Superior Tribunal de Justiça

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Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.424.164 - SC (2013/0403187-8)
RELATOR
RECORRENTE
ADVOGADOS
RECORRIDO
ADVOGADO
INTERES.
ADVOGADO
INTERES.
ADVOGADO
: MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
: UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA
: DENISE DE CASSIA ZILIO
FLÁVIO AUGUSTO BOREGGIO MELARA
ORLANDO KNOP JÚNIOR E OUTRO(S)
: HENRIQUE KLOCH E OUTROS
: HENRIQUE KLOCH (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS
: SUPERMERCADOS VITÓRIA LTDA
: ANTONIO CARLOS MOMM E OUTRO(S)
: ARISCO INDUSTRIAL LTDA
: JOSÉ MARCELO BRAGA NASCIMENTO E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:
Trata-se de ação indenizatória de danos materiais e morais movida por HENRIQUE
KLOCH, sua esposa e filha menor em desfavor de ARISCO INDUSTRIAL LTDA. - DIVISÃO
COLOMBO, posteriormente sucedida pela ora recorrente, UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL
LTDA., e de SUPERMERCADO VITÓRIA LTDA., em razão da venda e consumo do produto
"Creme de arroz Colombo" contaminado com insetos vivos, larvas e fragmentos de insetos.
Alegaram que o referido produto havia sido receitado por uma médica para
complementar a dieta da filha do casal, então com 1 ano e 4 meses. Como a menor foi acometida
de infecção intestinal aguda, a médica suspeitou de intoxicação alimentar, quando, então, foi
constatada a contaminação do referido produto, confirmada por laudo do órgão oficial de
vigilância sanitária do Estado, inclusive nas embalagens ainda fechadas e expostas à venda no
supermercado. Além do dano moral, alegaram ter assumido despesas imprevistas com o
tratamento da menor, bem como ter sido reduzida a carga horária de trabalho da mãe para poder
acompanhar a filha, implicando o decréscimo na renda familiar. Pugnaram pelo ressarcimento
dos danos materiais e morais.
Em contestação, a ora recorrente suscitou as excludentes do § 3º, II e III, do art. 12 e
do inciso III do art. 13 do CDC. Descreveu seu processo produtivo, apto a eliminar qualquer
contaminação do produto, e sustentou que o vício provavelmente decorria do armazenamento
inadequado nos distribuidores ou na casa dos autores. Esclareceu que, se o produto fosse
armazenado de forma indevida, mesmo as embalagens fechadas poderiam ser contaminadas.
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Questionou a ausência de prova do nexo de causalidade entre o produto contaminado e os danos
sofridos.
O segundo réu defendeu a responsabilidade exclusiva da fabricante.
No curso da demanda, os autores relataram fato novo, consubstanciado na perda
auditiva da menor, decorrente do uso do antibiótico prescrito para combater a enfermidade do
aparelho digestivo provocada pela ingestão do produto deteriorado e readequaram os pleitos.
A
sentença
julgou
procedentes
os
pedidos,
condenando
as
requeridas,
solidariamente, ao pagamento de indenização aos autores na seguinte proporção: (a) à menor, no
montante de R$ 900.000,00 pelos danos morais (R$ 300.000,00 pela intoxicação alimentar e R$
600.000,00 pela perda auditiva), além de R$ 1.100,00 a título de pensão mensal, no período de
18 a 60 anos, totalizando R$ 554.400,00; (b) ao pai, no valor comprovado das despesas com o
tratamento, a ser apurado em liquidação de sentença, mais R$ 300.000,00 pelo dano moral; e (c)
à mãe, nos lucros cessantes decorrentes da redução de sua carga horária de trabalho no período
necessário para acompanhar o tratamento da filha, a ser apurado em liquidação de sentença, mais
R$ 300.000,00 pelo dano moral. Determinou a incidência de correção monetária e juros
moratórios a partir de cada desembolso, quanto aos danos patrimoniais a serem ressarcidos; a
partir do evento danoso, no que concerne aos lucros cessantes; a contar da sentença, no tocante
aos danos morais. Foram ainda imputados às requeridas as custas processuais e honorários, estes
arbitrados em 10% sobre o valor da condenação.
Todas as partes recorreram, tendo o Tribunal de origem desprovido o apelo da ora
recorrente, acolhido totalmente o recurso do segundo requerido e dado parcial provimento à
apelação dos autores. O julgado recebeu a seguinte ementa:
"APELAÇÕES CÍVEIS. CREME DE ARROZ DESTINADO À
COMPLEMENTAÇÃO DA ALIMENTAÇÃO INFANTIL, CONTAMINADO COM
INSETOS VIVOS, LARVAS E FRAGMENTOS DE INSETOS. BEBÊ DE APENAS
UM ANO E QUATRO MESES QUE, APÓS CONSUMIR O ALIMENTO, É
ACOMETIDO
DE
INFECÇÃO
GASTROINTESTINAL
GRAVE
E
PROGRESSIVA, VINDO A SOFRER DE DESNUTRIÇÃO E DESIDRATAÇÃO,
ENFRENTANDO SITUAÇÃO DE IMINÊNCIA DE MORTE. PRESCRIÇÃO DE
ANTIBIÓTICO AGRESSIVO, QUE ACARRETA PERDA DA AUDIÇÃO.
SENTENÇA QUE CONDENA SOLIDARIAMENTE FABRICANTE E
COMERCIANTE DO PRODUTO AO RESSARCIMENTO DOS DANOS
MATERIAIS E MORAIS À VÍTIMA DIRETA DO EVENTO E A SEUS PAIS,
ALÉM DE PENSÃO MENSAL ÀQUELA, ATÉ OS SEUS SESSENTA ANOS, POR
SUA EVIDENTE DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE DE TRABALHO.
RECURSOS CONHECIDOS, SENDO O DA PRIMEIRA RÉ DESPROVIDO, O DA
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SEGUNDA RÉ PROVIDO E PARCIALMENTE PROVIDO O ADESIVO.
