metodologia na escola infantil: critérios e parâmetros de

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METODOLOGIA NA ESCOLA INFANTIL:
CRITÉRIOS E PARÂMETROS DE ESCOLHA
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo
Especialista em Educação Infantil – NEI
Marta Maria Castanho Almeida Pernambuco
Doutora em Educação – UFRN
Nas últimas décadas os especialistas de educação infantil têm se dividido em duas
perspectivas distintas para a educação infantil: uma que defende a inclusão de conteúdos e
metodologias, considerando o nível de desenvolvimento, mas com uma ação pedagógica
sistemática, a outra perspectiva, contrária a inclusão, defende que o conteúdo e a metodologia na
educação infantil é o próprio brincar.
Frente a essas duas perspectivas estão os professores, organizando o seu cotidiano escolar
muitas vezes sem terem clareza dessas discussões.
O reconhecimento da educação infantil, como um espaço que propicia o processo de
construção da relação ensino-aprendizagem e de acesso ao conhecimento, culturalmente acumulado
pela humanidade, traz a responsabilidade de pensar nas relações entre formas e conteúdos que
possam contribuir para efetivar um trabalho pedagógico mais comprometido com uma
intencionalidade educativa, trazendo para a vivência das crianças pequenas aspectos da vida
contemporânea da sociedade brasileira. A inclusão de conteúdos e metodologias, considerando o
nível de desenvolvimento, mas com uma ação pedagógica sistemática, tem sido outro desafio
constante para os educadores da área.
Nos cursos de formação continuada que temos ministrado para professores percebemos uma
excessiva preocupação com a metodologia a ser adotada. Geralmente, solicitam oficinas
pedagógicas de como fazer passo a passo uma determinada metodologia, acreditando ser a única
responsável pelo sucesso de todo o processo de ensino-aprendizagem.
Acompanhamos ao longo da história a euforia/entusiasmo dos professores a cada nova
metodologia que surge, adotam e defendem como se fosse a "SALVADORA" dos problemas da
educação. Foi assim com os "Centros de Interesse", os "Temas Geradores", a "Metodologia de
Resolução de Problemas", entre outras, que logo eram abandonadas por uma nova "mania".
Atualmente, uma grande maioria dos educadores vem considerando a Metodologia de
Projetos como a única capaz de promover uma aprendizagem sistemática e eficiente. Muitas
professoras entrevistadas recentemente apontam a Metodologia de Projetos como sendo capaz de
"superar" todas as outras. No entanto, quando nos aprofundamos na forma com que estão
"adotando" essa metodologia, percebemos que reproduzem muitos equívocos já adotados
anteriormente em outras metodologias: determinam tempo para cada tema, adotam o livro didático
ou lista de conteúdos prontos para escolher o tema, expõem o conteúdo informativamente,
demostrando não ter consciência dos princípios que norteiam a metodologia que pretendem estar
usando.
Essas primeiras reflexões nos conduziram a estar olhando algumas metodologias no seu
processo de construção, com a intenção de explicitar parâmetros e critérios que possibilitam
entender as intenções nas tomadas de decisão no cotidiano escolar. Selecionamos quatro
metodologias a saber: Centro de Interesse, Tema Gerador, Tema de Pesquisa e Metodologia de
Projetos, por serem as que tem aparecido com mais frequência na educação infantil.
Duas destas metodologias, a de Centro de Interesses e a de Projetos foram inspiradas na obra
de educadores do início do século XX, que hoje consideramos como pertencentes a uma postura que
é chamada de “escola nova” ou “escola ativa”, caracterizada como uma reação ao ensino formal,
centrado na ação do professor e em conteúdos pré determinados por livros didáticos. Os autores
classificados como escola-novistas, em geral são oriundos das transformações ocorridas do início
aos meados do século XX (estão neste bloco, além de Dewey e Decroly, Ferrière, Freinet,
Krupskaja, Makarenko, entre outros e no Brasil, os chamados pioneiros, Anísio Teixeira e Lourenço
Filho), se caracterizam por terem desenvolvido experiências concretas de ensino, em geral ligadas a
escolas para populações específicas (pequenas aldeias francesas, comunidades anarquistas, centros
juvenis para adolescentes com problemas sociais, ...) e terem construído sua obra na reflexão sobre
estas ações, aprofundando o conhecimento não só da ação pedagógica mas também dos aspectos
sociais e psicológicos (tanto cognitivos quanto afetivos) envolvidos no processo de ensino
aprendizagem. No geral, valorizam a ação do aluno, o “aprender a aprender”, o processo de
aprendizagem mais do que o seu produto.
