Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 1 2 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Diretoria SOCIEDADE PAULISTA DE PNEUMOLOGIA E TISIOLOGIA BIÊNIO 2016/2017 Presidente: Regina Maria de Carvalho Pinto Vice-Presidente: Roberto Rodrigues Júnior Secretária Geral: Silvia Carla Souza Rodrigues 1ª Secretária: Roberta Pulcheri Ramos Diretora de Finanças: Frederico Leon Arrabal Fernandes Diretor de Assuntos Científicos: Willian Salibe Filho Diretor de Divulgação: Angela Honda de Souza Diretor Assuntos do Interior: Ciro de Castro Botto Diretor de Informática: Claúdio Ricardo Frison Pediatria: Marina Buarque de Almeida Adyleia Aparecida Dalbo Contrera Toro Claudine Sarmento da Veiga COMISSÕES CONSELHO FISCAL Defesa Profissional: Lilia Azzi Collet da Rocha Camargo Ensino: Suzana Erico Tanni Minamoto Promoções: Luis Renato Alves Assuntos da Grande São Paulo: Lilian Ballini Caetano Publicações: Rodrigo Abensur Athanazio Efetivos: Élcio dos Santos Oliveira Vianna João Marcos Salge Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano DEPARTAMENTOS Cirurgia Torácica: Marcos Naoyuki Samano Celso Murilo Nálio Matias de Faria Erika Rymkiewicz Fisioterapia Respiratória: Luciana Dias Chiavegato Adriana Claudia Lunardi Lara Maris Nápolis Goulart Rodrigues Suplentes: Ricardo Mingarini Terra Liana Pinheiro dos Santos Maria Raquel Soares CONSELHO DELIBERATIVO Ex-Presidentes Endoscopia Respiratória: Evelise Lima Felipe Nominando Diniz Oliveira Viviane Rossi Figueiredo Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 3 REGIONAIS SUB-COMISSÕES Regional do ABC Presidente: Claudia Maria de Medeiros Pacheco Secretária: Mônica Silveira Lapa Asma - Maria Amélia Carvalho da Silva Santos Regional de Araraquara / Bauru / Botucatu Presidente: Marcos Abdo Arbex Secretário: José Eduardo Bergami Antunes Circulação - Caio Júlio Cesar dos Santos Fernandes Regional de Campinas Presidente: Mauricio Sousa de Toledo Leme Secretário: Paulo Roberto Tonidandel Câncer - Teresa Yae Takagaki Distúrbios Respiratórios do Sono - Pedro Rodrigues Genta Doenças Intersticiais - Regina Célia Carlos Tibana D.P.O.C. - José Gustavo Barian Romaldini Epidemiologia - Maria Cecília Nieves Teixeira Maiorano Regional de Marília Presidente: Gisele César de Rossi Agostinho Secretária: Maria de Lourdes Marmorato Botta Hafner Infecções Respiratórias e Micoses - Mauro Gomes Pleura - Ricardo Milinavicius Regional de Ribeirão Preto Presidente: Adriana Ignácio de Pádua Secretária: Fabíola Galhardo Rizzatti Regional de Santos Presidente: Alex Gonçalves Macedo Secretário: Thiago Fernandes Leomil Doenças Ambientais e Ocupacionais - Ubiratan de Paula Santos Tabagismo - Aldo Agra de Albuquerque Neto Terapia Intensiva - Eduardo Leite Vieira Costa Tuberculose - Suzana Pimenta Regional de São José dos Campos Presidente: José Eduardo de Oliveira Secretária: Márcio Adriano Leite Bastos Função Pulmonar - Andréa Gimenez Regional de São José do Rio Preto Presidente: Clélia Margarete Trindade Borralho Secretário: Leandro Cesar Salviano Doença Pulmonar Avançada - José Eduardo Afonso Júnior 4 Imagem - Gustavo de Souza Portes Meirelles Exercício e Atividade Física - André Luis Pereira de Albuquerque Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Apresentação A atualização clínica é um desafio constante para o médico pneumologista nos dias atuais. Novos entendimentos fisiopatológicos, novas doenças e avanços terapêuticos se somam no dia a dia de atendimento do consultório, dificultando o constante aprimoramento do conhecimento. Nesta edição, buscamos facilitar esta busca por atualização através de um formato com leitura mais fácil baseado em casos clínicos. Diversos autores foram convidados a apresentar a descrição de um caso clínico seguido de uma breve revisão sobre o tema, explorando as mais diversas áreas da pneumologia. Editores Editor-chefe: Rodrigo Abensur Athanazio Editores-executivos: Roberto Rodrigues Junior William Salibe Filho Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 5 Índice Estridor laringeo: um desafio do diagnóstico ao tratamento ............................................................................................................. 7 Laryngeal stridor: a challenge of diagnosis to treatment Hipertensão Pulmonar - o desafio do seu manejo .............................................................................................................................. 15 Pulmonary Hypertension - The Challenge of Its Management Co-infecção crônica pulmonar: algumas possibilidades diagnósticas .......................................................................................... 18 Chronic lung co-infection: some diagnostic possibilities Dispneia progressiva em paciente jovem ............................................................................................................................................. 22 Progressive dyspnea in young patient Uma pneumonia incomum? .................................................................................................................................................................... 26 Uncommon pneumonia? Agenesia pulmonar unilateral direita, dextrocardia e pneumotórax: uma rara associação .......................................................... 29 Right unilateral pulmonary agenesis, dextrocardia and pneumothorax: a rare association Síndrome Fibrose/Enfisema Pulmonar associada à Hepatopatia ..................................................................................................... 32 Fibrosis / emphysema pulmonary syndrome associated with liver disease Dispneia em paciente com Lúpus Eritematoso Sistêmico ................................................................................................................. 36 Dyspnea in a Patient with Systemic Lupus Erythematosus Bronquiectasia: uma história não contada ......................................................................................................................................... 39 Bronchiectasis: an untold story Sibilância na infância: todo cuidado é pouco! ................................................................................................................................... 43 Wheezing in childhood: all care is short! A espirometria é normal, e agora? ......................................................................................................................................................... 46 Spirometry is normal, now what? Aquele sono pesado... ............................................................................................................................................................................. 48 That heavy sleep 6 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Estridor laringeo: um desafio do diagnóstico ao tratamento Laryngeal stridor: a challenge of diagnosis to treatment José Gustavo Barian Romaldini1; Leandro Picheth Eloy Pereira2 Médico assistente da disciplina de pneumologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo 2 Cirurgião Torácico Especialização InCor-HCFMUSP Complementação Especializada Cirurgia da Parede Torácica e Mediastino 1 Caso Clínico O caso trata-se de uma paciente feminina de 52 anos, natural e procedente de São Paulo, professora, trazida PS de um Hospital da capital no dia 17/02 após crise súbita de asma enquanto dirigia. Refere ter apresentado quadro de síncope levando a colisão do auto. Durante internação apresentou novo episódio de dispneia intensa, sendo transferida para UTI. Crise com duração de cerca de 3 minutos. Sendo solicitado avaliação e acompanhamento da Pneumologia. Como antecedentes apresentava prematuridade, diagnóstico de asma grave após internação hospitalar prolongada há menos de 6 meses por pneumonia grave, pneumonia de repetição com três internações prévias, sem história de atopia. Quadro de tosse e dor torácica em investigação. Negava história de tabagismo, etilismo ou drogadição. No momento da avaliação apresentava-se já assintomática a e com ausculta respiratória normal, porém durante avaliação apresentou nova crise com dispneia intensa, súbita associada a tosse e estridor laríngeo com duração de cerca de 2 minutos Trazia exames realizados antes desta internação: angiotomografia de tórax (27/06/2015), que mostrava discretas opacidades parenquimatosas e atelectásias laminares em campos posteriores, negativo para tromboembolismo pulmonar. Broncoscopia de 06/07/2015 com alteração compatível com compressão extrínseca do brônquio do LIE, e em 06/ 10/2015 sem tal compressão descrevendo apenas sinais de laringite posterior e traqueobronquite aguda. Realizou Ecocardiograma com função sistólica preservada, teste ergométrico e cateterismo cardíaco com coronariografia dentro da normalidade. A prova de função pulmonar de 23/07/2015 mostrava um distúrbio ventilatório inespecífico leve. Realizou Rx de tórax durante a internação atual também normal. José Gustavo Barian Romaldini Rua lord cockrane, 820 ap 74c Ipiranga, São Paulo Cel. 98912-4612 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 7 Devido ao inicio súbito e duração curta associado a ao estridor laríngeo e ausculta respiratória normal foi questionado o diagnóstico até então de crise asmática e levantada hipóteses diagnósticas de traqueobroncomalácia ou discinesia de pregas vocais. Solicitado nasofibroscopia e tomografia de tórax com cortes em inspiração e expiração. Iniciado uso de esomeprazol (80mg/dia), Motilium (10mg; 03x/dia), Rivotril (01mg, 12/12h), Escitalopram (10mg/dia), mantido formoterol/budesonida, suspenso antibioticoterapia e corticoides sistêmicos. Nasofibroscopia sem alteração de motilidade de pregas vocais, hipertrofia e conchas nasais (+/4+), laringite posterior. A tomografia não evidenciou alterações significativas parenquimatosas e sem sinais de cola amento de traqueia ou brônquios que sugerissem malácia. Persistia com crises de laringoespasmo recorrentes inclusive com aumento da frequência das crises, agora desencadeadas aos mínimos esforços ou a expiração forçada. Fez nova com laringotraqueobroncoscopia, agora dirigido para pesquisa de discinesia de pregas vocais, com avaliação dinâmica da laringe, que evidenciou durante a inspiração movimentos paradoxais das pregas vocais com obstrução intermitente da fenda glótica o que é compatível com o diagnóstico de discinesia de pregas vocais . Porém durante exame dinâmico, apresentou também “tosse em explosão” sugestiva de traqueomalácia. Apresentava também sinais de rinossinusite. Após confirmação diagnóstica de discinesia de pregas vocais foi ajustado tratamento já instituído e iniciado antibioticoterapia para rinossinusite. A paciente manteve piora das crises, mesmo com tratamento otimizado. Foi readmitida em UTI no dia 14/03 após crise mais acentuada e persistente (melhorou apenas com dormonid EV). Diante do quadro de piora clínica progressiva, optado por realizar traqueostomia. Mesmo após traqueostomia a paciente ainda apresentava crises de tosse associada a estridor o que é incompatível com diagnóstico de discinesia de pregas vocais. Em 16/03/2016, fez nova TC de tórax, essa sendo realizada em vigência da crise, com achado de redução do calibre da traqueia distal e brônquios principais, com abaulamento posterior, tanto nas imagens em inspiração quanto em expiração. L L Optado por colocação de prótese traqueal em tubo T (Montgomery), com ramo distal longo. Cursou com melhora sintomática importante, recebendo alta hospitalar. 8 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 (figuras abaixo). Usando a ótica para guiar a introdução do tubo, foi possível o posicionamento, seletivando o tubo à esquerda, através do traqueostoma. Optado por não utilizar um tubo de duplo lúmen, pois diâmetro maior pode interferir na sutura da parede membranosa. A paciente precisou ser novamente internada por infecção vias aéreas/ prótese traqueal e dor cervical. Cultura + para acinetobacter produtor de carbapenemas. Iniciou Polimixina b por 7 dias com melhora parcial, permanecendo sempre bastante secretiva. Optado por iniciar Gentamicina inalatória Apresentou melhora da secreção. Recebeu alta hospitalar com Gentamicina inalatória 2 x dia de uso continuado. Manteve-se bem por algum período, porém voltou a cursar com aumento do volume da expectoração de forma persistente Nova discussão do caso, sendo optado por indicar abordagem cirúrgica, a traqueobroncoplastia, com reforço posterior da traqueia torácica e brônquios principais direito e esquerdo. Paciente foi posicionada em decúbito lateral esquerdo. Realizada toracotomia póstero-lateral direita, abertura no quarto espaço intercostal. Ligadura da veia ázigos. Abertura da pleura mediastino, dissecção e exposição de toda traqueia torácica, e dos brônquios principais direito, até o brônquio intermédio, e brônquio principal esquerdo até bifurcação dos brônquios do lobo superior e inferior. O procedimento cirúrgico Após a indução anestésica e passagem de cateter peridural, retiramos a prótese traqueal, tubo T. Na tentativa de realizar intubação seletiva à esquerda, com tubo simples, identificado dificuldade para seletivação do tubo à esquerda, mesmo com o auxílio da broncoscopia. Decidido por passar uma ótica pelo orifício da traqueostomia, com a realização de uma traqueoscopia rígida. Identificado importante colabamento traqueal, com obstrução completa do óstio do brônquio principal esquerdo Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Fig.: Foto esquemática do acesso cirúrgico, e exposição da traqueia torácica e brônquios (Wright CD. Tracheal Surgery: Posterior Splinting Tracheoplasty for Tracheomalacis. Operative Techniques in Thoracic and Cardiovascular Surgery 20:31-45, 2015 9 Foto da exposição da traqueia torácica e brônquios principais direito e esquerdo. Observa-se o alargamento da parede posterior da traqueia e brônquios. para a traqueia, e cerca de 1,5cm de largura para os brônquios principais. Passado os pontos da borda esquerda da prótese de polipropileno, aproximado e amarrado. Seguiu com a passagem dos pontos, dois pontos, da parede membranosa, e o ponto da extremidade direita do anel traqueal, que já estava passado na traqueia, na prótese. Amarrado os pontos na sequência. A sutura foi feita no sentido craniocaudal, com distância aproximada de 0,8cm. No brônquio principal direito, o reforço posterior se estendeu até o brônquio intermédio, próximo de sua bifurcação. À esquerda foi até a bifurcação dos brônquios do lobo superior e inferior. Foto do reforço completo da parede posterior da traqueia. Figura: Desenho esquemático do reforço posterior da traqueia torácica e brônquios. Wright CD, Grillo HC , Hammoud ZT, Wain JC, Gaissert HA, Zaydfudim V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for Expiratory Collapse of Central Airways; Ann Thorac Surg 2005; 80:259–67 Realizado os pontos da sutura da parede posterior com PDS 4-0 e poliglactina (Vicryl) 4-0. Iniciou-se a passagem dos pontos na extremidade esquerda no anel traqueal e após na extremidade direita do anel. Utilizada a tela de polipropileno, uma tira de 2,5 cm 10 Figura: Reforço posterior da traqueia torácica e brônquios completo. Wright CD. Tracheal Surgery: Posterior Splinting Tracheoplasty for Tracheomalacis. Operative Techniques in Thoracic and Cardiovascular Surgery 20:31-45, 2015 Optado por cobrir o esôfago que ficaria em contato com a tela de polipropileno com patch de pleura autóloga, conforme Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 demonstrado na foto acima (aspecto cirúrgico final). A paciente foi extubada no centro cirúrgico, e encaminhada para o pós-operatória para unidade de terapia intensiva. Neste momento foi mantida traqueostomia. Cursou no pós-operatório, com piora infecciosa e derrame pleural à direita, com necessidade de drenagem pleural Realizada nova a broncoscopia que mostrou aumento da luz traqueal, porém com presença de secreção mucopurulenta de moderada quantidade, sendo feito toalete brônquico. Evoluiu com melhora clínica progressiva, após inicio de antibioticoterapia com resolução do quadro infeccioso. Retirado dreno pleural. Optado por nova avaliação endoscópica, sendo evidenciado melhora significativa da luz traqueal e dos brônquios principais direito e esquerdo, e ausência de secreção. Neste momento feito a decanulação. Paciente se com melhora importante dos sintomas respiratórios, e da qualidade de vida. Sem novas internações hospitalares até 05 meses de seguimento. Broncoscopia realizado após 05 meses da cirurgia mostrou traqueia de calibre preservado, com mobilização próxima da fisiológica com a tosse. A Carina e óstios dos brônquios principais direito e esquerdo de diâmetro preservados. Mucosa de aspecto preservado (fotos abaixo). Traqueia distal A tomografia de tórax neste período, com o diâmetro das vias aéreas principais preservadas. Melhora significativa em relação à pré-operatória. Discussão A discinesia de prega vocal (DPV) é por definição a adução paradoxal das cordas vocais na inspiração e / ou início da expiração com leve fenda posterior É uma alteração funcional, não orgânica, sem base anatômica com movimentação paradoxal e involuntária das pregas vocais1 Está muito relacionada a desordens psicogênicas (teoria da conversão)1e também relacionada a doença do refluxo gastresofágico1(teoria do refluxo) A DPV é um diagnóstico diferencial de asma 2 , principalmente em pacientes com asma de difícil controle e deve ser investigada quando: • Sintomas e sinais de obstrução de vias aéreas superiores • Sintomas obstrutivos intensos com parâmetros físicos e exames complementares normais • Hospitalizações frequentes • Exame radiológico de tórax normal e ausência de hiperinsuflação nas crises • Intubação e/ou traqueostomia de urgência • Precipitação ou piora das crises após conflitos emocionais • Estridor inspiratório • Falta de resposta a broncodilatadores; Asma refratária • Frequentes atendimentos em serviços de urgência simulando • Melhora dos sintomas durante o sono, na distração e após sedação • Ausência e história pessoal e familiar de alergia O Tratamento deve ser individualizado e pode incluir fonoterapia, psicoterapia, técnicas de relaxamento, uso de antidepressivos e ansiolíticos, terapia anti refluxo gastresofágico e até uso de toxina botulínica. Deve-se cessar o uso de medicamentos desnecessários, como medicações para asma e explicar claramente a patologia para o paciente. Traqueobroncomalácia Crina e óstios dos brônquios principais A traqueia normal tem uma relativa complacência e elasticidade permitindo alguma variação no seu diâmetro3. Pode reduzir sua luz em 13-14% nas porções média e proximal durante expiração forçada4,9. Traqueomalácia, traqueobroncomalácia, colapso dinâmico excessivo da via aérea, ou colapso expiratório da via aérea central são diferentes termos que descrevem o estreitamento da luz traqueal. Tem uma prevalência estimada de 4 – 23% dos pacientes que são submetidos à broncoscopia 10,11. