Curso Popular de Formação de Defensoras e Defensores Públicos Direito Civil – Módulo I Professora Cristina Otaviano E-mail: [email protected] Aulas 3 e 4 9. Pessoa natural. Aquisição e extinção da personalidade. Direitos da personalidade. Embrião excedentário. Nome. Nome social.Transexualidade. I. Pessoa Natural 1. Conceito É o ser humano com vida, dotado de estrutura biopsicológica. Para Teixeira de Freitas – é o ente de existência visível. Não é correta a expressão “ente biologicamente criado” – há outras formas (in vitro). Atenção: Não caia na pegadinha de concurso que mencionada a necessidade de quaisquer dos elementos mencionados acima para que o ser humano adquira personalidade. Para o Código Civil basta o nascimento com vida. Artigo 1º do CC – “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil” Toda e qualquer pessoa natural dispõe de personalidade jurídica, podendo titularizar relações jurídicas. Para Cristiano Chaves ter personalidade jurídica significa ser titular de direitos e deveres e titularizar direitos da personalidade, pois alguns entes despersonalizados (condomínio, massa falida) possuem direitos e deveres, mas não são pessoas jurídicas. 2. Início da pessoa natural Do nascimento com vida (artigo 2º do CC) – verificado com o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório. Docimasia hidrostática de Galeno ou Docimasia Pulmonar Não precisa revestir forma humana (afrontaria a dignidade); Não precisa ser viável (França e Holanda); Não precisa permanecer vivo por um lapso de tempo determinado (Espanha – 24 horas); Não precisa do corte do cordão umbilical (Washington de Barros Monteiro). Existe celeuma quanto ao nascituro Atenção: Não caia na pegadinha de concurso que afirma que a pessoa adquire direitos com o registro do assento de nascimento. De acordo com o CC a pessoa titulariza direitos com o nascimento com vida. O registro é mera formalidade administrativa. Declara o nascimento com vida e a aquisição da personalidade (diferentemente da pessoa jurídica, que passa a existir a partir do registro). É ato declaratório e não constitutivo. 3. Extinção da pessoa natural A existência da pessoa natural termina com a morte (CC, artigo 6º), que se verifica com a morte encefálica, sendo desnecessário o reconhecimento judicial desse fato. Efeito Principal da morte: Extinção da personalidade jurídica da pessoa natural Efeitos Secundários da morte (dentre outros): - Abertura da a sucessão (CC, art. 1.784); - Extinção do poder familiar (CC, art. 1.635, I); - Extinção dos contratos intuitu personae (personalíssimos); - Cessação da obrigação de alimentos, para ambas as partes (CC, art. 1.697); - Extinção do usufruto; - Extinção do casamento ou da união estável; - No Direito Penal - extinção da punibilidade do agente (CP, art. 107)... 3.1.“Espécies” de Mortes Real Morte Presumida Com declaração de ausência Sem declaração de ausência 1. Morte Real: É a regra no sistema jurídico pátrio. Para o seu reconhecimento exige-se uma declaração médica da ocorrência da morte encefálica para que seja lavrada a certidão de óbito. A morte real será certificada pelo médico à vista do cadáver. 2. Morte Presumida: 2.1. Sem declaração de ausência (morte real sem cadáver): Prevista no artigo 7º do CC e artigo 88 da LRP - Probabilidade extrema da morte de quem estava em perigo de vida (afogamento); - Desaparecimento em campanha ou feito prisioneiro e não encontrado após 2 anos do fim da guerra; - Desaparecimento em naufrágio, incêndio, terremoto ou qualquer outro desastre; - Desaparecidos em razão de participação (ou acusados de participação) em atividades políticas entre 2.9.61 e 5.10. 88, reputados mortos pela (Lei 10.536/02); - Exemplos: Queda do avião da Tam em SP., afogamentos, “caso Amarildo”. Procedimento: - Procedimento de justificação de óbito (jurisdição voluntária); - Competência da Vara de Registros Públicos, Vara de Família (subsidiariamente Vara Cível); - Produção de provas que demonstrem a ocorrência do óbito, data, local e demais circunstâncias; - O juízo declara o local e data do óbito, determinado que seja realizado seu registro. 2.2. Com declaração de ausência - Prevista nos artigo 22 a 39 do CC; - O ausente é a pessoa que desaparece do seu domicílio sem deixar notícias ou procurador ou, mesmo deixando um procurador, este não queira ou não possa exercer ou continuar exercendo o mandato, ou se os poderes conferidos forem insuficientes; - No CC de 1916 a ausência era tratada como hipótese de incapacidade civil; - O ausente é considerado como se morto fosse; - A declaração de ausência depende de procedimento judicial (jurisdição voluntária) – Artigos 744 e 745 do NCPC; - A declaração de ausência está organizada em 3 fases: (i) a curatela dos bens do ausente (arts. 22 a 25); (ii) (ii) a sucessão provisória (arts. 26 a 36); e (iii) (iii) a sucessão definitiva (arts. 37 a 39). Curatela dos bens do ausente: - Início por provocação de qualquer interessado ou do Ministério Público, dando conta ao juiz de que uma determinada pessoa desapareceu de seu domicílio, dela não havendo notícias; - Comprovado o desaparecimento, o juiz, ouvido o Ministério Público, declara a ausência, determinando, na mesma decisão, a arrecadação dos bens do ausente, a publicação de editais durante um ano, reproduzidos de dois em dois meses, anunciando o levantamento dos bens e convocando o ausente a retomar a posse de seus bens (CPC, art. 1.161) e, finalmente, nomeando um curador para os bens do ausente; - Não há exigência legal de prazo mínimo de desaparecimento do ausente para que seja requerida a abertura do procedimento e a declaração de ausência; - Essa primeira fase é voltada à proteção do patrimônio do ausente, mitigando-se a proteção de terceiros; - Exatamente por isso, é vedada a prática de qualquer ato de disposição pelo curador; - O procedimento de ausência estará submetido à lei vigente no momento da declaração de ausência - o que ocorre na primeira fase; - Em regra, o