XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 ANÁLISE E CARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES CLIMÁTICAS INERENTES AO PROJETO HIDROVIA-HIDRELÉTRICAS DO ALTO MADEIRA-RO Dorisvalder Dias Nunes Coordenador do LABOGEOHPA/DG-UFRO – [email protected] Joiada Moreira da Silva. Bolsista do CNPq/bacharelando do curso de Geografia/UFRO Déborah Pereira Linhares, Bolsista do CNPq/acadêmica do curso de Geografia/UFRO Luiz Cleyton Holanda Lobato, Pesquisador/colaborador/acadêmico do curso de Geografia/UFRO Aldina Gomes de Assunção, Pesquisador/colaborador/acadêmica do curso de Geografia/UFRO Rydianne Carvalho Moura Pesquisador/colaborador/acadêmica do curso de Geografia/UFRO ABSTRACT The purpose of this paper is to discuss a proposal in order to establish a Hidroelectrical enterprise in Madeira river, on the track Porto Velho, Guajará-Mirim. This paper has two analytical extension: The social-economic aspects related to the enterprise implications on the waterside population and the physical aspects related to the climatic characteristics of the regional environment, determining so, the central point of the study. Therefore, from the point of view of the climatic analysis, it was identified and characterized the indexes of Evaporation, Transpiration, Deficient and Hydric Excess, to establish the Hydric oscillation. INTRODUÇÃO A discussão deste trabalho nasce a partir da proposição do Poder Público em Rondônia, para implementação de um complexo Hidrelétrico/Hidroviário no Rio Madeira, trecho à montante de Porto VelhoRO. De modo geral a abordagem foi dividida em dois aspectos: sócio-econômico, relacionado às implicações que o empreendimento deve causar às populações ribeirinhas. O segundo aspecto trata do meio físico caracterizado pela análise climatológica, este último, constituindo o ponto central da pesquisa. O objetivo geral foi o de analisar os condicionantes climáticos, tais como: precipitação pluviométrica, temperatura e evapotranspiração na bacia do Rio Madeira; considerando os índices climatológicos para implementação do Projeto Hidrelétrica/Hidrovia do Alto Madeira Rondônia – PHHAM/RO, de modo a verificar a capacidade de suporte a partir das características climatológicas, com dois objetivos específicos: o primeiro estabelecer através de “Balanço Hídrico” os índices de evapotranspiração potencial, evapotranspiração real, deficiência hídrica e excedente hídrico na área de estudo. O segundo, detectar as influências do clima na formação da Bacia do Rio Madeira, considerando os fenômenos hidrológicos: Escoamento Superficial e Evapotranspiração. O estudo do clima para implantação do PHHAM/RO encontra justificativa na relevância que possui um empreendimento desse porte, principalmente quando se considera que o represamento é de caráter longitudinal obedecendo a morfologia fluvial que possui o rio Madeira. Isto considerado verifica-se a importância do estudo climático e sua relação com as características da bacia do Rio Madeira juntamente com seus principais formadores: o Rio Beni e o Rio Mamoré, ambos com suas cabeceiras na Cordilheira dos Andes. Esse trecho possui peculiaridades climáticas fundamentais à implementação do empreendimento. O Projeto PHHAM/RO, proposto pelo poder público, indica a construção na Bacia Hidrográfica do Rio Madeira de três barramentos com importante potencial de geração de eletricidade. Esse empreendimento aproveitará as formações geológicas de intrusões graníticas do Proterozóico Médio e Superior da Cachoeira do Santo Antônio e Salto Jirau, em águas brasileiras e cachoeira Esperanza no Rio Beni na Bolívia (INTEROCEAN, S/D). 