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 11 Expiração Inspiração Figura: Influência da inspiração e expiração nas vias aéreas intra e extratorácica (Pearson’s Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008) A traqueomalácia descreve a perda ou redução da sustentação e da rigidez da cartilagem traqueal com consequente obstrução da via aérea5 um aumento patológico da complacência traqueal que leva à um colapso excessivo da via aérea com as variações fisiológicas da traqueia intratorácica3. Etiologia A traqueomalácia pode ser congênita ou adquirida3. As alterações congênitas incluem: defeitos cartilaginosos segmentares congênitos, malformações vasculares, traqueobroncomalácia primária, síndrome de traqueobroncomegalia. Defeitos cartilaginosos segmentares congênitos é uma causa rara, decorrente da agenesia ou malformação dos anéis cartilaginosos. Mais comum na árvore brônquica. As malformações vasculares são causa comum de traqueomalácia segmentar congênita. Artérias anômalas exercem compressão extrínseca na cartilagem em desenvolvimento, com desenvolvimento inadequado dos anéis cartilaginosos. Traqueobroncomalácia primária ocorre sem compressão extrínseca traqueal. Mais frequente em crianças prematuras, mas pode ocorrer em crianças saudáveis isoladamente. Deve-se ao desenvolvimento inadequado da cartilagem. Geralmente se resolve espontaneamente nos primeiros um a dois anos de idade, mas pode ser necessário intervenção invasiva. Síndrome de traqueobroncomegalia se refere à uma dilatação difusa da árvore traqueobrônquica, por vezes compromete da laringe aos brônquios subsegmentares. Conhecido também como diverticulose traqueal , ou síndrome de Mounier-Kuhn, que foi descrita pela primeira vez em 1932. A causa é desconhecida. Existe uma diminuição no número de fibras elásticas das vias aéreas. Há a associação com outras doenças do tecido conjuntivo. 12 Figura: Aparência broncoscópica na síndrome de Mounier-Kuhn (Pearson’s Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008) As causas adquiridas são decorrentes de trauma de via aérea, compressão extrínseca prolongada, ou quadros inflamatórios 3. As causas pós-trauma são decorrentes de lesões que geram perda ou dano aos elementos cartilaginosos, ou distensão excessiva da parede membranosa. A mais comum é a lesão relacionada à intubação, podendo ser por cicatrização inadequada do estoma da traqueostomia, torsão da cânula de traqueostomia, pressão por insuflação excessiva do cuff da cânula endotraqueal, ou de traqueostomia. A pressão na mucosa da via aérea compromete sua perfusão, e erosão mecânica. Embora a principal doença de via aérea relacionada por intubação é a estenose é a estenose de traqueia. As duas lesões, estenose e malácia, podem ser vistas associadas3. Outras lesões da mucosa traqueal também podem determinar a formação de malácia. Figura: Desenho esquemático de traqueomalácia segmentar relacionada à intubação endotraqueal com insuflação excessiva do cuff Pearson’s Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008) Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Compressão extrínseca prolongada da traqueia. As lesões cervicais ou mediastinais também podem levar à malácia por comprometimento do fluxo de sangue para os componentes de sustentação cartilaginosos. Exemplos são os bócios mergulhantes, ou aquelas em continuidade com a traqueia, como teratomas, timomas, cistos broncogênicos 3. As causas inflamatórias são a traqueobroncomalácia adquirida, relacionada ao enfisema e bronquite crônica, e à policondrite3. O colapso expiratório da traqueia e brônquios principais é também uma forma de traqueobroncomalácia 4 . Muitas vezes associado com doença pulmonar obstrutiva crônica 5. A fisiopatologia do enfisema pulmonar e da doença pulmonar obstrutiva crônica é multifatorial. A etiologia da traqueobroncomalácia adquirida parece estar relacionada à inflamação crônica, relacionado ao tabagismo ou episódios recorrentes de bronquite3. As alterações estruturais típicas são um alargamento da parede posterior, membranosa, que se torna redundante, e os anéis cartilaginosos perdem a rigidez e a sustentação estrutural, e, portanto, a forma em “C”, tornando-se achatado, descrito com os formatos “crescente” ou em “boca de peixe”. das vias aéreas ocorre em 56% dos pacientes. Uma classificação proposta por Carden e colaboradores, em 2005, também diferenciam as causas congênita das adquiridas, em crianças e adultos 7,8. As etiologias podem ser sumarizadas nas tabelas abaixo: # Traqueomalácia em crianças: D Congênitas: - Idiopática - Prematuridade - Anomalias congênitas da cartilagem - Síndromes congênitas associadas à traqueomalácia - Anomalias congênitas associadas à traqueomalácia D Adquiridas - Intubação prolongada - Traqueotomia - Traqueobronquite severa - Compressão externa Vascular / Cardíaca / Esquelética / Tumores e cistos - Infecção - Pós-traumática # Traqueomalácia em adultos: D Congênitas: - Genética - Idiopática (Síndrome de Monier-Kuhn) D Adquiridas - Após intubação - Pós traqueostomia - Trauma torácico - Pós transplante de pulmão - Enfisema - Infecção ou bronquite crônica - Inflamação crônica - Compressão externa Aaneurisma de aorta / Tumores e cistos / abscessos - Aneis vasculares Diagnóstico Figura: Operative Techniques in Thoracic and Cardiovasculary Surgery 20:31-45 2015 Elsevier Policondrite recidivante é uma doença sistêmica que envolve múltiplas cartilagens do corpo. Mais frequente nas 3º e 4º décadas com incidência equivalentes em homens e mulheres. Doença auto-imune do tecido conjuntivo, secundário à produção de auto anticorpos, desenvolvendo condrite traqueal, e substituição da cartilagem destruída por tecido fibroso. O envolvimento Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Os sinais e sintomas estão associados à obstrução de via aérea em vários níveis da arvora traqueobrônquica e são difíceis de serem identificadas apenas com a avaliação clínica. Portanto os pacientes com sintomas referentes ao colapso das vias aéreas centrais são tratados de maneira similar a aqueles com colapso da árvore distal. Porém a diferenciação destes pacientes é importante, pois os que apresentam o colapso de via aérea central podem se beneficiar da estabilização cirúrgica4. A prova de função pulmonar pode contribuir para esta avaliação. A curva fluxo volume mostra limitação do fluxo expiratório, com preservação do fluxo inspiratório. A curva expiratória mostra um fluxo máximo baixo, com queda próxima à linha de base, com um longo platô até o final da expiração2. 13 Figura mostrando as curvas fluxo-volume de paciente com 57 anos , história de dispnéia progressiva, tosse, sibilos e infecções respiratórias. Préoperatória, e 02 meses após a cirurgia . (Wright CD, Grillo HC , Hammoud ZT, Wain JC, Gaissert HA, Zaydfudim V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for Expiratory Collapse of Central Airways; Ann Thorac Surg 2005;80:259–67) Estudos de imagens tem importante papel no diagnóstico do colapso expiratório das vias aéreas centrais. Aquino e colaboradores mostraram importante diferença nas mudanças do diâmetro da traqueia com a inspiração e expiração, entre pacientes com traqueomalácia e os casos controle9. O diâmetro traqueal nos casos controles teve uma redução de 13 a 14% nas traqueias proximal e média. Enquanto os pacientes com traqueomalácia tiveram uma redução média de 47% na traqueia proximal e 54% na traqueia média. Sugere que uma mudança no diâmetro da traqueia superior à 18% proximal e superior à 28% na traqueia média entre a inspiração e expiração, a probabilidade de traqueomalácia é de 89-100% 9. Uma mudança superior à 30% mostrou ser sensível para detectar traqueomalácia. A broncoscopia realizada no paciente acordado, que pode obedecer a comandos, como inspiração, expiração e tosse, tem importante papel como exame diagnóstico e para planejamento cirúrgico. Assim como pode realizar uma graduação do estreitamento expiratório da via aérea, sendo normal, quando menor que 50%, leve (50 – 75% de colapso), moderado (75 – 100%), e grave com 100% de colapso 12. As desvantagens potenciais da broncoscopia são a limitação da técnica pela manipulação das vias s aéreas, sedação, distorções ópticas, e magnificações, e uma relativa dificuldade de realizar o procedimento em pacientes dispneicos. A avaliação do estreitamento traqueal é subjetiva, e a caracterização das estruturas extratraqueais é difícil10. A tomografia computadorizada é um exame rápido e não invasivo. Permite a avaliação da traqueia, e das estruturas adjacentes, assim como do movimento respiratório 10. Não é necessário a instrumentação das vias aéreas, ou sedação. Diversas informações podem ser avaliadas, como: medidas da área da luz traqueal, diâmetro anteroposterior, e dimensões laterais10. Referências Bibliográficas 1. Morris ML, et al. Vocal Cord Dysfunction. Clinical Pulmonare Medicine 2006 Vol 11, pp73-86 2. Newman AKB, Mason, UG, Schmaling, KB. Clinical features of vocal cord dysfunction. Am J Respir Crit Care Med vol 152, 1995. 3. Ashiku SK, Maddaus MA, Pearson FG. Tracheomalacia. Pearson’s Thoracic and Esophageal Surgery 3rd Edition; 2008. Chapter 22 pp277-293 4. Wright CD, Grillo HC , Hammoud ZT, Wain JC, Gaissert HA, Zaydfudim V, Mathisen DJ. Tracheoplasty for Expiratory Collapse of Central Airways; Ann Thorac Surg 2005;80:259–67 5. Grillo, HC. Tracheobronchial malacia and compression. In: Surgery of the trachea and bronchi. Hamilton, Ontario: BC Decker, 2004:398–401 6. Wright CD. Tracheal Surgery: Posterior Splinting Tracheoplasty for Tracheomalacis. Operative Techniques in Thoracic and Cardiovascular Surgery 20:31-45, 2015 7. Carden KA, Boiselle PM, Waltz DA, et al. Tracheomalacia and tracheobronchomalacia in chidren and adults: an in-depth review. Chest 2005; 127:984–1005. 8. Krugler C, Stanzel F. Tracheomalacia. Thoracic Surgical Clinics 24(2014) 51-58 9. Aquino SL, Shepard JA, Ginns LC, et al. Acquired tracheomalacia:CT changes in tracheal lumen between inspiration and expiration measured by semi-automated cross-sectional area calculations. J Comput Assist Tomogr 2001;25:394–9. 10. Leong P, Bardin PG, Lau KK. What´s the name? Expiratory tracheal narrowing in adults explained. Clinical Radiology 68 (2013) 1268e1275 11. Murgu S, Colt H. Tracheobronchomalacia and excessive dynamic airway collapse. Respirology 2006;11:388e406. 12. Murgu S, Colt H. Description of a multidimensional classification system for patients with expiratory central airway collapse. Respirology 2007;12:543e50. 13. Majid, Gaurav, Sanchez, et al. Evaluation of Tracheobronchomalacia by Dynamic Flexible Bronchoscopy - A Pilot Study Ann Am Thorac Soc Vol 11, No 6, pp 951–955, Jul 2014 Fig: Majid, Gaurav, Sanchez, et al. Evaluation of Tracheobronchomalacia by Dynamic Flexible Bronchoscopy - A Pilot Study Ann Am Thorac Soc Vol 11, No 6, pp 951–955, Jul 2014 14 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Hipertensão Pulmonar - o desafio do seu manejo Pulmonary Hypertension - The challenge of its management Fernanda Maria Pinheiro Machado Nogueira1; Carlos Gustavo Yuji Verrastro2 ; Celia Camelo Silva3; Jaquelina Sonoe Ota Arakaki4 1 Residente da Disciplina de Pneumologia – Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP 2 Radiologista da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP e do Grupo Fleury 3 Coordenadora do Serviço de Cardiologia Pediátrica; Ecocardiografista e Hemodinâmicista Pediátrica da Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP 4 Coordenadora do Grupo de Circulação Pulmonar da Disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP Relatamos o caso de um paciente do sexo masculino, 27 anos, natural e procedente de São Paulo, trabalhava como técnico de leitura da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo. Há 4 anos, iniciou quadro de dispneia progressiva aos esforços associada à síncope nos últimos meses. Há 2 anos com edema e hiperemia de face ao deitar. Negava comorbidades, uso de medicações, exposições, tabagismo e etilismo. Ao exame físico encontrava-se em bom estado geral, porém com pletora facial e turgência jugular, além de circulação colateral visível em parede anterior do tórax. Apresentava PA= 120 x 80mmHg, FC= 80 bpm, f=20 irpm e SpO2= 97% em ar ambiente. Ausculta pulmonar normal e ausculta cardíaca com sopro sistólico em foco tricúspide (+/6+) e desdobramento fixo de B2. Radiografia tórax evidenciava tronco da artéria pulmonar retificado, sem alterações significativas em parênquima pulmonar; Ecocardiograma apresentava aumento de ventrículo direito em grau importante e pressão sistólica da artéria pulmonar estimada em 54mmHg (Velocidade de Refluxo da Tricúspide de 3,1 m/s). Na tomografia de tórax observava-se opacidade com atenuação de partes moles na região mediastinal, envolvendo as estruturas vasculares mediastinais, a traquéia e o esôfago, com focos de calcificação de permeio, promovendo afilamento dos ramos principais da artéria pulmonar e das veias pulmonares superiores bilaterais. Tomografia de abdome excluiu sinais de fibrose retroperitoneal. Realizou PET/ CT (figura 1) evidenciando tecido fibrosante dentro do mediastino estreitando traquéia e artérias pulmonares sem captação de FDG em PET / CT. Além disso, paciente realizou sorologia para histoplasmose e PPD negativos; IgA, IgG e IgG4: normais. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Fig.1 – PET/TC evidenciando tecido fibrosante dentro do mediastino estreitando traquéia e artérias pulmonares sem captação de FDG em PET / CT. Há acúmulo aumentado de FDG na parede do ventrículo direito (VD), devido a disfunção do VD. Presença de stent em ramo principal da artéria pulmonar esquerda. Imagem cedida por Dr Gustavo Meireles (radiologista do Grupo Fleury) Paciente apresentava critérios clínicos e tomográficos compatíveis com o diagnóstico de Mediastinite Fibrosante com provável hipertensão pulmonar avaliada pelo ecocardiograma. Devido a gravidade da doença, a presença de sintomas compatíveis com síndrome da veia cava superior e baixo débito, iniciou-se a anticoagulação e posteriormente foi submetido à angioplastia pulmonar de artéria do lobo inferior direito (figura 2) e colocação de stent em artéria pulmonar esquerda (figura 1 e 2), evoluindo com melhora dos sintomas de baixo débito. A Mediastinite Fibrosante (MF) é uma doença rara, de alta morbidade, caracterizada pela proliferação anormal de tecido fibroso no mediastino, com compressão de estruturas broncovasculares. Apresenta incidência igual entre homens e mulheres sendo mais comum em jovens1. 15 Fig. 2- Angiografia pulmonar pré (A) e pós (B) angioplastia de artéria do ramo do lobo inferior direito. Angioplastia pulmonar e colocação de stent em artéria pulmonar esquerda (C e D). As manifestações são variáveis, sendo as mais comuns: dor retroesternal, tosse, síndrome da veia cava superior, disfagia, dispneia progressiva, hemoptise, atelectasia e pneumonite obstrutiva. O diagnóstico é dado por meio de quadro clínico sugestivo e alterações tomográficas compatíveis. A MF pode resultar de reação de hipersensibilidade a fungos, bactérias, micobactérias ou outros antígenos desconhecidos ( doenças granulomatosas) , como também pode secundária a doenças não granulomatosas, como radioterapia, Doença de Behçet ou a drogas. A causa pode ser desconhecida (idiopática) ou estar associada a doença relacionada a IgG4)2. Ressalta-se a importância do diagnóstico diferencial com neoplasias que acometem o mediastino. A MF secundária a doença relacionada a IgG4 é caracterizada por processo fibroinflamatório, com sobreposição de aspectos clínicos e radiológicos, sendo que os pacientes acometidos podem apresentar outras manifestações como como fibrose retroperitoneal, colangite esclerosante, tireoidite Riedel2,3. Um estudo concluiu que um terço dos pacientes com mediastinite fibrosante por histoplasmose ou doença granulomatosa apresentam características histopatológicas da doença relacionada a IgG4. Ainda não está claro se as alterações ocorrem como resposta imune do hospedeiro contra o histoplasma ou se representam uma manifestação da doença relacionada a IgG42. A hipertensão pulmonar é uma complicação grave causada por compressão extrínseca das artérias e/ou veias pulmonares e não há evidências de benefício de fármacos utilizados para o tratamento da hipertensão arterial pulmonar4. O PET/CT pode auxiliar na diferenciação entre MF e 16 condições neoplásicas ou inflamatórias. O exame ainda pode ser realizado para controle de tratamento e avaliação de resposta5,6. O tratamento poderá ser clínico direcionado a doença de base, porém geralmente com resultados espúrios, ou por meio de intervenção invasiva, seja cirúrgica 7,8 ou endovascular ( angioplastia com balão na artéria pulmonar, prótese endovascular)9,10 porém os efeitos hemodinâmicos e a eficácia a longo prazo são desconhecidos. Pacientes com MF associada à doença relacionada a IgG4 podem se beneficiar do uso de corticóide. Alguns relatos demonstraram a presença de acúmulo de linfócitos B CD20 em amostras de tecido da MF, com redução da lesão com Rituximabe, porém mais estudos são necessários para comprovar sua eficácia11. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. Peikert T, Colby TV, Midthun De, Pairolero PC, Edell ES, Schroeder DR, Specks U. Fibrosing mediastinitis: clinical presentation, therapeutic outcomes, and adaptive immune response. Medicine (Baltimore). 2011;90(6):412-23. 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Takalkar AM, Bruno GL, Makanjoula AJ, El-haddad G, Lilien DL, Payne DK. A Potential Role for F-18 FDG PET/CT in Evaluation and Management of Fibrosing Mediastinitis. Clin Nucl Med. 2007;32(9):703-6. 7. Brown Ml, Cedeno AR, Edell ES, Hagler DJ, Schaff HV. Operative strategies for pulmonary artery occlusion secondary to mediastinal fibrosis. Ann Thorac Surg. 2009;88(1):233-7. 8. Ojeifo O, Gilotra NA, Kemp CD, Leventhal A, Resar J, Zehr KJ, Jones S. Mediastinal Fibrosis of the Pulmonary Artery Secondary to Tuberculosis. Ann Thorac Surg. 2015;100(3):e49-50. 9. Valentin LI, Kuban JD, Ramanathan R, Whigham Cj. Endovascular Treatment of Bilateral Pulmonary Artery Stenoses and Superior Vena Cava Syndrome in a Patient with Advanced Mediastinal Fibrosis. Tex Heart Inst J. 2016;43(3):249-51. 10. Ponamgi SP, Desimone CV, Lenz CJ, Coylewright M, Asirvatham SJ, Holmes DR, Packer DL. Catheter-based intervention for pulmonary vein stenosis due to fibrosing mediastinitis: The Mayo Clinic experience. 