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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Diretoria
SOCIEDADE PAULISTA DE PNEUMOLOGIA E TISIOLOGIA
BIÊNIO 2016/2017
Presidente: Regina Maria de Carvalho Pinto
Vice-Presidente: Roberto Rodrigues Júnior
Secretária Geral: Silvia Carla Souza Rodrigues
1ª Secretária: Roberta Pulcheri Ramos
Diretora de Finanças: Frederico Leon Arrabal Fernandes
Diretor de Assuntos Científicos: Willian Salibe Filho
Diretor de Divulgação: Angela Honda de Souza
Diretor Assuntos do Interior: Ciro de Castro Botto
Diretor de Informática: Claúdio Ricardo Frison
Pediatria:
Marina Buarque de Almeida
Adyleia Aparecida Dalbo Contrera Toro
Claudine Sarmento da Veiga
COMISSÕES
CONSELHO FISCAL
Defesa Profissional: Lilia Azzi Collet da Rocha Camargo
Ensino: Suzana Erico Tanni Minamoto
Promoções: Luis Renato Alves
Assuntos da Grande São Paulo: Lilian Ballini Caetano
Publicações: Rodrigo Abensur Athanazio
Efetivos:
Élcio dos Santos Oliveira Vianna
João Marcos Salge
Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano
DEPARTAMENTOS
Cirurgia Torácica:
Marcos Naoyuki Samano
Celso Murilo Nálio Matias de Faria
Erika Rymkiewicz
Fisioterapia Respiratória:
Luciana Dias Chiavegato
Adriana Claudia Lunardi
Lara Maris Nápolis Goulart Rodrigues
Suplentes:
Ricardo Mingarini Terra
Liana Pinheiro dos Santos
Maria Raquel Soares
CONSELHO DELIBERATIVO
Ex-Presidentes
Endoscopia Respiratória:
Evelise Lima
Felipe Nominando Diniz Oliveira
Viviane Rossi Figueiredo
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REGIONAIS
SUB-COMISSÕES
Regional do ABC
Presidente: Claudia Maria de Medeiros Pacheco
Secretária: Mônica Silveira Lapa
Asma - Maria Amélia Carvalho da Silva Santos
Regional de Araraquara / Bauru / Botucatu
Presidente: Marcos Abdo Arbex
Secretário: José Eduardo Bergami Antunes
Circulação - Caio Júlio Cesar dos Santos Fernandes
Regional de Campinas
Presidente: Mauricio Sousa de Toledo Leme
Secretário: Paulo Roberto Tonidandel
Câncer - Teresa Yae Takagaki
Distúrbios Respiratórios do Sono - Pedro Rodrigues Genta
Doenças Intersticiais - Regina Célia Carlos Tibana
D.P.O.C. - José Gustavo Barian Romaldini
Epidemiologia - Maria Cecília Nieves Teixeira Maiorano
Regional de Marília
Presidente: Gisele César de Rossi Agostinho
Secretária: Maria de Lourdes Marmorato Botta Hafner
Infecções Respiratórias e Micoses - Mauro Gomes
Pleura - Ricardo Milinavicius
Regional de Ribeirão Preto
Presidente: Adriana Ignácio de Pádua
Secretária: Fabíola Galhardo Rizzatti
Regional de Santos
Presidente: Alex Gonçalves Macedo
Secretário: Thiago Fernandes Leomil
Doenças Ambientais e Ocupacionais - Ubiratan de Paula Santos
Tabagismo - Aldo Agra de Albuquerque Neto
Terapia Intensiva - Eduardo Leite Vieira Costa
Tuberculose - Suzana Pimenta
Regional de São José dos Campos
Presidente: José Eduardo de Oliveira
Secretária: Márcio Adriano Leite Bastos
Função Pulmonar - Andréa Gimenez
Regional de São José do Rio Preto
Presidente: Clélia Margarete Trindade Borralho
Secretário: Leandro Cesar Salviano
Doença Pulmonar Avançada - José Eduardo Afonso Júnior
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Imagem - Gustavo de Souza Portes Meirelles
Exercício e Atividade Física - André Luis Pereira de Albuquerque
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Apresentação
A atualização clínica é um desafio constante para o médico pneumologista nos dias atuais.
Novos entendimentos fisiopatológicos, novas doenças e avanços terapêuticos se somam no dia a
dia de atendimento do consultório, dificultando o constante aprimoramento do conhecimento.
Nesta edição, buscamos facilitar esta busca por atualização através de um formato com leitura
mais fácil baseado em casos clínicos. Diversos autores foram convidados a apresentar a descrição
de um caso clínico seguido de uma breve revisão sobre o tema, explorando as mais diversas áreas
da pneumologia.
Editores
Editor-chefe:
Rodrigo Abensur Athanazio
Editores-executivos:
Roberto Rodrigues Junior
William Salibe Filho
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
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Índice
Estridor laringeo: um desafio do diagnóstico ao tratamento ............................................................................................................. 7
Laryngeal stridor: a challenge of diagnosis to treatment
Hipertensão Pulmonar - o desafio do seu manejo .............................................................................................................................. 15
Pulmonary Hypertension - The Challenge of Its Management
Co-infecção crônica pulmonar: algumas possibilidades diagnósticas .......................................................................................... 18
Chronic lung co-infection: some diagnostic possibilities
Dispneia progressiva em paciente jovem ............................................................................................................................................. 22
Progressive dyspnea in young patient
Uma pneumonia incomum? .................................................................................................................................................................... 26
Uncommon pneumonia?
Agenesia pulmonar unilateral direita, dextrocardia e pneumotórax: uma rara associação .......................................................... 29
Right unilateral pulmonary agenesis, dextrocardia and pneumothorax: a rare association
Síndrome Fibrose/Enfisema Pulmonar associada à Hepatopatia ..................................................................................................... 32
Fibrosis / emphysema pulmonary syndrome associated with liver disease
Dispneia em paciente com Lúpus Eritematoso Sistêmico ................................................................................................................. 36
Dyspnea in a Patient with Systemic Lupus Erythematosus
Bronquiectasia: uma história não contada ......................................................................................................................................... 39
Bronchiectasis: an untold story
Sibilância na infância: todo cuidado é pouco! ................................................................................................................................... 43
Wheezing in childhood: all care is short!
A espirometria é normal, e agora? ......................................................................................................................................................... 46
Spirometry is normal, now what?
Aquele sono pesado... ............................................................................................................................................................................. 48
That heavy sleep
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Estridor laringeo: um desafio do diagnóstico
ao tratamento
Laryngeal stridor: a challenge of diagnosis to treatment
José Gustavo Barian Romaldini1; Leandro Picheth Eloy Pereira2
Médico assistente da disciplina de pneumologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
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Cirurgião Torácico
Especialização InCor-HCFMUSP
Complementação Especializada Cirurgia da Parede Torácica e Mediastino
1
Caso Clínico
O caso trata-se de uma paciente feminina de 52 anos,
natural e procedente de São Paulo, professora, trazida PS
de um Hospital da capital no dia 17/02 após crise súbita
de asma enquanto dirigia. Refere ter apresentado quadro
de síncope levando a colisão do auto.
Durante internação apresentou novo episódio de
dispneia intensa, sendo transferida para UTI. Crise com
duração de cerca de 3 minutos. Sendo solicitado avaliação
e acompanhamento da Pneumologia.
Como antecedentes apresentava prematuridade,
diagnóstico de asma grave após internação hospitalar
prolongada há menos de 6 meses por pneumonia grave,
pneumonia de repetição com três internações prévias, sem
história de atopia. Quadro de tosse e dor torácica em
investigação. Negava história de tabagismo, etilismo ou
drogadição.
No momento da avaliação apresentava-se já
assintomática a e com ausculta respiratória normal, porém
durante avaliação apresentou nova crise com dispneia
intensa, súbita associada a tosse e estridor laríngeo com
duração de cerca de 2 minutos
Trazia exames realizados antes desta internação:
angiotomografia de tórax (27/06/2015), que mostrava
discretas opacidades parenquimatosas e atelectásias
laminares em campos posteriores, negativo para
tromboembolismo pulmonar.
Broncoscopia de 06/07/2015 com alteração compatível
com compressão extrínseca do brônquio do LIE, e em 06/
10/2015 sem tal compressão descrevendo apenas sinais
de laringite posterior e traqueobronquite aguda.
Realizou Ecocardiograma com função sistólica
preservada, teste ergométrico e cateterismo cardíaco com
coronariografia dentro da normalidade.
A prova de função pulmonar de 23/07/2015 mostrava
um distúrbio ventilatório inespecífico leve.
Realizou Rx de tórax durante a internação atual também
normal.
José Gustavo Barian Romaldini
Rua lord cockrane, 820 ap 74c
Ipiranga, São Paulo
Cel. 98912-4612
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
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Devido ao inicio súbito e duração curta associado a ao
estridor laríngeo e ausculta respiratória normal foi
questionado o diagnóstico até então de crise asmática e
levantada hipóteses diagnósticas de traqueobroncomalácia ou discinesia de pregas vocais.
Solicitado nasofibroscopia e tomografia de tórax com
cortes em inspiração e expiração. Iniciado uso de
esomeprazol (80mg/dia), Motilium (10mg; 03x/dia),
Rivotril (01mg, 12/12h), Escitalopram (10mg/dia), mantido
formoterol/budesonida, suspenso antibioticoterapia e
corticoides sistêmicos.
Nasofibroscopia sem alteração de motilidade de pregas
vocais, hipertrofia e conchas nasais (+/4+), laringite posterior.
A tomografia não evidenciou alterações significativas
parenquimatosas e sem sinais de cola amento de traqueia
ou brônquios que sugerissem malácia.
Persistia com crises de laringoespasmo recorrentes
inclusive com aumento da frequência das crises, agora
desencadeadas aos mínimos esforços ou a expiração forçada.
Fez nova com laringotraqueobroncoscopia, agora
dirigido para pesquisa de discinesia de pregas vocais,
com avaliação dinâmica da laringe, que evidenciou
durante a inspiração movimentos paradoxais das pregas
vocais com obstrução intermitente da fenda glótica o que
é compatível com o diagnóstico de discinesia de pregas
vocais . Porém durante exame dinâmico, apresentou
também “tosse em explosão” sugestiva de traqueomalácia.
Apresentava também sinais de rinossinusite.
Após confirmação diagnóstica de discinesia de pregas
vocais foi ajustado tratamento já instituído e iniciado
antibioticoterapia para rinossinusite.
A paciente manteve piora das crises, mesmo com
tratamento otimizado.
Foi readmitida em UTI no dia 14/03 após crise mais
acentuada e persistente (melhorou apenas com dormonid EV).
Diante do quadro de piora clínica progressiva, optado
por realizar traqueostomia.
Mesmo após traqueostomia a paciente ainda apresentava
crises de tosse associada a estridor o que é incompatível
com diagnóstico de discinesia de pregas vocais.
Em 16/03/2016, fez nova TC de tórax, essa sendo
realizada em vigência da crise, com achado de redução do
calibre da traqueia distal e brônquios principais, com
abaulamento posterior, tanto nas imagens em inspiração
quanto em expiração.
L
L
Optado por colocação de prótese traqueal em tubo T
(Montgomery), com ramo distal longo. Cursou com melhora
sintomática importante, recebendo alta hospitalar.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
(figuras abaixo). Usando a ótica para guiar a introdução do
tubo, foi possível o posicionamento, seletivando o tubo à
esquerda, através do traqueostoma. Optado por não utilizar
um tubo de duplo lúmen, pois diâmetro maior pode interferir
na sutura da parede membranosa.
A paciente precisou ser novamente internada por
infecção vias aéreas/ prótese traqueal e dor cervical.
Cultura + para acinetobacter produtor de carbapenemas.
Iniciou Polimixina b por 7 dias com melhora parcial,
permanecendo sempre bastante secretiva. Optado por
iniciar Gentamicina inalatória
Apresentou melhora da secreção. Recebeu alta hospitalar
com Gentamicina inalatória 2 x dia de uso continuado.
Manteve-se bem por algum período, porém voltou a cursar
com aumento do volume da expectoração de forma persistente
Nova discussão do caso, sendo optado por indicar
abordagem cirúrgica, a traqueobroncoplastia, com reforço
posterior da traqueia torácica e brônquios principais
direito e esquerdo.
Paciente foi posicionada em decúbito lateral esquerdo.
Realizada toracotomia póstero-lateral direita, abertura
no quarto espaço intercostal. Ligadura da veia ázigos.
Abertura da pleura mediastino, dissecção e exposição de
toda traqueia torácica, e dos brônquios principais direito,
até o brônquio intermédio, e brônquio principal esquerdo
até bifurcação dos brônquios do lobo superior e inferior.
O procedimento cirúrgico
Após a indução anestésica e passagem de cateter
peridural, retiramos a prótese traqueal, tubo T.
Na tentativa de realizar intubação seletiva à esquerda,
com tubo simples, identificado dificuldade para seletivação
do tubo à esquerda, mesmo com o auxílio da broncoscopia.
Decidido por passar uma ótica pelo orifício da
traqueostomia, com a realização de uma traqueoscopia
rígida. Identificado importante colabamento traqueal, com
obstrução completa do óstio do brônquio principal esquerdo
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Fig.: Foto esquemática do acesso cirúrgico, e exposição da traqueia torácica
e brônquios (Wright CD. Tracheal Surgery: Posterior Splinting Tracheoplasty
for Tracheomalacis. Operative Techniques in Thoracic and Cardiovascular
Surgery 20:31-45, 2015
9
Foto da exposição da traqueia torácica e brônquios
principais direito e esquerdo. Observa-se o alargamento
da parede posterior da traqueia e brônquios.
para a traqueia, e cerca de 1,5cm de largura para os
brônquios principais. Passado os pontos da borda
esquerda da prótese de polipropileno, aproximado e
amarrado. Seguiu com a passagem dos pontos, dois
pontos, da parede membranosa, e o ponto da extremidade
direita do anel traqueal, que já estava passado na traqueia,
na prótese. Amarrado os pontos na sequência. A sutura
foi feita no sentido craniocaudal, com distância
aproximada de 0,8cm.
No brônquio principal direito, o reforço posterior se
estendeu até o brônquio intermédio, próximo de sua
bifurcação. À esquerda foi até a bifurcação dos brônquios
do lobo superior e inferior.
Foto do reforço completo da parede posterior da
traqueia.
Figura: Desenho esquemático do reforço posterior da traqueia torácica e
brônquios. Wright CD, Grillo HC , Hammoud ZT, Wain JC, Gaissert HA,
Zaydfudim V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for Expiratory Collapse of Central
Airways; Ann Thorac Surg 2005; 80:259–67
Realizado os pontos da sutura da parede posterior com
PDS 4-0 e poliglactina (Vicryl) 4-0. Iniciou-se a passagem
dos pontos na extremidade esquerda no anel traqueal e
após na extremidade direita do anel.
Utilizada a tela de polipropileno, uma tira de 2,5 cm
10
Figura: Reforço posterior da traqueia torácica e brônquios completo. Wright
CD. Tracheal Surgery: Posterior Splinting Tracheoplasty for Tracheomalacis.
Operative Techniques in Thoracic and Cardiovascular Surgery 20:31-45, 2015
Optado por cobrir o esôfago que ficaria em contato com a
tela de polipropileno com patch de pleura autóloga, conforme
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
demonstrado na foto acima (aspecto cirúrgico final).
A paciente foi extubada no centro cirúrgico, e encaminhada
para o pós-operatória para unidade de terapia intensiva.
Neste momento foi mantida traqueostomia.
Cursou no pós-operatório, com piora infecciosa e derrame
pleural à direita, com necessidade de drenagem pleural
Realizada nova a broncoscopia que mostrou aumento
da luz traqueal, porém com presença de secreção
mucopurulenta de moderada quantidade, sendo feito
toalete brônquico.
Evoluiu com melhora clínica progressiva, após inicio de
antibioticoterapia com resolução do quadro infeccioso.
Retirado dreno pleural. Optado por nova avaliação
endoscópica, sendo evidenciado melhora significativa da
luz traqueal e dos brônquios principais direito e esquerdo,
e ausência de secreção. Neste momento feito a decanulação.
Paciente se com melhora importante dos sintomas
respiratórios, e da qualidade de vida. Sem novas
internações hospitalares até 05 meses de seguimento.
Broncoscopia realizado após 05 meses da cirurgia
mostrou traqueia de calibre preservado, com mobilização
próxima da fisiológica com a tosse. A Carina e óstios dos
brônquios principais direito e esquerdo de diâmetro
preservados. Mucosa de aspecto preservado (fotos abaixo).
Traqueia distal
A tomografia de tórax neste período, com o diâmetro
das vias aéreas principais preservadas. Melhora
significativa em relação à pré-operatória.
Discussão
A discinesia de prega vocal (DPV) é por definição a
adução paradoxal das cordas vocais na inspiração e / ou
início da expiração com leve fenda posterior
É uma alteração funcional, não orgânica, sem base
anatômica com movimentação paradoxal e involuntária
das pregas vocais1
Está muito relacionada a desordens psicogênicas (teoria
da conversão)1e também relacionada a doença do refluxo
gastresofágico1(teoria do refluxo)
A DPV é um diagnóstico diferencial de asma 2 ,
principalmente em pacientes com asma de difícil controle
e deve ser investigada quando:
• Sintomas e sinais de obstrução de vias aéreas
superiores
• Sintomas obstrutivos intensos com parâmetros físicos
e exames complementares normais
• Hospitalizações frequentes
• Exame radiológico de tórax normal e ausência de
hiperinsuflação nas crises
• Intubação e/ou traqueostomia de urgência
• Precipitação ou piora das crises após conflitos
emocionais
• Estridor inspiratório
• Falta de resposta a broncodilatadores; Asma
refratária
• Frequentes atendimentos em serviços de urgência
simulando
• Melhora dos sintomas durante o sono, na distração e
após sedação
• Ausência e história pessoal e familiar de alergia
O Tratamento deve ser individualizado e pode incluir
fonoterapia, psicoterapia, técnicas de relaxamento, uso
de antidepressivos e ansiolíticos, terapia anti refluxo
gastresofágico e até uso de toxina botulínica.
Deve-se cessar o uso de medicamentos desnecessários,
como medicações para asma e explicar claramente a
patologia para o paciente.
Traqueobroncomalácia
Crina e óstios dos brônquios principais
A traqueia normal tem uma relativa complacência e
elasticidade permitindo alguma variação no seu
diâmetro3. Pode reduzir sua luz em 13-14% nas porções
média e proximal durante expiração forçada4,9.
