DE JESUS CHRISTO corrupta,
um
contradicção manifesta dos termos,
razão» — diz
um
«ente de
scismatico da Egreja anglicana,
Jucido intervallo de boa
A demonstração
n'um
fé.
é simples,
sem
recorrer aos poderosos
auxiliares das razões moraes.
A
posto
Egreja
de
Christo.
um
é
corpo mystico, essencialmente com-
verdadeiros
Quem
da verdadeira
faz o
fé,
crentes,
verdadeiro
e
adoradores de Jesus
crente
é
a
profissão
e do verdadeiro culto de Jesus Chris-
177
Divindade de Jesus
Logo— a
to.
apóstata que abandonou a fé e a
Egreja
doutrina christã, que degenerou
pureza, e corrupção,
sus Christo,
tal
nem uma
em
erro e idolatria, im-
Egreja não é a
parte d'ella.
Um
Egreja de Jeparticular,
que
a verdadeira fé e depois se fez heresiarcha,
professou
deixou, no instante da sua rebeldia, de pertencer á Egreja
de Jesus Christo.
As mesmas condições militam
transfiguração religiosa
d'úma nação, qualquer que
predominante do
a heresia
seu systema
religioso.
na
seja
Se
toda a Egreja apostatou, como os protestantes aífirmam,
muitos séculos antes da Reforma, a Egreja de Jesus
Christo necessariamente pereceu, por isso que membros
impuros, heréticos, idólatras e corrompidos não podiam
Mas
constituila.
a Biblia rebate energicamente esta hy-
pothese assas degradante para a humanidade, e grande-
mente
ultrajadora para o divino fundador da Egreja ca-
A
tholica.
Biblia repete-nos
que o Reino Espiritual de
Jesus Christo, desde o seu estabelecimento, não poderia
anniquilado.
ser
idolatria,
A
.Biblia
brada contra a accusação de
de superstição e erros condemnaveis que a Re-
forma attribue á Egreja romana.
A
to
Biblia diz claramente
foi,
em
por
que a Egreja de Jesus Chris-
graça e misericórdia de Deus, estabelecida
perpetua santidade.
«Sereis respeitado e honrado por todas as idades,
quanto o
sol
e
a lua subsistirem.» (Ps. 4,
XXI,
em
v. $.)
«N'esses dias florescerão os justos, e saborear-se-hão
ahi fructos de paz,
Em
em quanto
a lua subsistir.» (v. 7.)
traducção ingleza, os protestantes aífirmam que
David prophetisa aqui a
gloria
do Reino ou Egreja de
Jesus Christo. E, comtudo, o propheta é solem nemente
desmentido pelos seus interpretes, quando
chamam
12
ao
!
178
Uivindadê de Jesus
do
tribunal
arbítrio a Egreja
livre
do Pontifice para se
condemnar de impura e corrompida! A Biblia protestante declara que Isaias prophetisa a vinda do reina
vêr
de Jesus Christo por estas palavras, realisadas no rigor
da palavra:
«Acontecerá nos últimos tempos que a montanha so*
bre a qual
em
multidão.
(Isaias,
O
Cap.
II,
.
.
e os idolos serão ahi pulverisados.»
v. 2 e 18.)
anniquilamento da
pessoalmente
prido
transito nas
je
casa do Senhor será edificada, terá seus
das collinas; e todas as naçSes hao-de ahi conver-
tice
gir
a
nos píncaros dos montes, e sobrepujará o vér-
alicerces
idolatria,
não tendo sido cum-^
Jesus Christo durante o seu
amarguras da RedempçSo, é o que nós ho-
comtemplamos
complemento
apostólicos
por
n'essa
pela
obra
Egreja
converteram á
dispersos na face do
gloriosa/ levada ao seu
catholica,
cujos pregadores
fé os idolatras, e
ainda hoje
mundo, luctam anciosos contra as
perseguições, para obrigar no redií da fé o restante
fieis,
mar
sobre
quem
a luz da
Egreja que os protestantes
latra
da
Redempção começa a
E é
o seu influxo de vida e immortalidade.
í
A
condemnam de impura
dMn-
derraesta
a
e ido-
Egreja Romana, forte de graça, e depositaria
missão de Jesus Christo, condemnada de corrupta^
supersticiosa e idolatra
179
JHvindade de Jesuê
VIII
Ha um
braço a desarmar o gigante de três séculos,
que, no delírio da sua
grandeza, ousou pôr hombro ás
columnas do Vaticano, para
de
vícios,
protestantismo,
homem,
frade
nivelal-as
em que mergulhara
como todas
com
o tremedal
os seus admiradores.
recua três séculos á sua origem na cella
heresiarcha,
para
O
as creaçoes arrogantes do
explicar-nos a
d'um
miséria da sua
morte pela miséria do seu nascimento. Aventureiro, que
medrara á custa das paixões da humanidade, que
lison-
geára nas praças, entre as multidões, e nos salões mais
que as praças, o protestantismo é hoje o decré-
viciosos
da paralysia, esperando boce-
pito,
entorpecido no
jar o
ultimo suspiro da sua desastrosa passagem entre os
leito
homens. Nos últimos dias da sua existência, chamou á
cabeceira do leito o racionalismo, revelou-lhe o segredo
da sua conservação, legou-lhe a herança das suas doutrinas desacreditadas, e socegou
rançosa felicidade
O
instante,
na «spe-
de encarecer, na pessoa de seu her-
thesouro de mentiras, que a sciencia lhe rebai-
deiro, o
xara a
um
bem merecido
desprezo.
racionalismo está descorocoado á cabeceira do
O
ribundo.
dade, é
também
profundezas do
destino
o século da verdade para investigar as
espirito,
e as elevadas hypotheses^do
da humanidade. As luctas ha
cessantes
mo-
século da mentira para o regimen da socie-
do
homem com
o
três séculos in-
homem, da 80ciedade*com
180
Divindade de Jesus
o seu
governo, e das velhas instituições
o
sempre
e
os novos
materialismo da vida, sempre occupada
desacreditou
em
viver^
com
desanimou a esperança, e
ensaios, enervou a coragem,
irresoluta no conjecturar seus des-
tinos além do tumulo.