cônjuge – ou o companheiro – do ausente será o seu legítimo curador, salvo se houver separação judicial ou cartorária, divórcio, separação de fato ou dissolução da união estável; - Contado o prazo de um ano da arrecadação dos bens, tem ensejo a segunda fase do procedimento de ausência, que diz respeito à sucessão provisória. Sucessão provisória: - Haverá uma transmissão precária do patrimônio do ausente, em favor de seus herdeiros; - Não pode haver alienação dos bens – exceto na hipótese de ruína ou desapropriação; - Os frutos e rendimentos produzidos pelos bens que couberem ao descendente, ascendente ou cônjuge a eles pertencem. Já os demais sucessores deverão capitalizar metade desses frutos e rendimentos; - Se o ausente reaparecer receberá seus bens e a metade dos frutos (exceto se a ausência for voluntária); Sucessão definitiva - Após dez anos do trânsito em julgado da sentença que reconheceu a abertura da sucessão provisória; - Outra possibilidade de requerimento da sucessão definitiva ocorre quando o ausente está desaparecido há, pelo menos, cinco anos e que já conte com 80 anos de idade, ao menos, pois a idade já avançada diminui a probabilidade de que ainda esteja vivo; - A lei prestigia o interesse dos herdeiros: a transmissão dos bens se dá em caráter definitivo e os herdeiros podem dispor livremente dos bens; - o domínio está sujeito à condição resolutiva, ou seja, se o ausente aparecer nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, receberá os bens no estado em que se encontrem, os sub-rogados em seu lugar ou o preço que seus herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo; - Se retornar após ocorrer depois do prazo de dez anos da sentença que declarou aberta a sucessão definitiva, não haverá mais qualquer direito ao recebimento de bens; - Com o trânsito em julgado da sentença que reconhece a abertura da sucessão definitiva, haverá uma presunção de morte do ausente. 3. Declaração de ausência e dissolução do casamento: Declarada por sentença a morte presumida resta dissolvido o casamento ou união estável. Posição majoritária: abertura da sucessão definitiva (único momento) Momento abertura da sucessão definitiva (patrimoniais) Posição Minoritária: Abertura da sucessão provisória (pessoais e familiares) Retorno do ausente: quais as consequências para o novo matrimônio do consorte? 4. Comoriência É uma presunção de simultaneidade de óbitos, aplicável quando, morrendo duas ou mais pessoas ao mesmo tempo (simultaneamente), não for possível indicar, com precisão, a premoriência, ou seja, quem precedeu a morte de quem (artigo 8º do CC). - Não precisam estar no mesmo local; - A presunção somente pode ser afastada por prova robusta; - Traz praticidade e segurança jurídica; - Alguns ordenamentos adotam presunção de ordem de falecimentos (Inglês e Francês) - Importância: Não há transmissão de patrimônio entre os comorientes; Questões polêmicas: 1.Existe direito a uma morte digna? Diretivas antecipadas ou testamento vital (resolução n. 1.995/2012 - CFM): É o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente que padece de doença terminal e incurável definidos enquanto estiver no gozo de suas faculdades mentais, estabelecendo os limites terapêuticos a serem adotados em seu tratamento de saúde, em eventual hipótese de impossibilidade de manifestação de vontade. - A declaração terá validade e eficácia e prevalecerá sobre a vontade de parentes e qualquer parecer não médico; - Não há necessidade de registro da declaração em cartório; - A dignidade da pessoa humana também se projeta na morte – direito a vida digna é direito à morte digna; - Não se discute aqui a eutanásia – vedada pelo ordenamento jurídico (homicídio privilegiado); - Recusa em se submeter a tratamentos que só prolongam a agonia; - Proporcionalidade; - Análise à luz do caso concreto; - Autonomia privada. Atenção: Diretivas antecipadas mistanásia (eutanasia social) eutanásia distanásia (obstinação terapêutica) ortotanasia (eutanasia por omissão). II. Nascituro 1. Conceito É o ser concebido e não nascido (tem de haver vida intrauterina). A questão quanto a existência de personalidade do nascitura é controvertida. Atenção: Nascituro natimorto embrião 2.Teorias sobre a personalidade do nascituro: concepturo O CC Dispõe em seu artigo 2º: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. A redação do dispositivo é contraditória (a personalidade começa do nascimento com vida, mas o nascituro possui direitos??). Para dirimir a controvérsia a doutrina construiu três teorias: 1. Teoria Natalista: Também conhecida como teoria negativista (nega a personalidade); Ao nascituro não se reconhecem direitos, pois não possui personalidade (possui mera expectativa de direito); Teria sido afastada pelo Código Civil (vez que o artigo 2º resguarda os direitos do nascituro); Para Corrente mais radical o nascituro é coisa; Silvio Rodrigues e Arnoldo Wald; ADI 3510 (Lei de Biossegurança) – Permitiu experimentos com os embriões excedentários – reforçando essa teoria; É a mais prática – pois delimita com exatidão o momento aquisitivo da personalidade; 2. Teoria da Personalidade Condicional: Também conhecida como teoria condicionalista ou da personalidade virtual; Estaria submetido à uma condição suspensiva para a aquisição da personalidade– nascimento com vida; O nascituro possui direitos da personalidade (personalidade formal); Os direitos patrimoniais estão condicionados ao nascimento com vida (logo a personalidade está condicionada); Washington de Barros Monteiro, Fábio Ulhoa Coelho; Crítica: Não se diferencia da teoria concepcionista - não traz avanço. 