Traqueomalácia, traqueobroncomalácia, colapso
dinâmico excessivo da via aérea, ou colapso expiratório
da via aérea central são diferentes termos que descrevem
o estreitamento da luz traqueal. Tem uma prevalência
estimada de 4 – 23% dos pacientes que são submetidos à
broncoscopia 10,11.
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
11
Expiração
Inspiração
Figura: Influência da inspiração e expiração nas vias aéreas intra e
extratorácica (Pearson’s Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008)
A traqueomalácia descreve a perda ou redução da
sustentação e da rigidez da cartilagem traqueal com
consequente obstrução da via aérea5 um aumento patológico
da complacência traqueal que leva à um colapso excessivo
da via aérea com as variações fisiológicas da traqueia
intratorácica3.
Etiologia
A traqueomalácia pode ser congênita ou adquirida3. As
alterações congênitas incluem: defeitos cartilaginosos
segmentares congênitos, malformações vasculares,
traqueobroncomalácia primária, síndrome de
traqueobroncomegalia.
Defeitos cartilaginosos segmentares congênitos é uma
causa rara, decorrente da agenesia ou malformação dos
anéis cartilaginosos. Mais comum na árvore brônquica.
As malformações vasculares são causa comum de
traqueomalácia segmentar congênita. Artérias anômalas
exercem compressão extrínseca na cartilagem em
desenvolvimento, com desenvolvimento inadequado dos
anéis cartilaginosos.
Traqueobroncomalácia primária ocorre sem
compressão extrínseca traqueal. Mais frequente em
crianças prematuras, mas pode ocorrer em crianças
saudáveis isoladamente. Deve-se ao desenvolvimento
inadequado da cartilagem. Geralmente se resolve
espontaneamente nos primeiros um a dois anos de idade,
mas pode ser necessário intervenção invasiva.
Síndrome de traqueobroncomegalia se refere à uma
dilatação difusa da árvore traqueobrônquica, por vezes
compromete da laringe aos brônquios subsegmentares.
Conhecido também como diverticulose traqueal , ou
síndrome de Mounier-Kuhn, que foi descrita pela
primeira vez em 1932. A causa é desconhecida. Existe
uma diminuição no número de fibras elásticas das vias
aéreas. Há a associação com outras doenças do tecido
conjuntivo.
12
Figura: Aparência broncoscópica na síndrome de Mounier-Kuhn (Pearson’s
Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008)
As causas adquiridas são decorrentes de trauma de via
aérea, compressão extrínseca prolongada, ou quadros
inflamatórios 3.
As causas pós-trauma são decorrentes de lesões que
geram perda ou dano aos elementos cartilaginosos, ou
distensão excessiva da parede membranosa.
A mais comum é a lesão relacionada à intubação,
podendo ser por cicatrização inadequada do estoma da
traqueostomia, torsão da cânula de traqueostomia,
pressão por insuflação excessiva do cuff da cânula
endotraqueal, ou de traqueostomia.
A pressão na mucosa da via aérea compromete sua
perfusão, e erosão mecânica. Embora a principal doença
de via aérea relacionada por intubação é a estenose é a
estenose de traqueia. As duas lesões, estenose e malácia,
podem ser vistas associadas3. Outras lesões da mucosa
traqueal também podem determinar a formação de
malácia.
Figura: Desenho esquemático de traqueomalácia segmentar relacionada à
intubação endotraqueal com insuflação excessiva do cuff Pearson’s Thoracic
and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008)
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Compressão extrínseca prolongada da traqueia. As
lesões cervicais ou mediastinais também podem levar à
malácia por comprometimento do fluxo de sangue para
os componentes de sustentação cartilaginosos. Exemplos
são os bócios mergulhantes, ou aquelas em continuidade
com a traqueia, como teratomas, timomas, cistos
broncogênicos 3.
As causas inflamatórias são a traqueobroncomalácia
adquirida, relacionada ao enfisema e bronquite crônica,
e à policondrite3.
O colapso expiratório da traqueia e brônquios
principais é também uma forma de traqueobroncomalácia
4
. Muitas vezes associado com doença pulmonar obstrutiva
crônica 5. A fisiopatologia do enfisema pulmonar e da
doença pulmonar obstrutiva crônica é multifatorial. A
etiologia da traqueobroncomalácia adquirida parece
estar relacionada à inflamação crônica, relacionado ao
tabagismo ou episódios recorrentes de bronquite3.
As alterações estruturais típicas são um alargamento
da parede posterior, membranosa, que se torna
redundante, e os anéis cartilaginosos perdem a rigidez e a
sustentação estrutural, e, portanto, a forma em “C”,
tornando-se achatado, descrito com os formatos
“crescente” ou em “boca de peixe”.
das vias aéreas ocorre em 56% dos pacientes.
Uma classificação proposta por Carden e
colaboradores, em 2005, também diferenciam as causas
congênita das adquiridas, em crianças e adultos 7,8. As
etiologias podem ser sumarizadas nas tabelas abaixo:
# Traqueomalácia em crianças:
D Congênitas:
- Idiopática
- Prematuridade
- Anomalias congênitas da cartilagem
- Síndromes congênitas associadas à traqueomalácia
- Anomalias congênitas associadas à traqueomalácia
D Adquiridas
- Intubação prolongada
- Traqueotomia
- Traqueobronquite severa
- Compressão externa
Vascular / Cardíaca / Esquelética / Tumores e cistos
- Infecção
- Pós-traumática
# Traqueomalácia em adultos:
D Congênitas:
- Genética
- Idiopática (Síndrome de Monier-Kuhn)
D Adquiridas
- Após intubação
- Pós traqueostomia
- Trauma torácico
- Pós transplante de pulmão
- Enfisema
- Infecção ou bronquite crônica
- Inflamação crônica
- Compressão externa
Aaneurisma de aorta / Tumores e cistos / abscessos
- Aneis vasculares
Diagnóstico
Figura: Operative Techniques in Thoracic and Cardiovasculary Surgery
20:31-45 2015 Elsevier
Policondrite recidivante é uma doença sistêmica que
envolve múltiplas cartilagens do corpo. Mais frequente
nas 3º e 4º décadas com incidência equivalentes em
homens e mulheres. Doença auto-imune do tecido
conjuntivo, secundário à produção de auto anticorpos,
desenvolvendo condrite traqueal, e substituição da
cartilagem destruída por tecido fibroso. O envolvimento
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Os sinais e sintomas estão associados à obstrução de
via aérea em vários níveis da arvora traqueobrônquica e
são difíceis de serem identificadas apenas com a
avaliação clínica. Portanto os pacientes com sintomas
referentes ao colapso das vias aéreas centrais são tratados
de maneira similar a aqueles com colapso da árvore distal.
Porém a diferenciação destes pacientes é importante,
pois os que apresentam o colapso de via aérea central
podem se beneficiar da estabilização cirúrgica4.
A prova de função pulmonar pode contribuir para esta
avaliação. A curva fluxo volume mostra limitação do fluxo
expiratório, com preservação do fluxo inspiratório. A curva
expiratória mostra um fluxo máximo baixo, com queda
próxima à linha de base, com um longo platô até o final
da expiração2.
13
Figura mostrando as curvas fluxo-volume de paciente com 57 anos , história
de dispnéia progressiva, tosse, sibilos e infecções respiratórias. Préoperatória, e 02 meses após a cirurgia . (Wright CD, Grillo HC , Hammoud
ZT, Wain JC, Gaissert HA, Zaydfudim V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for
Expiratory Collapse of Central Airways; Ann Thorac Surg 2005;80:259–67)
Estudos de imagens tem importante papel no diagnóstico
do colapso expiratório das vias aéreas centrais. Aquino e
colaboradores mostraram importante diferença nas
mudanças do diâmetro da traqueia com a inspiração e
expiração, entre pacientes com traqueomalácia e os casos
controle9. O diâmetro traqueal nos casos controles teve
uma redução de 13 a 14% nas traqueias proximal e média.
Enquanto os pacientes com traqueomalácia tiveram uma
redução média de 47% na traqueia proximal e 54% na
traqueia média. Sugere que uma mudança no diâmetro da
traqueia superior à 18% proximal e superior à 28% na
traqueia média entre a inspiração e expiração, a
probabilidade de traqueomalácia é de 89-100% 9. Uma
mudança superior à 30% mostrou ser sensível para detectar
traqueomalácia.
A broncoscopia realizada no paciente acordado, que pode
obedecer a comandos, como inspiração, expiração e tosse,
tem importante papel como exame diagnóstico e para
planejamento cirúrgico. Assim como pode realizar uma
graduação do estreitamento expiratório da via aérea, sendo
normal, quando menor que 50%, leve (50 – 75% de colapso),
moderado (75 – 100%), e grave com 100% de colapso 12.
As desvantagens potenciais da broncoscopia são a
limitação da técnica pela manipulação das vias s aéreas,
sedação, distorções ópticas, e magnificações, e uma
relativa dificuldade de realizar o procedimento em
pacientes dispneicos. A avaliação do estreitamento
traqueal é subjetiva, e a caracterização das estruturas
extratraqueais é difícil10.
A tomografia computadorizada é um exame rápido e
não invasivo. Permite a avaliação da traqueia, e das
estruturas adjacentes, assim como do movimento
respiratório 10. Não é necessário a instrumentação das
vias aéreas, ou sedação. Diversas informações podem ser
avaliadas, como: medidas da área da luz traqueal,
diâmetro anteroposterior, e dimensões laterais10.
Referências Bibliográficas
1.
Morris ML, et al. Vocal Cord Dysfunction. Clinical Pulmonare Medicine
2006 Vol 11, pp73-86
2. Newman AKB, Mason, UG, Schmaling, KB. Clinical features of
vocal cord dysfunction. Am J Respir Crit Care Med vol 152, 1995.
3. Ashiku SK, Maddaus MA, Pearson FG. Tracheomalacia. Pearson’s Thoracic
and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008. Chapter 22 pp277-293
4. Wright CD, Grillo HC , Hammoud ZT, Wain JC, Gaissert HA, Zaydfudim
V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for Expiratory Collapse of Central
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Fig: Majid, Gaurav, Sanchez, et al. Evaluation of Tracheobronchomalacia
by Dynamic Flexible Bronchoscopy - A Pilot Study Ann Am Thorac Soc Vol
11, No 6, pp 951–955, Jul 2014
14
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Hipertensão Pulmonar - o desafio do seu manejo
Pulmonary Hypertension - The challenge of its management
Fernanda Maria Pinheiro Machado Nogueira1; Carlos Gustavo Yuji Verrastro2 ; Celia Camelo Silva3;
Jaquelina Sonoe Ota Arakaki4
1
Residente da Disciplina de Pneumologia – Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São
Paulo - UNIFESP
2
Radiologista da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP e do
Grupo Fleury
3
Coordenadora do Serviço de Cardiologia Pediátrica; Ecocardiografista e Hemodinâmicista Pediátrica da
Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
4
Coordenadora do Grupo de Circulação Pulmonar da Disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de
Medicina - Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
Relatamos o caso de um paciente do sexo masculino,
27 anos, natural e procedente de São Paulo, trabalhava
como técnico de leitura da Companhia de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo. Há 4 anos, iniciou quadro
de dispneia progressiva aos esforços associada à síncope
nos últimos meses. Há 2 anos com edema e hiperemia de
face ao deitar. Negava comorbidades, uso de medicações,
exposições, tabagismo e etilismo.
Ao exame físico encontrava-se em bom estado geral,
porém com pletora facial e turgência jugular, além de
circulação colateral visível em parede anterior do tórax.
Apresentava PA= 120 x 80mmHg, FC= 80 bpm, f=20 irpm e
SpO2= 97% em ar ambiente. Ausculta pulmonar normal e
ausculta cardíaca com sopro sistólico em foco tricúspide
(+/6+) e desdobramento fixo de B2.
Radiografia tórax evidenciava tronco da artéria
pulmonar retificado, sem alterações significativas em
parênquima pulmonar; Ecocardiograma apresentava
aumento de ventrículo direito em grau importante e pressão
sistólica da artéria pulmonar estimada em 54mmHg
(Velocidade de Refluxo da Tricúspide de 3,1 m/s). Na
tomografia de tórax observava-se opacidade com
atenuação de partes moles na região mediastinal,
envolvendo as estruturas vasculares mediastinais, a
traquéia e o esôfago, com focos de calcificação de permeio,
promovendo afilamento dos ramos principais da artéria
pulmonar e das veias pulmonares superiores bilaterais.
Tomografia de abdome excluiu sinais de fibrose
retroperitoneal.
Realizou PET/ CT (figura 1) evidenciando tecido
fibrosante dentro do mediastino estreitando traquéia
e artérias pulmonares sem captação de FDG em PET /
CT. Além disso, paciente realizou sorologia para
histoplasmose e PPD negativos; IgA, IgG e IgG4:
normais.
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Fig.1 – PET/TC evidenciando tecido fibrosante dentro do mediastino
estreitando traquéia e artérias pulmonares sem captação de FDG em PET /
CT. Há acúmulo aumentado de FDG na parede do ventrículo direito (VD),
devido a disfunção do VD. Presença de stent em ramo principal da artéria
pulmonar esquerda. Imagem cedida por Dr Gustavo Meireles (radiologista
do Grupo Fleury)
Paciente apresentava critérios clínicos e tomográficos
compatíveis com o diagnóstico de Mediastinite Fibrosante
com provável hipertensão pulmonar avaliada pelo
ecocardiograma.
Devido a gravidade da doença, a presença de sintomas
compatíveis com síndrome da veia cava superior e baixo
débito, iniciou-se a anticoagulação e posteriormente foi
submetido à angioplastia pulmonar de artéria do lobo
inferior direito (figura 2) e colocação de stent em artéria
pulmonar esquerda (figura 1 e 2), evoluindo com melhora
dos sintomas de baixo débito.
A Mediastinite Fibrosante (MF) é uma doença rara, de
alta morbidade, caracterizada pela proliferação anormal
de tecido fibroso no mediastino, com compressão de
estruturas broncovasculares. Apresenta incidência igual
entre homens e mulheres sendo mais comum em jovens1.
15
Fig. 2- Angiografia pulmonar pré (A) e pós (B) angioplastia de artéria do ramo do lobo inferior direito. Angioplastia pulmonar e colocação de stent em artéria
pulmonar esquerda (C e D).
As manifestações são variáveis, sendo as mais comuns:
dor retroesternal, tosse, síndrome da veia cava superior,
disfagia, dispneia progressiva, hemoptise, atelectasia e
pneumonite obstrutiva. O diagnóstico é dado por meio de
quadro clínico sugestivo e alterações tomográficas compatíveis.
A MF pode resultar de reação de hipersensibilidade a fungos,
bactérias, micobactérias ou outros antígenos desconhecidos
( doenças granulomatosas) , como também pode secundária
a doenças não granulomatosas, como radioterapia, Doença
de Behçet ou a drogas. A causa pode ser desconhecida
(idiopática) ou estar associada a doença relacionada a IgG4)2.
Ressalta-se a importância do diagnóstico diferencial com
neoplasias que acometem o mediastino.
A MF secundária a doença relacionada a IgG4 é
caracterizada por processo fibroinflamatório, com
sobreposição de aspectos clínicos e radiológicos, sendo
que os pacientes acometidos podem apresentar outras
manifestações como como fibrose retroperitoneal,
colangite esclerosante, tireoidite Riedel2,3. Um estudo
concluiu que um terço dos pacientes com mediastinite
fibrosante por histoplasmose ou doença granulomatosa
apresentam características histopatológicas da doença
relacionada a IgG4. Ainda não está claro se as alterações
ocorrem como resposta imune do hospedeiro contra o
histoplasma ou se representam uma manifestação da
doença relacionada a IgG42.
A hipertensão pulmonar é uma complicação grave
causada por compressão extrínseca das artérias e/ou veias
pulmonares e não há evidências de benefício de fármacos
utilizados para o tratamento da hipertensão arterial
pulmonar4.
O PET/CT pode auxiliar na diferenciação entre MF e
16
condições neoplásicas ou inflamatórias. O exame ainda
pode ser realizado para controle de tratamento e avaliação
de resposta5,6.
O tratamento poderá ser clínico direcionado a doença
de base, porém geralmente com resultados espúrios, ou
por meio de intervenção invasiva, seja cirúrgica 7,8 ou
endovascular ( angioplastia com balão na artéria pulmonar,
prótese endovascular)9,10 porém os efeitos hemodinâmicos
e a eficácia a longo prazo são desconhecidos.
Pacientes com MF associada à doença relacionada a
IgG4 podem se beneficiar do uso de corticóide. Alguns
relatos demonstraram a presença de acúmulo de linfócitos
B CD20 em amostras de tecido da MF, com redução da
lesão com Rituximabe, porém mais estudos são
necessários para comprovar sua eficácia11.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
17
Co-infecção crônica pulmonar: algumas
possibilidades diagnósticas
Chronic lung co-infection: some diagnostic possibilities
Jonas Atique Sawazaki1 e Ricardo de Souza Cavalcante2
1
Residente de infectologia – Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico por Imagem –
Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP
2
Médico infectologista do Hospital das Clínicas de Botucatu e Departamento de Doenças Tropicais e
Diagnóstico por Imagem da Faculdade de Medicina de Botucatu– UNESP
Endereço: Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico por Imagem – Faculdade de Medicine de
Botucatu – UNESP
Palavras-chave: paracoccidioidmicose, tuberculose,
diagnóstico
Key words: paracoccidioidomycosis, tuberculosis,
diagnosis
Relato de caso
Paciente pardo, do sexo masculino, 36 anos de idade, foi
admitido com quadro de tosse produtiva com expectoração
amarelada há quatro meses associada à perda de peso não
aferida e febre. Também apresentava dispneia, com piora
nos últimos cinco dias. Referia a presença de lesões em nariz,
lábio e supercílio direito que acreditava ser decorrentes de
queimaduras térmicas. Natural e procedente de Botucatu-SP,
morador de rua, usuário ativo de crack e etilista (1,5 litro de
destilado por 11 anos). Já viveu em zona rural. Negava outras
doenças e antecedentes.
Na admissão apresentava-se em regular estado geral,
magro, desidratado, febril (37,9°C), orientado, com
pressão arterial de 100/60 mmHg, taquipneico (42 rpm),
taquicárdico (130 bpm) e saturação periférica de O2 de
78% em ar ambiente. Presença de lesões ulceradas com
crosta em asa nasal esquerda, lábio superior esquerdo,
pavilhão auditivo esquerdo e supercílio direito e lesão
ulcerada em palato mole recoberta por secreção
purulenta. Expansibilidade torácica reduzida globalmente,
murmúrio vesicular presente em todo o tórax, porém
diminuído em ápices e crepitações finas difusas
bilateralmente. Restante do exame sem alterações.