A metodologia de Tema Gerador tem sua inspiração nas idéias de Paulo Freire e para muito
de seus divulgadores, não pode ser entendida como um conjunto de receitas para ação dos
professores, mas como um processo que permite conjugar ação-reflexão-ação, na geração de
Projetos Pedagógicos próprios para escolas. Em comum com as outras duas, tem a valorização dos
alunos e do processo de aprendizagem, apesar de, por suas origem histórica, privilegiar a realidade
social e mudança de consciência política.
Tema de Pesquisa é uma forma de trabalho particular, encontrada pelo NEI para articular as
demandas da Educação Infantil com as influências oriundas do conhecimento das outras
metodologias acima mencionadas.
Metodologia de Centros de Interesses
A metodologia idealizada por Ovídio Decroly levava em conta a evolução natural dos
interesses da criança. Para ele a criança, que inicialmente é egocêntrica, só se interessa por ela
mesma, para depois se interessar pela família, casa, escola, dessa forma, ampliando seu circuito de
interesses até os problemas mais amplos da humanidade.
O ponto de partida da metodologia de Decroly é o conhecimento dos fatos que se relacionam
mais de perto com a vida das crianças, abrangendo temas como: a criança e suas necessidades e a
criança e seu meio.
Ele defendia que os Centros de Interesses permitiriam que a criança se interessasse no
presente o que poderia necessitam no futuro. Propôs três fases para a efetivação da metodologia:
Observação, Associação e Expressão. O aluno é convidado, no primeiro momento a observar o
mundo ao redor, para descobrir os seus focos de interesse. Em seguida, na Associação, é
incentivada a associar as observação e o focos de interesse ao que já sabe e ao que existe nos livros
e outros recursos do conhecimento sistematizado. A expressão é o momento de síntese, onde através
da livre expressão, desenho, escrita, ou outra linguagem de domínio da criança, ela registra o
conhecimento adquirido.
Atualmente é conferido um novo enfoque aos Centros de Interesses, partindo de temas
centrais propostos pelos professores e escolhidos diretamente pelo conjunto das crianças.
Segundo HERNÁNDEZ (1998, p.64) em linhas gerais os Centros de Interesses se apoiam
num duplo ponto de partida psicopedagógico:
Por um lado, destaca o princípio da aprendizagem por descoberta, que estabelece que a
atitude para a aprendizagem por parte dos alunos é mais positiva quando parte daquilo
que lhes interessa, e aprendem da experiência do que descobrem por si mesmos. E, por
outro lado, um princípio da Escola Ativa, que se refere ao exercício da educação como
prática democrática, que outorga às assembléias de classe a decisão sobre o que se deve
aprender.
Nesse sentido, a escolha do tema está vinculado à realidade da criança, sendo utilizado como
critério de seleção o caráter significativo, surgindo na família, na escola, nas suas relações sociais,
culturais, intelectuais e emocionais.
Metodologia de Projetos de Trabalho
Idealizado inicialmente por W.H. Kilpatrick, a partir da pedagogia de Jonh Dewey, defendia
que a criança vai para a escola para resolver os problemas que enfrenta no seu dia-a-dia, o professor
é um guia e auxilia a criança como uma pessoa mais experiente. Posteriormente, foi agregada a esta
metodologia os estudos de Resolução de Problemas, e atualmente aparece ligada ao grupo de
Barcelona, cujo principal representante é Cesar Coll.
Segundo HERNÁNDEZ (1998, p.66), os Projetos de Trabalho, tratam de ensinar o aluno a
aprender, a encontrar o nexo, a estrutura, o problema que vincula a informação e que permite
aprender.
