Serviço Social e as questões etnico-raciais1 Maria Luisa da Costa Fogari 2 [email protected] Neide Ap. de Souza Lehfeld 3 Modalidade do Trabalho: Resultados de Investigações Eixo Temático: Classes, Gênero, Etnia e Sociedade Palavras – Chave: Serviço Social, Afrodescendentes, Políticas Públicas Introdução “Sonho com o dia em que todos levantar-se-ão e compreenderão que foram feitos para viverem como irmãos." ( Nelson Mandela) O objetivo desse artigo será discorrer sobre a representação social e a vida das pessoas negras, indo além da hereditariedade étnica, refletindo a visualização e a imagem no mundo contemporâneo num patamar humanista. Representação social dos afrodescendentes enquanto membros de um grupo étnico racial. Para Philippe Poutignat & Jocelyne Streiff-Fenart (1998, p.45) “Grupo étnico é então “simplesmente” uma categoria descritiva e objetiva, discernível pelo observador externo (...) A nação pressupõe, por sua vez, uma consciência subjetiva específica de povo”. Contudo, as condições étnicas, enquanto condição classificatória e segregacionista, é um dilema herdado pelos afrodescendentes desde o período colonial, imperial e republicano. Entretanto o objetivo geral desse estudo foi analisar como estão se efetivando as ações afirmativas, e como estão sendo visualizadas pelos profissionais Assistentes Sociais, e pelos usuários do Serviço Social oriundos da etnia negra do município de Santa Rita do Passa Quatro, enquanto garantia da cidadania, eqüidade e justiça social dos usuários do Serviço Social. Os objetivos específicos desse estudo foram: observar quais as ações pleiteadas pelo Serviço Social dão importância às questões raciais; buscar dados sobre as concepções de ações afirmativas através de um grupo negro santa-ritense; e finalmente buscar informações relativas aos conselhos municipais existentes no município. 1 Ponencia presentada en el XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. El Trabajo Social en la coyuntura latinoamericana: desafíos para su formación, articulación y acción profesional. Universidad Católica Santiago de Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009. 2 Assistente Social Mun. de Tambaú-SP, mestranda pós-graduação em Serviço Social 3 Docente pós-graduação Unesp/Franca e Coordenadora Curso Serviço Social Unaerp/R Preto. 1 O universo da pesquisa foi constituído pelos profissionais responsáveis pelo: Fundo Social de Solidariedade, Setor de Cultura e Departamentos de Saúde e Educação do município de Santa Rita do Passa Quatro - S.P. A amostra constituiu-se intencionalmente pelo grupo afro santa-ritense, foram entrevistadas: cinco pessoas do grupo, duas assistentes sociais, um integrante responsável pelos Departamentos de: Saúde, Esporte e Cultura, e da Educação e de Promoção Social de Santa Rita do Passa Quatro - SP. A técnica da coleta de dados com caráter qualitativo se constituiu de observação e aplicação de formulário e, posteriormente, da entrevista semi-estruturada. 1 - O continente africano e suas interferências pejorativas: Indagar sobre as questões relacionadas ao povo afrodescendente no contexto das políticas públicas na contemporaneidade requer que façamos um retrocesso ao processo histórico, principalmente no período relacionado as grandes explorações coloniais realizadas pelos Ibéricos. Para entendermos melhor o processo escravagista brasileiro, explanaremos um pouco sobre o continente Africano. Na África, temos uma população distribuída em várias nações. A África sempre representou no imaginário dos exploradores um lugar dotado de um povo envolto em tradições estereotipadas; tradições essas nunca entendidas pela sociedade, onde os ideais burgueses civilizatórios sempre prevaleceram. (...) ainda, que existam visões estereotipadas cultivadas contra outros povos e regiões, a África, mais do que qualquer outro continente, terminou por um véu de preconceitos que ainda hoje marcam a percepção da sua realidade. (WALDMAN, 2004 e 2006B, APUD, SERRANO & WALDMAN, 2007, p.21). (...) As imagens do continente africano construídas pelo imaginário medieval suscitavam todo tipo de objeções. Assolados pelo calor inclemente, os territórios meridionais estariam infestados de monstros e de outros seres fabulosos, coabitando com grupos de semi-humanos ou de humanos inferiores. Todavia, mesmo essas manifestações de vida escasseariam consoante a proximidade com o Equador, onde os mares seriam ferventes e abundariam rios de metal derretido. (SERRANO & WALDMAN, 2007, p.277). O continente africano foi desqualificado pelo pensamento ocidental, sendo