Ricardo de Souza Cavalcante
Av. Prof. Mário Rubens Guimarães Montenegro,
s/n, Bairro: UNESP -Campus de Botucatu,
CEP:18618687 - Botucatu, SP.
Telefone: +55 14 38801291
Email: [email protected]
18
A gasometria arterial em ar ambiente revelava alcalose
respiratória (pH=7,47 e pressão parcial de CO2=31,5
mmHg) e hipoxemia (pressão parcial de O2=56,8 mmHg).
O hemograma apresentava anemia microcítica e
hipocrômica (hemoglobina de 8,0 g/dL, hematócrito de
30,5%, volume corpuscular médio de 77,2 µmm³,
hemoglobina corpuscular média de 20,4 pg), plaquetas
normais (431000/mm 3) e leucocitose com neutrofilia
(23660 leucócitos com 19800 neutrófilos). Proteína C
reativa (34,2 mg/dL) e velocidade de hemossedimentação
(120 mm/h) apresentavam-se elevadas. Função renal e
enzimas hepáticas normais. A radiografia simples de tórax
revelava infiltrado intersticial difuso (Figura 1) e na
tomografia de tórax cavernas, nódulos centrolobulares
com padrão de árvore em brotamento e áreas com
opacidades em vidro fosco (Figura 2).
Fig. 1. Radiografia simples de tórax póstero-anterior e perfil: presença de
infiltrado intersticial difuso, mais proeminente em terço médio à direita.
Foi iniciado suporte ventilatório com concentração de
oxigênio de 50% em máscara de Venturi e introduzido
terapia antibiótica com amoxicilina + clavulanato e
azitromicina intravenoso.
Realizado coleta de baciloscopia de escarro que
revelou 10 a 99 bacilos álcool ácido resistentes por 100
campos de imersão. A cultura de escarro colhida na
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Fig. 2. Tomografia de tórax: presença de cavernas em ápices e uma
caverna em lobo inferior do pulmão esquerdo, algumas com nível hidroaéreo,
nódulos centrolobulares com padrão de árvore em brotamento, algumas
áreas com opacidades em vidro fosco.
admissão identificou complexo Mycobaterium tuberculosis.
O exame micológico direto de escarro revelou presença
de células fúngicas típicas de Paracoccidioides spp, assim
como o exame citopatológico do escarro que encontrou
leveduras não associadas a hifas sugestivas de
Paracoccidioides spp pela coloração de Gomori Grocotti.
Também foi realizada biópsia da lesão em asa nasal cujo
exame histopatológico foi conclusivo para
paracoccidioidomicose. A pesquisa de anticorpos anti-P.
brasiliensis realizada pelo teste de imunodifusão dupla
em gel de ágar revelou o título de 1:4. A despeito destes
diagnósticos foi mantido terapia antibiótica com
amoxicilina-clavulanato e azitromicina pela possibilidade de pneumonia bacteriana secundária. Diante da coinfecção foram introduzidas a associação sulfametoxazoltrimetroprim 1200 mg/240 mg, por via oral, a cada 12 horas
além de rifampicina (R) 600 mg – isoniazida (H) 300 mg –
pirazinamida (Z) 1600 mg – etambutol (E) 1100 mg ao dia.
O paciente evoluiu com melhora clínica significativa e
30 dias após sua admissão foi transferido para um serviço
de atendimento à dependência química. Permanece em
seguimento ambulatorial com a Infectologia.
Discussão
A paracoccidioidomicose (PCM) é micose sistêmica
causada por fungos termo-dimórficos do complexo
Paracoccidioides brasilienesis e Paracoccidioides lutzii1. Sua
porta de entrada são os pulmões, pela inalação de
artroconídeos, estruturas presentes em sua forma
micelial. Ao alcançarem os alvéolos pulmonares
transformam-se em leveduras causando áreas de
pneumonite. Por via linfática, o fungo dissemina-se para
linfonodos paratraqueais e parabrônquicos ocasionando
uma reação granulomatosa. Uma resposta imune do tipo
celular com produção de interleucina (IL) 12, interferon
gama (IFNγ) e IL-2 em níveis adequados garante o controle
da infecção, podendo permanecer focos latentes do fungo.
Alguns indivíduos, após longo período, reativam estes
focos evoluindo para a forma crônica da PCM. No entanto,
diante de uma resposta insatisfatória logo após a
infecção, com produção de IL-10, IL-4 e IL-5 há evolução
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
para a forma aguda/subaguda da PCM2.
A PCM é endêmica na América Latina, do México à
Argentina. Aproximadamente 80% dos casos estão no
Brasil, com maior ocorrência nos estados de São Paulo,
Paraná, Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas
Gerais, Rio Grande do Sul e Rondônia3. Por não ser uma
doença de notificação compulsória, não se sabe qual a
real incidência da PCM no Brasil, mas estima-se um valor
entre 0,71 a 2,70/100.000 habitantes/ano 4. Acomete
principalmente indivíduos que tenham contato prévio ou
atual com o solo, principalmente os trabalhadores rurais.
É notório a maior incidência em homens do que mulheres,
principalmente após a puberdade, devido ao efeito
protetor do estrógeno e a maior pressão epidemiológica,
pois há mais trabalhadores rurais do sexo masculino.
Há três principais formas clínicas na PCM. A forma
aguda/subaguda corresponde de 5 a 25% dos casos, em
geral, incide sobre crianças, adolescentes e adultos jovens,
com importante comprometimento de órgãos ricos no
sistema fagocítico-mononuclear como linfonodos, fígado,
baço e medula óssea, sendo raro lesões pulmonares. A
duração da sintomatologia é de poucas semanas e observase elevada frequência de sintomas constitucionais como
febre, emagrecimento, indisposição e anorexia. A maior
parte dos casos de PCM apresentam-se sob a forma
crônica que corresponde 75 a 95% dos casos, com maior
incidência em indivíduos com idade entre 30 e 60 anos.
Os pulmões são o principal órgão comprometido, com
presença de tosse, expectoração e dispneia. Lesões de
mucosa de vias aero-digestivas superiores e pele são
também muito frequentes. Outros órgãos como laringe,
traqueia e adrenais são encontradas com relativa
frequência. Os sintomas se instalam insidiosamente, com
duração de vários meses. Entre os sintomas
constitucionais, destaca-se o emagrecimento, a
indisposição e a anorexia. Ambas as formas clínicas
podem evoluir para a forma residual ou sequela. A mais
comum das sequelas é a fibrose pulmonar, com evolução
para insuficiência respiratória crônica.
O diagnóstico confirmatório da PCM pode ser obtido
pela identificação do fungo em espécimes clínicos tais
como o escarro, raspado de lesões mucocutâneas,
secreção de linfonodos, tecidos ou lavado broncoalveolar 5. O exame micológico direto permite a
visualização de estruturas típicas do gênero
Paracoccidioides, assim como o exame cito e
histopatológico com a utilização de colorações de
hematoxilina-eosina e Gomori-Grocott. A cultura é pouco
utilizada na prática clínica devido sua baixa sensibilidade
e demora no tempo de crescimento. A sorologia pode
auxiliar no diagnóstico, mas não é confirmatória. O
método mais utilizado é a reação de imunodifusão dupla
em gel de ágar que detecta anticorpos específicos anti-P.
brasiliensis. Esta técnica tem sensibilidade de 90%, sendo
um importante recurso para diagnóstico e avaliação de
19
resposta terapêutica para os pacientes com doença
causada pelo complexo P. brasiliensis6. No entanto, este
método tem baixa sensibilidade na doença causada pelo
P. lutzii, sendo necessário a descoberta de novos antígenos
para melhorar o rendimento do teste7.
Diversas drogas já foram estudadas no tratamento da
PCM. Na atualidade, o itraconazol (ITC) é considerado o
medicamento de escolha para o tratamento da maior parte
dos casos, pois apresenta cura clínica e sorológica mais
precoces quando comparado com a associação
sulfametoxazol-trimetoprim (SMX-TMP) 8, 9. No entanto,
casos graves que necessitem de terapia intravenosa o uso
de anfotericina B ou do SMX-TMP são mais indicados, visto
a ausência de formulação parenteral do ITC no Brasil. O
SMX-TMP também são indicados nos casos de lesão do
trato gastrointestinal pela PCM, devido a absorção errática
do ITC e em pacientes com lesão de sistema nervoso central
devido à baixa penetração do ITC pela barreira hematoencefálica. Nesta última condição, a anfotericina B e o
fluconazol também são possibilidades terapêuticas.
O caso clínico descrito neste artigo traz uma situação
especial, a co-infecção PCM e tuberculose (TB). A resposta
imune inadequada presente nos indivíduos com PCM é
específica para os antígenos do fungo, mas não para outras
infecções10. Eventualmente pode haver uma deficiência de
imunidade celular mais ampla que também envolva uma
incapacidade de resposta a outros agentes como o
complexo M. tuberculosis. Além disso, soma-se o fato de
que as exposições epidemiológicas podem se sobrepor.
No passado, havia uma grande população vivendo em área
rural com elevada exposição ao Paracoccidioides spp, mas
pouca ao complexo M. tuberculsosis. Com o êxodo para as
cidades, boa parte desta população foi viver nas periferias,
muitas delas em condições de aglomeração elevando o
risco para aquisição da tuberculose, mas mantendo o da
PCM, pois permaneceram como trabalhadores rurais.
Um levantamento de 1000 casos de PCM atendidos em
Ribeirão Preto – SP encontrou 8,3% de co-infecção PCMTB11. Semelhante resultado foi encontrado no Mato Grosso
do Sul, com 5,5% de associação em 422 casos de PCM12.
Nenhum destes autores especificam se o diagnóstico foi
simultâneo ou se uma das infecções ocorreu primeiro.
Esta prevalência demonstra que a co-infecção é um
problema presente.
Um estudo realizado em Campinas – SP, aponta para o
problema que envolve a co-infecção. Dos 227 casos de
PCM avaliados, 36 (15,8%) tinham diagnóstico de
tuberculose, porém a confirmação com baciloscopia ou
cultura estava presente em apenas 18 deles (7,9%)13. Os
outros 18 casos tiveram o diagnóstico presuntivo de TB,
receberam tratamento específico, porém sem resposta
clínica. Tal fato levou a nova investigação que diagnosticou
PCM nestes casos, havendo resposta clínica com o
tratamento antifúngico. Isto demonstra que o erro
diagnóstico ainda é frequente atrasando a introdução do
20
tratamento para PCM. Isto pode acarretar consequências
desastrosas ao paciente, pois aumenta as possibilidade
de sequelas pulmonares. A fibrose é uma sequela precoce
na PCM e aumenta progressivamente com o tempo de
doença 14, 15, podendo ocasionar importantes limitações
ao indivíduo pela insuficiência respiratória crônica.
Algumas características destas infecções permitem sua
suspeição diagnóstica. O achado epidemiológico de
contato com o solo ou zona rural são indicativos da PCM
para pacientes oriundos de áreas endêmicas, enquanto
que na TB a presença de fatores que reduzem a imunidade
celular como o HIV/aids, terapia imunossupressora,
neoplasias, desnutrição, drogadição, gestação e extremos
de idade compreendem importantes condições para o
adoecimento, além de encarceramento e moradores de rua.
Clinicamente a febre é mais frequente na TB do que na forma
crônica da PCM. Quanto aos sintomas respiratórios, o que
difere significativamente é a hemoptise, muito mais
incidente na tuberculose. A presença de lesões em outros
órgãos como pele, mucosas são mais observadas na PCM.
Radiologicamente, a PCM caracteriza-se por lesões
intersticiais que comprometem bilateralmente os pulmões,
raramente atingindo os ápices, enquanto que a TB, em geral,
as lesões são apicais, e mais frequentemente cavitadas.
O caso descrito traz alguns ensinamentos importantes
na prática clínica. Ser morador de rua e dependente de
álcool e drogas ilícitas é uma epidemiologia comum nos
casos de TB. As manifestações pulmonares e os achados
de imagem também fortalecem este diagnóstico, que foi
confirmado por baciloscopia e cultura de escarro. Pela
forte evidência da TB, muitos médicos esquecem de realizar
investigação para PCM. Entretanto, existem duas
evidências que apontam para esta possibilidade e que
devem ser ressaltadas. A primeira é de ordem
epidemiológica. O paciente procede de área endêmica da
PCM e já teve contato prévio com área rural. Além disso,
para a forma crônica da PCM este paciente tem idade e
sexo compatíveis. A segunda refere-se às manifestações
clínicas. A presença de lesões cutâneas e mucosas são
mais típicas dos casos de PCM, sendo um importante
indicativo desta patologia. Estas evidências foram
consideradas para se investigar PCM neste paciente, que
teve o diagnóstico confirmado pela análise do escarro
(exame micológico direto e citopatológico) e
histopatológico de lesão cutânea.
Outro importante ponto a se considerar neste caso
refere-se ao tratamento. O ITC é a droga de escolha para
tratamento da PCM. No entanto, a rifampicina, por agir no
sistema enzimático citocromo P450, acelera a
metabolização do ITC, reduzindo drasticamente os níveis
séricos deste fármaco16. Em geral, recomenda-se evitar o
uso concomitante destas duas drogas. Por isso, neste caso
apresentado optou-se pelo uso da associação SMX-TMP
para tratamento da PCM.
Apesar da frequência baixa, a co-infecção PCM-TB é um
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
problema em nosso meio devido à falta de suspeição
diagnóstica nestes casos, o que acarreta atraso no
tratamento e consequentemente maior sequela pulmonar.
Uma avaliação epidemiológica e clínica minuciosa
permitem ao médico identificar evidências que sugiram o
diagnóstico da co-infecção.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
21
Dispneia progressiva em paciente jovem
Progressive dyspnea in young patient
Felipe Marques da Costa1, Caio Julio Cesar dos Santos Fernandes2, Rogério de Souza3
1,2,3
Unidade de Circulação Pulmonar, Disciplina de Pneumologia, Instituto do Coração, Hospital das
Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil
Caso clínico
Paciente do sexo feminino, 38 anos, procurou
atendimento com queixa de dispneia progressiva há
dois anos, com piora nos últimos 20 dias, atualmente
aos mínimos esforços, além de episódios de síncope.
Antecedentes pessoais: portadora de hipertensão
arterial sistêmica controlada em uso de captopril. Nega
casos semelhantes na família, sem contato com regiões
endêmicas para esquistossomose. Nega roncos ou
sonolência diurna e sem histórico de uso de
anorexígenos, nega tabagismo.
Ao exame, eupneica em repouso, porém taquicárdica
(110 BPM). Turgência jugular, ausculta cardíaca com
sopro sistólico em foco tricúspide, além de hiperfonese
de 2ª bulha. Hepatomegalia à palpação abdominal, sem
outras alterações.
Foi submetida a exames gerais, com hemograma,
função renal e eletrólitos que resultaram normais. A
radiografia de tórax em incidência ântero-posterior (AP)
mostrou aumento do índice cardiotorácico, abaulamento
do arco da artéria pulmonar e sem alterações
parenquimatosas (figura 1). Realizou ecocardiograma
transtorácico que demonstrou importante aumento de
câmaras direitas, hipocinesia de ventrículo direito,
pressão sistólica da artéria pulmonar estimada em 94
mmHg, sem alterações em câmaras esquerdas. Prova
de função pulmonar normal. Cintilografia de inalação
e perfusão com baixa probabilidade de
tromboembolismo pulmonar. Optado por realização
do cateterismo cardíaco direito, sendo observados os
seguintes parâmetros: pressão do átrio direito = 12
mmHg, pressão média na artéria pulmonar (PMAP) = 58
mmHg, pressão de oclusão = 11 mmHg, débito cardíaco
3,1 l/min, resistência vascular pulmonar 15,1 woods,
evidenciando um padrão pré-capilar, compatível com
hipertensão pulmonar arterial (HAP).
Na investigação da etiologia da HAP, foram solicitados:
auto-anticorpos, ultrassom de abdome total e sorologias
para hepatite viral e HIV, que resultou positiva para este
último. Contagem de linfócitos CD4 = 507 células/mm³ e carga
viral 9701 cópias/mL, sendo optado pela introdução de
22
Fig. 1. Radiografia de tórax em PA
esquema antirretroviral (lamivudina, zidovudina e efavirez)
associado a tratamento específico para HAP sildenafil.
No seguimento ambulatorial, paciente evoluiu com
melhora de classe funcional, queda no BNP de 667 pg/mL
para 250 pg/mL e aumento da distância percorrida no
teste de caminhada de 6 minutos de 220 m para 415 m.
Discussão
Hipertensão pulmonar (HP) vem se tornando um
problema de saúde cada vez mais comum, acometendo
cerca de 1% da população mundial1. O envelhecimento em
países desenvolvidos representa um importante fator deste
processo, assim como as doenças infecciosas em regiões
menos desenvolvidas.
HP é definida como um aumento da PMAP ≥ 25 mmHg
no cateterismo cardíaco direito em repouso 1. Sua
classificação leva em consideração aspectos clínicos,
patológicos e terapêuticos, sendo dividida em cinco grupos
(figura 2): hipertensão arterial pulmonar (grupo I), que
engloba várias etiologias, dentre estas a relacionada ao
vírus da imunodeficiência humana (HIV); secundária a
doenças cardíacas de câmaras esquerdas (grupo II);
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Fig. 2: Classificação de hipertensão pulmonar (adaptado NICE 2013)
doenças pulmonares ou hipoxêmicas (grupo III),
relacionada à doença tromboembólica crônica (grupo IV)
e, por último, aquele que reúne doença com mecanismos
multifatoriais ou não esclarecidos (grupo V)2.
O diagnóstico de HP requer elevado grau de suspeição
clínica, pois, em sua maioria, os sintomas são
inespecíficos. Dispneia ao exercício costuma apresentarse precocemente. Um fluxograma diagnóstico é mostrado
na figura 3.
Como observado no caso, durante a investigação não
foram encontrados indícios de cardiopatia de câmeras
esquerdas, pneumopatia ou tromboembolismo pulmonar,
tornando-se necessária a realização de cateterismo
cardíaco direito. Os parâmetros hemodinâmicos
encontrados foram compatíveis com hipertensão arterial
pulmonar (HAP), sendo secundária à infecção pelo HIV, já
que outras causas foram afastadas.