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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 17 Co-infecção crônica pulmonar: algumas possibilidades diagnósticas Chronic lung co-infection: some diagnostic possibilities Jonas Atique Sawazaki1 e Ricardo de Souza Cavalcante2 1 Residente de infectologia – Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico por Imagem – Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP 2 Médico infectologista do Hospital das Clínicas de Botucatu e Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico por Imagem da Faculdade de Medicina de Botucatu– UNESP Endereço: Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico por Imagem – Faculdade de Medicine de Botucatu – UNESP Palavras-chave: paracoccidioidmicose, tuberculose, diagnóstico Key words: paracoccidioidomycosis, tuberculosis, diagnosis Relato de caso Paciente pardo, do sexo masculino, 36 anos de idade, foi admitido com quadro de tosse produtiva com expectoração amarelada há quatro meses associada à perda de peso não aferida e febre. Também apresentava dispneia, com piora nos últimos cinco dias. Referia a presença de lesões em nariz, lábio e supercílio direito que acreditava ser decorrentes de queimaduras térmicas. Natural e procedente de Botucatu-SP, morador de rua, usuário ativo de crack e etilista (1,5 litro de destilado por 11 anos). Já viveu em zona rural. Negava outras doenças e antecedentes. Na admissão apresentava-se em regular estado geral, magro, desidratado, febril (37,9°C), orientado, com pressão arterial de 100/60 mmHg, taquipneico (42 rpm), taquicárdico (130 bpm) e saturação periférica de O2 de 78% em ar ambiente. Presença de lesões ulceradas com crosta em asa nasal esquerda, lábio superior esquerdo, pavilhão auditivo esquerdo e supercílio direito e lesão ulcerada em palato mole recoberta por secreção purulenta. Expansibilidade torácica reduzida globalmente, murmúrio vesicular presente em todo o tórax, porém diminuído em ápices e crepitações finas difusas bilateralmente. Restante do exame sem alterações. Ricardo de Souza Cavalcante Av. Prof. Mário Rubens Guimarães Montenegro, s/n, Bairro: UNESP -Campus de Botucatu, CEP:18618687 - Botucatu, SP. Telefone: +55 14 38801291 Email: [email protected] 18 A gasometria arterial em ar ambiente revelava alcalose respiratória (pH=7,47 e pressão parcial de CO2=31,5 mmHg) e hipoxemia (pressão parcial de O2=56,8 mmHg). O hemograma apresentava anemia microcítica e hipocrômica (hemoglobina de 8,0 g/dL, hematócrito de 30,5%, volume corpuscular médio de 77,2 µmm³, hemoglobina corpuscular média de 20,4 pg), plaquetas normais (431000/mm 3) e leucocitose com neutrofilia (23660 leucócitos com 19800 neutrófilos). Proteína C reativa (34,2 mg/dL) e velocidade de hemossedimentação (120 mm/h) apresentavam-se elevadas. Função renal e enzimas hepáticas normais. A radiografia simples de tórax revelava infiltrado intersticial difuso (Figura 1) e na tomografia de tórax cavernas, nódulos centrolobulares com padrão de árvore em brotamento e áreas com opacidades em vidro fosco (Figura 2). Fig. 1. Radiografia simples de tórax póstero-anterior e perfil: presença de infiltrado intersticial difuso, mais proeminente em terço médio à direita. Foi iniciado suporte ventilatório com concentração de oxigênio de 50% em máscara de Venturi e introduzido terapia antibiótica com amoxicilina + clavulanato e azitromicina intravenoso. Realizado coleta de baciloscopia de escarro que revelou 10 a 99 bacilos álcool ácido resistentes por 100 campos de imersão. A cultura de escarro colhida na Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Fig. 2. Tomografia de tórax: presença de cavernas em ápices e uma caverna em lobo inferior do pulmão esquerdo, algumas com nível hidroaéreo, nódulos centrolobulares com padrão de árvore em brotamento, algumas áreas com opacidades em vidro fosco. admissão identificou complexo Mycobaterium tuberculosis. O exame micológico direto de escarro revelou presença de células fúngicas típicas de Paracoccidioides spp, assim como o exame citopatológico do escarro que encontrou leveduras não associadas a hifas sugestivas de Paracoccidioides spp pela coloração de Gomori Grocotti. Também foi realizada biópsia da lesão em asa nasal cujo exame histopatológico foi conclusivo para paracoccidioidomicose. A pesquisa de anticorpos anti-P. brasiliensis realizada pelo teste de imunodifusão dupla em gel de ágar revelou o título de 1:4. A despeito destes diagnósticos foi mantido terapia antibiótica com amoxicilina-clavulanato e azitromicina pela possibilidade de pneumonia bacteriana secundária. Diante da coinfecção foram introduzidas a associação sulfametoxazoltrimetroprim 1200 mg/240 mg, por via oral, a cada 12 horas além de rifampicina (R) 600 mg – isoniazida (H) 300 mg – pirazinamida (Z) 1600 mg – etambutol (E) 1100 mg ao dia. O paciente evoluiu com melhora clínica significativa e 30 dias após sua admissão foi transferido para um serviço de atendimento à dependência química. Permanece em seguimento ambulatorial com a Infectologia. Discussão A paracoccidioidomicose (PCM) é micose sistêmica causada por fungos termo-dimórficos do complexo Paracoccidioides brasilienesis e Paracoccidioides lutzii1. Sua porta de entrada são os pulmões, pela inalação de artroconídeos, estruturas presentes em sua forma micelial. Ao alcançarem os alvéolos pulmonares transformam-se em leveduras causando áreas de pneumonite. Por via linfática, o fungo dissemina-se para linfonodos paratraqueais e parabrônquicos ocasionando uma reação granulomatosa. Uma resposta imune do tipo celular com produção de interleucina (IL) 12, interferon gama (IFNγ) e IL-2 em níveis adequados garante o controle da infecção, podendo permanecer focos latentes do fungo. Alguns indivíduos, após longo período, reativam estes focos evoluindo para a forma crônica da PCM. No entanto, diante de uma resposta insatisfatória logo após a infecção, com produção de IL-10, IL-4 e IL-5 há evolução Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 para a forma aguda/subaguda da PCM2. A PCM é endêmica na América Latina, do México à Argentina. Aproximadamente 80% dos casos estão no Brasil, com maior ocorrência nos estados de São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rondônia3. Por não ser uma doença de notificação compulsória, não se sabe qual a real incidência da PCM no Brasil, mas estima-se um valor entre 0,71 a 2,70/100.000 habitantes/ano 4. Acomete principalmente indivíduos que tenham contato prévio ou atual com o solo, principalmente os trabalhadores rurais. É notório a maior incidência em homens do que mulheres, principalmente após a puberdade, devido ao efeito protetor do estrógeno e a maior pressão epidemiológica, pois há mais trabalhadores rurais do sexo masculino. Há três principais formas clínicas na PCM. A forma aguda/subaguda corresponde de 5 a 25% dos casos, em geral, incide sobre crianças, adolescentes e adultos jovens, com importante comprometimento de órgãos ricos no sistema fagocítico-mononuclear como linfonodos, fígado, baço e medula óssea, sendo raro lesões pulmonares. A duração da sintomatologia é de poucas semanas e observase elevada frequência de sintomas constitucionais como febre, emagrecimento, indisposição e anorexia. A maior parte dos casos de PCM apresentam-se sob a forma crônica que corresponde 75 a 95% dos casos, com maior incidência em indivíduos com idade entre 30 e 60 anos. Os pulmões são o principal órgão comprometido, com presença de tosse, expectoração e dispneia. Lesões de mucosa de vias aero-digestivas superiores e pele são também muito frequentes. Outros órgãos como laringe, traqueia e adrenais são encontradas com relativa frequência. Os sintomas se instalam insidiosamente, com duração de vários meses. Entre os sintomas constitucionais, destaca-se o emagrecimento, a indisposição e a anorexia. Ambas as formas clínicas podem evoluir para a forma residual ou sequela. A mais comum das sequelas é a fibrose pulmonar, com evolução para insuficiência respiratória crônica. O diagnóstico confirmatório da PCM pode ser obtido pela identificação do fungo em espécimes clínicos tais como o escarro, raspado de lesões mucocutâneas, secreção de linfonodos, tecidos ou lavado broncoalveolar 5. O exame micológico direto permite a visualização de estruturas típicas do gênero Paracoccidioides, assim como o exame cito e histopatológico com a utilização de colorações de hematoxilina-eosina e Gomori-Grocott. A cultura é pouco utilizada na prática clínica devido sua baixa sensibilidade e demora no tempo de crescimento. A sorologia pode auxiliar no diagnóstico, mas não é confirmatória. O método mais utilizado é a reação de imunodifusão dupla em gel de ágar que detecta anticorpos específicos anti-P. brasiliensis. Esta técnica tem sensibilidade de 90%, sendo um importante recurso para diagnóstico e avaliação de 19 resposta terapêutica para os pacientes com doença causada pelo complexo P. brasiliensis6. No entanto, este método tem baixa sensibilidade na doença causada pelo P. lutzii, sendo necessário a descoberta de novos antígenos para melhorar o rendimento do teste7. Diversas drogas já foram estudadas no tratamento da PCM. Na atualidade, o itraconazol (ITC) é considerado o medicamento de escolha para o tratamento da maior parte dos casos, pois apresenta cura clínica e sorológica mais precoces quando comparado com a associação sulfametoxazol-trimetoprim (SMX-TMP) 8, 9. No entanto, casos graves que necessitem de terapia intravenosa o uso de anfotericina B ou do SMX-TMP são mais indicados, visto a ausência de formulação parenteral do ITC no Brasil. O SMX-TMP também são indicados nos casos de lesão do trato gastrointestinal pela PCM, devido a absorção errática do ITC e em pacientes com lesão de sistema nervoso central devido à baixa penetração do ITC pela barreira hematoencefálica. Nesta última condição, a anfotericina B e o fluconazol também são possibilidades terapêuticas. O caso clínico descrito neste artigo traz uma situação especial, a co-infecção PCM e tuberculose (TB). A resposta imune inadequada presente nos indivíduos com PCM é específica para os antígenos do fungo, mas não para outras infecções10. Eventualmente pode haver uma deficiência de imunidade celular mais ampla que também envolva uma incapacidade de resposta a outros agentes como o complexo M. tuberculosis. Além disso, soma-se o fato de que as exposições epidemiológicas podem se sobrepor. No passado, havia uma grande população vivendo em área rural com elevada exposição ao Paracoccidioides spp, mas pouca ao complexo M. tuberculsosis. Com o êxodo para as cidades, boa parte desta população foi viver nas periferias, muitas delas em condições de aglomeração elevando o risco para aquisição da tuberculose, mas mantendo o da PCM, pois permaneceram como trabalhadores rurais. Um levantamento de 1000 casos de PCM atendidos em Ribeirão Preto – SP encontrou 8,3% de co-infecção PCMTB11. Semelhante resultado foi encontrado no Mato Grosso do Sul, com 5,5% de associação em 422 casos de PCM12. Nenhum destes autores especificam se o diagnóstico foi simultâneo ou se uma das infecções ocorreu primeiro. Esta prevalência demonstra que a co-infecção é um problema presente. Um estudo realizado em Campinas – SP, aponta para o problema que envolve a co-infecção. Dos 227 casos de PCM avaliados, 36 (15,8%) tinham diagnóstico de tuberculose, porém a confirmação com baciloscopia ou cultura estava presente em apenas 18 deles (7,9%)13. Os outros 18 casos tiveram o diagnóstico presuntivo de TB, receberam tratamento específico, porém sem resposta clínica. Tal fato levou a nova investigação que diagnosticou PCM nestes casos, havendo resposta clínica com o tratamento antifúngico. Isto demonstra que o erro diagnóstico ainda é frequente atrasando a introdução do 20 tratamento para PCM. Isto pode acarretar consequências desastrosas ao paciente, pois aumenta as possibilidade de sequelas pulmonares. A fibrose é uma sequela precoce na PCM e aumenta progressivamente com o tempo de doença 14, 15, podendo ocasionar importantes limitações ao indivíduo pela insuficiência respiratória crônica. Algumas características destas infecções permitem sua suspeição diagnóstica. O achado epidemiológico de contato com o solo ou zona rural são indicativos da PCM para pacientes oriundos de áreas endêmicas, enquanto que na TB a presença de fatores que reduzem a imunidade celular como o HIV/aids, terapia imunossupressora, neoplasias, desnutrição, drogadição, gestação e extremos de idade compreendem importantes condições para o adoecimento, além de encarceramento e moradores de rua. Clinicamente a febre é mais frequente na TB do que na forma crônica da PCM. Quanto aos sintomas respiratórios, o que difere significativamente é a hemoptise, muito mais incidente na tuberculose. A presença de lesões em outros órgãos como pele, mucosas são mais observadas na PCM. Radiologicamente, a PCM caracteriza-se por lesões intersticiais que comprometem bilateralmente os pulmões, raramente atingindo os ápices, enquanto que a TB, em geral, as lesões são apicais, e mais frequentemente cavitadas. O caso descrito traz alguns ensinamentos importantes na prática clínica. Ser morador de rua e dependente de álcool e drogas ilícitas é uma epidemiologia comum nos casos de TB. As manifestações pulmonares e os achados de imagem também fortalecem este diagnóstico, que foi confirmado por baciloscopia e cultura de escarro. Pela forte evidência da TB, muitos médicos esquecem de realizar investigação para PCM. Entretanto, existem duas evidências que apontam para esta possibilidade e que devem ser ressaltadas. A primeira é de ordem epidemiológica. O paciente procede de área endêmica da PCM e já teve contato prévio com área rural. Além disso, para a forma crônica da PCM este paciente tem idade e sexo compatíveis. A segunda refere-se às manifestações clínicas. A presença de lesões cutâneas e mucosas são mais típicas dos casos de PCM, sendo um importante indicativo desta patologia. Estas evidências foram consideradas para se investigar PCM neste paciente, que teve o diagnóstico confirmado pela análise do escarro (exame micológico direto e citopatológico) e histopatológico de lesão cutânea. Outro importante ponto a se considerar neste caso refere-se ao tratamento. O ITC é a droga de escolha para tratamento da PCM. No entanto, a rifampicina, por agir no sistema enzimático citocromo P450, acelera a metabolização do ITC, reduzindo drasticamente os níveis séricos deste fármaco16. Em geral, recomenda-se evitar o uso concomitante destas duas drogas. Por isso, neste caso apresentado optou-se pelo uso da associação SMX-TMP para tratamento da PCM. Apesar da frequência baixa, a co-infecção PCM-TB é um Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 problema em nosso meio devido à falta de suspeição diagnóstica nestes casos, o que acarreta atraso no tratamento e consequentemente maior sequela pulmonar. Uma avaliação epidemiológica e clínica minuciosa permitem ao médico identificar evidências que sugiram o diagnóstico da co-infecção. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. Teixeira MM, Theodoro RC, Carvalho MJ, Fernandes L, Paes HC, et al. Phylogenetic analysis reveals a high level of speciation in the Paracoccidioides genus. Mol Phylogenet Evol 2009; 52: 273–83. Benard G. An overview of the immunopathology of human paracoccidioidomycosis. Mycopathologia 2008;165(4-5):209-21. Colombo AL, Tobón A, Restrepo A, Queiroz-Telles F, Nucci M. Epidemiology of endemic systemic fungal infections in Latin America. Medical Mycology 2011; 49(8):785-98. Martinez R. Epidemiology of paracoccidioidomycosis. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2015; 57 Suppl 19:11-20. Lacaz CS. Mycological diagnosis. In: Franco M, Lacaz CS, RestrepoMoreno A, Del Negro G. Paracoccidioidomycosis. 1sted. Boca Raton: CRC Press. 1994, p339– 344. 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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 21 Dispneia progressiva em paciente jovem Progressive dyspnea in young patient Felipe Marques da Costa1, Caio Julio Cesar dos Santos Fernandes2, Rogério de Souza3 1,2,3 Unidade de Circulação Pulmonar, Disciplina de Pneumologia, Instituto do Coração, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil Caso clínico Paciente do sexo feminino, 38 anos, procurou atendimento com queixa de dispneia progressiva há dois anos, com piora nos últimos 20 dias, atualmente aos mínimos esforços, além de episódios de síncope. Antecedentes pessoais: portadora de hipertensão arterial sistêmica controlada em uso de captopril. Nega casos semelhantes na família, sem contato com regiões endêmicas para esquistossomose. Nega roncos ou sonolência diurna e sem histórico de uso de anorexígenos, nega tabagismo. Ao exame, eupneica em repouso, porém taquicárdica (110 BPM). Turgência jugular, ausculta cardíaca com sopro sistólico em foco tricúspide, além de hiperfonese de 2ª bulha. Hepatomegalia à palpação abdominal, sem outras alterações. Foi submetida a exames gerais, com hemograma, função renal e eletrólitos que resultaram normais. A radiografia de tórax em incidência ântero-posterior (AP) mostrou aumento do índice cardiotorácico, abaulamento do arco da artéria pulmonar e sem alterações parenquimatosas (figura 1). Realizou ecocardiograma transtorácico que demonstrou importante aumento de câmaras direitas, hipocinesia de ventrículo direito, pressão sistólica da artéria pulmonar estimada em 94 mmHg, sem alterações em câmaras esquerdas. Prova de função pulmonar normal. Cintilografia de inalação e perfusão com baixa probabilidade de tromboembolismo pulmonar. Optado por realização do cateterismo cardíaco direito, sendo observados os seguintes parâmetros: pressão do átrio direito = 12 mmHg, pressão média na artéria pulmonar (PMAP) = 58 mmHg, pressão de oclusão = 11 mmHg, débito cardíaco 3,1 l/min, resistência vascular pulmonar 15,1 woods, evidenciando um padrão pré-capilar, compatível com hipertensão pulmonar arterial (HAP). Na investigação da etiologia da HAP, foram solicitados: auto-anticorpos, ultrassom de abdome total e sorologias para hepatite viral e HIV, que resultou positiva para este último. Contagem de linfócitos CD4 = 507 células/mm³ e carga viral 9701 cópias/mL, sendo optado pela introdução de 22 Fig. 1. Radiografia de tórax em PA esquema antirretroviral (lamivudina, zidovudina e efavirez) associado a tratamento específico para HAP sildenafil. No seguimento ambulatorial, paciente evoluiu com melhora de classe funcional, queda no BNP de 667 pg/mL para 250 pg/mL e aumento da distância percorrida no teste de caminhada de 6 minutos de 220 m para 415 m. Discussão Hipertensão pulmonar (HP) vem se tornando um problema de saúde cada vez mais comum, acometendo cerca de 1% da população mundial1. O envelhecimento em países desenvolvidos representa um importante fator deste processo, assim como as doenças infecciosas em regiões menos desenvolvidas. HP é definida como um aumento da PMAP ≥ 25 mmHg no cateterismo cardíaco direito em repouso 1. Sua classificação leva em consideração aspectos clínicos, patológicos e terapêuticos, sendo dividida em cinco grupos (figura 2): hipertensão arterial pulmonar (grupo I), que engloba várias etiologias, dentre estas a relacionada ao vírus da imunodeficiência humana (HIV); secundária a doenças cardíacas de câmaras esquerdas (grupo II); Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Fig. 2: Classificação de hipertensão pulmonar (adaptado NICE 2013) doenças pulmonares ou hipoxêmicas (grupo III), relacionada à doença tromboembólica crônica (grupo IV) e, por último, aquele que reúne doença com mecanismos multifatoriais ou não esclarecidos (grupo V)2. O diagnóstico de HP requer elevado grau de suspeição clínica, pois, em sua maioria, os sintomas são inespecíficos. Dispneia ao exercício costuma apresentarse precocemente. Um fluxograma diagnóstico é mostrado na figura 3. Como observado no caso, durante a investigação não foram encontrados indícios de cardiopatia de câmeras esquerdas, pneumopatia ou tromboembolismo pulmonar, tornando-se necessária a realização de cateterismo cardíaco direito. Os parâmetros hemodinâmicos encontrados foram compatíveis com hipertensão arterial pulmonar (HAP), sendo secundária à infecção pelo HIV, já que outras causas foram afastadas. No mundo, cerca de 34 milhões de pessoas estão infectadas pelo HIV. A HAP associada ao vírus é uma entidade rara, acometendo cerca de 0,5% desses pacientes. Apesar disso, o risco é aproximadamente 2500 vezes maior quando comparado a população saudável.3-5 A patogênese da HAP é complexa, envolvendo a interação de genes moduladores com fatores ambientais. A lesão Fig. 3: Fluxograma de investigação em paciente com suspeita de hipertensão pulmonar Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 23 endotelial é secundária a ação de proteínas virais, ativação da cascata inflamatória e fatores próprios do hospedeiro, culminando com remodelamento vascular, vasoconstrição e trombose local6-15. O uso de terapia antirretroviral altamente ativa (HAART), apesar da escassez de grandes estudos prospectivos, pode associar-se a redução da PMAP quando instituído em pacientes com classe funcional I e II, tornando o diagnóstico precoce fundamental 16. Outro estudo demonstrou redução na mortalidade 17. Apesar disso, estudos pós era HAART não revelaram redução consistente na prevalência de HAP18. Na ausência de recomendações específicas, o tratamento de HAP secundária ao HIV deve seguir as mesmas orientações para as demais etiologias do grupo I. O uso de anticoagulantes ou bloqueador de canal de cálcio não é recomendado, excesso em situações especiais. Com relação ao tratamento específico, alguns estudos com prostanóides, antagonistas de receptor de endotelina e inibidores de fosfodiesterase apresentaram resultados favoráveis, porém são baseados em ensaios clínicos não randomizados e com poucos pacientes19-26. O prognóstico do paciente com HAP relacionada ao HIV sem tratamento adequado pode ser tão ruim quanto 50% de mortalidade em 8 meses de sequimento27, porém, em séries após introdução do esquema HAART e terapia específica para HAP, a sobrevida tem melhorado consideravelmente, chegando a 72% em 3 anos28. Embora sejam necessários mais estudos para melhor compreensão dos mecanismos fisiopatológicos da HAP associada ao HIV, a evidência atual recomenda a estratégia de tratamento simultâneo do HIV, com uso continuado de antiretrovirais, associado ao tratamento específico da HAP, reforçando a importância da abordagem diagnóstica abrangente em todos os pacientes com suspeita de hipertensão pulmonar. 