9. Do Pedido Final - Centro de Apoio Operacional das Promotorias

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Procuradoria da República no Município de Uberaba
EXMO. SR. DR. JUIZ FEDERAL DA _______ VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA
DE UBERABA/MG
Procedimento Administrativo Cível nº. 1.22.002.000239/2005-60.
“Segundo os Diretores Murilo e Cristina, há situações absurdas em que o médico diarista se vê obrigado
a escolher qual paciente será internado em UTI e qual não receberá tal serviço. Em outras palavras, o
médico diarista se vê obrigado a escolher qual paciente terá mais chances de viver, recebendo todos os
cuidados de uma UTI ideal, e qual será exposto a um grande risco de morrer.” (trecho do relatório
elaborado por servidores desta Procuradoria da República em visita ao Hospital Escola da UFTM, às fls.
1.165/1.167).
Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral,
desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. (Artigo 4º da
Convenção Americana dos Direitos Humanos – Pacto de de San José da Costa Rica, promulgado pelo
Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992)
“Com o corredor superlotado temos que usar nossa criatividade para respeitar o pudor que sabendo ser
um dos seus direitos, nos desdobramos para conseguir espaço, mesmo que seja em uma parte do corredor
para dar banho e trocar os pacientes” (trecho do documento subscrito pela Coordenadora do Pronto
Atendimento do Hospital Escola da UFTM, às fls. 1.254/1.255).
A dignidade da pessoa humana identifica um espaço de integridade moral a ser assegurado a todas as
pessoas por sua só existência. É um respeito à criação, independente da crença que se professe quanto à
sua origem. A dignidade relaciona-se tanto com a liberdade e valores do espírito como com as condições
materiais de subsistência. O desrespeito a este princípio terá sido um dos estigmas do século que se
encerrou e a luta por sua afirmação um símbolo do novo tempo. (Luís Roberto Barroso).
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, no exercício das suas atribuições
constitucionais e legais, por meio do Procurador da República infra assinado, propor a
presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de liminar inaudita altera pars em face da
UNIÃO, pessoa de direito público interno, cuja AdvocaciaGeral tem endereço nesta cidade de Uberaba/MG na
Procuradoria Seccional localizada Rua Aristides Borges, nº. 28,
bairro Fabrício, neste Município;
Procuradoria da República no Município de Uberaba/MG
Av. Gabriela Castro Cunha, 340 – Vila Olímpica – CEP 38066.000 – Uberaba/MG
PABX: (34) 3319-7900 – FAX: (34) 3319-7940 – Correio eletrônico: [email protected]
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pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:
1. Da legitimidade ministerial
Indiscutível a legitimidade do órgão ministerial no presente caso, já que a
saúde é direito INDISPONÍVEL, cabendo ao órgão ministerial nos termos do art. 127,
caput, da CF, zelar pela defesa de tais direitos. Mais que isso, no presente caso, além dos
direitos individuais de pessoas que se encontram aguardando tratamento urgente no Hospital
Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e não conseguem, devido a ausência de
leitos de UTI's suficientes, a presente ação objetiva a tutela difusa de toda a população do
Município de Uberaba/MG e dos demais municípios referenciados que um dia pode vir a
necessitar de tratamento em Unidades de Tratamento Intensivo.
Outrossim, a legitimidade do Ministério Público Federal para a defesa do
direito à vida e à saúde vem estampada no art. 129, incisos II e III, da Constituição Federal, na
medida em que, dentre as funções institucionais atribuídas ao parquet, incumbe zelar pelo
efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos
assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia, bem como
promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção de interesses difusos e
coletivos.
Ademais, importante realçar que o direito postulado contém a nota de
permeabilidade e dispersão social que o caracteriza, indubitavelmente, como difuso,
amoldando-se à discrição legal inserta no inciso I, do parágrafo único, do art. 81, do CDC
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(interesses ou direitos transindividuais de natureza indivisível de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato).
É dizer, o fato de inexistir a eficaz e satisfatória prestação de serviços de
saúde à população caracteriza a circunstância que liga todos os que porventura precisem ou
venham a precisar de tais serviços, revelando-se, à evidência, sua natureza indivisível.
Nesse contexto, o fato em comento, além de ser difusa sua característica, por
ser transindividual, reveste-se, consoante se ressaltou inicialmente, da nota de
indisponibilidade (CF, art. 127), em face da afetação ao interesse público primário, que é o
interesse do bem geral, ou seja, o interesse da sociedade ou da coletividade como um todo,
potencialmente usuária desse serviço público, e, em sendo assim, sujeita aos efeitos nefastos
da prestação do serviço irregular, em flagrante desrespeito do Poder Público a direitos
assegurados na Constituição Federal, circunstância que, seguramente, confere ao Ministério
Público a incumbência da defesa os interesses transindividuais indisponíveis através de Ação
Civil Pública.
A propósito, salutar o magistério de Nelson Nery Júnior:
O Ministério Público está legitimado à defesa de interesses individuais
homogêneos que tenham expressão para a coletividade, como: a) os
que digam respeito à saúde ou à segurança das pessoas, ou ao acesso
das crianças e adolescentes à educação; b) aqueles em que haja
extraordinária dispersão dos lesados; c) quando convenha à
coletividade o zelo pelo funcionamento de um sistema econômico,
social ou jurídico.1
1
Código de Processo Civil Anotado: Ed. RT, São Paulo, 1994, p. 1.029
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Por último, nos termos do art. 5º, inciso V, alínea “a”, da Lei
Complementar nº 75/93, dentre as funções institucionais do Ministério Público da União
incumbe zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e
serviços básicos de saúde.
Reconhecendo a legitimidade ativa do Ministério Público para a defesa de
direitos individuais indisponíveis e transindividuais ligados à vida e saúde, vale citar os
recentes julgados do Superior Tribunal de Justiça, verbis:
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS.
PESSOA IDOSA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE
ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
1. Este Tribunal Superior possui entendimento pacífico no sentido
de que o Ministério Público é parte legítima para propor ação civil
pública, com o objetivo de tutelar direitos individuais
indisponíveis.
2. O direito à vida e à saúde são direitos individuais indisponíveis,
motivo pelo qual o Ministério Público é parte legítima para
ajuizar ação civil pública visando o fornecimento de
medicamentos de uso contínuo para pessoas idosas. (q.v., verbi
gratia, EREsp 718.393/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, PRIMEIRA
SEÇÃO, DJ 15.10.2007).
3. Recurso especial não provido. (Origem: STJ - SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL –
927818, Processo: 200700366476 UF: RS Órgão Julgador:
SEGUNDA TURMA, Data da decisão: 01/04/2008 Documento:
STJ000826047, Fonte DJ DATA:17/04/2008 PÁGINA:1, Relator(a)
CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF
1ª REGIÃO) (grifamos)
MP. LEGITIMIDADE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMÉDIOS.
FORNECIMENTO. DOENÇA GRAVE. A Seção, por maioria,
entendeu que o Ministério Público tem legitimidade para defesa de
direitos individuais indisponíveis em favor de pessoa carente
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individualmente considerada, na tutela dos seus direitos à vida e à
saúde (CF/1988, arts. 127 e 196). Precedentes citados: REsp
672.871-RS, DJ 1º/2/2006; REsp 710.715-RS, DJ 14/2/2007, e REsp
838.978-MG, DJ 14/12/2006. EREsp 819.010-SP, Rel. originária Min.
Eliana Calmon, Rel. para acórdão Min. Teori Albino Zavascki,
julgados em 13/2/2008. (Julgamento noticiado no Informativo de
Jurisprudência nº. 344, de 11 a 15 de fevereiro de 2008).” (grifamos)
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTERNAÇÃO DE
MENOR EM HOSPITAL COM UTI NEONATAL PARA
REALIZAÇÃO DE PARTO DE RISCO. DIREITO À VIDA E À
SAÚDE.
DIREITO
INDIVIDUAL
INDISPONÍVEL.
LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DO PARQUET. ART. 127
DA CF/88. PRECEDENTES.
1. O Ministério Público possui legitimidade para defesa dos direitos
individuais indisponíveis, mesmo quando a ação vise à tutela de
pessoa individualmente considerada.
2. O artigo 127 da Constituição, que atribui ao Ministério Público
a incumbência de defender interesses individuais indisponíveis,
contém norma auto-aplicável, inclusive no que se refere à
legitimação para atuar em juízo.
3. Tem natureza de interesse indisponível a tutela jurisdicional do
direito à vida e à saúde de que tratam os arts. 5º, caput e 196 da
Constituição, em favor de menor que precisa realizar parto em hospital
com UTI neonatal, por se tratar de procedimento de risco. A
legitimidade ativa, portanto, se afirma, não por se tratar de tutela de
direitos individuais homogêneos, mas sim por se tratar de interesses
individuais indisponíveis. Precedentes: REsp 16.512/RS, Rel. Min.
Luiz Fux, 1ª Turma, DJ de 14.11.2005; EDcl no Resp 662.033/RS,
Rel. Min. José Delgado, 1ª Turma, DJ de 13.06.2005.
4. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ - RESP
865901/RS - PRIMEIRA TURMA – j. 05/12/2006 - DJ:14/12/2006
PÁGINA:316 -Relator(a) TEORI ALBINO ZAVASCKI –
unânime)(grifamos)
PROCESSUAL
CIVIL.
RECURSO
ESPECIAL.
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CAUTELAR
INOMINADA. LEGITIMATIO AD CAUSAM DO PARQUET.
ART. 127 DA CF/88. DIREITO À SAÚDE.
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1. O Ministério Público está legitimado a defender os interesses
transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os
individuais homogêneos.
2. É que a Carta de 1988, ao evidenciar a importância da
cidadania no controle dos atos da Administração, com a eleição
dos valores imateriais do art. 37, da CF/1988 como tuteláveis
judicialmente, coadjuvados por uma série de instrumentos
processuais de defesa dos interesses transindividuais, criou um
microssistema de tutela de interesses difusos referentes à
probidade da administração pública, nele encartando-se a Ação
Cautelar Inominada, Ação Popular, a Ação Civil Pública e o
Mandado de Segurança Coletivo, como instrumentos concorrentes
na defesa desses direitos eclipsados por cláusulas pétreas.
3. Deveras, é mister concluir que a nova ordem constitucional erigiu
um autêntico 'concurso de ações' entre os instrumentos de tutela dos
interesses transindividuais e, a fortiori, legitimou o Ministério Público
para o manejo dos mesmos.
4. Legitimatio ad causam do Ministério Público à luz da dicção final
do disposto no art. 127 da CF/1988, que o habilita a demandar em prol
de interesses indisponíveis.
5. Sob esse enfoque a Carta Federal outorgou ao Ministério Público a
incumbência de promover a defesa dos interesses individuais
indisponíveis, podendo, para tanto, exercer outras atribuições previstas
em lei, desde que compatível com sua finalidade institucional
(CF/1988, arts. 127 e 129).
6. In casu, trata-se de Ação Cautelar Inominada ajuizada pelo
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, objetivando que o
Município custeie avaliação de tratamento médico especializado a
pessoa portadora de varizes nos membros inferiores com insuficiência
venosa bilateral, e recurso especial interposto contra acórdão que
decidiu pela ilegitimidade ativa do Ministério Público para pleitear
direito de outrem que não idoso, criança ou adolescente.
7. O direito à saúde, insculpido na Constituição Federal é direito
indisponível, em função do bem comum, maior a proteger,
derivado da própria força impositiva dos preceitos de ordem
pública que regulam a matéria.
8. Outrossim, o art. 6.º do CPC configura a legalidade da legitimação
extraordinária cognominada por Chiovenda como "substituição
processual".
9. Impõe-se, ressaltar que a jurisprudência hodierna do E. STJ admite
ação individual acerca de direito indisponível capitaneada pelo MP
(Precedentes: REsp 688052 / RS, DJ 17.08.2006; REsp 822712 / RS,
DJ 17.04.2006; REsp 819010 / SP, DJ 02.05.2006).
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10. Recurso especial provido para reconhecer a legitimidade ativa do
Ministério Público Estadual. (Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 817710,
Processo: 200600275362 UF: RS Órgão Julgador: PRIMEIRA
TURMA, Data da decisão: 17/05/2007 Documento: STJ000750328,
Fonte DJ DATA:31/05/2007 PÁGINA:364, Relator(a) LUIZ FUX)
(grifamos).
2. Competência da Justiça Federal
A competência da Justiça Federal está disciplinada no artigo 109, caput, I,
§2º, da Constituição Federal, que assim estabelece:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública
federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou
oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as
sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.
