A CRIANÇA E O PROCESSO DE HOSPITALIZAÇÃO: OS DESAFIOS PROMOVIDOS PELA SITUAÇÃO DA DOENÇA MENÇA, Viviane Bayer 1, SOUSA, Sandra Sales Paula Silva2 ¹Graduanda do Curso de Psicologia da Faculdade Dom Bosco. [email protected] ²Psicóloga, Mestre em Psicologia Social e da Personalidade (UFRJ/ FGV) e docente do Curso de Psicologia da Faculdade Dom Bosco. [email protected] RESUMO A infância é a fase em que o indivíduo inicia a construção de sua relação com o próprio corpo e com o mundo externo, por meio de vivências pessoais, familiares e sociais. Entretanto, em caso de hospitalização, as privações e restrições impostas às crianças podem provocar grande sofrimento psíquico. O principal objetivo deste artigo é identificar e apresentar pesquisas que abordem temáticas relacionadas à vivência e aos desafios da criança hospitalizada e caracterizar a prática de cuidados dispensados as mesmas. Foram realizadas consultas a artigos indexados nas bases de dados: Data Mining, ISI, Medline, Pubmed e Scielo. A hospitalização infantil constitui-se em um fenômeno complexo, devendo ser compreendida em sua totalidade e considerar o desenvolvimento integral desses pacientes. Palavras-chave: Hospitalização infantil, adoecimento, hospital pediátrico, psicologia. ABSTRACT Childhood is the stage at which individuals begin building their interaction with their own body and the outside world, through personal, family and social experiences. However, in case of hospitalization, privation and restriction imposed to children can cause great psychological distress. The main objective of this paper is to identify and to present research results that address issues related to the experience and challenges of hospitalized children and to characterize the care given to them. Articles indexed in: Data Mining, ISI, Medline, Pubmed and SciELO were consulted. Children hospitalization constitutes a complex phenomenon that should be understood in its entirety and considered during the integral development of these patients. Keywords: Children hospitalization, illness, pediatric hospital, psychology. 1. INTRODUÇÃO O presente artigo objetiva apresentar pesquisas que abordem temáticas relacionadas à vivência da criança hospitalizada, tais como sua rotina hospitalar e o processo de adaptação à nova realidade, a fim de caracterizar a prática de cuidados dispensados às mesmas. Para tanto, foram realizadas consultas a artigos indexados em bases de dados como Data Mining, ISI, Medline, Pubmed e Scielo, com o intuito de identificar os conhecimentos disponíveis na área e fornecer subsídios para o atendimento da criança hospitalizada. A infância é um período muito importante na vida de qualquer indivíduo. É nesta fase que o indivíduo constrói sua relação com o próprio corpo e com o mundo externo por meio de suas vivências pessoais, familiares e sociais. É uma fase marcada pelas atividades físicas intensas, sendo que estas são necessárias para que a criança possa explorar e conhecer o ambiente a sua volta e assim, consequentemente, crescer e aprimorar seu conhecimento sobre o mundo. Todavia, no decorrer de seu desenvolvimento, as crianças também podem vivenciar períodos de doenças, o que muitas vezes pode ocasionar a hospitalização (OLIVEIRA, 2009). Para a compreensão do processo saúde-doença torna-se indispensável o entendimento de saúde e qualidade de vida. A Organização Mundial de Saúde (OMS) conceitua saúde como sendo um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Já a qualidade de vida é compreendida como sendo a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive em relação a seus objetivos, suas expectativas, seus padrões e suas preocupações (CALVETT, 2008). De acordo com Collet, Oliveira e Viera (2002), o hospital é uma instituição de atendimento à saúde que tem uma finalidade específica e exige dos profissionais uma atuação junto aos que precisam de assistência no processo diagnóstico-terapêutico. Considerando o aspecto histórico, verifica-se que o hospital foi concebido como instrumento terapêutico no final do século XVIII, porém a consciência de que o hospital era um instrumento destinado a curar apareceu apenas em torno de 1780 (FOUCALT, 