1. A responsabilidade do comerciante pelo fato do produto é subsidiária sendo,
in casu, descabida, a teor do art. 13 do CDC.
2. Tem-se na teoria da causalidade adequada o substrato capaz de antecipar o
marco extremo da responsabilidade do agente pelo dano suportado pelo lesado.
Assim, se o fabricante é responsável pelo defeito do produto, causador da
doença - infecção gastrointestinal, responsável também será pela superveniente
deficiência auditiva, ocasionada pelo medicamento ingerido a fim de dominar referida
condição médica, pois a relação de causalidade restará demonstrada sempre que 'não
se possa considerar o dano como consequência extraordinária, indiferente ao fato
atribuído ao indigitado responsável'. (NORONHA, Fernando. Direito das
Obrigações. V.1. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 611).
3. A confiança no produto, sua tradição e ampla indicação como complemento
à dieta infantil, aliado ao bom nome da empresa no mercado de consumo nacional são
fatores determinantes ao patamar atingido na condenação do fabricante pelo defeito
no produto.
4. No arbitramento dos danos extrapatrimoniais suportados pela menor, tem-se
tanto o dano corporal, traduzido na violência contra sua integridade física,
acarretando-lhe a perda da função auditiva, como o dano moral em sentido estrito,
consubstanciado no sofrimento, na dor, na frustração, no medo, na aflição, tanto
sentida na época em que a doença encontrava-se em sua fase aguda, como também a
que se sujeitará no futuro, sempre que imaginar que nascera perfeita e em razão de um
alimento estragado perdeu a capacidade de interagir e conhecer, de forma integral, o
mundo que a cerca.
5. O valor arbitrado a título de dano moral obedece aos princípios da
razoabilidade e proporcionalidade, além do caráter compensatório, punitivo e
pedagógico. Patamar consentâneo aos valores jurídico-constitucionais em jogo.
6. A pensão mensal decorrente de acidente de consumo que diminui a
capacidade laboral da vítima deve ser vitalícia, uma vez que não se pode presumir
nenhuma melhora do problema auditivo com o avançar da idade da lesada.
7. Cabível a pretensão de constituição de capital para a garantia da obrigação
alimentar até o seu termo final. Inteligência do art. 475-Q do CPC."
A UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA. ofereceu embargos de declaração,
apontando omissões, contradições e obscuridades no julgado, como também para fins de
prequestionamento. Os aclaratórios foram rejeitados.
Sobreveio a interposição do presente recurso especial, com amparo em ambas as
alíneas do permissivo constitucional. Sustenta a recorrente vulneração dos arts. 135, V, 138, §
1º, c/c o art. 304 e seguintes do CPC, em razão da suspeição e parcialidade da magistrada
prolatora da sentença, cujo marido é primo do advogado dos autores, a quem os autos foram
redistribuídos após 8 anos de trâmite processual e quando já designada audiência de instrução e
julgamento, que acabou não sendo realizada em face do julgamento antecipado da lide pela
juíza. Aduz contrariados os arts. 128 e 460 do CPC em razão de julgamento ultra petita. Alega
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nulidade do julgamento das apelações em virtude do impedimento do presidente da 6ª Câmara
Cível, somente anunciado no momento em que feito o pregão. Quanto ao mérito, argumentando
serem suficientes para o deslinde da controvérsia a revaloração das provas e a constatação da
ausência de nexo de causalidade referidas no voto vencido, aponta violado o art. 12, § 3º, II e III,
do CDC, uma vez que o antibiótico que provocou a surdez da menor foi receitado para combater
uma bactéria não encontrada no produto da recorrente e por estar corroborado que a
contaminação do produto ocorreu após a abertura da embalagem, configurando a culpa exclusiva
do consumidor ou de terceiros, tudo a implicar a improcedência dos pedidos. Caso mantida sua
obrigação de indenizar, pugna pela redução dos valores arbitrados na origem, por ofensa aos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e por infringência aos arts. 403, 944 e 945 do
Código Civil, além da observância do termo inicial da correção monetária, conforme preceitua a
Súmula n. 362 do STJ. Ademais, afirma violado o art. 475-Q, § 2º, do CPC porquanto estaria
preclusa a determinação de constituição de capital para pagamento da pensão. Colaciona
dissenso jurisprudencial concernente ao montante dos danos morais e à constituição de capital
para pagamento da pensão.
Foi interposto também recurso extraordinário, com alegação de afronta ao art. 5º,
XXXV, XXXVII, LIII, LIV e LV, da Constituição Federal.
Após o transcurso in albis do prazo para contrarrazões, apenas o recurso especial foi
admitido.
Houve a interposição de agravo em recurso extraordinário, devidamente
contraminutado.
É o relatório.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.424.164 - SC (2013/0403187-8)
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE
CONSUMO.
ALIMENTO
INFANTIL
CONTAMINADO.
INFECÇÃO
GASTROINTESTINAL
SEVERA.
PRESCRIÇÃO
DE
ANTIBIÓTICO
AGRESSIVO. PERDA AUDITIVA. DANOS MATERIAIS E MORAIS DEVIDOS
AOS PAIS E À MENOR. SUSPEIÇÃO DA JUÍZA. PARENTESCO ENTRE SEU
CÔNJUGE E O ADVOGADO DA PARTE. HIPÓTESE NÃO PREVISTA EM LEI.
INTERESSE NA CAUSA NÃO COMPROVADO. IMPEDIMENTO DO
PRESIDENTE DA CÂMARA JULGADORA ANUNCIADO NO INÍCIO DO
JULGAMENTO. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA N.
284/STF. JULGAMENTO ULTRA PETITA . OCORRÊNCIA EM RELAÇÃO À
PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. NEXO DE CAUSALIDADE. TESE
AMPARADA EXCLUSIVAMENTE NO VOTO VENCIDO. INCIDÊNCIA DAS
SÚMULAS N. 7 E 320 DO STJ. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. EXCESSO
CONFIGURADO. REDUÇÃO.
