Dresdner Kleinwort Benson Global Finance - Brazil À ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica SGAN 603 N, Mod. J, sala 103 70830-030 – Brasília – DF Dresdner Bank Brasil S.A. Banco Múltiplo Avenida Rio Branco 128, 11 / 12 Andar 20040-002 Rio de Janeiro, Brasil Graham Lofts Phone : +55-21-221-2101 Fax : +55-21-507-1922 e-mail : [email protected] Date : 09 de junho de 1999 Ref.: Contribuições para Audiência Pública 002/1999 Prezados Senhores, Vimos pela presente encaminhar nossos comentários e sugestões a respeito da resolução objeto da audiência pública acima referida, que estabelecerá os Valores Normativos que limitam o repasse, para as tarifas de fornecimento, dos preços livremente negociados na aquisição de energia elétrica, por parte dos concessionários e permissionários de distribuição. O Dresdner Bank é um banco bastante ativo e com vasta experiência em operações no setor elétrico, envolvendo assessoria e financiamento a privatizações e a projetos de geração e transmissão de energia elétrica, tanto no Brasil quanto no exterior. Sendo assim, entendemos a relevância do tema discutido e, mais que isso, acreditamos que esse seja um dos pontos vitais para o desenvolvimento de novos projetos de geração de energia elétrica no País. Em outras palavras, na visão do Dresdner Kleinwort Benson, banco de investimentos do Grupo Dresdner, a definição de um mecanismo inadequado de repasse do custo da energia adquirida pelas distribuidoras aos consumidores finais poderia apresentar dois efeitos: restrição à entrada de investidores privados na área de geração de energia elétrica no Brasil e redução das margens de comercialização das distribuidoras, o que iria contra estabelecido no contrato de concessão das mesmas. No contexto de um mercado de geração completamente liberalizado, o distribuidor deveria ser simplesmente um “repassador” de energia entre os geradores e o mercado e, nesse sentido, o conceito de “valor normativo” poderia ser considerado por alguns investidores como uma intromissão nos mecanismos de livre mercado (inclusive uma intromissão nas decisões de investimento em relação ao tipo de usina a ser desenvolvida). Entretanto, entendemos a metodologia proposta como uma medida transitória, a ser aplicada objetivando proteger o consumidor final diante da ausência de um histórico de funcionamento do livre mercado de energia elétrica no Brasil. Como observamos no processo de liberalização de outros países, o mecanismo que regula as distribuidoras e protege o consumidor final deve evoluir conforme a livre competição seja implantada. O mecanismo elaborado pela ANEEL hoje não necessariamente será o mais apropriado em 5 anos. No entanto, de forma a encorajar o estabelecimento de contratos de longo prazo (por exemplo, 20 anos) entre distribuidoras e Produtores Independentes de Energia (PIEs), para viabilizar investimentos adicionais na geração, o Dresdner Kleinwort Benson consideraria mais apropriado que no Brasil se adotasse um mecanismo de repasse comparável ao modelo Colombiano. No modelo adotado na Colômbia, a agência reguladora se limita a verificar se os concessionários de distribuição efetuaram os esforços necessários para minimizar os custos de compra de energia, ou ainda, aprovação do Valor Normativo caso a caso, conforme as características de custo da energia vendida. Considerando a regulamentação proposta pela ANEEL, e o atual contexto de mercado, o Dresdner Kleinwort Benson identificou várias sugestões, muitas delas resultantes do fato que, diante da escassez de recursos domésticos de longo prazo para o financiamento de novos projetos de geração, a utilização de recursos internacionais torna-se via indispensável para o desenvolvimento de projetos de geração no curto e médio prazo. A utilização de recursos internacionais possui, no entanto, uma conseqüência perversa: a exposição dos agentes ao risco de variação cambial durante o período de operação das plantas, em função do pagamento e remuneração das dívidas assumidas em moeda estrangeira. Tal exposição é agravada pelo fato de não existir no mercado financeiro nacional alternativas de proteção economicamente viáveis, a não ser o repasse para a tarifa de