No mundo, cerca de 34 milhões de pessoas estão
infectadas pelo HIV. A HAP associada ao vírus é uma
entidade rara, acometendo cerca de 0,5% desses pacientes.
Apesar disso, o risco é aproximadamente 2500 vezes maior
quando comparado a população saudável.3-5
A patogênese da HAP é complexa, envolvendo a interação
de genes moduladores com fatores ambientais. A lesão
Fig. 3: Fluxograma de investigação em paciente com suspeita de hipertensão pulmonar
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
23
endotelial é secundária a ação de proteínas virais,
ativação da cascata inflamatória e fatores próprios do
hospedeiro, culminando com remodelamento vascular,
vasoconstrição e trombose local6-15.
O uso de terapia antirretroviral altamente ativa
(HAART), apesar da escassez de grandes estudos
prospectivos, pode associar-se a redução da PMAP quando
instituído em pacientes com classe funcional I e II, tornando
o diagnóstico precoce fundamental 16. Outro estudo
demonstrou redução na mortalidade 17. Apesar disso,
estudos pós era HAART não revelaram redução consistente
na prevalência de HAP18.
Na ausência de recomendações específicas, o
tratamento de HAP secundária ao HIV deve seguir as
mesmas orientações para as demais etiologias do grupo
I. O uso de anticoagulantes ou bloqueador de canal de
cálcio não é recomendado, excesso em situações especiais.
Com relação ao tratamento específico, alguns estudos
com prostanóides, antagonistas de receptor de endotelina
e inibidores de fosfodiesterase apresentaram resultados
favoráveis, porém são baseados em ensaios clínicos não
randomizados e com poucos pacientes19-26.
O prognóstico do paciente com HAP relacionada ao HIV
sem tratamento adequado pode ser tão ruim quanto 50%
de mortalidade em 8 meses de sequimento27, porém, em
séries após introdução do esquema HAART e terapia
específica para HAP, a sobrevida tem melhorado
consideravelmente, chegando a 72% em 3 anos28.
Embora sejam necessários mais estudos para melhor
compreensão dos mecanismos fisiopatológicos da HAP
associada ao HIV, a evidência atual recomenda a
estratégia de tratamento simultâneo do HIV, com uso
continuado de antiretrovirais, associado ao tratamento
específico da HAP, reforçando a importância da abordagem
diagnóstica abrangente em todos os pacientes com
suspeita de hipertensão pulmonar.
6.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
25
Uma pneumonia incomum?
Uncommon pneumonia?
Celso Madeira Padovesi
Médico Pneumologista pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
Médico Assistente do Ambulatório de Tisiologia do Hospital Santa Marcelina
Caso clínico
Paciente do sexo masculino, 82 anos, procurou pronto
atendimento devido quadro de tosse produtiva e febre
diária de 38ºC há 1 semana, sem sintomas de vias aéreas
superiores associados. Antecedentes pessoais: portador
de diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica,
insuficiência cardíaca e revascularização miocárdica
prévia. Foi submetido a exames gerais, com hemograma,
função renal e eletrólitos normais. A radiografia de tórax
(figura 1) mostrou consolidação em lobo superior direito
(LSD), e a tomografia computadorizada (TC) do tórax (figura
2) confirmou consolidação do parênquima pulmonar do
LSD, além de mostrar opacidades nodulares e
micronodulares em lobo médio (LM) e lobo inferior direito
(LID), formando em alguns locais agrupamentos com
padrão de árvore em brotamento. Feita hipótese
diagnóstica de pneumonia adquirida na comunidade, e
foi prescrito levofloxacina 500 mg/dia durante 10 dias.
Paciente evoluiu com melhora significativa dos sintomas,
e após um mês passou em consulta com pneumologista
com uma nova TC do tórax. Nesta ocasião, paciente relatou
melhora significativa dos sintomas, restando apenas tosse
seca, e estava 2kg abaixo do seu peso habitual. Negou
febre e sudorese noturna nesta ocasião. A nova TC do tórax
(figura 3) evidenciou melhora significativa das alterações,
com redução importante da consolidação, porém com
persistência de alguns nódulos e micronódulos com
padrão de árvore em brotamento. Apesar da melhora
significativa do quadro clínico e dos achados
tomográficos, a persistência dos micronódulos com
padrão de árvore em brotamento em paciente idoso e
diabético levou a equipe de pneumologia a solicitar exame
de escarro com pesquisa e cultura para BAAR. A
baciloscopia do escarro resultou negativa. Foi solicitada
Celso Madeira Padovesi
Endereço comercial: Rua Barata Ribeiro, 414,
Cj 62 - CEP 01308-000 - Bela Vista, São Paulo - SP
Telefone: (11) 3151-6500
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26
Fig. 1. Radiografia de tórax nas incidências póstero-anterior (A) e perfil (B)
mostrando padrão de consolidação em lobo superior direito.
Fig. 2. Tomografia computadorizada do tórax evidenciando consolidação
em lobo superior direito (A), associado a micronódulos centrolobulares com
padrão de árvore em brotamento em lobos médio e inferior direito (B).
Fig. 3. Tomografia computadorizada do tórax mostrando redução da
consolidação (A) e dos micronódulos (B).
uma broncoscopia com lavado broncoalveolar (LBA) e
biópsia transbrônquica. A baciloscopia do LBA também
resultou negativa, mas a PCR (polymerase chain reaction,
ou reação em cadeia da polimerase) para Mycobacterium
tuberculosis (MTB) resultou positiva. Neste momento, a
equipe de pneumologia realizou diagnóstico de
tuberculose (TB) pulmonar com apresentação na forma de
pneumonia tuberculosa, e iniciou o tratamento com
esquema básico, composto por rifampicina, isoniazida,
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
pirazinamida e etambutol. Posteriormente, surgiram
outras duas evidências a favor do diagnóstico: a cultura
do escarro coletado na avaliação inicial isolou MTB, e o
anatomopatológico da biópsia transbrônquica evidenciou
processo granulomatoso crônico com necrose caseosa. O
tratamento foi mantido por nove meses, e o paciente
evoluiu com melhora clínica e radiológica total (figura 4).
Fig. 4. Radiografia de tórax na incidência póstero-anterior revelando melhora
radiológica significativa.
Discussão
A pneumonia tuberculosa é uma forma rara de
apresentação da TB pulmonar, com prevalência estimada
em 2 a 7% dos casos 1,2 . A infecção primária pelo
Mycobacterium tuberculosis (MTB) na infância pode se
manifestar com padrão pneumônico, com acometimento
predominante nos lobos médio e inferiores dos pulmões3.
Já a pneumonia tuberculosa do adulto não tem local
preferencial de acometimento, e até o momento não se
sabe ao certo se essa forma de apresentação da TB se
deve a infecção primária, reativação de infecção latente
ou reinfecção4.
A fisiopatologia também não está bem estabelecida,
mas o mecanismo proposto mais aceito é o da formação
de uma fístula a partir de um linfonodo mediastinal para
o interior da luz brônquica, inundando a via aérea com
material caseoso contendo grande número de bacilos. Por
sua vez, esse material caseoso leva a uma reação
inflamatória aguda, e consequentemente consolidação
alveolar. Diversos estudos com broncoscopia em
pacientes com pneumonia tuberculosa evidenciaram
lesões nas vias aéreas compatíveis com fístulas de
linfonodos adjacentes, o que fortalece essa teoria5.
A pneumonia tuberculosa é um pouco mais comum em
idosos e em pacientes com alguma imunossupressão,
como portadores de SIDA, diabetes mellitus e câncer, mas
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
pode também ocorrer em indivíduos sem qualquer fator
de risco. As manifestações clínicas diferem da TB
pulmonar pós-primária clássica. O quadro costuma ser
agudo ou subagudo, com predomínio de tosse produtiva e
febre, sendo menos frequentes manifestações como perda
ponderal e sudorese noturna. Por esse motivo, muitas vezes
é confundida com pneumonia bacteriana1,4.
O diagnóstico da pneumonia tuberculosa é feito de
modo semelhante à forma pulmonar clássica, ou seja, pela
associação do quadro clínico com evidências
microbiológicas e achados radiológicos4. A sensibilidade
da baciloscopia no escarro é semelhante ao descrito para
a TB pulmonar clássica, ou seja, 60 a 80%1,4,6. Há um fato
importante a ser ressaltado no caso apresentado: o uso
de levofloxacina pelo paciente durante 10 dias. Sabe-se
que as fluoroquinolonas possuem uma boa ação
bactericida contra o MTB, atingindo inclusive as
micobactérias intracelulares7. Atualmente, a ofloxacina e
a levofloxacina são drogas de segunda linha no tratamento
da TB, usadas em esquemas alternativos e em casos de
resistência às drogas de primeira linha6. Assim, acreditase que o uso de antibióticos da classe das
fluoroquinolonas possa reduzir a carga bacilar, levar à
melhora clínica e radiológica (ao menos parcialmente) e,
em última análise, retardar o diagnóstico, como ocorreu
no caso relatado.
De acordo com as diretrizes mais recentes para o
tratamento da tuberculose, quando há um quadro clínicoradiológico compatível com TB, num cenário de alta
prevalência, pode-se iniciar o tratamento, mesmo sem
confirmação microbiológica 6,8 . Porém, em casos
duvidosos, pode-se utilizar exames mais invasivos, como
a broncoscopia com lavado broncoalveolar (LBA) e biópsia
transbrônquica9. No caso relatado, a baciloscopia do LBA
também resultou negativa. Porém, a PCR para o MTB
resultou positiva, fato que foi decisivo para se iniciar o
tratamento do paciente em questão. Hoje em dia há
diversos métodos moleculares para o diagnóstico da
tuberculose, com sensibilidade de 80 a 97%9,10,11. Porém é
importante ressaltar que, para os pacientes que já tiveram
tuberculose pulmonar, um resultado de PCR positivo pode
não significar necessariamente doença ativa, uma vez que
o material genético do MTB pode persistir no tecido
pulmonar por tempo indefinido6.
Após iniciado o tratamento do paciente, a cultura do
escarro coletado no início da investigação resultou
positiva. A cultura do escarro é reconhecidamente método
de elevada sensibilidade e especificidade para o
diagnóstico de TB pulmonar, aumentando em até 30% o
diagnóstico microbiológico dos casos com baciloscopia
negativa6. Porém, um estudo com pequena amostra sugeriu
uma tendência à menor sensibilidade da cultura de
escarro em pacientes com pneumonia tuberculosa, em
comparação à forma pulmonar clássica4.
Os achados radiológicos da pneumonia tuberculosa
27
são marcadamente distintos da forma pulmonar clássica.
A forma pneumônica se caracteriza pela consolidação
lobar ou segmentar, sem local preferencial de
acometimento, enquanto na forma clássica há predomínio
de nódulos, micronódulos e cavidades, e os segmentos
superiores e posteriores são os mais acometidos. A
ocorrência de cavidades na forma pneumônica é incomum.
Outros achados radiológicos como linfadenomegalia
mediastinal, árvores em brotamento, sinais de
disseminação broncogênica e cicatriz de TB prévia podem
ser encontrados em ambas as formas de TB pulmonar4.
O tratamento da pneumonia tuberculosa em nada difere
da forma pulmonar clássica, sendo utilizadas, no nosso
meio, as quatro drogas que compõem o esquema básico:
rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol6. Devido
à imunossupressão relacionada ao diabetes mellitus,
alguns autores sugerem estender o tratamento da TB
pulmonar em pacientes diabéticos para nove meses,
especialmente naqueles com mau controle glicêmico8. Por
esse motivo, o paciente do caso relatado teve seu
tratamento estendido para nove meses.
Em resumo, a pneumonia tuberculosa pode se
apresentar como um verdadeiro desafio diagnóstico, uma
vez que seu quadro clínico-radiológico é muito semelhante
ao de uma pneumonia bacteriana comum. Deve-se atentar
para a possibilidade de uma pneumonia tuberculosa
quando não ocorre melhora clínica e radiológica completa
no prazo esperado para uma pneumonia comum após
antibioticoterapia adequada, especialmente na presença
de alguma condição imunossupressora. Como qualquer
forma de apresentação da TB pulmonar, o atraso no
diagnóstico e no tratamento pode levar a graves
consequências para o paciente, bem como à contaminação
de outras pessoas. No caso apresentado, um dos fatores
que contribuíram para o atraso no diagnóstico e
tratamento foi o uso da levofloxacina, que proporcionou
uma melhora clínica e radiológica parcial, e ainda,
provavelmente, levou a uma significativa redução da carga
bacilar no escarro, dificultando o diagnóstico
microbiológico. Esse caso ilustra como é importante
realizar exames mais invasivos, como a broncoscopia com
LBA e biópsia transbrônquica, quando se suspeita de TB
pulmonar, especialmente nas apresentações clínicoradiológicas incomuns.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Agenesia pulmonar unilateral direita, dextrocardia
e pneumotórax: uma rara associação
Right unilateral pulmonary agenesis, dextrocardia and
pneumothorax: a rare association
Guilherme Eler de Almeida1, Leonardo Peixoto Domingos2, Hozanna Holanda Brasil3
1
Médico Pneumologista do Hospital Regional de Cacoal - RO
2
Médico Radiologista do Hospital Regional de Cacoal
3
Médica Residente de Clínica Médica do Hospital Regional de Cacoal - RO
Introdução
A agenesia pulmonar é uma condição rara,
caracterizada pela ausência completa do parênquima
pulmonar, brônquios e vasos pulmonares, cujo
prognóstico depende da presença de malformações
associadas 1,2,3,4. A apresentação clinica é variável e o
diagnóstico é frequentemente feito na infância após infecções
pulmonares repetidas, hemoptise, insuficiência
cardiorrespiratória ou como parte de uma síndrome, com
maior taxa de mortalidade nesses casos1,2,5. Alguns pacientes
chegam a idade adulta sem o diagnóstico instituído, tomando
conhecimento de tal malformação após desenvolverem
sintomas. Descrevemos um caso de um paciente adulto jovem
com agenesia pulmonar direita associada à dextrocardia,
assintomático até então, tendo apresentado um extenso
pneumotórax espontâneo, com insuficiência respiratória
aguda e parada cardiorrespiratória.
Fig.1. Paciente intubado, com pneumotórax extenso, não drenado, associado
a ausência de parênquima e vasculatura pulmonares à direita e dextrocardia.
Foi prontamente submetido à drenagem torácica
bilateral (drenos de 28Fr) e encaminhado à UTI (Figura 2).
Convocados familiares, que referiram que o paciente
recebeu o diagnóstico de agenesia pulmonar direita e
dextrocardia aos quatro anos de idade, estando
assintomático até então, com leve dispneia apenas quando
dos episódios de infecções de vias aéreas superiores, que
eram infrequentes e rapidamente auto-limitados, não
estando em seguimento pneumológico ou clínico.
Relato de Caso
Homem, 21 anos, referindo dispneia de início súbito há
cerca de oito horas da admissão, associada à dor torácica
pleurítica bilateral lancinante, com predomínio à
esquerda, além de tosse seca. Negava febre, sibilância ou
hemoptise. Apresentou parada cardiorrespiratória na
chegada ao pronto socorro, em AESP, sendo revertida após
um ciclo de reanimação cardiopulmonar conforme
protocolo preconizado pelo ACLS.
Após intubação e adaptação à ventilação mecânica,
apresentava murmúrio vesicular reduzido globalmente,
com creptos esparsos. Realizada tomografia
computadorizada de tórax que mostrou extenso
pneumotórax, ausência de parênquima e vasculatura
pulmonares à direita, além de dextrocardia (Figura 1).
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Fig.2. Paciente intubado, com pneumotórax drenado, associado a ausência
de parênquima e vasculatura pulmonares à direita, dextrocardia e enfisema
subcutâneo.
Permaneceu intubado por cerca de 48 horas, sendo
extubado e após observação por 48 horas adicionais, foi
encaminhado à enfermaria, ainda drenado. Apresentou
escape aéreo por cinco dias, sem terapêutica específica,
com resolução espontânea. Os drenos de tórax foram
sacados após mais sete dias, com confirmação de completa
reexpansão por tomografia de tórax (Figura 3).
29
com a síndrome VACTERL (Vertebral, Anal, Cardíaca,
Traqueo-Esofágica, Renal e membros/Limbs) 3,13 .
Nos casos de agenesia unilateral completa, a cavidade
pleural pode não ser encontrada no lado afetado 9.
Dentre as malformações cardiovasculares são citados
dextrocardia, persistência do ducto arterioso, forame oval
Fig.3. Drenos de tórax sacados, mostrando ausência completa de parênquima
e vasculatura pulmonares à direita, dextrocardia e espessamento pleural.
patente, defeito de septo atrial, defeito do septo
ventricular, Tetralogia de Fallot, coarctação da aorta, arco
aórtico à direita, truncus arteriosus,
Recebeu alta assintomático, com saturação de O2 de
arco aórtico
3,4
interrompido, entre outros .
97% em ar ambiente. Foi avaliado no ambulatório de
A agenesia pulmonar direita costuma ser mais severa
Cirurgia Torácica, sem conduta adicional. Após isso, recusa-
e ter maior mortalidade em relação à esquerda, devido a
se a manter acompanhamento ambulatorial.
compressão da árvore traqueobrônquica, com um excessivo
desvio da carina ipsilateral e drenagem inapropriada do
Discussão
pulmão funcionante 1,2,4,5,12 .
Assim como no paciente em questão, existem diversos
A agenesia pulmonar unilateral é uma condição rara,
caracterizada por ausência completa do parênquima
relatos
da
dextrocardia
associação
1,3,4,14,15
de
agenesia
pulmonar
e
.
pulmonar, brônquios e vasos pulmonares, que ocorre
Embora em lactentes possa estar associada a muitas
isoladamente ou acompanhada de outras anomalias 1,2,4,6.
anomalias cardíacas, a dextrocardia em adultos tem uma
A prevalência é estimada em 34 por milhão de nascidos
gama limitada de possibilidades diagnósticas, sendo esta
vivos 5,6,7 , porém a verdadeira incidência é desconhecida,
frequentemente um achado de imagem 16.
já que 50% são natimortos e mais de 20% morrem ao nascer
A hipertensão pulmonar é uma possível complicação,
ou durante os primeiros meses de vida5, sendo assim mais
sendo mais comum nesses pacientes, já que há uma
de 50% dos pacientes morrem antes dos primeiros cinco
redução do leito vascular pulmonar que, caso associada a
anos de vida 4,8. É citada leve predominância no sexo
cardiopatia congênita, pode piorar o prognóstico 2.
9
feminino .
