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ATENÇÃO BÁSICA: ASPECTOS COMPARATIVOS –
BRASÍLIA E OUTRAS CAPITAIS
FLAVIO GOULART (Médico, Doutor em Saúde Pública; Membro do
Observatório da Saúde do DF – Email: [email protected])
CRITÉRIOS DE ESCOLHA DA AMOSTRA
•Regional, com pelo menos uma capital em cada região geográfica do país.
•Demográfica, cidades com população superior a um milhão de habitantes.
•Reconhecido desenvolvimento do sistema de saúde em termos de
implantação da ESF.
Base de dados: a mais atual possível (junho de 2013), com exceção
de Brasília (dezembro de 2012).
CIDADE
BRASÍLIA
GOIÂNIA
B. HORIZONTE
CURITIBA
FORTALEZA
BELÉM
REGIÃO
CO
CO
SE
S
NE
N
POP
2.609.998
1.318.149
2.385.640
1.764.541
2.476.589
1.402.056
BASE DE DADOS (DAB/MS)
CIDADE
BRASÍLIA
GOIÂNIA
B. HORIZONTE
CURITIBA
FORTALEZA
BELÉM
EqSF
IMPLANT
ESF POP
EqSF/
COBERTA 1000 HAB
133
458.850
182
627.900
497 1.714.650
294
696.900
294 1.014.300
696
400.200
0,05
0,13
0,21
0,17
0,12
0,49
ESF
EqSB
EqSB/
COBERT IMPLANT 1.000 HAB
ESTIM
17,58
51
0,02
47,63
91
0,06
71,87
234
0,09
39,49
152
0,09
40,96
197
0,08
28,54
05
0,00...
CONSIDERAÇÕES GERAIS
•O DF tem percentual de cobertura de ESF nitidamente inferior à das demais capitais
(17,58%). A única que se aproxima é Belém, com 28,54%.
•No campo oposto, destaca-se a situação de Belo Horizonte (71,87%), ficando Goiânia
(47,63%), Fortaleza (40,96%) e Curitiba (39,49%) em situação intermediária.
•As maiores populações cobertas estão em Belo Horizonte (1.714.650 pessoas) e
Fortaleza (1.014.300) enquanto, comparativamente, a população coberta no DF é
estimada em 458.850 pessoas.
•De longe, a capital que apresenta o maior número de equipes de SF implantadas é Belo
Horizonte, onde tal cifra chega quase a meio milhar. Na amostra escolhida, o DF tem o
menor número de equipes, apenas 133.
•Em termos de Saúde Bucal, os melhores desempenhos, ao menos no plano quantitativo,
estão em Belo Horizonte e Curitiba, seguidas de perto por Fortaleza e, logo a seguir,
Goiânia. Brasília, com 0,02 equipes de SB por mil habitantes fica apenas um pouco melhor
do que Belém, onde esta cifra é apenas virtual (cinco equipes implantadas).
ANO
EqSF
Implantadas/DF
POP
Coberta
2001
60
207.000
2002
40
138.000
2003
0
0
2004
38
131.100
2005
40
138.000
2006
24
82.800
2007
33
113.850
2008
39
134.550
2009
92
317.400
2010
120
414.000
2011
110
379.500
2012
133
458.850
IMPLANTAÇÃO DA ESF NO
DF – SÉRIE HISTÓRICA 2001 2012
ANÁLISE DO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO
•A implantação da ESF passou, no DF, por quase uma década de estagnação
e até mesmo de regressão, aspecto que começa a ser revertido apenas em
2009.
•Os contextos políticos deste período inicial estão ligados aos Governos
Roriz e Arruda, geralmente considerados como de poucas realizações na
atenção básica, com investimentos concentrados na construção de
hospitais, além de alta complexidade.
•A retomada, em 2009, está ligada ao breve mandato tampão de Rogério
Rosso, no qual a presença de Fabíola Aguiar como Gestora do SUS, foi
decisiva para o progresso da ESF, inclusive com a criação de uma sub
secretaria específica para tal área.
•A cifra obtida em dezembro de 2012, 133 equipes, ainda se encontra bem
abaixo da meta do governo Agnelo Queiroz, como se verá adiante
O QUE DIZ O GOVERNO DO DF?
•Página web (www.ses.df.gov.br): ESF como resultado de um movimento mundial, estratégia
capaz de <<estruturar redes integradas de atenção à saúde, como círculos virtuosos na
construção de sistemas de saúde efetivos, capaz de produzir melhoras na eficiência e
efetividade da atenção à saúde, com racionalização de custos, satisfação da clientela, além
de vinculação e co-responsabilidade entre esta, os profissionais e os gestores dos serviços>>.