13 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 De acordo com o termo de referência do PHHAM/RO, as estruturas físicas das Hidrelétricas que deverão ser instaladas nas cachoeiras de Santo Antônio e Salto Jirau, terão uma altura de 25 a 30 metros de coroamento, cada barragem; na cachoeira de Esperanza a barragem terá altura entre 10 e 15 metros de coroamento. O aproveitamento desses Barramentos para geração de energia elétrica prevê um total de 7.5000 MGV gerados no Brasil. As análises climatológicas realizadas pelo poder público no âmbito do PHHAM/RO são abordadas de forma superficial, sendo necessária a realização de um diagnóstico com maior detalhamento das condições climáticas e a variabilidade dos indicadores de precipitação, temperatura, umidade relativa do ar, evapotranspiração e as influências da circulação atmosférica na distribuição desses elementos em conjunto com os fenômenos hidrológicos responsáveis pela formação de águas superficiais na área de estudo. Alguns aspectos das ciências ambientais serão abordados nesta pesquisa, onde se destacam dois de grande relevância: a Climatologia e a Hidrologia. O trabalho apresenta uma caracterização do clima e verticaliza nos aspectos metodológicos para inferência de cálculos de balanço hídrico conforme Thornthwaite e Mather (1955) relacionando com o nível do rio Madeira. MATERIAIS E MÉTODOS Para o desenvolvimento da Pesquisa sobre o empreendimento Hidrovia-Hidrelétrica do Rio Madeira, optou-se pela proposta metodológica de pesquisa em geografia de LIBAUT (1971), ratificada por ROSS (1996), que estabelece os quatros níveis da pesquisa geográfica: o nível compilatório, nível correlativo, nível semântico e nível normativo. No primeiro nível realizou-se o levantamento do material bibliográfico e a coleta de dados pertinentes ao tema proposto nesta pesquisa. No segundo nível foram feitas as análises dos dados com base no método de balanço hídrico de Thorntrwaite e Matler (1955). No terceiro nível se estabeleceu as discussões teóricas, relacionando os aspectos climatológicos e suas implicações na viabilidade do PHHAM/RO. O quarto nível refere-se a normatização dos resultados e seu tratamento analítico, representado por tabelas, quadros, gráficos, figuras, mapas, cartogramas e considerações finais. AMOSTRAGEM Para a coleta dos dados selecionou-se previamente nove pontos de coleta. Destes, dois pontos com estações automáticas e sete postos pluviométricos. Foram coletados os índices de temperatura e precipitação na área de estudo. Os pontos de coleta dos dados selecionados estão localizados próximo à margem dos rios Madeira, Mamoré e Guaporé. Salienta-se que os dados foram obtidos a partir de relatórios meteorológicos de entidades públicas e privadas, tais como: CPRM, DCPPVH-RO, EMBRAPA, DNAEE, IBGE, SEDAM e SEPLAN. Os índices referentes a temperatura e precipitação são valores de média mensal e anual do período de 1969 à 1998. APLICAÇÃO DO MÉTODO DE BALANÇO HÍDRICO PARA QUANTIFICAÇÃO DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO Para análise dos dados determinou-se o cálculo de balanço hídrico utilizando o método de Thornthwaite e Mather (1955). O cálculo é feito individualmente para cada ano sem interrupção para períodos longos (29 anos). Assim, os elementos mensais dos métodos de balanço hídrico calculados são: Evapotranspiração potencial, evapotranspiração real, deficiência hídrica e excedente hídrico. Estes elementos permitem detectar dentro de um limite de confiabilidade, anormalidade climática que poderá vir a comprometer o PHHAM/RO, caso seja implementado. Para o método adotado foi considerada a capacidade máxima de retenção de água disponível em “100mm”, independente do tipo de solo para o balanço hídrico anual. A mensuração de balanço hídrico, segundo o método de Thornthwaite e Mather (1955) limita-se a área compreendida entre a cachoeira de Santo Antônio e o Salto de Jirau, com a caracterização do clima estendendo-se a Guajará-Mirim-RO. 14 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O clima de um lugar é representado pela variação dos índices de temperatura, precipitação e massas de ar. A temperatura oscila de acordo com a incidência dos raios solares que atinge a superfície terrestre e proporcionam uma variação térmica do clima considerando as características fisiográficas dos lugares. A precipitação, considerando