O
do espiritualismo, com o seu cortejo de
reinado
concepções elevadas e generosas renuncias das coisas
do mundo, apresentou-se, ha vinte annos, sem estrepido,
sem ovações,
e
sem
a concorrência dos fanatisados,
que apparecem sempre para
novidade que se annuncia.
justificar o
O
bom
quilate da
seu progresso, lento e
re-
gulado na estrada das experiências, logrou assumir as
honras d'uma verdade magestosa, que caminha sempre
desempedida ao seu
pecilhos do
como um
beças
erro.
sem embaraçar-se com os emmundo, a verdade religiosa é
fim,
N'este
estandarte animador, agitado sobre nossas ca-
mão do
pela
anjo,
que jamais desce a hastea-lo
entre os homens.
Cremos na
fervorosa
dedicação de muitos espíritos
para que a Egreja de Jesus Christo haja de triumphar
sobre todas as seitas, e acolha ao seu seio maternal to-
das as rebeldias de seus ingratos inimigos. Este zelo é
em
si
o
fructo
que mais se resente do saboroso
leite,
que bebemos no seio d'aquella mae carinhosa mas a
verdade é uma, eterna e superior aos bons officios da
;
humanidade.
A
religião christa
é
a luz perenne accêsa por
Deus
na longa noite que vai atravessando as gerações desde
que o primeiro homem, perdido na vereda em que Lúcifer o desviara, precisou de luz que o encaminhasse á
gloria*
para
que
fora
creado.
amigos dos homens empregam
O
fervoroso zelo,
em
que os
mostrar-lhes essa luz
181
Divindade de Jesus
Redemptora,
é
um
beneficio feito a seus irmãos, des-
garrados do caminho,
mas nSo
é
argumento novo para
mais aclarar a face da verdade. Frayssinous, o inspirado
apologista
do Christianismo,
nSo formulou demonstra-
ções que S. treneu nSo adduzisse no 2.° século. S. Cle-
mente d'Alexandria nao
recearia
caminhar ao lado de
Lacordaire nas provas da divindade da
religião christã.
E Bossuet nSo subiu mais alto, nas contemplações de
Deus, que Santo Agostinho ha quatorze séculos.
A vantagem é toda dos homens. O sol brilha sem*
pre no firmamento; mas na terra nem todos tem o dom
da visão para contemplal-o. E o cego, que hoje abriu
os olhos, dará mais resplendor ao astro que nunca vira.?
Quem devemos ouvir com mais anciedade nos argumentos que nos aproximam da verdade, é aquelles que,
mais perto d^ella, beberam a sciencia pura, que lhes manava como de fonte virgem antes que a onda turva do
orgulho humano lhe manchasse a pureza.
E', por isso, que no ultimo artigo do motivo que rapidamente desenvolvemos, viemos, no decorrer dos
sé-
culos,
mencionar a auctoridade d'aquelles cujo nome só
por
sobre-excede o que mais acurado poderá sahir da
si
nossa inexperiente penna.
No
primeiro século, S. Bernaté
condemna
o orgulho
dos heréticos, que preferem a sua sciencia aos manda-
mentos da egreja universal, cujo ensino
e
communhão
Clemente reprova aos Corinthios as suas
desintelligencias e menospreço pela auctoridade dos pasregeitam. S.
tores,
que os apóstolos, animados do
lhes conferiram
espirito
de Deus,
para governal-os. Exhorta-os a submet-
terem-se aos padres, desarmando-se do seu orgulho e arrogância. Santo Ignacio repete
em
suas cartas a neces-
182
Divindade de Jesus
sidade de se unirem os
a seus pastores. S. Polycar-
fieis
po pedia aos de Filippes firmeza e constância na
que
fé,
receberam dos apóstolos por intermédio de seus pastores
mesmo tempo, segundo
e ao
;
refere Eusébio, repetia as
palavras do Senhor, quaes as ouvira da bocca dos apóstolos. Hegisippo,
2.^ século, fez
uma
via-
Roma, consultou um grande numero de bispos,
declarou que se lhe deparara a mesma fé em todas
gem
e
no começo do
a
Reuniu, depois, todas as tradições apostó-
as cidades.
em
licas
cinco livros, que Eusébio viu, e que nSo che-
garam a esta geraçSo. No mesmo
nha do domfngo,
tros bispos
eram
as cartas do papa S.
cada ma-
Clemente e d'ou-
na assembléa dos
lidas
em
século,
fieis,
em
seguida
ás dos apóstolos.
No
2.° século
vejam-se as bellas e profundas doutri-
nas de S. Ireneu, Tertuliano, e S. Justino. Este recorda
o preceito de se ajuntarem os
fieis
na egreja para
cele-
brarem o domingo— tradição emanada de Jesus Christo,
fallando
a
«dir-se-ha
este preceito não foi
um
sus Christo?— pergunta
Ou
os
faz
elle
provas,
uma
com
?
Que
a condição, porém, de
a obrigação de direito
com
divino,
nós, de santificar o
mana, em
professor de theologi:i.
escolham
d'estas asserções absurdas e
rão a maneira de concilial-a
como
de suas apparições
promulgado por Je-
parte da tradição escripta
nossos adversários
sem
em uma
seus discípulos
que
que encontra-
o 'seu systema, e
que
elles
com
reconhecem,
domingo, primeiro dia da
se-
logar do sétimo.»
Diz Tertuliano,
no
livro
da
«ResurreiçSo» que
os
hereges deveriam provar os seus sentimentos pela simples escriptura. Esta asserção
como
resposta para
tomam-na os protestantes
fazer calar os catholicos.