1. O parentesco existente entre o cônjuge do magistrado e o advogado da parte
não encontra previsão no art. 135 do CPC, cujas hipóteses devem ser interpretadas
de forma restritiva.
2. Para o acolhimento de suspeição fundada no inciso V do art. 135 do CPC, é
necessária prova induvidosa da aventada parcialidade do juiz, não servindo a tanto a
mera circunstância de ter havido julgamento antecipado da lide e o vulto da
condenação.
3. A ausência de indicação do dispositivo legal supostamente violado
caracteriza deficiência na fundamentação do recurso especial, atraindo a incidência
da Súmula n. 284 do STF.
4. Segundo a jurisprudência do STJ, o pedido deve ser extraído a partir de uma
interpretação lógico-sistemática de todo o conteúdo da petição inicial, não se
limitando ao tópico específico referente aos pedidos. Todavia, esse entendimento
requer cautela em sua aplicação, de modo que o julgador não resvale para a
discricionariedade. Ainda que os fatos narrados comportem pedido de pensão, não
pode o juiz, à míngua de qualquer pedido ou cogitação tendente a exigi-la,
considerá-la, de ofício, implícita no pedido de ressarcimento de danos materiais.
5. A ausência do nexo de causalidade deduzida com base em tese
exclusivamente tratada no voto vencido não logra conhecimento no âmbito do
recurso especial, a teor do contido na Súmula n. 320 do STJ. O reconhecimento do
nexo causal pelo voto vencedor com amparo nas circunstâncias fáticas da causa não
pode ser revisto sem o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que encontra
óbice na Súmula n. 7 do STJ.
6. O quantum indenizatório fixado na instância ordinária submete-se ao
controle do Superior Tribunal de Justiça na hipótese em que o valor da condenação
seja irrisório ou exorbitante, distanciando-se, assim, das finalidades legais.
7. Reduz-se a indenização deferida à consumidora menor para R$ 300.000,00,
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sendo R$ 200.000,00 pelos danos morais resultantes da infecção gastrointestinal
severa de que foi acometida e R$ 100.000,00 pela perda auditiva decorrente do
tratamento com antibiótico agressivo. Igualmente, reduz-se a indenização devida a
cada um dos genitores para R$ 50.000,00. Correção monetária nos termos da Súmula
n. 362 do STJ.
8. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (Relator):
Trata-se de ação indenizatória de danos materiais e morais movida por uma casal, em
nome próprio e representando sua filha menor, em razão de acidente de consumo decorrente da
ingestão de alimento contaminado com insetos, larvas vivas e fragmentos de insetos, que
acarretaram infecção intestinal aguda na menor, à época com 1 ano e 4 meses de idade,
sobrevindo, no curso da demanda, a informação de fato novo, consubstanciado na deficiência
auditiva da criança, atribuída ao antibiótico ministrado no tratamento.
A sentença deferiu o pleito indenizatório, condenando a fabricante UNILEVER
BRASIL INDUSTRIAL LTDA. e o SUPERMERCADO VITÓRIA LTDA., solidariamente, ao
ressarcimento dos danos materiais e morais, a seguir discriminados: (a) R$ 900.000,00 à filha do
casal pelos danos morais, sendo R$ 300.000,00 pelos males físicos e psicológicos decorrentes da
intoxicação alimentar e R$ 600.000,00 pelos males físicos e psicológicos decorrentes da perda
auditiva, além de pensão mensal de R$ 1.100,00 pelo dano patrimonial relativo à diminuição da
capacidade laborativa e para custear os gastos com a administração de seu problema de saúde,
tendo como parâmetro os anos que integram o período produtivo da vida adulta (18 a 60 anos),
totalizando R$ 554.400,00; (b) R$ 300.000,00 pelos danos morais sofridos por cada um dos
genitores; (c) ressarcimento das despesas comprovadas nos autos, além das que forem
documentalmente comprovadas em liquidação de sentença, no tocante ao pai; e (d) lucros
cessantes a serem apurados em liquidação de sentença para a mãe, atinentes à diminuição
salarial sofrida pela redução da carga horária para acompanhar o tratamento da filha. Determinou
ainda a incidência de correção monetária e juros de mora a contar de cada desembolso, quanto
aos danos patrimoniais; a partir do evento danoso, no que tange aos lucros cessantes; a contar da
sentença, no caso dos danos morais.
Em grau de apelação, a sentença foi parcialmente modificada para excluir a
responsabilidade solidária do supermercado e determinar que a pensão à menor fosse vitalícia e
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que se procedesse à constituição de capital para garantia da obrigação.
Passo ao exame destacado das proposições deduzidas pela recorrente.
I - Nulidade da sentença em razão da suspeição de parcialidade da juíza violação dos arts. 135, V, 138, § 1º, c/c o art. 304 do CPC
Sustenta a recorrente a nulidade da sentença porquanto prolatada por juíza cujo
marido é primo do advogado dos autores. Argumenta que a parcialidade da magistrada ficou
evidenciada ao deixar de realizar a audiência de instrução e julgamento já designada pelo juiz
que presidiu o feito nos primeiros oito anos, encerrando abruptamente a instrução e lhe
cerceando a defesa, além de lhe condenar em montante excessivo e superior ao próprio pedido
exordial, em manifesto julgamento ultra petita.
O acórdão recorrido afastou o vício apontado à míngua de amparo legal, visto que
ultrapassada a limitação de parentesco prevista no inciso II do art. 135 do CPC, entendendo
prejudicada a causa prevista no inciso V do art. 135 do CPC, uma vez que os indícios de
parcialidade apontados carecem de fundamento fático ou jurídico. Afirmou que a demanda
percorreu seis anos somente na tentativa de realização de perícias médicas, constantemente
impugnadas pela ora recorrente, havendo o desentranhamento de laudo a pedido da própria
empresa, por suspeição do perito. No mais, afastou qualquer cerceamento de defesa em razão do
julgamento antecipado da lide, uma vez que este se mostrou adequado ao caso concreto, assim
como o montante da condenação.