Cabe realçar que a competência dessa Justiça Federal é facilmente
identificada quando se tem em vista o interesse e da União para a causa, inclusive a sua
condição de ré, porquanto este ente federado tem importante papel e responsabilidade
específica no financiamento e implementação das ações ligadas ao Sistema Único de Saúde,
em especial, no que se refere aos serviços de alta complexidade (UTI's).
Ademais, in casu, verifica-se a, concretamente, a deficiência na prestação
de serviço de saúde pública de alta complexidade para a população referenciada da
macrorregião de Uberaba/MG, que, em grande parte, é encaminhada para atendimento de
urgência e emergência no Hospital Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro –
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UFTM, cujas instalações, todavia, não dispõem dos leitos de UTI's suficientes para atender
aquelas pessoas – em estado grave ou de risco – que necessitam de assistência médica e de
enfermagem ininterrupta, com equipamentos próprios e recursos humanos especializados.
Ou seja, a presente ação civil pública envolve, além das questões atinentes
ao Sistema Único de Saúde, problemas ligados à correta prestação de serviços públicos por
entidade da administração pública federal indireta (UFTM).2
3. Dos Fatos
De acordo com as informações contidas no procedimento administrativo nº.
1.22.002.000239/2005-60, instaurado no âmbito desta Procuradoria da República, bem como
diante dos documentos consubstanciados em investigação promovida pelo Ministério Público
Estadual (Procedimentos Administrativos nº.s 066/06 e 007/08 – fls. 1.237/1.523), o
Município de Uberaba/MG não dispõe, atualmente, de leitos de UTI suficientes para atender
toda a demanda de pacientes do SUS, de Uberaba/MG e dos 27 (vinte e sete) municípios
referenciados.
Como é de largo conhecimento público, o Hospital Escola, órgão vinculado
à estrutura administrativa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, vem registrando,
habitualmente, graves situações de superlotação nos serviços de alta complexidade. Projetado
para outra época, embora continue sendo referência regional e prestando excelentes serviços à
2 Sobre a responsabilidade da União no âmbito do SUS, notadamente quantos aos serviços de alta
complexidade, vide tópico específico.
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população, o Hospital Escola já não consegue atender sozinho toda a demanda que lhe é
imposta.
O Município de Uberaba/MG, como sede de macrorregional, é referência
em saúde pública para vinte e sete (27) municípios do triângulo mineiro, com população
assistida em torno de 650.000 (seiscentos e cinqüenta mil) habitantes. São encaminhados para
Uberaba/MG especialmente pacientes que se utilizam dos serviços de alta complexidade
(cirurgias cardíacas, neurocirurgias, cirurgias bariátricas, internações em UTI etc.).
De acordo com a pactuação existente, o município de Uberaba/MG recebe
pacientes referenciados de vinte e sete (27) municípios, além de outros que são encaminhados
fora da pactuação e sem passarem pelo controle (obrigatório) do SUS/Fácil. Há registro
também de pacientes que são encaminhados além do pactuado, provavelmente por falta de
recursos de algumas cidades e/ou do descontrole do próprio sistema.
O certo é que, invariavelmente, o Hospital Escola tem recebido pacientes
acima de sua capacidade instalada, com graves prejuízos e danos aos pacientes. É claro que a
cidade conta com outras unidades hospitalares conveniadas, como, por exemplo, Hospital
Hélio Angotti, referência em oncologia; Hospital da Beneficência Portuguesa, em
maternidade, e o Hospital Universitário. Contudo, a estrutura do SUS existente não é
suficiente para atender toda a demanda.
A gravidade dos fatos advinda da superlotação do Pronto Socorro do
HC/UFTM foi noticiada à esta Procuradoria, inicialmente, no ano de 2005, consoante se
observa do documento de fls. 04/06, e, mais tarde, no dia 17 de dezembro de 2007, à
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Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Uberaba/MG, ocasião na qual a
Diretora do Pronto Socorro daquela unidade hospitalar, Dra. Geisa Perez Medina Gomide,
através do ofício 074/07/UPS/HC/UFTM, retratou ao parquet estadual preocupação com o
estrangulamento do setor de Pronto Atendimento – superlotado – e com as condições
dispensadas aos pacientes (fls. 1.243/1.244).
Naquele mesmo documento, a Diretoria do Pronto Socorro informou a
existência de verdadeiro caos no setor de urgência e emergência, da seguinte forma:
A Unidade de Pronto Socorro do HC/UFTM trabalha com espaço
físico limitado e o número fixo de servidores (médicos, enfermeiros de
técnicos), podendo atender com certo conforto a 32 pacientes adultos
simultaneamente. Na mesma linha, diariamente este número é
ultrapassado sendo que raramente ficamos com menos de 45,
chegando até 60 pacientes ao mesmo tempo.
Muitas vezes existem vagas nas enfermarias porém ou os casos são
tão graves que precisam de UTI, as quais sempre estão lotadas, ou
estão apenas em observação e não podem ser transferidos.
A grande demanda no plantão noturno no Hospital Escola também já havia
sido, à época, objeto de cobrança por parte da Coordenação do Pronto Socorro Adulto, nos
termos de documento encaminhado à direção de enfermagem, quando, então, foi chamada a
atenção para a necessidade de melhor assistência, pela enfermagem, e da qualidade e
humanidade que deveriam ser destinadas aos pacientes internados (fls. 1.254/1.255).
A propósito, salutar transcrever o trecho do documento subscrito pela
Coordenadora do Pronto Atendimento, Hélida Rosa Silva, dirigido à Diretoria de
Enfermagem do Hospital Escola:
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Com o corredor superlotado temos que usar nossa criatividade
para respeitar o pudor que sabendo ser um dos seus direitos, nos
desdobramos para conseguir espaço, mesmo que seja em uma
parte do corredor para dar banho e trocar os pacientes...
Não basta colocar os pacientes dentro do pronto socorro se ele não for
atendido adequadamente. Não estamos preocupados com o número de
pacientes que são atendidos em nosso serviço, mas com a qualidade
deste atendimento, na maioria das vezes são atendidos em macas sem
lençol, sem desinfecção prévia sem grades, sem sistema de elevação
da cabeceira e sem travesseiros.
Na mesma linha, o SINTE-MED – Sindicato dos Trabalhadores em
Educação da UFTM, por intermédio do Ofício nº. 91/2006, após relatar o estado de
descontrole do setor de Pronto Atendimento do Hospital Escola, enviou cópia do expediente
ao Ministro da Educação, Ministro da Saúde, Ministério Público Estadual, Federal, Reitoria
etc (fls. 1.429/1.431).
Em resumo, o SINTE-MED registrou o seguinte:
Portanto, temos a soma de 58 pacientes, num PSA que comporta
até 28 pacientes com um mínimo de qualidade, onde vários
estavam em estado gravíssimo. E para atendê-los com dignidade e
qualidade conforme reza a CF (1988), só havia 8 (oito)
trabalhadores federais (corpo de enfermagem), se configurando
um verdadeiro ESTADO DE GUERRA ou de CALAMIDADE
PÚBLICA.
O que já era grave ficou ainda pior. Para ilustrar, ao lado de outros casos
também considerados muito graves, merece destaque o caso da paciente M.J.R., de 34 anos de
idade, que foi internada no Hospital Escola no dia 11 de dezembro 2007, com quadro de
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aneurisma cerebral e indicação de cirurgia. Por falta de leitos de UTI a paciente não foi
operada e acabou vindo a óbito no dia 05 de janeiro de 2008 (fls. 1252/1.253 e 1.292/1.293).
O médico responsável pelo setor de neurocirurgia, Dr. Leopoldo Prézia
Araújo, ao tomar conhecimento da reclamação prestou os necessários esclarecimentos, dando
conhecimento também da gravidade que o setor de neurocirurgia atravessa diante da escassez
de leitos de UTI. A gravidade dos fatos foi narrado, em parte, pelo neurocirurgião à Direção
Clínica, antes que a paciente viesse à óbito (fls. 1.278/1.279):
1º A paciente encontra-se internada esperando tratamento cirúrgico de
aneurisma cerebral, que ainda não foi realizado até momento, tão
somente pela absoluta falta de vagas em Unidades de Terapia
Intensiva ocasionada pela superlotação de nosso hospital (como
pode ser comprovado pelo ofício n. 074/07/UPS/HC/UFTM);
2º A situação da paciente é a mesma de outros que estiveram ou ainda
estão internados nas ultimas semanas , tais como: M.A.P. (RG
HC/UFTM:19235); M.C. (RG HC/UFTM:511239); M.F.S. (RG
HC/UFTM:536929); G.C.A. (RG HC/UFTM:452879); todos
portadores de aneurisma cerebrais que rotineiramente têm
aguardado vaga em UTI para serem operados porem a
superlotação permanente deste setor tem atrasado a realização da
cirurgia. (g.n.).
No mesmo documento, segue o médico descrevendo a gravidade dos
pacientes que continuam aguardando procedimento no setor de neurocirurgia, relatando
inclusive os constantes cancelamentos de cirurgias por falta de leitos de UTI. Os registros
relativos ao plantão do dia 1º de janeiro de 2008 noticiam que aproximadamente 25 (vinte e
cinco) pacientes estariam aguardando os procedimentos de neurocirurgia (fls.
1.282/1.283).
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O mencionado profissional foi ouvido perante a Promotoria de Justiça de
defesa da Saúde da Comarca de Uberaba/MG. Na oportunidade, o Dr. Leopoldo confirmou
que a falta de leitos de UTI tem causado inegáveis prejuízos aos serviços de neurocirurgia,
com reflexos danosos aos pacientes que acabam morrendo por causa da falta de leitos de UTI
(fls. 1.315/1.316).
Os dados constantes do prontuário médico da paciente, subscrito pelos
médicos responsáveis pela neurocirurgia, comprovam a suspensão de cirurgia agendada para
M.F.S., por falta de vaga na UTI (fl. 1.285)
Os administradores do Hospital Escola também foram ouvidos na
Promotoria de Justiça de defesa da Saúde da Comarca de Uberaba/MG, ocasião na qual o
Superintendente, Dr. Murilo Antônio Rocha, a Diretora Clínica, Dra. Cristina Cunha Hueb
Barata de Oliveira, e Diretora do Pronto Socorro, Dra. Geisa Perez Medina Gomide,
confirmaram que o número de leitos de UTI existentes no Hospital Escola da UFTM são
realmente insuficientes para atender os pacientes que necessitam do tratamento
intensivo (fls. 1.332/1.338).
Os relatórios anexados aos autos confirmam, também, os elevados índices
de ocupação dos leitos de UTI Hospitalar, merecendo destaque, os alarmantes níveis de
ocupação da Unidade de Terapia Intensiva do Pronto Socorro, entre os meses de junho de
2007 a janeiro de 200, conforme relatório expedido pela UFTM, em 26 de fevereiro de 2008
(fls. 1.321/1.325).
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Em oficios datados de 09 e 15 de julho de 2008, a Diretoria Clínica do
Hospital Escola da UFTM informou que, nos dias 08/07/2008 e 15/07/2008, respectivamente,
12 (doze) pacientes e 09 (nove), pacientes necessitavam de internação em UTI, sem
possibilidade de vaga imediata ou mesmo em curto prazo, em quaisquer das UTI's no
Hospital Escola. Os relatórios fotográficos anexados demonstram a situação alarmante
verificada no Hospital Universitário (fls. 1.121/1.122 e 1.158/1.159)
Ressalte-se que, de acordo com declarações prestadas pela Diretoria Clínica
do Hospital Escola da UFTM ao Jornal da Manhã, edição de 10/07/08, atualmente, aquela
unidade hospitalar conta com estrutura física para instalação imediata de mais 15 (quinze)
leitos, o que, apesar de não ser o número ideal, teria o condão de solucionar provisoriamente o
problema em questão, a partir da imediata instalação dos leitos de UTI's necessários ao
atendimento dos pacientes, medida que se busca com o ajuizamento da presente ação civil
pública (fl. 1.132).