6. Referências Bibliográficas 18. 1. 19. 2. 3. 4. 5. 24 Hoeper MM, Humbert M, Souza R, Idrees M, Kawut SM, SliwaHahnle K, Jing ZC, Gibbs JS. A global view of pulmonary hypertension. Lancet Respir Med. 2016 Apr;4(4) Simonneau G, Gatzoulis MA, Adatia I, Celermajer D, Denton C, Ghofrani A, Gomez Sanchez MA, Krishna Kumar R, Landzberg M, Machado RF, Olschewski H, Robbins IM, Souza R. Updated clinical classification of pulmonary hypertension. J Am Coll Cardiol. 2014 Dec 24;62(25 Suppl):D34-41. Opravil M, Pech_ere M, Speich R, Joller-Jemelka HI, Jenni R, Russi EW et al. HIV-associated primary pulmonary hypertension. A case control study. Swiss HIV Cohort Study. Am J Respir Crit Care Med1997;155:990–5. Correale M, Palmiotti GA, Lo Storto MM, Montrone D, Foschino Barbaro MP, Di Biase M, Lacedonia D. HIV-associated pulmonary arterial hypertension: from bedside to the future. Eur J Clin Invest. 2015;45(5):515–28. Sitbon O, Lascoux-Combe C, Delfraissy JF, Yeni PG, Raffi F, De Zuttere D et al. 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Celso Madeira Padovesi Médico Pneumologista pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Médico Assistente do Ambulatório de Tisiologia do Hospital Santa Marcelina Caso clínico Paciente do sexo masculino, 82 anos, procurou pronto atendimento devido quadro de tosse produtiva e febre diária de 38ºC há 1 semana, sem sintomas de vias aéreas superiores associados. Antecedentes pessoais: portador de diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca e revascularização miocárdica prévia. Foi submetido a exames gerais, com hemograma, função renal e eletrólitos normais. A radiografia de tórax (figura 1) mostrou consolidação em lobo superior direito (LSD), e a tomografia computadorizada (TC) do tórax (figura 2) confirmou consolidação do parênquima pulmonar do LSD, além de mostrar opacidades nodulares e micronodulares em lobo médio (LM) e lobo inferior direito (LID), formando em alguns locais agrupamentos com padrão de árvore em brotamento. Feita hipótese diagnóstica de pneumonia adquirida na comunidade, e foi prescrito levofloxacina 500 mg/dia durante 10 dias. Paciente evoluiu com melhora significativa dos sintomas, e após um mês passou em consulta com pneumologista com uma nova TC do tórax. Nesta ocasião, paciente relatou melhora significativa dos sintomas, restando apenas tosse seca, e estava 2kg abaixo do seu peso habitual. Negou febre e sudorese noturna nesta ocasião. A nova TC do tórax (figura 3) evidenciou melhora significativa das alterações, com redução importante da consolidação, porém com persistência de alguns nódulos e micronódulos com padrão de árvore em brotamento. Apesar da melhora significativa do quadro clínico e dos achados tomográficos, a persistência dos micronódulos com padrão de árvore em brotamento em paciente idoso e diabético levou a equipe de pneumologia a solicitar exame de escarro com pesquisa e cultura para BAAR. A baciloscopia do escarro resultou negativa. Foi solicitada Celso Madeira Padovesi Endereço comercial: Rua Barata Ribeiro, 414, Cj 62 - CEP 01308-000 - Bela Vista, São Paulo - SP Telefone: (11) 3151-6500 [email protected] 26 Fig. 1. Radiografia de tórax nas incidências póstero-anterior (A) e perfil (B) mostrando padrão de consolidação em lobo superior direito. Fig. 2. Tomografia computadorizada do tórax evidenciando consolidação em lobo superior direito (A), associado a micronódulos centrolobulares com padrão de árvore em brotamento em lobos médio e inferior direito (B). Fig. 3. Tomografia computadorizada do tórax mostrando redução da consolidação (A) e dos micronódulos (B). uma broncoscopia com lavado broncoalveolar (LBA) e biópsia transbrônquica. A baciloscopia do LBA também resultou negativa, mas a PCR (polymerase chain reaction, ou reação em cadeia da polimerase) para Mycobacterium tuberculosis (MTB) resultou positiva. Neste momento, a equipe de pneumologia realizou diagnóstico de tuberculose (TB) pulmonar com apresentação na forma de pneumonia tuberculosa, e iniciou o tratamento com esquema básico, composto por rifampicina, isoniazida, Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 pirazinamida e etambutol. Posteriormente, surgiram outras duas evidências a favor do diagnóstico: a cultura do escarro coletado na avaliação inicial isolou MTB, e o anatomopatológico da biópsia transbrônquica evidenciou processo granulomatoso crônico com necrose caseosa. O tratamento foi mantido por nove meses, e o paciente evoluiu com melhora clínica e radiológica total (figura 4). Fig. 4. Radiografia de tórax na incidência póstero-anterior revelando melhora radiológica significativa. Discussão A pneumonia tuberculosa é uma forma rara de apresentação da TB pulmonar, com prevalência estimada em 2 a 7% dos casos 1,2 . A infecção primária pelo Mycobacterium tuberculosis (MTB) na infância pode se manifestar com padrão pneumônico, com acometimento predominante nos lobos médio e inferiores dos pulmões3. Já a pneumonia tuberculosa do adulto não tem local preferencial de acometimento, e até o momento não se sabe ao certo se essa forma de apresentação da TB se deve a infecção primária, reativação de infecção latente ou reinfecção4. A fisiopatologia também não está bem estabelecida, mas o mecanismo proposto mais aceito é o da formação de uma fístula a partir de um linfonodo mediastinal para o interior da luz brônquica, inundando a via aérea com material caseoso contendo grande número de bacilos. Por sua vez, esse material caseoso leva a uma reação inflamatória aguda, e consequentemente consolidação alveolar. Diversos estudos com broncoscopia em pacientes com pneumonia tuberculosa evidenciaram lesões nas vias aéreas compatíveis com fístulas de linfonodos adjacentes, o que fortalece essa teoria5. A pneumonia tuberculosa é um pouco mais comum em idosos e em pacientes com alguma imunossupressão, como portadores de SIDA, diabetes mellitus e câncer, mas Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 pode também ocorrer em indivíduos sem qualquer fator de risco. As manifestações clínicas diferem da TB pulmonar pós-primária clássica. O quadro costuma ser agudo ou subagudo, com predomínio de tosse produtiva e febre, sendo menos frequentes manifestações como perda ponderal e sudorese noturna. Por esse motivo, muitas vezes é confundida com pneumonia bacteriana1,4. O diagnóstico da pneumonia tuberculosa é feito de modo semelhante à forma pulmonar clássica, ou seja, pela associação do quadro clínico com evidências microbiológicas e achados radiológicos4. A sensibilidade da baciloscopia no escarro é semelhante ao descrito para a TB pulmonar clássica, ou seja, 60 a 80%1,4,6. Há um fato importante a ser ressaltado no caso apresentado: o uso de levofloxacina pelo paciente durante 10 dias. Sabe-se que as fluoroquinolonas possuem uma boa ação bactericida contra o MTB, atingindo inclusive as micobactérias intracelulares7. Atualmente, a ofloxacina e a levofloxacina são drogas de segunda linha no tratamento da TB, usadas em esquemas alternativos e em casos de resistência às drogas de primeira linha6. Assim, acreditase que o uso de antibióticos da classe das fluoroquinolonas possa reduzir a carga bacilar, levar à melhora clínica e radiológica (ao menos parcialmente) e, em última análise, retardar o diagnóstico, como ocorreu no caso relatado. De acordo com as diretrizes mais recentes para o tratamento da tuberculose, quando há um quadro clínicoradiológico compatível com TB, num cenário de alta prevalência, pode-se iniciar o tratamento, mesmo sem confirmação microbiológica 6,8 . Porém, em casos duvidosos, pode-se utilizar exames mais invasivos, como a broncoscopia com lavado broncoalveolar (LBA) e biópsia transbrônquica9. No caso relatado, a baciloscopia do LBA também resultou negativa. Porém, a PCR para o MTB resultou positiva, fato que foi decisivo para se iniciar o tratamento do paciente em questão. Hoje em dia há diversos métodos moleculares para o diagnóstico da tuberculose, com sensibilidade de 80 a 97%9,10,11. Porém é importante ressaltar que, para os pacientes que já tiveram tuberculose pulmonar, um resultado de PCR positivo pode não significar necessariamente doença ativa, uma vez que o material genético do MTB pode persistir no tecido pulmonar por tempo indefinido6. Após iniciado o tratamento do paciente, a cultura do escarro coletado no início da investigação resultou positiva. A cultura do escarro é reconhecidamente método de elevada sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de TB pulmonar, aumentando em até 30% o diagnóstico microbiológico dos casos com baciloscopia negativa6. Porém, um estudo com pequena amostra sugeriu uma tendência à menor sensibilidade da cultura de escarro em pacientes com pneumonia tuberculosa, em comparação à forma pulmonar clássica4. Os achados radiológicos da pneumonia tuberculosa 27 são marcadamente distintos da forma pulmonar clássica. A forma pneumônica se caracteriza pela consolidação lobar ou segmentar, sem local preferencial de acometimento, enquanto na forma clássica há predomínio de nódulos, micronódulos e cavidades, e os segmentos superiores e posteriores são os mais acometidos. A ocorrência de cavidades na forma pneumônica é incomum. Outros achados radiológicos como linfadenomegalia mediastinal, árvores em brotamento, sinais de disseminação broncogênica e cicatriz de TB prévia podem ser encontrados em ambas as formas de TB pulmonar4. O tratamento da pneumonia tuberculosa em nada difere da forma pulmonar clássica, sendo utilizadas, no nosso meio, as quatro drogas que compõem o esquema básico: rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol6. Devido à imunossupressão relacionada ao diabetes mellitus, alguns autores sugerem estender o tratamento da TB pulmonar em pacientes diabéticos para nove meses, especialmente naqueles com mau controle glicêmico8. Por esse motivo, o paciente do caso relatado teve seu tratamento estendido para nove meses. Em resumo, a pneumonia tuberculosa pode se apresentar como um verdadeiro desafio diagnóstico, uma vez que seu quadro clínico-radiológico é muito semelhante ao de uma pneumonia bacteriana comum. Deve-se atentar para a possibilidade de uma pneumonia tuberculosa quando não ocorre melhora clínica e radiológica completa no prazo esperado para uma pneumonia comum após antibioticoterapia adequada, especialmente na presença de alguma condição imunossupressora. Como qualquer forma de apresentação da TB pulmonar, o atraso no diagnóstico e no tratamento pode levar a graves consequências para o paciente, bem como à contaminação de outras pessoas. No caso apresentado, um dos fatores que contribuíram para o atraso no diagnóstico e tratamento foi o uso da levofloxacina, que proporcionou uma melhora clínica e radiológica parcial, e ainda, provavelmente, levou a uma significativa redução da carga bacilar no escarro, dificultando o diagnóstico microbiológico. Esse caso ilustra como é importante realizar exames mais invasivos, como a broncoscopia com LBA e biópsia transbrônquica, quando se suspeita de TB pulmonar, especialmente nas apresentações clínicoradiológicas incomuns. 4. 5. Lee KM, Choe KH, Kim SJ. Korean J Intern Med. 2006;21:230-5 Smith LS, Schillaci RF, Sarlin RF. Endobronchial tuberculosis. Serial fiberoptic bronchoscopy and natural history. Chest. 1987;91(5):644-7 6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. 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Clin Chest Med. 2005;26:295-312 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Agenesia pulmonar unilateral direita, dextrocardia e pneumotórax: uma rara associação Right unilateral pulmonary agenesis, dextrocardia and pneumothorax: a rare association Guilherme Eler de Almeida1, Leonardo Peixoto Domingos2, Hozanna Holanda Brasil3 1 Médico Pneumologista do Hospital Regional de Cacoal - RO 2 Médico Radiologista do Hospital Regional de Cacoal 3 Médica Residente de Clínica Médica do Hospital Regional de Cacoal - RO Introdução A agenesia pulmonar é uma condição rara, caracterizada pela ausência completa do parênquima pulmonar, brônquios e vasos pulmonares, cujo prognóstico depende da presença de malformações associadas 1,2,3,4. A apresentação clinica é variável e o diagnóstico é frequentemente feito na infância após infecções pulmonares repetidas, hemoptise, insuficiência cardiorrespiratória ou como parte de uma síndrome, com maior taxa de mortalidade nesses casos1,2,5. Alguns pacientes chegam a idade adulta sem o diagnóstico instituído, tomando conhecimento de tal malformação após desenvolverem sintomas. Descrevemos um caso de um paciente adulto jovem com agenesia pulmonar direita associada à dextrocardia, assintomático até então, tendo apresentado um extenso pneumotórax espontâneo, com insuficiência respiratória aguda e parada cardiorrespiratória. Fig.1. Paciente intubado, com pneumotórax extenso, não drenado, associado a ausência de parênquima e vasculatura pulmonares à direita e dextrocardia. Foi prontamente submetido à drenagem torácica bilateral (drenos de 28Fr) e encaminhado à UTI (Figura 2). Convocados familiares, que referiram que o paciente recebeu o diagnóstico de agenesia pulmonar direita e dextrocardia aos quatro anos de idade, estando assintomático até então, com leve dispneia apenas quando dos episódios de infecções de vias aéreas superiores, que eram infrequentes e rapidamente auto-limitados, não estando em seguimento pneumológico ou clínico. Relato de Caso Homem, 21 anos, referindo dispneia de início súbito há cerca de oito horas da admissão, associada à dor torácica pleurítica bilateral lancinante, com predomínio à esquerda, além de tosse seca. Negava febre, sibilância ou hemoptise. Apresentou parada cardiorrespiratória na chegada ao pronto socorro, em AESP, sendo revertida após um ciclo de reanimação cardiopulmonar conforme protocolo preconizado pelo ACLS. Após intubação e adaptação à ventilação mecânica, apresentava murmúrio vesicular reduzido globalmente, com creptos esparsos. Realizada tomografia computadorizada de tórax que mostrou extenso pneumotórax, ausência de parênquima e vasculatura pulmonares à direita, além de dextrocardia (Figura 1). Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Fig.2. Paciente intubado, com pneumotórax drenado, associado a ausência de parênquima e vasculatura pulmonares à direita, dextrocardia e enfisema subcutâneo. Permaneceu intubado por cerca de 48 horas, sendo extubado e após observação por 48 horas adicionais, foi encaminhado à enfermaria, ainda drenado. Apresentou escape aéreo por cinco dias, sem terapêutica específica, com resolução espontânea. Os drenos de tórax foram sacados após mais sete dias, com confirmação de completa reexpansão por tomografia de tórax (Figura 3). 29 com a síndrome VACTERL (Vertebral, Anal, Cardíaca, Traqueo-Esofágica, Renal e membros/Limbs) 3,13 . Nos casos de agenesia unilateral completa, a cavidade pleural pode não ser encontrada no lado afetado 9. Dentre as malformações cardiovasculares são citados dextrocardia, persistência do ducto arterioso, forame oval Fig.3. Drenos de tórax sacados, mostrando ausência completa de parênquima e vasculatura pulmonares à direita, dextrocardia e espessamento pleural. patente, defeito de septo atrial, defeito do septo ventricular, Tetralogia de Fallot, coarctação da aorta, arco aórtico à direita, truncus arteriosus, Recebeu alta assintomático, com saturação de O2 de arco aórtico 3,4 interrompido, entre outros . 97% em ar ambiente. Foi avaliado no ambulatório de A agenesia pulmonar direita costuma ser mais severa Cirurgia Torácica, sem conduta adicional. Após isso, recusa- e ter maior mortalidade em relação à esquerda, devido a se a manter acompanhamento ambulatorial. compressão da árvore traqueobrônquica, com um excessivo desvio da carina ipsilateral e drenagem inapropriada do Discussão pulmão funcionante 1,2,4,5,12 . Assim como no paciente em questão, existem diversos A agenesia pulmonar unilateral é uma condição rara, caracterizada por ausência completa do parênquima relatos da dextrocardia associação 1,3,4,14,15 de agenesia pulmonar e . pulmonar, brônquios e vasos pulmonares, que ocorre Embora em lactentes possa estar associada a muitas isoladamente ou acompanhada de outras anomalias 1,2,4,6. anomalias cardíacas, a dextrocardia em adultos tem uma A prevalência é estimada em 34 por milhão de nascidos gama limitada de possibilidades diagnósticas, sendo esta vivos 5,6,7 , porém a verdadeira incidência é desconhecida, frequentemente um achado de imagem 16. já que 50% são natimortos e mais de 20% morrem ao nascer A hipertensão pulmonar é uma possível complicação, ou durante os primeiros meses de vida5, sendo assim mais sendo mais comum nesses pacientes, já que há uma de 50% dos pacientes morrem antes dos primeiros cinco redução do leito vascular pulmonar que, caso associada a anos de vida 4,8. É citada leve predominância no sexo cardiopatia congênita, pode piorar o prognóstico 2. 