O art. 135, inciso II, do CPC reconhece fundada a suspeição de parcialidade do juiz
quando houver entre o magistrado, seu cônjuge ou parentes, em linha reta ou colateral até o
terceiro grau, relações de débito e crédito para com alguma das partes. Inexiste previsão de
suspeição baseada em relação de parentesco entre o cônjuge do magistrado e os advogados das
partes, já tendo decidido o STJ que as hipóteses de suspeição previstas no art. 135 da lei
processual são taxativas e devem ser interpretadas de forma restritiva para não comprometer a
garantia do juiz natural. Nesse sentido: REsp n. 1.340.594/MT, Segunda Turma, relator Ministro
Mauro Campbell Marques, DJe de 19.3.2014; e AgRg no Ag 444.085/SP, Terceira Turma,
relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 22.5.2005.
Por sua vez, as alegações utilizadas pela recorrente para tentar evidenciar a
parcialidade da magistrada (julgamento antecipado da lide, montante da condenação e
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julgamento ultra petita ) não se mostram plausíveis, sendo certo que, para o acolhimento da
suspeição, seria necessária prova induvidosa da aventada parcialidade.
Conquanto o magistrado que antes presidia o feito tivesse designado audiência de
instrução de julgamento, inexiste óbice a que o juiz a quem os autos são redistribuídos tenha
compreensão diversa e entenda que a causa já se encontra madura para o julgamento de mérito.
Sendo o destinatário das provas e encontrando elementos suficientes para formar seu
convencimento, é facultado ao magistrado, conforme preceitua o art. 330 do CPC, conhecer
diretamente do pedido, proferindo sentença meritória.
Ademais, é cediço que "os arts. 130 e 131 do CPC consagram o princípio do livre
convencimento motivado, segundo o qual o juiz é livre para apreciar as provas produzidas, bem
como a necessidade de produção das que forem requeridas pelas partes, indeferindo as que,
fundamentadamente,
reputar inúteis ou protelatórias" (AgRg no REsp n. 1.483.175/CE,
Segunda Turma, relator Ministro Herman Benjamin, DJe de 9.12.2014).
No caso, a juíza fundamentou, destacadamente, os motivos pelos quais considerava
desnecessária a produção das provas requeridas, in verbis :
"2 - indefiro o pedido da primeira ré formulado à fl. 288, de realização de
perícia de engenharia em sua fábrica para verificação da alegada infalibilidade na
linha de produção do creme de arroz porque o tempo transcorrido desde a produção
do lote 20 do referido produto que gerou a pretensão resistida ora em debate torna
inócua qualquer verificação para o caso específico em apreço, pois não há como aferir
se a(s) caixa(s) adquiridas pelos autores foram efetivamente submetidas ao rigor do
processo produtivo descrito, tornando-se, assim, prova dispendiosa, morosa e inútil à
elucidação da quaestio juris;
3 - indefiro o pedido da primeira ré formulado à fl. 289, de expedição de ofício
ao Instituto Adolfo Lutz para confirmação dos laudos técnicos de fls. 188 e 189
(documentos 25 e 26 da contestação) pois o teor dos documentos não está sendo
questionado, atribuindo-lhes este Juízo total credibilidade, sendo, pois, supérflua a
providência que contraria os princípios da celeridade e economia processuais;
4 - quanto à ouvida de testemunhas e depoimento pessoal dos autores antes
deferida, incumbe ao Juiz, destinatário da prova, repelir as diligências inúteis e/ou
protelatórias. O presente feito encontra-se fartamente instruído com documentos e
laudos suficientes à formação do convencimento deste Juízo, razão pela qual, usando
do poder discricionário que me é conferido pelo art. 130 do CPC, dispenso a dilação
probatória que apenas retardaria desnecessariamente o processo que já tramita há
mais de 10 anos, contrariando os princípios da economia e celeridade processuais;
5 - indefiro a produção de prova documental complementar postulada pela
primeira ré à fl. 289 uma vez que já finda a fase probatória e porque a finalidade da
mesma indicada pela parte a quem aproveitaria, de elucidação acerca do processo
produtivo e envase do creme de arroz, já está satisfeita com a admissão e manutenção
nos autos dos documentos de fls. 173-182"
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Da mesma forma, o vulto da condenação, por si só, não configura parcialidade do
julgador, uma vez que foi devidamente fundamentado nas razões de decidir.
Por fim, eventual julgamento ultra petita também não é elemento caracterizador de
parcialidade do magistrado, havendo instrumentos recursais próprios para o afastamento de tal
vício.
II - Nulidade do julgamento das apelações em face do impedimento do
presidente da 6ª Câmara, somente anunciado no momento em que feito o pregão
Sustenta a recorrente a nulidade do julgamento levado a termo pelo Tribunal a quo,
pois o presidente da Câmara julgadora somente se deu por impedido no momento em que
anunciado o julgamento em que seu filho figurava como advogado dos autores da ação, nada
obstante ter recebido a procuradora da ora recorrente em seu gabinete, para entrega de
memoriais.
O vício foi apontado em embargos declaratórios, refutados pelo acórdão recorrido ao
fundamento de não se configurar uma omissão: "O eventual impedimento de magistrado, não
relator, que tempestivamente refutou a participação no julgamento da lide, não é matéria que
deve ficar consignada no acórdão, pois alheia ao objeto da lide".
O recurso especial não logra alcançar o conhecimento quanto ao ponto, visto que a
recorrente absteve-se de indicar qualquer violação de dispositivo de lei federal, o que configura
deficiência de sua fundamentação e atrai a incidência da Súmula n. 284 do STF.