1992). Anteriormente a isso, Mendonça (2009) relata que o hospital era o local dos doentes, moribundos e inválidos. No entanto, com o avanço da cientificidade médica, o hospital passa a ser visto como dispositivo de cuidado médico. Calvett (2008) afirma que o estudo da pediatria surgiu na última metade dos anos 1800, principalmente sob a influência do médico Abraham Jacobi (1830-1919), que é considerado o Pai da Pediatria. Abraham Jacobi desenvolveu novas pesquisas na investigação científica e clínica das doenças da infância, onde promoveu diversas perspectivas de como auxiliar a criança no processo saúde-doença. Collet, Oliveira e Viera (2002) afirmam que essas perspectivas influenciaram a visão dos profissionais sobre o ser criança, o papel da família, a abrangência da assistência, a composição e o interrelacionamento da equipe de saúde. Costa Junior, Coutinho e Ferreira (2006) apontam que o hospital pediátrico já foi historicamente visto como um ambiente potencialmente adverso e restritivo ao desenvolvimento humano. As diretrizes de atendimento hospitalar eram baseadas nos modelos biomédicos de saúde, que enfatizavam apenas o tratamento e a cura de doenças, desconsiderando a atenção integral às crianças e adolescentes e a manutenção de comportamentos de saúde. A criança hospitalizada era vista como um adulto, sem condições diferenciadas em sua assistência. Dessa maneira, o enfrentamento de situações que não contemplavam as necessidades mínimas do desenvolvimento infantil, promoviam comportamentos de rejeição à terapêutica prescrita pelos profissionais, comportamentos agressivos e dificuldades de socialização com as demais crianças e membros da equipe de saúde. Por conseguinte, Castro (2007) afirma que a Psicologia Pediátrica emergiu do reconhecimento da importância dos aspectos psicológicos para os problemas da saúde infantil, assim como da constatação da necessidade do conhecimento do desenvolvimento infantil e da preocupação em realizar intervenções breves e eficazes com as crianças. O termo Psicologia Pediátrica surgiu em 1968, quando profissionais interessados no cuidado da saúde de crianças, adolescentes e suas famílias, passaram a realizar uma avaliação e intervenção diferenciada. Desde então, essa área tem crescido e se ampliado. A definição atual de Psicologia Pediátrica se refere à aplicação dos conhecimentos da Psicologia da Saúde para a criança, o adolescente e suas famílias, contemplando o atendimento clínico, a pesquisa e o ensino. 2. VIVÊNCIA E DESAFIOS EXPERIMENTADOS PELA CRIANÇA HOSPITALIZADA Quando um indivíduo está hospitalizado, existe uma interrupção do seu ambiente habitual, alterando seus costumes, hábitos e sua capacidade de autorrealização e de cuidado pessoal (LÓPEZ, 1998). Frequentemente os pacientes são submetidos às condutas terapêuticas, tais como visitas, exames médicos, uso de medicamentos, rotinas rígidas de horários de alimentação, repouso e impossibilidade de locomoção (BARROS, 2009). Para a criança, a doença é um acontecimento inesperado e indesejável, onde todos os costumes próprios da infância tornam-se algo distante devido às restrições que a doença e o tratamento impõem (CARDOSO, 2007). Todas essas mudanças causam impacto na vida da criança e podem modificar seu comportamento durante e depois da internação. (OLIVEIRA, 2009). O adoecimento e a hospitalização trazem para a criança vivências novas e muitas vezes ameaçadoras. A doença coloca a criança e sua família diante da condição de finitude humana, na qual o temor à morte é intensificado em decorrência da situação de enfermidade que o paciente se encontra (LEPRI, 2008). Sendo assim, Angerami (2006) afirma que o hospital é uma instituição marcada pela luta constante entre a vida e a morte, possibilitando a cura, minimização ou suspensão do sofrimento. Dessa forma, Sanchez (2011) afirma que o ambiente hospitalar pode se tornar estressante, interferindo no estado psicológico da criança. Durante a internação hospitalar, a criança pode apresentar sofrimento psíquico, através da palavra, do comportamento e de reações emocionais, que muitas vezes são diferentes do habitual. As diferentes causas do estresse podem estar relacionadas ao