Esquece-
183
Divindade de Jesus
ram que Tertuliano
repelle victoriosamente os heréticos
que invectivam os dogmas particulares, formalmente expressos
nos livros sagrados,
ctoridades
hábitos
Escripturas,
uma
trabalho e n2ío
sia
com vãos
raciocínios e au-
apologista manda-os renunciar os
do paganismo, diametralmente adversos á dou-
das
trina
O
pagSs.
um
perfeito
em que
a here-
cuja intelligencia é
analyse superficial
termina por bradar contra o dogma contrario ao
ciocínio.
E'
necessário— diz
elle
— combater
timento das Escripturas, enunciadas por
terpretação.
a heresia do
responde
egrejas,
tores,
:
Onde
alto
— «na
com
uma
ra-
o sen-
segura
in-
encontrar esta segurança?— pergunta
da sua soberba racionalista. Tertuliano
tradição,
no ensino
no
consenso
oral, primittivo,
unanime das
e uniforme dos pas-
que substituíram os apóstolos, cujo valor tem na
integridade da doutrina.»
No
IV século ensína-nos
Eusébio que os discípulos
óo Salvador nos transmittiram sua doutrina, parte na
obra que nos legaram, e parte na tradição
— pôde
assim
christãos.
nos
elle
chamar-se
Na sua
direito
oral
que
ó,
não escripto dos
obra contra Mareei d'Ancyra mostra-
a doutrina de Jesus Christo espalhada
extremidade á outra da
que
—o
terra, por
é o sustentáculo e a confirmação
pturas nos ensinam.
d'uma
meio da tradição oral,
da que as Escri-
184
Divindade de Jesus
§
IX
Todos os padres, e doutores dos primeiros séculos do
Christianismo, estabelecem, unanimes, a sacrosanta au-
Os
ctoridade da tradição.
que apregoam, para
adversários do catholicismo,
da
fins sinistros, a integridade
reli-
glão de Christo nos primeiros séculos, nSo sabemos co-
mo,
oral,
inconsequentes, recusam
tao
em
cuja
acceitar
a
tradição
observância consistia a belleza dos cha-
mados bellos séculos do Christianismo.
Ao grave testimunho da antiguidade
ecclesiastica^
reune-se o dos concílios, e a voz unisona da egreja universal.
Nihil innoveiur, nisi quod tradUum
em
est
:
é
este
o
que preside a todas as deliberações em Nicea^
preceito
em
Constantinopla,
Epheso, e Calcedonia,
em Roma
e Trento.
A
da Egreja não poderia
constituição
Jesus Christo a
instituirá,
dade divina do ensino
Pois
mente
com
a
que
é a Egreja
privilegiada
que, pelo vinculo da
subsistir,
?
Não
é
uma
assembléa, divina-
a infallibilidade da doutrina,
de propagal-a
mesma
fé,
se
?
Não
é
em
seu
só auctoridade, representante de
Mas
a
Egreja
e
seio,,
abraçam os homens^
se santificam pelo culto, e se colligam submissos a
palavra
qual
existência e auctori-
tradicional.
com
prerogativa
sem a
Deus
uma
?
não é só sociedade divina, por que a
do eterno lhe bafejou a existência. E' por que
185
Divindade de Jesus
Jesus Christo e o Espirito Santo presidem na realidade
do
na intelligencia dos pastores, e de todos os
espirito,
A
seus membros.
tradição é a palavra de
duzida na boca dos que a transmittem
Deus
alumiando o coração dos que a escutam,
Santo,
na-lhes
repro-
e o Espirito
;
illumi-
entendimento para que a razão não repugne
o
aos seus juizos. Negar a tradição é negar a
assimilal-a
Egreja, cuja existência é essencialmente tradicional. Ensinar
transmittir
é
a
verdade de geração
A
pela palavra viva, e não pela letra morta.
S. Paulo, e
não
nae,» e
O
nem
escreveu
fez escrever códi-
seu augusto preceito é
ide,
:
lín-
na intelligencia dás Escripturas.
nem
Jesus Christo
gos legislativos.
geração
palavra que
semelhante á palavra tradição, na
significa ensino, é
gua de
em
e
não aquelles preceitos.
ensinae
O
isto,
ou
:
«ide e ensi-
aquillo, estes, e
novo testamento, posterior ao
um compendio de
dogmas enunciados debaixo da forma imperativa. Os
estabelecimento da religião christã, é
escreveram
evangelistas
sus
muito depois da morte de Je-
Christo, para desmentir as falsidades, que o paga-
nismo, e os fariseus disseminaram. As epistolas eram
uma
substituição ao
ensino
podiam exercitar de viva
suas egrejas.
nem
entrou
tianisrno.
tivesse
E'
evidente,
oral,
pois,
cSe o Christianismo — diz de Maisíre — n^o-
soffrido
ataques, nunca seria forçoso recorrer á
mas nunca
o
dogma
se-
determinado pela Escriptura, se não existisse ante-
riormente
A
que a Escriptura não
sequer integralmente na fundação do Chris-
Escriptura para fixar o dogma;
ria
que os apóstolos não
por estarem longe das
voz,
fé,
no seu estado natural, que é ã pa/avra ..
se a opposição sophistica a não forçasse a ser es-
cripta,
seria
mil vezes mais angélica.
A
fé
chora sobre
1^^
Divindade de Jesus
essas decisões
ziram
que a
revolta lhe arrancou, e
desgraças sempre...
que produ-
o estado de guerra levan-
tou essas
veneráveis muralhas em torno da verdade
defendem-na, por certo mas occultam-na tornam-na
:
;
inaccessivel
Ah
!
humano em
segue o
se
mas,
;
não era
tude,
íNunca
sociedade
de está
possível
e
constituição,
collecção de
mesmo, menos
accessivel.