A associação entre agenesia pulmonar e pneumotórax
A patogênese permanece especulativa, embora a
é
bastante
conhecida,
sendo
esta
uma
potencial
ruptura vascular e insultos teratogênicos tenham sido
complicação
considerados 10,
infecções
descreveu o caso de um paciente com agenesia pulmonar
intrauterinas, consanguinidade, fatores genéticos, déficit
direita com quadros recorrentes de pneumotórax. Alguns
de vitamina A, ácido fólico e uso de salicitatos foram
pacientes, no entanto, podem ter o diagnóstico de
citados 1,2,5 . Dentre as etiologias genéticas, sugere-se a
agenesia a partir de um pneumotórax espontâneo, como
duplicação da porção distal do braço superior do
descrito por Abdessalem 5 .
também
causas
virais,
6
cromossomo 02 .
O
nos
paciente
casos
aqui
já
diagnosticados.
apresentado
Bryon 17
permaneceu
Diferentes autores 1,2,3,4,5,7 citaram a classificação de
assintomático por toda sua vida, manifestando primeiro
malformação segundo Schneider publicada em 1912,
evento grave com o pneumotórax. Existem vários relatos
posteriormente modificada por Boyden 11: tipo I (agenesia):
na literatura de agenesia pulmonar com pneumotórax ou
ausência completa de parênquima, brônquios e vasos
dextrocardia, porém, na bibliografia pesquisada não
sanguíneos para o lado afetado; tipo II (aplasia):
foram encontrados relatos da associação dos três eventos,
existência de um brônquio rudimentar com ausência total
sendo este o primeiro caso descrito.
de tecido pulmonar e tipo III (hipoplasia): presença de
Considerando a frequência de pneumotórax nos casos
quantidade variável de parênquima pulmonar, árvore
de agenesia pulmonar, é importante considerar esse
brônquica e vasculatura de suporte. O paciente citado,
diagnóstico sempre que esses pacientes apresentarem
classifica-se como do tipo I.
sintomatologia respiratória súbita.
A agenesia do pulmão esquerdo é a mais frequente 12 e
usualmente
se
manifesta
sem
outras
anomalias,
Referências Bibliográficas
enquanto a agenesia do pulmão direito é comumente
associada
com
malformações
cardíacas
(14%),
gastrointestinais (14%), esqueléticas (12%), vasculares (9%)
e genitourinárias (9%) 1,3 . Descreve-se também associação
30
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31
Síndrome Fibrose/Enfisema Pulmonar
associada à Hepatopatia
Fibrosis / emphysema pulmonary syndrome associated with
liver disease
Fernanda Mayumi Nomura1; Ester Nei Aparecida Martins Coletta2; Mariana Silva Lima3; Silvia Carla
Sousa Rodrigues3
1
Aluna do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Iamspe
2
Patologista do Iamspe; 3Assistentes do ambulatório de DPI do Iamspe
Caso Clínico
Paciente do sexo masculino, branco, 71 anos,
apresentou-se em nossa instituição com história de
dispneia aos esforços e tosse seca havia dois anos.
Negava sintomas gastrintestinais e lesões de pele. Referia
exposição passiva a fumaça de cigarro por 30 anos e a
canários por 4 anos, estando afastado havia 5 anos;
etilismo social. Portador de diabetes tipo II e glaucoma,
usava metformina e colírio de timolol. No exame físico,
foram observados hipocratismo digital e estertores finos
na ausculta pulmonar. Tomografia de alta resolução (TCAR)
do tórax mostrava sinais de fibrose pulmonar associada
à enfisema (Figura 1), e achados sugestivos de hepatopatia
crônica nos cortes do abdome superior.
A prova de função pulmonar foi compatível com
distúrbio ventilatório combinado de grau leve, porém com
redução acentuada da difusão pulmonar para o monóxido
de carbono (Tabela). Os exames de hemograma, bioquímica
básica, sorologia para doenças do tecido conjuntivo e
Fig. 1. Tomografia de alta resolução do tórax (A,B,C e D), evidenciando
extensas opacidades reticulares e em vidro fosco (setas grossas) associadas
a enfisema centrolobular (cabeça de seta), bronquiectasias de tração e cistos
de faveolamento nas regiões periféricas (setas finas) com nítido gradiente
ápico-basal.
32
Tabela - Prova de função pulmonar
Parâmetros
Valores absolutos
CVF, L
2,57
VEF1, L
1,74
VEF1/CVF
0,68
CPT, L
4,01
VR, L
1,79
sGaw, cmH2O/L/s
0,14
DCO, mL/min/mmHg
7,3
% predito
75
64
75
89
32
CVF: capacidade vital forçada; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro
segundo; VEF1/CVF: relação de volume expiratório forçado no primeiro
segundo sobre a capacidade vital forçada; CPT: capacidade pulmonar total;
VR: volume residual; sGaw: condutância específica das vias aéreas; DCO:
difusão pulmonar do monóxido de carbono.
dosagem de α-1 antitripsina foram normais. Sorologias
para HIV e vírus da hepatite B e C foram negativos. A
endoscopia digestiva alta (EDA) revelou varizes de esôfago,
pangastrite enantemática moderada e bulboduodenite
erosiva moderada.
Realizado lavado broncoalveolar que mostrou achados
inespecíficos, não sendo realizada biópsia transbrônquica
por causa das extensas áreas de enfisema e o risco de
pneumotórax.
A biópsia pulmonar cirúrgica, realizada na língula,
mostrou uma pneumonia intersticial inflamatória e
fibrosante inclassificável (Figura 2). O paciente evoluiu
no pós operatório com drenagem torácica prolongada e,
mais tardiamente, após alta hospitalar, com piora
progressiva de seu estado geral, perda de peso e ascite.
Foi reinternado, nesta ocasião no serviço de
Gastroenterologia, sendo então diagnosticado com cirrose
biliar criptogênica e hepatocarcinoma. Ultrassonografia
com doppler hepático evidenciou fígado com morfologia
irregular, contornos rombos e serrilhados, dimensões
reduzidas e ecotextura hiperecoica, nodular, heterogênea;
vasos portais com calibre variável e trajetos tortuosos,
com circulação colateral e sinais de trombose porta. TC e
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Discussão
Fig. 2. A. Pneumonia intersticial fibrosante e inflamatória com desorganização
arquitetural e enfisema supleural (setas); (HE; 28X). B. Bronquíolectasias,
inflamação moderada e esclerose vascular acentuada (seta); (HE; 28X). C.
Via aérea ectasiada (bronquíoloectasia) com tecido de granulação na parede
(seta);( HE; 40X). D. Espaço enfisematoso com descamação moderada
(estrela); (HE; 40X).
RNM do abdome (Figura 3) mostraram fígado com
dimensões reduzidas, contornos lobulados e densidade
heterogênea, ausência de dilatação das vias biliares intrahepáticas; nódulos nos segmentos 5, 6 e 2, medindo 3,7cm,
3,7 cm e 4,6 cm, respectivamente, hipervascular na fase
arterial com clareamento dos segmentos 7 e 2; trombose
de provável aspecto não tumoral na veia porta; circulação
colateral exuberante e ascite. Marcadores tumorais
negativos. Nova EDA revelou varizes esofágicas de grosso
e médio calibres, sendo realizada ligadura elástica com
cinco bandas.
Fig. 3. Imagens axiais com contraste de tomografia (A) na fase portal e de
RM em T1 na fase arterial (B). Presença de nódulos heterogêneos
hipervasculares com washout na fase portal (cabeças de seta). Há ainda
hepatopatia crônica caracterizada por irregularidades da superfície hepática,
alargamento fissural e redução das dimensões do lobo direito (seta grossas)
associada a ascite (asterisco) e circulação colateral (setas finas).
O paciente teve deterioração progressiva de seu quadro
clínico, evoluindo com aumento da massa tumoral
hepática, exacerbações infecciosas pulmonares
frequentes e piora da função pulmonar. Quimioterapia
foi contraindicada por conta do seu baixo estado
performance, e o paciente foi encaminhado aos cuidados
paliativos, em uso de prednisona, formoterol/budesonida
e tiotropio, indo a óbito por insuficiência hepática.
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Descrevemos o caso de um indivíduo tabagista passivo
com quadro tomográfico e anatomopatológico
caracterizado pela combinação de fibrose pulmonar e
enfisema associado à cirrose biliar criptogênica, o que
sugere o diagnóstico da síndrome do encurtamento dos
telômeros.
Para a classificação correta das doenças pulmonares
intersticiais (DPI), é fundamental a discussão de uma
equipe multidisciplinar composta por pneumologista,
radiologista torácico e patologista, especialistas em DPI.
A biópsia pulmonar cirúrgica é o parâmetro-ouro para a
definição correta das pneumopatias intersticiais, embora
em alguns centros uma minoria de pacientes seja
submetida ao procedimento. Em algumas situações,
apesar da biópsia, os achados anatomopatológicos
podem apresentar sobreposição de padrões, como por
exemplo achados de pneumonia intersticial usual (PIU)
associados à pneumonia intersticial inespecífica (PINE),
o que dificulta a classificação correta da DPI. Em outras
situações, existe discrepância entre os achados
histopatológicos e os dados clínicos ou tomográficos,
como, por exemplo, um padrão de PIU com curso clínico
estável (evolução improvável para pacientes com FPI) ou
achados de biópsia sugestiva de uma doença do tecido
conjuntivo com autoanticorpos ausentes1.
Quando os achados histopatológicos, clínicos e
tomográficos são inespecíficos ou insuficientes para a
definição de um subtipo específico de DPI, esta é rotulada
como “DPI não classificável” (DPINC). DPINC, portanto,
representa um subgrupo heterogêneo de DPI, que pode
incluir fibrose pulmonar idiopática (FPI) e condições nãoFPI, como pneumonite de hipersensibilidade (PH) e DPI
associada às doenças do tecido conjuntivo (DTC). Um
estudo recente observou 10% de casos de DPINC numa
coorte de 1370 pacientes com pneumopatias
parenquimatosas difusas. A principal razão para um
diagnóstico impreciso da DPI foi a falta de material
anatomopatológico por contraindicação para biópsia
pulmonar cirúrgica devido a riscos de complicações.
DPINC apresenta características clínicas e prognósticas
intermediárias entre FPI e outras DPI não-FPI. O risco de
progressão ou morte na DPINC, nesse estudo,
correlacionou-se a dados clínicos e radiológicos de FPI,
principalmente diagnóstico radiológico de pneumonia
intersticial usual (PIU) ou possível PIU, presença de
faveolamento e alto escore de fibrose, além de redução na
difusão pulmonar do monóxido de carbono (DCO)2.
No caso aqui descrito, a biópsia pulmonar apresenta
achados de fibrose, lesões de vias aéreas e enfisema, sem
preencher critérios de uma DPI específica de acordo com
a diretriz da ATS/ERS3, o que a define do ponto de vista
anatomopatológico como DPINC. No entanto, clinicamente,
33
a coexistência de fibrose pulmonar, enfisema e cirrose
biliar criptogênica em nosso paciente sugere um fenômeno
etiopatogênico comum às três condições e, provavelmente,
relacionado ao encurtamento dos telômeros provocado
por mutações nos genes das telomerases.
Os telômeros são as estruturas proteicas do DNA que
atuam prevenindo a destruição do cromossoma. Eles se
encurtam com a divisão celular e com a idade avançada ou
podem ser estimulados por fatores ambientais, o que
funciona como um gatilho para a desregulação do DNA,
acelerando a senescência celular e a apoptose, um processo
que pode levar à fibrose e falência de múltiplos órgãos4. As
telomerases são um complexo de ribonucleotídeos que
sintetizam novas repetições dos telômeros garantindo a
integridade do seu comprimento5. Há dois componentes
principais: a transcriptase reversa da telomerase- e a RNAtelomerase que fornecem o molde para a replicação dos
telômeros. Mutações nesses genes causam disfunção das
telomerases e encurtamento dos telômeros 4.
Atualmente uma série de doenças são classificadas
como “telomeropatias” ou “síndromes do telômero”, e
incluem situações que cursam com falência da medula
óssea (disceratose congênita, algumas formas de anemia
aplástica adquirida e leucemia mieloide aguda), fibrose
pulmonar, hiperplasia regenerativa nodular hepática e
cirrose biliar 5,6 . Mutações nas mesmas regiões dos
mesmos genes causam diferentes doenças, mas o prejuízo
da manutenção do comprimento dos telômeros parece
estar presente em todas essas enfermidades/síndromes 5.
Na idade adulta, a FPI é considerada a forma mais
comum de apresentação das doenças do telômero. As
mutações nos genes das telomerases explicam cerca de 820% dos casos de FPI familiar e uma pequena proporção
dos casos esporádicos. Trinta e sete por cento dos casos
familiares e 25% dos casos esporádicos de FPI apresentam
telômeros 10% menores em comparação à população
geral5. As mutações nas proteínas do surfactante são outra
causa de fibrose pulmonar familiar. Um estudo recente
analisou o comprimento dos telômeros em diversas
doenças pulmonares intersticiais. Em todos os casos de
doença pulmonar intersticial, os telômeros são mais
curtos do que em controles saudáveis, mas na FPI, eles
são significativamente menores do que em outras
pneumonias intersticiais idiopáticas e na sarcoidose.7
Mais recentemente, a síndrome do encurtamento dos
telômeros também vem sendo associada à susceptibilidade
genética para o desenvolvimento de enfisema8. Relatos de
casos de famílias com mutações nos genes das telomerases
demonstraram desenvolvimento prematuro de enfisema e
enfisema combinado com fibrose, apesar de uma história
modesta de tabagismo 8, 9.
Não existem orientações estabelecidas sobre quando e
em quem realizar testes genéticos na rotina de
investigação de indivíduos com pneumopatias idiopáticas,
34
mas a importância da detecção de um mecanismo
genético, como mutações nos genes das telomerases,
possui implicações tanto terapêuticas e prognósticas
quanto para monitoração e aconselhamento genético.
Outra utilidade dos testes genéticos em pacientes com
fibrose pulmonar é a estratificação de populações de
indivíduos para participação em triagens para intervenção
clínica 10. Recentemente, foi sugerido que a resposta
positiva ou negativa à N-acetilcisteína na FPI está
associada a polimorfismos genéticos11.
A análise do comprimento dos telômeros nos leucócitos
do sangue periférico envolve uma simples coleta de sangue,
porém no Brasil o teste geralmente só é disponível em
algumas universidades e restrito à área de pesquisa. Nosso
paciente não foi submetido à análise da sequência ou de
mutações nos telômeros porque nosso serviço não tem
acesso ao teste, mas a combinação de fibrose e enfisema
difuso aliado à hepatopatia são bastante sugestivos da
síndrome dos telômeros curtos, o que pode ter sido
estimulado pela exposição passiva à fumaça de nicotina.
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35
Dispneia em paciente com Lúpus
Eritematoso Sistêmico
Dyspnea in a Patient with Systemic Lupus Erythematosus
Regina Celia Carlos Tibana1, Gustavo Frazatto Medeiros de Miranda2, Dr. Carlos Alberto de Castro Pereira3
Médica pós-graduanda da disciplina de pneumologia da Escola Paulista de Medicina – Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP)
2
Médico pós-graduando da disciplina de pneumologia da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP
3
Doutor em Pneumologia pela UNIFESP; Coordenador do grupo de assistência e pesquisa em doenças
pulmonares intersticiais da UNIFESP
1
Caso Clínico
Paciente do sexo feminino, 56 anos, caucasiana,
natural e procedente de São Paulo, com dispneia
progressiva e tosse seca de início há três meses.
Antecedente de lúpus eritematoso sistêmico (LES) há
19 anos, doença do refluxo gastroesofágico com
hérnia de hiato, hipertensão arterial sistêmica e
tremor
essencial,
com
estabilidade
das
comorbidades. Foi submetida à cirurgia ortopédica
na coluna torácica há 4 anos, sem intercorrências.
Negava tabagismo ou exposição ambiental relevante.
Fazia uso contínuo de omeprazol 20 mg ao dia,
bromoprida 10 mg duas vezes ao dia,
hidroclorotiazida 25 mg ao dia e primidona 50 mg ao
dia. Prednisona foi iniciada pelo reumatologista, na
dose de 60 mg ao dia há 1 mês, quando relatou piora
da dispneia.
Ao exame físico encontrava-se em bom estado geral
e com saturação de 98% em ar ambiente. A ausculta
pulmonar identificou raros roncos em base pulmonar
esquerda e no teste do degrau manteve saturação
basal.
Na avaliação propedêutica complementar, não foi
verificada hipertensão pulmonar ao ecocardiograma
transtorácico. Na avaliação funcional pulmonar
(tabela 1), identificou-se redução proporcional da
capacidade vital forçada e volume expiratório
forçado no primeiro segundo, sugerindo distúrbio
ventilatório inespecífico. Realizada medida dos
volumes pulmonares, com achado de capacidade
pulmonar total levemente reduzida, redução
moderada da medida de difusão pulmonar do
monóxido de carbono e coeficiente de difusão
pulmonar normal.
36
Tabela 1. Função Pulmonar. CVF: capacidade vital forçada;
VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo; CPT:
capacidade pulmonar total; DCO: difusão pulmonar do
monóxido de carbono; KCO: coeficiente de difusão pulmonar.
Valores Absolutos
CVF (L)
2,18
VEF1 (L)
1,57
VEF1/CVF
72
CPT (L)
3,9
DCO (mL/mmHg/min)
11,1
KCO (1/min)
4,12
% Previsto
64%
58
75
56
106
As imagens da tomografia computadorizada de tórax
(Figura 1) não evidenciaram alterações relevantes,
conforme demonstrado nas imagens abaixo.
Fig 1. Tomografia computadorizada de tórax: sem evidência de doença
parenquimatosa ou pleural.
Qual é a hipótese diagnóstica?
Síndrome do Pulmão Encolhido (Shrinking Lung
Syndrome)
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Discussão
A primeira descrição da síndrome do pulmão encolhido
(SPE) data de 1965, por Hoffbrand e Beck, que relataram 8
casos de dispneia inexplicada em 24 pacientes com LES1.
Trata-se de uma condição rara, com prevalência de
aproximadamente 1%, conforme descrito em uma coorte
multiétnica de 632 pacientes com LES2. A associação com
outras doenças do tecido conjuntivo é menos frequente,
mas já foi descrita na síndrome de Sjogren primária, artrite
reumatoide, esclerose sistêmica e doença indiferenciada
do tecido conjuntivo3.