considerado habitado por selvagens. Por que? Porque foi rodeado por pensamentos negativos, distorcidos, errôneos, devido aos interesses eurocêntricos, reflexo do pensamento darwinista. Para buscarmos explicações sobre esses pensamentos pejorativos construídos pelos europeus em relação aos outros povos, recorremos à leitura de 2 Morgan. Morgan e Tylor foram os principais defensores do evolucionismo cultural. Para Morgan: As mais recentes investigações a respeito das condições primitivas da raça humana estão tendendo à conclusão de que a humanidade começou sua carreira na base da escala e seguiu um caminho ascendente, desde a selvageria até a civilização, através de lentas acumulações de conhecimento experimental. (MORGAN, 2005, p.49) Segundo a teoria de Morgan, os africanos começaram a serem visualizados como sinônimo de seres humanos – de uma raça – em estágio evolutivo inferior. Foram sobre essa teoria estereotipada que se desenvolveram as relações entre Europa e África entre os séculos XV ao XVIII. 2 - Contexto histórico brasileiro: Foram sob esses estigmas, segundo o evolucionismo cultural em relação aos outros povos, teoria defendida por Morgan que as embarcações lideradas por Pedro Álvares Cabral, seguiram intencionados em encontrar as Índias. Não encontraram as Índias. O navegador ibérico atracou suas caravelas no Novo Mundo nos primeiros anos do século XVI, mas precisamente no litoral sul da Bahia. O espaço territorial brasileiro possuía um expressivo número de indígenas, que pertenciam as suas nações, que eram divididas em várias aldeias. Os grupos indígenas encontrados no litoral passaram a sofrer a imposição capitalista européia, através da colonização das terras recém invadidas. O poderio mercantil lusitano teve como imperativo quando desbravou mares: a exploração territorial e o desejo de arrebanhar almas para Igreja Católica, pois essa estava passando pelo período da Inquisição e da Reforma Protestante, idealizada por Martinho Lutero. Era necessário proliferar sua fé, seus dogmas além – mar. Em 1530, no reinado de D. João III, o Brasil começou a ser povoado pelos portugueses, devido ao temor de que outros países dominassem o território, começando daí por diante a aculturação e miscigenação racial no Brasil. Os solos da colônia foram divididos no início em capitanias hereditárias, partindo para a produção agrícola. Definiram, dessa forma: (...) A base, a agricultura; as condições, a estabilidade patriarcal da família, a regularidade do trabalho por meio da escravidão, a união dos portugueses com a mulher índia, incorporada assim á cultura econômica e social do invasor.(FREYRE, 2005, p. 65) 3 Caio Prado Junior (2006) relata que inicialmente o que lhes interessa é explorar economicamente estes países, por isto a supervalorização dos territórios orientais, enriquecidos pelas atividades mercantis. Na América a situação apresentava-se de forma diversa: tinha-se um território primitivo ocupado por poucos indígenas, que não fornecia qualquer coisa aproveitável. Era preciso ampliar estas bases, criar um povoamento capaz de abastecer feitorias que viessem a serem fundadas, com interesses comerciais. Daí surge à idéia de povoar e organizar a produção. O homem europeu veio com ideais de não colocar em ação sua energia vital, outro faria por ele, viria como dirigente da produção de gêneros de grande valor comercial, como empresário de um trabalho rentável. O europeu dirige-se para os trópicos, somente como proprietário, mandatário, que alguém trabalhe por ele. Quem trabalharia por ele? A solução encontrada fora escravizar os indígenas. Os indígenas eram usados para o corte e carregamento do pau-brasil por meio de um sistema de trocas conhecido como escambo. (...) os índios souberam que era por culpa sua, de sua iniqüidade, de seus pecados, que o bom deus do céu caíra sobre eles, como um cão selvagem, ameaçando lançá-los para sempre nos infernos. O bem e o mal, a virtude e o pecado, o valor e a covardia, tudo se confundia, transtrocando o belo com o feio, o ruim com o bom. Nada valia, agora e doravante, o que para eles mais valia: a bravura gratuita, a vontade de beleza, a criatividade, a solidariedade. A cristandade surgia a seus olhos como o mundo do pecado, das enfermidades dolorosas e mortais, da covardia, que se adonava do mundo índio, tudo conspurcando, tudo apodrecendo. (RIBEIRO, 1995, p. 43) O tráfico de escravos oriundos do continente africano era uma atividade muito lucrativa, era exercida por mercadores negros e europeus, intensificando-se amplamente após a conquista da América. Sempre