Reunir o género
!
seus braços, era esta a sua vontade
gravar-se
(i)
artigos
isso
o que ella queria
isto
illustre escriptor
uma
poderia
por
;
leis
civil
«O homem
nenhuma
!»
Pro-
nao pode fazer-
constituição legitima
em
caracteres legíveis na sua ampli-
foi
nem
será escripto à priori
uma
fundamentaes, que devam constituir a
ou
Somente quando a sociedasem que possa dizer-se como, é
religiosa.
constituída,
fazer
:
declarar
particulares;
ou explicar por escripto certos
mas quasi sempre
taes declarações
são effeitos ou causa de grandíssimos males, e sempre
custam aos povos mais do que valem.»
(2)
Se bem que o Conde de Maistre exceptua d'esta
re-
gra geral a legislação de Moysés, inalterável e pura du-
rante quinze séculos, a legislação de Moysés confirma
rigorosamente a regra geral. Por quanto, ao lado doesse
código
civil, religioso,
e militar,
emanação
divina, func-
ciona a tradição, que rege os tribunaes encarregados de
explicar os
plical-a
em
sentidos obscuros da
casos reservados.
lei,
e os meios de ap-
«Nenhuma
instituição, ver-
dadeiramente grande— diz um theologo francez— embora
seja divina, poderia fundar-se na simples escriptura,
porquanto, a não degenerar a natureza das cousas,
(i)
«Principio gerador das Const.» T. 17."
T. 27.** pag. 39.
(2) Ibid.
— pag.
22.
nem
187
Divindade de Jesus
homem
Deus nem
o
a
virtude que eila n3o tem; será sempre letra
vida,
e
poderiam communicar á escriptura
morta, e palavra muda.»
O
sem
Christianismo,
a tradição, seria forçosamente
no século V semelhante ao século
idêntico, e estacionário
como nos
e no século
I,
primeiros.
consiste na harmonia das suas formas
com
com
A
XIX
sua vida
os tempos e
os logares.
A
multiplicidade de
dade d*uma
leis
instituição.
escriptas denuncia a fragili-
^Pesshnce
reipublicce,
plurimce
leges»—à.m2i Tácito. E Platão, por estas palavras, que,
um
segundo
illustre
humano
canonista, são o prefacio
do Evangelho^ parecia responder, christãmente inspirado,
aos que recusam confiar o espirito religioso ás tradições
oraes
:
«O homem
que deve toda a sua instrucção á
tem de sabedoria mais que as apparena palavra é para a escriptura o que um homem é
Escriptura, não
cias
:
para o Seu
A
retrato.
nossos olhos apresentam-se-nos
como vivas as obras da pintura mas, interrogadas,
guardam silencio com dignidade. Tal é a Escriptura. In;
terrogae-a;
dar-vos-ha sempre
cação.
por isso
E'
uma
só e
que todo o discurso
vulga entre sábios e ignorantes,
elle
mesma
signifi-
escripto se di-
não sabe o que
ha de dizer a uns nem occultar a outros. Atacado e
sultado
sem
se, e carece
feza.
elle
.
.
razão,
sempre de seu auctor ausente para sua de-
Mas, se o mesmo discurso é
parece legitimo,
como
seio de seu pae!...
fallado,
que tem a s«a
revelar
a
como nos
sáe mais possante e corajoso do
que se
Fallo do discurso vivo,
va com a sciencia na alma do discípulo;
vra,
in-
não pôde responder, nem defender-
defeza, e
falo
gra-
da pala-
que sabe o que convém
uns e esconder a outros... d'aquelle Verj^^
188
Divindade de Jesus
vivo e animado, cujo simples retrato é a escriptura.» (i)
Clirysostomo applica á revelação do Salvador
Jo^So
S.
bom
vida,
e
que os
coração
livros
seria
:
preceitos divinos nos estivessem Escriptos
pela
mas,
como
graça,
o estão pela tinta
que perdemos
já
construamos, que assim
pas,
em
;
elle
«sem duque não necessitássemos da Escriptura,
da sabedoria antiga. Diz
os princípios
em
no
nossos
graça por nossas cul-
tal
é forçoso,
uma prancha
vez de iima nau, sem comtudo esquecer que o
pri-
Deus
mitivo estado da
nossa doutrina
nada revelou por
escripto do velho testamento aos pa-
era
o melhor.
triarchas eleitos: fallava-lhes directamente, porque son-
dava a pureza de seus corações; mas, cavado o abysmo
de vicios pelo povo hebreu, foram-lhe necessários
e
leis.
ção,
pois
Santo
:
Em
«E'
necessário fallar.»
revoltada a
vez de
elle
quem
só escripto a
prometteu-lhes o Espi-
livro,
Mas, com
também
um
vos inspirará quando vos for
humanidade contra
moral, foram-lhes
livros
sob o império da nova revela-
que o Christo não deixou
seus apóstolos.
rito
mesmo
Deu-se o
o
decorrer dos tempos,
os
dogmas
e contra a
precisos livros. (2)
Regeitando a tradição, emfim, os protestantes despre-
zam
a essência do Christianismo, e os racionalistas con-
ferem-lhe a
lavra
tes,
mesma
escripta.
importância que lhes merece a pa-
Para que os primeiros sejam consequen-
devem cedo ou
tarde consubstanciar-se no systema
dos segundos.
(i) Plat. in Phaedr. edit.
(2)
Hom.
in
Math. 1,1.
Lugdun, 1590, pag. 356
e 357.
Divindade de Jesus
Que
o seio de
Deus
se abra, e irradie torrentes lu-
minosas sobre todos; chova-nos o orvalho da
madôra.
189
fé reani-
Desça sobre nós o império de Christo. Venha
a nós o vosso Reino, Senhor
FIM
NOTAS
'
DIVINDADE DE JESUS
NOTAS
DIVINDADE DE JESUS
PAG. 70
Voltaire,
o mais ignorante insultador que ainda
Alguns julgadores de Voltaire dizem
«
A'
frente
intolerante
:
de todos está o author do Bssai
37ir les mosurs, obra sarcástica, repleta
de
iti"
a religião do Calvário.
jnrioíi
scepticismo.»
