o mito grego sobre a origem do mal: a caixa de pandora

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O MITO GREGO SOBRE A ORIGEM
DO MAL: A CAIXA DE PANDORA
Sempre causou perplexidade aos filósofos e teólogos a existência do mal no mundo.
Afinal se Deus é bom, justo, infalível e poderoso, como o mal pode surgir em sua obra e
por que o mal parece ser tão difícil de ser suprimido?
Essa indagação gerou os mais diversos mitos explicativos nas antigas tradições, como a
saga de Seth e Osíris, no Egito, Ormuz e Ariman, na Pérsia, Adão, Eva e a serpente,
entre os hebreus e o mito de Pandora entre os gregos.
Embora sejamos herdeiros da tradição judaico-cristã e o mito de Adão e Eva tenha sido
consagrado como verdade literal e absoluta pelos teólogos fundamentalistas judeus e
cristãos, precisamos reconhecer a beleza e a profundidade do mito grego de Pandora,
que é mais engenhoso e rico em nuances psicológicas.
A estória começa com Prometeu , um dos titãs, escalando o Olimpo e roubando o fogo
dos deuses para oferecer aos homens (o fogo do conhecimento?).
Zeus, o rei dos deuses, furioso com tamanha ousadia, prendeu-o e o amarrou em um
rochedo, onde um abutre vinha todos os dias comer-lhe o fígado, que se regenerava
durante a noite, para ser comido novamente pelo abutre no dia seguinte. Esse mito
sugere o sofrimento caudado pela insaciedade do homem e, em outro nível, significa o
longo e penoso ciclo de morte e renascimento, que os budistas denominam roda do
Sansara.
Zeus, porém, não satisfeito com a vingança desfechada contra o ladrão, resolveu vingarse também de todos os homens beneficiários do fogo roubado por Prometeu. Então
ordenou que Hefesto, o Deus-ferreiro do mundo subterrâneo, fizesse a mulher.
Hefesto fez uma mulher belíssima chamada Pandora e a apresentou a Zeus antes de ela
descer à superfície da Terra. Zeus, admirado com a obra de Hefesto, despachou Pandora
para a Terra, mas antes lhe deu uma grande e belíssima caixa de marfim ornamentada
fechada e também lhe deu a chave, dizendo-lhe: “Quando você se casar, ofereça esta
caixa como dote ao seu marido, mas a caixa só pode ser aberta após seu casamento”.
Em pouco tempo, Pandora conheceu Epimeteu, irmão mais novo de Prometeu e logo se
casaram. A princípio, Pandora estava muito feliz com seu casamento e passava os dias
cuidando da casa e do lindo jardim, tendo se esquecido da caixa.
Porém Epimeteu viajava constantemente e, certa vez, ficou muito tempo longe de casa.
Pandora sentia-se só e triste. Lembrou-se da caixa e foi até o canto onde estava
guardada examiná-la curiosamente. Enquanto observava os lindos detalhes e adornos
externos, Pandora pareceu ouvir pequenas vozes gritando lá de dentro e dizendo:
“Deixe-nos sair!..Deixe-nos sair...”. Pandora não podia esperar mais. Foi correndo
buscar a chave e imediatamente abriu a tampa da caixa. Para sua grande surpresa
centenas de pequeninas e monstruosas criaturas, parecendo terríveis insetos, saíram
voando lá de dentro, com um zumbido assustador.
Muitas dessas horríveis criaturas a picaram na face e nas mãos e saíram em enxame pela
janela, fazendo um barulho infernal. Logo a nuvem desses insetos cobriu o sol, e o dia
ficou escuro e cinzento. Apavorada, Pandora fechou a caixa e sentou-se sobre a tampa.
As picadas dos insetos doíam muito, mas algo mais a estava preocupando: Ela estava
tendo toda a espécie de sentimentos e pensamentos sombrios e odiosos que nunca tivera
antes. Sentiu raiva de si mesma por ter aberto a caixa. Sentiu uma grande onda de ciúme
de Epimeteu. Sentiu-se raivosa e irritada. Percebeu que estava doente de corpo e de
alma.
Súbito pareceu-lhe ouvir outra vozinha gritando de dentro da caixa: “Liberte-me!
Deixe-me sair daqui!”. Pandora respondeu rispidamente: “Nunca! Você não sairá ! Já
fiz tolice demais em abrir essa caixa!”
Mas a voz prosseguiu de dentro da caixa: “Deixe-me sair, Pandora! Só eu posso ajudála!”