medo da dor, das agulhas, exames e o receio de ser afastado dos familiares. É importante ressaltar que a falta de estratégias de enfrentamento para esta situação e o esquema de funcionamento estabelecido pelo ambiente hospitalar, podem contribuir para o surgimento de sentimentos de ansiedade e sintomas depressivos. Sanchez (2011) afirma que a depressão pode se manifestar através de problemas somáticos e alterações de comportamento. De acordo com a Associação Psiquiátrica Americana, os sintomas básicos de um Episódio Depressivo Maior são os mesmos para crianças e adolescentes. Na depressão infantil o diagnóstico pode ser realizado de acordo com os mesmos critérios utilizados na depressão adulta. Para um diagnóstico de Episódio Depressivo Maior é necessário que o indivíduo apresente durante ao menos duas semanas, cinco ou mais dos seguintes sintomas: humor deprimido; falta de interesse e prazer nas atividades; perda ou ganho de peso; alterações no sono; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimentos de inutilidade e culpa; indecisão e dificuldades de concentração; suicídio e tentativa de suicídio. O hospital é um ambiente que inspira receios e tristeza, sendo inevitável encontrar crianças com sintomas depressivos em virtude da hospitalização. A hospitalização e a doença interagem na vivência da criança, sendo necessário desenvolver intervenções preventivas para minimizar as consequências provenientes da doença orgânica, as quais dificultam o tratamento e a adesão aos procedimentos necessários para sua recuperação. Desse modo, Oliveira, Dantas e Fonseca (2004) relatam que informar as crianças dos seus direitos, enquanto hospitalizadas, suscita um maior entendimento e pode aliviar alguns dos sentimentos de impotência que elas tipicamente experimentam. Os hospitais que fornecem serviços de pediatria devem ter uma política hospitalar ampla sobre os direitos e responsabilidades dos pacientes e de seus responsáveis, inclusive no que compete ao acompanhamento de um adulto à criança hospitalizada. No Brasil, a preocupação com a permanência dos pais no hospital tornou-se mais efetiva após a promulgação da Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, regulamentando o Estatuto da Criança e do Adolescente e dispondo em seu Artigo 12: “os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsáveis, nos casos de internação de criança ou adolescente”. (BRASIL, 1991). A participação dos pais no ambiente hospitalar e sua permanência com os filhos durante a hospitalização têm papel preponderante no processo de cuidado da criança que sentirá maior segurança ao estar acompanhada neste momento diferenciado. A família pode auxiliar na observação da criança em diferentes situações e por mais tempo que o profissional que a acompanha. Os pais exercem papel fundamental no contexto da hospitalização infantil, na medida em que representam a referência fundamental da criança, enquanto mediadores da relação terapêutica, fonte principal de segurança e de carinho, além de apoio imprescindível ao enfrentamento desta situação desafiadora que é a doença e a internação. 2.1 O BRINCAR NO CONTEXTO HOSPITALAR De acordo com Sanchez (2011), a intervenção psicológica juntamente com o brincar são estratégias que promovem um ambiente preventivo de comportamentos de depressão, auxiliando a criança a enfrentar suas dificuldades. Carvalho (2006) aponta que todas as instituições voltadas para cuidados com a criança devem ser reconhecidas como espaços de desenvolvimento integral, a fim de contemplar uma equipe de profissionais especializados e conscientes das necessidades globais destes pacientes. Dessa maneira, Motta (2004) afirma que entre as possíveis estratégias utilizadas por crianças para enfrentar as condições estressantes está o brincar, recurso utilizado tanto pela criança, como pelos profissionais do hospital para lidarem com as particularidades da hospitalização. A importância do brincar no contexto hospitalar ganhou relevância social especialmente a partir do trabalho do médico Patch Adams (1999), nos Estados Unidos da América. Esta temática vem ocupando um espaço significativo no estudo da hospitalização infantil, trazendo questões