C.
de ignorância a
CanTU.
Hist.
univ,
Introd,
<(.J*étais
trèsdisposé à pardonner a Voltaire la
vaise politique, so?i
quelle
mais.
il
.
.
IGNORANCE,
mau-
et la hardiesse avec la
tronque, défigure, et altere la piupart des faits,
Que
permet quayid
de choses inutiles qu'un historien ne se
il est
manière d*écrire
fort
IGNORANF/» MaBLY. «De
l'histoire.»
i3
la
194
Divindade de Jesus
Poíir plaisenter
«
comine
sur Ezequiel et sur la Genèse
l'a
il fallait
choses qui rendent la plaisenterie
faii
Voltaire
reunir deux
bien misérable ; la
IGNORANCE et la plus déplorable légèBenjamin CONSTANT. Cours de latéraiute fran.
plus profonde
reié.»
çaise.
Esteve o philosopho de Ferney
ça
dos
mesmos que
o egualavam
um
em
secuio na desgrascepticismo. Re-
putavam-no auctoridade indecente para argumentacãa
séria.
Voltaire, n*estes últimos annos, entrou
em
purifi-
camaradagem d'elle a philosophia. As jogralidades do homem que disse: <iÉcrasons
l'infa'me/í> entendem-nas aquelles que acham nebuloso
cação. Já se não peja da
Strauss.
196
Divindade de Jesus
PAG. 97
Barthélemy, insigne collaborador da Encyclopedia Caa
iholica,
este esboço
Messias, acrescenta
:
também é' figurado
o maná do deserto,
a
cobre,
dos personagens figurativos do
«Figurado por pessoas, o Messias
por successos.
a
columna de
O
cordeiro paschal,
fogo, a serpente
de
immolação perpetua do cordeiro do templo, a
maior parte das ceremonias legaes,
os sacrifícios eram
e,
por sobre tudo,
outras tantas figuras permanentes,
que sempre e successivamente iam presignalando o Dedas nações. Quem não vê ahi designio provi-
sejado
dencial, perfeitamente seguido até sua completa realisa-
c3o? Teremos
que muitos
dizer
por
diversos
em
isto
conta d'acaso?
retratos
auctores,
se
do
mesmo
O
mesmo
seria
individuo, tirados
pareciam entre
si
porque o
acaso os fizera similhantes. Além de que, a própria Escriptura nos adverte
e a
^a
em tempos
como
rodo,
que é necessário ver Jesus Christo
egreja sob o véo das antigas sombras, e que,
anteriores ao Messias, tudo acontecia figu.
diz
S.
Paulo.
Ponderam os padres que o
novo testamento é a rosa desabrochada, e o velho o
botão.
dito
No
dizer
de Santo Agostinho, o novo está recôn-
no velho testamento, e o povo judeu é
ingente propheta.»
um como
196
Uivindade de Jesus
PAG. iio
o i^ermão da montanlia.
l>ci»de
.
Fragmentos do sublime discurso de Jesus Christo
«Bem-aventurados os pobres de
les
espirito por
que é
:
d'el-
o reino dos céos.
«Bem-aventurados os limpos de coração, que hão de
vêr a Deus.
que padecem perseguição por
que é d'elies o reino do céo.
«Nao cuideis que eu vim a derrogar a lei ou os prophetas: nSo vim derrogal-os, vim a dar-lhes cumpri«Bem-aventurados
amor da
os
justiça, por
mento.
«Por que, em verda<je, vos digo que
céo e
retn
terra, nãío
sem que tudo
e
como
em quanto
um só i,
lei
existi-
ou
tíl^
seja cumprido.
mandamen-
que
violar o
menor
induzir os
homens
a transgredil-os, será visto
«Aquelle,
tos,
passará da
pois,
doestes
ultimo no reino dos céos;
o
mas
o que isto
fi-
zer e ensinar será o grande no reino do céo.
«Dai a todos que vos pedirem.
«Não
repulseis
«Tratai os
«Sabeis que
reis
quem
vos pede de empréstimo.
homens como
foi dito
:
:
fazei
o
«Amareis vosso próximo, e odia-
Mas eu vos
bem aos que
vosso inimigo.»
inimigos
quereríeis ser tratados.
digo
:
«Amai vossos
vos aborrecem
:
orai
197
Divindade de Jesus
aquelles
por
de que
que
que vos perseguem e calumniam, afim
de vosso Pai que está ro céo,
sejais os filhos
levantar o seu sol sobre bons e máos, e dá
faz
chuva a
justos e a peccadores.
«Por que se amais apenas os que vos amam, que
compensa haveis de
também
o
mesmo
ter
re-
nSo fazem os publicanos
?
?
«Fazei a todos bem, e sereis os filhos de Deus, que é
bom
para os ingratos, e para os máos.
«Sede,
pois,
de misericórdia, como vosso Pai é
cheios
cheio de misericórdia.
«Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos
homens, com o fim de serdes visto por
elles
:
de ou-
nSo vol-as recompensará vosso Pai que está
tra sorte
nos céos.
«Quando,
pois,
dás a esmola
trombeta, que vai
honrados dos homens.
como praticam
os
Em
verdade vos digo, que
el-
receberam a sua recompensa.
«E quando
tas,
ti,
e nas praças para serem
hypocritas nas synagogas,
les já
nao o faças ao som da
adiante de
fazeis
oração, n2o sejais
que gostam de
orar
em
como
os hypocri-
pé nas synagogas, e
rw)s
cantos das ruas, para serem vistos dos homens. Etn
verdade vos digo, que
elles já
receberam a sua
re-
compensa.