2. Teoria Concepcionista: O nascituro possui personalidade jurídica (adquirida na concepção); Possui Direitos da personalidade (logo possui personalidade); A aquisição de direitos patrimoniais está condicionada ao nascimento com vida; Possui base no CC – Artigo 1.609, parágrafo único (que permite o reconhecimento da filiação do nascituro), 1.779 (possibilidade de nomeação de curador ao nascituro), 542 (autorizando doação ao nascituro) e 1.798 (capacidade sucessória do nascituro); Adotada pela maioria da Doutrina: Pontes de Miranda, Renan Lotufo, J. M. Leoni Lopes de Oliveira, Rubens Limongi França, Francisco Amaral, José Ascensão de Oliveira, Flávio Tartuce, Silmara Chinellato e Almeida; A jurisprudência é refratária (mas há julgados adotando); A lei dos alimentos gravídicos reforça a teoria (mas há controvérsia quanto à titularidade); STJ – Resp. 399.028/SP – admitiu indenização ao nascituro pela perda do pai; O Pacto de São José da Costa Rica adota a teoria Concepcionista – Artigo 4º, 1 (protege a vida desde a concepção). DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. MORTE. ATROPELAMENTO. COMPOSIÇÃO FÉRREA. AÇÃO AJUIZADA 23 ANOS APÓS O EVENTO. PRESCRIÇÃO INEXISTENTE. INFLUÊNCIA NA QUANTIFICAÇÃO DO QUANTUM. PRECEDENTES DA TURMA. NASCITURO. DIREITO AOS DANOS MORAIS. DOUTRINA. ATENUAÇÃO. FIXAÇÃO NESTA INSTÂNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I - Nos termos da orientação da Turma, o direito à indenização por dano moral não desaparece com o decurso de tempo (desde que não transcorrido o lapso prescricional), mas é fato a ser considerado na fixação do quantum. II - O nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstância de não tê-lo conhecido em vida tem influência na fixação do quantum. III Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado desde logo, inclusive nesta instância, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando inconvenientes e retardamento da solução jurisdicional. RESP. 399.028/SP. DISTINÇÃO ENTRE A TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONAL E CONCEPCIONISTA: “Enfim, a distinção entre a teoria condicionalista e a teoria concepcionista é, tão somente, relativa à qualificação jurídica: para os concepcionistas, se o nascituro dispõe de direitos da personalidade, é porque já tem a própria personalidade jurídica, apesar de os direitos patrimoniais ficarem condicionados; de outra banda, os condicionalistas afirmam que, apesar de já titularizar os direitos da personalidade, se os direitos patrimoniais estão condicionados, a personalidade jurídica, como um todo, está condicionada.” Professor Cristiano Chaves. Obs. 1: A questão não deveria em regra ser cobrada em prova objetiva, mas em dissertativa. Multipla escolha – optar pela lei ou verificar se pede uma das teorias; Dissertativa – Fale sobre as três; Conheça o posicionamento da banca. Atenção: ADPF 54 – INTERRUPÇÃO DE GESTAÇÃO DE FETO ANENCEFÁLICO – A proteção ao nascituto não impede a interrupção da gestação do feto anencefálico. Há falta de viabilidade potencial de vida humana. Existe o interesse em se preservar a integridade física e psíquica da gestante. Exigese prova da anencefalia e da inviabilidade da vida. Questões Polêmicas: 1. PERGUNTA DO EXAME ORAL DO VII CONCURSO DA DPE/SP: É possível a interrupção de gestação de feto com microcefalia? Deve-se defender que a hipótese é em tudo distinta daquela tratada na ADPF 54. Existe a possibilidade de sobrevivência da criança após o parto, embora com limitações de intensidade variável. O ser humano não pode ser tratado como objeto. A interrupção de gestação de feto com microcefalia seria uma espécie de eugenia. Espécie de técnica que visa “melhorar qualidades físicas e morais de gerações futuras“ e frequentemente é associado a políticas de controle social adotadas por Adolf Hitler durante o regime nazista alemão. É importante pontuar que em concurso da DPE/SP o posicionamento favorável a legalização do aborto (em geral) é recomendável (A vedação ao aborto não protege a vida – morte de gestantes). 2. POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIDADE CIVIL DA GESTANTE POR COMPORTAMENTO PREJUDICIAL AO NASCITURO: É possível responsabilizar a gestante por comportamento prejudicial durante a gestação (abuso de álcool, drogas, medicamentos etc.)? O comportamento da gestante poderá trazer graves consequências à criança(inclusive má formação física). Há conflito entre a liberdade da gestante sobre o próprio corpo e à vida do feto. Se admitida, se cuidaria de responsabilidade civil subjetiva, dependente da comprovação da culpa lato sensu, na forma do caput do artigo 927 do Código de 2002. A eventual ação movida pelo filho contra a genitora pode ser ajuizada antes ou depois do nascimento com vida, representado pelo seu responsável (o pai, nesse caso, ou um curador especial, nomeado pelo juiz, na forma dos artigos 1.779 . A tendência no direito comparado é resolver essa questão em favor da criança, estabelecendo responsabilidades para a gestante (e, a depender do caso, ao médico, quando atuar culposamente). No direito norte-americano encontra-se o caso Jefferson c. Griffin Spalding County Hospital Authority 274 S.E. Ed 457, julgado em 1981, pela Suprema Corte da Geórgia, no qual se ordenou a uma gestante de 39 semanas submeter-se a uma cesariana, contra a sua vontade, para salvar a vida do feto, ameaçada em razão de problemas durante a gestação. Localiza-se, também, outro precedente, relativo ao Caso Jennifer Johnson, com a primeira condenação de uma mulher, nos Estados Unidos, por ter contaminado o próprio filho, com fortes doses de cocaína, através do cordão umbilical. Na jurisprudência Italiana um Tribunal de Piacenza admitiu a responsabilidade dos pais por dano pré-concepcional causado à integridade física do filho, a quem transmitiram moléstia grave contagiosa 3. Direitos do Nascituro É pacífico (independentemente da teoria que se adote)que o nascituro possui alguns direitos: Direito a vida (veda-se o aborto); Direito a assistência pré-natal, mediante a efetivação de políticas pública (ECA, artigo 7º); Direito à alimentos (Lei dos Alimentos Gravídicos – Lei no 11.804/08); Direito ao reconhecimento de sua filiação (Rcl. 2040/DF – Caso Glória Trevis – no qual o STF decidiu que o feto possuía direito a conhecer sua