Para o mesmo autor os Projetos de Trabalho se fundamentam em bases teóricas que
respeitam os seguintes princípios:
•
aprendizagem significativa, a partir do que os alunos já sabem;
•
articulação com uma atitude favorável para o conhecimento;
•
previsão de uma estrutura lógica e seqüencial dos conteúdos na ordem que
facilite sua aprendizagem;
•
sentido de funcionalidade do que aprender;
•
memorização compreensiva das informações;
•
e avaliação do processo durante toda a aprendizagem.
Afirma ainda que:
Definitivamente, a organização dos Projetos de Trabalho se baseia fundamentalmente
numa concepção da globalização entendida como um processo muito mais interno do que
externo, no qual as relações entre conteúdos e áreas de conhecimento têm lugar em
função das necessidades que traz consigo o fato de resolver problemas que subjazem na
aprendizagem (HERNÁNDEZ, p.63, 1998).
MARTINS, M. C. (1999), sintetiza em três momentos a metodologia de Projetos: o 1º
momento, Avaliação Inicial – é o de sondagem para levantamento de repertório, o 2º momento,
Encaminhamento de Ações – é o de levantamento de propostas possíveis, avaliação e
replanejamento e o 3º momento, Sistematização - é quando há uma apropriação do conhecimento
construído.
Metodologia de Tema Gerador
A metodologia de Tema Gerador surge com bases teóricas na pedagogia de Paulo Freire,
tendo como fonte principal o texto de “Pedagogia do Oprimido” e teve uma de suas sistematizações
elaborada pela equipe que coordenou o Movimento de Reorientação Curricular no Municio de São
Paulo na década de 90.
Os Temas Geradores foram idealizados como um objeto de estudo que compreende o fazer e
o pensar, o agir e o refletir, a teoria e a prática, pressupondo um estudo da realidade, onde emerge
uma rede de relações entre situações significativas individual, social e histórica. Assim como, uma
rede de relações que orienta a discussão, interpretação e representação dessa realidade.
Por sua natureza os Temas Geradores têm como princípios básicos:
• uma visão de totalidade e abrangência da realidade;
• a ruptura do conhecimento no nível do senso comum;
• adota o diálogo como sua essência;
• exige do educador uma postura de crítica, de problematização constante,
distanciamento, de estar na ação e de se observar e se criticar nessa ação;
• aponta para a participação, discutindo no coletivo e exigindo disponibilidade
dos educadores.
O Movimento de Reorientação Curricular defende a opção da organização curricular
interdisciplinar na escola pelo Tema Gerador pelas seguintes razões:
por proporcionar um vínculo significativo entre conhecimento e realidade local;
por não ser uma abordagem curricular burocraticamente preestabelecida;
por envolver o educador na prática do "fazer e pensar currículo";
por relacionar realidade local com um contexto mais amplo;
por entender que o conhecimento não está pronto e acabado e que a escola é
também local de produção de conhecimento;
por estabelecer uma relação dialética entre os conhecimentos do senso comum e os
já sistematizados;
por buscar uma forma interdisciplinar de apropriação do conhecimento. (SME/SP,
p.15, 1991a)
Os Temas Geradores se organizam em três momentos pedagógicos: estudo da realidade
(ER). organização do conhecimento (OC). aplicação do conhecimento - AC). Em 1994, estes
momentos foram caracterizados por Pernambuco como:
Ao organizar uma aula, uma sequência de conteúdos, uma reunião com pais, estamos
sempre atentos à situação inicial que gera o passo seguinte. É o momento de compreender o
outro e o significado que a proposta tem sem seu universo e ao mesmo tempo permitir-lhe
pensar, com um certo distanciamento, sobre a realidade na qual está imerso. É o momento da
fala do outro, da descodificação inicial proposta pôr Paulo Freire, quando cabe ao professor,
ou ao organizador da tarefa, ouvir e questionar, entender e desequilibrar os outros
participantes, provocando-os a mergulhar na etapa seguinte. Este primeiro momento constitui o
estudo da realidade (ER).