«Guardai-vos dos falsos prophetas, que
vosco, cobertos de pelles de ovelhas,
vem
ter
quando
com-
elles in-
teriormente sao lobos arrebatadores.
«Pelos fructos é que os haveis de conhecer. Por ventura
colhe alguém
uvas dos espinheiros, ou figos dos
abrolhos?
«Nem
todo o que
me
diz
:
«Senhor
!
Senhor
!»
ha de
i^8
Divindade de Jesus
entrar
no reino dos céos
vontade de meu
«Todo
aquelle, pois,
observa,
será
mas
;
aquelle
que
fizer
a
Pai.
que ouve as minhas palavras, e as
comparado ao homem sábio que
cou a sua casa sobre rocha
;
veio a
chuva
e
edifi-
vieram
as innundações, e assopraram os ventos contra aquella
casa; e ella nSo cahiu, por
que estava fundada sobre
rocha.
45
E todo o que ouve minhas palavras e as nSo observa,
será comparado ao homem sem consideração, que edificou a sua casa sobre areia; veio a chuva, e vieram
as innundaçtíes, e assopraram os ventos contra aquella
casa; e ella cahiu, e foi grande a sua ruina.»
Jesus disse ainda muitas outras coisas, e os que o
ouviram pasmaram extáticos.
«Quem é este homem ?» — perguntavam elles,
Este homem era o Salvador do mundo, o Verbo
Deus
descido á terra,
destino.
Uma
para revelar aos
homens
de
o aeu
nova era surgia para a humanidade, quan-
do Jesus principiava sua
celestial missão.
199
Divindade de Jesus
Trasladamos da Vida de Nosso Senhor Jesus Christo
Luiz Veuillot, a magnifica conclusão d'aquelle livro
de
que primou entre quantas obras
Renan
a impugnar
sahiram
d^alto quilate
:
«Jesus Christo é o Filho único do Deus único. E' o
poder, a sabedoria, e explendor increado do Increado. E'
Deus da
Fai,
terra e céo. Rei eterno,
formando
um
só
com
elle
omnipotente como sèu
na
indivisível Trinda-
Por mysterio que excede o entendimento e satisfaz
de.
a
e
razão,
deu.
Deus
o
ha dado á
terra, e,
dando-o, a
Homem,
Este Jesus, dado assim, é Filho do
si
se
e
fi-
e Deus a um tempo homem
Deus para cumprir e rematar a lei
homem para servir, Deus para redemir homem para
abater-se debaixo do jugo, Deus para vencer; homem
para morrer. Deus para triumphar da morte. E maravilha tal é esta que os olhos de nossa alma podem vêr a
divindade atravez da humanidade, o poder que creou o
lho
de
Deus
:
nascido sob a
homem
:
lei.
;
mundo
e venceu o inferno atravez da infermidade
a injustiça
humana
divino composto de duas naturezas
divina, outra
que
um ser
mui diversas uma
que Jesus é
crucificou. Por
:
humana; uma increada, outra creada; uma
eterna, outra temporal. A(\ediante esta miraculosa opera-
rão,
a divindade está no
homem,
e o
homem
subsiste
«m Deus; homem e Deus se enlaçam assiduamente
em Jesus Christo. Nasceu Jesus mas d'uma virgem
ahi está uma criancinha pobre sobre um emprestado
;
;
berço; mas uma estrella a annuncía, os anjos a saúdam
com um cantar, que em breves termos encerra toda a
sabedoria; os sanctos o bem-dizem, adoram-n'o os prín-
cipes da sciencia, os tyrannos assustam-se. Foge;
mas
200
Divindade de Jesus
escoltado de
guarda. Vai humilde,
invisivel
rano senhor do universo. Vive infermo;
guarece os infermos,
palavra
nrras sobi^*
mas com sua
reviventa os mortos, ex-
pulsa os demónios, retém a seiva das plantas, dá ordens
mas obriga o mar a pamas á hora predicta, e conExpira; mas o centuriao .reconhe-
açs elementos. Paga o tributo;
gar-lh'o.
Padece na cruz
forme seu desígnio.
ce-o
;
no madeiro infamante
como
morre, assim
Magos o haviam reconhecido no presepe onde
pastores e
nascera.
em que
sepultado,
E*
e
descola
a
pedra sepulcral, e
surge vivo.
E'
Deus
homem
E'
?
e misérias, são próprias
?
Taes quebrantos, soffrimentos
d'um Deus
?
E
taes maravilhas
homem ? Nem homem nem Deus
em alguma das hypotheses. TSo inti-
sSo próprias d'um]
está 3Ó de per
mamente
si
identificou
Jesus sua divindade e humanida-
de que nao ha ahi scisSo comprehensivel. Se
nSío
é
Deus, redunda meramente n'um impostor; se nSo é ho-
mem,
a obra de
propriamente
Deus nao
se entende, e a divindade
fica desluzida.
Só Deus explica o homem, e só o
Jesus,
em
tudo sempre Homem-Deus.
homem explica o
No Homem-Deus
é tudo lógico e congruente, simultaneamente
vindade.
Em
O
papa
repugna; a cada passo a confunde,,
lhe faz espanto.
Hormisdas, compendiando o ensinamento
S.
S.
a di-
tudo transcende a raz3o humana, e em:
nenhum ponto lhe
e em caso nenhum
do papa
com
Leão,
explicação do
dá a
um
imperador esta excellente
mysterio das duas naturezas
em Jesus
Christo
«Deus
é Trindade, isto é, Padre, e Filho, e Espirito
Santo; todavia,
Deus
é um.
Ora
escuta Israel :
O
Se-
IHmndade
20
de Jesus
nhor teu Deus é o Deus uno. Outra qualquer doutrina^
ou separa a divindade
e admitte a insana
ou attribue o
polytheismo,
Trindade, e presuppõe
dôr
impiedade da
soffrimento á essência da
na impassivel natureza
di-
vina.