relacionadas à sua importância no processo de humanização hospitalar. Sendo assim, torna-se importante a inserção do psicólogo nas enfermarias de pediatria, no sentido de desenvolver atividades lúdicas para que a criança experimente sua nova forma de ser ou estar, a fim de fortalecer sua autoestima e autoconceito, criando oportunidades de retorno ao equilíbrio psíquico. O reconhecimento da relevância do brincar no contexto hospitalar veio a instituir a Lei Federal nº 11.104 de 21 de março de 2005, que prevê a obrigatoriedade de instalação de brinquedotecas nas unidades de saúde que ofereçam atendimento pediátrico em regime de internação. De acordo com o Art. 2º, considera-se brinquedoteca, para os efeitos desta Lei, o espaço provido de brinquedos e jogos educativos, destinados a estimular o brincar nas crianças e seus acompanhantes. Verifica-se que o enfrentamento das consequências psicológicas da doença é favorecido com a utilização do lúdico, contemplando a abordagem em grupo, a fim de integrar as crianças e seus familiares e proporcionar momentos de satisfação e de reorganização das experiências (AZEVEDO, 2011). O brincar, para a criança tem importância tanto para o seu desenvolvimento sensório-motor e intelectual como para o processo de socialização e aperfeiçoamento da autoconsciência e da criatividade. O brincar também é uma forma eficaz de diminuir o estresse, pois nele a criança estimula sua criatividade, explora seus limites e expressa suas emoções (COLLET; OLIVEIRA, 2002). É brincando que a criança desenvolve o equilíbrio das emoções vividas, da necessidade de conhecer e reinventar a realidade, desenvolvendo a atenção, concentração e outras habilidades (PAULA; FOLTRAN, 2007). 2.2 A CLASSE HOSPITALAR COMO MODALIDADE DE ENSINO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL Com o intuito de evitar a interrupção da escolaridade das crianças hospitalizadas, o Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria Nacional de Educação Especial, prevê o atendimento educacional em classes hospitalares (OLIVEIRA; FILHO; GONÇALVES, 2008). A formulação da Política Nacional de Educação Especial (MEC/SEESP, 1994 e 1995) propõe que a educação em hospital seja realizada através da organização de classes hospitalares, devendo-se assegurar oferta educacional não só às crianças com transtornos do desenvolvimento, mas também às crianças e adolescentes em situações de risco, como é o caso da internação hospitalar (FONSECA, 1999). A classe hospitalar tem por objetivo recuperar a socialização da criança por um processo de inclusão, dando continuidade a sua aprendizagem. A criação de classes escolares em hospitais é resultado do reconhecimento formal de que crianças hospitalizadas, independentemente do período de permanência na instituição ou de outro fator qualquer, têm necessidades educativas e direitos de cidadania, onde se inclui a escolarização. O médico francês Henry Wallon (1879 – 1962), um dos pioneiros da psicologia infantil, dizia que “aprender alivia a dor infantil e, se alivia a dor infantil o educador tem algo a fazer onde há crianças sofrendo por questões de saúde" (MATA, 1997). Sendo assim, o professor que trabalha na classe hospitalar é um profissional que tem formação de educador e por meio de atividades pedagógicas pode fazer um elo entre a realidade hospitalar e a vida cotidiana da criança internada. O professor pode avaliar, acompanhar e intervir no processo de aprendizagem da criança, além de oferecer informações para a compreensão do processo de elaboração da doença e da morte, explicando procedimentos médicos e auxiliando na adaptação ao hospital (MEDEIROS; GABARDO, 2005). 