as ocorrências de chuvas, corresponderá o grau de umidade (seco ou úmido). A área de estudo localiza-se entre os paralelos 08º46’55’’ e 10º47’00’’ de latitude sul e meridianos 63º05’00’’ e 65º20’00’’Longitude Oeste, na porção meridional da Amazônia legal. As temperaturas oscilam entre 24,5°C a 26,5°C durante o ano e a umidade relativa do ar está acima de 90% devido a posição latitudinal da área do PHHAM/RO. Essas duas variáveis climáticas contribuem para o elevado índice de evapotranspiração potencial superior a 1400mm, deixando o ar carregado de umidade suficiente para a ocorrência de alto índice pluviométrico sempre superior a 1900mm anuais. De acordo com MOLION (1988), a área de estudo encontra-se na região climática denominada “Cinturão do Equador” correspondente a uma faixa compreendida em 13º de Latitude Norte e 17º de Latitude Sul. Nessa faixa tem-se o maior índice de insolação do planeta, visto que o período iluminado do dia apresenta sempre a mesma quantidade de horas durante o ano e não é influenciado pelo equinócio. A área do PHHAM/RO está inserida nesta faixa de Latitude de insolação local, considerada como máxima. Onde informa que o fenômeno constituído pelo Binômio (insolação e evapotranspiração) é a maior fonte natural de transferência do calor para as regiões subtropicais (MOLION, Op. Cit.). O Binômio climático atuante na região justifica o regime termodinâmico pluviométrico e umidade presente no ar (evapotranspiração). Estes podem influenciar no nível do rio Madeira na área do PHHAM/RO apresentando os seguintes aspectos: • Características do clima: A região onde está localizada a área de estudo do PHHAM/RO sofre influência do sistema de circulação atmosférica atuante na Amazônia, como é o caso da massa equatorial continental (mEc), da frente polar (FP), das correntes de ar, a linha de instabilidade tropical (IT) e a convergência intertropical (CIT). A mEc, quente e úmida, predominante na Amazônia, é responsável pelas chuvas regionais que na área de estudo se apresentam mais abundantes nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, com média superior a 100mm mensais A FP, originária na Antártida, chega ao continente sulamericano inicialmente seguindo a tragetória a oeste dos Andes, posteriormente a leste desta cordilheira, após transpô-la ao sul do Chile invade a região norte com ventos girando de oeste à sul e provocando em sua passagem chuvas frontais e sensíveis quedas de temperatura. Atinge o Brasil e conseqüentemente a área de estudo, o que provoca as chamadas ondas de frio (“Friagem”) (NIMER, 1989). O regime de chuvas define-se por dois períodos distintos: um bastante chuvoso devido a influência da passagem da IT (ou da CIT) e outro caracterizado pela ausência de chuvas (estiagem), com índice mensal inferior a 60mm, principalmente nos meses de junho, julho e agosto. Neste período na área de estudo as estações registram índice ”zero” de precipitação (EMBRAPA, 1998). A umidade relativa do ar no clima regional e na área analisada possui um percentual superior a 80% e inferior a 95% anual. A característica climática do PHHAM/RO está submetida ao grupo do clima “tropical chuvoso”, apresentando os tipos Am e Aw segundo a classificação de KOPPEN. O tipo Am caracteriza-se por apresentar totais pluviométricos elevados e moderados com períodos de estiagem e o Aw por totais pluviométricos anuais oscilando entre elevado e moderado, elevado e nítido períodos de estiagem. O tipo Am é encontrado nas regiões de Vale do médio rio Madeira e o Aw na região do baixo rio Mamoré e todo Vale do rio Guaporé (SCHMIDT,1942). • Índice de Temperatura: A área do PHHAM/RO, por estar localizada na “zona intertropical tórrida” (CONTI, 1998) e nas baixas latitudes, recebe grande quantidade de energia solar, o que proporciona uma elevada temperatura, registrando 17,8ºC (mínima) nos meses mais amenos e 35,0ºC (máxima) nos meses mais quentes. As médias de temperatura predominantes variam entre 24,8ºC e 27,2ºC anuais, considerando o