O paciente usualmente queixa-se de dispneia e dor
pleurítica. Ortopneia pode ocorrer em alguns casos. Ao
exame físico, pode-se observar redução da expansão
torácica, taquipneia, uso de musculatura acessória e
movimento abdominal paradoxal4. O achado radiográfico
universal é a elevação diafragmática, que pode ser uni ou
bilateral, e associar-se a atelectasias basais. Derrame e
espessamento pleurais são achados menos comuns3.
Não existem critérios diagnósticos para SPE e deve ser
suspeitada em paciente com LES e dispneia, após
descartadas causas de etiologia intersticial, vascular e
sistêmica. A avaliação funcional pulmonar usualmente
evidencia um padrão restritivo com medida da capacidade
de difusão para o monóxido de carbono normal ou
levemente reduzida e coeficiente de difusão pulmonar
normal3. As pressões inspiratória e expiratória máximas
estão reduzidas na maioria dos casos5. A avaliação do
movimento diafragmático durante a inspiração através
de ultrassonografia pode ser útil no caso de dúvida
diagnóstica. Eletroneuromiografia é normal na maioria
dos casos 5. Mais recentemente, a realização de
ressonância nuclear magnética detectou a presença de
pleurite na ausência de miosite do diafragma 6. A
realização de tomografia computadorizada de tórax e
ecocardiograma transtorácico é importante para excluir
doença intersticial e vascular pulmonar, respectivamente.
Entre os fatores associados a ocorrência de SPE no LES,
estão descritos doença de longa duração e presença dos
autoanticorpos anti-SSA/Ro3, 7 e anti-RNP2.
A patogênese da SPE permanece incerta. Na primeira
descrição, os autores implicaram a presença de
microatelectasias causadas por tensão superficial
excessiva devido a perda de surfactante1. Desde então,
todas as teorias são especulativas e incluem deficiência
de surfactante, miopatia diafragmática, neuropatia frênica
e disfunção da parede torácica. Henderson et al avaliaram
6 casos de SPE com manometria esofáfica e encontraram
2 anormalidades fisiológicas características: 1. Piora da
força da musculatura respiratória em altos volumes
pulmonares, mas não em baixos volumes; 2. Diminuição
acentuada da complacência pulmonar na ausência de
doença intersticial. A partir destes achados, os autores
sugeriram um modelo fisiopatológico no qual a
inflamação pleural crônica prejudicaria a inspiração
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
profunda por meio de reflexos neurais e pela dor,
resultando em hipoinsuflação pulmonar crônica e
reorganização do parênquima, com consequente
diminuição da complacência pulmonar. A complacência
pulmonar reduzida piora a hipoinsuflação e perpetua uma
alça de retroalimentação positiva, explicando a gradual
progressão dos sintomas na SPE8.
Não existe um consenso na terapêutica para a SPE. O
tratamento baseia-se na terapia anti-inflamatória,
principalmente com o uso de corticosteroides, que são
feitos na maioria dos casos em altas doses (>0,5 mg/Kg/
dia). O uso de azatioprina e ciclofosfamida é o mais
descrito, porém com resultados conflitantes. A experiência
com micofenolato e metotrexato é limitada a poucos
relatos. Desde 2010(9), relatos isolados do uso de
rituximabe têm demonstrado resultados satisfatórios em
casos graves ou refratários, com melhoras significantes
nos exames de função pulmonar. Uso de teofilina e betaagonistas inalatórios tem sido feito com a intenção de
aumentar a força da musculatura diafragmática5.
O prognóstico a longo prazo é bom, com a maioria dos
pacientes permanecendo estáveis ou com melhora clínica
e funcional5.
Evolução Clínica
Frente a hipótese diagnóstica de SPE, foi solicitada
medida de pressão inspiratória e expiratória máximas, com
os seguintes valores encontrados: 16 (19% do previsto) e
23 cmH2O (28% do previsto), respectivamente. A realização
de espirometria em posição supina, evidenciou queda de
10% da capacidade vital forçada em relação a posição
sentada. Tais achados caracterizam fraqueza da
musculatura respiratória e corroboram o diagnóstico.
Após dois meses do uso da prednisona na dose de 60 mg
ao dia, foi iniciada redução gradual da dose até 30 mg ao
dia e azatioprina foi introduzida como terapia
imunossupressora poupadora de corticosteroide.
Como a paciente apresentou aumento das enzimas
canaliculares, a medicação foi substituída pela
pulsoterapia com ciclofosfamida (750 mg/m2). Entretanto,
após o terceiro ciclo, a medicação também foi substituída,
devido náuseas e vômitos, e micofenolato foi iniciado.
Como não apresentou melhora significativa após três
meses de tratamento, o imunossupressor foi modificado
para ciclosporina. A paciente segue estável funcional-mente
e com melhora subjetiva da dispneia.
Referências Bibliográficas
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Bronquiectasia: uma história não contada
Bronchiectasis: an untold story
Andressa Oliveira Peixoto MD1,*, Fernando Augusto Lima Marson PhD1,2, Adyléia Aparecida Dalbo Contrera
Toro PhD1, José Dirceu Ribeiro PhD1
1
Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas
2
Departamento de Genética Médica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas
Manuscrito
Trata-se do caso de uma adolescente, do sexo feminino,
procedente de Americana/SP, que era saudável e que não
apresentou intercorrências de saúde até os nove anos de
idade.
Entre nove e 13 anos de idade, ela iniciou quadro de
tosse diária, crônica com episódios de pneumonia de
repetição. Posteriormente, os episódios de infecção das
vias aéreas eram acompanhados de febre, vômica,
hemoptise e odor forte na expiração, frequentemente
acompanhados de redução de peso. O tratamento foi
baseado em cursos recorrentes de antibioticoterapia e
investigação diagnostica realizados na cidade de origem.
Aos 13 anos de idade veio encaminhado para o
acompanhamento no Hospital de Clínicas da Universidade
Estadual de Campinas.
Na avaliação clínica, a paciente e seus familiares
negaram: (i) presença de limitação às atividades físicas,
(ii) diagnóstico de outros processos infecciosos (além do
quadro clínico pulmonar), (iii) antecedente familiar para
alergia, (iv) contato epidemiológico para tuberculose, (v)
alteração do hábito intestinal, (vi) alteração do
desenvolvimento neuropsicomotor.
Na avaliação clínica chamava a atenção alguns aspectos
da dinâmica familiar: (i) pai relatou que era alcoólatra
desde os 15 anos de idade, (ii) a paciente tinha um irmão de
19 anos que residia com avó paterna e era fruto de outro
relacionamento do pai, (iii) os pais eram rígidos frente as
atividades e atitudes realizadas pela criança.
No exame físico a adolescente apresentou: bom estado
geral, corada, hidratada, eupneica, afebril, acianótica,
ativa, reativa, boa perfusão periférica com tempo de
enchimento capilar inferior a dois segundos. Exame
Andressa Oliveira Peixoto MD1
Rua Tessália Vieira de Camargo, 126,
CEP: 130833-7 - Campinas, São Paulo, Brasil.
E-mail: [email protected]
Tel. +55 19 981284888 / 35218959
Fax +55 19 3521-8970
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
respiratório: expansibilidade pulmonar preservada,
murmúrio vesicular presente, porém reduzido na região
de base pulmonar à esquerda, com estertores
subcrepitantes localizados na mesma área, frequência
respiratória de 16 ipm, saturação transcutânea de
oxigênio da hemoglobina de 96%. Exame cardiovascular:
ritmo cardíaco regular em dois tempos bulhas
normofonéticas sem sopro, frequência cardíaca de 80
bpm. Exame físico abdominal: abdômen flácido, ruídos
hidroaéreos normais, ausência de dor a palpação.
Ela trouxe vários exames complementares realizados
em outro serviço:
(i) tomografia computadorizada de alta resolução de
tórax. Os achados encontrados na tomografia estão
apresentados na Figura 1;
Fig. 1. A figura representa a gravidade da bronquiectasia secundária a
aspiração de corpo estranho no lóbulo esquerdo.
(ii) espirometria: distúrbio ventilatório obstrutivo leve
com ausência de resposta positiva ao broncodilatador
inalatório;
(iii) imunoglobulinas normais;
39
(iv) investigação para tuberculose negativa pela cultura
de escarro;
(v) ausência de deficiência de alfa 1 antitripsina;
(vi) teste de suor negativo para fibrose cística.
Entre nove e 13 anos, antes de vir para o Hospital
Universitário, ela permaneceu com os episódios
infecciosos recorrentes da via aérea por quatro anos, sem
sucesso na investigação da etiologia da doença. Após esse
período, devido a uma crise de tosse intensa expeliu um
objeto de polipropileno (bolinha de plástico), sem
comunicar este fato aos médicos e aos responsáveis.
Porém quando foi encaminhada ao serviço de
pneumologia pediátrica da Unicamp, relatou que tinha
aspirado corpo estranho, e não havia contado aos pais,
anteriormente, por medo de represálias. Nesse contexto,
permaneceu por longo período com corpo estranho alojado
no lobo inferior esquerdo, que acarretou nas infecções
recorrentes, e possivelmente, nas bronquiectasias
localizadas. Indicamos broncoscopia e não foi observado
presença de outros corpos estranhos. Fundamentado na
história, eliminação de corpo estranho e na tomografia
computadorizada de alta resolução de tórax, a hipótese
diagnostica elencada foi bronquiectasia localizada
secundária à aspiração de corpo estranho.
O presente relato de caso reforça a necessidade de
avaliar a presença de corpo estranho, como etiologia de
bronquiectasia, que pode ser de diferentes estruturas e
origens. Corpos estranhos podem se alojar nos pulmões
por décadas e sem direcionamento correto para o
diagnóstico1-3. Foi fundamental o relato da paciente pois
propiciou o diagnostico ressaltando a importância da
avaliação clínica e alterações da dinâmica familiar que
devem ser valorizadas como facilitadores do diagnóstico.
Como observado no presente caso, o “simples” relato da
paciente sobre a aspiração do corpo estranho poderia
evitar a evolução para bronquiectasia, pela retirada, em
tempo hábil, do objeto4.
A confirmação de aspiração de corpo estranho
traqueobrônquico em crianças pode ser tardia ou
negligenciada, e pode originar complicações como
pneumonia de repetição, atelectasia permanente ou
bronquiectasias 5. Achados unilaterais inesperados, na
radiografia ou tomografia computadorizada de alta
resolução de tórax, devem ser avaliados como suspeita
de aspiração de corpos estranhos inalados, na ausência
de fatores de risco conhecidos (por exemplo: malformação
congênita)5.
Bronquiectasia é o alargamento anormal dos brônquios
decorrente de numerosos distúrbios adquiridos ou
congênitos. A dilatação dos brônquios leva a insuficiência
da depuração mucociliar6,7. Se o termo bronquiectasia for
utilizado como referência a uma doença, ao invés do seu
aspecto radiológico, se considera uma síndrome clínica,
que é caracterizada por tosse, escarro e infecções
recorrentes do trato respiratório 7.
40
Bronquiectasias, em crianças ou adultos sem fibrose
cística, são denominadas de bronquiectasias não
relacionadas a fibrose cística e, são resultados de doenças
crônicas (por exemplo: discinesia ciliar primária) e/ou
episódios repetidos de agressões ambientais, juntamente
a atuação de variantes genéticas 6. Portanto, fatores
genéticos e ambientais podem alterar a predisposição
para as doenças crônicas e afetar a prevalência de
bronquiectasias.
Bronquiectasia é uma enfermidade crônica que pode
cursar com tosse diária, aumento da expectoração, e
predisposição a infecções respiratórias baixas de
repetição, que levam a suspeita do diagnóstico. Hemoptise
e dor torácica são achados tardios nas bronquiectasias6.
O diagnóstico da bronquiectasia, geralmente requer
exame de imagem, particularmente a tomografia
computadorizada de alta resolução de tórax (padrão
ouro)6.
As bronquiectasias são classificadas pela
característica morfológica em: (i) cilíndricas: brônquios
com dilatações uniformes e paredes espessas, estendendose até a periferia do pulmão, sem afilamento normal. Na
tomografia computadorizada de alta resolução de tórax
apresenta sinal do trilho de trem ou do anel de sinete; (ii)
varicosas: brônquios com contornos irregulares,
alternando áreas de dilatação e constrição; (iii) císticas
ou saculares: formas de maior gravidade e comuns aos
pacientes com fibrose cística, apresentando brônquios
dilatados e amontoados de cistos com líquido. Aspecto de
favo-de-mel8.
Quanto a origem, as bronquiectasias podem ser
classificadas em: (i) adquiridas: obstrução brônquica,
estase e infecção; (ii) congênitas: dilatações brônquicas
que, resultam da interrupção no desenvolvimento normal
da árvore brônquica [8]. Em resumo, ocorre um repetitivo
ciclo de inflamações e infecções.
As causas mais frequentes e a variabilidade clínica da
bronquiectasia em adultos está descrita na tabela 17. Em
crianças, os aspectos de etiologia, prevalência e
fisiopatologia das bronquiectasias podem diferir, em
parte, dos adultos. Aproximadamente, 60% das crianças
têm etiologia subjacente, decorrentes de infecções,
imunodeficiências primárias, aspiração (corpos
estranhos e aspiração de saliva e/ou material gástrico
naquelas com retardo do desenvolvimento
neuropsicomotor) e discinesia ciliar.
Bronquiectasia pós-infecciosa pode se desenvolver
após infecção grave, como pneumonia, infecção por
micobactérias tuberculosas ou não tuberculosas e/ou
infecção viral 7. Enquanto, os achados pós-infecção,
geralmente são generalizados, os associados ao corpo
estranho são localizados. Na prática clínica, podem existir
dificuldades para o diagnóstico de aspiração de corpo
estranho como causa de bonquiectasia. Dificuldades para
o diagnóstico podem levar a numerosas investigações e
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Tabela 1. Causas relacionadas a bronquiectasias e a prevalência conhecida.
Etiologia
Idiopática
Pós-infecciosa
Pós-tuberculose
Adultos afetados
20 – 60%
20 – 40%
< 2% (países desenvolvidos)
Causa dominante no Leste europeu,
Ásia e outras regiões
Aspergilose broncopulmonar alérgica
1 – 10%
Doenças do tecido conjuntivo
1 – 10%
Imunodeficiência
Fibrose cística
Discinesia ciliar primária
Síndrome da unha amarela
Traqueobroncomegalia
< 5%
< 1% em clínicas de adultos sem fibrose
cística
< 2% (podendo estar subestimado
devido a testes diagnósticos limitados)
< 1%
< 1%
Infecção micobactérias não-tuberculose
2 – 50%
Infecção por HIV
Malignidade hematológica
Deficiência de α-1 antitripsina
Inalação de corpo estranho
Doença pulmonar obstrutiva crônica
< 1%
< 1%
< 1%
< 1%
2 – 60%
Asma
Refluxo gastresofágico ou aspiração
1 – 50%
Não disponível
Características clínicas típicas
Variável
História de infecção grave no(s) lobo(s)
afetado(s) ou infecção prévia
História de tuberculose com cavitação e
dano pulmonar
História de asma, rolhas de escarro,
chiado, resposta aos corticosteroides e
presença de alergia específica ao
Aspergillus
Bronquiectasia central
Evidência de doenças do tecido conjuntivo
sistêmica (a mais frequentemente é a
artrite reumatoide)
Evidência de infecções não pulmonares
ou patógenos não usuais
Bronquiectasia do lobo superior,
comprometimento extrapulmonar,
infertilidade masculina, má absorção
Isolamento de Pseudomonas aeruginosa,
Staphylococcus aureus ou micobactérias
não-tuberculose
Doença do lobo médio ou inferior, história
de otite média e rinossinusite, idade
precoce dos primeiros sintomas
Unhas amarelas e derrame pleural
Dilatação traqueal e bonquiectasia central
em imagem radiológica típica
Bronquiectasia nodular do lobo
médioComum em mulheresEscoliose,
pectus excavatum e baixo índice de
massa corpórea
Sem fenótipo característico
Frequentes infecções do trato respiratório
Enfisema paraseptal e obstrução do fluxo aéreo
Doença de lobo único
Moderada doença do lobo inferior bilateral
com enfisema e história de tabagismo
Não é bem descrita
Bronquiectasia de lobo inferior bilateral ou
de lobo inferior direito isolada.
Não é claramente identificada como uma
etiologia
A tabela foi adaptada de: Redondo M, Keyt H, Dhar R, Chalmers JD. Global impacto f bronchiectasis and cystic fibrosis. Breathe 2016; 12:222-235.
tratamentos sem a comprovação diagnóstica definitiva
de corpo estranho, como exemplo, tuberculose, bronquite
crônica, discinesia ciliar primaria, dentre outras9.
Um fato significativo, é que apesar da extensa
caracterização clínica, radiológica e imunológica,
aproximadamente de 30 a 70% dos pacientes são
classificados como tendo bronquiectasias idiopáticas7.
Bronquiectasias cursam com exacerbações pulmonares
infecciosas e que necessitam de internação hospitalar
para antibioticoterapia intravenosa e têm grande impacto
na qualidade de vida e está associada ao declínio da
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
função pulmonar e aumento da mortalidade7, 10.
Sempre que possível, o tratamento da bronquiectasia
deve ser direcionado ao fator etiológico. Para diminuir a
prevalência de aspiração de corpos estranhos, políticas
de conscientização pública, para a prevenção de acidentes,
devem ser maximizadas11.
Na prática clínica, bronquiectasias caracterizam-se
como anomalias radiológicas associadas a desordens
infecciosas, inflamatórias e congênitas. Bronquiectasia,
anteriormente denominada de doença órfã, é o desfecho
comum de numerosas enfermidades de baixas
41
prevalências, portanto deve despertar a curiosidade para
o diagnóstico diferencial, cujo manejo é diferente.
Aspiração de corpo estranho deve ser avaliada na
presença de sintomas respiratórios crônicos, não
explicados por outras condições, mesmo quando não há
história clínica compatível, principalmente, quando
apenas um lóbulo é afetado por bronquiectasia. A história
clínica pode ser o ponto chave do diagnóstico e deve muito
valorizada 2. É necessário reforçar a importância da
apresentação clínica, anamnese e as causas etiológicas
das bronquiectasias para permitir eficácia diagnóstica,
que possibilitará um tratamento personalizado, nas
diferentes faixas etárias. Uma história não contada pode
dificultar o diagnóstico precoce de aspiração de corpo de
estranho e acarretar em bronquiectasia, como no presente
caso apresentado.