como traficantes, os portugueses traficaram na costa africana: marfim, ouro, escravo; na Índia, as especiarias. Um poderoso comércio envolvia Portugal, África e Brasil. Os negros africanos trazidos ao Brasil, vinham de várias partes da África para trabalhar como mão-de-obra escrava nas lavouras de cana-de-açúcar do Nordeste e, mais tarde, nas plantações de café. Segundo o autor, Gilberto Freyre (2005, p. 70) (...) Transportamse da África para o trabalho agrícola no Brasil nações quase inteiras de negros. Uma mobilidade espantosa. (...). Aprisionado, ele (...) era arrastado pelo pombeiro – mercador africano de escravos – para a praia, onde seria resgatado em troca de tabaco, aguardente e bugigangas. Dali partiam em comboios, pescoço atado a pescoço com outros negros, numa corda puxada até o porto e o tumbeiro. (...) (RIBEIRO,1995, p. 119) 4 Concluímos que nessa conjuntura histórica a negligência e injustiças ao povo africano eram comuns, devido ao domínio e prepotência da coroa portuguesa, inclusive na organização sociocultural da colônia, por exemplo, o escravizado era (...) o agente de europeização que difundiria a língua do colonizador e que ensinaria aos escravos recém chegados as técnicas de trabalho, as normas e valores próprios da subcultura a que se via incorporado (...) (RIBEIRO, 1995, p.116). Em julho de 1873, aconteceu o Primeiro Congresso Republicano de São Paulo, sob a presidência de Américo Brasiliense de Almeida Mello, ficando decidido nesse encontro que cada província deveria (...) efetuar a reforma, substituindo no trabalho o braço escravo pelo trabalho livre, respeitando o princípio de indenização baseado no direito a propriedade. , (QUINTÃO, 2002, p. 75) (...) Além da dificuldade em conseguir senão, pela coerção, quem trabalhasse em terra alheia, o escravo era a solução ideal na medida em que ele não podia ser proprietário, apenas propriedade. A exclusão dos homens livres do acesso à terra era importante, por sua vez, para garantir uma mão-de-obra escrava reserva, particularmente em culturas que exigiam curtos períodos de trabalhos intensivo, por exemplo, a safra e a moagem de cana-de-açúcar. Os homens livres tinham lugar, portanto, no projeto dos dominantes, mas um lugar dependente. (CUNHA, 1987, p. 53) Em 1888 cai o último governo escravocrata, finalizando com a escravidão no Brasil por meio da Lei de 13 de Maio, assinada pela princesa Izabel. No entender do autor Sérgio Buarque de Holanda (1995, p.73) o ano de 1888 representou um marco divisório entre duas épocas; em nossa evolução nacional, essa data assume significado singular e incomparável. No pós-abolição nenhuma solução ou política pública foi norteada para o recém liberto, que não possuía as técnicas necessárias para o mercado de trabalho, formando o exército industrial de reserva. Ou o negro ficava nas zonas rurais sujeitando-se as supremacias da elite agrária ou disputar com os imigrantes, que era a (...) mão de obra importada da Europa, com freqüência constituída por trabalhadores mais afeitos ao novo regime de trabalho e as suas implicações econômicas ou sociais.(FERNANDES, 1965, p.03) Esses espaços segregados e discriminatórios foram à base social, econômica e cultural brasileira. Para Octavio Ianni (2004), o dilema vivenciado pelo negro perpassa pelas questões relacionadas à Abolição em 1888. Segundo o autor, por volta da consolidação do capitalismo brasileiro, o negro foi preterido, em benefício do imigrante, formando uma população vivendo de pequenos biscates, da marginalidade, formando o exército 5 industrial de reserva. Assim, o homem negro passa a ser responsável pelo seu sustento e sobrevivência, enquanto membro da sociedade brasileira. 3 - Fugas, resistências, movimento negro foi uma perspectiva de direito? Nem sempre os retrógrados livros, contaram a verdadeira história vivida pela comunidade negra brasileira. Nesse sentido, ressalvamos que nunca levaram em consideração os verdadeiros acontecimentos. Portanto, faremos a partir de então, uma abordagem histórica dialética, mediante os autores que expressam em suas obras contemporâneas, a história que não foi contatada. Pois vivemos longos períodos ditatoriais na história brasileira, e também tivemos muito enfatizada a submissão contada erroneamente nas literaturas quando se relacionavam aos afrodescendentes, esse fato sempre favoreceu a emergente burguesia brasileira. As resistências e as revoltas sempre estiveram presentes, durante o longo período da escravidão, até os movimentos sociais contemporâneos. Entende – se que tivemos um processo permeado