período de observação 1969/1998. A temperatura registrada na área e o período considerado apresentam uma média de 25,4º C com uma amplitude de 1,5ºC a 2,5º C anuais • Aspectos Pluviométricos: Os totais de chuvas anuais no período de 1969/1998 na área de estudo do PHHAM/RO oscilaram entre 1220 e 2834mm, conforme distribuição no decorrer dos meses. O 15 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 regime de chuvas caracteriza-se por duas épocas distintas: a chuvosa, com duração média 08 meses de outubro a maio com maior intensidade de precipitação nos meses de dezembro a março em toda área de estudo, considerando a classificação do clima de Rondônia (KOPPEN, 1936). No período de chuvas os índices mensais são superiores a 10mm. Mas nos anos 1975, 1976, 1978, 1980, 1984, 1989, e 1991 ocorreram chuvas com valores mensais predominantementes superiores a 500mm. A época menos chuvosa corresponde aos demais meses do ano, período de estiagem, ocorrendo nos meses de junho a agosto, chovendo menos de 60mm mensais. Em 1978, 1983, 1984, 1988, 1997, nesta estação a estiagem atingiu seu ponto crítico quando registrou-se “zero” de chuvas na área de estudo, de modo que: “As chuvas convectivas ocorrem principalmente no verão em decorrência do diferente aquecimento basal da atmosfera em contato com uma superfície heterogênea”,, podendo ser restritas à escala local ou provenientes de instabilidade tropical(IT) de noroeste associadas às calhas induzidas”(TAVARES,1981). Com base nessa afirmação, as chuvas convectivas ocorrem com mais freqüência na região e consequentemente na área do PHHAM/RO. A área de estudo ainda apresenta fenômenos considerados como “anomalias na variação dos índices de chuva” (CPTEC, 1998), que podem repetir-se num curto intervalo de tempo. Este fenômeno ocorreu nos anos de 1971, 1987, 1987, 1988, 1995 e 1998 com pluviosidade abaixo de 2.300 mm, que é considerada a média anual. De modo geral, a pluviosidade na área do PHHAM/RO varia pouco, com exceção da região próxima a cidade de Guajará Mirim-RO, onde a média de precipitação reduz bruscamente para índices entre 1241.0mm e 2033.5mm. O gráfico I é um demonstrativo das médias anuais de chuvas ocorridas na área de estudo no período de 1969 a 1998. 4.000 28,0 26,0 24,0 22,0 2.000 7 19 1 73 19 75 19 7 19 7 79 19 8 19 1 83 19 8 19 5 87 19 8 19 9 91 19 9 19 3 95 19 97 19 19 69 0 TEMPERATURA PRECIPITAÇÃO GRÁFICO I - DEMONSTRATIVO DA VARIABILIDADE MÉDIA ANUAL DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO DA PHAM/RO 1969 À 1998 SÉRIE AMOSTRAL FONTE: Relatório Meteorológico e Variações do Nível do Rio Madeira DCPPVH/CPRM(1990-1998), EMBRAPA(1977-1998), SEDAM/DNAEE(1970-1995), IBGE(1969), SEPLAN(1996). • Aspectos Termodinâmicos: O regime térmico na área do PHHAM/RO é expresso por valores de temperatura elevada durante todo o ano com uma média mensal de 25,4ºC. Os meses mais quentes vão de maio a novembro, onde a média diária da temperatura máxima chega a ser superior a 30,9ºC e a temperatura mínima oscila entre 19,2ºC e 20,0º C. As menores temperaturas decorrem da invasão de massa polar que não é freqüente na região e conseqüentemente na área de estudo. Portanto, é normal a ocorrência do fenômeno, resultante de dias quentes e noites com temperaturas amenas, ocasionando um desequilíbrio térmico com o frio. Conforme AYOADE (1991), “As variações sazonais na temperatura resultam principalmente das variações no volume de insolação recebida em qualquer lugar sobre o globo. As temperaturas são mais elevadas no verão quando os volumes de insolação são mais baixos. As variações sazonais na temperatura do ar são maiores nas áreas extratropicais, 16 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 particularmente nas superfícies hídricas. Portanto podemos dizer que as variações sazonais da temperatura aumentam com a latitude e com o grau de continentalidade”. Diante do exposto é possível inferir que na área de estudo a temperatura está relacionada a sazonalidade do clima