Alim. Nutr.= Braz. J. Food Nutr., Araraquara v. 24, n. 1, p. 45-49, jan./mar. 2013 ISSN 0103-4235 ISSN 2179-4448 on line PROPOSTA DE FERRAMENTAS DE QUALIDADE PARA UM SISTEMA DE GESTÃO DE SEGURANÇA DE ALIMENTOS EM UNIDADES DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO Isabela Cristina Lobo de MORAIS* Stella Regina Reis da COSTA** RESUMO: A gestão da qualidade inclui um sistema composto por princípios, técnicas, métodos e ferramentas. O objetivo deste trabalho foi desenvolver uma ferramenta da qualidade com proposta de indicadores através da elaboração de uma Lista de Verificação com critérios de pontuação de conformidade para auditorias, visando o diagnóstico de conformidade à legislação sanitária, através da verificação da eficácia da implantação das Boas Práticas de Fabricação. A ferramenta de avaliação foi elaborada com base na RDC 216, de 15/09/04 da ANVISA que dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. A Lista de Verificação consta de 151 itens de verificação, distribuídos em blocos de avaliações de vários aspectos do estabelecimento como Edificação e instalações (34 itens), Higienização (13 itens), Controle Integrado de Pragas (5 itens), Abastecimento de Água (9 itens), Manejo de Resíduos (6 itens), Manipuladores (15 itens), Matérias-primas, Ingredientes e Embalagens (17 itens), Preparação do Alimento (22 itens), Armazenamento e Transporte dos Alimentos Preparados (5 itens), Exposição ao Consumo (9 itens), Documentação e Registro (15 itens) e Responsabilidade (1 item). Foi estabelecido o ponto de corte de 76% para conformidade para se considerar o resultado da avaliação como Aprovado, corroborando o proposto por legislações estaduais, federais e artigos científicos. Recomenda-se o uso do método 5W2H, com elaboração de plano de ações corretivas com prazos de curto, médio e longo prazos para resolução das não-conformidades. PALAVRAS-CHAVE: Auditoria em boas práticas; critérios de pontuação; conformidade. INTRODUÇÃO A adoção de um sistema de gestão implica, normalmente, na padronização dos métodos e práticas de uma organização, uma vez que a padronização é de fundamental importância para as organizações (ABREU, 2007). A mes- ma também é importante para permitir a análise crítica e a conseqüente melhoria dos procedimentos e métodos da empresa, pois propicia uma perspectiva concreta do que analisar e melhorar. Segundo a trilogia Juran, o controle da qualidade é o processo para assegurar o cumprimento dos objetivos definidos no planejamento, durante as operações e consiste em avaliar o desempenho, comparar o desempenho obtido com as metas e atuar a partir das diferenças (MARSHALL JUNIOR et al., 2010). Umas das ferramentas utilizadas para avaliação preliminar das condições higiênico-sanitárias de um serviço de alimentação é a Lista de Verificação, a qual avalia: as condições ambientais; instalações, edificações e saneamento; equipamentos; sanitização, produção; embalagem e rotulagem; controle de qualidade e controle no mercado (SENAC, 2001). Esta avaliação inicial permite levantar pontos críticos ou não conformes e, a partir dos dados coletados, traçar ações corretivas para adequação de instalações, procedimentos e processos produtivos, buscando eliminar ou reduzir riscos físicos, químicos e biológicos, que possam comprometer os alimentos e a saúde do consumidor. Em setembro de 2004 entrou em vigência no Brasil a resolução RDC 216, do Ministério da Saúde, que dispõe sobre o Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação (BRASIL, 2004). Ressalta-se aqui que a complementação desta Portaria e Resoluções pelos órgãos de Vigilância Sanitária Estadual, Distrital e Municipal deve ocorrer, porém, sem nunca ferir a legislação federal (MORAIS, 2010). Quanto aos indicadores para conformidade à legislação encontram-se diversas publicações técnicas e científicas que citam a utilização de questionários para a avaliação das Boas Práticas de Fabricação e não comentam a forma de avaliação dos mesmos (MORAIS, 2010). Para analisar a situação de cozinhas hospitalares, o Programa Alimento Seguro sugere um check list específico onde se considera a influência de cada item sobre o grau de risco em relação à qualidade e segurança alimentar, sendo classificados como Imprescindível aquele item que pode * Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos – Curso de Mestrado – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – 23890-000 – Seropédica - RJ – Brasil. E-mail: [email protected]. ** Departamento de Tecnologia de Alimentos – Instituto de Tecnologia – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – 23890-000 – Seropédica – RJ – Brasil. MORAIS, I. C. L.; COSTA, S. R. R. Ferramentas de Qualidade para UANs. Alim. Nutr.