No dia 15/07/2008, às 14:00 horas, atendendo determinação deste signatário,
02 (dois) servidores desta Procuradoria da República compareceram nas dependências do
Hospital Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, com a finalidade de averiguar
as condições de funcionamento das Unidades de Terapia Intensiva, bem como a demanda por
tais serviços. Na ocasião, foram pelos médicos Dra. CRISTINA HUEB BARATA, Diretora
Clínica do Hospital Escola, e Dr. MURILO ANTÔNIO ROCHA, Superintendente, retratando
a seguinte situação (fls. 1.165/1.178):
Em conversa com esses representantes do HE, fomos informados de
que no hospital existem 11 (onze) leitos de UTI credenciados junto ao
Sistema Único de Saúde (SUS), destinados a adultos. Para tais leitos,
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o SUS remunera R$ 360,00/dia, valor inferior ao custo médio que gira
em torno de R$600,00/dia. Ainda segundo os Diretores do HE,
existem outros 9 (nove) leitos de UTI adulto que, embora estejam
completamente aparelhados e em pleno funcionamento, estão
credenciados junto ao SUS como leitos comuns, cuja remuneração é
bastante inferior à dos leitos de UTI.
Ouvimos dos representantes do HE que, em razão da grande
demanda, a instituição se viu obrigada a improvisar outros leitos
(fls. 4/13), embora estes não possam ser considerados UTIs,
contam com alguns aparelhos próprios das unidades de terapia
intensiva. Não obstante, há carência de equipes médicas e
instalações adequadas. Dessas unidades improvisadas, 06
funcionam em uma enfermaria e outras são “montadas” imediata
e precariamente em outros setores do hospital, como, por
exemplo, na sala de emergências e nas salas de pós operatório,
chegando a ficar muitos dias nesta situação.
Com o emprego dessa estratégia, muitas vidas têm sido salvas,
contudo tais improvisações geram o travamento de outros setores
importantes do hospital, ocupando as enfermarias gerando a
recusa de pacientes encaminhados pelo Sistema SUS Fácil. É o
que ocorre por exemplo quando as UTIs improvisadas são
montadas nas salas de recuperação pós operatória, pois se tais
salas estão ocupadas pelos leitos de UTI improvisados, mesmo que
as mesas de cirurgia estejam prontas para utilização, as cirurgias
não podem acontecer ocorrendo a remarcação das mesmas. O
mesmo ocorre no caso da sala de emergências que, estando
ocupada pelas UTIs improvisadas, não podem receber aqueles
pacientes que sempre chegam em estado de saúde gravíssimo, tais
como vítimas de acidentes de veículos, queimados, vítimas de
arma de fogo e arma branca, dentre outros.
Visando aperfeiçoar os serviços de UTIs improvisadas, a Direção do
HE montou uma central de equipamentos de UTI. Assim, sempre que
a situação exige que paciente seja tratado em UTI, em não havendo
vagas, o que ocorre sempre, todos os dias do ano, monta-se, de
afogadilho, uma UTI no setor onde o paciente se encontra internado
(sala de emergência, sala de pós operatório, enfermaria etc.).
Há pacientes que, embora necessitem de internamento em UTI,
encontram-se em situação de menor risco do que os demais.
Nesses casos, tais pacientes chegam a esperar até 15 dias por uma
vaga.
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Segundo os Diretores Murilo e Cristina, há situações absurdas em
que o médico diarista se vê obrigado a escolher qual paciente será
internado em UTI e qual não receberá tal serviço. Em outras
palavras, o médico diarista se vê obrigado a escolher qual paciente
terá mais chances de viver, recebendo todos os cuidados de uma
UTI ideal, e qual será exposto a um grande risco de morrer. Por
óbvio, o quadro é bastante estressante e frustante para todos os
profissionais de saúde envolvidos.
Importa ressaltar que a demanda enfrentada pelo Hospital Escola não
encontra alento nos demais leitos de UTI oferecidos pelos hospitais
privados, vez que em sua maioria são leitos de baixa resolutibidade,
leitos que não oferecem ao médico o apoio necessário em certos casos
mais complexos. Igualmente, os leitos existentes nas cidades vizinhas
de Araxá e Frutal, também por serem de baixa resolutibidade, não se
prestam a atendimentos mais complexos. Assim, no HE deságuam
pacientes vindos da rede privada e da rede pública de Uberaba e de
todas as cidades do sul do Triângulo Mineiro e de várias outras
regiões, cuja população é algo por volta de 650.000 mil habitantes.
É de destacar que, na situação atual, não basta instalação de UTIs
em áreas adequadamente preparadas, tanto no que toca às
instalações físicas quanto no que toca à aparelhagem. Também se
faz essencial a contratação de equipes médicas multiprofissionais
(fl. 14), sem as quais as UTIs não têm condições de funcionamento
adequado e condições ideais aos pacientes.
Outro ponto importante diz respeito aos leitos acima referidos que são
improvisados para fazer as vezes de UTIs. É que a Vigilância
Sanitária freqüentemente tem pressionado o HE com ameaças de
multa por manter pacientes em instalações de terapia intensiva
improvisadas. Os médicos, nessas situações, ficam acuados: não têm
instalações adequadas de terapia intensiva para oferecer aos pacientes;
para tentar salvar vidas, não podem privar os pacientes dos
tratamentos intensivos realizados improvisadamente e também não
podem manter os pacientes nesses leitos improvisados.
Um dado curioso relatado pelo médicos diz respeito à implantação
do RESGATE do Corpo de Bombeiros e do SAMU da Prefeitura.
Com o uso esses veículos de socorro, muitas vítimas tem sido
salvas no trajeto até o HE e lá, embora vivos, chegam carentes de
serviços imediatos de UTI, o que tornou mais uma causa de
aumento da demanda, pois são situações onde não se admitem
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recusa do paciente devido a urgência e emergência da situação.
Ou seja, tendo ou não vaga na UTI, o paciente dá entrada no
hospital.
Outro dado que merece atenção diz respeito aos graves acidentes de
trânsito causados por condutores alcoolizados. De acordo com o
Diretor Murilo, que atua em tais casos, o uso de etilômetros
(bafômetros) nas “blitz” de trânsito poderia diminuir
consideravelmente as ocorrências que exigem atendimento em UTIs,
na medida em que inibem a direção de veículos por alcoolizados.
No que toca às UTIs neonatal e infantil, a procura também é grande,
todavia os 20 (vinte) leitos existentes quase sempre suprem a
demanda.
Após as informações prestadas pelos Diretores Murilo e Cristina,
fomos acompanhados até as instalações de internação dos HE.
Pudemos constatar uma UTI improvisada instalada na sala de
emergência, seis UTIs improvisadas instaladas em uma
enfermaria, UTIs improvisadas instaladas em outros setores que
não contam sequer com camas, sendo utilizadas macas para a
acomodação dos pacientes, todos em situações de risco de queda,
infecção hospitalar e outros. (grifamos).
Diante das informações e dos fatos retratados naquela oportunidade,
verifica-se, à evidência, a carência de estrutura física e humana adequada ao atendimento das
pessoas que necessitam de tratamento nas Unidades de Terapia Intensiva no Hospital Escola
da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, em total desrespeito ao direito à vida, à
saúde e, sobretudo, à dignidade da pessoa humana, cujo núcleo essencial deve ser
respeitado e garantido pelo Estado em qualquer hipótese.
Conforme se depreende do relatório elaborado no dia 15/07/2008,
corroborado pelas fotos reproduzidas na ocasião, os pacientes que aguardam leitos de UTI's
estão sendo submetidos a tratamento desumano e degradante, na medida em que, enquanto
aguardam vagas em UTI's, são alojados em setores improvisados nas dependências do
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Hospital Escola, sem assistência médica adequada à gravidade do respectivo estado de saúde
e à mercê da sorte de sobreviver, caso sejam escolhidos pelo médico responsável para a
internação em UTI. O desrespeito à vida e à digninidade desses pacientes, pois, é
diuturnamente violado pelo próprio Estado, principal destinatários da proteção aos
direitos fundamentais.
4. Da insuficiência de disponibilidade de leitos de UTI na macrorregião de Uberaba/MG
e não observância dos parâmetros estabelecidos na Portaria GM nº. 1.101/02 do
Ministério da Saúde
Diante da necessidade de se estabelecer uma estimativa mínima da
necessidade de leitos hospitalares, incluindo-se os leitos de UTI”s, no âmbito do Sistema
Único de Saúde, o Ministério da Saúde editou a Portaria nº. 1.101/GM, de 12 de junho de
2002, a qual, no item 3.5 consignou o seguinte:
“3.5 NECESSIDADE DE LEITOS HOSPITALARES
Em linhas gerais, estima-se a necessidade de leitos hospitalares da
seguinte forma:
a) Leitos hospitalares Totais – 2,5 a 3 leitos para cada 1.000
habitantes;
b) Leitos de UTI: calcula-se, em média, a necessidade de 4% a
10% do total de leitos hospitalares;
c) Leitos em Unidades de Recuperação (pós-cirúrgico): calcula-se, em
média 2 e 3 leitos por sala de cirúrgica;
d) Leitos para Pré Parto: calcula-se, no mínimo, 2 leitos por sala de
Parto” (grifamos)
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Nesse contexto, a partir dos dados indicativos da Portaria nº. 1.101/GM, do
Ministério da Saúde, ato normativo geral e válido, e do total da população referenciada,
cerca de 650.000 (seiscentos e cinqüenta mil) habitantes, a macrorregional de Uberaba/MG
teria que dispor, no âmbito do Sistema Único de Saúde, de um mínimo de 64 (sessenta e
quatro) e um máximo de 191 (cento e noventa e um) leitos de Unidades de Terapia
Intensiva, a ser implementadas de acordo com os critérios fixados na Portaria GM/MS nº.
3.432/98, que estabelece os elementos básicos que devem estruturar as UTI's.
Entretanto, a partir das informações obtidas junto às unidades
hospitalares conveniadas, verifica-se, de plano, que, atualmente, encontram-se em
efetivo funcionamento na Macrorregional de Uberaba/MG (SUS) apenas 58 (cinqüenta e
oito) leitos de UTI's (leitos operacionais), número aquém do padrão mínimo estipulado
pelo Ministério da Saúde, o que, no caso da macrorregional de Uberaba/MG, deveria
obedecer o mínimo de 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI's (Portaria GM/MS nº.
1.101/2002, Item 3.5, alínea “b”).
Os 58 (cinqüenta e oito) leitos de UTI's em efetivo funcionamento na
macrorregional de Uberaba/MG, dentre aqueles credenciados no âmbito do Sistema Único de
Saúde, número, repita-se, aquém do padrão mínimo exigido pelo Ministério da Saúde,
estão distribuídos da seguinte forma (fls. 1.205/1.230):
Hospital
Leitos de UTI's Operacionais
Tipos de Leitos de UTI's
Hospital Escola UFTM
31
11 – Neonatal Tipo II
20 – Adulto Tipo II
Hospital e Maternidade São
02
02 – Adulto Tipo II
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Hospital
Leitos de UTI's Operacionais
Tipos de Leitos de UTI's
Hospital de Clínica da
UNIUBE
05
05 – Adulto Tipo II
Hospital Hélio Angotti
05
05 – Adulto Tipo II
Santa Casa de Misericórdia
de Araxá/MG
08
02 – Adulto Tipo I
06 – Adulto Tipo II
Casa do Caminho
(Araxá/MG)
07
07 – Adulto Tipo II
Domingos
De acordo com informações da Diretoria Clínica do Hospital Escola da
UFTM, aquela entidade hospitalar conta, além dos 31 (trinta e um) leitos de UTI's
devidamente credenciados no Sistema Único de Saúde, com mais outros 15 (quinze) leitos de
UTI's sem credenciamento junto ao Ministério da Saúde e desprovidos de instalações
adequadas, ou seja, são leitos improvisados pela direção do Hospital Escola3.
Entretanto, os leitos improvisados, frise-se, são incapazes de atender a todos
requisitos estabelecidos na Portaria GM/MG nº. 3.432, de 12 de agosto de 1998, e, por
conseguinte, de integrar o cálculo exigido para verificar a fiel observância aos padrões
mínimos fixados pelo Ministério da Saúde (Portaria GM/MS nº. 1.101/2002, Item 3.5), o que
se observa diante do relatório elaborado pelos servidores desta Procuradoria da República, às
fls. 1.165/1.167, e das fotos que o acompanham, às fls. 1.168/1.178.
3 Essa situação foi constatada durante a visita realizada pelos servidores desta Procuradoria da República no
Hospital Escola, conforme se depreende do relatório de fls. 1.165.1.167).
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Aliás, a própria existência de leitos de UTI's improvisados demonstra que os
leitos credenciados não suprem a demanda de atendimento do Hospital Escola da UFTM. A
necessidade de novos leitos de UTI's é tamanha, que a diretoria do Hospital Escola se viu
obrigada, diante a omissão do Ministério da Saúde em credenciar novos leitos, em
improvisar outros leitos e locais diversos do hospital, mesmo sem credenciamento ou
estrutura adequada, a fim de possibilitar aos paciente mais chances de sobrevivência.