Amazônico, caracterizado por temperaturas oscilantes que influenciam na média anual e podem, ainda, influenciar o aumento do índice de evapotranspiração tanto potencial como real. • Evapotranspiração Potencial: A EP para a área de estudo foi estabelecida pelo cálculo de balanço hídrico conforme método de Thonthwaite e Mather (1955) com uma média anual de 1488mm. A EP na área do PHHAM/RO apresenta-se elevada por ser uma região com grande incidência de radiação solar, onde os valores variam entre 1368mm a 1723mm. Esta flutuação está relacionada com a temperatura e a precipitação, pois a redução de um destes dois fenômenos provoca, dentre outros fatores, a redução na evapotranspiração potencial. A precipitação fornece umidade ao solo para que desta forma ocorra evaporação de vapor d’água. Através da temperatura o solo permanece úmido, permitindo que este fenômeno ocorra. Sendo assim, é importante observar o que NIMER (1989) indica, pois considera que, “a evapotranspiração potencial - EP apresenta-se como fator térmico no clima. Corresponde a capacidade de evapotranspiração em milímetros de área coberta e com solo bem suprido de umidade. Uma área com as características descritas apresenta perda de água, para a atmosfera condicionada pela disponibilidade de energia solar. Quanto maior for a energia disponível, tanto maior será a evapotranspiração potencial. Ela corresponde à chuva teoricamente necessária para manter o vegetal sempre suprido de água”. No período de observação (1969/1998), registrou-se os maiores índices de EP nos meses de outubro a abril. Este fenômeno ocorreu em virtude da elevada temperatura e abundância de chuvas na área de estudo, onde os valores mensais foram superiores a 110mm. Os meses de menor incidência, junho a setembro, apresentaram valores mensais inferiores a 100mm, chegando a índices abaixo de 50mm mensais no mês de junho e julho causados pela diminuição da temperatura. A intensidade da EP depende principalmente dos fatores meteorológicos com a temperatura, que nos anos de 1969 a 1972 e 1996 a 1998, apresentou valores superiores a 1500mm anuais. Esta alta nos anos citados está relacionada às temperaturas superiores a 26º C anuais e a radiação solar que proporciona uma temperatura espacial de acordo com a cobertura vegetal e disponibilidade de água no solo, que segundo BEZERRA (1994), é proveniente das chuvas infiltradas e nesta situação, justifica os altíssimos índices de EP na área do PHHAM/RO. • A evapotranspiração real – ER, é definida por VILLELA (1975) como sendo a “perda de água reduzida total ou parcialmente por falta de umidade no solo. Assim, evapotranspiração real poderá se mostrar inferior ou igual a potencial”. Na área do PHHAM/RO está relacionada aos índices de precipitação e temperatura da região e, em alguns períodos, apresenta-se inferior ou igual às EPs mencionadas. Os valores de evapotranspiração real - ER da PHHAM/RO apresentaram uma média anual de 1282mm e variando entre 1167mm a 1535mm, ocorrendo com maior intensidade principalmente nos meses de outubro a maio. Nestes períodos a ER, chega a ser superior a 110 mm mensais. Nos meses de junho a setembro, ocorre a redução do índice de ER, inferiores a 100mm mensais, o que corresponde ao mesmo período do ano em que ocorreram os menores índices de EP. Na ER os menores índices estão acima de 80mm mensais compreendendo os meses de agosto e setembro, período marcado pelo princípio de chuvas. Na área de estudo, os índices de ER superaram 1350mm mensais nos anos de 1974, 1989, 1993 e 1994. Este fenômeno está relacionado a alta pluviosidade da área do PHHAM/RO. Os anos de 1969, 1970, 1971, 1995 e 1998 a ER apresentam médias superiores a 1100mm anuais. Portanto, a ER, assim como a EP, está diretamente relacionada aos índices da temperatura local. No entanto, os valores da ER são menores por influência das chuvas. Os valores incorporados na base calculada para mensuração com maior precisão da ER na área de estudo no período de 1969/1998 pode ser compreendido