= Braz. J. Food Nutr., Araraquara, v. 24, n. 1, p. 45-49, jan./mar. 2013. influir em grau crítico; Necessário, aquele item que pode influir em grau menos crítico; Recomendável, aquele que pode influir em grau não crítico e Informativo, aquele que oferece subsídios para melhor interpretação dos resultados (SENAC, 2004). Quando se fala em auditoria, fala-se em mudança organizacional, sendo a mesma, uma forma de buscar o aperfeiçoamento constante das organizações. O resultado da auditoria deve ser levado ao conhecimento do pessoal que tenha responsabilidade pela área auditada e as ações corretivas devem ser tomadas por sua administração em tempo hábil. Não é recomendável que a auditoria seja atribuição da gerência ou supervisão da área a ser auditada, quanto mais independente for o auditor, menos julgamentos tendenciosos serão emitidos. O auditor deve ainda ser qualificado profissionalmente, ou seja, ter conhecimentos específicos referentes à área que irá auditar deve ser treinado, ter independência em relação à área auditada e trabalhar em equipe de no mínimo duas pessoas. Não cabe ao auditor implementar melhorias ou solucionar problemas encontrados, irá apontar as possíveis falhas do auditado, não resolvê-las, isto é de responsabilidade da empresa, que poderá fazer as adequações com o auxílio de uma consultoria (GERMANO, 2008). A implantação desse sistema preconiza a aplicação de medidas preventivas e corretivas e o comprometimento da equipe para seu êxito, perpassando uma série de etapas que devem ser desenvolvidas e constantemente reavaliadas (LOVATTI, 2004). O método 5W2H é uma ferramenta utilizada no mapeamento e padronização de processos, na elaboração de planos de ação e no estabelecimento de procedimentos associados a indicadores. É de cunho basicamente gerencial e busca o fácil entendimento através da definição de responsabilidades, métodos, prazos, objetivos e recursos associados (MARSHALL JUNIOR et al., 2010). Estudos mostram o uso da ferramenta 5W2H para propor melhorias na qualidade dos serviços de um restaurante comercial self service no estado do Rio de Janeiro, concluindo que aplicada efetivamente contribui para diminuir o risco de doenças transmitidas por alimentos (LOURENÇO; CARVALHO, 2006). O objetivo do trabalho foi desenvolver um sistema de gestão da segurança de alimentos em Unidades de Alimentação e Nutrição de uma empresa de grande porte do ramo de energia através da elaboração de uma Lista de Verificação para auditorias, visando o diagnóstico de conformidade à legislação sanitária e a comparação com os indicadores de conformidade propostos buscando a melhoria contínua. MATERIAL E MÉTODOS Foi proposto utilizar um instrumento de medição de qualidade, ou seja, uma Lista de Verificação de Boas Práticas de Fabricação. Esta ferramenta foi elaborada com base na RDC 216, de 15/09/04 da ANVISA, legislação federal, 46 que dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Pesquisou-se nas legislações sanitárias federais (BRASIL, 2002; 2004), estadual de São Paulo (1998) e Rio Grande do Sul (2006) e municipal de Belo Horizonte (2000), assim como em diversos artigos científicos, os critérios de pontuação para avaliar as Boas Práticas de Fabricação de uma Unidade de Alimentação e Nutrição de uma empresa de grande porte do ramo de energia visando à criação de pontos de corte para classificação das Unidades, dando subsídios para a melhoria contínua dos processos através do uso de outra ferramenta. A ferramenta para acompanhamento gerencial identificada como a ideal para o acompanhamento dos resultados das auditorias é o método 5W2H, ou seja, estabelecer um plano de ação corretiva, identificando why (por