Não é demasiado frisar, novamente, esta situação, que foi retratada pelos
servidores desta Procuradoria da República durante visita ao Hospital Escola da UFTM, em
15/07/2008:
Ouvimos dos representantes do HE que, em razão da grande
demanda, a instituição se viu obrigada a improvisar outros leitos
(fls. 4/13), embora estes não possam ser considerados UTIs,
contam com alguns aparelhos próprios das unidades de terapia
intensiva. Não obstante, há carência de equipes médicas e
instalações adequadas. Dessas unidades improvisadas, 06
funcionam em uma enfermaria e outras são “montadas” imediata
e precariamente em outros setores do hospital, como, por
exemplo, na sala de emergências e nas salas de pós operatório,
chegando a ficar muitos dias nesta situação.
Com o emprego dessa estratégia, muitas vidas têm sido salvas,
contudo tais improvisações geram o travamento de outros setores
importantes do hospital, ocupando as enfermarias gerando a
recusa de pacientes encaminhados pelo Sistema SUS Fácil. É o
que ocorre por exemplo quando as UTIs improvisadas são
montadas nas salas de recuperação pós operatória, pois se tais
salas estão ocupadas pelos leitos de UTI improvisados, mesmo que
as mesas de cirurgia estejam prontas para utilização, as cirurgias
não podem acontecer ocorrendo a remarcação das mesmas. O
mesmo ocorre no caso da sala de emergências que, estando
ocupada pelas UTIs improvisadas, não podem receber aqueles
pacientes que sempre chegam em estado de saúde gravíssimo, tais
como vítimas de acidentes de veículos, queimados, vítimas de
arma de fogo e arma branca, dentre outros.
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Visando aperfeiçoar os serviços de UTIs improvisadas, a Direção
do HE montou uma central de equipamentos de UTI. Assim,
sempre que a situação exige que paciente seja tratado em UTI, em
não havendo vagas, o que ocorre sempre, todos os dias do ano,
monta-se, de afogadilho, uma UTI no setor onde o paciente se
encontra internado (sala de emergência, sala de pós operatório,
enfermaria etc.). (fls. 1.165/1.167) (grifos não originais)
As Unidades de Terapia Intensiva são unidades hospitalares destinadas ao
atendimento de pacientes graves ou de risco que dispõem de assistência médica e enfermagem
ininterruptas, com equipamentos específicos próprios, recursos humanos especializados e que
tenham acesso a outras tecnologias destinadas a diagnósticos e terapêutica (item 1.1 do anexo
da Portaria GM/MS nº. 3.432, de 12 de agosto de 1998).
As UTI's tipo II, padrão dos leitos credenciados operacionais existentes no
Hospital Escola da UFTM, devem contar com a seguinte estrutura básica, segundo estabelece
a Portaria GM/MS nº. 3.432/1998, verbis:
2 - Das Unidades de Tratamento Intensivo do tipo II:
2.1. Deve contar com equipe básica composta por:
-um responsável técnico com título de especialista em Medicina
Intensiva ou com habilitação em Medicina Intensiva Pediátrica, ou, no
caso de Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal, um médico com
título de especialista em Pediatria com área de atuação em
Neonatologia conferidos pela Associação Médica Brasileira (com
redação introduzida pela Portaria GM/MS nº. 332, de 24 de março de
2000);
- um médico diarista para cada dez leitos ou fração, com título de
especialista em Medicina Intensiva ou com habilitação em Medicina
Intensiva Pediátrica, ou no caso de Unidade de Tratamento Intensivo
Neonatal, um médico com título de especialista em Pediatria com área
de atuação em Neonatologia, conferidos pela Associação Médica
Brasileira (com redação introduzida pela Portaria GM/MS nº. 332, de
24 de março de 2000);
- um médico plantonista exclusivo para até 10 pacientes ou fração;
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- um enfermeiro coordenador, exclusivo da unidade, responsável pela
área de enfermagem;
- um enfermeiro, exclusivo da unidade, para cada 10 leitos ou fração ,
por turno de trabalho;
- um fisioterapeuta para cada 10 leitos ou fração no turno da manhã e
da tarde;
- um auxiliar ou técnico de enfermagem para cada 2 leitos ou fração,
por turno de trabalho;
- um funcionário exclusivo responsável pelo serviço de limpeza;
- acesso a cirurgião geral (ou pediátrico), torácico, cardiovascular,
neurocirurgião e ortopedista.
2.2. O hospital deve contar com:
- Laboratório de análises clínicas disponível nas 24 horas do dia;
- Agência transfusional disponível nas 24 horas do dia;
- Hemogasômetro;
- Ultra-sonógrafo;
- Eco-doppler-cardiógrafo;
- Laboratório de microbiologia;
- Terapia renal substitutiva;
- Aparelho de raios x móvel;
- Serviço de Nutrição Parenteral e enteral;
- Serviço Social;
- Serviço de Psicologia.
2.3. O hospital deve contar com acesso a:
- Estudo hemodinâmico;
- Angiografia seletiva;
- Endoscopia digestiva;
- Fibrobroncoscopia;
- Eletroencefalografia.
2.4. Materiais e Equipamentos necessários:
- Cama de Fawler, com grades laterais e rodízio, uma por paciente;
- Monitor de beira de leito com visoscópio, um para cada leito;
- Carro ressuscitador com monitor, desfibrilador, cardioversor e
material para intubação endotraqueal, dois para cada 10 leitos ou
fração;
- Ventilador pulmonar com misturador tipo blender , um para cada
dois leitos, devendo 1/3 dos mesmos ser do tipo microprocessado;
- Oxímetro de pulso, um para cada dois leitos;
- Bomba de infusão, duas bombas por leito;
- Conjunto de nebulização, em máscara, um para cada leito;
- Conjunto padronizado de beira de leito, contendo: termômetro
(eletrônico, portátil, no caso de UTI neonatal), esfigmomanômetro,
estetoscópio, ambu com máscara (ressuscitador manual), um para cada
leito;
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- Bandejas para procedimentos de: diálise peritoneal, drenagem
torácica, toracotomia, punção pericárdica, curativos, flebotomia,
acesso venoso profundo, punção lombar, sondagem vesical e
traqueostomia;
- Um monitor de pressão invasiva;
- Marcapasso cardíaco externo, eletrodos e gerador na unidade,
- Eletrocardiógrafo portátil, dois de uso exclusivo da unidade;
- Maca para transporte com cilindro de oxigênio, régua tripla com
saída para ventilador pulmonar e ventilador pulmonar para transporte;
- Máscaras de venturi que permita diferentes concentrações de gases;
- Aspirador portátil;
- Negatoscópio;
- Oftalmoscópio;
- Otoscópio;
- Pontos de oxigênio e ar comprimido medicinal com válvulas
reguladoras de pressão e pontos de vácuo para cada leito;
- Cilindro de oxigênio e ar comprimido, disponíveis no hospital;
- Conjunto CPAP nasal mais umidificador aquecido, um para cada
quatro leitos, no caso de UTI neonatal, um para cada dois leitos;
- Capacete para oxigenioterapia para UTIs pediátrica e neonatal;
- Fototerapia, um para cada três leitos de UTI neonatal;
- Incubadora com parede dupla, uma por paciente de UTI neonatal;
- Balança eletrônica, uma para cada dez leitos na UTI neonatal.
2.5. Humanização:
- Climatização;
- Iluminação natural;
- Divisórias entre os leitos;
- Relógios visíveis para todos os leitos;
- Garantia de visitas diárias dos familiares, a beira do leito;
- Garantia de informações da evolução diária dos pacientes aos
familiares por meio de boletins.
Assim, a instalação de leitos improvisados nas dependências do Hospital
Escola da UFTM não tem o condão de suprir as rigorosas exigências relativas ao
credenciamento e estruturação básica de leitos de UTI estabelecidos pelo próprio Ministério
da Saúde e, nem muito menos, exonerar a União de implementar, concretamente, o
credenciamento e funcionamento do número leitos mínimos que o próprio ente federado
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reconhece como necessário para atender a toda população da macrorregional de
Uberaba/MG, a saber 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI's.
Ressalte-se que a necessidade mínima de leitos de UTI's preconizada pelo
Ministério da Sáude, através da Portaria GM nº. 1.101/2002, só pode ser aquela referente
aos leitos credenciados e em efetivo funcionamento nas unidades hospitalares
conveniadas. Ou seja, apenas aqueles leitos devidamente credenciados e em plenas condições
de possibilitar a internação dos pacientes (leitos operacionais) é que devem ser considerados
para efeitos do cálculo do número mínimo exigido pelo citado ato normativo, sob pena de se
considerar como UTI aquilo que não o é.
Assim, aqueles leitos de UTI's credenciados junto ao SUS que, todavia, não
foram efetivamente instalados ou que não estejam em operação, ou seja, aqueles leitos de
UTI's que só existem no “papel” (leitos fictícios), bem como aqueles leitos que não foram
credenciados e/ou aqueles leitos de UTI's desprovidos das instalações adequadas estabelecidas
em ato normativo válido (Portaria GM/MS nº. 3.432/98), não podem, de modo algum, ser
considerados pelo Ministério da Saúde para efeitos da exigência mínima estabelecida na
Portaria GM nº. 1.101/2002), sob pena de se subverter todos os requisitos indispensáveis ao
regular credenciamento, instalação e funcionamento dos leitos de UTI's e prestação dos
serviços de alta complexidade em saúde pública à toda população.
E, neste caso, a omissão da União é patente, na medida em que o
Ministério da Saúde, mesmo ciente da insuficiência de leitos mínimos na macrorregional
de Uberaba/MG, não tomou qualquer providência visando à implementação dos leitos
necessários à satisfação dos padrões mínimos que o próprio órgão estabeleceu.
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Isto porque, o Ministério da Saúde, mesmo depois de notificado pela
Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Uberaba/MG para se manifestar a
respeito da situação da macrorregional de Uberaba/MG, em duas oportunidades, limitou-se a
encaminhar, por intermédio da Secretária de Atenção à Saúde, os pareceres nºs. 127/07 e
148/2007, subscritos pela sua Coordenadoria, enfatizando que é responsabilidade dos
gestores, estadual ou municipal, as solicitações de credenciamento de leitos de UTI junto ao
Ministério da Saúde (fls. 1.422/1.425 e 1.439/1.441).
No aludidos documentos, o Ministério da Saúde considerou suficientes para
a população de Uberaba/MG o número de leitos de UTI disponíveis, de acordo com os
parâmetros da portaria GM/MS nº. 1101 de 12/06/02. Salientou, entretanto, a necessidade de
criação de 08 (oito) leitos de UTI na Microrregional de Frutal/MG e de credenciamento de
UTI pediátrica em Uberaba/MG, diante da inexistência de credenciamento desse tipo de leito
de UTI. No mais, sinalizou que Uberaba/MG estaria com o número de leitos suficientes para a
demanda do SUS.
Em outra oportunidade, atentendo requisição do Ministério Público Federal,
o Ministério da Saúde informou que o Município de Uberaba/MG conta, atualmente, com 71
(setenta e um leitos) leitos de UTI credenciados junto ao SUS, sendo 60 (sessenta) adultos e
11 (onze) neonatais. Já o Município de Araxá/MG, segundo os dados do Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde – CNES, possui um total de 19 (dezenove) leitos conveniados no
âmbito do SUS. Todavia, o Ministério da Saúde não soube informar o número de leitos
operacionais, alegando que as informações eram de responsabilidade da Central de regulação
de leitos do respectivo Estado/Município (fls. 1.234/1.235).
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Verifica-se, assim, o total descaso do Ministério da Saúde com as ações
e serviços públicos de saúde, haja vista que, sem os dados acerca dos leitos de UTI's em
efetivo funcionamento no âmbito do SUS, aquele órgão não tem quaisquer condições de
fiscalizar a observância das exigências mínimas que ele mesmo estabeleceu através da
Portaria GM nº. 1.101/2002, Item 3.5, alínea “b”. Afinal, do que adiantaria a existência
de 1.000 (mil) leitos de UTI se nenhum destes estivesse operacional.
5. Da insuficiência do número mínimo de leitos estabelecido na Portaria GM/MS nº.
1.101/2002 (item 3.5, alínea “b”) para atender a toda a demanda da macrorregional de
Uberaba/MG.