A Trindade
santa é
nâo multiplica,
se
nem
mo,
se divide,
humanas
só Deus,
que numericamente
nem d'algum modo
recebe accresci-
Nao emprehendamos
sujeitar ás leis
as profundezas d'aquelle mysterio da substaninaccessivel
eterna,
cia
um
Adoremos a
invisiveis.
mais elevada das naturezas
á
incomprehensivel
e
ineffavel
substancia da Trindade, Padre, Filho, e Espirito Santo,
cuja distincfão subsiste na indivisibilidade, cuja unida-
de repugna á divisSo dá essência, bem que as pessoas
numerem;
se
distinctivo,
e saibamos conferir a
cada pessoa o seu
nSo tirando a nenhuma sua divindade,
á Essência o
attribuindo
que é
nem
d'uma ou d'ou-
próprio
tra.
Deus
Pai,
de indivisa
:
Deus
Filho,
Deus
Espirito Santo, Trinda-
incomprehensivel mysterio
!
Sem embargo,
sabemos que é da essência do Pai gerar o
essência
Pai; e
Filho; e
da
do Filho de Deus nascer do Pai, e egual ao
da essência do Espirito Santo proceder do Pai e
do Filho na unidade d'uma idêntica substancia. Tam-
bém
é
pto
que,
:
da essência do Filho de Deus o que está
nos
escri-
últimos tempos o Verbo se fez carne e
habitou entre nós.
Pelo que,
nas entranhas da Santa
Virgem Maria, virgem mae de Deus, as duas naturezas
se
haviam unido sem se confundirem. Aquelle que, an-
terior
ao tempo,
já era o Filho
de Deus,
do homem. Nascia, no tempo, de
demais homens; mas sem
abrir
mSíe,
fazia-se filho
consoante os
o seio maternal,
nem
Dwmdade
202
desluzir-ihe a santíssima
e,
de Je^vê
perfeitissima virgindade
mys-
;
sobremaneira digno do nascimento d'um Deus
terio
cujo concebimento se fizera
Aquelie,
sem intervenção
do homem, e guardava o que recebera do Pai
ófferecendo aos
olhos
dos
celestial,
homens o que recebera de
sua mãe bemdita, como nasceria senão preservado de
toda a macula
humana
?
Estava no presepe, e ao
mesmo tempo no
céo
;
ado
ravam-no, envolto nas mantilhas, as legiSes celestiaes,
Menino ainda, ensinava doutrina sobre-humana, e revê
seu
lava
mem
poder
um
a
com
Deus e ho
por qualquer união, mas po:
o filho de Deus, Deus e ho
divinos prodígios. Era
tempo, não
já
mesmo era de si
mem^ que o mesmo importa
que
elle
dizer: força e fraqueza,
humildade e magestade; vendido e redemptor
do e
liberaiisador
do reino do
;
crucifica-
céo;. revestido
de nossa
infermidade ao extremo de receber a morte
;
possessor do
poder divino ao extremo de readquirir a vida. Pois que
elle
quizera nascer
homem,
foi
sepultado; e por
igualar-se a seu Pai, ergueu-se da sepultura.
se
um
que quiz
Como
fos-
entre os mortos, reanimou os que eram cinza no
tumulo, e sem deixar o seio de seu Pai, desceu ao
in-
commum
de
ferno
:
entregando a alma, segundo
a
lei
todos os homens, retomou-a de sua força divina.
E'
isto
o
que assim o
que nos ensina e
fez.
Como
certifica aquelie
mesmo
não quizesse que o espectáculo
dos soffrimentos de seu corpo nos induzisse a crer que
elle
não era Deus,
nem
quizesse
também que
o explen-
dôr de seus milagres nos induzisse a pensar que
elle era
somente Deus e não homem, instruiu-nos com o diverso
comportamento de dois dos apóstolos. «A
fé
de Pedro nos
ensina que Jesus Christo Nosso Senhor é Deus; a du-
Jmus
jyivindoàe de
vida
203
Thomaz, que é homem. Quando pergunta a
de
seus discípulos o que dizem d'elle os homens^ provoca
a resposta de Pedro: Sois o Christo^ filho do Deus vivo,
E o louvor dado
accende
inspirou,
velam.
o
a
em
que o Deus Padre
estas palavras,
nós a fé na verdade que ellas re-
Por igual theor, quando, depois da resurreicSo,
Senhor apparece aos apóstolos, porque está Thomaz
ausente e depois duvida
?
E'
para que o
mundo
creia
o que o discípulo incrédulo verificou, e que a universalidaide
dos
possa conhecer
fieis
quem
testemunho d'um a quem
diante o
lhe tocasse
era Jesus,
ordenou que
elle
com suas mãos. Sendo que
o aífectuoso Sal-
vador n3o evidenciou tanto a incredulidade de
para confusão do santo apostolo,
Com
da posteridade.
o
mesmo
elJes.
Haviam
Thomaz
como para instrucçao
propósito se reuniu o
§enhor aos dois discipulos que iam para
conversou com
me-
elles
Emmaus
e
sabido da resurrei-
ção pelo aviso das santas mulheres, e nao obstante du-
vidavam.
phetas>
interpretando Moysés e todos os pro-
Jesus,
lhes
mostrou que ao Christo cumpria soffrer
para entrar na sua gloria; e estabeleceu,
plicados testemunhos dos
livros
santos,
com
os multi-
que em
si
se
compadecem ao mesmo tempo duas naturezas, a humana que testifica a paixSo, a divina que revela a
gloria.
Nos desígnios de Jesus Christo sobre o mundo, o
mesmo
mysterio se manifesta
com
a
mesma
apparencia
de opposição entre os desígnios e os meios que empre-
ga
para cumpril-os.