III - Julgamento ultra petita - violação dos arts. 128 e 460 do CPC
Neste tópico, a irresignação da recorrente abrange sua condenação ao pagamento dos
gastos futuros com o tratamento da menor, deferido ao pai; de lucros cessantes em favor da mãe,
equivalentes ao que deixou de ganhar com a redução da carga horária no trabalho; e de pensão
mensal vitalícia à menor.
Alega que os autores, quando da interposição da demanda, limitaram o pedido de
danos morais a 200 salários mínimos para cada requerente e de danos patrimoniais a R$ 700,00,
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relativos a despesas com alimentação especial e medicamentos para a menor. Posteriormente, em
razão do fato novo consubstanciado na perda auditiva da criança, reformularam o pedido de
condenação, limitando-o a R$ 1.000.000,00, quantia que abarcaria os danos materiais, morais e
estéticos.
Ao contrário do que alega a recorrente, os autores não limitaram suas pretensões aos
patamares acima referidos, mas os invocaram como valores mínimos para a indenização
pretendida.
Relativamente aos danos morais, anoto a posição do Superior Tribunal de Justiça de
que os valores deduzidos na petição inicial para fins de ressarcimento têm caráter meramente
estimativo, tanto que a condenação em montante a eles inferior não implica em reciprocidade de
sucumbência. A esse respeito, colaciono os seguintes precedentes: AgRg no AREsp n.
16.465/DF, Terceira Turma, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 2.5.2014; AgRg
no REsp n. 1.403.118/AC, Segunda Turma, relator Ministro Humberto Martins, DJe de
31.3.2014; e AgRg no AREsp n. 424.813/CE, Quarta Turma, relatora Ministra Isabel Gallotti,
DJe de 14.3.2014.
Os pedidos formulados pelos autores na petição inicial e na petição de emenda à
inicial em razão do fato novo foram deduzidos nos seguintes termos:
"a) a procedência da ação a fim de condenar os Requeridos aos pagamentos dos
danos morais não inferiores a 200 (duzentos) salários mínimos a cada requerente, e
danos materiais no valor de R$ 70,00 (setecentos reais) suportados pelos requerentes,
com despesas de alimentação especial e medicamentos, com a incidência da correção
monetária que integram a indenização, inclusive, custas e despesas processuais,
aplicando-se a disposição da Súmula 562 do STF."
"Ante a documentação em anexo e demais atos do processo que provam o nexo
causal, os requerentes esperam que Vossa Excelência receba esta petição
considerando como fato novo nos termos do art. 397 e 462 do Código de Processo
Civil, para ao final condenar os requeridos no pagamento dos danos materiais, morais
e estéticos, num valor não inferior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais)."
Conquanto os pedidos devam ser interpretados restritivamente, segundo a dicção do
art. 293 do CPC, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o pedido deve ser
extraído a partir de uma interpretação lógico-sistemática de toda a petição inicial, abrangendo os
requerimentos feitos em seu corpo e não se limitando aos termos constantes de capítulo especial
ou sob a rubrica "dos pedidos". Confiram-se, entre muitos, os seguintes julgados: AgRg no Ag
n. 468.472/RJ, Primeira Turma, relator Ministro Luiz Fux, DJ de 2.6.2003; REsp n.
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1.391.789/PR, Segunda Turma, relator Ministro Humberto Martins, DJe de 24.10.2014; AgRg
no REsp n. 1.276.751/SP, Terceira Turma, de minha relatoria, DJe de 19.11.2014; AgRg no Ag
n. 738.250/GO, Quarta Turma, relator Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 5.11.2007; e
AgRg no REsp n. 1.229.473/PE, Quinta Turma, relator Ministro Walter de Almeida Guilherme,
Desembargador convocado do TJSP, DJe de 3.11.2014.
No presente caso, é possível extrair da petição inicial a pretensão de ressarcimento
dos lucros cessantes sofridos pela mãe da criança em razão da necessidade de reduzir sua carga
horária no trabalho, a fim de acompanhar o tratamento da filha:
"Tal situação fez com que a mãe da menor Professora da Rede Pública
Municipal, requeresse diminuição de sua carga horária, diminuindo a jornada de
trabalho para meio período, pois tem que acompanhar a dieta alimentar de
recuperação de sua filha. Este fato, reduziu a (sic) ganho familiar, devendo ser
suportado pelo causador" (e-STJ, fl. 7).
O mesmo se diga em relação aos gastos futuros, necessários à reparação dos danos
físicos sofridos pela menor. Consta da exordial:
"O fato da requerida ser condenada a indenizar os danos morais não a isenta da
obrigação de reparar e ressarcir os danos materiais, nesses incluído o reembolso das
despesas com o tratamento médico, alimentação especial e medicamentos, enfim
todos os gastos de sua recuperação no sentido mais amplo da expressão" (e-STJ, fl.
6).
Na petição de emenda à exordial, foram discriminadas novas despesas já efetuadas e
que teriam de ser renovadas ao longo do tempo, em decorrência da perda auditiva que acometera
a menor, tais como consultas com médicos e fonoaudiólogos, despesas de locomoção e estadia
para se consultar no centro auditivo de Bauru (SP), moldes de silicone, aparelhos auditivos e
pilhas.
É possível concluir, com base numa interpretação lógico-sistemática da inicial e da
emenda à inicial, que os autores pretenderam ver-se ressarcidos não só das despesas até então
efetuadas com o tratamento da menor mas também daquelas necessárias à continuidade do
tratamento e que se consumariam em momento posterior ao ajuizamento da demanda.
Assim, em relação aos gastos futuros com o tratamento da menor, deferidos ao pai, e
aos lucros cessantes concernentes à redução salarial da mãe, não há falar em julgamento ultra
petita , pois a condenação imposta à recorrente guarda consonância com o inteiro teor da petição
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inicial, complementada pela emenda decorrente de fato superveniente.
O mesmo não se pode dizer da pensão mensal vitalícia.