Uma segunda fase ou momento é o de cumprir as expectativas: é quando, percebendo
quais as superações, informações, habilidades necessárias para dar conta das questões
inicialmente colocadas, o professor ou educador propõe atividades que permitam a sua
conquista. Aqui predomina a fala do organizador. Apesar de não se perder de vista a fala do
outro, o que orienta essa etapa é a tentativa de propiciar os saltos que não poderiam ser dados
sem o conhecimento do qual o organizador é o portador. É o momento da organização do
conhecimento (OC).
O terceiro momento é o da síntese, quando a junção da fala do outro com a fala do
organizador permite a síntese entre as duas diferentes visões de mundo ou, ao menos, da
percepção de sua diferença e finalidade. É um momento em que uma fala não predomina sobre
a outra, mas juntas exploram as perspectivas criadas, reforçam os instrumentos apreendidos,
fazem um exercício de generalização e ampliação dos horizontes anteriormente estabelecidos
aplicação do conhecimento (AC).
Metodologia de Tema de Pesquisa
O uso do Tema de Pesquisa foi a forma que o NEI escolheu para articular três dimensões
básicas: o conhecimentos das áreas de conteúdo que se quer tornar disponível, o contexto
sociocultural das crianças, ou suas realidades imediatas, e os aspectos vinculados diretamente à
aprendizagem.
Os Temas de Pesquisa estão sendo usados no NEI, desde a Reestruturação Curricular na
década de 80, como uma forma de considerar as experiências de vida e valores socioculturais das
crianças, garantindo o acesso a experiências, onde possam expressar, ampliar e atualizar suas idéias,
conhecimentos e sentimentos.
As principais referências utilizadas na construção do que hoje chamamos de Tema de
Pesquisa foram as propostas de Madalena FREIRE (1983), em A paixão de conhecer o mundo e
Sonia KRAMER (1989), em Com a pré-escola nas mãos.
Contexto Sociocultural das Crianças, ou seja, pressupõe um conhecimento da realidade
onde a criança está inserida, tanto das vivências anteriores com a família, quanto das experiências
partilhadas com outras crianças e do grupo social a que pertencem, considerando os conhecimentos,
os valores e as diversas linguagens que já trazem do cotidiano.
Áreas de Conteúdo ou os conhecimentos produzidos e sistematizados nas áreas de
Linguagem, Matemática, Ciências Naturais e Ciências Sociais.
Nível de Desenvolvimento das Crianças, sendo respeitadas as características próprias do
desenvolvimento sócio-afetivo, cognitivo e psicomotor, ou seja, qual a estrutura do pensamento das
crianças naquele momento de aprendizagem, como aprendem.
O tema de pesquisa constitui-se num parâmetro básico da dinâmica pedagógica. Para definilo melhor, foram apontados alguns critérios balizadores:
-
precisa ser um assunto que gere questionamentos, necessidade de ir em busca de um
aprofundamento maior, possibilitando, dessa forma, o diálogo;
que contribua para uma visão mais ampla da realidade onde o indivíduo está inserido,
favorecendo um melhor entendimento do mundo em que vive;
unifique/aglutine conceitos de outras áreas do conhecimento, com a perspectiva de
articular-se com outros conhecimentos, podendo ser ampliado para outros temas;
envolva um componente afetivo do grupo, para ser significativo, ou seja, que todo o grupo
esteja curioso e interessado em saber mais/investigar aquele determinado assunto.
(Rêgo,1995).
Segundo a mesma autora, esta metodologia também se articula em três momentos análogos
aos utilizados metodologia de Tema Gerador, embora com algumas diferenças: por exemplo, no
Tema Gerador o estudo da realidade pressupõe que os conteúdos partam da realidade local e para
isso é necessário a pesquisa/estudo dos problemas da comunidade, já no tema de pesquisa os
conteúdos surgem do contexto sócio-econômico-cultural-político.
Estudo da realidade: é onde, a partir do que o grupo já sabe sobre o assunto, sistematizamse as questões a serem estudadas. Nesse momento, é a hora da professora, organizadora do trabalho,
observar, ouvir e questionar as crianças, incentivando-as a verbalizarem, para que possam
expressar o que já aprenderam em outras experiências anteriores sobre o tema, culminando com as
questões que o grupo, crianças e professoras, conseguiu levantar para serem investigadas.