por ideais contraditórios, que se baseavam na relação exploratória entre: escravo (posse) e senhores patriarcais (detentores do poder ou proprietários). A sociedade colonial havia pretendido situar “o negro africano” em apenas uma condição, a de ser escravo propriedade do senhor; mas, entre 1500 e 1800, o desenvolvimento das economias e sociedades coloniais e as ações de iniciativas dos próprios escravos e negros livres alteraram esse plano original. (...) (ANDREWS, 2007, p. 38) A data de 20 de novembro foi escolhida como o Dia da Consciência Negra por marcar a morte do maior líder da história dos negros no Brasil. Nesse dia, em 1695, Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra, foi morto e capturado pelos portugueses, dando fim ao Quilombo dos Palmares, em Alagoas – o maior do país. Outras reações de resistência: a preservação de manifestações religiosas, certos traços da culinária africana, a capoeira, o suicídio e o aborto eram outras formas de oposição à escravidão. Também podemos considerar o banzo uma forma de não aceitar a escravização e a imposição alheia. Mas não foi toda de alegria a vida dos negros, escravos dos ioiôs e das iaiás brancas. Houve os que se suicidaram comendo terra, enforcando-se, envenenando-se com ervas e potagens dos mandingueiros. O banzo deu cabo de muitos. O banzo – a saudade da África. Houve os que de tão banzeiros ficaram lesos, idiotas. Não morreram: mas ficaram penando. E sem achar gosto na vida normal - entregando-se a excessos, abusando de aguardente, da maconha, masturbando-se. Doenças africanas seguiram-nos até o Brasil, devastando-os nas senzalas (...) (FREYRE, 2005, p. 552). 6 Mesmo com todas as imposições e sansões, não deixaram a cultura africana esmorecer. Sobre a importância da religião, Octavio Ianni (2004, p. 214) definiu que: (...) a religião é um ângulo cultural e, também, político importante da sociedade brasileira. (...). Em oposição ao sistema aristocrático imposto, os povos oriundos da diáspora africana, preservaram e valorizaram a identidade étnica, por meio das danças e rituais dedicados aos reis e rainhas do congo. (...) No Brasil, as classes dominantes sempre “manipulam” as informações sobre aspectos da realidade social, de modo a criar a ilusão que a sociedade é harmônica, homogênea, racialmente democrática, cordial, pacífica, ordeira, etc . Junto, com as várias e freqüentemente combinadas diversidades religiosas, raciais e outras, há a gama e a trama das diferenças de classes sociais. As diferenças de classes sociais, fundadas nas posições diversas das pessoas e dos seus familiares no processo de produção e apropriação, combinam-se com aquelas diversidades (...) (IANNI, 2004, p. 215). As aglomerações negras foram essenciais para que os escravizados buscassem autonomia sobre suas vidas e também: (...) o acesso aos bens materiais (sobretudo alimentos e terra) e a bens espirituais (religião, música e dança). Essas táticas e esses objetivos definiam os elementos centrais da vida e da cultura dos escravos (...) (ANDREWS, 2007, p. 38 e 39). No pós-abolição na cultura negra o profano e o sagrado se consubstanciam aos momentos de alegria, de agradecimento, de amargura. Já sobre a ginga e o negro, Wilson do Nascimento Barbosa escreveu o seguinte: (...) A ginga era o modo de mover o corpo, até tornar tudo vazio, fundindo mente e corpo num único movimento. (SANTOS & BARBOSA, 1994, p. 30) Como afirma Procacci (1993, p. 16), apud (TEODORO, 2008) “os pobres não podem não ser iguais, participam do mesmo status jurídico de todos os demais cidadãos. Uma vez afirmada a igualdade formal, os pobres não podem ser excluídos dos direitos, consolidando um problema efetivo para o Estado e a sociedade moderna”. 4- A questão racial e a sociedade contemporânea: Os dados sobre a questão racial em âmbito nacional, apesar da implantação da SEPPIR Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, com o intuito da promoção de políticas públicas que combatam o racismo; dos direitos universais preconizados na Constituição de 1988; da introdução no calendário Nacional o feriado do dia 20 de novembro, como o "Dia Nacional da Consciência Negra"; da obrigatoriedade da temática História da cultura-africana e afro-brasileira por meio da Lei Federal (nº 10.639 7 de 09/01/2003); da introdução da Política de Ações Afirmativas (cotas em universidades públicas); do estatuto da Igualdade Racial; da formação dos Conselhos de Participação da Comunidade Negra, as disparidades econômicas, sociais, culturais e políticas ainda são prementes na sociedade contemporânea. Quando