Quer cimentar
sobre a terra o império
em
lucta
a forca; tem a força nas suas mSos, e quebrou-a.
attrahir
a
si
o
mundo, e ensina o
com
Quer
contrario de tudo o
204
JJiinndade de Jesus
que o mundo quer: propõe a humildade,
çao, a cruz. Chama-se o Crucificado. Lega
rantes,
como herança,
apresentarem
triumpham.
aquella cruz; encarrega-os de a
humano: cumprem-no elles e
cumprem em menos tempo que o
género
ao
E
a renunciaa doze igno-
isto
ao mais poderoso império para abafar a na-
necessário
cionalidade
d'uma nação conquistada. Baquêam os
Ído-
uma nova humanidade. A palavra de Jesus
opera um tal milagre. Esta palavra que elle deu
surge
los,
sósinha
nSo entendei'am,
aos apóstolos, e ao pronuncial-a lh'a
palavra que revoltou os judeus e que ainda revol-
esta
homem, é, sem embargo, como
denominam, a palavra de reconciliação
ta o instincto de todo o
os apóstolos a
que tudo repõe em paz
o homem com
sociedade, em
o
e ordem, o
homem com Deus,
homem
comsigo mesmo. iNa
homem,
o
espirites e corações,
tudo
ella
muda,
to-
das as trevas illumina, todas as esterilidades fecunda.
Por
o judeu estupefacto vê claramente asescriptu-
ella,
ras cujas profundezas
assombravam sua
pag3ío foge do labyrintho
em que
intelligencia,
o
o sophisma lhe devo-
rava a razão.
Que
que
vida,
christãos!
luz,
homem
Já o
e
que
alegria já nos primeiros
sabe onde vai, sente-se senhor
de seu caminho e seguro de seu destino. A palavra do
do
homem um homem o Verbo encarhomem um Deus, deu-lhe parte na natu'
reza divina.
Esta sublime phrase é de S. Pedro: e a
Creador
nado
fizera
fez
do
;
comprehendeu-a,— o homem que ado-
homem
creu-a e
rava
o
fetichismo
onde
elle sobe, torna-se
de
e
os imperadores
!
E n'esta aUura
humilde e manso
;
e a faculda-
sublime da adoração, até ahi tão deploravelmente
206
JHvindade de Jesus
degenerada, desenvolve-se conforme seu natural, e co-
I
roa a terra do radioso floreei mento dos santos.
Contrariam-nos que, não obstante, resta ainda mun-
do que converter.
Com
prazer homicida, nos mostram,
pelo contrario, as separações
^
E'
e
certo;
Subsiste o
— diz
Deus nSo
livre
Santo
que
se fazem e se perdem.
faz aquillo qiie
arbitrio.
Agostinho
não quiz
fazer.
Aquelle que te creou sem
— não
te
salvará
sem
ti.
ti,
Não
queres salvar-te, não queres ajudar Jesus Christo na
obra da tua salvação, não serás salvo
A
mem
uma
fazer
e estúpido, não deve pensar
se de o
O
liber-
homem tem
de
mas não pode dispensarexercitar. Escolhe entre o bem e o mal, entre o
inferno. Não ha abstenção possível: abster-se é
livre arbitrio, e
céo e o
livre arbitrio
dignidade divina, ao denominal-a
Só Deus possue a liberdade.
dade.
seu o
morrerás.
que escolha. NMsso redunda aquelle
que o homem, orgulhoso
em
:
pode dar-se no céo e no inferno: o ho-
adoração
muito
é;
escolher.
Esta
livre
escolha,
deixada á vontade do individuo,
ás vezes é proposta á humanidade toda.
Deus
a
Um
decreto de
constrange a decidir-se entre Jesus e Barab-
bás.
A
civilisação
moderna derivada da divindade de Je-
sus Christo, está a braços
com uma
d'aquellas temero-
sas crises. Inclinou-se a favor de Barâbbás, escuta vo-
luntariamente as vozes a bradarem que repulse Jesus
Se Jesus Christo
Christo.
nós
é
repulsado,
que será de
?
Tirar
Jesus Christo
do
mundo
é impossível. Guar-
Pôde elle permittir
que o baixem do throno e o repreguem na cruz? Ora,
da-o vivo
propriamente o tumulo.
200
Divindade de Jesus
Deus e
humano não quer tanto arrancar a coroa aos reis como dar-lhe o triregno das três concupiscências, a tiara de Satanaz. Quando Jesus Christo voitar ao Calvário voltará Tibério a Caprea, e o Deus Tio espirito que medita este grande crime contra
contra
o género
bério terá outra vez templos.
Esta divindade, porém, terá
de viver até
ja
lá;
viverá, e a
Os
hora, e a Egreja
ha
ordem
gerai
da redempçSo será mantida.
segredos da misericórdia de Christo s3o insondáveis
como
os segredos do seu poder.
tencer a
do
uma
e ainda no trajecto d'essa hora, a Egre-
Tudo
o que deve per-
Christo lhe pertencerá. Até á hora derradeira
mundo
redempc3o.
humano todo ha de aproveitar a
como aquella torrente de fogo liqui-
o género
E' ella
do que parte das plagas do
sol
e atravessa as aguas do
mar em sua immensa extensão. E' certo que todo o
mar se n3o aquece, algumas regiões ficam geladas; mas,
se aquella torrente bemfazeja não existisse, tudo seria
gelo
e
morte.
quer que
E'
existe
esse calor que sustenta a vida onde
alguma vida e lá onde ella é mais
;
abundante, ahi é maior o arrojo e continuamente se realisam
tas
conquistas sobre a morte
onde
vida.
n-ão
;
e não ha regiões mor-,
penetrem os moradores das regiões da
Credo!»
FIM DAS NOTAS
índice
Carta
5
»
7
» ao
senhor Visconde d' Azevedo
Prefacio
A
razAo do
37
67
homem
interprete dos actos de Jesus
Prophecias
73
87
Jesus
101
Discípulos, apóstolos e martyres
117
Conclusão
13$
Tradição apostólica
145
Notas á divindade de Jesus
193
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