filiação); Capacidade de ser parte ativa em uma relação jurídico-processual (ser autor de um processo). Se a lei lhe confere direitos, deve lhe conferir meios para defendê-los, por meio de sua capacitação para a demanda; Atenção: No que tange aos direitos de natureza patrimonial (apreciáveis economicamente), como a doação, a herança, o legado e a pensão previdenciária, somente serão adquiridos pelo nascituro com o nascimento com vida, uma vez que a plenitude da eficácia desses direitos patrimoniais fica condicionada a esse evento futuro e incerto (nascimento com vida). Exemplificando, se é doado um imóvel a um nascituro, enquanto ele não nascer com vida, não poderá ser promovido o registro regular no Cartório de Imóveis em seu nome. Todavia, se alguém pagou os tributos devidos, poderá cobrar do nascituro, se nascer vivo. III. Natimorto O natimorto é o ser concebido, mas que nasceu sem vida. Como a lei assegura desde a concepção os direitos da personalidade ao nascituro, tal proteção se estende ao natimorto. Ao natimorto são assegurados os direitos: Ao nome; À sepultura; À imagem. Enunciado 1, Jornada de Direito Civil: “A proteção que o Código defere ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como nome, imagem e sepultura” IV. Concepturo O concepturo é o filho que alguém ainda vai conceber. Não se confunde com o nascituro, já concebido, mas ainda não nascido. É o caso da chamada prole eventual, ou seja, aquele que será gerado, concebido, a quem se permite deixar benefício em testamento, desde que seja concebido nos dois anos subsequentes à morte do testador (CC, art. 1.800, § 4o) V. Embrião Excedentário O embrião laboratorial (in vitro) é aquele que foi preparado para ser implantado, mas ainda não o foi (embriões pré-implantatórios) ou remanescente de uma fertilização na proveta (embrião excedentário). O CC silenciou sobre a proteção ao embrião; A doutrina majoritária entende que o embrião laboratorial não dispõe da proteção dedicada ao nascituro. Não são aplicáveis aos embriões in vitro os direitos da personalidade; O artigo 5º da Lei 11.105 (Lei de Biossegurança) permite, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, desde que: - Sejam embriões inviáveis ou congelados há mais de 3 anos; - Haja consentimento dos genitores (Tal dispositivo indica que a legislação está negando direitos da personalidade ao embrião). O dispositivo foi julgado constitucional na ADI n. 3510/DF. VI. Direitos da Personalidade 1. Fundamento basilar dos direitos da personalidade: - Dignidade da pessoa humana (Artigo 1º, III, CF). - Cláusula geral de tutela da pessoa humana; - Cuidado: Não deve ser usada como fundamento principal em questão dissertativa; 2. Origem: - A Carta Magna inglesa, de 1215 e Declaração dos Direitos do Homem, em 1789: Já traziam menção implícita aos direitos da personalidade; - Somente após a 2ª Guerra Mundial foram verdadeiramente construídos; - Os Códigos Civis em geral não traziam menção aos direitos da personalidade – reformulação após a 2º Guerra; - No Brasil : - Constituição Federal 1988 - Código Civil de 2002. 3. Conceito: “...é possível asseverar serem os direitos da personalidade aquelas situações jurídicas reconhecidas à pessoa, tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Isto é, são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em que se convertem as projeções físicas, psíquicas e intelectuais do seu titular, individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada tutela jurídica.” Cristiano Chaves. - Noção fluída e em constante evolução; - Possibilitam a atuação na defesa da própria pessoa (físico, psíquico, intelectual...); - Efetivação da dignidade da pessoa humana. Enunciado 274 da Jornada de Direito Civil: “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1o, III, da Constituição Federal.” 4. Fontes: - Doutrina Majoritária Direito Natural (jusnaturalismo) - Doutrina minoritária Ordenamento jurídico (positivismo) 5. Características: 5. 1. Indisponibilidade relativa (artigo 11 CC) Irrenunciabilidade Intransmissibilidade - Admite disposição (relativa) em determinadas situações e dentro de certos limites; - Impossibilidade de disposição em caráter total ou permanente (limitado e específico) e que viole a dignidade; - Possível ao titular ceder o exercício (e não a titularidade) de alguns dos direitos da personalidade; - Ato de disposição: Lei ou autonomia provada; - Exemplo: Big Brother Brasil, cessão de direitos autorais, doação de órgãos duplos ou regeneráveis. - Exemplo: “Casso do arremesso de anões” - Conselho Constitucional da França Enunciado 4, Jornada de Direito Civil: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral”. 5.2. Absolutos: - Eficácia contra todos. 5.3. Imprescritíveis: Pretensão de fazer cessar a lesão (imprescritível) Pretensão indenizatória (prescritível - artigo 206, § 3o, V, CC). Atenção: Há importante exceção no que pertine à pretensão indenizatória por perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, durante ditatura militar, considerada imprescritível (AgRg. 970.753/MG – STJ). 5.4. Extrapatrimonialidade: - É um valor existencial, portanto insuscetível de apreciação econômica (o que não afasta a reparação do dano moral como forma de reparação pela violação); - Impenhorável; 5.5. Vitalícios: - Extinguem-se com o titular; - Os reflexos patrimoniais se transmitem. Obs.: O rol de características variará de acordo com o doutrinador. 6. Direitos da personalidade em espécie: - Classificação tricotômica: 1. Integridade física (corpo); 2. Integridade psíquica (alma); 3. Integridade intelectual (intelecto). 