O acórdão recorrido entendeu possível o deferimento de pensão, tendo em vista a
"incidência das despesas destacadas expressamente no pedido, além de compensar real e efetiva
diminuição da capacidade laboral e inserção no competitivo mercado de trabalho".
Ocorre que, quanto às despesas futuras necessárias ao tratamento, já foi assegurado o
devido ressarcimento, postulado pelo pai.
Por sua vez, no tocante às eventuais dificuldades de inserção no mercado de
trabalho, denota-se da petição de emenda à inicial que tal circunstância foi invocada pela parte
apenas como fundamento para orientar a fixação do dano moral, in verbis :
"A dor moral não pode ser medida, mas deve ser indenizada, para que o valor
indenizatório sirva além de atenuar a dor dos requerentes, como penalidade para os
causadores, para que com isso sejam mais prudentes.
Como se repara um apelido que foi atribuído à Débora, pelos próprios
coleguinhas de escola como 'surdinha' e 'muda'? Como se repara a falta de
comunicação? Como se repara a deficiência auditiva para o mercado de trabalho e a
própria sobrevivência?"
É preciso cautela ao se aplicar o entendimento adotado pelo STJ de compreensão do
pedido a partir de uma interpretação lógico-sistemática da petição inicial, sob pena de se resvalar
para a discricionariedade do julgador, que venha a comprometer sua imparcialidade, atributo
indispensável do órgão jurisdicional e pressuposto de validade da relação processual, como bem
alertou a eminente Ministra NANCY ANDRIGHI no voto proferido no julgamento do REsp n.
1.155.274/PE, DJe de 15.5.2012, nestes termos:
"Por mais que se queira conferir uma exegese abrangente ao pedido, jamais se
pode extrapolar a pretensão da parte, concedendo-lhe o que sequer cogitou ao ajuizar
a ação. O pedido é condutor da atividade jurisdicional, especificamente em relação ao
objeto da sentença, no que se convencionou denominar de princípio da congruência,
derivado dos arts. 128 e 460 do CPC.
Conclui-se, portanto, que a interpretação do pedido deve se guiar por duas
balizas: de um lado, a contextualização do pedido, integrando-o ao inteiro teor da
petição inicial, de modo a extrair a pretensão integral da parte; e, de outro lado, a
adstrição do pedido, atendendo-se ao que foi efetivamente pleiteado, sem ilações ou
conjecturas que ampliem o seu objeto."
Valendo-me ainda do raciocínio da Ministra NANCY no precedente acima, a mera
circunstância de que os fatos narrados comportem, em tese, o pedido de pensão não autoriza o
julgador, à míngua de qualquer pedido ou cogitação tendente a exigi-la, a, de ofício, considerá-la
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implícita no pedido de ressarcimento de danos materiais.
Portanto, merece acolhida o recurso especial para excluir da condenação a pensão
vitalícia, ficando prejudicado o exame da alegação de afronta ao art. 475-Q, § 2º, do CPC,
atinente à questão da constituição de capital para pagamento da pensão.
IV - Ausência de nexo de causalidade entre o defeito do produto e a perda
auditiva da menor - violação aos arts. 12, § 3º, II e III, do CDC e 403 do CC
A recorrente sustenta, a partir do delineamento fático constante do voto vencido, que
inexiste nexo de causalidade entre a contaminação no creme de arroz que produz e a perda
auditiva sofrida pela menor. Isso porque é incontroverso nos autos que a perda auditiva da
criança resultou do uso do antibiótico Garamicina e, segundo o voto vencido, o remédio foi
ministrado à menor para combater infecção outra que não aquela decorrente do vício em seu
produto.
Não há como acolher a pretensão recursal que se ampara em tese tratada
exclusivamente no voto vencido, conforme enunciado da Súmula n. 320 desta Corte ("A questão
federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento" ).
Ademais, o voto condutor do acórdão recorrido examinou a questão do nexo de
causalidade entre o defeito do produto fabricado pela recorrente e a perda auditiva da menor,
evidenciando sua presença no caso, a justificar a responsabilidade civil da empresa. A respeito,
leia-se a seguinte passagem do aresto impugnado:
"No que toca ao nexo causal entre o defeito do produto e o dano suportado, in
casu, a surdez da menor, tem-se como devidamente implicados a partir dos elementos
probatórios trazidos aos autos oportunamente.
Na linha cronológica dos acontecimentos, destaca-se que a compra do produto
contaminado deu-se em 27.10.1999 (fl.16). Referido alimento — Creme de Arroz
Colombo , assim como todos os outros apreendidos do mesmo lote (20 EQ), conforme
atestou o LACEN/SC, encontrava-se irremediável e incontestavelmente impróprio
para o consumo humano por infestação de insetos vivos, fragmentos de insetos, larvas
e outras sujidades capazes de causar prejuízos à saúde e integridade física dos
consumidores, notadamente de seu público alvo — bebês de um a três anos, dada a
natural fragilidade do ser humano nesta etapa de seu desenvolvimento.
Após poucos dias de consumo do alimento, a menor começou a apresentar os
sintomas de doença gastrointestinal, tendo sido submetida, no dia 29.10.1999, à
primeira de muitas baterias de exames laboratoriais, consultas pediátricas e
prescrições medicamentosas. Ressalte-se que, conforme relato dos pais, ao sinal de
infecção intestinal o pediatra restringiu uma série de alimentos, concentrando a fonte
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de nutrição da filha no creme de arroz, adicionado à mamadeira, razão pela qual,
houve a ingestão continuada do produto, tornando a menor cada vez mais vulnerável
aos agentes causadores da infecção e ocasionando a piora considerável de seu quadro
clínico.