Noutro vértice, ainda que, eventualmente, existisse, no âmbito da
macrorregional de Uberaba/MG, a quantidade mínima de leitos de UTI's exigidos pelo
Ministério da Sáude, devidamente credenciados e em funcionamento4, este número não seria
suficiente para atender a demanda dos atendimentos e das internações que necessitam ser
realizados, dia após dia, em Uberaba/MG, especialmente no Hospital Escola da UFTM.
Com efeito, consoante cabalmente demonstrado no bojo do procedimento
administrativo que instrui a presente ação civil pública. Em primeiro lugar, constata-se que
nem mesmo a existência de leitos improvisados é capaz de suprir a demanda real da
macrorregional de Uberaba/MG, onde, especiamente no âmbito do Hospital Escola da UFTM,
os pacientes têm que aguardar até 15 (quinze dias) para obter um vaga nos leitos de UTI's
disponíveis (fl. 1.166), período no qual ficam entre a vida e morte.
4 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI's, calculados nos termos da Portaria GM/MS nº. 1.101, Item 3.5, alínea
“b”, considerando o número de habitantes da macrorregional de Uberaba/MG, que, atualmente, soma cerca
de 650.000 (seiscentos e cinqüenta mil) habitantes.
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Cite-se, por exemplo, o caso da paciente M.J.R., de 34 anos de idade,
citado alhures, que foi internada no Hospital Escola, no dia 11 de dezembro 2007, com
quadro de aneurisma cerebral e indicação de cirurgia e, em razão da falta de leitos de
UTI, a paciente não foi operada, vindo a óbito no dia 05 de janeiro de 2008 (fls.
1252/1.253 e 1.292/1.293).
Ademais, os relatórios anexados aos autos confirmam, também, os elevados
índices de ocupação dos leitos de UTI no Hospital Escola, merecendo destaque, os alarmantes
níveis de ocupação da Unidade de Terapia Intensiva do Pronto Socorro, entre os meses de
junho de 2007 a janeiro de 2008, conforme relatório expedido pela UFTM, em 26 de fevereiro
de 2008 (fls. 1.321/1.325). Não muito diferente, é a situação do Hospital de Clínicas da
Universidade de Uberaba – UNIUBE, que, atualmente, vem trabalhando diariamente com a
capacidade total esgotada (fl. 1.216).
Registre-se, a propósito, que o Hospital Escola vêm atendendo a uma
demanda “extra”, que inclui pacientes de diversas cidades e Estados da federação, além
daqueles residentes nos municípios referenciados, compreendidos na macrorregião de
Uberaba/MG, conforme demonstram os documentos acostados às fls. 97/140.
Saliente-se, para melhor compreensão do problema, que a grande maioria
dos pacientes são encaminhados diretamente ao Hospital Escola em virtude de sua maior
estrutura de pessoal, pois, como se sabe, não basta a existência de leitos de UTI se o Hospital
não dispõe de equipes médicas, enfermagem e plantões. Ademais, conforme já realçado, o
Hospital Escola tem estrutura física para receber, hoje, imediatamente, a implementação de
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mais 15 (quinze) leitos, de acordo com informações repassadas pela própria Diretoria Clínica
ao Jornal da Manhã, edição de 10/07/08 (fl. 1.132).
Importante realçar, ainda, que a própria Gerência Regional de Saúde
reconhece que o número de leitos de UTI's da macrorregional de Uberaba/MG é
“insuficiente para a demanda existente na Macrorregião de Uberaba e outros Municípios
pactuados com a Secretaria Municipal de Uberaba, uma vez que alta complexidade não
atende apenas a população referenciada”, consoante ofício encaminhado a esta
Procuradoria da República, no dia 09/07/08 (fls. 1.085/1.086).
O Ministério da Saúde, ao definir a necessidade de leitos de UTI mediante a
edição da Portaria GM nº. 1.101/2002, estabeleceu, a priori, critérios gerais e abstratos
aplicável em razão do número de habitantes de determinada região. Entretanto, o ato
normativo, ao fixar padrões mínimos e máximos (4% a 10% do total de leitos),
possibilitou que o número de leitos de UTI fosse implementado, no caso concreto, de
acorco com as peculiaridades de cada região.
E, no caso da macrorregional de Uberaba/MG, as necessidades concretas de
atendimentos e internação em leitos de UTI, consoante sobejadamente demonstrado nestes
autos, é fator que impõe a implementação de uma quantidade de leitos de UTI em número
acima do padrão mínimo, ou seja, elevando o número de leitos de UTI para algo em torno da
média sugerida, equivalente 123 (cento e vinte e três) leitos, ou em número suficiente para
impedir que pacientes em situação de extrema urgência venham a falecer enquanto
esperam o surgimento de vaga ou sejam atendidos em condições inadequadas, assim
reconhecidas pelo próprio Ministério da Saúde.
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Portanto, restando comprovado que a macrorregional de Uberaba/MG
necessita, urgentemente, da implementação de leitos de UTI em quantidade superior ao
número mínimo estabelecido pela Portaria GM/MS nº. 1.101/2002, a discrionariedade do
Poder Público na fixação do número de leitos de UTI encontra limites nas normas
constitucionais que asseguram os direitos à vida e à saúde e estabelecem o dever
específico à autoridade de pública de implementá-los.
Afinal, diante da flagrante inércia da administração pública em assegurar os
direitos constitucionais de maior relevância, cabe ao Poder Judiciário a importante missão e
responsabilidade de reestabelecer o respeito à ordem jurídica constitucional, garantindo, desse
modo, a eficácia das normas constitucionais, a força normativa e a própria vontade de
constituição5, que é a vontade primária da sociedade e daqueles responsáveis pela
manutenção da ordem constitucional de ver a constituição respeitada e valorizada, em
especial na concretização dos direitos fundamentais.
Isto porque, a discricionariedade da administração pública em avaliar a
conveniência e oportunidade de priorizar soluções e concretizar medidas não pode significar,
especialmente em um Estado democrático de Direito, a violação de deveres específicos que a
Constituição Federal impõe ao poder público para a efetivação dos direitos fundamentais
(individuais e sociais) expressamente consagrados no texto magno.
5 Apesar de reconhecer o significado dos fatores históricos, políticos e sociais para a força normativa da
Constituição, Hesse enfatiza o aspecto da vontade de Constituição. A Constituição transforma-se em
força ativa se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se
fizerem-se presentes, na consciência geral (especialmente na consciência dos principais responsáveis
pela ordem constitucional), não só a vontade de poder, mas também a vontade de Constituição
(HESSE, Konrad – A Força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto
Alegre: safe, 1991).
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É, pois, patente, a responsabilidade da União pela superlotação do Hospital
Escola da UFTM e pela carência de leitos de UTI na macrorregional de Uberaba/MG, uma
vez que este ente federado não vem zelando pela concretização das necessidades mínimas
fixadas em Portaria do próprio Ministério da Saúde, no que se refere aos leitos de UTI's (Item
3.5, alínea “b”, da Portaria GM/MS nº. 1.101/2002).
A União, pois, que tanto arrecada, deve adotar as medidas necessárias para a
melhoria dos serviços do SUS, através da ampliação da rede conveniada e criação de novos
leitos de UTI, unidades de urgência e emergência etc., pelo menos até se atingir o número
mínimo fixado pelo Ministério da Saúde, para que a população tenha, de fato, o acesso
mínimo e digno aos serviços públicos de saúde, como determina o artigo 1º, inciso III, da
Constituição Federal, e não, simplesmente, quedar-se inerte à realidade hoje enfrentada,
especialmente, pelo Hospital Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
6. Do Direito
Em primeiro lugar, e antes mesmo do direito à saúde, a digninidade da
pessoa humana, como fundamento do Estado brasileiro (art. 1º, inciso III, da Constituição
Federal), e o direito à vida, garantido no art. 5º, caput, da Carta Constitucional, justificam a
atuação do parquet na defesa dos interesses veiculados na presente ação civil pública. Cumpre
ressaltar que o PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA baliza nosso
ordenamento jurídico
insculpido no artigo 1°, inciso III, da Constituição Federal,
apresentando-se como núcleo essencial e intangível de proteção dos demais direitos
fundamentais.
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Some-se a isso, ainda, o próprio direito à saúde, cujos fundamentos básicos
estão elencados nos artigos 196 a 200 da Constituição Federal. Especificamente, o artigo 196
dispõe que:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco
de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Visando a concretizar o mandamento constitucional, o legislador estabeleceu
preceitos que tutelam e garantem o direito à saúde. Neste sentido, a Lei n.º 8.212/91 dispõe
que:
Art. 1º A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de
ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a
assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência
social.
(...)
Art. 2º A Saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco
de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Parágrafo único. As atividades de saúde são de relevância pública e
sua organização obedecerá aos seguintes princípios e diretrizes:
a) acesso universal e igualitário;
b) provimento das ações e serviços através de rede regionalizada e
hierarquizada, integrados em sistema único;
c) descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
(grifos acrescidos).
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Assim, corroborando o mandamento constitucional, a Lei n.º 8.080, de 19 de
setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da
saúde, estabelece:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo
o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e
execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de
riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de
condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e
aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
(...)
Art. 4°. O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por
órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da
administração direta e indireta e das funções mantidas pelo Poder
Público, constitui o Sistema Único de Saúde – SUS. (grifos
acrescidos).
O artigo 7° da citada lei estabelece que as ações e serviços públicos que
integram o Sistema Único de Saúde serão desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas
no artigo 198, da CF, obedecendo, ainda, aos seguintes princípios:
Art. 7° (...)
I – universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis
de assistência;
II - Integralidade de assistência, entendida como um conjunto
articulado e contínuo de serviços preventivos e curativos, individuais e
coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade
do sistema;
III – preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua
integridade física e moral;
IV – igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios
de qualquer espécie;
(...)
XI – conjugação de recursos financeiros, tecnológicos, materiais e
humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
na prestação de serviços de assistência à saúde da população.
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Verifica-se, destarte, que a própria norma disciplinadora do Sistema Único
de Saúde elenca como princípio a integralidade de assistência, definindo-a como um
conjunto articulado e contínuo de serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos,
exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema.
Por certo, quando se refere, aqui, ao Estado, considera-se igualmente
responsáveis, na medida da sua competência6, a União, os Estados-membros, o DF, e os
Municípios, consoante dispõe o art. 23, caput, II, da CF/88, in verbis:
“É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios:
(...)
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas
portadoras de deficiência;”
Por seu turno, a lei de regência do SUS, Lei nº 8.080/90, estatui, em vários
de seus dispositivos, que:
Art. 4º O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e
instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta
e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema
Único de Saúde (SUS).
§ 1º Estão incluídas no disposto neste artigo as instituições públicas federais,
estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de
insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de
equipamentos para saúde.
(...)
6 No tocante à responsabilidade da União pela implementação dos leitos de UTI's, vide tópico específico.
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Destarte, in casu, a União é responsável pela ausência de leitos UTIs
para atendimento dos pacientes que delas necessitam, assim como dos que estão e dos que
virão a necessitar de atendimentos médicos, haja vista que, a rigor, a simples transferência da
administração – municipalização – da saúde, não a desobriga da sua responsabilidade. De
igual, não é admissível eventual escusa da UNIÃO em assumir a responsabilidade, sob o
argumento de que transferiu ao Município o encargo respectivo.
Sem entrar no mérito, qualquer observador desatento constataria que, diante
de tal disponibilidade financeira, o Estado disporia de recursos para custear qualquer outra
política de interesse público, já que despendeu tantos recursos financeiros com a execução de
programa político de menor preponderância para as reais necessidades da coletividade.
Ademais, a reserva do financeiramente possível, com exceção da presença de
justo motivo,“não pode ser invocada pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do
cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta
governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos
constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade”7.
Importante realçar, neste aspecto, que os direitos à vida e à saúde
correspondem à fração do núcleo essencial do princípio da dignidade da pessoa humana, ou
seja, compõem o chamado mínimo existencial,8 que, constituído pelas condições materiais
7 Supremo Tribunal Federal, ADPF 45, Decisão monocrática proferida pelo Ministro Celso de Melo, em
29/04/2004, publicada no DJ Nr. 84 do dia 04/05/2004.