através do Gráfico II. 17 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 2000 2000 1500 1500 1000 1000 500 500 0 ER EP GRÁFICO II - EVAPOTRANSPIRAÇÃO POTENCIAL E REAL DO PHAM/RO 29 27 25 23 21 19 17 15 13 11 9 7 5 3 1 0 SÉRIE AMOSTRAL - 1969/1998 Seqüência2 Seqüência1 FONTE: Relatório Meteorológico e Variações do Nível do Rio Madeira DCPPVH/CPRM(1990-1998), EMBRAPA(1977-1998), SEDAM/DNAEE(1970-1995), IBGE(1969), SEPLAN(1996). DEFICIÊNCIA E EXCEDENTE HÍDRICO NA ÁREA DO PHHAM/RO Em toda área de estudo, verificou-se um regime hídrico anual de excessos e deficiências hídricas sazonais, de certa forma prevista pelo menos em termos quantitativos. A localização da área de estudo, na porção meridional da Amazônia com grandes excessos hídricos anuais, fez no passado pesquisadores pensarem ser o fenômeno constante em todo o ano e abranger toda a Amazônia. Porém, algumas áreas deste território são caracterizadas pela ocorrência de deficiência hídrica e, neste contexto, insere-se a área do PHHAM/RO (ver Gráfico III). DEFICIÊNCIA HÍDRICA A área de estudo apresentou maior deficiência hídrica entre os meses de maio a setembro, com oscilação entre 39mm a 463mm anuais, considerando o período observado (1969 a 1998). Os meses de junho, julho e agosto apresentaram maior deficiência, com índices inferiores a 60mm mensais. Nos anos de 1974, 1975, 1976, 1977, 1979, 1982, 1987 e 1993, nos meses considerados críticos, ocorreu o equilíbrio da deficiência com o excedente hídrico. Porém, nos anos de 1969, 1970, 1983, 1991 e 1998 registrou-se uma deficiência na área com valores superiores a 100mm mensais. “A deficiência hídrica corresponde quando o valor da evapotranspiração real é inferior à evapotranspiração potencial. Considerando que a quantidade evapotranspirada é em função da precipitação e do nível da água armazenada que tanto no excedente com a deficiência hídrica parte da água armazenada retorna a atmosfera por meio de evapotranspiração. Isto significa que a quantidade de água que o solo fornece à evapotranspiração em um determinando período, é função da diferença entre o volume da água precipitada e a evapotranspiração do período em questão”.(BRANDÃO,1989). A deficiência hídrica é um parâmetro estatístico meteorológico significativo para o estudo de hidrovias e hidrelétricas, uma vez que é através deste fenômeno que se calcula os valores de influência dos índices de chuvas contidos no solo e a contribuição dessa chuva na flutuação do nível dos rios. 18 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 2000 500 1500 400 300 1000 200 500 DEF EXC GRÁFICO III - EXCEDENTE E DEFICIÊNCIA HÍDRICA DA ÁREA PHAM/RO 100 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 0 SÉRIE AMOSTRAL - 1969/1998 Seqüência2 Seqüência1 FONTE: Relatório Meteorológico e Variações do Nível do Rio Madeira DCPPVH/CPRM(1990-1998), EMBRAPA(1977-1998), SEDAM/DNAEE(1970-1995), IBGE(1969), SEPLAN(1996). EXCEDENTE HÍDRICO O excesso de água presente no solo está relacionado ao total de água da chuva num determinado período e local. Este fenômeno relaciona-se não somente ao índice de precipitação, mas também com o tipo de solo e vegetação da área que está sendo estudada. Porém, não consideramos os tipos de solo, mas os valores de evapotranspiração, pois estes valores representam a água evapotranspirada pelos vegetais e o excedente estocado. O excedente hídrico, na área de estudo correspondente ao período de observação de 1969 a 1998, apresenta índices médios superiores a 600mm anuais. Exceto o ano de 1998 onde o excedente registrado foi de 173mm para uma precipitação de 1220mm anuais. Nos meses de novembro a abril, período em que ocorre o excesso hídrico no trecho em estudo, a precipitação varia entre 2mm a 417mm mensais, e nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março os maiores índices de excedente registrado têm média superior a 100mm mensais. “Nem toda água de precipitação que ultrapassa a necessidade das plantas deve ser considerada excesso hídrico. Ela vai