fomos ao campo de pesquisa no município de Santa Rita do Passa Quatro, ao perguntarmos se enquanto alunos os entrevistados haviam sofrido algum tipo de discriminação devido as suas heranças genéticas. Dos cinco afrodescendentes, três responderam que sim, e a resposta mais significante foi à relacionada ao sujeito número 1, a chamaremos pelo nome fictício de Maria. Sim, muito por colegas, professores... Fui até expulsa de escolas por causa de racismo...Quando eu estudava na escola Nelson Fernandes havia duas pessoas negras (uma delas era eu), a professora sempre tratava com pouco caso...desprezo...Percebendo essa situação, eu fiquei muito chateada com aquilo e cheguei nela para saber... porque! Ela respondeu que não gostava de pessoas negras, por isso eu fui expulsa...Também os colegas me tratavam com discriminação, faziam piadinhas, não gostavam de ficar junto... Esse fato repugnante, preconceito que leva ao tratamento segregacionista e até a expulsão. Esses fatos ainda acontecem, porque ainda temos uma escola desdenhada sob os moldes eugênicos, do branquemento, este âmbito onde deveria decorrer a inclusão para diversidade e a diferença, universal, equitativa, portanto, a consolidação da função democrática da instituição escolar. Ao perguntamos para Maria, o que é cidadania, a mesma respondeu o seguinte: não sei, estou nervosa.... E democracia? não lembro, não sei... Ao indagarmos se a mesma conhecia a Constituição de 1988, infelizmente a resposta ainda seguiu o mesmo padrão. Não sei o que é... Podemos acusar Maria? Não podemos, pois a mesma é fruto das relações étnicas desiguais que foram construídas, numa relação de centralização do poder econômico, político, social e cultural ter sido feito somente para uma parcela populacional. Concluímos que a comunidade afrodescendente desde o nascimento é excluída. São excluídos, desde o momento do parto, seguindo um cotidiano permeado por negações, preconceitos e rótulos. 8 Considerações Finais: Em Santa- Rita do Passa Quatro, os dados finais não são diferentes, temos uma comunidade afro-descendente empobrecida, discriminada, estigmatizada, na marginalização. Esses cidadãos vivem geralmente em bairros periféricos, desconhecem seus direitos. Portanto, percebe-se que as ações são segregacionistas, criadas pensando na macro realidade social. Os munícipes, quando entrevistados na coleta de dados, não sabiam da existência da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), da Lei 10.639, das ações afirmativas (cotas educacionais) e da Carta Magna de 1988. No município não temos o Conselho de Participação da Comunidade Negra, segundo as observações realizadas não existe interesse por parte do poder público em instituir esse órgão deliberativo. O mais agravante é que os entrevistados desconheciam a existência de conselhos municipais. Vale a pena ressaltar que no município não temos ações e nem políticas públicas para a comunidade negra com dotes inclusivos. Através da bibliografia consultada, compreendemos que temos um aparato legislativo invejável para o processo inclusivo de afrodecendentes no Brasil, mas por outro lado, percebe-se que os cidadãos não têm as informações e conhecimentos necessários para buscá-los. Outro fator preponderante, a importância em mudarmos a filosofia da cultura assistencialista; pois a assistência social com a promulgação da LOAS (Leis Orgânicas da Assistência Social) e da NOB (Normas Operacionais Básicas) foi ordenada como política pública garantidora de direitos a cidadania, num contexto democrático. Finalmente, devemos enquanto pesquisadores e profissionais assistentes sociais atentar para os preconceitos e estigmas, embasados na nossa ética profissional, levando a informação e o conhecimento para que o cidadão afrodescendente tenha voz e vez, no cenário político, social, econômico e cultural. Entendendo que (...) o assistente social não trabalha só com coisas materiais. Tem também efeitos na sociedade como um profissional que incide no campo do conhecimento, dos valores, dos comportamentos, da cultura, que, por sua vez, têm efeitos reais interferindo na vida dos sujeitos. (...) (IAMAMOTO, 2004, p.68) 9 Referências bibliográficas: ANDREWS, Georg R. América Afro-Latina 1800 – 2000. São Carlos: EDUFScar, 2007. FERNANDES, Florestan. A Integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1965. FREYRE, Gilberto, Casa grande & senzala. 13ª. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 2005. HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26.ed. 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