8 Nesse sentido, vale citar o magistério de Ana Paula Barcelos (In Eficácia Jurídica dos Princípios
Constitucionais. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar. 2002, páginas 252 e
258): “Ao lado do campo meramente político, uma fração do princípio da dignidade da pessoa humana, seu
conteúdo mais essencial, está contida naquela esfera do consenso mínimo assegurada pela Constituição e
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básicas de existência do ser humano, exige do Poder Público, incluindo-se o Poder Judiciário,
o reconhecimento de eficácia jurídica positiva, independentemente de se condicionar a sua
implementação à eventual reserva dos recursos financeiros correspondentes.”9
Nesse sentido, vale consignar, ainda, “que o caráter programático das
regras inscritas no texto da Carta Política não pode converter-se em mera promessa
constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas
nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
transformada em matéria jurídica. É precisamente aqui que reside a eficácia jurídica positiva ou simétrica e o
caráter de regra do princípio constitucional. Ou seja: a não realização dos efeitos compreendidos nesse
mínimo existencial constitui uma violação ao princípio constitucional, no tradicional esquema do “tudo
ou nada”, podendo-se exigir judicialmente a prestação equivalente. (...) Na linha do que se identificou
no exame sistemático da própria Carta de 1988, o mínimo existencial que ora se concebe é composto de
quatro elementos, três materiais e um instrumental, a saber: a educação fundamental, a saúde básica,
a assistência aos desamparados e o acesso à Justiça. Repita-se, ainda uma vez, que esses quatro pontos
correspondem ao núcleo essencial da dignidade da pessoal humana a que se reconhece eficácia jurídica
e, a fortiori, o status de direito subjetivo exigível diante do Poder Judiciário. (grifos não originais).
9 Note-se que os direitos sociais (prestação positiva) não são os únicos a custar dinheiro, e esse é um ponto
fundamental. “Também os direitos individuais e os políticos demandam gastos por parte do Poder Público.
São indispensáveis o manejo de recursos públicos, por exemplo, para a manutenção da polícia e dos
bombeiros, cuja função principal é proteger não apenas a vida, mas também a propriedade, direito
tipicamente individual”(op. Cit, página 238), e nem por isso o argumento da reserva do possível foi ou é
levado em consideração pelas autoridades estatais para negar proteção às liberdades individuais
(direitos de prestação negativa). “Assim, a diferença entre os direitos sociais e os individuais, no que toca ao
custo, é uma questão de grau, e não de natureza. Ou seja: é mesmo possível que os direitos sociais
demandem mais recursos que os individuais, mas isso não significa que este apresentem custo zero. Desse
modo, o argumento que afastava, tout court, o atendimento dos direitos sociais pelo simples fato de que
eles demandam ação estatais e custam dinheiro não se sustenta. Também a proteção dos direitos
individuais tem seus custos, apenas se está muito acostumados com eles”. (op. cit. página 238/239). Na
mesma linha, o magistério de Stephen Holmes and Cass R. Sunstein (In The Cost of Rights, WW Norton &
Company. New York. London. 1999, p. 44): “All rights are costly because all rights pressuppose taxpayer
funding fo effective supervisory machinery for monitoring and enforcement.” (grifos não originais).
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impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que
determina a própria lei fundamental do Estado”10 .
Observe-se, ainda, que, no caso dos autos, os padrões mínimos de leitos
de UTI's estabelecidos pelo Ministério da Saúde sequer foram implementados no âmbito
da macrorregional de Uberaba/MG. Aqui, portanto, não caberia a invocação da reserva do
possível para que a União se eximisse de implementar os serviços básicos de saúde que ela
mesmo estabeleceu como indispensável, através de ato normativo válido (Portaria GM/MS nº.
1.101/2002). Seria um paradoxo !
Neste ínterim, cabe fazer uma ponderação entre os valores mais importantes
para a coletividade: a título de exemplo, a compra de viaturas policiais, publicidade etc ou a
eficaz prestação do serviço público e essencial de saúde. Nesta ponderação, é evidente que
deve ser privilegiado o direito à vida, instrumentalizado pela eficaz prestação dos serviços de
saúde. Paradigmático, neste tocante, o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça,
verbis:
SUS. FORNECIMENTO. MEDICAMENTO. HEPATITE - A Turma
proveu o recurso ao entendimento de que o SUS visa à integralidade
da assistência à saúde, seja individual ou coletiva. Devendo, pois,
atender aos que dela necessitam em qualquer grau de
complexidade, de modo que, restando comprovado o
acometimento do indivíduo ou de um grupo por determinada
moléstia, necessitando certo medicamento para debelá-la, esse
deve ser fornecido, de modo a atender ao princípio maior que é a
garantia à vida digna e que tem como direito-meio o direito à
saúde (...)Precedentes citados: REsp 212.346-RJ, DJ 4/2/2002; RMS
11.129-PR, DJ 18/2/2002; REsp 325.337-RJ, DJ 3/9/2001, e REsp
10 Supremo Tribunal Federal, ADPF 45, Decisão monocrática proferida pelo Ministro Celso de Melo, em
29/04/2004, publicada no DJ Nr. 84 do dia 04/05/2004.
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127.604-RS, DJ 16/3/1998. REsp 430.526-SP, Rel. Min. Luiz Fux,
julgado em 1º/10/2002.” (grifamos)
Ademais, a responsabilidade da União ainda é evidenciada em razão dos
compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil na concretização
das políticas públicas ligadas à saúde, mediante adesão a tratados internacionais de direitos
humanos relacionados à proteção dos direitos econômicos, sociais e culturais. Frise-se que nas
relações com Estados estrangeiros incumbe à União representar a República Federativa do
Brasil, nos termos do art. 21, inciso I, da Constituição Federal.
Nesse sentido, inicialmente, vale apontar as disposições do Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais, e Culturais, aprovado pelo Decreto
Legislativo n.º 226, de 12.12.1991. Assinado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992, entrou em
vigor no nosso país em 24.2.1992, após a promulgação pelo Decreto n.º 591, de 6/7/1992:
Artigo 12
§1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de
toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível de saúde física e
mental.
§2. As medidas que os Estados-partes no presente Pacto deverão
adotar, com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito,
incluirão as medidas que se façam necessárias para assegurar:
A diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como
o desenvolvimento são das crianças.
A melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio
ambiente.
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A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas,
profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças.
A criação de condições que assegurem a todos assistência médica e
serviços médicos em caso de enfermidade. (grifamos)
Na mesma óptica, só que na esfera regional de proteção dos direitos
humanos, está o Protocolo à Convenção Americana de Direitos Humanos sobre Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador), aprovado, no Brasil, pelo
Decreto Legislativo nº. 56, de 19 de abril de 1995, e promulgado pelo Decreto nº. 3.321, de
30 de dezembro de 1999:
Artigo 10 Direito à Saúde
1 - Toda pessoa tem direito à saúde, compreendendo-se como
saúde o gozo do mais alto nível de bem-estar físico, mental e social.
2 - A fim de tornar efetivo o direito à saúde, os estados-partes
comprometem-se a reconhecer a saúde como bem público e,
especialmente, a adotar as seguintes medidas para garantir esse
direito:
a) assistência primária à saúde, entendendo-se como tal a assistência
médica essencial ao alcance de todas as pessoas e famílias da
comunidade;
b) extensão dos benefícios dos serviços de saúde a todas as pessoas
sujeitas à jurisdição do Estado;
c) total imunização contra as principais doenças infecciosas;
d) prevenção e tratamento das doenças endêmicas, profissionais e de
outra natureza;
e) educação da população com referência à prevenção e ao tratamento
dos problemas da saúde; e
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f) satisfação das necessidades de saúde dos grupos de mais alto risco e
que, por sua situação de pobreza, sejam mais vulneráveis. (grifamos)
Assim, o direito à saúde, como expressão do direito à vida e do princípio da
dignidade da pessoa humana, demanda atenção especial e implementação concreta e eficiente
pelo Estado brasileiro, in casu, a União, de modo a garantir o acesso de toda a população às
ações e serviços públicos de saúde, em decorrência dos deveres e obrigações diretamente
estabelecidos na Constituição Federal, na legislação infraconstitucional e nos tratados
internacionais de proteção aos direitos humanos.
7. Da responsabilidade específica da União pela implementação adequada e suficiente de
leitos de UTI.
No que se referente, especificamente, ao credenciamento de leitos de UTI
no âmbito do Sistema Único de Saúde, foi editada a Portaria nº. 598/GM/MS, de 23 de março
de 2006, através da qual se estabeleceu que à Secretaria Municipal de Saúde ou a Secretaria
Estadual de Saúde incumbência de formalizar processo para credenciamento de leitos de UTI,
à luz da legislação vigente, encaminhando para análise da SES e pactuação na CIB (Comissão
Intergestores Bipartite). Posteriormente são encaminhadas ao Ministério da Saúde as
informações estratégicas, necessárias à homologação, publicação do credenciamento e
aos processos de acompanhamento e avaliação.
Fica nítida, portanto, a responsabilidade da União no procedimento de
credenciamento de leitos de UTI, cabendo ao Ministério da Saúde a análise e aprovação final
do credenciamento de leitos de UTI. Além do mais, ressalte-se que a verba para pagamento
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dos leitos de UTI advém também do Governo Federal, conforme estabelecem os artigos 23,
26 e 27 da NOAS (Portaria nº. 373/MG/MS, de 27 de fevereiro de 2002), restando, assim,
clara a responsabilidade da União.
Acrescente-se que nos termos do artigo 149, combinado com o artigo 195 da
Constituição Federal, a União detém competência tributária exclusiva para instituir e cobrar
contribuições de seguridade social, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 149.
Como as ações de saúde integram a seguridade social, parte da arrecadação dessas
contribuições está vinculada ao financiamento das ações e serviços de saúde. Ou seja, está
consagrado que o financiamento do SUS no plano federal se dá com os recursos destinados do
orçamento próprio da seguridade social e, ainda do orçamento fiscal (impostos). Por isso
mesmo, a União é a principal financiadora do Sistema Único de Saúde.
É dever do Sistema Único de Saúde fornecer os meios necessários (leitos de
UTI) que garantam a vida e possibilitem o tratamento dos pacientes que utilizam o SUS.
Sobre os leitos de UTI, cabe lembrar que ao dispor sobre A POLÍTICA DE ATENÇÃO DE
ALTA COMPLEXIDADE/CUSTO NO SUS, a NOAS, no item 23, fixa o elenco de
atribuições do Ministério da Saúde:
1.5
DA
POLÍTICA
DE
ATENÇÃO
DE
ALTA
COMPLEXIDADE/CUSTO NO SUS
23. A responsabilidade do Ministério da Saúde sobre a política de alta
complexidade/custo se traduz nas seguintes atribuições:
a - definição de normas nacionais;
b - controle do cadastro nacional de prestadores de serviços;
c - vistoria de serviços, quando lhe couber, de acordo com as normas
de cadastramento estabelecidas pelo próprio Ministério da Saúde;
d - definição de incorporação dos procedimentos a serem ofertados
à população pelo SUS;
e - definição do elenco de procedimentos de alta complexidade;
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f - estabelecimento de estratégias que possibilitem o acesso mais
equânime diminuindo as diferenças regionais na alocação dos
serviços;
g - definição de mecanismos de garantia de acesso para as referências
interestaduais, através da Central Nacional de Regulação para
Procedimentos de Alta Complexidade;
h - formulação de mecanismos voltados à melhoria da qualidade dos
serviços prestados;
i - financiamento das ações.
i – financiamento das ações. (grifamos).
Portanto, se, por um lado, incumbe à União, através do Ministério da Saúde,
definir os procedimentos a serem ofertados à população pelo SUS, o elenco de procedimentos
de alta complexidade e o financiamento das respectivas ações, por outro, também cabe ao
citado ente federado fiscalizar se os Estados e Municípios vêm, efetivamente, observando as
orientações e os preceitos estabelecidos em caráter geral para a adequada execução das ações
e dos serviços públicos de saúde.
Assim, se a União, por intermédio do Ministério da Saúde, estabeleceu a
necessidade mínima de leitos de UTI's para determinado número de habitantes, cabe ao
próprio ente federado cobrar dos Estados e Municípios a implementação dos procedimentos
necessários ao credenciamento, junto ao Ministério da Saúde, da quantidade de leitos
mínimos exigidos em cada região ou, em caso de inércia dos demais ente federados,
implementar diretamente os leitos de Unidades de Terapia Intensiva indispensáveis à atender
a demanda da população que necessita deste tipo de atendimento, uma vez que, nos termos do
art. 196 da Constituição Federal, a saúde é direito de todos e dever do Estado .
Em norma dirigente, os itens 26 e 27 da NOAS prescrevem que:
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26. As ações de alta complexidade e as ações estratégicas serão
financiadas de acordo com Portaria do Ministério da Saúde.