sendo naturalmente armazenada no solo e utilizada pelas plantas à medida que as chuvas se tornam insuficientes.Entretanto qualquer solo, tem um limite específico de estocagem, além do qual ele fica saturado de umidade. Assim que esse limite é alcançado, qualquer nova entrada de água no ambiente passa a se constituir em excesso hídrico ou excedente hídrico”.segundo BRANDÃO,(op.cit) O excedente hídrico é um fenômeno que ocorre em praticamente toda a Amazônia. Na área de estudo do PHHAM/RO, este fenômeno influencia na flutuação do nível (cheia e seca) dos rios e que, por lógica, tende a influenciar os níveis do rio Madeira, conforme constatação através dos cálculos de balanço hídrico. INFLUÊNCIA DO CLIMA NA VARIAÇÃO DO NÍVEL DO RIO MADEIRA A rede hidrográfica de Rondônia está representada pelo rio Madeira e seus afluentes, que fazem parte da grande bacia Amazônica. O rio Madeira é formado pela confluência dos rios Beni e Mamoré, originários dos planaltos andinos e pelo rio Guaporé que têm nascentes nos contrafortes meridionais da chapada dos Parecis. Em território brasileiro, este rio possui cerca de 1400 Km de extensão. Podemos dividir o curso do rio Madeira em três trechos: alto madeira, identificado pelos seus formadores, o Mamoré e o Beni e trechos sem cachoeiras. As cheias ocorrem de novembro a maio e possuem 19 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 duração variável. O trecho de corredeiras que se inicia à jusante da cidade de Guajará-Miriim – RO e termina na cachoeira do Santo Antônio, acima da cidade de Porto Velho-RO, constitui o médio Madeira. O trecho possui aproximadamente 360 Km de extensão com 18 corredeiras (“cachoeiras”) e um desnível de cerca de 179 metros, cuja declividade é da ordem geral de 20cm/Km. E por último, o baixo-madeira que compreende desde a cachoeira de Santo Antônio até sua foz no Amazonas. Neste trecho, o rio é francamente navegável durante todo o ano (INTEROCEAN, S/D). O Rio Mamoré estende-se à confluência do Rio Guaporé até receber o Beni e seus afluentes principais são os rios Pacaás Novos, Sotério e outros. O nível do rio Madeira varia de acordo com o comportamento do clima, principalmente a distribuição sazonal das chuvas e da incidência de temperatura que ocorre na porção sudoeste da Amazônia, área do PHHAM/RO. O rio Madeira possui um “regime tropical austral”. Este regime caracteriza-se por dois períodos bem distintos: cheia e vazante. O trecho em estudo apresenta um nível de cheia relacionado ao período predominante de chuvas abundantes nos meses entre outubro e maio. Porém, o nível máximo de cheia do rio Madeira ocorre no mês de abril, quando seu nível ultrapassa os 16m de profundidade (Gráfico - IV). 450 18 400 16 350 14 300 12 250 10 200 8 150 6 100 4 50 2 0 ja n fev m ar abr m a io p re c ip ita ç ã o 337 275 398 221 105 e v a p o tra n s 128 124 119 127 120 p ru f u n d id a d e 1 2 ,8 1 4 ,7 1 5 ,4 1 4 ,9 1 2 ,9 1 0 ,8 p re c ip ita ç ã o ju n ju l ago set 8 36 9 8 ,8 3 9 ,6 100 138 286 130 52 101 48 101 134 123 7 ,5 3 5 ,0 3 3 ,0 5 3 ,7 5 5 ,8 9 8 ,8 5 e v a p o tra n s out nov dez PROFUNDIDADE PRECIPITAÇÃO E EVAPOTRANSPIRAÇÃO(m m) G R Á F IC O IV - D E M O S T R A T IV O D A IN F L U Ê N C IA D O C L IM A N O N ÌV E L D O R IO M A D E IR A E M 1 9 9 1 0 p ru f u n d id a d e Fonte: Dados obtidos junto a Delegacia Fluvial de PVH, do DNAEE em Brasília e Cálculos elaborados para evapotranspiração real utilizando o método de balanço hídrico de Thornthwaite e Mather (1955) O nível de vazante caracteriza-se pelo período em que o rio madeira atingiu sua menor profundidade, nos meses de junho a setembro. O fenômeno está relacionado a redução periódica dos índices de chuva e aumento diário de radiação solar, provocando fortes temperaturas que propiciam um grau elevado de evaporação e transpiração. Este nível apresenta-se mais crítico no mês de setembro quando a profundidade do rio madeira chega a ser inferior a 3 metros. A redução brusca no nível de profundidade do madeira pode está