Organização do conhecimento: caracteriza-se pela busca dos conhecimentos construídos
historicamente pelo homem. A partir das questões inicialmente postas, a professora organiza
atividades significativas que possibilitem às crianças avançarem no conhecimento. Nesse momento,
a professora tem um papel fundamental, de articuladora do conhecimento, ou seja, como a "pessoa"
que "sabe mais", orientando as crianças a se lançarem na busca das respostas aos questionamentos
propostos pelo grupo, estejam elas em livros, bibliotecas, museus, especialistas acadêmicos, artistas,
artesãos, e outros profissionais.
Aplicação do conhecimento: caracteriza-se pela síntese de tudo que conseguiram aprender
sobre o assunto, através de uma das formas de expressão humana. De posse das informações,
professoras e crianças fazem uma síntese do que aprenderam e expressam de alguma forma, seja
através do desenho, da imitação, da escrita, o novo conhecimento. Agora, a professora propõe uma
volta às questões iniciais para uma retomada, pelo grupo, dos questionamentos gerados no estudo da
realidade, que por sua vez geraram as atividades propostas. Em todos os estudos realizados, é
produzido um registro coletivo, em forma de texto descritivo, para garantir um fechamento. Nesse
momento, professoras e crianças contribuem com suas impressões, visões e conhecimentos. A partir
dessas sínteses, as crianças poderão estruturar idéias transformadoras sobre o mundo em vivem.
Critérios e Parâmetros de Escolha
Ainda que preliminares, as primeiras análises em torno dessas metodologias nos revelam, no
seu processo de construção, critérios comuns, mesmo que tenham origens e fundamentações
teóricas próprias.
Identificamos inicialmente sete critérios que perpassam todas elas, mesmo que cada uma
defina um caminho diferente de atuar. Os critérios identificados foram:
Dialogicidade - é importante que a metodologia propicie o diálogo, incentivando os alunos
a exporem suas idéias e teorias, construindo a interlocução sobre a realidade circundante. Dando
mais ou menos ênfase a atuação do professor, todas propõe que o processo de aprendizagem é de
cada aluno individualmente e se dá em uma interação coletiva, mediada pela palavra e pela ação dos
diferentes alunos que constituem cada turma e seu professor. Assim, além dos desafios cognitivos
estabelecidos pela diferença dos olhares, é constituído um objetivo comum, partilhado pelo grupo,
que dá suporte às demandas emocionais e o aprendizado em lidar com as diferenças.
Conhecimentos prévio dos alunos - partir dos conhecimentos que as crianças trazem,
significa deixá-las falar de suas experiências no cotidiano, explorando o vocabulário que elas já
têm, investigando e questionando o significado que atribuem a diferentes termos. Antes que o
professor a ensine, a criança possui uma série de idéias bastante estabelecidas sobre diversos
conhecimentos, que, usadas como ponto de partida, permitem que ela participe como sujeito do
diálogo e estabeleça uma relação de mudança ou permanência com os novos conhecimentos que
está aprendendo.
A criança é entendida como um ser que já viveu determinadas experiências e pertence a um
meio familiar sócio-econômico-cultural particular, ou seja, encarada como um ser pensante, mesmo
que seu tipo de pensamento se diferencie do tipo de pensar dos adultos.
A criança pequena já traz para a escola um conhecimento do mundo em que vive. O
professor deve partir desses conhecimentos, das representações que fazem da realidade, dando
atenção às suas perguntas e curiosidades. Com certeza, elas têm uma ligação com o contexto
sociocultural em que estão inseridas. Mesmo as crianças no início da oralidade, nos dias atuais, têm
acesso aos meios de comunicação e dispõem de algumas informações, como também, já viveram
um certo número de experiências, principalmente junto às suas famílias e, portanto, têm o que dizer.