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Agradecimentos
FALM: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (FAPESP) pelos auxílios à pesquisa e bolsas de
estudo #2011/12939-4, #2011/18845-1, #2015/12183-8 e
#2015/12858-5; Fundo de Apoio à Pesquisa, ao Ensino e à
Extensão da Universidade Estadual de Campinas pelo
suporte à pesquisa #0648/2015; JDR: FAPESP pelo auxílio à
pesquisa 2011/18845-1 e #2015/12183-8. Aos outros
membros da pneumologia pediátrica da faculdade de
ciências médicas da Universidade de Campinas: Maria
Ângela Gonçalves de Oliveira Ribeiro, Emília Gonçalves,
Maria Cristina Ribeiro dos Santos Simões e Milena
Baptistella Grotta Silva.
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Sibilância na infância: todo cuidado é pouco!
Wheezing in childhood: all care is short!
Lidia Alice Gomes Monteiro Marin Torres1
1
Responsável pelo serviço de pneumologia pediátrica do departamento de pediatria da FMRP-USP
Mestre e doutora em Pediatria pela mesma Universidade
Responsável pelo serviço de residência médica de Pediatria da Santa Casa de Ribeirão Preto
Caso clínico
Paciente de 1 ano e 8 meses de idade, sexo masculino,
previamente hígido e sem história familiar de atopia ou
asma. Nasceu a termo, sem problemas perinatais e
permaneceu eutrófico, tendo tido aleitamento materno
exclusivo até os 5 meses de idade. Nega prurido nasal,
espirros ou alergia de pele. Nega otites ou outras doenças
prévias. Teste de triagem neonatal para Fibrose cística:
negativo. Procurou o serviço com quadro de tosse
produtiva há 6 meses, com alguns episódios repetidos
de sibilância, sendo que o último foi grave e motivou até
internação. Refere a mãe que iniciou o quadro com coriza
hialina, tosse seca e “ronqueira no peito”. Procurou
pronto-socorro e foi medicado com sintomáticos. Notou
uma melhora inicial, mas depois de 5 dias, o quadro
começou a progredir para uma tosse produtiva, noturna
e pela manhã com chiado no peito. Procurou novamente
atendimento sendo medicada com corticoide oral e antihistamínico. Apresentou discreta melhora, mas após
alguns dias houve nova recrudescência. Usou chás
caseiros e medicação homeopática por 4 semanas, mas
a tosse piorou passando a ser rouca, emetizante e com
cianose durante as crises, mas não apresentava guincho.
Procurou novamente o pediatra que receitou
azitromicina para um quadro de provável coqueluche,
apesar de vacinado e sem tossidores em casa. A criança
utilizou a medicação com melhora por 4 dias, mas antes
do término, voltou a apresentar a tosse, agora com
vômitos de secreção amarelada. Foi encaminhada para
um alergista que pediu RAST para alérgenos inalados e
alimentares e optou por trocar leite de vaca por leite de
soja, apesar dos exames serem todos normais e de não
apresentar comprometimento de pele ou trato
gastrintestinal. Dessa vez a mãe não observou nenhuma
resposta, tendo evoluído com piora progressiva,
sibilância, dependência de oxigênio. Nesse momento
foi internado e permaneceu por 10 dias em uso de
oxigênio, com melhora muito lenta, apesar do uso de
aerossol, corticoide e antibióticos, que utilizou por uma
semana. Teve alta melhor, mas ainda apresentava tosse
e sibilos esparsos. Procurou um ORL que optou por
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
introduzir tratamento para refluxo, com inibidor de
bomba de prótons. Entretanto, mesmo em uso da
medicação, voltou a apresentar tosse matutina,
produtiva, com vômitos de secreção espessa e
amarelada. A família estava desesperada e a criança
começara a perder peso por causa dos vômitos póstosse. Procurou um pneumologista que achou que
pudesse ser asma e introduziu corticoide inalatório,
mas mesmo após um mês de tratamento em dose alta,
não apresentou melhora. Foi encaminhado então para
o nosso serviço para que fosse descartado o diagnóstico
de Fibrose Cística.
Exame físico: Palidez cutânea, principalmente perioral,
fr 56 irm, saturação periférica de O2 em 87% em ar
ambiente. Tiragem intercostal e de fúrcula, com
expiração prolongada e discreto aumento do diâmetro
AP do tórax, com hipersonoridade à percussão. Raros
sibilos, mas presença de estertores difusos de médias e
finas bolhas em ambos os HTs à ausculta.
Exames realizados: cloro no suor: 13/17 – dosagem de
Igs: normais – phmetria e EED normais – Rasts todos
negativos. Cultura de escarro positiva para H influenzae.
PCR 65. Hemograma com desvio à D e leucocitose.
Plaquetose. (Figura 1)
Conduta: A criança foi tratada com broncodilatadores
e corticóides pelos 3 primeiros dias de internação,
enquanto aguardava os exames, sem melhora, e após, foi
introduzida Amoxicilina com clavulanato, utilizados por
3 semanas, com melhora progressiva do quadro e
desaparecimento completo da tosse e da sibilância, que
não voltaram a ocorrer nesse paciente. Foram retiradas
progressivamente as medicações introduzidas antes sem
recrudescência do quadro.
HD: Bronquite Bacteriana Protraída.
Discussão
A sibilância e tosse recorrentes são episódios muito
aflitivos para os pais em pneumologia pediátrica. Nos
43
Fig. 1. Rx de tórax mostrando velamento reticulado grosseiro perihilar
bilateral, sem sinais de hiperinsuflação.
países em desenvolvimento o “burden” da doença
respiratória ainda é muito alto, estando a pneumonia e
as doenças supurativas pulmonares, entre as principais
causas de mortalidade mundial, apesar das pesquisas
serem escassas nesse campo1.
A real prevalência do lactente sibilante ou com tosse
crônica é desconhecida e provavelmente subestimada mas
pode ocorrer em 8-10 % dos casos de procura de
atendimento especializado, sendo também penosa a
peregrinação dos pais com a criança enferma. Existe uma
tendência atual a se evitar as investigações exaustivas
em crianças saudáveis, dando-se preferência a realizar
uma boa história clínica, o que é difícil quando os pais
estão cansados e estressados pela busca constante de
médicos e exames2.
Uma exceção a isso é quando a criança apresenta
sibilância associada à tosse produtiva com expectoração
amarelada, pois esse quadro tem sido associado a
situações graves, com evolução em 13% das vezes para
supuração crônica e bronquectasias3.
A bronquite bacteriana protraída (BBP) é uma das
doenças que compõem o espectro das doenças supurativas
das vias aéreas em crianças. Foi descrita já na década de
40 e após a introdução dos antibióticos experimentou uma
redução de prevalência, mas voltou a apresentar alta
incidência nos dias atuais, sendo descrita novamente em
2006 como entidade clínica distinta das outras causas de
supuração das vias aéreas 4. Também ficou conhecida
como bronquite crônica bacteriana ou infecção
endobrônquica crônica e corresponde a um quadro de
tosse e sibilância, com expectoração amarelada. Costuma
prolongar-se por mais de 4 semanas, podendo levar a
perda de peso e evoluir a curto prazo para pneumonia.
Caso não tratada, pode cuasar bronquectasias a longo
prazo, aparecendo sinais de baqueteamento digital e
aumento do diâmetro torácico. Esse quadro tem sido
descrito com maior frequência em pacientes que
necessitaram maiores concentrações de oxigênio ou
44
permaneceram internados por mais tempo durante a
evolução da doença3.
Quando voltou a ser observado, no início dos anos 2000,
foi analisado por meio de broncoscopia e Lavado Broncoalveolar (LBA) e demonstrado que existe uma infecção
endobrônquica com patógenos respiratórios em
concentrações maiores que 10x4 unidades formadoras
de colônias, muitas vezes com formação de biofilmes.
Várias bactérias foram implicadas, mas o H influenzae e
M catharralis são os mais frequentes, embora possa ocorrer
mais que uma bactéria e alguns virus. Entretanto, pela
dificuldade de realização desse procedimento em todos
os lactentes com tosse produtiva, a maioria
completamente saudável antes desse processo, optou-se
por uma definição clínica que atualmente engloba: tosse
produtiva crônica com secreção amarelada, por mais que
4 semanas, tendo sido descartadas outras condições
crônicas causadoras de tosse produtiva e com resposta
positiva ao uso de antibióticos por 2-4 semanas. A análise
celular do LBA mostrou ainda, infiltração acentuada de
neutrófilos e uma ativação da via de expressão da
Interleucina 1β, mostrando a amplitude do processo
inflamatório presente5.
A idade de maior prevalência é entre 1 e 5 anos de
idade, mas pode ocorrer mais cedo ou até com 12 anos e
nas coortes estudadas não havia evidências de sinusite
ou outras doenças de vias aéreas superiores, sendo
característica a predominância de estertores de finas e
médias bolhas, sobre os sibilos no exame físico. A presença
dos ruídos é causada pela dificuldade de movimento ciliar
provocada pelo acúmulo de secreção e presença da
infecção 6,7.
O caso apresentado é, portanto, um lactente com uma
doença de início súbito e bem definido, sem qualquer
sintomatologia prévia, cujo quadro iniciou após um
episódio viral e persistiu com tosse e chiado por mais de
2 semanas, que seria o máximo tolerado para um quadro
viral sem complicações. Entretanto, a infecção mostrava
poucos sinais de invasividade, como pode ser visto pelos
exames gerais. Atingiu e ultrapassou as 4 semanas de
definição proposta, apresentando os sinais
característicos de expectoração purulenta, confirmando,
pois, o diagnóstico de BBP. A radiografia mostrava
velamento perihilar grosseiro, bilateral, porém não havia
febre, nem sinais no hemograma que sugerissem
pneumonia, além do longo tempo de evolução. Em relação
aos outros diagnósticos cogitados é necessário fazer
alguns comentários. A doença de RGE não costuma estar
associada à tosse produtiva e nem à secreção amarelada
e seu período de aparecimento costuma ser mais precoce,
com maior prevalência e gravidade em lactentes mais
jovens. Além do mais, foi descartado pelos exames8. Os
quadros de alergia à proteína do leite de vaca que
apresentam sintomas respiratórios, costumam apresentar
mais de um aparelho comprometido, aparecendo sempre
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
urticária ou alterações gastrintestinais com maior
frequência e, geralmente, associadas temporalmente à
administração do alimento9. Já a asma poderia estar
presente, mas faltam sinais e sintomas de atopia e história
familiar característica, que podem ser fatores previsores
da sua ocorrência no lactente10. Em relação à Fibrose
cística, faltam alguns sinais tais como perda de peso,
diarreia ou outros sinais de má-absorção e aparecimento
mais precoce e gradativo do quadro. Entretanto o exame
do cloro no suor e a resposta adequada ao tratamento,
sem retorno do quadro, mesmo após 6 meses da suspensão
do antibiótico, praticamente descartam essa doença.
Conclusão
Dessa forma, precisamos estar atentos, realizar uma
história clínica detalhada e paciente, além de um exame
físico cuidadoso, mesmo que seja preciso fazê-lo em mais
de uma vez. Em crianças a tosse e sibilância são queixas
muito comuns, e não devem trazer maiores preocupações
quando forem secas e de resolução espontânea.
Entretanto, é muito importante considerar com atenção
os quadros de tosse produtiva com secreção amarelada
de longa duração, que tem tratamento fácil no seu início,
mas, se não tratadas, podem conduzir o paciente a um
quadro irreversível de bronquectasias, com prejuízos
incalculáveis para a criança, família e sociedade.
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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
45
A espirometria é normal, e agora?
Spirometry is normal, now what?
Luís Paulo Tonioli1; William Salibe Filho2
1
Médico Pneumologista, Professor do curso de medicina do Centro Universitário São Camilo
2
Médico assistente da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC); Professor
do curso de medicina do Centro Universitário São Camilo
Sr. José tem 52 anos, é tabagista pesado, no total 40
anos.maço. Tem como antecedentes Hipertensão Arterial
e Diabetes Mellitus. Em uso de Hidroclorotiazida 25 mg/
dia e Glibenclamida 5mg/dia. Trabalha como pedreiro e
tinha uma saúde ótima, não faltava no trabalho e fazia o
serviço pesado. Há 6 meses começou a apresentar uma
dispnéia aos grandes esforços, fato novo que não tinha
antes. A tosse já tinha alguns anos, mais pela manhã.
Mesmo com estes sintomas José acabou não indo ao
médico e somente tomou um xarope receitado por um
amigo do trabalho. Após 3 meses mantinha os mesmos
sintomas e então resolveu procurar um Pneumologista, a
pedido de sua esposa, que estava preocupada.
Durante a consulta Sr. José relatou: dispnéia aos
grandes esforços há 9 meses, associado a tosse com
expectoração hialina, sem febre. No exame físico
apresentava-se: corado, hidratado, acianótico, PA: 130 x
90mmHg, Saturação Periférica de Oxigênio: 95%, Peso: 62
kg, Altura: 1,70 m, IMC: 21,01. Aparelho Respiratório:
murmúrio vesicular presente, diminuído bilateralmente,
sem ruídos adventícios. Aparelho Cardiovascular: RCR em
2T, bulhas normofonéticas sem sopros. Membros
Inferiores: sem edemas. Nos demais sistemas sem
alterações significativas.
O médico pediu uma Radiografia de Tórax e uma
Espirometria que eram normais. Após estes exames, José
foi reavaliado e mantinha os sintomas.
E agora?
A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) se
evidência por ser uma doença previnível e tratável,
caracterizada por sintomas respiratórios persistentes e
limitação do fluxo aéreo devido as anormalidades das
vias aéreas e alveolares decorrentes da exposição a gases
e partículas nocivas (ex: cigarro, queima de matéria
orgânica, poeira ocupacional, entre outros)1. O processo
inflamatório crônico provoca alterações estruturais e
estreitamento das vias aéreas, podendo estar associado
a destruição do parênquima pulmonar e sua
desarquitetura, culminando na redução da retração
46
elástica pulmonar e por consequência na capacidade de
manter as vias aéreas abertas durante a expiração1.
Apesar de a DPOC ser um problema de saúde pública
mundial, sua estimativa de prevalência é incerta, devido
a variabilidade da população estudada, qualidade dos
dados analisados, qualidade das espirometrias e as regras
usadas na definição da doença2,3.Como exemplo podemos
citar o estudo PLATINO realizado em 5 países da América
Latina (Brasil, México, Uruguai, Chile e Venezuela)
mostrando que apesar de em todos eles a incidência de
DPOC aumentar com a idade, principalmente acima dos
60 anos, sua prevalência foi de 7,8% na Cidade do México
chegando até 19,7% em Montevideo no Uruguai4. Baseado
no estudo BOLD e em outros grandes estudos
epidemiológicos podemos dizer que a prevalência
mundial da DPOC é de aproximadamente 11,7% e é
responsável por 3 milhões de mortes anuais5.
A DPOC deve ser considerada e investigada em todos os
pacientes com queixa de dispnéia, tosse crônica,
normalmente produtiva e que tenha história de exposição
a fatores de risco para desenvolvimento da doença1.A
obstrução expiratória ao fluxo aéreo é a base para o
diagnóstico da doença, sendo a investigação feita
inicialmente através dos testes de função pulmonar, o mais
utilizado a espirometria. A presença de uma relação entre
o volume expiratório forçado no primeiro segundo e a
capacidade vital forçada (VEF1/CVF) < 0,70, após uso de
broncodilatador de curta-ação, confirma a presença de
limitação persiste ao fluxo aéreo, e também o diagnóstico
da DPOC, quando da história clínica compátivel1.
Entretanto estudos recentes tem discutido o uso do VEF1
e da relação VEF 1/CVF para o diagnóstico da DPOC,
principalmente nos casos iniciais, pois nesta fase o
acometimento da doença está nas pequenas vias aéreas6,
podendo ocorrer alterações patológicas significativas,
mesmo antes do início dos sintomas mais intensos e o
VEF 1 reflete principalmente o comprometimento das
grandes vias aéreas. Uma série de evidências sugerem que
fumantes e ex-fumantes tem alterações clínicas,
radiológicas e fisiológicas não identificadas pelas
medidas espirométricas atuais7. Portanto, devido a doença
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
iniciar nas pequenas vias aéreas, porque não usar algum
parâmetro que avalie melhor esta região do pulmão?
Nesta linha Dilektasli et al(8)publicaram artigo recente
discutindo o uso do volume expiratório forçada no terceiro
segundo (VEF3), que reflete melhor as alterações das vias
menores, e consequentemente pode ser mais sensível no
diagnóstico precoce da doença. Além da análise da relação
VEF3/CVF, também foi avaliado o uso do volume expiratório
forçado no sexto segundo (VEF6) e a relação VEF3/VEF6. No
estudo, foram incluídos 7.853 participantes, dos que
tinham relação VEF1/CVF normal. Em 677 indivíduos (15.4%)
da amostra quando analisado pela relação VEF 3/VEF 6
apresentaram alteração, e quando analisado por VEF3/
CVF em 312 (7.1%), mostrando que estes parâmetros
podem ser mais sensíveis para o diagnóstico da DPOC.
Associado a este fato, foram analisadas Tomografias de
Tórax (avaliado a presença de enfisema, dimensão das
vias aéreas e aprisionamento aéreo) e questionários de
qualidade de vida que já mostravam alterações neste grupo
de pacientes. Entretanto, é desconhecido se a população
com VEF1/CVF normal, mas VEF3/VEF6 alterada, definida
neste estudo, terá uma progressão mais rápida da doença8.
Em outra publicação, que faz parte do Subpopulations and
Intermediate Outcome Measures in COPD Study
(SPIROMICS), foi aventada a hipótese de que muitos
tabagistas e ex-tabagistas com sintomas respiratórios que
tenham a relação VEF 1/CVF> 0.70, após uso de
broncodilatador de curta ação, apresentam um tipo de
doença crônica das vias aéreas baixas, e que esta seria
similar a DPOC 9. Com uma amostra considerável de
participantes os autores avaliaram sintomas
respiratórios, com o uso de um questionário de sintomas
(COPD Assessment Test– CAT), e até 50% dos pacientes
sintomáticos apresentaram função pulmonar preservada,
ou seja, não receberiam o diagnóstico de DPOC. Mesmo
não tendo o diagnóstico da doença estes pacientes
exacerbam, tem sintomas respiratórios, evidências de
comprometimento da via aérea, e muitas vezes são
tratados, mesmo não preenchendo os critérios
diagnósticos atualmente estabelecidos9.