relacionado também com o alto índice de evapotranspiração potencial e real que ocorre nesses períodos. E, conforme já mencionamos anteriormente, pode está influenciando na flutuação dos níveis de profundidade do rio Madeira. Através dos cálculos de excedente e da deficiência hídrica obtivemos valores que nos mostraram a influência do clima regional na área do PHHAM/RO e sua influência na variação no nível da profundidade do rio Madeira, o que pode ser compreendido através do gráfico IV. Para isso, vale salientar que o rio Madeira, por possuir em seu nível uma variação correspondente as precipitações mensais, já apresentou profundidade mínima significativa. Em 1998 o nível mínimo chegou a 2,32 metros no mês de setembro e em 1996, o nível máximo foi de 17,02 metros de profundidade (D. P. P. PVH-RO, 1999). 20 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 CONCLUSÕES Os cálculos mostram que mesmo a área de estudo apresentando um alto índice de chuva anual, pode ocorrer deficiência hídrica devido a irregularidade de precipitações durante o ano. Esta variação caracteriza a área analisada por um período chuvoso e outro de estiagem, contribuindo para o excesso de umidade de água no solo. O balanço hídrico forneceu indicadores que sugerem uma maior reflexão quanto a capacidade do rio Madeira em suportar a implantação de hidrelétricas na cachoeira de Santo Antônio e Salto Jirau. Através do método aplicado, constatamos que o clima da área do PHHAM-RO dispõe de particularidades pontuais, a exemplo dos fenômenos relacionados a evapotranspiração potencial e real, excedente e deficiência hídrica. Tais fenômenos influenciam no nível de variação da profundidade bem como na vazão do rio Madeira e seus afluentes, com possibilidades de comprometer o PHHAM/RO. O inventário realizado pela INTEROCEAN propõe que o lago a ser formado com a construção dos barramentos não extrapolará a calha natural de cheia do Madeira pois será a “fio d’água”, isto significa que não haverá formação de um lago extrapolando o curso natural do ambiente fluvial. Caso se confirme essa estrutura, o clima exercerá grande influência no represamento do rio, uma vez que o espaço analisado apresenta alta temperatura (média de 25,4ºC anuais) e precipitação média de 2300mm anuais que proporciona uma evapotranspiração real - ER de1282mm para a área do PHHAM/RO, e retira o excesso de água presente no solo (984,1mm provocado pelas chuvas) transformando o que era excedente hídrico em escassez, originando deficiência hídrica. O déficit hídrico que ocorre nos meses de maio a setembro tem média anual de 190,1mm, o que caracteriza o período de estiagem na área de estudo, no qual o nível do rio Madeira atinge sua menor profundidade, com média inferior a de 3 m, assim como sua menor vazão. Este fenômeno não só pode comprometer a geração de energia, como as atividades sócio-econômicas (transportes de cargas pelo modal hidroviários) que dependem do nível mínimo de navegabilidade no período de estiagem amazônica. Obviamente neste estudo, não se esgotam as possibilidades de análise do problema apresentado, de modo que os estudos devem prosseguir para um melhor entendimento. 21 XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AYOADE, J. O. Introdução a Climatologia da Região dos Trópicos. 3 ed, Rio de janeiro; Bertrand Brasil, 1991. BARROS, J. C. et al. Cálculo de Balanço Hídrico para o Estabelecimento do Volume de Recarga dos Aqüíferos na área de Brasília. Revista de Geografia. Vol. 14, de 28 de outubro, Distrito Federal: UNB, 1989. BEZERRA, R. B. Balanço Hídrico em Porto Velho-RO, no período de 1954 à 1993. Rondônia: UNIR, 1996. BRANDÃO, A. M. P. M. et al. Balanço Hídrico e clima da Região dos Cerrados. Rio de Janeiro: IBGE, 1989. BRASIL. CENTRO DE PREVISÃO DE TEMPO E ESTUDOS CLIMÁTICOS – CPTEC. Anomalias climáticas. São Paulo: Boletim, Vol. 02, fevereiro, 1996. BRASIL. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Região Norte. 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