9 feminino . A associação entre agenesia pulmonar e pneumotórax A patogênese permanece especulativa, embora a é bastante conhecida, sendo esta uma potencial ruptura vascular e insultos teratogênicos tenham sido complicação considerados 10, infecções descreveu o caso de um paciente com agenesia pulmonar intrauterinas, consanguinidade, fatores genéticos, déficit direita com quadros recorrentes de pneumotórax. Alguns de vitamina A, ácido fólico e uso de salicitatos foram pacientes, no entanto, podem ter o diagnóstico de citados 1,2,5 . Dentre as etiologias genéticas, sugere-se a agenesia a partir de um pneumotórax espontâneo, como duplicação da porção distal do braço superior do descrito por Abdessalem 5 . também causas virais, 6 cromossomo 02 . O nos paciente casos aqui já diagnosticados. apresentado Bryon 17 permaneceu Diferentes autores 1,2,3,4,5,7 citaram a classificação de assintomático por toda sua vida, manifestando primeiro malformação segundo Schneider publicada em 1912, evento grave com o pneumotórax. Existem vários relatos posteriormente modificada por Boyden 11: tipo I (agenesia): na literatura de agenesia pulmonar com pneumotórax ou ausência completa de parênquima, brônquios e vasos dextrocardia, porém, na bibliografia pesquisada não sanguíneos para o lado afetado; tipo II (aplasia): foram encontrados relatos da associação dos três eventos, existência de um brônquio rudimentar com ausência total sendo este o primeiro caso descrito. de tecido pulmonar e tipo III (hipoplasia): presença de Considerando a frequência de pneumotórax nos casos quantidade variável de parênquima pulmonar, árvore de agenesia pulmonar, é importante considerar esse brônquica e vasculatura de suporte. O paciente citado, diagnóstico sempre que esses pacientes apresentarem classifica-se como do tipo I. sintomatologia respiratória súbita. A agenesia do pulmão esquerdo é a mais frequente 12 e usualmente se manifesta sem outras anomalias, Referências Bibliográficas enquanto a agenesia do pulmão direito é comumente associada com malformações cardíacas (14%), gastrointestinais (14%), esqueléticas (12%), vasculares (9%) e genitourinárias (9%) 1,3 . Descreve-se também associação 30 1. Xie L, Zhao J and Shen J. Clinical diagnostic approach to congenital agenesis of right lung with dextrocardia: a case report with review of literature. Clin Respir J 2015; 10: 805-808. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. Malcon MC, Malcon CM, Cavada MN, Caruso PEM, Real LF. Agenesia pulmonar unilateral. J Bras Pneumol. 2012;38(4):526-529. Kay’s SK, -Carcauzon VC, Goua V, Podevin G, Marteau M, Sapin E, et al. 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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 31 Síndrome Fibrose/Enfisema Pulmonar associada à Hepatopatia Fibrosis / emphysema pulmonary syndrome associated with liver disease Fernanda Mayumi Nomura1; Ester Nei Aparecida Martins Coletta2; Mariana Silva Lima3; Silvia Carla Sousa Rodrigues3 1 Aluna do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Iamspe 2 Patologista do Iamspe; 3Assistentes do ambulatório de DPI do Iamspe Caso Clínico Paciente do sexo masculino, branco, 71 anos, apresentou-se em nossa instituição com história de dispneia aos esforços e tosse seca havia dois anos. Negava sintomas gastrintestinais e lesões de pele. Referia exposição passiva a fumaça de cigarro por 30 anos e a canários por 4 anos, estando afastado havia 5 anos; etilismo social. Portador de diabetes tipo II e glaucoma, usava metformina e colírio de timolol. No exame físico, foram observados hipocratismo digital e estertores finos na ausculta pulmonar. Tomografia de alta resolução (TCAR) do tórax mostrava sinais de fibrose pulmonar associada à enfisema (Figura 1), e achados sugestivos de hepatopatia crônica nos cortes do abdome superior. A prova de função pulmonar foi compatível com distúrbio ventilatório combinado de grau leve, porém com redução acentuada da difusão pulmonar para o monóxido de carbono (Tabela). Os exames de hemograma, bioquímica básica, sorologia para doenças do tecido conjuntivo e Fig. 1. Tomografia de alta resolução do tórax (A,B,C e D), evidenciando extensas opacidades reticulares e em vidro fosco (setas grossas) associadas a enfisema centrolobular (cabeça de seta), bronquiectasias de tração e cistos de faveolamento nas regiões periféricas (setas finas) com nítido gradiente ápico-basal. 32 Tabela - Prova de função pulmonar Parâmetros Valores absolutos CVF, L 2,57 VEF1, L 1,74 VEF1/CVF 0,68 CPT, L 4,01 VR, L 1,79 sGaw, cmH2O/L/s 0,14 DCO, mL/min/mmHg 7,3 % predito 75 64 75 89 32 CVF: capacidade vital forçada; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo; VEF1/CVF: relação de volume expiratório forçado no primeiro segundo sobre a capacidade vital forçada; CPT: capacidade pulmonar total; VR: volume residual; sGaw: condutância específica das vias aéreas; DCO: difusão pulmonar do monóxido de carbono. dosagem de α-1 antitripsina foram normais. Sorologias para HIV e vírus da hepatite B e C foram negativos. A endoscopia digestiva alta (EDA) revelou varizes de esôfago, pangastrite enantemática moderada e bulboduodenite erosiva moderada. Realizado lavado broncoalveolar que mostrou achados inespecíficos, não sendo realizada biópsia transbrônquica por causa das extensas áreas de enfisema e o risco de pneumotórax. A biópsia pulmonar cirúrgica, realizada na língula, mostrou uma pneumonia intersticial inflamatória e fibrosante inclassificável (Figura 2). O paciente evoluiu no pós operatório com drenagem torácica prolongada e, mais tardiamente, após alta hospitalar, com piora progressiva de seu estado geral, perda de peso e ascite. Foi reinternado, nesta ocasião no serviço de Gastroenterologia, sendo então diagnosticado com cirrose biliar criptogênica e hepatocarcinoma. Ultrassonografia com doppler hepático evidenciou fígado com morfologia irregular, contornos rombos e serrilhados, dimensões reduzidas e ecotextura hiperecoica, nodular, heterogênea; vasos portais com calibre variável e trajetos tortuosos, com circulação colateral e sinais de trombose porta. TC e Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Discussão Fig. 2. A. Pneumonia intersticial fibrosante e inflamatória com desorganização arquitetural e enfisema supleural (setas); (HE; 28X). B. Bronquíolectasias, inflamação moderada e esclerose vascular acentuada (seta); (HE; 28X). C. Via aérea ectasiada (bronquíoloectasia) com tecido de granulação na parede (seta);( HE; 40X). D. Espaço enfisematoso com descamação moderada (estrela); (HE; 40X). RNM do abdome (Figura 3) mostraram fígado com dimensões reduzidas, contornos lobulados e densidade heterogênea, ausência de dilatação das vias biliares intrahepáticas; nódulos nos segmentos 5, 6 e 2, medindo 3,7cm, 3,7 cm e 4,6 cm, respectivamente, hipervascular na fase arterial com clareamento dos segmentos 7 e 2; trombose de provável aspecto não tumoral na veia porta; circulação colateral exuberante e ascite. Marcadores tumorais negativos. Nova EDA revelou varizes esofágicas de grosso e médio calibres, sendo realizada ligadura elástica com cinco bandas. Fig. 3. Imagens axiais com contraste de tomografia (A) na fase portal e de RM em T1 na fase arterial (B). Presença de nódulos heterogêneos hipervasculares com washout na fase portal (cabeças de seta). Há ainda hepatopatia crônica caracterizada por irregularidades da superfície hepática, alargamento fissural e redução das dimensões do lobo direito (seta grossas) associada a ascite (asterisco) e circulação colateral (setas finas). O paciente teve deterioração progressiva de seu quadro clínico, evoluindo com aumento da massa tumoral hepática, exacerbações infecciosas pulmonares frequentes e piora da função pulmonar. Quimioterapia foi contraindicada por conta do seu baixo estado performance, e o paciente foi encaminhado aos cuidados paliativos, em uso de prednisona, formoterol/budesonida e tiotropio, indo a óbito por insuficiência hepática. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Descrevemos o caso de um indivíduo tabagista passivo com quadro tomográfico e anatomopatológico caracterizado pela combinação de fibrose pulmonar e enfisema associado à cirrose biliar criptogênica, o que sugere o diagnóstico da síndrome do encurtamento dos telômeros. Para a classificação correta das doenças pulmonares intersticiais (DPI), é fundamental a discussão de uma equipe multidisciplinar composta por pneumologista, radiologista torácico e patologista, especialistas em DPI. A biópsia pulmonar cirúrgica é o parâmetro-ouro para a definição correta das pneumopatias intersticiais, embora em alguns centros uma minoria de pacientes seja submetida ao procedimento. Em algumas situações, apesar da biópsia, os achados anatomopatológicos podem apresentar sobreposição de padrões, como por exemplo achados de pneumonia intersticial usual (PIU) associados à pneumonia intersticial inespecífica (PINE), o que dificulta a classificação correta da DPI. Em outras situações, existe discrepância entre os achados histopatológicos e os dados clínicos ou tomográficos, como, por exemplo, um padrão de PIU com curso clínico estável (evolução improvável para pacientes com FPI) ou achados de biópsia sugestiva de uma doença do tecido conjuntivo com autoanticorpos ausentes1. Quando os achados histopatológicos, clínicos e tomográficos são inespecíficos ou insuficientes para a definição de um subtipo específico de DPI, esta é rotulada como “DPI não classificável” (DPINC). DPINC, portanto, representa um subgrupo heterogêneo de DPI, que pode incluir fibrose pulmonar idiopática (FPI) e condições nãoFPI, como pneumonite de hipersensibilidade (PH) e DPI associada às doenças do tecido conjuntivo (DTC). Um estudo recente observou 10% de casos de DPINC numa coorte de 1370 pacientes com pneumopatias parenquimatosas difusas. A principal razão para um diagnóstico impreciso da DPI foi a falta de material anatomopatológico por contraindicação para biópsia pulmonar cirúrgica devido a riscos de complicações. DPINC apresenta características clínicas e prognósticas intermediárias entre FPI e outras DPI não-FPI. O risco de progressão ou morte na DPINC, nesse estudo, correlacionou-se a dados clínicos e radiológicos de FPI, principalmente diagnóstico radiológico de pneumonia intersticial usual (PIU) ou possível PIU, presença de faveolamento e alto escore de fibrose, além de redução na difusão pulmonar do monóxido de carbono (DCO)2. No caso aqui descrito, a biópsia pulmonar apresenta achados de fibrose, lesões de vias aéreas e enfisema, sem preencher critérios de uma DPI específica de acordo com a diretriz da ATS/ERS3, o que a define do ponto de vista anatomopatológico como DPINC. No entanto, clinicamente, 33 a coexistência de fibrose pulmonar, enfisema e cirrose biliar criptogênica em nosso paciente sugere um fenômeno etiopatogênico comum às três condições e, provavelmente, relacionado ao encurtamento dos telômeros provocado por mutações nos genes das telomerases. Os telômeros são as estruturas proteicas do DNA que atuam prevenindo a destruição do cromossoma. Eles se encurtam com a divisão celular e com a idade avançada ou podem ser estimulados por fatores ambientais, o que funciona como um gatilho para a desregulação do DNA, acelerando a senescência celular e a apoptose, um processo que pode levar à fibrose e falência de múltiplos órgãos4. As telomerases são um complexo de ribonucleotídeos que sintetizam novas repetições dos telômeros garantindo a integridade do seu comprimento5. Há dois componentes principais: a transcriptase reversa da telomerase- e a RNAtelomerase que fornecem o molde para a replicação dos telômeros. Mutações nesses genes causam disfunção das telomerases e encurtamento dos telômeros 4. Atualmente uma série de doenças são classificadas como “telomeropatias” ou “síndromes do telômero”, e incluem situações que cursam com falência da medula óssea (disceratose congênita, algumas formas de anemia aplástica adquirida e leucemia mieloide aguda), fibrose pulmonar, hiperplasia regenerativa nodular hepática e cirrose biliar 5,6 . Mutações nas mesmas regiões dos mesmos genes causam diferentes doenças, mas o prejuízo da manutenção do comprimento dos telômeros parece estar presente em todas essas enfermidades/síndromes 5. Na idade adulta, a FPI é considerada a forma mais comum de apresentação das doenças do telômero. As mutações nos genes das telomerases explicam cerca de 820% dos casos de FPI familiar e uma pequena proporção dos casos esporádicos. Trinta e sete por cento dos casos familiares e 25% dos casos esporádicos de FPI apresentam telômeros 10% menores em comparação à população geral5. As mutações nas proteínas do surfactante são outra causa de fibrose pulmonar familiar. Um estudo recente analisou o comprimento dos telômeros em diversas doenças pulmonares intersticiais. Em todos os casos de doença pulmonar intersticial, os telômeros são mais curtos do que em controles saudáveis, mas na FPI, eles são significativamente menores do que em outras pneumonias intersticiais idiopáticas e na sarcoidose.7 Mais recentemente, a síndrome do encurtamento dos telômeros também vem sendo associada à susceptibilidade genética para o desenvolvimento de enfisema8. Relatos de casos de famílias com mutações nos genes das telomerases demonstraram desenvolvimento prematuro de enfisema e enfisema combinado com fibrose, apesar de uma história modesta de tabagismo 8, 9. Não existem orientações estabelecidas sobre quando e em quem realizar testes genéticos na rotina de investigação de indivíduos com pneumopatias idiopáticas, 34 mas a importância da detecção de um mecanismo genético, como mutações nos genes das telomerases, possui implicações tanto terapêuticas e prognósticas quanto para monitoração e aconselhamento genético. Outra utilidade dos testes genéticos em pacientes com fibrose pulmonar é a estratificação de populações de indivíduos para participação em triagens para intervenção clínica 10. Recentemente, foi sugerido que a resposta positiva ou negativa à N-acetilcisteína na FPI está associada a polimorfismos genéticos11. A análise do comprimento dos telômeros nos leucócitos do sangue periférico envolve uma simples coleta de sangue, porém no Brasil o teste geralmente só é disponível em algumas universidades e restrito à área de pesquisa. Nosso paciente não foi submetido à análise da sequência ou de mutações nos telômeros porque nosso serviço não tem acesso ao teste, mas a combinação de fibrose e enfisema difuso aliado à hepatopatia são bastante sugestivos da síndrome dos telômeros curtos, o que pode ter sido estimulado pela exposição passiva à fumaça de nicotina. Referências Bibliográficas 1. Cottin V, Wells A. Unclassified or unclassifiable interstitial lung disease: confusing or helpful disease category? The European respiratory journal. 2013;42(3):576-9. 2. Ryerson CJ, Urbania TH, Richeldi L, Mooney JJ, Lee JS, Jones KD, et al. Prevalence and prognosis of unclassifiable interstitial lung disease. The European respiratory journal. 2013;42(3):750-7. 3. 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Antecedente de lúpus eritematoso sistêmico (LES) há 19 anos, doença do refluxo gastroesofágico com hérnia de hiato, hipertensão arterial sistêmica e tremor essencial, com estabilidade das comorbidades. Foi submetida à cirurgia ortopédica na coluna torácica há 4 anos, sem intercorrências. Negava tabagismo ou exposição ambiental relevante. Fazia uso contínuo de omeprazol 20 mg ao dia, bromoprida 10 mg duas vezes ao dia, hidroclorotiazida 25 mg ao dia e primidona 50 mg ao dia. Prednisona foi iniciada pelo reumatologista, na dose de 60 mg ao dia há 1 mês, quando relatou piora da dispneia. Ao exame físico encontrava-se em bom estado geral e com saturação de 98% em ar ambiente. A ausculta pulmonar identificou raros roncos em base pulmonar esquerda e no teste do degrau manteve saturação basal. Na avaliação propedêutica complementar, não foi verificada hipertensão pulmonar ao ecocardiograma transtorácico. Na avaliação funcional pulmonar (tabela 1), identificou-se redução proporcional da capacidade vital forçada e volume expiratório forçado no primeiro segundo, sugerindo distúrbio ventilatório inespecífico. Realizada medida dos volumes pulmonares, com achado de capacidade pulmonar total levemente reduzida, redução moderada da medida de difusão pulmonar do monóxido de carbono e coeficiente de difusão pulmonar normal. 