Pandora hesitou, mas a voz era tão doce, e ela se sentia tão só e desesperada,que
resolveu abrir a caixa. De lá de dentro saiu uma pequena fada, com asinhas verdes e
luminosas que clarearam um pouco aquele quarto escuro, aliviando a atmosfera que se
tornara pesada e opressiva. “Eu sou a Esperança”, disse a fada. E prosseguiu: “Você fez
uma coisa terrível, Pandora! Libertou todos os males do mundo: egoísmo, crueldade,
inveja, ciúme, ódio, intriga, ambição, desespero, tristeza, violência e todas as outras
coisas que causam miséria e infelicidade. Zeus prendeu todos esses males nessa caixa e
deu a você e a seu marido. Ele sabia que você iria, um dia, abrir essa caixa. Essa é a
vingança de Zeus contra Prometeu e todos os homens, por terem roubado o fogo dos
deuses!”
Chorando copiosamente, Pandora disse: “Que coisa terrível eu fiz! Como poderemos
pegar todos esses males e prendê-los novamente na caixa?”
“Você nunca poderá fazer isso Pandora!” Respondeu tristemente a fada da Esperança.
“Eles já estão todos espalhados pelo mundo e não podem mais ser presos!”
“Mas há algo que pode ser feito: Zeus enviou-me também, junto com esses males, para
dar esperança aos sofredores, e eu estarei sempre com eles, para lembrar-lhes que seu
sofrimento é passageiro e que sempre haverá um novo amanhã !”
Explicação filosófica do mito
Em um ponto, o mito de Pandora é essencialmente diferente do mito de Adão e Eva.
O mal que se propagou no mundo também faz parte de uma decisão de Zeus e não da
intervenção de um adversário externo, como Satã, que tem planos e desígnios contrários
ao Deus Supremo.
Embora no constructo mitológico o surgimento dos males esteja descrito como uma
“vingança de Zeus” está claro que foi uma Conseqüência de os homens se terem
apropriado de um elemento divino – a autoconsciência e o conhecimento do bem e do
mal, simbolizados pelo fogo dos deuses, mas ainda não estarem maduros para lidar com
esse poderoso elemento, até então de posse exclusiva dos deuses.
Os homens adquiriram uma faculdade de conhecimento até então exclusiva dos deuses e
se tornaram potencialmente divinos, mas ainda eram primários e animalizados (nos
mitos, este estágio da humanidade é representado pelos titãs ou pelos homens da
Atlântida) para saberem lidar com essa força divina que agora existia em sua alma.
Analogamente, podemos citar o fato de que os chimpanzés aprenderam a técnica de usar
pedras para quebrar nozes, mas imaginem quantos males aconteceriam na floresta se
eles aprendessem a fabricar dinamite.
O homem físico não passa de um chimpanzé ligeiramente aperfeiçoado, dotado de uma
centelha de consciência que pertence à ordem divina do Universo. Essa coexistência
entre nossa natureza animal e nossa natureza divina é a causa de todos os males, pois o
conflito é inevitável enquanto a natureza divina ainda não “domou” e “domesticou”
totalmente a natureza animal.
No mito de Adão e Eva, parece que existe uma possibilidade de se evitar o pecado e a
queda, enquanto no mito grego essa inevitabilidade é evidente: Uma vez que Prometeu
roubou o fogo dos deuses, as conseqüências viriam inevitavelmente: Zeus sabia que
Pandora abriria a caixa, enquanto no mito hebreu parece que Deus não sabia se Adão
obedeceria ou não à proibição divina de comer o fruto proibido.
Aos compararmos a versões mitológicas análogas da cultura hebraica e da grega, não
queremos valorizar uma e desvalorizar a outra, mas sim destacar o fato de que as
tradições refletem o contexto cultural e religioso dos povos a que se destinam.
A cultura hebraica jamais poderia supor que Deus pudesse também dar origem ao mal,
visto que seria inadmissível que um Deus Bom e Justo pudesse originar o mal.
A cultura grega jamais poderia admitir que o Deus Supremo pudesse ter um adversário e
opositor, visto que um Deus Sábio e Poderoso não poderia ter sua obra obstruída por
algum adversário.
Sempre que aplicamos atributos e qualificações à Divindade, essas distorções são
produzidas, porque as atribuições são qualificações antropomórficas feitas pelos
próprios homens , que criam uma imagem de Deus, como uma imagem sublimada de si
próprios, projetando nela as imagens e ideais mais valorizados pelas diversas sociedades
humanas.
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