Na tentativa de auxiliar no diagnóstico da doença
aparecem os exames de imagem, infelizmente o papel da
radiografia nestes casos fica limitada, sendo a tomografia
de tórax um exame útil para avaliação das alterações
morfológicas pulmonares e fornecer uma analise visual e
quantitativa da DPOC10. Em uma análise retrospectiva,
pacientes com sintomas respiratórios e enfisema
confirmado na tomografia não apresentavam alterações
na espirometria em 10.4%, e portanto não tinham o
diagnóstico(7). Também em outro estudo, 26% dos
pacientes com enfisema e aprisionamento aéreo
confirmado na tomografia não preenchiam os critérios
diagnósticos da DPOC na espirometria, e seriam
classificados como GOLD 011.
Diante destes fatos, e como mostrado no caso, é preciso
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
cada vez mais valorizar as queixas dos pacientes, e
também muitas vezes usar mais de um método diagnóstico,
como por exemplo: tomografia de tórax, questionários de
sintomas, teste de caminhada de 6 minutos, na tentativa
de identificar possíveis indivíduos doentes, pois crescem
as evidências da presença de alterações estruturais antes
da identificação da obstrução ao fluxo aéreo de acordo
com critérios espirométricos de rotina. Entretanto, o que
ainda não se sabe, é como será a evolução da doença
nestes pacientes, mas muito provavelmente com o
diagnóstico precoce os danos futuros para este grupo
tendem a ser menores.
Referências Bibliográficas
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47
Aquele sono pesado...
That heavy sleep
Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde¹;Geraldo Lorenzi Filho²; Pedro Rodrigues Genta3
¹Médico Residente do programa de Pneumologia, HCFMUSP
²Professor Livre-Docente, Diretor do Laboratório do Sono, Serviço de Pneumologia, InCor, HCFMUSP
3
Médico Assistente, Doutor,Laboratório do Sono, Serviço de Pneumologia, InCor, HCFMUSP
Relato de Caso
Paciente do sexo feminino, parda, 50 anos, procura
atendimento médico por queixa de dispneia. Relata
dispneia moderada (escala do Medical Resource Council
(MRC)=3). Afirma que se sente cansada todas as manhãs,
e que frequentemente acorda com cefaleia. A dispneia
piorou progressivamente com ganho de 13 kg em 2 anos.
Nega tosse ou chiado. Refere ortopnéia e nega dispneia
paroxística noturna. O esposo afirma durante a consulta
que a paciente tem estado sonolenta durante o dia e que
tem tido sono agitado. Refere ainda que não dorme com a
esposa pois o ronco é muito alto. todas as noites. Caracteriza
o ronco como de tal intensidade que o fez dormir em outro
quarto. Mesmo sendo ambos religiosos, refere que a esposa
tem dormido durante as celebrações das quais participam.
A paciente também refere edema de membros inferiores.
Quanto aos antecedentes pessoais, a paciente afirmou ser
portadora de hipertensão arterial sistêmica e diabetes
mellitus tipo 2. Negou tabagismo ou outros antecedentes
além dos já referidos acima. Quando ativamente
questionada, negou qualquer trauma ou acidente, e afirmou
que a menopausa se iniciou aos 45 anos.
Ao exame físico, apresentava-se em bom estado geral,
afebril, acianótica, com ausculta cardíaca dificultada por
panículo adiposo e mamas, porém sem alterações
perceptíveis. Edema de membros inferiores graduado em
2+/4+, com sinal de cacifo positivo e simétrico. Ausculta
pulmonar também sem alterações, assim como restante
de exame físico. Sinais vitais foram aferidos, apresentando
frequência cardíaca de 105 bpm, respiratória de 25 irpm,
pressão arterial de 150/90 mmHg e saturação periférica
de oxigênio igual a 80% em ar ambiente. Calculado Índice
de Massa Corpórea (IMC) igual a 43 kg/m². A
circunferência cervical foi medida em 42 cm e a escala de
Mallampatti modificado classe III.
Foram solicitados os seguintes exames: gasometria
Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, 8º andar
48
arterial em ar ambiente -pH 7,39, pO2 46,8 mmHg, pCO2
55,6 mmHg, bicarbonato33,3mmol/L, SatO 2 77%;
Radiografia de Tórax – normal. Ecocardiograma – normal;
Pró-BNP:195pg/mL (normal=125); TSH e T4 Livre – normais.
Também foram aplicadas as escalas de Berlin (risco para
apneia obstrutiva do sono) e Epworth (sonolência
excessiva diurna) em virtude de história acima, tendo
assim um Berlim alto risco e Epworth=14 (sonolência
excessiva diurna >10 pontos).
Foi realizada Prova de Função Pulmonar, com valores
encontrados de:
CVF
VEF1
VEF1/CFV
CPT
VR
VR/CPT
DLCO
Pré-Broncodilatador(L)
2,05
1,77
0,86
4,01
1,96
0,49
26,05
% do
Previsto
60
65
108
83
116
Pós-Broncodi- Variação
latador(L)
(%)
2,04
0
1,78
1
0,87
1
116
Em virtude de hipótese diagnóstica, foi então solicitada
polissonografia, que apresentou apenas eventos
obstrutivos, com IAH de 56 eventos/hora de sono, tempo
total de sono de 9h06min, tendo FC máxima de 140 bpm,
permanecendo 100% do exame com saturação abaixo de
90%, com a seguinte curva de saturação:
Qual(ais) o(s) diagnóstico(s)?
Síndrome de Hipoventilação da Obesidade
Apneia Obstrutiva do Sono.
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
Após diagnóstico, foi instituída terapia com pressão
positiva contínua em via aérea (CPAP)nasal, ajustado em
12cmH2O. Após 3 meses de tratamento, a leitura dos dados
do CPAP revelou que a paciente vinha usando o
equipamento por 5,4 horas/noite em média. Houve resolução
do ronco da sonolência diurna (Epworth=8),da qualidade do
sono, da fadiga e cefaleia matinal. Nova gasometria mostrou
pH 7,44, pO2 69,1 mmHg, pCO2 42 mmHg, BIC 28,3mmol/L e
SO2 91,6%. Novo pró-BNP de 21pg/mL.
Síndrome de Hipoventilação da Obesidade
(SHO)
A obesidade afeta mais de um terço da população adulta
mundial, sendo “a epidemia do século 21”. Pacientes
obesos (IMC> 30 kg/m²)com hipercapnia arterial diurna
(PaCO2> 45 mmHg), na ausência de outras causas, sofrem
de Síndrome de Hipoventilação da Obesidade (SHO), tendo
ainda maioria dos pacientes (>90%) também apnéia
obstrutiva do sono (AOS)1–3.
Entre 1955-56, foram descritos pacientes com
obesidade, hipersonolência, eritrocitose secundária,
hipertensão pulmonar e cor pulmonale, sendo os primeiros
casos descritos de Apnéia Obstrutiva do Sono (AOS), porém
logo se notou que uma proporção consistente também
apresentava hipoventilação1,4–6. Já em 1909 o presidente
norte-americano William Taft, com os mesmos sintomas,
compara “sua tendência à sonolência ao garoto gordo em
Pickwick.”Antes, entre 1837-1839,Charles Dickens publica
“The Posthumous Papers of the Pickwick Club”, onde o
personagem “fat boy Joe”, apresenta muitos dos sintomas
relacionados aos portadores da síndrome, dentre eles a
sonolência diurna. A partir daí, Sidney Burwell em 1956,
ao descrever um paciente com características semelhantes,
dá nome à síndrome de “Síndrome de Pickwick”, termo em
desuso nos dias de hoje5–7.
A prevalência da SHO na população geral permanece
incerta já que não foram realizados estudos populacionais
para tal. Se aproximadamente 6% da população geral dos
Estados Unidos tem IMC ≥ 40 kg/m2, estima-se que 10 a
20% tenha SHO. Desta forma, 0,6% da população adulta
daquele país teria SHO (1 em 160 adultos na população
geral)1,5,6.
Em relação ao diagnóstico, ressalta-se que é de
exclusão, e deve seguir como regra os 3 critérios
estabelecidos em 1999 pela Academia Americana de
Medicina do Sono:1. Hipoventilação alveolar diurna
(acordado, PCO2 arterial> 45 mmHg); 2.IMC ≥ 30 kg/m2; 3.
Ausência de outras causas de hipoventilação 1,5,6,8,9. Na
maioria dos casos o diagnóstico é estabelecido
tardiamente. É frequente o diagnóstico ocorrer durante
episódio de acentuação da hipoventilação, muitas vezes
em situação de emergência e insuficiência respiratória
aguda. Nestes casos, infecções respiratórias ou mesmo
de partes moles (ex. celulite de membros inferiores) podem
Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016
ser desencadeantes. A grande maioria dos pacientes tem
os sintomas clássicos da AOS (ronco intenso, cansaço,
sonolência diurna). Em contraste, pacientes com SHO
também apresentam dispnéia e sinais de cor
pulmonale(sendo assim a principal causa de morte as
repercussões cardiovasculares secundárias). Os achados
do exame físico podem incluir, pletora facial, cianose de
extremidades,P2 proeminente na ausculta cardíaca
(muitas vezes difícil de ouvir por causa da obesidade) e
edema das extremidades inferiores1,2,5,6,8–17.
Apesar de geralmente utilizada para a avaliação
concomitante de AOS, tendo aí sua importância, o
diagnóstico não depende da realização de uma
polissonografia. O teste definitivo é a gasometria arterial
realizado ao ar ambiente. O nível elevado de bicarbonato
sérico devido à compensação metabólica da acidose
respiratória é comum e aponta para a natureza crônica
da hipercapnia, podendo ser utilizado como teste sensível
para o rastreio da doença (através de gasometria venosa,
de mais fácil acesso e menos dolorosa ao paciente). O
bicarbonato acima de 27 mmol/L sugere hipercapnia,
devendo ser confirmado com a medida da PaCO2. Além
disso, a hipoxemia detectada na oximetria de pulso em
pacientes com distúrbios respiratórios do sono obrigatal
rastreio. Se houver hipercapnia, testes de função pulmonar
e radiografia de tórax devem ser realizados para excluir
outras causas. As provas de função pulmonar podem ser
normais, mas tipicamente revelam um distúrbio restritivo
leve-moderado devido à obesidade, ou até mesmo redução
proporcional de CVF e VEF1, sem evidência objetiva de
restrição, como é visto neste caso. Evidência de obstrução
na prova de função pulmonar exclui o diagnóstico de SHO.
Outros testes laboratoriais devem incluir um hemograma
completo (descartar eritrocitose secundária) e TSH para
excluir hipotireoidismo grave1,2,5,6,8–17. A tabela 1 mostra
os principais diagnósticos diferenciais da SHO:
Tabela 1. Diagnóstico diferencial de Hipoventilação
• Doença respiratória obstrutiva
• Doença intersticial pulmonar grave
• Limitação respiratória mecânica como nas desordens
graves da caixa torácica (p.ex.,Cifoescoliose)
• Condições neuropáticas e miopáticas (p.ex. Esclerose
Lateral Amiotrófica, Distrofia muscular de Duchenne e
miastenia gravis)
• Causas centrais (p.ex. doença cerebrovascular,
Hipotireoidismo severo)
• Síndrome de hipoventilação congênita (p.ex.Síndrome
de Ondine)
• Uso de sedativo-hipnóticos, opiáceos ou álcool.
O mecanismo pelo qual a obesidade leva à
hipoventilação é complexo e não totalmente
compreendido (Figura 2). Vários têm sido propostos,
49
Fig. 2. Fisiopatologia da SHO. Adaptado de Mokhlesi6
Fig.3. Influência dos eventos obstrutivos do sono na hipercapnia. Adaptado
de Mokhlesi(6)
incluindo sobrecarga mecânica do sistema respiratório,
respostas centrais alteradas à hipercapnia e hipóxia,
influência da AOS e anormalidades neuro-hormonais como
a resistência à leptina. A sobrecarga na mecânica
respiratória reduz a complacência da parede torácica e
os volumes pulmonares, incluindo a capacidade residual
funcional. Há também redução da complacência pulmonar
e uma limitação ao fluxo expiratório nas vias aéreas
inferiores, gerando pressão intrínseca positiva à
expiração e aprisionamento aéreo. Estas alterações,
juntamente com a resistência das vias aéreas superiores,
sobrecarregam ainda mais os músculos inspiratórios,
resultando num componente restritivo, limitador à
mecânica ventilatória. Como resultado, maior esforço é
necessário para a manutenção de valores próximos do
normal. A quimiossensibilidade é progressivamente
prejudicada pelo aumento do nível de CO2. A hipercapnia
crônica também resulta da incapacidade de eliminar o
CO2 durante o dia,acumulado à noite em episódios de
apnéias e hipopnéias (Figura 3). Um mecanismo
secundário que também prejudica a quimiossensibilidade
é o aumento do bicarbonato no soro e líquido
cefalorraquidiano. Ainda, a leptina parece exercer papel
importante na fisiopatologia da SHO. A leptina é
estimulante respiratório a nível central. A obesidade leva
à aumento da leptina circulante e secundariamente à
resistência à leptina. Desta forma, se desenvolve uma
inibição ventilatória1,5,6,8,9,16.
50
A maioria dos pacientes com SHO são obesos mórbidos
e têm AOS grave. Tais afetam negativamente na qualidade
de vida, morbidade e mortalidade. A SHO parece ser um
fardo adicional, com qualidade de vida inferior do que
outras doenças hipercápnicas. Pacientes com SHO têm
maior número/hospitalizações prolongadas, necessidade
maior de ventilação mecânica e são mais frequentemente
transferidos para unidades de cuidados críticos. A
prevalência de SHO entre pacientes adultos hospitalizados
com IMC ≥ 35 kg/m²pode chegar à 31%2,8–11,13–19.
A pressão positiva de via aérea (por meio de um nível via
CPAP - pressão positiva contínua de via aérea ou de dois
níveis por NPPV – ventilação por pressão positiva nãoinvasiva) é o tratamento de escolha e melhora a ventilação
alveolar por meio de diminuição da resistência das vias aéreas
superiores, alívio da carga muscular ventilatória e/ou aumento
da atuação ventilatória central1,3-6,8,9,11,14,16,17,19-27. Pacientes
com SHO podem ser inicialmente tratados com CPAP se
clinicamente estáveis e PaCO2 não severamente alterada
(<55mmHg). É tipicamente administrada através de
máscara nasal, almofadas nasais e máscaras oronasais.
Alguns estudos mostraram que as máscaras oronasais
são menos eficazes e associadas a uma menor aderência
e maiores efeitos colaterais em comparação com
máscaras nasais 28 . Desta forma, a longo prazo as
máscaras nasais são recomendadas. No paciente crítico
em insuficiência respiratória, máscaras oronasais são
preferíveis.
Em um grande estudo multicêntrico espanhol
controlado-randomizado, NPPV e CPAP foram mais eficazes
do que a modificação do estilo de vida com relação à
melhoria dos sintomas clínicos e parâmetros
polissonográficos, sem diferenças significativas entre
eles, embora NPPV exibiu ligeiramente melhores valores
de função pulmonar3. No entanto, estudos comparativos
de longo prazo são necessários para comparar a NPPV ao
CPAP em relação a variáveis de longo prazo, como duração
da hospitalização, eventos cardiovasculares e
mortalidade. Em pacientes com hipoventilação persistente
ou dessaturação grave apesar da eliminação de eventos
obstrutivos, a ventilação não-invasiva de dois níveis deve
ser experimentada 1,4,8,9,11,16,18–21,23,25–27,29,30. Às vezes, a
suplementação de oxigênio é necessária.
A perda de peso é altamente recomendada e pode
reverter a hipoventilação. Terapia farmacológica para
hipoventilação de obesidade não é utilizada. O consumo
de álcool e sedativos devem ser desencorajados 5,6,8,9,16 .Oxigenoterapia isolada não é apropriada
mesmo em eventos agudos por não reduzir número de
eventos obstrutivos, poder promover maior retenção de
CO2 noturno (Efeito Haldane e Ventilação espaço-morto) e
piorar a qualidade do sono 5,6,9,10,12,16-18 . Quanto às
flebotomias, não existem estudos em pacientes com SHO.
Em geral se utiliza as indicações para cardiopatas e
pneumopatas (Hematócrito > 65% ou sintomas de
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hiperviscosidade). A traqueostomia, apesar de ter sido o
primeiro tratamento instituído, tem seu espaço reservado
apenas para aqueles casos refratários, em virtude de risco
e complicações inerentes ao procedimento e ao pacienteo
beso5,6,8,9.
Em relação às descompensações agudas, em pacientes
que se apresentam com sinais clínicos de narcose e acidose
hipercápnica deve-se iniciar prontamente ventilação
positiva de via aérea. A ventilação não invasiva em um
ambiente monitorado, sendo o paciente candidato
aceitável para tal (capaz de cooperar, proteger suas vias
aéreas, hemodinamicamente estável, pH arterial maior do
que 7,20) deve ser iniciada.
Os erros de conduta mais comuns no tratamento da
SHO são22:Uso excessivo de Oxigênio Complementar –
acarreta em maior retenção de CO2; Uso excessivo de
diurético de alça - são comumente acometidos por quadros
cardíacos secundário, o que indica o uso de diurético de
alça no tratamento inicial destes, porém o uso excessivo
pode levar à um quadro de Insuficiência Renal Aguda prérenal e alcalose metabólica, indicando-se o uso
monitorado desta droga; Uso excessivo de psicotrópicos promovem uma maior colapsabilidade da via aérea e
diminuem a resposta ventilatória. A confusão diagnóstica
com DPOC e insuficiência cardíaca congestiva é frequente
- Um estudo retrospectivo mostrou que pacientes obesos
mórbidos admitidos em unidade de terapia intensiva por
insuficiência respiratória secundaria à SHO tinham
diagnóstico e tratamento errôneo de DPOC em 75% dos
casos e 86% estavam sendo tratados para insuficiência
cardíaca congestiva13.
Os objetivos da terapia na SHO são reverter as
principais anormalidades fisiológicas que dão origem à
doença, ou seja, normalizar a respiração durante o sono,
reduzir o peso e melhorar a condição respiratória. As
metas terapêuticas para pacientes com SHO incluem a
normalização da PaCO2 durante a vigília e no sono, a
prevenção da dessaturações durante o sono e vigília, o
controle da eritrocitose, da hipertensão pulmonar e do cor
pulmonale, e o alívio da hipersonia3-6,8,9,12,14,16,18,19,21,23,25,29. A
fraca aderência à pressão positiva será associada à
melhora clínica incompleta. Esta pode ser avaliada através
da revisão do cartão de memória do dispositivo.
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