36 Tabela 1. Função Pulmonar. CVF: capacidade vital forçada; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo; CPT: capacidade pulmonar total; DCO: difusão pulmonar do monóxido de carbono; KCO: coeficiente de difusão pulmonar. Valores Absolutos CVF (L) 2,18 VEF1 (L) 1,57 VEF1/CVF 72 CPT (L) 3,9 DCO (mL/mmHg/min) 11,1 KCO (1/min) 4,12 % Previsto 64% 58 75 56 106 As imagens da tomografia computadorizada de tórax (Figura 1) não evidenciaram alterações relevantes, conforme demonstrado nas imagens abaixo. Fig 1. Tomografia computadorizada de tórax: sem evidência de doença parenquimatosa ou pleural. Qual é a hipótese diagnóstica? Síndrome do Pulmão Encolhido (Shrinking Lung Syndrome) Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Discussão A primeira descrição da síndrome do pulmão encolhido (SPE) data de 1965, por Hoffbrand e Beck, que relataram 8 casos de dispneia inexplicada em 24 pacientes com LES1. Trata-se de uma condição rara, com prevalência de aproximadamente 1%, conforme descrito em uma coorte multiétnica de 632 pacientes com LES2. A associação com outras doenças do tecido conjuntivo é menos frequente, mas já foi descrita na síndrome de Sjogren primária, artrite reumatoide, esclerose sistêmica e doença indiferenciada do tecido conjuntivo3. O paciente usualmente queixa-se de dispneia e dor pleurítica. Ortopneia pode ocorrer em alguns casos. Ao exame físico, pode-se observar redução da expansão torácica, taquipneia, uso de musculatura acessória e movimento abdominal paradoxal4. O achado radiográfico universal é a elevação diafragmática, que pode ser uni ou bilateral, e associar-se a atelectasias basais. Derrame e espessamento pleurais são achados menos comuns3. Não existem critérios diagnósticos para SPE e deve ser suspeitada em paciente com LES e dispneia, após descartadas causas de etiologia intersticial, vascular e sistêmica. A avaliação funcional pulmonar usualmente evidencia um padrão restritivo com medida da capacidade de difusão para o monóxido de carbono normal ou levemente reduzida e coeficiente de difusão pulmonar normal3. As pressões inspiratória e expiratória máximas estão reduzidas na maioria dos casos5. A avaliação do movimento diafragmático durante a inspiração através de ultrassonografia pode ser útil no caso de dúvida diagnóstica. Eletroneuromiografia é normal na maioria dos casos 5. Mais recentemente, a realização de ressonância nuclear magnética detectou a presença de pleurite na ausência de miosite do diafragma 6. A realização de tomografia computadorizada de tórax e ecocardiograma transtorácico é importante para excluir doença intersticial e vascular pulmonar, respectivamente. Entre os fatores associados a ocorrência de SPE no LES, estão descritos doença de longa duração e presença dos autoanticorpos anti-SSA/Ro3, 7 e anti-RNP2. A patogênese da SPE permanece incerta. Na primeira descrição, os autores implicaram a presença de microatelectasias causadas por tensão superficial excessiva devido a perda de surfactante1. Desde então, todas as teorias são especulativas e incluem deficiência de surfactante, miopatia diafragmática, neuropatia frênica e disfunção da parede torácica. Henderson et al avaliaram 6 casos de SPE com manometria esofáfica e encontraram 2 anormalidades fisiológicas características: 1. Piora da força da musculatura respiratória em altos volumes pulmonares, mas não em baixos volumes; 2. Diminuição acentuada da complacência pulmonar na ausência de doença intersticial. A partir destes achados, os autores sugeriram um modelo fisiopatológico no qual a inflamação pleural crônica prejudicaria a inspiração Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 profunda por meio de reflexos neurais e pela dor, resultando em hipoinsuflação pulmonar crônica e reorganização do parênquima, com consequente diminuição da complacência pulmonar. A complacência pulmonar reduzida piora a hipoinsuflação e perpetua uma alça de retroalimentação positiva, explicando a gradual progressão dos sintomas na SPE8. Não existe um consenso na terapêutica para a SPE. O tratamento baseia-se na terapia anti-inflamatória, principalmente com o uso de corticosteroides, que são feitos na maioria dos casos em altas doses (>0,5 mg/Kg/ dia). O uso de azatioprina e ciclofosfamida é o mais descrito, porém com resultados conflitantes. A experiência com micofenolato e metotrexato é limitada a poucos relatos. Desde 2010(9), relatos isolados do uso de rituximabe têm demonstrado resultados satisfatórios em casos graves ou refratários, com melhoras significantes nos exames de função pulmonar. Uso de teofilina e betaagonistas inalatórios tem sido feito com a intenção de aumentar a força da musculatura diafragmática5. O prognóstico a longo prazo é bom, com a maioria dos pacientes permanecendo estáveis ou com melhora clínica e funcional5. Evolução Clínica Frente a hipótese diagnóstica de SPE, foi solicitada medida de pressão inspiratória e expiratória máximas, com os seguintes valores encontrados: 16 (19% do previsto) e 23 cmH2O (28% do previsto), respectivamente. A realização de espirometria em posição supina, evidenciou queda de 10% da capacidade vital forçada em relação a posição sentada. Tais achados caracterizam fraqueza da musculatura respiratória e corroboram o diagnóstico. Após dois meses do uso da prednisona na dose de 60 mg ao dia, foi iniciada redução gradual da dose até 30 mg ao dia e azatioprina foi introduzida como terapia imunossupressora poupadora de corticosteroide. Como a paciente apresentou aumento das enzimas canaliculares, a medicação foi substituída pela pulsoterapia com ciclofosfamida (750 mg/m2). Entretanto, após o terceiro ciclo, a medicação também foi substituída, devido náuseas e vômitos, e micofenolato foi iniciado. Como não apresentou melhora significativa após três meses de tratamento, o imunossupressor foi modificado para ciclosporina. A paciente segue estável funcional-mente e com melhora subjetiva da dispneia. Referências Bibliográficas 1. 2. Hoffbrand BI, Beck ER. “Unexplained” dyspnoea and shrinking lungs in systemic lupus erythematosus. Br Med J. 1965;1(5445):1273-7. Bertoli AM, Vila LM, Apte M, Fessler BJ, Bastian HM, Reveille JD, et al. 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Magnetic Resonance Imaging-Confirmed Pleuritis in Systemic Lupus Erythematosus-Associated Shrinking Lung Syndrome. Arthritis Rheumatol. 2015;67(7):1880. Souza Neves F, da Silva TH, Paviani G, Fontes Zimmermann A, de Castro GR, Alves Pereira I. Reinforcing a medical hypothesis with a new question: is there a subgroup of shrinking lungs syndrome that is induced by pleurisy in systemic lupus erythematosus and is this subgroup marked by anti-Ro/SSA? Clin Rheumatol. 2010;29(7):7779. Henderson LA, Loring SH, Gill RR, Liao KP, Ishizawar R, Kim S, et al. Shrinking lung syndrome as a manifestation of pleuritis: a new model based on pulmonary physiological studies. J Rheumatol. 2013;40(3):273-81. Benham H, Garske L, Vecchio P, Eckert BW. Successful treatment of shrinking lung syndrome with rituximab in a patient with systemic lupus erythematosus. J Clin Rheumatol. 2010;16(2):68-70. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Bronquiectasia: uma história não contada Bronchiectasis: an untold story Andressa Oliveira Peixoto MD1,*, Fernando Augusto Lima Marson PhD1,2, Adyléia Aparecida Dalbo Contrera Toro PhD1, José Dirceu Ribeiro PhD1 1 Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas 2 Departamento de Genética Médica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas Manuscrito Trata-se do caso de uma adolescente, do sexo feminino, procedente de Americana/SP, que era saudável e que não apresentou intercorrências de saúde até os nove anos de idade. Entre nove e 13 anos de idade, ela iniciou quadro de tosse diária, crônica com episódios de pneumonia de repetição. Posteriormente, os episódios de infecção das vias aéreas eram acompanhados de febre, vômica, hemoptise e odor forte na expiração, frequentemente acompanhados de redução de peso. O tratamento foi baseado em cursos recorrentes de antibioticoterapia e investigação diagnostica realizados na cidade de origem. Aos 13 anos de idade veio encaminhado para o acompanhamento no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas. Na avaliação clínica, a paciente e seus familiares negaram: (i) presença de limitação às atividades físicas, (ii) diagnóstico de outros processos infecciosos (além do quadro clínico pulmonar), (iii) antecedente familiar para alergia, (iv) contato epidemiológico para tuberculose, (v) alteração do hábito intestinal, (vi) alteração do desenvolvimento neuropsicomotor. Na avaliação clínica chamava a atenção alguns aspectos da dinâmica familiar: (i) pai relatou que era alcoólatra desde os 15 anos de idade, (ii) a paciente tinha um irmão de 19 anos que residia com avó paterna e era fruto de outro relacionamento do pai, (iii) os pais eram rígidos frente as atividades e atitudes realizadas pela criança. No exame físico a adolescente apresentou: bom estado geral, corada, hidratada, eupneica, afebril, acianótica, ativa, reativa, boa perfusão periférica com tempo de enchimento capilar inferior a dois segundos. Exame Andressa Oliveira Peixoto MD1 Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, CEP: 130833-7 - Campinas, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected] Tel. +55 19 981284888 / 35218959 Fax +55 19 3521-8970 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 respiratório: expansibilidade pulmonar preservada, murmúrio vesicular presente, porém reduzido na região de base pulmonar à esquerda, com estertores subcrepitantes localizados na mesma área, frequência respiratória de 16 ipm, saturação transcutânea de oxigênio da hemoglobina de 96%. Exame cardiovascular: ritmo cardíaco regular em dois tempos bulhas normofonéticas sem sopro, frequência cardíaca de 80 bpm. Exame físico abdominal: abdômen flácido, ruídos hidroaéreos normais, ausência de dor a palpação. Ela trouxe vários exames complementares realizados em outro serviço: (i) tomografia computadorizada de alta resolução de tórax. Os achados encontrados na tomografia estão apresentados na Figura 1; Fig. 1. A figura representa a gravidade da bronquiectasia secundária a aspiração de corpo estranho no lóbulo esquerdo. (ii) espirometria: distúrbio ventilatório obstrutivo leve com ausência de resposta positiva ao broncodilatador inalatório; (iii) imunoglobulinas normais; 39 (iv) investigação para tuberculose negativa pela cultura de escarro; (v) ausência de deficiência de alfa 1 antitripsina; (vi) teste de suor negativo para fibrose cística. Entre nove e 13 anos, antes de vir para o Hospital Universitário, ela permaneceu com os episódios infecciosos recorrentes da via aérea por quatro anos, sem sucesso na investigação da etiologia da doença. Após esse período, devido a uma crise de tosse intensa expeliu um objeto de polipropileno (bolinha de plástico), sem comunicar este fato aos médicos e aos responsáveis. Porém quando foi encaminhada ao serviço de pneumologia pediátrica da Unicamp, relatou que tinha aspirado corpo estranho, e não havia contado aos pais, anteriormente, por medo de represálias. Nesse contexto, permaneceu por longo período com corpo estranho alojado no lobo inferior esquerdo, que acarretou nas infecções recorrentes, e possivelmente, nas bronquiectasias localizadas. Indicamos broncoscopia e não foi observado presença de outros corpos estranhos. Fundamentado na história, eliminação de corpo estranho e na tomografia computadorizada de alta resolução de tórax, a hipótese diagnostica elencada foi bronquiectasia localizada secundária à aspiração de corpo estranho. O presente relato de caso reforça a necessidade de avaliar a presença de corpo estranho, como etiologia de bronquiectasia, que pode ser de diferentes estruturas e origens. Corpos estranhos podem se alojar nos pulmões por décadas e sem direcionamento correto para o diagnóstico1-3. Foi fundamental o relato da paciente pois propiciou o diagnostico ressaltando a importância da avaliação clínica e alterações da dinâmica familiar que devem ser valorizadas como facilitadores do diagnóstico. Como observado no presente caso, o “simples” relato da paciente sobre a aspiração do corpo estranho poderia evitar a evolução para bronquiectasia, pela retirada, em tempo hábil, do objeto4. A confirmação de aspiração de corpo estranho traqueobrônquico em crianças pode ser tardia ou negligenciada, e pode originar complicações como pneumonia de repetição, atelectasia permanente ou bronquiectasias 5. Achados unilaterais inesperados, na radiografia ou tomografia computadorizada de alta resolução de tórax, devem ser avaliados como suspeita de aspiração de corpos estranhos inalados, na ausência de fatores de risco conhecidos (por exemplo: malformação congênita)5. Bronquiectasia é o alargamento anormal dos brônquios decorrente de numerosos distúrbios adquiridos ou congênitos. A dilatação dos brônquios leva a insuficiência da depuração mucociliar6,7. Se o termo bronquiectasia for utilizado como referência a uma doença, ao invés do seu aspecto radiológico, se considera uma síndrome clínica, que é caracterizada por tosse, escarro e infecções recorrentes do trato respiratório 7. 40 Bronquiectasias, em crianças ou adultos sem fibrose cística, são denominadas de bronquiectasias não relacionadas a fibrose cística e, são resultados de doenças crônicas (por exemplo: discinesia ciliar primária) e/ou episódios repetidos de agressões ambientais, juntamente a atuação de variantes genéticas 6. Portanto, fatores genéticos e ambientais podem alterar a predisposição para as doenças crônicas e afetar a prevalência de bronquiectasias. Bronquiectasia é uma enfermidade crônica que pode cursar com tosse diária, aumento da expectoração, e predisposição a infecções respiratórias baixas de repetição, que levam a suspeita do diagnóstico. Hemoptise e dor torácica são achados tardios nas bronquiectasias6. O diagnóstico da bronquiectasia, geralmente requer exame de imagem, particularmente a tomografia computadorizada de alta resolução de tórax (padrão ouro)6. As bronquiectasias são classificadas pela característica morfológica em: (i) cilíndricas: brônquios com dilatações uniformes e paredes espessas, estendendose até a periferia do pulmão, sem afilamento normal. Na tomografia computadorizada de alta resolução de tórax apresenta sinal do trilho de trem ou do anel de sinete; (ii) varicosas: brônquios com contornos irregulares, alternando áreas de dilatação e constrição; (iii) císticas ou saculares: formas de maior gravidade e comuns aos pacientes com fibrose cística, apresentando brônquios dilatados e amontoados de cistos com líquido. Aspecto de favo-de-mel8. Quanto a origem, as bronquiectasias podem ser classificadas em: (i) adquiridas: obstrução brônquica, estase e infecção; (ii) congênitas: dilatações brônquicas que, resultam da interrupção no desenvolvimento normal da árvore brônquica [8]. Em resumo, ocorre um repetitivo ciclo de inflamações e infecções. As causas mais frequentes e a variabilidade clínica da bronquiectasia em adultos está descrita na tabela 17. Em crianças, os aspectos de etiologia, prevalência e fisiopatologia das bronquiectasias podem diferir, em parte, dos adultos. Aproximadamente, 60% das crianças têm etiologia subjacente, decorrentes de infecções, imunodeficiências primárias, aspiração (corpos estranhos e aspiração de saliva e/ou material gástrico naquelas com retardo do desenvolvimento neuropsicomotor) e discinesia ciliar. Bronquiectasia pós-infecciosa pode se desenvolver após infecção grave, como pneumonia, infecção por micobactérias tuberculosas ou não tuberculosas e/ou infecção viral 7. Enquanto, os achados pós-infecção, geralmente são generalizados, os associados ao corpo estranho são localizados. Na prática clínica, podem existir dificuldades para o diagnóstico de aspiração de corpo estranho como causa de bonquiectasia. Dificuldades para o diagnóstico podem levar a numerosas investigações e Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Tabela 1. Causas relacionadas a bronquiectasias e a prevalência conhecida. Etiologia Idiopática Pós-infecciosa Pós-tuberculose Adultos afetados 20 – 60% 20 – 40% < 2% (países desenvolvidos) Causa dominante no Leste europeu, Ásia e outras regiões Aspergilose broncopulmonar alérgica 1 – 10% Doenças do tecido conjuntivo 1 – 10% Imunodeficiência Fibrose cística Discinesia ciliar primária Síndrome da unha amarela Traqueobroncomegalia < 5% < 1% em clínicas de adultos sem fibrose cística < 2% (podendo estar subestimado devido a testes diagnósticos limitados) < 1% < 1% Infecção micobactérias não-tuberculose 2 – 50% Infecção por HIV Malignidade hematológica Deficiência de α-1 antitripsina Inalação de corpo estranho Doença pulmonar obstrutiva crônica < 1% < 1% < 1% < 1% 2 – 60% Asma Refluxo gastresofágico ou aspiração 1 – 50% Não disponível Características clínicas típicas Variável História de infecção grave no(s) lobo(s) afetado(s) ou infecção prévia História de tuberculose com cavitação e dano pulmonar História de asma, rolhas de escarro, chiado, resposta aos corticosteroides e presença de alergia específica ao Aspergillus Bronquiectasia central Evidência de doenças do tecido conjuntivo sistêmica (a mais frequentemente é a artrite reumatoide) Evidência de infecções não pulmonares ou patógenos não usuais Bronquiectasia do lobo superior, comprometimento extrapulmonar, infertilidade masculina, má absorção Isolamento de Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus ou micobactérias não-tuberculose Doença do lobo médio ou inferior, história de otite média e rinossinusite, idade precoce dos primeiros sintomas Unhas amarelas e derrame pleural Dilatação traqueal e bonquiectasia central em imagem radiológica típica Bronquiectasia nodular do lobo médioComum em mulheresEscoliose, pectus excavatum e baixo índice de massa corpórea Sem fenótipo característico Frequentes infecções do trato respiratório Enfisema paraseptal e obstrução do fluxo aéreo Doença de lobo único Moderada doença do lobo inferior bilateral com enfisema e história de tabagismo Não é bem descrita Bronquiectasia de lobo inferior bilateral ou de lobo inferior direito isolada. Não é claramente identificada como uma etiologia A tabela foi adaptada de: Redondo M, Keyt H, Dhar R, Chalmers JD. Global impacto f bronchiectasis and cystic fibrosis. Breathe 2016; 12:222-235. tratamentos sem a comprovação diagnóstica definitiva de corpo estranho, como exemplo, tuberculose, bronquite crônica, discinesia ciliar primaria, dentre outras9. Um fato significativo, é que apesar da extensa caracterização clínica, radiológica e imunológica, aproximadamente de 30 a 70% dos pacientes são classificados como tendo bronquiectasias idiopáticas7. Bronquiectasias cursam com exacerbações pulmonares infecciosas e que necessitam de internação hospitalar para antibioticoterapia intravenosa e têm grande impacto na qualidade de vida e está associada ao declínio da Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 função pulmonar e aumento da mortalidade7, 10. Sempre que possível, o tratamento da bronquiectasia deve ser direcionado ao fator etiológico. Para diminuir a prevalência de aspiração de corpos estranhos, políticas de conscientização pública, para a prevenção de acidentes, devem ser maximizadas11. Na prática clínica, bronquiectasias caracterizam-se como anomalias radiológicas associadas a desordens infecciosas, inflamatórias e congênitas. Bronquiectasia, anteriormente denominada de doença órfã, é o desfecho comum de numerosas enfermidades de baixas 41 prevalências, portanto deve despertar a curiosidade para o diagnóstico diferencial, cujo manejo é diferente. Aspiração de corpo estranho deve ser avaliada na presença de sintomas respiratórios crônicos, não explicados por outras condições, mesmo quando não há história clínica compatível, principalmente, quando apenas um lóbulo é afetado por bronquiectasia. A história clínica pode ser o ponto chave do diagnóstico e deve muito valorizada 2. É necessário reforçar a importância da apresentação clínica, anamnese e as causas etiológicas das bronquiectasias para permitir eficácia diagnóstica, que possibilitará um tratamento personalizado, nas diferentes faixas etárias. Uma história não contada pode dificultar o diagnóstico precoce de aspiração de corpo de estranho e acarretar em bronquiectasia, como no presente caso apresentado. 8. Hochhegger B, Irion K, Bello R, Marchiori E, Moreira J, Porto Nda S, Quinto Dos Reis D. Understanding the classification, physiopathology and the diagnostic radiology of bronchiectasis. Rev Port Pneumol. 2010; 16(4):627-39. 9. Ramchandani R, Dewan RK, Ramchandani S. Incidental intraoperative diagnosis of retained foreign body lung misdiagnosed as pulmonary tuberculosis. Lung India. 2016; 33(4):444-6. doi: 10.4103/09702113.184926. 10. Patria MF, Longhi B, Lelii M, Tagliabue C, Lavelli M, Galeone C, Principi N, Esposito S. Children with recurrent pneumonia and noncystic fibrosis bronchiectasis. Ital J Pediatr. 2016; 42:13. doi: 10.1186/ s13052-016-0225-z. 11. Higuchi O, Adachi Y, Ichimaru T, Asai M, Kawasaki K. Foreign body aspiration in children: a nationwide survey in Japan. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2009;73(5):659-61. doi: 10.1016/j.ijporl.2008.12.026. Agradecimentos FALM: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelos auxílios à pesquisa e bolsas de estudo #2011/12939-4, #2011/18845-1, #2015/12183-8 e #2015/12858-5; Fundo de Apoio à Pesquisa, ao Ensino e à Extensão da Universidade Estadual de Campinas pelo suporte à pesquisa #0648/2015; JDR: FAPESP pelo auxílio à pesquisa 2011/18845-1 e #2015/12183-8. Aos outros membros da pneumologia pediátrica da faculdade de ciências médicas da Universidade de Campinas: Maria Ângela Gonçalves de Oliveira Ribeiro, Emília Gonçalves, Maria Cristina Ribeiro dos Santos Simões e Milena Baptistella Grotta Silva. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 42 Liptzin DR, Fan LL, Stillwell PC, Dannull KA, Fadell MF, Partrick DA, Dishop MK. Flip-flop lung. An unusual etiology of bronchiectasis. Am J Respir Crit Care Med. 2014; 190(8):e29. doi: 10.1164/rccm.2014030533IM. Wang L, Pudasaini B, Wang XF. Diagnose of occult bronchial foreign body: A rare case report of undetected Chinese medicine aspiration for 10 long years. Medicine (Baltimore). 2016; 95(31):e4076. doi: 10.1097/ MD.0000000000004076. Pellissier A, Kebdani S, Lacheheb M, Lainez S, Froudarakis ME, Vergnon JM. 41 Years into the bronchial tree: A very obstructive cap. Clin Respir J. 2016. doi: 10.1111/crj.12443. Gang W, Zhengxia P, Hongbo L, Yonggang L, Jiangtao D, Shengde W, Chun W. Diagnosis and treatment of tracheobronchial foreign bodies in 1024 children. J Pediatr Surg. 2012; 47(11):2004-10. doi: 10.1016/ j.jpedsurg.2012.07.036. Boleken ME, Kaya M, Ozturk A, Kanmaz T, Yücesan S. Initial temporary misdiagnosis of bronchiectasis following pumpkin seed aspiration. Prim Care Respir J. 2007; 16(6):384-6. Brower KS, Del Vecchio MT, Aronoff SC. The etiologies of non-CF bronchiectasis in childhood: a systematic review of 989 subjects. BMC Pediatr. 2014; 14:4. doi: 10.1186/s12887-014-0299-y. Redondo M, Keyt H, Dhar R, Chalmers JD. Global impact of bronchiectasis and cystic fibrosis. Breathe. 2016; 12: 222-235. doi: 10.1183/20734735.007516 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Sibilância na infância: todo cuidado é pouco! Wheezing in childhood: all care is short! Lidia Alice Gomes Monteiro Marin Torres1 1 Responsável pelo serviço de pneumologia pediátrica do departamento de pediatria da FMRP-USP Mestre e doutora em Pediatria pela mesma Universidade Responsável pelo serviço de residência médica de Pediatria da Santa Casa de Ribeirão Preto Caso clínico Paciente de 1 ano e 8 meses de idade, sexo masculino, previamente hígido e sem história familiar de atopia ou asma. Nasceu a termo, sem problemas perinatais e permaneceu eutrófico, tendo tido aleitamento materno exclusivo até os 5 meses de idade. Nega prurido nasal, espirros ou alergia de pele. Nega otites ou outras doenças prévias. Teste de triagem neonatal para Fibrose cística: negativo. Procurou o serviço com quadro de tosse produtiva há 6 meses, com alguns episódios repetidos de sibilância, sendo que o último foi grave e motivou até internação. Refere a mãe que iniciou o quadro com coriza hialina, tosse seca e “ronqueira no peito”. Procurou pronto-socorro e foi medicado com sintomáticos. Notou uma melhora inicial, mas depois de 5 dias, o quadro começou a progredir para uma tosse produtiva, noturna e pela manhã com chiado no peito. Procurou novamente atendimento sendo medicada com corticoide oral e antihistamínico. Apresentou discreta melhora, mas após alguns dias houve nova recrudescência. Usou chás caseiros e medicação homeopática por 4 semanas, mas a tosse piorou passando a ser rouca, emetizante e com cianose durante as crises, mas não apresentava guincho. Procurou novamente o pediatra que receitou azitromicina para um quadro de provável coqueluche, apesar de vacinado e sem tossidores em casa. A criança utilizou a medicação com melhora por 4 dias, mas antes do término, voltou a apresentar a tosse, agora com vômitos de secreção amarelada. Foi encaminhada para um alergista que pediu RAST para alérgenos inalados e alimentares e optou por trocar leite de vaca por leite de soja, apesar dos exames serem todos normais e de não apresentar comprometimento de pele ou trato gastrintestinal. Dessa vez a mãe não observou nenhuma resposta, tendo evoluído com piora progressiva, sibilância, dependência de oxigênio. Nesse momento foi internado e permaneceu por 10 dias em uso de oxigênio, com melhora muito lenta, apesar do uso de aerossol, corticoide e antibióticos, que utilizou por uma semana. Teve alta melhor, mas ainda apresentava tosse e sibilos esparsos. Procurou um ORL que optou por Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 introduzir tratamento para refluxo, com inibidor de bomba de prótons. Entretanto, mesmo em uso da medicação, voltou a apresentar tosse matutina, produtiva, com vômitos de secreção espessa e amarelada. A família estava desesperada e a criança começara a perder peso por causa dos vômitos póstosse. Procurou um pneumologista que achou que pudesse ser asma e introduziu corticoide inalatório, mas mesmo após um mês de tratamento em dose alta, não apresentou melhora. Foi encaminhado então para o nosso serviço para que fosse descartado o diagnóstico de Fibrose Cística. Exame físico: Palidez cutânea, principalmente perioral, fr 56 irm, saturação periférica de O2 em 87% em ar ambiente. Tiragem intercostal e de fúrcula, com expiração prolongada e discreto aumento do diâmetro AP do tórax, com hipersonoridade à percussão. Raros sibilos, mas presença de estertores difusos de médias e finas bolhas em ambos os HTs à ausculta. Exames realizados: cloro no suor: 13/17 – dosagem de Igs: normais – phmetria e EED normais – Rasts todos negativos. Cultura de escarro positiva para H influenzae. PCR 65. Hemograma com desvio à D e leucocitose. Plaquetose. (Figura 1) Conduta: A criança foi tratada com broncodilatadores e corticóides pelos 3 primeiros dias de internação, enquanto aguardava os exames, sem melhora, e após, foi introduzida Amoxicilina com clavulanato, utilizados por 3 semanas, com melhora progressiva do quadro e desaparecimento completo da tosse e da sibilância, que não voltaram a ocorrer nesse paciente. Foram retiradas progressivamente as medicações introduzidas antes sem recrudescência do quadro. HD: Bronquite Bacteriana Protraída. Discussão A sibilância e tosse recorrentes são episódios muito aflitivos para os pais em pneumologia pediátrica. Nos 43 Fig. 1. Rx de tórax mostrando velamento reticulado grosseiro perihilar bilateral, sem sinais de hiperinsuflação. países em desenvolvimento o “burden” da doença respiratória ainda é muito alto, estando a pneumonia e as doenças supurativas pulmonares, entre as principais causas de mortalidade mundial, apesar das pesquisas serem escassas nesse campo1. A real prevalência do lactente sibilante ou com tosse crônica é desconhecida e provavelmente subestimada mas pode ocorrer em 8-10 % dos casos de procura de atendimento especializado, sendo também penosa a peregrinação dos pais com a criança enferma. Existe uma tendência atual a se evitar as investigações exaustivas em crianças saudáveis, dando-se preferência a realizar uma boa história clínica, o que é difícil quando os pais estão cansados e estressados pela busca constante de médicos e exames2. Uma exceção a isso é quando a criança apresenta sibilância associada à tosse produtiva com expectoração amarelada, pois esse quadro tem sido associado a situações graves, com evolução em 13% das vezes para supuração crônica e bronquectasias3. A bronquite bacteriana protraída (BBP) é uma das doenças que compõem o espectro das doenças supurativas das vias aéreas em crianças. Foi descrita já na década de 40 e após a introdução dos antibióticos experimentou uma redução de prevalência, mas voltou a apresentar alta incidência nos dias atuais, sendo descrita novamente em 2006 como entidade clínica distinta das outras causas de supuração das vias aéreas 4. Também ficou conhecida como bronquite crônica bacteriana ou infecção endobrônquica crônica e corresponde a um quadro de tosse e sibilância, com expectoração amarelada. Costuma prolongar-se por mais de 4 semanas, podendo levar a perda de peso e evoluir a curto prazo para pneumonia. Caso não tratada, pode cuasar bronquectasias a longo prazo, aparecendo sinais de baqueteamento digital e aumento do diâmetro torácico. Esse quadro tem sido descrito com maior frequência em pacientes que necessitaram maiores concentrações de oxigênio ou 44 permaneceram internados por mais tempo durante a evolução da doença3. Quando voltou a ser observado, no início dos anos 2000, foi analisado por meio de broncoscopia e Lavado Broncoalveolar (LBA) e demonstrado que existe uma infecção endobrônquica com patógenos respiratórios em concentrações maiores que 10x4 unidades formadoras de colônias, muitas vezes com formação de biofilmes. Várias bactérias foram implicadas, mas o H influenzae e M catharralis são os mais frequentes, embora possa ocorrer mais que uma bactéria e alguns virus. Entretanto, pela dificuldade de realização desse procedimento em todos os lactentes com tosse produtiva, a maioria completamente saudável antes desse processo, optou-se por uma definição clínica que atualmente engloba: tosse produtiva crônica com secreção amarelada, por mais que 4 semanas, tendo sido descartadas outras condições crônicas causadoras de tosse produtiva e com resposta positiva ao uso de antibióticos por 2-4 semanas. A análise celular do LBA mostrou ainda, infiltração acentuada de neutrófilos e uma ativação da via de expressão da Interleucina 1β, mostrando a amplitude do processo inflamatório presente5. A idade de maior prevalência é entre 1 e 5 anos de idade, mas pode ocorrer mais cedo ou até com 12 anos e nas coortes estudadas não havia evidências de sinusite ou outras doenças de vias aéreas superiores, sendo característica a predominância de estertores de finas e médias bolhas, sobre os sibilos no exame físico. A presença dos ruídos é causada pela dificuldade de movimento ciliar provocada pelo acúmulo de secreção e presença da infecção 6,7. O caso apresentado é, portanto, um lactente com uma doença de início súbito e bem definido, sem qualquer sintomatologia prévia, cujo quadro iniciou após um episódio viral e persistiu com tosse e chiado por mais de 2 semanas, que seria o máximo tolerado para um quadro viral sem complicações. Entretanto, a infecção mostrava poucos sinais de invasividade, como pode ser visto pelos exames gerais. Atingiu e ultrapassou as 4 semanas de definição proposta, apresentando os sinais característicos de expectoração purulenta, confirmando, pois, o diagnóstico de BBP. A radiografia mostrava velamento perihilar grosseiro, bilateral, porém não havia febre, nem sinais no hemograma que sugerissem pneumonia, além do longo tempo de evolução. Em relação aos outros diagnósticos cogitados é necessário fazer alguns comentários. A doença de RGE não costuma estar associada à tosse produtiva e nem à secreção amarelada e seu período de aparecimento costuma ser mais precoce, com maior prevalência e gravidade em lactentes mais jovens. Além do mais, foi descartado pelos exames8. Os quadros de alergia à proteína do leite de vaca que apresentam sintomas respiratórios, costumam apresentar mais de um aparelho comprometido, aparecendo sempre Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 urticária ou alterações gastrintestinais com maior frequência e, geralmente, associadas temporalmente à administração do alimento9. Já a asma poderia estar presente, mas faltam sinais e sintomas de atopia e história familiar característica, que podem ser fatores previsores da sua ocorrência no lactente10. Em relação à Fibrose cística, faltam alguns sinais tais como perda de peso, diarreia ou outros sinais de má-absorção e aparecimento mais precoce e gradativo do quadro. Entretanto o exame do cloro no suor e a resposta adequada ao tratamento, sem retorno do quadro, mesmo após 6 meses da suspensão do antibiótico, praticamente descartam essa doença. Conclusão Dessa forma, precisamos estar atentos, realizar uma história clínica detalhada e paciente, além de um exame físico cuidadoso, mesmo que seja preciso fazê-lo em mais de uma vez. Em crianças a tosse e sibilância são queixas muito comuns, e não devem trazer maiores preocupações quando forem secas e de resolução espontânea. Entretanto, é muito importante considerar com atenção os quadros de tosse produtiva com secreção amarelada de longa duração, que tem tratamento fácil no seu início, mas, se não tratadas, podem conduzir o paciente a um quadro irreversível de bronquectasias, com prejuízos incalculáveis para a criança, família e sociedade. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. Moran M, Guzman J, Chapman N et al. Negleted disease research and development: the public divide. G-Finder; 2013. Available from : http://www.policycures.org. Accessed at February 2017. Bush A. How should we manage asthma in preschoolers – from guidelines to consensus. 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Trabalha como pedreiro e tinha uma saúde ótima, não faltava no trabalho e fazia o serviço pesado. Há 6 meses começou a apresentar uma dispnéia aos grandes esforços, fato novo que não tinha antes. A tosse já tinha alguns anos, mais pela manhã. Mesmo com estes sintomas José acabou não indo ao médico e somente tomou um xarope receitado por um amigo do trabalho. Após 3 meses mantinha os mesmos sintomas e então resolveu procurar um Pneumologista, a pedido de sua esposa, que estava preocupada. Durante a consulta Sr. José relatou: dispnéia aos grandes esforços há 9 meses, associado a tosse com expectoração hialina, sem febre. No exame físico apresentava-se: corado, hidratado, acianótico, PA: 130 x 90mmHg, Saturação Periférica de Oxigênio: 95%, Peso: 62 kg, Altura: 1,70 m, IMC: 21,01. Aparelho Respiratório: murmúrio vesicular presente, diminuído bilateralmente, sem ruídos adventícios. Aparelho Cardiovascular: RCR em 2T, bulhas normofonéticas sem sopros. Membros Inferiores: sem edemas. Nos demais sistemas sem alterações significativas. O médico pediu uma Radiografia de Tórax e uma Espirometria que eram normais. Após estes exames, José foi reavaliado e mantinha os sintomas. E agora? A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) se evidência por ser uma doença previnível e tratável, caracterizada por sintomas respiratórios persistentes e limitação do fluxo aéreo devido as anormalidades das vias aéreas e alveolares decorrentes da exposição a gases e partículas nocivas (ex: cigarro, queima de matéria orgânica, poeira ocupacional, entre outros)1. O processo inflamatório crônico provoca alterações estruturais e estreitamento das vias aéreas, podendo estar associado a destruição do parênquima pulmonar e sua desarquitetura, culminando na redução da retração 46 elástica pulmonar e por consequência na capacidade de manter as vias aéreas abertas durante a expiração1. Apesar de a DPOC ser um problema de saúde pública mundial, sua estimativa de prevalência é incerta, devido a variabilidade da população estudada, qualidade dos dados analisados, qualidade das espirometrias e as regras usadas na definição da doença2,3.Como exemplo podemos citar o estudo PLATINO realizado em 5 países da América Latina (Brasil, México, Uruguai, Chile e Venezuela) mostrando que apesar de em todos eles a incidência de DPOC aumentar com a idade, principalmente acima dos 60 anos, sua prevalência foi de 7,8% na Cidade do México chegando até 19,7% em Montevideo no Uruguai4. Baseado no estudo BOLD e em outros grandes estudos epidemiológicos podemos dizer que a prevalência mundial da DPOC é de aproximadamente 11,7% e é responsável por 3 milhões de mortes anuais5. A DPOC deve ser considerada e investigada em todos os pacientes com queixa de dispnéia, tosse crônica, normalmente produtiva e que tenha história de exposição a fatores de risco para desenvolvimento da doença1.A obstrução expiratória ao fluxo aéreo é a base para o diagnóstico da doença, sendo a investigação feita inicialmente através dos testes de função pulmonar, o mais utilizado a espirometria. A presença de uma relação entre o volume expiratório forçado no primeiro segundo e a capacidade vital forçada (VEF1/CVF) < 0,70, após uso de broncodilatador de curta-ação, confirma a presença de limitação persiste ao fluxo aéreo, e também o diagnóstico da DPOC, quando da história clínica compátivel1. Entretanto estudos recentes tem discutido o uso do VEF1 e da relação VEF 1/CVF para o diagnóstico da DPOC, principalmente nos casos iniciais, pois nesta fase o acometimento da doença está nas pequenas vias aéreas6, podendo ocorrer alterações patológicas significativas, mesmo antes do início dos sintomas mais intensos e o VEF 1 reflete principalmente o comprometimento das grandes vias aéreas. Uma série de evidências sugerem que fumantes e ex-fumantes tem alterações clínicas, radiológicas e fisiológicas não identificadas pelas medidas espirométricas atuais7. Portanto, devido a doença Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 iniciar nas pequenas vias aéreas, porque não usar algum parâmetro que avalie melhor esta região do pulmão? Nesta linha Dilektasli et al(8)publicaram artigo recente discutindo o uso do volume expiratório forçada no terceiro segundo (VEF3), que reflete melhor as alterações das vias menores, e consequentemente pode ser mais sensível no diagnóstico precoce da doença. Além da análise da relação VEF3/CVF, também foi avaliado o uso do volume expiratório forçado no sexto segundo (VEF6) e a relação VEF3/VEF6. No estudo, foram incluídos 7.853 participantes, dos que tinham relação VEF1/CVF normal. Em 677 indivíduos (15.4%) da amostra quando analisado pela relação VEF 3/VEF 6 apresentaram alteração, e quando analisado por VEF3/ CVF em 312 (7.1%), mostrando que estes parâmetros podem ser mais sensíveis para o diagnóstico da DPOC. Associado a este fato, foram analisadas Tomografias de Tórax (avaliado a presença de enfisema, dimensão das vias aéreas e aprisionamento aéreo) e questionários de qualidade de vida que já mostravam alterações neste grupo de pacientes. Entretanto, é desconhecido se a população com VEF1/CVF normal, mas VEF3/VEF6 alterada, definida neste estudo, terá uma progressão mais rápida da doença8. Em outra publicação, que faz parte do Subpopulations and Intermediate Outcome Measures in COPD Study (SPIROMICS), foi aventada a hipótese de que muitos tabagistas e ex-tabagistas com sintomas respiratórios que tenham a relação VEF 1/CVF> 0.70, após uso de broncodilatador de curta ação, apresentam um tipo de doença crônica das vias aéreas baixas, e que esta seria similar a DPOC 9. Com uma amostra considerável de participantes os autores avaliaram sintomas respiratórios, com o uso de um questionário de sintomas (COPD Assessment Test– CAT), e até 50% dos pacientes sintomáticos apresentaram função pulmonar preservada, ou seja, não receberiam o diagnóstico de DPOC. Mesmo não tendo o diagnóstico da doença estes pacientes exacerbam, tem sintomas respiratórios, evidências de comprometimento da via aérea, e muitas vezes são tratados, mesmo não preenchendo os critérios diagnósticos atualmente estabelecidos9. Na tentativa de auxiliar no diagnóstico da doença aparecem os exames de imagem, infelizmente o papel da radiografia nestes casos fica limitada, sendo a tomografia de tórax um exame útil para avaliação das alterações morfológicas pulmonares e fornecer uma analise visual e quantitativa da DPOC10. Em uma análise retrospectiva, pacientes com sintomas respiratórios e enfisema confirmado na tomografia não apresentavam alterações na espirometria em 10.4%, e portanto não tinham o diagnóstico(7). Também em outro estudo, 26% dos pacientes com enfisema e aprisionamento aéreo confirmado na tomografia não preenchiam os critérios diagnósticos da DPOC na espirometria, e seriam classificados como GOLD 011. Diante destes fatos, e como mostrado no caso, é preciso Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 cada vez mais valorizar as queixas dos pacientes, e também muitas vezes usar mais de um método diagnóstico, como por exemplo: tomografia de tórax, questionários de sintomas, teste de caminhada de 6 minutos, na tentativa de identificar possíveis indivíduos doentes, pois crescem as evidências da presença de alterações estruturais antes da identificação da obstrução ao fluxo aéreo de acordo com critérios espirométricos de rotina. Entretanto, o que ainda não se sabe, é como será a evolução da doença nestes pacientes, mas muito provavelmente com o diagnóstico precoce os danos futuros para este grupo tendem a ser menores. Referências Bibliográficas 1. Global Strategy for the Diagnosis, Management and Prevention of COPD (2017 Report): Gold Executive summary [Internet]. 