Ainda no deslinde cronológico dos fatos, merece transcrição parte da sentença
recorrida, na qual se reporta a julgadora aos fatos, datas e prescrições médicas, a fim
de implicar o consumo do alimento à surdez atual da consumidora:
A partir da data referida, os documentos constantes dos autos comprovam a
submissão da pequena Débora a sucessivos exames laboratoriais e consultas
médicas em datas muito próximas (11/11/99, 20/11/99, 22/11/99, 25/11/99,
04/01/2000, 21/01/2000, 23/01/2000, 24/01/2000, 26/01/2000), induzindo à
conclusão de que a criança não apresentava melhora em seu quadro clínico.
Nesse contexto impossível não unir, na mesma cadeia causal a ingestão do
alimento deteriorado e a doença gastrointestinal que foi se desdobrando em
sintomas cada vez mais graves.
Os medicamentos prescritos são indicativos de que Débora apresentou, no
período posterior à compra e ingestão do alimento contaminado os sintomas de:
febre, pois lhe foram receitados antitérmicos (fl.33); diarréia, pois lhe foram
receitados medicamentos antidiarréicos e restauradores da flora intestinal (fl.42);
desidratação, pois lhe foram receitados soros rehidratantes (fls.42 e 47); náuseas
e vômitos, pois lhe foi receitado medicamento inibidor destes sintomas (fl.46);
desnutrição, pois lhe foram receitados leites especiais, suplementos vitamínicos e
suplementos alimentares (fls.40, 42 e 43); infecção, pois lhe foram receitados
medicamentos antiinfecciosos e antibióticos (fls.43, 41 48), culminando com o
intensivo tratamento com o antibiótico Garamicina, receitado em 26/01/2000
(fl.48), eis que a medicação antes ministrada fora insuficiente para conter a
doença.
Este último antibiótico, a Garamicina, finalmente conseguiu estagnar a
infecção gastrointestinal, no entanto, sujeitou a menina Débora às reações
adversas indicadas na bula do medicamento (fls. 216 e 216v), dentre as quais a
mais grave é perda da audição (fls. 630/631).
Nota-se que não há efetiva interrupção do nexo causal, capaz de liberar a
apelante da obrigação indenizatória. Da ingestão do alimento até o diagnóstico de
perda auditiva, a vida da menor resumiu-se a internações médicas, consultas, exames,
tratamentos medicamentosos, forçando, inclusive, a mãe a reduzir sua jornada de
trabalho para prestar a necessária assistência e acompanhamento à filha."
Dessa forma, a tese sustentada pela recorrente encontraria óbice ainda na Súmula n.
7 do STJ, porquanto seria imprescindível o reexame do conjunto fático-probatório para se
chegar, eventualmente, a conclusão diversa da adotada pelas instâncias de origem.
Ainda neste tópico, a recorrente alega que estaria corroborado que a contaminação
do produto ocorreu após a abertura da embalagem, configurando culpa exclusiva do consumidor
ou de terceiros, o que também se rechaça porquanto as instâncias de origem deixaram
expressamente consignado que, além do produto adquirido pelos autores, foram examinadas
amostras do mesmo lote, em embalagens lacradas, que apresentaram igual contaminação.
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Leia-se a seguinte passagem do acórdão recorrido:
"A afirmativa de que a contaminação se deu na residência dos consumidores
não merece prosperar uma vez que a Vigilância Sanitária recolheu e encaminhou ao
Lacen embalagens lacradas do produto em questão, cujo lote era idêntico ao adquirido
pelos apelados, manifestando-se o laboratório em dois laudos diversos: um sobre o
produto encaminhado pelos consumidores e outro acerca do apreendido diretamente
do Supermercado. Em ambos os casos foram encontrado (sic) insetos vivos,
fragmentos de insetos e outras sujidades que atestam a imprestabilidade do alimento
ao consumo humano, especialmente infantil."
V - Redução do montante da indenização por dano moral - afronta aos arts. 944
e 945 do CC e dissenso jurisprudencial
No tocante ao aventado dissídio jurisprudencial, no que concerne ao valor
indenizatório por danos extrapatrimoniais, verifica-se a impossibilidade de ser estabelecido juízo
de valor acerca da semelhança dos pressupostos fáticos dos acórdãos confrontados, pois cada
caso tem peculiaridades próprias – circunstâncias em que o fato ocorreu, condições do ofensor e
do ofendido, grau de repercussão do fato no âmbito moral da vítima –, as quais determinam a
aplicação do direito à espécie.
Dessa forma, ainda que haja grande semelhança nas características externas e
objetivas, os acórdãos, no aspecto subjetivo, são distintos, tornando incabível a análise do
recurso com base no dissídio.
O exame do recurso especial em casos que tais tem sido feito pela alegação de
afronta à legislação federal.
É pacífica a orientação do Superior Tribunal de Justiça de que, nas hipóteses em que
o Tribunal de origem, com base no acervo probatório dos autos, considera configurado o dano
moral e fixa o quantum
indenizatório observando os critérios da razoabilidade e
proporcionalidade, é inviável a revisão de tal entendimento em razão do óbice da Súmula n.
7/STJ.
A revisão de indenização por danos morais somente é possível em recurso especial
quando o valor fixado nas instâncias ordinárias for exorbitante ou ínfimo, distanciando-se,
assim, de suas finalidades legais a implicar em vulneração da lei federal.
No presente caso, as instâncias ordinárias fixaram a indenização pelos danos morais
sofridos pela menor em R$ 900.000,00, sendo R$ 300.000,00 pelos males físicos e psicológicos
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decorrentes da intoxicação alimentar e R$ 600.000,00 pelos males físicos e psicológicos
decorrentes da perda auditiva. Para cada um dos genitores, arbitraram a indenização em R$
300.000,00.
Tais valores estão fora dos parâmetros usualmente adotados pelo STJ, conforme se
vê a seguir.
No julgamento do REsp n. 1.024.693/SP, a Segunda Turma, por unanimidade,
acolheu a pretensão recursal para restabelecer a verba indenizatória fixada na sentença, no
patamar de 500 salários mínimos, em hipótese de negligência médica durante o parto que
culminou em deficiência mental irreversível da criança. O julgamento ocorreu em agosto de
2009, quando o salário mínimo correspondia a R$ 465,00, o que totalizava R$ 232.500,00.