6.1. Tutela do Corpo Vivo (artigo 13 CC): Art. 13. “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. - Regra é possível a disposição (técnica legislativa duvidosa - há inversão) - Protege o corpo e partes separadas do corpo; Direito a integridade física (autônoma em relação aos outros direitos da personalidade). - Violação – Dano estético (não precisa ser permanente – influencia no quantum – REsp 575.576) - Dano estético cumulável com Dano moral Súmula 387 – STJ: “É lícita a cumulação de indenizações de dano estético e dano moral”. Não Viola: Piercing (não causa diminuição, não contraria bons costumes); Amputação terapêutica (exigência médica) Atenção: A expressão “contrariar bons costumes” deve ser vista com reserva e crítica, notadamente num concurso da DPE!!! Questões polêmicas: 1. Cirurgia de transgenitalização (mudança de sexo). 2. Gestação por substituição ou gestação em útero alheio (Barriga de Aluguel) - Disciplina (Resolução 2013/2013 do CFM); - Maioridade e capacidade; - Vínculo de parentesco; - Impossibilidade gestacional da mãe; - gratuidade do procedimento. 3 – Órgão para transplante: - A regra do art. 13 não se aplica para fins de transplantes - Disciplina própria - Lei 9.434/1997; - Órgãos dúplices ou regeneráveis; - Pessoas da mesma família (do contrário - autorização do Conselho de Medicina); - Gratuidade; - Intervenção do MP (administrativa). Atenção: As regras relativas ao transplante não se aplicam para a doação de leite materno, óvulo, sêmen, medula e sangue. Mas continua exigível a gratuidade. 6.2. Tutela do Corpo Morto (artigo 14 CC): Art. 14. “É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo”. Abrange o corpo como um todo e as partes separadas do corpo (ex.: corpo para pesquisas científicas ou parte do corpo para transplante); O beneficiário do transplante post mortem não pode ser escolhido pelo falecido; Revogabilidade a qualquer tempo. Questões polêmicas: 1. Art. 14 do CC x art. 4º da Lei de Transplantes (Lei 9.434/1997): - Se houve declaração de vontade, valerá a vontade do titular. Caso não tenha manifestado vontade, os familiares decidem.; - Respeito à autonomia da vontade; - Corpo de indigente não pode haver retirada de órgãos para transplante (pode ser encaminhado para pesquisas científicas). Enunciado 277 - Art. 14: “O art. 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art. 4º da Lei n. 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador.”. 6.3. Direito à autonomia do paciente (artigo 15 CC): Art. 15. “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”. Toda intervenção depende de consentimento do paciente; Impossibilidade de internação forçada; O paciente tem direito à informação. Questões polêmicas: 1. Testemunha de Jeová tem direito de se recusar à transfusão de sangue? - Não há conflito entre vida e liberdade religiosa (vida digna); - Integridade física x liberdade religiosa; - Jurisprudência: Integridade física; - Cristiano Chaves, Gustavo Tepedino, Manoel Gonçalves Ferreira Filho e Celso Ribeiro Bastos: Liberdade religiosa; - E a situação do incapaz? 2. Internação involuntária (artigo 6º, II, Lei 10.216/01): - Porque a doença psiquiátrica recebe tratamento diverso? 6.4. Direito ao nome (artigo 16 à 19 CC): Art. 16. “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.” Art. 17. “O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.” Art. 18. “Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial.” Art. 19. “O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.” Elementos: prenome, sobrenome e agnome; Individualização da pessoa; Mudança imotivada (artigos 56 a 58 da LRP); Pseudônimo merece a mesma proteção; Título não faz parte do nome; Pseudônimo x Hipocorístico (Xuxa, Pelé). Competência: Vara de Registros Públicos, de Família ou Cível. Vedação - Publicações: Exposição ao ridículo (mesmo sem intenção difamatória). Exploração econômica (sem autorização). Responsabilidade (REsp. 1.020.936/ES): Objetiva Dano presumido 1. Caracateristicas: i) absoluto (efeitos erga omnes); ii) obrigatório (o art. 50 da Lei no 6.015/73 – LRP - necessidade de registro civil de todas as pessoas nascidas, inclusive os natimortos); iii) indisponível (uma vez que não pode o titular ceder, alienar, renunciar, dentre outras formas de disposição); iv) exclusivo (característica inerente, apenas, à pessoa jurídica, uma vez que impossível de ser aplicada à pessoa natural, a quem se permite a homonímia); v) imprescritível (não sendo possível perder o nome pelo não uso); vi) inalienável (reconhecida a impossibilidade de a pessoa humana vender ou dar o seu nome como decorrência lógica da própria impossibilidade de dispor da própria identificação pessoal. No entanto, não se olvide que a pessoa jurídica poderá dispor de seu nome de fantasia, que se trata de elemento componente de seu patrimônio); vii) incessível (caráter privativo, também, da pessoa natural, inaplicável à pessoa jurídica); viii) inexpropriável (não sendo suscetível de desapropriação pelo Poder Público, salvo em se tratando de nome de pessoa jurídica, em face de seu conteúdo patrimonial); ix) irrenunciável (salvo casos especiais, em que se admite o despojamento de parte do nome); x) intransmissível (consequência natural da indisponibilidade). xi) Imutável relativamamente (Princípio da inalterabilidade relativa do nome): Exceções: - adoção; - acréscimo do nome do padrasto (artigo 57, § 8º, LRP); - programa de proteção à testemunha (Lei 9.807/1999); - casamento; - erro de grafia; - exposição do titular ao ridículo; - transexual; - inclusão de sobrenome de ascendente (pai, avô, bisavô); - viuvez; - retirada de sobrenome no caso de abandono paterno. 6.5. Direito à imagem: Art. 20. “Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes”. É o direito à identificação da pessoa. Imagem-retrato Tridimensional: Imagem-atributo Imagem-voz - Exploração comercial deve ser autorizada (gera indenização); - Utilização sem fins comerciais e que não gere dano? - Local Público relativiza a imagem (Caso do Top less – Resp. 595.600.). Função social da imagem - Flexibilização do direito à imagem Consentimento Expresso Tácito 6.6 – Direito à privacidade Art. 21. “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.” Teoria dos Círculos Concêntricos Privacidade Sigilo ou Segredo Intimidade Obs.: Essa ordem pode variar a depender do doutrinador. Atenção: Imagem e privacidade são bens jurídicos distintos – Caso Daniela Cicarelli. O direito à privacidade é autônomo, ou seja, ele não depende da violação da honra – Pode haver violação da imagem sem ofensa (Caso Manoel Garrincha - Resp. 521.697/RJ ). VII. Proteção da personalidade do morto Com a morte extingue-se a personalidade – logo o morto não possui direito da personalidade. 