que), what (o que), where (onde), when (quando), who (quem), how (como) e how much (quanto custa). RESULTADOS E DISCUSSÃO A alimentação inadequada deve ser considerada como situação de risco para a força de trabalho, passível de alteração e controle para prevenção, manutenção e recuperação da saúde. O absenteísmo é um indicador importante uma vez que está diretamente ligado à produtividade, afetado diretamente pela ocorrência de Doenças Transmitidas por Alimentos, somado a isso, há a obrigatoriedade de cumprimento da legislação vigente no país. Frente à necessidade da organização da gestão da segurança de alimentos nas Unidades de Alimentação e Nutrição de uma empresa de grande porte do ramo de energia, o estabelecimento de ferramentas de qualidade como sugerido neste trabalho é de grande valia, avaliando criticamente se os indicadores definidos foram aplicáveis e se as metas devem ser redefinidas, no mínimo uma vez ao ano. A Lista de Verificação proposta consta de 151 itens de verificação, distribuídos em blocos de avaliações de vários aspectos do estabelecimento como Edificação e instalações (34 itens), Higienização (13 itens), Controle Integrado de Pragas (5 itens), Abastecimento de Água (9 itens), Manejo de Resíduos (6 itens), Manipuladores (15 itens), Matérias-primas, Ingredientes e Embalagens (17 itens), Preparação do Alimento (22 itens), Armazenamento e Transporte dos Alimentos Preparados (5 itens), Exposição ao Consumo (9 itens), Documentação e Registro (15 itens) e Responsabilidade (1 item). A Lista de Verificação deve ser preenchida por meio de observação direta no próprio local complementado pela análise de documentos, quando pertinente. As opções de respostas para o preenchimento da Lista de Verificação são: “Conforme” (C) - quando o estabelecimento atendeu ao item observado. “Não Conforme” (NC) - quando o mesmo apresentou Não-conformidade. MORAIS, I. C. L.; COSTA, S. R. R. Ferramentas de Qualidade para UANs. Alim. Nutr.= Braz. J. Food Nutr., Araraquara, v. 24, n. 1, p. 45-49, jan./mar. 2013. “Não Aplicável (N/A) – quando o item é não aplicável. Com a construção da Lista de Verificação, buscou-se sistematizar as auditorias, estabelecendo um calendário de auditorias. Preconiza-se a verificação semestral do cumprimento das Boas Práticas. O resultado esperado é o atendimento de, no mínimo, 76% do total de itens para ser classificado como Aprovado, visando a excelência dos serviços e cumprimento da legislação sanitária vigente. A metodologia para a análise dos resultados é baseada no critério de pontuação adaptado da Portaria SMSA/ SUS-BH 18/2000 e na RDC nº. 275 de 21 de outubro de 2002 do Ministério da Saúde. De acordo com o critério de pontuação da RDC 275 de 21/10/2002, sugere-se a construção do panorama sanitário dos estabelecimentos produtores de alimentos, mediante sistematização dos dados obtidos nesse item. O panorama sanitário poderá ser utilizado como critério para definição e priorização das estratégias institucionais de intervenção. ( ) GRUPO 3 - 76 A 100% de atendimento dos itens ( ) GRUPO 2 - 51 A 75% de atendimento dos itens ( ) GRUPO 1 - 0 A 50% de atendimento dos itens Considerando que ambas as legislações consideram o ponto de corte >76% de conformidade como BOM (Belo Horizonte) e Grupo 3 (ANVISA), que não é prioritário para estratégia institucional de intervenção, foi estabelecido este valor para considerar o resultado da avaliação como Aprovado. Os itens cuja resposta foi “Não Aplicável”, não devem ser estatisticamente avaliados. O cálculo da pontuação do bloco deverá ser feito somando-se as notas referentes às respostas Conforme (C) e dividindo este valor pela pontua- ção máxima do bloco subtraído pela soma dos valores dos itens não aplicáveis (N/A). Akutsu et al. (2005), Saccol et al. (2006), Souza et al.