2017 [cited Acessado 17/01/2017]. Available from: http://goldcopd.org/gold-2017global-strategy-diagnosis-management-prevention-copd/. 2. Trends in COPD (Chronic Bronchitis and Emphysema): Morbidity and Mortality [Internet]. 2013 [cited 17/01/2017]. Available from: http:/ /www.lung.org./assets/documents/research/copd-trend-report.pdf 3. Vollmer WM, et al. Comparison of spirometry criteria for the diagnosis of COPD: results from the BOLD study. Eur Respir J. 2009:34(3): 588–97. 4. Menezes AM, Perez-Padilla R, Jardim JR, Muino A, Lopez MV, Valdivia G, et al. Chronic obstructive pulmonary disease in five Latin American cities (the PLATINO study): a prevalence study. Lancet. 2005;366(9500):1875-81. 5. Buist AS, et al. International variation in the prevalence of COPD (The BOLD Study): a population-based prevalence study. The Lancet 2007:741–50. 6. Hogg JC, Macklem PT, Thurlbeck WM. Site and nature of airway obstruction in chronic obstructive lung disease. N Engl J Med. 1968;278(25):1355-60. 7. Lutchmedial SM, et al How Common Is Airflow Limitation in Patients With Emphysema on CT Scan of the Chest? Chest 2015:176–84. 8. Dilektasli AG, Porszasz J, Casaburi R, Stringer WW, Bhatt SP, Pak Y, et al. A Novel Spirometric Measure Identifies Mild COPD Unidentified by Standard Criteria. Chest. 2016;150(5):1080-90. 9. Woodruff PG, et al Clinical Significance of Symptoms in Smokers with Preserved Pulmonary Function. N Engl J Med. 2016;374;19. 10. Lynch DA, et al CT-Definable Subtypes of Chronic Obstructive Pulmonary Disease: A Statement of the Fleischner Society. Radiology. 2015;277. 11. Regan E.A ea. Clinical and Radiologic Disease in Smokers With Normal Spirometry. JAMA Internal Medicine. 2015;175;9:1539-49. 47 Aquele sono pesado... That heavy sleep Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde¹;Geraldo Lorenzi Filho²; Pedro Rodrigues Genta3 ¹Médico Residente do programa de Pneumologia, HCFMUSP ²Professor Livre-Docente, Diretor do Laboratório do Sono, Serviço de Pneumologia, InCor, HCFMUSP 3 Médico Assistente, Doutor,Laboratório do Sono, Serviço de Pneumologia, InCor, HCFMUSP Relato de Caso Paciente do sexo feminino, parda, 50 anos, procura atendimento médico por queixa de dispneia. Relata dispneia moderada (escala do Medical Resource Council (MRC)=3). Afirma que se sente cansada todas as manhãs, e que frequentemente acorda com cefaleia. A dispneia piorou progressivamente com ganho de 13 kg em 2 anos. Nega tosse ou chiado. Refere ortopnéia e nega dispneia paroxística noturna. O esposo afirma durante a consulta que a paciente tem estado sonolenta durante o dia e que tem tido sono agitado. Refere ainda que não dorme com a esposa pois o ronco é muito alto. todas as noites. Caracteriza o ronco como de tal intensidade que o fez dormir em outro quarto. Mesmo sendo ambos religiosos, refere que a esposa tem dormido durante as celebrações das quais participam. A paciente também refere edema de membros inferiores. Quanto aos antecedentes pessoais, a paciente afirmou ser portadora de hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus tipo 2. Negou tabagismo ou outros antecedentes além dos já referidos acima. Quando ativamente questionada, negou qualquer trauma ou acidente, e afirmou que a menopausa se iniciou aos 45 anos. Ao exame físico, apresentava-se em bom estado geral, afebril, acianótica, com ausculta cardíaca dificultada por panículo adiposo e mamas, porém sem alterações perceptíveis. Edema de membros inferiores graduado em 2+/4+, com sinal de cacifo positivo e simétrico. Ausculta pulmonar também sem alterações, assim como restante de exame físico. Sinais vitais foram aferidos, apresentando frequência cardíaca de 105 bpm, respiratória de 25 irpm, pressão arterial de 150/90 mmHg e saturação periférica de oxigênio igual a 80% em ar ambiente. Calculado Índice de Massa Corpórea (IMC) igual a 43 kg/m². A circunferência cervical foi medida em 42 cm e a escala de Mallampatti modificado classe III. Foram solicitados os seguintes exames: gasometria Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, 8º andar 48 arterial em ar ambiente -pH 7,39, pO2 46,8 mmHg, pCO2 55,6 mmHg, bicarbonato33,3mmol/L, SatO 2 77%; Radiografia de Tórax – normal. Ecocardiograma – normal; Pró-BNP:195pg/mL (normal=125); TSH e T4 Livre – normais. Também foram aplicadas as escalas de Berlin (risco para apneia obstrutiva do sono) e Epworth (sonolência excessiva diurna) em virtude de história acima, tendo assim um Berlim alto risco e Epworth=14 (sonolência excessiva diurna >10 pontos). Foi realizada Prova de Função Pulmonar, com valores encontrados de: CVF VEF1 VEF1/CFV CPT VR VR/CPT DLCO Pré-Broncodilatador(L) 2,05 1,77 0,86 4,01 1,96 0,49 26,05 % do Previsto 60 65 108 83 116 Pós-Broncodi- Variação latador(L) (%) 2,04 0 1,78 1 0,87 1 116 Em virtude de hipótese diagnóstica, foi então solicitada polissonografia, que apresentou apenas eventos obstrutivos, com IAH de 56 eventos/hora de sono, tempo total de sono de 9h06min, tendo FC máxima de 140 bpm, permanecendo 100% do exame com saturação abaixo de 90%, com a seguinte curva de saturação: Qual(ais) o(s) diagnóstico(s)? Síndrome de Hipoventilação da Obesidade Apneia Obstrutiva do Sono. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 Após diagnóstico, foi instituída terapia com pressão positiva contínua em via aérea (CPAP)nasal, ajustado em 12cmH2O. Após 3 meses de tratamento, a leitura dos dados do CPAP revelou que a paciente vinha usando o equipamento por 5,4 horas/noite em média. Houve resolução do ronco da sonolência diurna (Epworth=8),da qualidade do sono, da fadiga e cefaleia matinal. Nova gasometria mostrou pH 7,44, pO2 69,1 mmHg, pCO2 42 mmHg, BIC 28,3mmol/L e SO2 91,6%. Novo pró-BNP de 21pg/mL. Síndrome de Hipoventilação da Obesidade (SHO) A obesidade afeta mais de um terço da população adulta mundial, sendo “a epidemia do século 21”. Pacientes obesos (IMC> 30 kg/m²)com hipercapnia arterial diurna (PaCO2> 45 mmHg), na ausência de outras causas, sofrem de Síndrome de Hipoventilação da Obesidade (SHO), tendo ainda maioria dos pacientes (>90%) também apnéia obstrutiva do sono (AOS)1–3. Entre 1955-56, foram descritos pacientes com obesidade, hipersonolência, eritrocitose secundária, hipertensão pulmonar e cor pulmonale, sendo os primeiros casos descritos de Apnéia Obstrutiva do Sono (AOS), porém logo se notou que uma proporção consistente também apresentava hipoventilação1,4–6. Já em 1909 o presidente norte-americano William Taft, com os mesmos sintomas, compara “sua tendência à sonolência ao garoto gordo em Pickwick.”Antes, entre 1837-1839,Charles Dickens publica “The Posthumous Papers of the Pickwick Club”, onde o personagem “fat boy Joe”, apresenta muitos dos sintomas relacionados aos portadores da síndrome, dentre eles a sonolência diurna. A partir daí, Sidney Burwell em 1956, ao descrever um paciente com características semelhantes, dá nome à síndrome de “Síndrome de Pickwick”, termo em desuso nos dias de hoje5–7. A prevalência da SHO na população geral permanece incerta já que não foram realizados estudos populacionais para tal. Se aproximadamente 6% da população geral dos Estados Unidos tem IMC ≥ 40 kg/m2, estima-se que 10 a 20% tenha SHO. Desta forma, 0,6% da população adulta daquele país teria SHO (1 em 160 adultos na população geral)1,5,6. Em relação ao diagnóstico, ressalta-se que é de exclusão, e deve seguir como regra os 3 critérios estabelecidos em 1999 pela Academia Americana de Medicina do Sono:1. Hipoventilação alveolar diurna (acordado, PCO2 arterial> 45 mmHg); 2.IMC ≥ 30 kg/m2; 3. Ausência de outras causas de hipoventilação 1,5,6,8,9. Na maioria dos casos o diagnóstico é estabelecido tardiamente. É frequente o diagnóstico ocorrer durante episódio de acentuação da hipoventilação, muitas vezes em situação de emergência e insuficiência respiratória aguda. Nestes casos, infecções respiratórias ou mesmo de partes moles (ex. celulite de membros inferiores) podem Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 ser desencadeantes. A grande maioria dos pacientes tem os sintomas clássicos da AOS (ronco intenso, cansaço, sonolência diurna). Em contraste, pacientes com SHO também apresentam dispnéia e sinais de cor pulmonale(sendo assim a principal causa de morte as repercussões cardiovasculares secundárias). Os achados do exame físico podem incluir, pletora facial, cianose de extremidades,P2 proeminente na ausculta cardíaca (muitas vezes difícil de ouvir por causa da obesidade) e edema das extremidades inferiores1,2,5,6,8–17. Apesar de geralmente utilizada para a avaliação concomitante de AOS, tendo aí sua importância, o diagnóstico não depende da realização de uma polissonografia. O teste definitivo é a gasometria arterial realizado ao ar ambiente. O nível elevado de bicarbonato sérico devido à compensação metabólica da acidose respiratória é comum e aponta para a natureza crônica da hipercapnia, podendo ser utilizado como teste sensível para o rastreio da doença (através de gasometria venosa, de mais fácil acesso e menos dolorosa ao paciente). O bicarbonato acima de 27 mmol/L sugere hipercapnia, devendo ser confirmado com a medida da PaCO2. Além disso, a hipoxemia detectada na oximetria de pulso em pacientes com distúrbios respiratórios do sono obrigatal rastreio. Se houver hipercapnia, testes de função pulmonar e radiografia de tórax devem ser realizados para excluir outras causas. As provas de função pulmonar podem ser normais, mas tipicamente revelam um distúrbio restritivo leve-moderado devido à obesidade, ou até mesmo redução proporcional de CVF e VEF1, sem evidência objetiva de restrição, como é visto neste caso. Evidência de obstrução na prova de função pulmonar exclui o diagnóstico de SHO. Outros testes laboratoriais devem incluir um hemograma completo (descartar eritrocitose secundária) e TSH para excluir hipotireoidismo grave1,2,5,6,8–17. A tabela 1 mostra os principais diagnósticos diferenciais da SHO: Tabela 1. Diagnóstico diferencial de Hipoventilação • Doença respiratória obstrutiva • Doença intersticial pulmonar grave • Limitação respiratória mecânica como nas desordens graves da caixa torácica (p.ex.,Cifoescoliose) • Condições neuropáticas e miopáticas (p.ex. Esclerose Lateral Amiotrófica, Distrofia muscular de Duchenne e miastenia gravis) • Causas centrais (p.ex. doença cerebrovascular, Hipotireoidismo severo) • Síndrome de hipoventilação congênita (p.ex.Síndrome de Ondine) • Uso de sedativo-hipnóticos, opiáceos ou álcool. O mecanismo pelo qual a obesidade leva à hipoventilação é complexo e não totalmente compreendido (Figura 2). Vários têm sido propostos, 49 Fig. 2. Fisiopatologia da SHO. Adaptado de Mokhlesi6 Fig.3. Influência dos eventos obstrutivos do sono na hipercapnia. Adaptado de Mokhlesi(6) incluindo sobrecarga mecânica do sistema respiratório, respostas centrais alteradas à hipercapnia e hipóxia, influência da AOS e anormalidades neuro-hormonais como a resistência à leptina. A sobrecarga na mecânica respiratória reduz a complacência da parede torácica e os volumes pulmonares, incluindo a capacidade residual funcional. Há também redução da complacência pulmonar e uma limitação ao fluxo expiratório nas vias aéreas inferiores, gerando pressão intrínseca positiva à expiração e aprisionamento aéreo. Estas alterações, juntamente com a resistência das vias aéreas superiores, sobrecarregam ainda mais os músculos inspiratórios, resultando num componente restritivo, limitador à mecânica ventilatória. Como resultado, maior esforço é necessário para a manutenção de valores próximos do normal. A quimiossensibilidade é progressivamente prejudicada pelo aumento do nível de CO2. A hipercapnia crônica também resulta da incapacidade de eliminar o CO2 durante o dia,acumulado à noite em episódios de apnéias e hipopnéias (Figura 3). Um mecanismo secundário que também prejudica a quimiossensibilidade é o aumento do bicarbonato no soro e líquido cefalorraquidiano. Ainda, a leptina parece exercer papel importante na fisiopatologia da SHO. A leptina é estimulante respiratório a nível central. A obesidade leva à aumento da leptina circulante e secundariamente à resistência à leptina. Desta forma, se desenvolve uma inibição ventilatória1,5,6,8,9,16. 50 A maioria dos pacientes com SHO são obesos mórbidos e têm AOS grave. Tais afetam negativamente na qualidade de vida, morbidade e mortalidade. A SHO parece ser um fardo adicional, com qualidade de vida inferior do que outras doenças hipercápnicas. Pacientes com SHO têm maior número/hospitalizações prolongadas, necessidade maior de ventilação mecânica e são mais frequentemente transferidos para unidades de cuidados críticos. A prevalência de SHO entre pacientes adultos hospitalizados com IMC ≥ 35 kg/m²pode chegar à 31%2,8–11,13–19. A pressão positiva de via aérea (por meio de um nível via CPAP - pressão positiva contínua de via aérea ou de dois níveis por NPPV – ventilação por pressão positiva nãoinvasiva) é o tratamento de escolha e melhora a ventilação alveolar por meio de diminuição da resistência das vias aéreas superiores, alívio da carga muscular ventilatória e/ou aumento da atuação ventilatória central1,3-6,8,9,11,14,16,17,19-27. Pacientes com SHO podem ser inicialmente tratados com CPAP se clinicamente estáveis e PaCO2 não severamente alterada (<55mmHg). É tipicamente administrada através de máscara nasal, almofadas nasais e máscaras oronasais. Alguns estudos mostraram que as máscaras oronasais são menos eficazes e associadas a uma menor aderência e maiores efeitos colaterais em comparação com máscaras nasais 28 . Desta forma, a longo prazo as máscaras nasais são recomendadas. No paciente crítico em insuficiência respiratória, máscaras oronasais são preferíveis. Em um grande estudo multicêntrico espanhol controlado-randomizado, NPPV e CPAP foram mais eficazes do que a modificação do estilo de vida com relação à melhoria dos sintomas clínicos e parâmetros polissonográficos, sem diferenças significativas entre eles, embora NPPV exibiu ligeiramente melhores valores de função pulmonar3. No entanto, estudos comparativos de longo prazo são necessários para comparar a NPPV ao CPAP em relação a variáveis de longo prazo, como duração da hospitalização, eventos cardiovasculares e mortalidade. Em pacientes com hipoventilação persistente ou dessaturação grave apesar da eliminação de eventos obstrutivos, a ventilação não-invasiva de dois níveis deve ser experimentada 1,4,8,9,11,16,18–21,23,25–27,29,30. Às vezes, a suplementação de oxigênio é necessária. A perda de peso é altamente recomendada e pode reverter a hipoventilação. Terapia farmacológica para hipoventilação de obesidade não é utilizada. O consumo de álcool e sedativos devem ser desencorajados 5,6,8,9,16 .Oxigenoterapia isolada não é apropriada mesmo em eventos agudos por não reduzir número de eventos obstrutivos, poder promover maior retenção de CO2 noturno (Efeito Haldane e Ventilação espaço-morto) e piorar a qualidade do sono 5,6,9,10,12,16-18 . Quanto às flebotomias, não existem estudos em pacientes com SHO. Em geral se utiliza as indicações para cardiopatas e pneumopatas (Hematócrito > 65% ou sintomas de Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 hiperviscosidade). A traqueostomia, apesar de ter sido o primeiro tratamento instituído, tem seu espaço reservado apenas para aqueles casos refratários, em virtude de risco e complicações inerentes ao procedimento e ao pacienteo beso5,6,8,9. Em relação às descompensações agudas, em pacientes que se apresentam com sinais clínicos de narcose e acidose hipercápnica deve-se iniciar prontamente ventilação positiva de via aérea. A ventilação não invasiva em um ambiente monitorado, sendo o paciente candidato aceitável para tal (capaz de cooperar, proteger suas vias aéreas, hemodinamicamente estável, pH arterial maior do que 7,20) deve ser iniciada. Os erros de conduta mais comuns no tratamento da SHO são22:Uso excessivo de Oxigênio Complementar – acarreta em maior retenção de CO2; Uso excessivo de diurético de alça - são comumente acometidos por quadros cardíacos secundário, o que indica o uso de diurético de alça no tratamento inicial destes, porém o uso excessivo pode levar à um quadro de Insuficiência Renal Aguda prérenal e alcalose metabólica, indicando-se o uso monitorado desta droga; Uso excessivo de psicotrópicos promovem uma maior colapsabilidade da via aérea e diminuem a resposta ventilatória. A confusão diagnóstica com DPOC e insuficiência cardíaca congestiva é frequente - Um estudo retrospectivo mostrou que pacientes obesos mórbidos admitidos em unidade de terapia intensiva por insuficiência respiratória secundaria à SHO tinham diagnóstico e tratamento errôneo de DPOC em 75% dos casos e 86% estavam sendo tratados para insuficiência cardíaca congestiva13. Os objetivos da terapia na SHO são reverter as principais anormalidades fisiológicas que dão origem à doença, ou seja, normalizar a respiração durante o sono, reduzir o peso e melhorar a condição respiratória. As metas terapêuticas para pacientes com SHO incluem a normalização da PaCO2 durante a vigília e no sono, a prevenção da dessaturações durante o sono e vigília, o controle da eritrocitose, da hipertensão pulmonar e do cor pulmonale, e o alívio da hipersonia3-6,8,9,12,14,16,18,19,21,23,25,29. A fraca aderência à pressão positiva será associada à melhora clínica incompleta. Esta pode ser avaliada através da revisão do cartão de memória do dispositivo. Referências Bibliográficas 1. 2. Balachandran JS, Masa JF, Mokhlesi B. Obesity Hypoventilation Syndrome. Sleep Med Clin [Internet]. 2014 Sep;9(3):341–7. Available from: http://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1556407X14000496 Castro-Añón O, Pérez de Llano LA, De la Fuente Sánchez S, Golpe R, Méndez Marote L, Castro-Castro J, et al. Obesity-hypoventilation syndrome: increased risk of death over sleep apnea syndrome. PLoS One [Internet]. 2015;10(2):e0117808. Available from: http:// www. p u b m e d c e n t r a l . n i h . g o v / a r t i c l e r e n d e r. f c g i ? a r t i d = 4324970&tool=pmcentrez&rendertype= abstract Pneumologia Paulista Vol. 29, No.3/2016 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. Masa JF, Corral J, Alonso ML, Ordax E, Troncoso MF, Gonzalez M, et al. Efficacy of different treatment alternatives for obesity hypoventilation syndrome: Pickwick study. 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