É importante que elas tenham a oportunidade de expressarem seu pensamento e que os
questionamentos propostos pela professora lhes possibilitem ampliar essas experiências, indo em
busca do conhecimento sistematizado
Interdisciplinaridade - permite o diálogo entre as diferentes áreas de conhecimentos, na
medida em que o objeto de estudo não domínio de uma única área. A complexidade da sociedade
moderna aponta desafios que nenhuma área sozinha consegue dá conta de explicá-la. Portanto, é
preciso considerar os conhecimentos das diferentes áreas para compreender o real.
A escola não tem o poder de mudar sozinha a sociedade. No entanto, é preciso que os
conteúdos nela trabalhados possibilitem uma visão crítica e mais ampla da realidade.
Segundo as discussões promovidas pela SME/SP1
O problema que se coloca para nós é a necessidade de compreender a realidade para
transformá-la. Conhecer ultrapassa o domínio da apreensão dos conteúdos e visa a
aprender os processos de pensar, processos esses que englobam problematização,
levantamento de hipóteses, observação, análise, comparação e síntese provisória,
possibilitando a quem aprende a sistematizar e gerar novos conteúdos, novos
conhecimentos. (SME/SP; s.d. p. 01).
1
Material mimeografado produzido pela Secretaria Municipal de Educação (SME) - São Paulo, para ser utilizado pelas
Equipes Municipais de Educação Infantil (EMEI).
Considerando ainda que nenhum campo do conhecimento dá conta sozinho de explicar as
múltiplas relações da realidade, é a escola um espaço onde se dá a construção e reconstrução do
saber socialmente produzido e sistematizado, nos diversos campos do conhecimento (SME/SP, s.d.
p. 01). Dessa forma, a educação, como prática social, apresenta-se como um forte instrumento para
a compreensão da realidade como um todo. A interdisciplinaridade surge, então, como uma
possibilidade de trabalho na escola.
Esse conhecimento é construído pela criança num processo que pressupõe continuidade e
ruptura, resgate e escolha. Portanto, os conteúdos dessa realidade devem ser trabalhados pela escola
de forma a favorecer uma aprendizagem significativa, possibilitando, ainda, uma atitude de
aprender a aprender.
Nível de desenvolvimento dos alunos – leva-se em conta as especificidades do
desenvolvimento das crianças em cada fase de sua vida. Promover a construção do conhecimento
pela criança significa, primordialmente, envolvê-la no seu processo de aprender. O sujeito como
construtor do seu conhecimento nas interações histórico-sociais, ou ainda, nas trocas do sujeito com
o meio em que vive.
Em cada fase da vida, os interesses e possibilidades dos sujeitos se alteram. Considerar os
interesses e possibilidades como pontos de partida para novas aquisições, adequá-las ao que já se
vislumbra como possível, criar desafios que sejam significativos dos grupos, é uma das vantagens
das metodologias ligadas à ação coletiva. Os limites dos grupos não são mais previamente
estabelecidos pelos professores, mas se revelando no desenrolar dos trabalhos. Neste sentido, ao
mesmo tempo são levadas em conta as estruturas mentais disponíveis e a sua possibilidade de
desenvolvimento.
Dialeticidade - permita o movimento, não se constituindo em momentos estanques para
serem seguidos como receita. O caminho deve ser traçado inicialmente e revisto permanentemente
durante o percurso. O conhecimento e a aprendizagem, também devem ser tratados dialeticamente.
Essas metodologias não se constituem de fases estanques e distintas no tempo, há sempre
um movimento. Os momentos ou fases definidos são uma forma de estar refletindo onde queremos
chegar e qual direção podemos dar ao trabalho em cada momento, para não cair nos extremos de
impor um conteúdo escolar centrado na fala de só um dos lados, do professor ou do aluno.
Também permitem pensar o conhecimento como algo dinâmico, contraditório, mutante e em
permanente construção, porque produzido pelos homens ao longo da história da humanidade e
mediante a necessidade de entender os fenômenos, os acontecimentos, ou seja a realidade para atuar
sobre ela, e, consequentemente modificá-la.
Nessa perspectiva, a dinâmica pedagógica tem um caráter processual, de movimento, em
função das necessidades surgidas, nas interações, não fazendo sentido o estabelecimento rígido de
programas prévios de ensino, ainda que não se perca de vista os objetivos educacionais a serem
atingidos.