27. O Ministério da Saúde definirá os valores de recursos
destinados ao custeio da assistência de alta complexidade para
cada estado. (grifamos)
O item 44.2 da NOAS admite, inclusive, a contratação de serviços na rede
privada sempre que não estiverem disponíveis na rede pública, ou mesmo quando, ainda que
existentes na rede pública, sejam insuficientes para o atendimento da população:
44.2. O interesse público e a identificação de necessidades
assistenciais devem pautar o processo de compra de serviços na rede
privada, que deve seguir a legislação, as normas administrativas
específicas e os fluxos de aprovação definidos na Comissão
Intergestores Bipartite, quando a disponibilidade da rede pública for
insuficiente para o atendimento da população.
Verifica-se, do teor da Norma Operacional de Assistência à Saúde, que, no
atendimento dos serviços de saúde, a União, por intermédio do Ministério da Saúde,
abandonou a antiga posição de mero órgão de supervisão e distribuição de recursos, passando
à condição de responsável solidária, nos serviços de média e alta complexidade.
A respeito da responsabilidade da União no âmbito do SUS, transcreve-se o
posicionamento do Tribunal de Contas da União:
“A competência fiscalizadora do TCU decorre da natureza federal dos
recursos repassados fundo a fundo pelo FNS para Estados, Distrito Federal e
Municípios. Mediante a Decisão-TCU n.º 506/1997-Plenário-Ata 31/97, o
Tribunal firmou entendimento, no sentido de que os recursos repassados pela
União no âmbito do SUS, aos Estados, Distrito Federal e Municípios
constituem recursos federais e, dessa forma, estão sujeitos à fiscalização do
TCU as ações e os serviços de saúde pagos à conta desses recursos, quer
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sejam os mesmos transferidos pela União mediante convênio, quer sejam
repassados com base em outro instrumento ou ato legal, como a transferência
automática fundo a fundo. Os recursos transferidos fundo a fundo pelo
Ministério da Saúde – MS não deixam de ser federais por passarem a
integrar os Fundos Estaduais, do Distrito Federal e Municipais de Saúde
ou por estarem previstos nos orçamentos de Estados e Municípios.
Trata-se de exigência orçamentária fixada nas Leis n.º 4.320/1964 e
8.080/1990 (vide também NOB/MS n.º 01/93, item 5, subitem 4.1.1).
Logo, há necessidade de se prestar contas ao órgão repassador dos
recursos recebidos, segundo as normas aplicáveis ao SUS. Apesar de o
art. 1º do Decreto n.º 1.232, de 30/08/1994, dispensar a celebração de
convênio ou instrumento congênere para a transferência de recursos federais
fundo a fundo a Estados, Municípios e Distrito Federal, no âmbito do SUS, o
conjunto de objetivos e compromissos que a legislação pertinente impõe aos
integrantes do SUS caracteriza relação convenial entre a União e as demais
esferas de governo, conforme Decisão TCU n.º 449/1998-Plenário-Ata
28/1998. A competência do TCU para fiscalizar os recursos federais do SUS
repassados a outras esferas de governo é ratificada pela legislação específica
do SUS (Decreto n.º 1.232/1994, art. 3°)” (Transferência de recursos e a Lei
de Responsabilidade fiscal. TCU, pág. 29). (grifamos).
Não há dúvida, pois, quanto ao dever especial atribuído à União pela
adequada e suficiente prestação contínua das ações e serviços alta complexidade na
macrorregião de Uberaba/MG, bem como pela obrigatoriedade de fornecer a população uma
quantidade de leitos de UTI capaz de suportar a real demanda, em especial, no âmbito do
Hospital Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, centro de referência neste
tipo de complexidade de serviço de saúde pública.
Ademais, no que se refere, especificamente, à responsabilidade da União
pela deficiência na disponibilização de leitos de UTI, vale citar o seguinte julgado do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região, verbis:
Processual Civil e Administrativo. Sistema Único de Saúde.
Responsabilidade da União pela deficiência do serviço. Falta de
UTI para atendimento de urgência. Prejuízos sofridos pela
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paciente e seu esposo. Reparação de danos materiais e morais.
Redução da indenização por danos morais, fixados em R$
2.500,00. Apelação e remessa oficial parcialmente providas.
(TRIBUNAL - QUINTA REGIAO - AC 380387/RN - Quarta Turma
– j. 20/06/2006 - DJ - Data::02/08/2006 - Página::732 - Nº::147 Relator(a) Desembargador Federal Lazaro Guimarães – unânime)
(grifamos)
Nesta ordem de considerações, além de o caso envolver a aplicação de
verbas federais, há o interesse dos órgãos de controle federal de verificar a regular e eficiente
aplicação dos recursos repassados e o cumprimento a contento das finalidades públicas. Com
esteio na Lei nº. 8.080/90, art. 16, inciso XIX, foi instituído o Sistema Nacional de Auditoria
– SNA, abrangido na competência da direção nacional do SUS, em cujo âmbito funciona o
Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS, órgão central que tem a
responsabilidade de executar as atividades de auditoria em todo o território nacional.
A propósito, o art. 33, § 4º, da Lei nº. 8.080/90 dispôs o seguinte:
“Art. 33. Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS)
serão depositados em conta especial, em cada esfera de sua atuação, e
movimentados sob fiscalização dos respectivos Conselhos de Saúde.
(...)
§ 4º O Ministério da Saúde acompanhará, através de seu sistema
de auditoria, a conformidade à programação aprovada da
aplicação dos recursos repassados a Estados e Municípios.
Constatada a malversação, desvio ou não aplicação dos recursos,
caberá ao Ministério da Saúde aplicar as medidas previstas em
lei.” (grifamos).
Nesse sentido, também se orienta a jurisprudência do Tribunal Regional
Federal da 1ª Região, verbis:
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“PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE.
COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. PRESCRIÇÃO.CERCEAMENTO
DE DEFESA. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE SUS. PROGRAMA DE AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE PACS. PROGRAMA DE INTERIORIZAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE
SAÚDE -PISUS - E PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA - PSF.
PAGAMENTOS INDEVIDOS.
1. Se as verbas foram repassadas pelo Sistema Único de Saúde - SUS e a
fiscalização cabe ao Ministério da Saúde e ao Tribunal de Contas da
União, a competência para processar e julgar a ação de improbidade é
da Justiça Federal.
(...)”(Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO, Classe: AC - APELAÇÃO
CIVEL – 200143000016691, Processo: 200143000016691 UF: TO Órgão
Julgador: TERCEIRA TURMA, Data da decisão: 29/5/2007 Documento:
TRF100254011, Fonte DJ DATA: 17/8/2007 PAGINA: 8, Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL TOURINHO NETO)”. (grifamos)
“PROCESSO CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DESVIO OU
MALVERSAÇÃO DE VERBAS DO SUS. INTERESSE DA UNIÃO.
COMPETENCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
1. Compete à Justiça Federal (art. 109, IV, CF/88) o processamento e
julgamento de causas que tenham como objeto o desvio de verbas do
Sistema Único de Saúde, repassada a Município pela União, por se
constatar, na espécie, objetivamente, o interesse da União, por força do
art. 23, inciso II, da CF/88. Precedentes do eg. Supremo Tribunal
Federal.
2. Possui o Ministério Público Federal legitimidade ativa para propor
ação visando o ressarcimento do erário por desvio de verbas do SUS.
(art. 37, inciso I, Lei Complementar nº 75/93).
3. Agravo retido não conhecido (art. 523, §1º do CPC).
4. Apelação provida para anular a v. sentença apelada, devendo os autos
serem remetidos a esta Corte, ex vi do art. 84, caput e § 2º do CPP.”
(Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO, Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL –
200038000217900, Processo: 200038000217900 UF: MG, Órgão Julgador:
QUARTA TURMA, Data da decisão: 21/6/2005 Documento:
TRF100213309, Fonte DJ DATA: 1/7/2005 PAGINA: 17, Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL I'TALO FIORAVANTI SABO
MENDES) (grifamos).
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Conforme já frisado, a responsabilidade da União também se faz presente
em decorrência dos compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do
Brasil na implementação de políticas públicas relacionadas a ações e serviços de saúde,
mediante a adesão a tratados internacionais de proteção dos direitos humanos (Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais, e Culturais e Protocolo de São Salvador).
É importante realçar que Ministério Público do Estado de Minas Gerais
ajuizou ação civil pública em face do Município de Uberaba/MG e do Estado de Minas
Gerais, perante a 5ª Vara Cível da Comarca de Uberaba/MG, processo nº. 070108216390-1,
com o objetivo de obrigar os mencionados entes federados, de forma solidária, a adotar as
medidas necessárias para a contratação de serviços e reserva de leitos extras de UTI's em
quantidades suficientes, inclusive junto à rede privada, se necessário. A ação movida pelo
parquet estadual fundou-se, basicamente, na responsabilidade solidária do Município e do
Estado de Minas Gerais no fornecimento de leitos extras de UTI's, sem, todavia, basear-se na
desobediência aos padrões mínimos estabelecidos na Portaria GM/MS nº. 1.101/2002).
Todavia, a presente ação civil pública fundamenta-se em causa de pedir e
pedidos diversos daquela proposta na Justiça Estadual, uma vez que a responsabilidade da
União, diretamente ou através do Ministério da Saúde, no caso de ausência de leitos de UTI,
é acentuada em razão de deveres de específicos impostos pelo ordenamento jurídico, a
saber: i) responsabilidade pela implementação de ações e financiamento dos serviços de alta
complexidade; ii) responsabilidade pela homologação do credenciamento de leitos de UTI's;
iii) fiscalização da aplicação dos recursos e das finalidades do Sistema Único de Saúde; iii)
responsabilidade patrimonial por indenizações derivadas da ausência de leitos de UTI; iv)
responsabilidade pela implementação dos compromissos internacionais assumidos pela
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República Federativo do Brasil; v) não observância dos padrões mínimos estabelecidos pelo
Ministério da Saúde através da Portaria GM nº. 1.101/2002; e vi) responsabilidade pela
deficiência na prestação dos serviços públicos de saúde no âmbito do Hospital Escola da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, entidade da administração pública federal.
Ademais, os pedidos veiculados na presente ação civil pública são formulado apenas em face
da União, em decorrência das responsabilidades específicas atribuídas, no âmbito do SUS, ao
citado ente federado.
8. Da tutela antecipada
O objeto da presente ação é buscar a tutela jurisdicional para que cesse a
omissão da União quanto a insuficiência de Leitos de UTI para atendimento da população dos
municípios que compõem a macrorregião de Uberaba/MG, que não vem observando sequer a
quantidade mínima de leitos de UTI's fixados pelo próprio Ministério da Saúde.
Porém, para que o provimento jurisdicional possua utilidade e efetividade,
presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, além da verossimilhança da alegação e o
fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, necessária a concessão de tutela
antecipada para que a situação atual, de completo desrespeito a integralidade dos Serviços de
Saúde e sua obrigatória continuidade não se prolongue no tempo.
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A Lei n.º 8.952, de 13 de dezembro de 1994, ao dar nova redação ao art.
273 do Código de Processo Civil, possibilitou a antecipação dos efeitos da tutela pretendida
no pleito inicial:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde
que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da
alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto
propósito protelatório do réu.
Sobre o tema em tela, o ilustre processualista Cândido Rangel Dinamarco
aduz:
"O novo art. 273 do Código de Processo Civil, ao instituir de modo
explícito e generalizado a antecipação dos efeitos da tutela pretendida,
veio com o objetivo de ser uma arma poderosíssima contra os males
do tempo no processo.” (in “A Reforma do CPC”, 2ª ed., ver. e ampl.,
São Paulo, Malheiros Editores, 1995).
Por conseguinte, trata-se o instituto da tutela antecipada da realização
imediata do direito, já que dá ao autor o bem por ele pleiteado. Dessa forma, desde que
presentes à prova inequívoca e a verossimilhança da alegação, a prestação jurisdicional será
adiantada sempre que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
Assim, as condições para que o magistrado conceda a tutela antecipada são:
a) verossimilhança da alegação; b) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação
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e, comentando tais requisitos, o Ministro do Superior Tribunal de Justiça Teori Albino
Zavascki pondera que:
Atento, certamente, à gravidade do ato que opera restrição a direitos
fundamentais, estabeleceu o legislador, como pressupostos genéricos,
indispensáveis a qualquer das espécies de antecipação da tutela, que
haja (a) prova inequívoca e (b) verossimilhança da alegação. O fumus
boni iuris deverá estar, portanto, especialmente qualificado: exige-se
que os fatos, examinados com base na prova já carreada, possam ser
tidos como fatos certos. Em outras palavras: diferentemente do que
ocorre no processo cautelar (onde há juízo de plausibilidade quanto ao
direito e de probabilidade quanto aos fatos alegados), a antecipação da
tutela de mérito supõe verossimilhança quanto ao fundamento de
direito, que decorre de (relativa) certeza quanto à verdade dos fatos.