1. Sucessão Processual: O titular do direito sofre a lesão, ajuíza a ação e falece; Os herdeiros se habilitam e dão continuidade à relação processual; Não há transmissão de direitos da personalidade. 2. Transmissão do direito à reparação de danos (artigo 943 do CC) Art. 943. “O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança”. O titular não iniciou o processo; Há prescrição; 3. Lesados indiretos (artigo 12, parágrafo único do CC) Art. 12. “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau”. O dano ocorre após a morte do titular; Lesados Direto: morto (não produz qualquer efeito) Indiretos: Parentes até quarto grau (direito à indenização) Legitimação ordinária: Nome próprio interesse próprio. Defesa de direito próprio da personalidade Não se aplica a ordem de vocação sucessória. Cada um dos lesados indiretos é legitimado concorrentemente. - Rol exemplificativo; - Direito a imagem exclui os de quarto grau (artigo 20, parágrafo único, CC). - Valor da indenização variável (de acordo com o vínculo); - Tantas indenizações quantas forem as ações; - Litisconsórcio facultativo; Lesados indiretos na Jurisprudência do STJ: - REsp. 86.109 - Caso de Lampião e Maria Bonita. A filha do casal descobriu que a imagem de seus pais vinha sendo indevidamente utilizada (os irmão não poderiam ajuizar a ação). - Resp. 521.697/RJ – Caso Garrincha. Os filhos de Garrincha, considerando que o pai nunca revelara tal característica, ajuizaram ação (os irmãos, filhos e viúva de Garrincha poderiam ajuizar a ação, por não se tratar de violação ao direito à imagem, mas à intimidade). Generalidades: 1. Direito da personalidade x Direitos humanos x Direitos fundamentais 2. Direitos da personalidade da pessoa jurídica? - A doutrina diverge, mas prevalece que não; - Direitos da personalidade são oriundos da claúsula geral de dignidade da pessoa humana; Enunciado 286- Art. 52. “Os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos”. Atenção: O artigo 52 confere a pessoa jurídica – no que couber – a proteção dos direitos da personalidade (são coisas diferentes) A pessoa jurídica pode sofrer dano moral? Resposta: Súmula 227- “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral” e REsp 433.954 indevido de duplicata). (protesto 3. Conflito entre direitos da personalidade e direitos de comunicação social. Comunicação social Liberdade de imprensa Liberdade de expressão Ponderação de interesses Não há direitos absolutos; No Brasil, não se admite o hate speech (HC 82.424-2/RS – Caso do livro antissemita) 4. Biografias Não autorizadas: Liberdade de expressão x intimidade do biografado; Ponderação: Permite-se a publicação (liberdade de expressão) – eventuais abusos serão coibidos posteriormente (o contrário aniquilaria a liberdade de expressão); Posterior: reparação, ação penal etc; ADI 4815 – STF afastou a necessidade de consentimento do biografado; Caso Roberto Carlos e Caso Lampião – O Mata Sete 5. Direito ao Esquecimento: Direito de restringir o uso de fatos pretéritos que lhe causam sofrimento – ao es esquecimento desses fatos; Ponderação: Direitos da personalidade x liberdade de imprensa (democracia – interesse público); Análise casuística; Caso Aida Cury - REsp. 1.335.153/RJ e Caso Chacina da Candelária REsp. 1.334.097/RJ; A internet – superinformacionismo. Pergunta de Concurso: 1. O tema foi explorado no II Concurso para Defensor Público do Paraná, na prova de Dissertativa Direito Civil (anulada). 2. O tema foi explorado no VII Concurso para Defensor Público de São Paulo, na prova de Dissertativa Direito Constitucional. IX. Proteção jurídica dos direitos da personalidade Superação do binômio lesão/sanção CDC e Reforma Processual 1994 – Avanço (tutela específica); 9.1. Tutela preventiva e compensatória (artigo 12 CC) Art. 12. “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.” (na primeira parte, a tutela preventiva; na segunda, a compensatória) Preventiva (específica) CC Individual CDC Coletiva CC e CDC Individual e Coletiva Tutela Compensatória (indenização) Outras formas de tutela: i. sanções penais (ex.: crimes contra a honra, crimes contra a pessoa); ii. sanções administrativas (ex.: limitação administrativa de determinados exercícios); e iii. os casos de autotutela permitidos em lei (1301 e 1303 CC – Intimidade). 9.2. Tutela específica dos direitos da personalidade Solução concreta de um caso; Vários tipos de tutela: Inibitória, sub-rogatória, remoção do ilícito (exemplificativo); Despatrimonialização da proteção dos direitos da personalidade; Questões polêmicas: 1. Mandado de distanciamento: - Proporcionalidade (restrição à liberdade de locomoção); - Não pode haver abuso pelo requerente (Caso Dado Dolabela e Luana Piovane); 2. É possível o uso da prisão civil? Autores clássicos não admitem (vedação Constitucional – Apenas caberia para inadimplemento de pensão alimentícia); Autores mais modernos (Luis Guilherme Marinoni e Fredie Didier) admitem (o juiz não estaria determinando a prisão por dívida, mas por descumprimento espontâneo de decisão judicial – não é prisão por divida). Problema: E o prazo? X. Transexualidade (Transexualismo, Transexualidade, neurodiscordância de gênero, trangeneralismo, hermafroditismo psíquico e síndrome da disforia sexual ou do gênero) 1. Conceito: O conceito de transexualismo ou transexualidade, em resumo, traduz-se num indivíduo que pertence biologicamente a um sexo, masculino ou feminino, contudo, psicologicamente, identificase com o sexo oposto. CID – Classifica como patologia (Síndrome da Disforia de gênero ou sexual - CID– 10 – F.64.0); Desejo