Indissociabilidade entre conteúdos e metodologias - os métodos não têm vida
independente dos objetivos e conteúdos. Estas metodologias não tem como base um conteúdo
determinado único. O trabalho pedagógico não se estrutura a partir de listas de conteúdo prontas e
acabadas para serem transmitidas, sem nenhuma vinculação com a vida da criança fora da escola.
O processo de construção do conhecimento é entendido como dinâmico, em constante
movimento, não comportando conteúdos supostamente acabados. Nesse sentido, o conhecimento
sistematizado nas diversas áreas surge como meio e não como fim em si mesmo. Privilegia-se mais
a forma com que as diferentes áreas constróem o seu conhecimento e não a quantidade ou a
dificuldade de um conjunto específico de informações.
Conhecimentos científicos, sociais, conceituais, culturais e atitudinais - O conhecimento
quando reduzido apenas à sua dimensão de ciência não permite uma leitura e atuação do/no mundo
em que as crianças vivem.
Segundo KRAMER (2000), o compromisso da escola com a cultura precisa incluir no
mínimo duas dimensões: uma relativa às tradições culturais, aos costumes e valores dos diferentes
grupos, suas trajetórias, experiências, seu saber, ou seja, que é produzido pelos grupos específicos
de homens e que está disponível na sua história, o conhecimento da tradição; a outra relativa ao
acervo cultural acumulado e sistematizado na literatura, no cinema, na música, na fotografia, no
teatro, na pintura, na escultura, na poesia, nos museus, o conhecimento da ciência e da arte. O
acesso aos diferentes tipos de conhecimentos produzidos pela humanidade contribui para a
formação de crianças que estarão mais preparadas para conviverem com a heterogeneidade e a
complexidade da sociedade contemporânea, pois resgata trajetórias, relatos, valores, diferenças,
crenças, permitindo uma leitura crítica da realidade.
Para KRAMER,(2000), a reflexão crítica da cultura que produzimos e que nos produz,
suscita o repensar do sentido da vida, da sociedade contemporânea e, nela, do papel de cada um de
nós.
Construção de um projeto coletivo de escola - na medida em que cada uma destas
metodologias viabiliza a construção de um projeto coletivo para os professores de uma escola,
acaba também por possibilitar o enfrentamento dos diferentes tipos de heterogeneidade entre
alunos.
A opção por uma dinâmica pedagógica passa, necessariamente, pelo compromisso que se
estabelece com: os princípios teóricos adotados, os objetivos, as características e vivências das
crianças, o tipo ou área de saber que se quer proporcionar. A partir dos princípios teóricos que se
estabeleceu como perspectiva para a educação na escola infantil, o fazer pedagógico visa sempre
partir do que a criança vive e sabe, para ampliar esse universo e ainda faze-la se apropriar de uma
forma de buscar esse conhecimento.
Estas metodologias supõe a construção coletiva, a democratização das relações internas, as
relações pedagógicas como centro e determinador das atividades administrativas e gerenciais do
espaço escolar. Necessitam, portanto, de valorização do trabalho docente, de criação de estruturas
de apoio material, de trocas experiências entre educadores, de acesso a novos conhecimentos e
materiais didáticos, da participação dos pais e comunidades locais. Dependem de condições que vão
além da boa vontade e do conhecimento de alguns professores.
Atribuir a estas metodologias a capacidade de sozinhas e automaticamente, pela tentativa de
sua adoção, resolver os problemas estruturais da escola como o desinteresse (de professores e
alunos), a evasão, a repetência é matá-las: na impossibilidade de serem adotadas em toda sua
dimensão, acabam sendo usadas pelos professores fragmentadamente, sem alterar as relações
internas e externas da escola, levando ao desencanto com qualquer nova proposta.
Relatos de alguns dos autores mencionados neste trabalho, como Hernández, SME/SP, e
outras experiências educacionais não registradas aqui, mostram que a sua utilização não só é viável,
mas também transformadora quando condições mínimas para a construção coletiva estão garantidas.
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