Sob esse aspecto, não há como deixar de identificar os pressupostos
da antecipação da tutela de mérito, do art. 273, com os da liminar em
mandado de segurança: nos dois casos, além da relevância dos
fundamentos (de direito), supõe-se provada nos autos a matéria fática.
(...) Assim, o que a lei exige não é, certamente, prova de verdade
absoluta, que sempre será relativa, mesmo quando concluída a
instrução, mas uma prova robusta, que, embora no âmbito de cognição
sumária, aproxime, em segura medida, o juízo de probabilidade do
juízo de verdade” (Antecipação da Tutela, Editora Saraiva, São Paulo,
1997, fls. 75-76).
Araken de Assis, em sua obra “Aspectos Polêmicos da Antecipação de
Tutela ”, Ed. Revista dos Tribunais, p. 30, assevera que “a verossimilhança exigida no
dispositivo se cinge ao juízo de simples plausibilidade do direito alegado em relação à parte
adversa. Isso significa que o juiz proverá com base em cognição sumária".
Assim, o juízo de verossimilhança reside num juízo de probabilidade,
resultante da análise dos motivos que lhe são favoráveis e dos que lhe são desfavoráveis. Se
os motivos favoráveis são superiores aos desfavoráveis, o juízo de probabilidade aumenta.
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Mister analisar que na ação civil pública a antecipação de tutela ganha relevância ainda maior
já que com ela visa-se tutelar interesses difusos, coletivos e coletivos lato sensu, bens de vida
de toda sociedade, como ocorre no presente caso.
Nessa esteira, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, em seu
monumental Código de Processo Civil Comentado, comentam:
"3. Antecipação da tutela. Pelo CPC 273 e 461, § 3°, com a redação
dada pela L 8952/94, aplicáveis à ACP (LACP 19), o juiz pode
conceder a antecipação da tutela de mérito, de cunho satisfativo,
sempre que presentes os pressupostos legais. A tutela antecipatória
pode ser concedida quer nas ações de conhecimento, cautelares e de
execução, inclusive de obrigação de fazer. V. coment. CPC 273, 461,
§ 3° e CDC 84, § 3° .” (3ª edição, revista e ampliada, Revista dos
Tribunais, 1997, p. 1.149)
No caso em tela, os requisitos exigidos pelo diploma processual para o
deferimento da tutela antecipada encontram-se devidamente preenchidos.
A prova inequívoca e a verossimilhança da alegação emana da falta de leitos
de UTI suficientes para atender a demanda da macrorregião de Uberaba/MG, comprovada por
intermédio de inúmeros documentos e depoimentos acostado aos autos, os quais deixam
patente a não observância, por parte da União, do número de leitos mínimos que ela
mesmo estabeleceu como suficiente para atender as necessidades urgentes da população;
o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, encontra-se consubstanciado no
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fato de que os pacientes acometidos de graves enfermidades podem perder a própria vida
enquanto aguardam na fila de espera o surgimento de leitos de UTI.11
A urgência, ou periculum in mora, resta, assim, caracterizada tendo em vista
que o objeto da ação diz respeito a leitos de UTI, sendo certo e inquestionável que pacientes
nesta condição, precisam ter prioridade de atendimento e mesmo certeza de atendimento. O
risco de morte é latente. A atual situação paralisante da União precisa ser prontamente
modificada.
Portanto, está em jogo questão de interesse público, de toda uma
coletividade de pessoas, que diariamente, necessitam de atendimento hospitalar, com direito
verossímil, face às provas acostadas, devendo-se assim privilegiar este, com fulcro no
garantia constitucional do direito a vida.
Com efeito, em razão da urgência do provimento jurisdicional pleiteado,
necessário à preservação da vida dos pacientes que, atualmente, dependem do atendimento em
UTI's, em especial, no âmbito do Hospital Escola da UFTM, é que, no caso concreto, deve ser
afastada a aplicação do art. 2º da Lei nº. 8.437/9212, de modo a possibilitar a concessão de
medida liminar inaudita altera pars, postergando-se o contraditório prévio previsto na norma
11 Cite-se, por exemplo, o caso da paciente M.J.R., de 34 anos de idade, citado alhures, que foi internada no
Hospital Escola, no dia 11 de dezembro 2007, com quadro de aneurisma cerebral e indicação de cirurgia e,
em razão da falta de leitos de UTI, a paciente não foi operada, vindo a óbito no dia 05 de janeiro de 2008 (fls.
1252/1.253 e 1.292/1.293).
12 Art. 2º No mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será concedida, quando cabível,
após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no
prazo de setenta e duas horas.
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em apreço para momento ulterior. É o caso, pois, de se aplicar o princípio da
proporcionalidade, visando à defesa de interesses e valores constitucionais de maior
relevância, a saber a vida e a saúde da população atendida.
Assim, presentes os requisitos necessários à concessão da tutela antecipada,
o Ministério Público Federal requer, com fundamento no artigo 12 da Lei n.º 7.347 de 24 de
julho de 1985, 273 e 461 do Código de Processo Civil, o seguinte:
a) o deferimento do provimento antecipatório, em caráter de urgência e
sem a oitiva prévia dos requeridos, para os fins de determinar que a União providencie a
implantação de serviços e reserva de leitos “extras” de UTI em quantidade suficientes a
atender a população da macrorregional de Uberaba/MG, inclusive junto à rede privada,
se necessário, ou, pelo menos, até atingir o percentual mínimo fixado na Portaria
GM/MS nº. 1.101/200213, observando, sempre que possível, as regras de contratação da
Administração Pública e a legislação do SUS aplicável, mediante comprovação nos
autos, no prazo improrrogável de 30 (trinta) dias, sob pena de multa de R$ 50.000,00
(cinqüenta mil reais), por dia de atraso, além das demais sanções cíveis e criminais
cabíveis, inclusive de caráter pessoal. Deverá constar do mandado judicial, ainda, que a
medida deverá ser cumprida de imediato, concedendo-se o prazo de 05 (cinco) dias para o
início do cumprimento da determinação judicial, devendo ocorrer a apresentação de projeto
detalhado e especificado por data acerca do necessário para o cumprimento da ordem em 30
(trinta) dias ou em prazo diverso a ser fixado a critério desse Juízo Federal, sem prejuízo,
13 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI.
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neste último caso, do encaminhamento dos pacientes que necessitem de internação em
UTI's ao tratamento adequado, inclusive, se necessário, na rede privada;
b) subsidiariamente, o deferimento do provimento antecipatório, em
caráter de urgência e sem a oitiva prévia dos requeridos, para os fins de determinar que
a União providencie a implantação de serviços e reserva de leitos “extras” de UTI em
quantidade suficientes a atender a todos os pacientes que derem entrada no Hospital
Escola da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e necessitem de internação
imediata em UTI, inclusive junto à rede privada, se necessário, ou, pelo menos, até
atingir o percentual mínimo fixado na Portaria GM/MS nº. 1.101/200214, observando,
sempre que possível, as regras de contratação da Administração Pública e a legislação
do SUS aplicável, mediante comprovação nos autos, no prazo improrrogável de 30
(trinta) dias, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por dia de atraso,
além das demais sanções cíveis e criminais cabíveis, inclusive de caráter pessoal. Deverá
constar do mandado judicial, ainda, que a medida deverá ser cumprida de imediato,
concedendo-se o prazo de 05 (cinco) dias para o início do cumprimento da determinação
judicial, devendo ocorrer a apresentação de projeto detalhado e especificado por data acerca
do necessário para o cumprimento da ordem em 30 (trinta) dias ou em prazo diverso a ser
fixado a critério desse Juízo Federal, sem prejuízo, neste último caso, do
encaminhamento dos pacientes que necessitem de internação em UTI's tratamento
adequado, inclusive, se necessário, na rede privada;
14 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI.
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c) caso esse Juízo Federal não considere a necessidade de se afastar a
aplicação do art. 2º da Lei nº. 8.437/92, requer-se a concessão do provimento jurisdicional
antecipatório, nos termos do item anterior, após audiência dos representantes judiciais das
pessoas jurídicas de direito público, que deverão se pronunciar no prazo de setenta e duas
horas, nos termo do citado dispositivo legal;
d) na eventualidade de V. Exª. entender que os elementos que subsidiam a
presente ação civil pública não demonstram, por si só, a urgência da presente medida
antecipatória, o que se admite, exclusivamente, por amor ao debate, requer seja ordenada, de
imediato, a realização de perícia médica no Hospital Escola da Universidade Federal do
Triângulo Mineiro, com a finalidade de atestar a superlotação nas dependências daquela
unidade hospitalar, em especial nas Unidades de Terapia Intensiva – UTI's, individualizandose a quantidade e a qualificação dos pacientes que aguardam internação em leitos de UTI, o
tempo de espera, as respectivas condições de saúde e o eventual risco de morte de cada um.
Solicita-se, outrossim, que, neste caso, seja determinada a oitiva da Diretora Clínica e do
Superintendente do Hospital Escola da UFTM, a fim de se justificar a situação de emergência
enfrentada pelo aludido hospital, bem como, se necessário, a realização de inspeção
judicial, nos termos do art. 440 do Código de Processo Civil, para a constatação pessoal
pela própria autoridade judiciária da situação de calamidade pública verificada no
Hospital Escola da UFTM.
9. Do Pedido Final
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Em face de tudo quanto acima foi exposto, o Ministério Público Federal
requer a Vossa Excelência se digne receber a presente inicial, determinando a sua autuação
com os documentos encartados no procedimento em anexo, e ainda:
a) ao final, confirmada a liminar, seja julgado procedente o pedido, para
condenar a União OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente na adoção das medidas necessárias
para que seja elevado o número existente de UTIs através de novos credenciamentos, em
quantidade suficientes para toda a demanda macrorregional de Uberaba/MG, pela MÉDIA
dos padrões estabelecidos na Portaria GM/MS nº. 1.101/2002, ou, pelo menos, até que se
atinja o número mínimo de leitos de UTI fixados na aludida portaria15, em prazo a ser fixado
judicialmente, ter sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por dia de atraso,
além das demais sanções cíveis e criminais cabíveis, inclusive de caráter pessoal. Deverá
constar do mandado judicial, ainda, que a medida deverá ser cumprida de imediato.
b) ordenar a União, a toda vez que houver descredenciamento de leitos SUS
de UTI, com diminuição das vagas existentes para a área de abrangência da macrorregião de
Uberaba/MG, implementar em prazo não superior a 30 (trinta) dias, a mesma quantidade de
leitos de UTI para atender aos pacientes usuários do SUS, ou em prazo diverso a ser fixado
a critério desse Juízo Federal, sem prejuízo, neste último caso, do encaminhamento dos
pacientes que necessitem de internação em UTI's ao tratamento adequado, inclusive, se
necessário, na rede privada;
15 64 (sessenta e quatro) leitos de UTI.
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c) a citação da UNIÃO de modo que possa tomar conhecimento da causa e
caso deseje, ofereça contestação aos pedidos formulados no prazo legal;
d) a intimação da UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIÂNGULO
MINEIRO para, querendo, integrar a presente demanda;
e) a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos,
desde logo, à vista do disposto no artigo l8 da Lei 7.347/l985 e no artigo 87 da Lei 8.078/90;
f) sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante entrega e
vista dos autos na Procuradoria da República no Município de Uberaba/MG, dado o disposto
no artigo 236, § 2º do Código de Processo Civil e artigo 18, inciso II, alínea “h”, da Lei
Complementar n. 75/93;
g) deferir a produção de todas as provas em Direito admitidas, notadamente
a pericial, a testemunhal, o depoimento pessoal, auditoria, justificação, juntada de documentos
novos e tudo o mais que se fizer mister à completa elucidação e demonstração cabal dos fatos
articulados na presente inicial; e
h) seja oficiado ao Ministério da Saúde para que informe o quanto já foi
gasto este ano com publicidade e propaganda e qual o valor total do orçamento previsto este
ano para tais despesas.
Dá-se a causa o valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais).
Pede deferimento.
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Uberaba, 24 de julho de 2008.
Bruno Nominato de Oliveira
Procurador da República
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