2.3. A MORTE DA CRIANÇA HOSPITALIZADA E O LUTO FAMILIAR A morte, como cessação definitiva da vida, faz parte do desenvolvimento do ser humano e é algo biologicamente natural, embora vivida socialmente. Falar sobre a morte implica lidar com sentimentos de tristeza, pela constatação da nossa finitude e pelo medo do desconhecido (KOVACS, 1992). A maneira como a morte é compreendida é dinâmica ao longo do desenvolvimento humano. Desde a infância, as pessoas têm contato com perdas, mas é na velhice que sua possibilidade parece ser mais considerada, uma vez que tal etapa é encarada como última no ciclo de desenvolvimento humano. Assim, a morte de uma criança é percebida como uma interrupção precoce no ciclo da vida, provocando, naqueles que ficam, sentimentos de fracasso e frustração e tornando a superação da perda uma tarefa difícil. (BITTENCOURT, 2011). A morte de um filho é um processo biopsicossocial e frequentemente provoca um luto patológico. Sua compreensão requer a reconstrução de uma nova realidade para a família, onde as anteriores expectativas em relação à criança foram inesperadamente desfeitas. O luto parental costuma tomar proporções de sofrimento tão intensas, afetando, além do próprio indivíduo, o seu relacionamento com o parceiro e também com a dimensão social (BITTENCOURT, 2011). Segundo Papalia (2009), o luto consiste em uma resposta emocional vivenciada nos primeiros estágios da perda. Para Kubler Ross (2005), há cinco estágios pelos quais as pessoas passam ao lidar com a perda, denominados: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. É importante ressaltar que nem todos passam pelos estágios dentro dessa ordem e nem todos completam o processo. O tempo de permanência em cada estágio dependerá de diversos fatores como estrutura de personalidade, apoio familiar, apoio social, tipo de cultura, idade e forma de comunicação do diagnóstico. Para Kovács (1992), o processo de luto só estará finalizado quando existir "a presença da pessoa perdida internamente em paz", havendo "um espaço disponível para outras relações", sendo, portanto, necessário um tempo para vivenciar o luto, e não para negá-lo. Vivenciar o sentimento de perda é importante para que se possa externalizar a dor, o que proporciona as condições necessárias para uma boa elaboração do luto e possibilita a retomada da vida, ao lado das lembranças boas. Bolze e Castoldi (2005) complementam que o luto não inicia com a morte e, especialmente no caso das crianças hospitalizadas, ele já estará sendo experienciado a partir da qualidade das relações familiares existentes antes, pela qualidade dos vínculos estabelecidos e, também, influenciado por condições atuantes mais próximas à morte propriamente dita. O luto, mesmo quando considerado normal, não significa que não seja sofrido ou que não exija um grande esforço de adaptação às novas condições de vida, tanto por parte de cada um dos indivíduos afetados, quanto no sistema familiar, que também sofre impacto em seu funcionamento e em sua identidade. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir do trabalho de pesquisa desenvolvido, verifica-se que os desafios trazidos pela hospitalização infantil são múltiplos. A hospitalização infantil pode alterar significativamente o desenvolvimento infantil, sendo que está diretamente ligada à retirada do convívio familiar, ao afastamento dos amigos, à privação da vida escolar e do ato de brincar e substituída por situações ameaçadoras e dolorosas. Por outro lado, a hospitalização também traz consigo inúmeras possibilidades, como a da cura e suspensão da dor através de procedimentos médicos e rotinas terapêuticas adotadas no hospital. Entretanto, a morte também pode estar presente no dia a dia das unidades de internação. Apesar de a morte ser um aspecto inerente à nossa condição humana, esta possibilidade parece ser mais dolorosa quando se estende à população infantil. Admitir a morte de uma criança parece retirar a esperança, colocandonos diante do fim prematuro de uma existência. Dessa maneira, torna-se evidente a necessidade de cuidado também ao cuidador, seja este o profissional ou o familiar que acompanha esse desfecho. Concluindo, nota-se que a hospitalização infantil constitui-se em um fenômeno complexo, com implicações profundas, que deve ser compreendido em sua totalidade, pois compreende um leque de variáveis a serem consideradas. Tendo em vista o reconhecimento destas implicações, torna-se indispensável considerar a integralidade do cuidado à criança, para que o paciente não seja visto como portador de uma doença, mas como um ser humano provido de necessidades, expectativas e sentimentos. A promoção do envolvimento das famílias nos cuidados da criança