•Objetivos da atual gestão da SES-DF: (a) prestação, na unidade de saúde e no domicílio, de
assistência integral, contínua, com resolubilidade e boa qualidade às necessidades de saúde
da população adstrita; (b) intervenção sobre os fatores de risco aos quais a população está
exposta; (c) eleição da família e do seu espaço social como núcleo básico de abordagem no
atendimento à saúde; (d) humanização das práticas de saúde; (e) estabelecimento de
parcerias intersetoriais; (f) democratização do conhecimento do processo saúde/doença, da
organização dos serviços e da produção social da saúde; (g) reconhecimento da saúde como
direito de cidadania e expressão da qualidade de vida; (h) estímulo à organização da
comunidade para o efetivo exercício social.
PLANO DE GOVERNO AGNELO QUEIROZ/2010
Acessível em
http://www.agneloqueiroz.com.br/arquivos/planodegoverno. pdf:
“Resgatar os princípios básicos de universalidade, integralidade e
equidade; efetivar a Atenção Básica de Saúde em todo o Distrito
Federal; restabelecer o Programa Saúde em Casa, articulado com o
Programa Saúde da Família (PSF) do governo federal, aumentando
o nº de equipes para 400. Ao lado disso, é proposta a criação de
Unidades de Pronto Atendimento (UPAS) 24 Horas, em todas as
regiões administrativas do Distrito Federal, bem como realizar a
reestruturação das unidades de saúde”.
SÍNTESE E CONCLUSÕES (1)
•Os dados que aqui se apresentam sem dúvida podem ser considerados
expressivos e reveladores de tendências concretas em termos da evolução
da atenção básica no DF, bem como na comparação com outras capitais.
•Percebe-se, acima de tudo, que no DF, no contexto atual, mas que também
reflete o acontecido nas últimas décadas, que a gestão da saúde não honra
a herança dos que conceberam o sistema de saúde inaugural da cidade, no
qual a cobertura universal, a regionalização, a descentralização das ações e
a qualidade dos serviços prestados eram pontos fundamentais.
•Além disso, pode-se inferir que um modelo assistencial centrado na
atenção básica, à semelhança de outras capitais brasileiras e de países que
podem ser considerados de excelência em termos de organização de
sistemas de saúde, está longe de ser alcançado no DF.
•A comparação com outras capitais do mesmo porte, mesmo de regiões
com indicadores econômicos piores, é reveladora da fragilidade do que se
vê por aqui.
SÍNTESE E CONCLUSÕES (2)
•O que não chega a ser surpresa para quem analisa os dados disponíveis, é que o
discurso das autoridades, seja nos planos de governo ou nos textos de apresentação
do setor de atenção básica da SES-DF, mostra-se totalmente em descompasso com a
realidade que se demonstra através das cifras de cobertura.
•As bases de dados que poderiam ser oferecidas pela própria SES-DF não estão
acessíveis, por exemplo, em relação à cobertura da ESF e da localização das equipes,
motivo pelo qual os procedimentos de análise devem ser feitos através do Portal
Web do Ministério da Saúde.
•Mesmo com o atraso histórico registrado no desenvolvimento da atenção básica, a
recuperação e o ritmo de retomada da implementação da ESF tem se revelado
bastante aquém das expectativas e das necessidades.
•A presente análise se completaria com dados mais qualitativos, por exemplo,
prevalência de internações por condições sensíveis, critérios da distribuição das
equipes no território, resolutividade, qualidade e humanização do atendimento
prestado, bem como permanência de concorrência de dois sistemas, ou mais, papel
das UPAs, planejamento baseado em demandas e dados epidemiológicos, processos
de capacitação etc. Para isso, infelizmente, a carência de informações é muito
grande...
POR QUE ATENÇÃO BÁSICA?
PROCESSO DE TRABALHO EM SAÚDE DA FAMÍLIA STARFIELD (1998)
1.PRIMEIRO CONTACTO: implica a acessibilidade e o uso de serviços para cada novo problema
ou novo episódio de um problema para os quais se procura atenção à saúde.
2.LONGITUDINALIDADE: manifesta a existência do aporte regular de cuidados pela equipe de
saúde e seu uso consistente ao longo do tempo, num ambiente de relação mútua de confiança e
humanizada entre equipe de saúde, indivíduos e famílias.
3.INTEGRALIDADE: pressupõe a prestação, pela equipe de saúde, de um conjunto de serviços
que atendam às necessidades da população adscrita nos campos da promoção, da prevenção,
da cura, do cuidado e da reabilitação, a responsabilização pela oferta de serviços em outros
pontos de atenção à saúde e o reconhecimento adequado dos problemas biológicos,
psicológicos e sociais que causam as doenças.
4.COORDENAÇÃO: conota a capacidade de garantir a continuidade da atenção, através da
equipe de saúde, com o reconhecimento dos problemas que requerem seguimento constante e
se articula com a função de centro de comunicação das redes de atenção à saúde.
5.FOCALIZAÇÃO NA FAMÍLIA: impõe considerar a família como o sujeito da atenção, o que exige
uma interação da equipe de saúde com esta unidade social e o conhecimento integral de seus
problemas de saúde e das formas singulares de abordagem familiar.