(2009) e Cardoso et al. (2011) utilizaram metodologia semelhante à proposta neste trabalho, ou seja, baseada na RDC 216, utilizando os critérios de pontuação da legislação RDC 275, portaria municipal de Belo Horizonte (2000) e portaria estadual de São Paulo (1998), ou seja, adequados para aqueles acima de 75% de conformidades para classificação da conformidade dos estabelecimentos produtores de alimentos. Lyra & Akutsu (2008) também utilizaram os pontos de corte da RDC 275 como indicadores de sua lista de verificação para avaliação do sistema de gestão de segurança de alimentos de acordo com o cumprimento das normas ISO 22000:2006 e ISO 14001:2004. Já Seixas et al. (2008) e Machado et al. (2009) utilizaram os mesmos critérios de pontuação da RDC 275 porém a lista de verificação proposta por esta mesma legislação. Conforme encontrado nos vários estudos, após aplicação da Lista de Verificação, deve-se classificar a Unidade de Alimentação e Nutrição conforme o índice de conformidades. Caso o resultado não atinja o preconizado (≥76% de conformidades), deve-se estabelecer um plano de ação corretiva baseado no método 5W2H, ou seja, identificando why (por que), what (o que), where (onde), when (quando), who (quem), how (como) e how much (quanto custa). Contudo deve-se fazer um plano 5W2H para cada não-conformidade encontrada, independente do resultado da classificação com o objetivo de melhoria contínua, conforme exemplificado na Tabela 1. Tabela 1 – Exemplo de plano 5W2H para não-conformidades encontradas em auditoria. Plano 5W2H para não-conformidades encontradas Itens de Verificação Por que? O que? Tem Manual de Boas Práticas (MBP) e POPs? Cumprimento de legislação RDC 216 Presença de documento: MBP e POPs No processo de resfriamento do alimento preparado Resfriar o a temperatura do alimento de mesmo é reduzida Cumprimento forma segura de 60ºC para 10ºC, de legislação conforme no máximo em RDC 216 preconizado 2 horas, depois na legislação refrigerados a 5ºC federal ou congelados à – 18ºC para posterior consumo? Onde? Quando? Quem? Como? Quanto? Gerente Através de consultoria externa R$3.000,00 Com uso Manipulador de um Diariamente de alimentos resfriador rápido. R$80.000,00 Na sala da gerência, em local Diariamente disponível a todos Na área de cocção. 47 MORAIS, I. C. L.; COSTA, S. R. R. Ferramentas de Qualidade para UANs. Alim. Nutr.= Braz. J. Food Nutr., Araraquara, v. 24, n. 1, p. 45-49, jan./mar. 2013. CONCLUSÃO É importante monitorar se o processo de gestão de segurança dos alimentos colaborou positivamente para a melhoria contínua do processo de alimentação na empresa. A proposta aqui apresentada servirá de subsídio para as Unidades de Alimentação e Nutrição gerir a qualidade nos setores diversos de sua organização, contribuindo dessa forma para a excelência dos serviços prestados. MORAIS, I. C. L.; COSTA, S. R. R. Proposal of quality tools for food safety management system in food service. Alim. Nutr.= Braz. J. Food Nutr., Araraquara, v. 24, n. 1, p. 45-49, jan./mar. 2013. ABSTRACT: Quality management includes a management system that consists of principles, techniques, methods and tools. The objective of this study was to develop a quality tool with proposed indicators by the development of a checklist with scoring criteria for compliance audits, aimed at the diagnosis of compliance to health legislation, by verifying the effectiveness of the implementation of the Good Manufacturing Practices. The assessment tool was developed based on the RDC 216 of ANVISA which provides for Technical Regulation of Practice for Food Services. The checklist consists of 151 items of verification, distributed in blocks of evaluations of various aspects of the establishment as Building and Installations (34 items), Hygiene (13 items), Integrated Pest Management (5 items), Water Supply (9 items), Waste Management (6 items), Handlers (15 items), Raw materials, Ingredients and Packaging (17 items), Preparation of Food (22 items), Storage and Transportation of Food Preparations (5 items), Exposure Consumption (9 items), Documentation and Record (15 items) and Responsibility (1 item). It was established a cutoff of 76% for compliance to consider the assessment as Accepted, corroborating the legislation proposed by state, federal and scientific articles. It is recommended that you use method 5W2H with developing corrective action plan with deadlines for short, medium and long-term resolution of nonconformities. KEYWORDS: compliance. Audit practice; scoring criteria; REFERÊNCIAS ABREU, E. S. 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