enferma e a garantia do direito de ter a presença de um acompanhante durante todo o tempo de sua internação é um grande avanço em termos da humanização do atendimento à criança. Verifica-se que a família pode ser grande fonte de segurança para o paciente infantil, por ser a instituição primária na qual se processam as relações interpessoais e afetivas, ou seja, tanto a família faz parte da vida dos filhos, como os filhos fazem parte da família. No contexto hospitalar, a família assume novos papéis, tais como informantes, auxiliares de tratamento e acompanhantes na experiência da hospitalização. A interação entre a família e a equipe é necessária para que a hospitalização infantil resulte em esforço conjunto, para manter a vida da criança, superando suas dificuldades cotidianas. A atividade na brinquedoteca, com as crianças e os pais que os acompanham, se insere como uma tentativa de transformar o ambiente das enfermarias, proporcionando condições psicológicas melhores para as crianças internadas, pois favorece o acesso à atividade simbólica e a elaboração psíquica de vivências do cotidiano infantil. As atividades escolares e principalmente as lúdicas, tais como o desenho livre, o contar histórias, o brincar com bonecos e jogos facilitam para a criança a assimilação da realidade externa à realidade interna, auxiliando no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e também o desenvolvimento de habilidades cognitivas. Dessa forma, a intervenção psicológica juntamente com o brincar são estratégias que promovem um ambiente que tenta minimizar sentimentos depressivos e efeitos iatrogênicos, auxiliando a criança a enfrentar as dificuldades do processo de internação e da doença. Verifica-se, portanto, a importância da adoção de cuidados de psicologia preventiva, além de outras atribuições específicas por parte do psicólogo, visando o bem-estar individual e social, através do diálogo com o paciente, seus familiares e a equipe de saúde. O atendimento à criança hospitalizada deve conceber todas as instituições voltadas aos cuidados para com ela como espaços de desenvolvimento integral, contemplando uma equipe de profissionais especializados e conscientes das necessidades globais dos pacientes. 5. REFERÊNCIAS ANGERAMI, Valdemar Augusto. Psicologia da Saúde: um novo significado para a prática clínica. São Paulo: Thomson Learning, 2006. ASSOCIAÇÃO PSIQUIÁTRICA AMERICANA. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.4.ed. Texto revisado. São Paulo: Artmed, 2003. AZEVEDO, Adriano Valério dos Santos. O brincar da criança com câncer no hospital: análise da produção científica. Estud. psicol. (Campinas), Campinas, v. 28, n. 4, Dez. 2011. BARROS, Danielle Marotti de Souza; LUSTOSA, Maria Alice. A ludoterapia na doença crônica infantil. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 12, n. 2, dez. 2009 . BITTENCOURT, Ana Luiza Portela; QUINTANA, Alberto Manuel; VELHO, Maria Teresa Aquino de Campos. A perda do filho: luto e doação de órgãos. Estud. psicol. (Campinas), Campinas, v. 28, n. 4, Dez. 2011. BOLZE, Simone D. A.; CASTOLDI, Luciana. O acompanhamento familiar antes e depois da morte da criança: uma proposta de intervenção para o psicólogo hospitalar. Aletheia, Canoas, n. 21, jun. 2005. BRASIL. Conselho nacional dos direitos da criança e do adolescente. Resolução n.41, de 13 de outubro de 1995. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília: Ministério da Saúde, 1991. BRASIL. Política Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC Secretaria de Educação Especial, 1994. CALVETT, Prisla Ücker; SILVA, Leonardo Machado da; GAUER, Gabriel José Chittó. Psicologia da saúde e criança hospitalizada. Psic, São Paulo, v. 9, n. 2, dez. 2008 CARDOSO, Flávia Tanes. Câncer infantil: aspectos emocionais e atuação do psicólogo.Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, jun. 2007 . CARVALHO, A. M., & BEGNIS, J. G. Brincar em unidades de atendimento pediátrico: aplicações e perspectivas. Psicologia em Estudo. Maringá, 2006. CASSORLA, R.M.S. Como Lidamos com o Morrer - Reflexões Suscitadas no Apresentar este Livro. In: Cassorla, R.M.S. (org.). Da Morte: Estudos Brasileiros. Campinas: Papirus, 1998. CASTRO, Elisa Kern de. Psicologia pediátrica: a atenção à criança e ao adolescente com problemas de saúde. Psicol. cienc. prof., Brasília, v. 27, n. 3, Set. 2007 . COLLET, Neusa; OLIVEIRA, Beatriz Rosana G. de; VIERA, Claudia S. Manual de enfermagem em pediatria. Goiânia: AB, 2002. COSTA JUNIOR, Áderson Luiz; COUTINHO, Sílvia Maria Gonçalves; FERREIRA, Rejane Soares. Recreação planejada em sala de espera de uma unidade pediátrica: efeitos comportamentais. Paidéia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto, v. 16, n. 33, abr. 2006 . FAQUINELLO, Paula; HIGARASHI, Ieda Harumi; MARCON, Sonia Silva. O atendimento humanizado em unidade pediátrica: percepção do acompanhante da criança hospitalizada. Texto contexto - enferm., Florianópolis, v. 16, n. 4, Dez. 2007 . FONSECA, E. S. Atendimento pedagógico-educacional hospitalar: promoção do desenvolvimento psíquico e cognitivo da criança hospitalizada. In: Temas sobre Desenvolvimento, v.8, n.44, p. 117, 1999. FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 10. ed. Rio de Janeiro: Graal. 1992. KOVÁCS, M.J. Morte e Desenvolvimento Humano. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1992. KUBLER-ROSS, E. (2005). Sobre a Morte e o Morrer. São Paulo: Martins Fontes. LEI no. 11.104 de 21 de março de 2005. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2005/Lei/L11104.htm> LEPRI, Patricia Maria Fassina. A criança e a doença: da fantasia à realidade. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, dez. 2008 . LOPEZ, Mercedez Arias. Hospitalização. Trad. Maria Teresa Ramalhal Teixeira. São Paulo: McGraw-Hill, 1998. REDONDO DE LA CRUZ, Maria Jesus. MATA, A. No Getulinho, educadores aprendem a aliviar a dor da criança hospitalizada. In.:Casarão. Jornal do Laboratório do Curso de Jornalismo UFF/IACS - Departamento de Comunicação Social. Niterói, v. 6, n. 29, 1997. MEDEIROS, J., GABARDO, A.. Classe hospitalar: aspectos da relação professor-aluno em sala de aula de um hospital. Interação em Psicologia, América do Norte, 8, abr. 2005. MELO, Wilson Vieira de; HOHENDORFF, Jean Von. Compreensão da morte e desenvolvimento humano: contribuições à psicologia hospitalar. Rev. Estudos e Pesquisas em Psicologia, Rio de Janeiro, v.9, n.2, 2009. MENDONCA, Vitor Silva. Sofrendo entre quatro paredes: relatos de mães acompanhantes dos filhos hospitalizados. Rev. electrón. psicol. polít. (Enlínea), San Luis, v. 7, n. 19, abr. 2009 . MENEZES, Marina; MORE, Carmen Ocampo; BARROS, Luísa. Psicologia Pediátrica e seus desafios atuais na formação, pesquisa e intervenção. Aná. Psicológica, Lisboa, v. 26, n. 2, abr. 2008 . MOTTA, Alessandra Brunoro; ENUMO, Sônia Regina Fiorim. Brincar no hospital: estratégia de enfrentamento da hospitalização infantil. Psicol. estud., Maringá, v. 9, n. 1, Apr. 2004 OLIVEIRA, Gislene Farias de; DANTAS, Francisco Danilson Cruz; FONSECA, Patrícia Nunes da. O impacto da hospitalização em crianças de 1 a 5 anos de idade. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 7, n. 2, dez. 2004. OLIVEIRA, Lecila Duarte Barbosa et al . A brinquedoteca hospitalar como fator de promoção no desenvolvimento infantil: relato de experiência. Rev. bras. crescimento desenvolv. hum., São Paulo, v. 19, n. 2, ago. 2009. OLIVEIRA, Linda Marques; FILHO, Vanessa Cristiane; GONÇALVES, Adriana Garcia. Classe Hospitalar e a Prática da Pedagogia. In: Revista Científica Eletrônica de Pedagogia. São Paulo, n. 11, Janeiro de 2008. PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W. Desenvolvimento Humano. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2009. PAULA, Ercilia Maria A.T. de.; FOLTRAN, Elenice Parise. Projeto brilhar: brinquedoteca, literatura e arte no ambiente hospitalar. In: Anais do VII Encontro de Pesquisa UEPG e V CONEX. Ponta Grossa: Universidade Estadual de Ponta Grossa, 2007. SANCHEZ, Marisa Leonetti Marantes; EBELING, Vanessa de Lourdes Nunes. Internação infantil e sintomas depressivos: intervenção psicológica. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, jun. 2011 . TADA, Iracema Neno Cecilio; KOVACS, Maria Júlia. Conversando sobre a morte e o morrer na área da deficiência. Psicol. cienc. prof., Brasília, v. 27, n. 1, mar. 2007..