Leia-se o seguinte trecho da fundamentação do julgado:
"A morte do filho no parto, por negligência médica, embora ocasione dor
indescritível aos genitores é evidentemente menor do que o sofrimento diário dos pais
que terão de cuidar, diuturnamente, do filho inválido, portador de deficiência mental
irreversível, que jamais será independente ou terá a vida sonhada por aqueles que lhe
deram a existência.
Assim, diante dos aspectos fáticos delineados soberanamente pelo Tribunal
recorrido, entendo razoabilíssima a indenização fixada pela sentença em 500
(quinhentos) salários-mínimos, sendo descabida qualquer alteração do Tribunal a quo
em seu valor."
Em outro precedente (REsp n. 1.074.251/SP, DJe de 15.5.2009), envolvendo a morte
de filho nas dependências de hospital, após ser submetido a cirurgia para extração de amígdalas,
a Terceira Turma deu provimento ao recurso especial para reduzir o valor da indenização de R$
400.000,00 para R$ 200.000,00, com amparo na seguinte fundamentação:
"7.- De outro lado, quanto ao valor da indenização, os danos morais tem como
objetivo compensar a dor causada à vítima e desestimular o ofensor de cometer atos
da mesma natureza. Não é razoável o arbitramento que importe em uma indenização
irrisória, de pouco significado para o ofendido, nem uma indenização excessiva, de
gravame demasiado ao ofensor. Por esse motivo, a jurisprudência deste Superior
Tribunal orienta que o valor da indenização por dano moral não escapa ao seu
controle, devendo ser fixado com temperança.
Verifica-se, de plano, que o valor fixado no presente caso, R$ 400.000,00
(quatrocentos mil reais), destoa dos valores aceitos por esta Corte para casos
semelhantes, isto é, de morte de filho menor decorrente de erro médico.
Assim, tendo em vista a jurisprudência desta Corte a respeito do tema e as
circunstâncias da causa, conclui-se que a indenização deve ser reduzida para o valor
de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), quantia que cumpre, com razoabilidade, a sua
dupla finalidade, isto é, a de punir pelo ato ilícito cometido e, de outra banda, a de
reparar a vítima pelo sofrimento moral experimentado."
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No REsp n. 1.239.060/MG (DJe de 18.5.2011), que tratava de consumo de alimento
contaminado (leite condensado em cuja lata fora encontrada uma barata), embora sem o relato de
problemas de saúde específicos advindos para o consumidor, a Terceira Turma considerou
adequada a indenização por dano moral fixada no patamar de R$ 15.000,00, sopesando, para
tanto, a sensação de náuseas, asco e repugnância certamente provocadas.
Em outras hipóteses coletadas na jurisprudência deste Tribunal, foram fixados os
seguintes montantes: (a) paraplegia decorrente de acidente de trânsito - R$ 40.000,00 (REsp n.
1.189.465/SC, Terceira Turma, DJe de 9.11.2010); (b) amputação de perna decorrente de erro
médico - R$ 80.000,00 (AgRg no REsp n. 920.225/RN, Segunda Turma, DJe de 19.8.2009); (c)
paraplegia e amputação de membro inferior decorrente de acidente de trânsito causado por
agente do Estado - R$ 100.000,00 (REsp n. 1.168.831/SP, Primeira Turma, DJe de 13.9.2010);
(d) comprometimento de mais de 90% da visão de uma criança em razão de falha do serviço
hospitalar no acompanhamento de recém-nascido - R$ 106.400,00, sendo R$ 76.000,00 pelos
danos morais e R$ 30.400,00 pelos danos estéticos (AgRg no Ag n.1.092.134/SC, Terceira
Turma, DJe de 6.3.2009); e (e) queimadura de terceiro grau em 30% do corpo de um jovem de
19 anos, mais amputação do braço direito e da genitália, em razão de choque elétrico de alta
intensidade provocado por transformador de alta tensão mal instalado em poste vizinho a uma
boate - R$ 800.000,00 (REsp n. 1.011.437/RJ, Terceira Turma, DJe de 5.8.2008).
Tomando, de um lado, esses precedentes como balizadores e, de outro, as
circunstâncias fáticas do presente caso delineadas pelas instâncias de origem, entendo
configurado o excesso justificador da intervenção do STJ a fim de readequar os termos da
condenação imposta à recorrente, observando os princípios da proporcionalidade e
razoabilidade.
Nesse sentido, levando em consideração o sofrimento por que passou a menor em
razão dos exames a que foi submetida, além da febre, diarreia, vômitos, desidratação e
subnutrição, mais a perda auditiva que sofreu em decorrência do antibiótico que foi necessário
para debelar a grave infecção que a acometera, entendo como adequado à reparação dos danos
morais o montante de R$ 300.000,00, sendo R$ 200.000,00 pelos danos morais propriamente
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ditos e R$ 100.000,00 pelos danos estéticos.
Relativamente aos genitores, que vivenciaram momentos de enorme sofrimento ao
ver sua pequena filha com grave infecção, correndo risco de morte, proponho a verba
indenizatória, devida a cada um, no montante de R$ 50.000,00.
Nos termos da Súmula n. 362 do Superior Tribunal de Justiça, os valores acima
deverão ser corrigidos monetariamente a partir deste julgamento.
VI - Conclusão
Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e dou-lhe parcial
provimento para excluir da condenação a pensão vitalícia e reduzir o valor da indenização
por danos morais devida à menor para R$ 300.000,00 e para R$ 50.000,00 a indenização
deferida a cada um dos genitores, valores que deverão ser corrigidos monetariamente, nos
termos da Súmula n. 362 do STJ.
Fica mantida a condenação em relação ao valor das custas e da verba honorária,
fixada em 10% sobre o valor da condenação, que já foi diminuída com a redução de sua base de
cálculo.
É o voto.
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