de viver e ser aceito como um membro do sexo oposto, usualmente acompanhado por uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo anatômico e um desejo de se submeter a tratamento hormonal e cirurgia para seu corpo tão congruente quanto possível com o seu sexo; Ultrapassado: Despalogização; Observar que o edital não fala em transexualismo; Grupo extremamente vulnerável e marginalizado; Dificuldade na obtenção de trabalho – o que os obriga à prostituição. Pesquisas apontam que cerca de 99% sobrevivem a custa da prostituição; Altos índices de agressões e homicídios (São Paulo têm os maiores índices – Mas não há dados precisos); Vítimas de preconceito, exclusão social; Negativa de direitos – RE 845778/SC (transexual impedida de usar o banheiro do Shopping fez as necessidades fisiológicas nas vestes). Obs.: Recomendo a belíssima sustentação oral da Dr. Juliana Cesario Alvim Gomes nesse RE – https://www.youtube.com/watch?v=b5prG9-_m2U Lei Estadual Paulista n. 10.948/2001 – Dispõe sobre as penalidades a serem aplicadas por discriminação em razão de gênero - Não tipifica crime (nem poderia); - Descreve condutas discriminatórias; - Aplica penalidades à pessoas físicas e jurídicas; - Apuração mediante procedimento administrativo; Sanciona com advertência, multa, suspensão de licença, cassação de licença 2. Identidade sexual Direito da personalidade (rol não exaustivo); Dignidade da pessoa humana; Direito à saúde; 3. Cirurgia de redesignação sexual (trangenitalização) Inicialmente condenada pelo CFM (LCD); Dois tipos: neocolpovulvoplatia e neofaloplastia; Finalidade: Terapêutica – Adequar o sexo morfológico ao psicológico; Diagnóstico que aponta que o indivíduo é transexual (patologização); Não há regulamentação legal; Regulamentação (Resolução 1955/2010 – CFM) – Requisitos: - Diagnósticado como transexual (i. Desconforto com o sexo anatômico natural; ii. Desejo expresso de eliminar os genitais perder as características primárias e secundárias do sexo natural e ganhar as do sexo oposto; iii. Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, 2 anos; iv. Ausência de outros transtornos); - A seleção dos pacientes deve obedecer a avaliação de equipe multidisciplinar, que deve obedecer os seguintes critérios: i. acompanhamento por no mínimo 2 anos; i. diagnóstico médico de transgenitalismo; iii. Maior de 21 anos; ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia. A Cirurgia é realizada pelo SUS; 4. Alteração do registro civil: Direito da personalidade, elemento de identificação da pessoal; Não há regulamentação legal expressa e específica (jurisprudência); O Artigo 58 da LRP – interpretação constitucional; Necessidade de processo judicial; Juízo competente – Há controvérsia (Família ou Registros Públicos); Deve haver ressalva no assento? (controvérsia); - RE 670.422/RS (Com repercussão geral reconhecida e pendente de julgamento – discute a necessidade da ressalva). A cirurgia é necessária para a redesignação? (controvérsia) - Fere o pluralismo e o direito à intimidade - TJSP - Apelação nº 0007491-04.2013.8.26.0196 (possível com realização de estudo psicossocial): Retificação de registro civil. Transexualidade. Pretensão de modificar a designação de sexo e do nome. Interesse de agir que está presente mesmo antes da realização de cirurgia de redesignação de gênero. Reconhecimento de que pode haver ferimento à dignidade da pessoa humana na apresentação com a aparência de um sexo e documentos de outro. Definitividade do Registro Civil que recomenda a realização de estudo médicopericial e psicossocial, bem como a requisição das fichas de atendimento do acompanhamento realizado quando da preparação para a cirurgia de mudança de sexo. Recurso provido para determinar o prosseguimento da ação, com recomendação - TJRJ - Apelação Cível nº 0013986-23.2013.8.19.0208 (Possível): APELAÇÃO CÍVEL – PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA – TRANSEXUAL –- REQUERIMENTO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL PARA MODIFICAÇÃO DO PRENOME E SEXO – REQUERENTE NÃO SUBMETIDO À CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO – ART. 58 DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. 5. Casamento e união estável Possibilidade: - Com a cirurgia há mudança de gênero; – Rol de família não exaustivo, dignidade da pessoa humana, igualdade, permissão de casamento entre pessoas do mesmo sexo; O Cônjuge deve ser informado? O casamento poderá ser anulado por erro essência – artigos 1556 e 1557, CC? (Controvérsias). Adoção? Formação de família? 6. Projeto de Lei n. 5002/2013 (Projeto de Lei João Nery) - Deputados Jean Willys e Érika Kokay: Dispõe sobre o direito à identidade de gênero e altera o artigo 58 da Lei 6.015 de 1973; Traz muitos avanços; Direito à identidade de gênero; Direito à alteração do nome sem ação judicial, sem cirurgia de transgenitalização; Direito ao nome social; Direito à cirurgia de transgenitalização sem diagnóstico de patologia ou tratamento psiquiátrico, sem procedimento administrativo ou ou judicial; 7. Princípios de Yogyakarta: Elaborados por uma Comissão Internacional de Juristas entre os dias 6 e 9 de novembro de 2006, em uma reunião na Universidade Gadjah Mada, em Yogyakarta, Indonésia.; Auxiliam a aplicação da legislação internacional de direitos humanos acerca da orientação e identidade de gênero.; Não possuem natureza cogente ( Soft law). Atenção: O STF na ADF dispositivos do CPM: n. 291 julgou não recepcionadas expressões discriminatórias em Ementa: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ART. 235 DO CÓDIGO PENAL MILITAR, QUE PREVÊ O CRIME DE “PEDERASTIA OU OUTRO ATO DE LIBIDINAGEM”. NÃO RECEPÇÃO PARCIAL PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 1. No entendimento majoritário do Plenário do Supremo Tribunal Federal, a criminalização de atos libidinosos praticados por militares em ambientes sujeitos à administração militar justifica-se, em tese, para a proteção da hierarquia e da disciplina castrenses (art. 142 da Constituição). No entanto, não foram recepcionadas pela Constituição de 1988 as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas, respectivamente, no nomen iuris e no caput do art. 235 do Código Penal Militar, mantido o restante do dispositivo. 