6.ORIENTAÇÃO COMUNITÁRIA: coloca o reconhecimento das necessidades das famílias em
função do contexto físico, econômico, social em que vivem, o que exige uma análise situacional
das necessidades de saúde das famílias numa perspectiva populacional e a sua integração em
programas intersetoriais de enfrentamento dos determinantes sociais da saúde.
7.COMPETÊNCIA CULTURAL: exige uma relação horizontal entre e equipe de saúde e população
que respeite as singularidades culturais e as preferências das pessoas e das famílias.
POR QUE APS?
Melhoram os resultados
sanitários
Produzem serviços mais
custo-efetivos
Diminuem as referências a
especialistas e as hospitais
Aumentam a satisfação dos
clientes
Aumentam a eficiência dos
sistemas de atenção à saúde
Melhor qualidade percebida
APS: “AGORA MAIS DO QUE NUNCA” - I (OMS, 2010)
REFORMA DA APS:
MOVIMENTO TRADICIONAL
Provisão de um pacote básico
de intervenções sanitárias e
de medicamentos essenciais
focados em populações
rurais pobres
Concentração em mães e
crianças
Foco em doenças
selecionadas especialmente
condições agudas de
natureza infecciosa
Melhoria do saneamento e da
educação em
saúde no nível local
Uso de tecnologia simplificada
por
agentes
comunitários de saúde
não profissionais
IMPLEMENTAÇÃO ATUAL (RENOVADA)
DA MUDANÇA
DA APS
Transformação e regulação do sistema de
atenção à
saúde buscando o acesso universal e a
proteção
social em saúde
Atenção à saúde para toda a comunidade
Resposta às necessidades e expectativas das
pessoas
em relação a um conjunto amplo de riscos e
doenças
Promoção de comportamentos e estilos
de vida saudáveis e mitigação dos danos
sociais e ambientais sobre a saúde
Equipes de saúde facilitando o acesso e o uso
apropriado de tecnologias e medicamentos
APS: “AGORA MAIS DO QUE NUNCA” - II (OMS, 2010)
Participação como mobilização
de
recursos locais e
gestão dos
centros
de saúde por meio de
comitês locais
Financiamento governamental e
prestação de serviços com
gestão centralizada
Gestão da escassez
Ajuda e cooperação técnica
bilateral
APS como antítese do hospital
APS é barata e requer
modestos investimentos
Participação institucionalizada da sociedade civil no
diálogo político e nos mecanismos de
accountability
Sistemas pluralísticos de atenção à saúde
operando
num contexto globalizado
Crescimento dos recursos da saúde rumo à
cobertura
universal
Solidariedade global e aprendizagem conjunta
APS como coordenadora de uma resposta bem
ampla
em todos os níveis de atenção
APS não é barata e requer investimentos
consideráveis mas gera maior valor para o dinheiro
investido que todas as
outras alternativas
ESF: BOAS PRÁTICAS E CÍRCULOS VIRTUOSOS – I (GOULART, 2007)
•Boa condução: capacidade de tomada de decisões, liderança, carisma,
espírito empreendedor, embasamento ideológico, além de qualificação
técnica e continuidade.
•Boas equipes técnicas: conhecimento, tradição de discussões em saúde, base
ideológica, capacidade empreendedora, militância, sintonia com o projeto
político, aceitação da liderança, organização e inserção em entidades
representativas
•Boas práticas sociais: por equilíbrio e sintonia entre as propostas de governo
e as da sociedade; associação sinérgica entre as noções de responsabilidade
pública e de direito à saúde
•Boas práticas políticas e administrativas: transparentes, efetivas e
socialmente aceitáveis, para além do campo da saúde, (substrato ideológico:
cidadania, direitos coletivos e responsabilidade pública)
ESF: BOAS PRÁTICAS E CÍRCULOS VIRTUOSOS – II (GOULART, 2007)
•Boa articulação externa: prática de um cosmopolitismo político e sanitário
•Boa implementação programática: padrões substitutivos dos modelos de
atenção, com afastamento dos elementos estruturais e ideológicos dos velhos
regimes de práticas.
•Desenvolvimento de inovações: gerenciais ou assistenciais (diferente de meras
“novidades” ousadia e o destemor – frente às possibilidades de erro e reversão.
•Busca de sustentabilidade: financeira, estrutural, processual, cultural, simbólica
e política
•Enraizamento no imaginário da comunidade de usuários e dos tomadores de
decisão.
•Efeito espelho (pedagogia do exemplo): articulação e da difusão da experiência
local entre interlocutores externos
“Uma coisa é por idéias arranjadas, outra é lidar com país de pessoas, de
carne e sangue, de mil e tantas misérias... Tanta gente – dá susto de
saber – e nenhum se sossega: todos nascendo, crescendo, se casando,
querendo colocação de emprego; querendo chuva e negócios bons. De
sorte que carece de se escolher...”
(Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas)
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