2. Não se pode permitir que a lei faça uso de expressões pejorativas e discriminatórias, ante o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual como liberdade existencial do indivíduo. Manifestação inadmissível de intolerância que atinge grupos tradicionalmente marginalizados. 3. Pedido julgado parcialmente procedente. Perguntas de prova: 1. Os princípios de Yogyakarta foram questionados na prova oral do VII Concurso da DPE/SP. 2. A questão relativa à mudança de nome e gênero foi objeto da peça do Concurso da DP/MS 2014. Questões polêmicas: 1. Transexualidade infantil: Tratamento hormonal em crianças; Cirurgia de transgenitalização em crianças; 2. O projeto de Lei de autoria dos Deputados Jean Willys e Érika Kokay permite: Redesignação de nome e gênero de criança e adolescente; O tratamento hormonal e a cirurgia de transgenitalização em crianças e adolescente; Necessidade de consentimento informado; Necessidade de consentimento do representante legal; O consentimento do representante legal pode ser suprido judicialmente – A criança ou adolescente deverá ser assistido pela Defensoria Pública; No processo de suprimento de vontade deve-se levar em consideração os princípios de capacidade progressiva e interesse superior da criança. 3. Despatologização: Acesa crítica a patologização: deixar de reconhecer como doença – livre desenvolvimento da identidade de gênero do cidadão transexual; Relações dinâmicas entre sexo e gênero; 20 de outubro - Dia Internacional de Ação pela Despatologização da Indentidade Trans; O primeiro movimento de patologização foi positivo – retirada do transexual do campo da indecência, da devassidão para o campo da doença (da culpa ao sofrimento); Critica a necessidade de demonstração de sofrimento para obtenção da cirurgia (o que não se exige do “não trans” – plásticas em geral; o diagnóstico parece, no mínimo, não enquadrar todas as possibilidades da experiência transexual (é redutor); Se o transexualismo é um transtorno de identidade, como é que seu tratamento consiste em afirmá-lo? (“Exemplo de Napoleão”); O transexual pode não desejar uma definição (não quer eliminar o “trans”) Propostas: 1. Alteração do diagnóstico ou sua flexibilização (Existem nuances); Moderada 2. Deixar de considerar a transexualidade como doença, e se passe a vê-la como uma identidade de gênero Mais radical; Requer um tratamento médico especial para sua expressão plena; Alguns alegam que se se adotar essa corrente a cirurgia pelo SUS estaria vetada( o SUS não atende apenas doentes - Gravidas); Há país que não mais considera como doença: França. XI. Nome Social 1. Conceito: É a designação utilizada publicamente pela pessoa transexual ou travesti, distinta do nome civil, e pela qual ela se identifica e é reconhecida e reflete sua identidade de gênero. Não há lei federal que expressamente consagre o nome social; Sua proteção pode ser alcançada pela interpretação constitucional do artigo 58 da LRP; O nome deve individualizar e identificar a pessoa (o nome civil nem sempre cumpre essa função); O pseudônimo goza de proteção legal (o nome social não?). Fundamentos: Dignidade da pessoa humana, pluralismo, liberdade, igualdade, autonomia individual, promoção da cidadania. 2. Decreto Estadual Paulista n 55.588/2010 Assegura aos cidadãos transsexuias o tratamento pelo nome social pela Administração Direta e Indireta no Estado de São Paulo; Não confere direito à emissão de documento com o nome social; Não cumprimento do Decreto pela Administração e Funcionários acarretará a instauração de procedimento administrativo e imposição de multa (de acordo com a lei 10.948/2001) e falta funcional (estatuto dos Funcionários Públicos Civis); 3. Decreto Federal n 8727/2016 Assegura aos cidadãos transexuais e travestis o tratamento pelo nome social perante à Administração Pública Federal; Impõe à administração pública que crie em seus registros, formulários, prontuários e etc., campo para que conste o nome social (entra em vigor em 28 de abril de 2017; Os documentos oficiais deverão trazer o nome social acompanhando o nome civil; A pessoa transexual ou travesti poderá requerer a inclusão do nome social em documento oficial, banco de dados, cadastro das entidades mencionadas. Há projeto de Decreto Legislativo tramitando com a finalidade de sustar o Decreto Federal 8727/2016. 4. Resolução n. 12/2015 – Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Travestis, e Transexuais Dispõe sobre o direito ao nome social na rede de ensino; Emissão de documentos internos de identificação com o nome social; Uso de banheiros, vestiários e espaços segregados por gênero de acordo com a identidade de gênero; Se houver distinção de uniformes – uso de acordo com a identidade de gênero; Tais direitos se estendem ao adolescente (sem necessidade de autorização do responsável). XII. Teoria do Patrimônio mínimo x Teoria do Umbral A “Teoria do Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo” criada pelo Professor Luiz Édson Fachin sustenta que o ordenamento jurídico deve garantir a toda pessoa um patrimônio mínimo, a um mínimo existencial, como forma de lhe garantir a dignidade. Dignidade da pessoa humana; Despatrimonialização e repersonalização das relações civis; A pessoa e sus necessidades como centro do Direito Civil; A teoria do umbral de acesso ao Direito Civil do Professor Lorenzetti é um complemento à teoria do Professor Fachin, exigindo que as pessoas tenham efetivo acesso ao patrimônio mínimo e não apenas em teoria. Num país de extrema desigualdade como o Brasil, milhares de pessoas permanecem no umbral (na fronteira, na porta de entrada) de acesso ao Direito Civil. Analogia com o Hotel de Luxo (Lorenzetti).