energia elétrica. Diante da impossibilidade de mitigação do risco cambial, os financiadores internacionais, e mesmo os investidores de capital, não estarão dispostos a prover recursos de longo prazo para o setor elétrico brasileiro. Dito isto, sigamos agora aos comentários e sugestões: 1. A metodologia de cálculo para o Valor Normativo e seus fatores (K1, K2 e K3) deveria ser explicitada para o melhor entendimento de certos aspectos, tais como: inclusão ou não de impostos (ex. ICMS) e custos de transmissão, referência adotada para o cálculo dos fatores, data base, dentre outros. Mais que isso, a metodologia deveria considerar a prática financeira prevalecente para o financiamento da geração elétrica desenvolvida pela iniciativa privada, o “Project Finance”1. 2. No momento, a resolução apresenta apenas um Valor Normativo por tipo de geração, não diferenciado por região geo-elétrica. Acreditamos ser relevante tal diferenciação, na medida em que o custo de combustíveis, componente significativo do custo de geração termelétrica, e o custo do aproveitamento hidrelétrico variam no território nacional. 3. A resolução também apresenta um mesmo Valor Normativo independentemente da escala do projeto de geração; isso pode também restringir a geração a projetos de grande escala, o que nem sempre será a solução mais adequada às necessidades da distribuidora e da população. 4. Acreditamos que o valor normativo de R$ 48,50/ MWh seja insuficiente para cobrir os custos de geração termelétrica movida a gás natural se considerarmos que: a) o preço do gás natural se situa em torno de US$ 2,8/ mmbtu na região Sudeste, podendo alcançar valores superiores em outras regiões do país (onde, por exemplo, o gás natural liqüefeito (GNL) importado é a única opção); b) a recente desvalorização do Real ocasionou o aumento do custo de investimento, devido ao alto conteúdo de componentes importados (aproximadamente 70%). Segundo nossa experiência um valor na faixa de R$ 55-60/ MWh seria mais adequado (vide Anexo 1). 5. Ainda no caso das termelétricas, acreditamos que os fatores K devam ser mais flexíveis para que possam se adequar à estrutura de capital utilizada. (vide Anexo 1). 1 Essa modalidade, largamente utilizada para o financiamento de Produtores Independentes de Energia, permite a utilização dos ativos e do caixa gerado pelo projeto, através de contratos de venda de energia de longo prazo, como garantias aos financiadores, possibilitando financiamentos fora do balanço do acionista, menor aporte de capital (25% a 40%) e, consequentemente, o envolvimento de um mesmo acionista em diversos projetos. 6. Acreditamos também que os fatores K1 e K3 determinados para projetos hidrelétricos não consideram de forma adequada a participação dos custos em dólares americanos (10%) no Valor Normativo. Embora a distribuição proposta reflita a proporção entre os custos de equipamentos e serviços importados e domésticos no custo de construção de uma hidrelétrica, tal distribuição não considera os financiamentos e o capital empregado no projeto, que serão obtidos grande parte em dólares americanos devido à oferta restrita de recursos de longo prazo no mercado local. Uma vez que grande parte dos financiamentos serão contraídos em dólares americanos, grande parte dos custos da energia variarão conforme essa moeda. Esta proporção variará caso a caso mas, considerando o contexto brasileiro, esperaríamos algo em torno de 40% para K1 mínimo e 60% para K3 máximo. (vide Anexo 1). 7. A estabilidade do Valor Normativo atribuído aos Contratos Bilaterais quando da data de seu registro junto à ANEEL, conforme Art. 3º §1ºe 3º da nova resolução, é da maior relevância dado que os comprometimentos de compra de energia serão de longo prazo, e a alteração do Valor Normativo de forma inesperada poderá prejudicar o estabelecimento de tais contratos. 8. É preciso definir qual a base para a determinação do índice de preços que ajustará o custo do combustível no caso da geração termelétrica (COMB). A utilização de um único índice poderá se mostrar imprópria, dado que a variação dos custos de combustível dependerá de sua origem (ex. Bolívia, GNL importado, Campos), acarretando um risco adicional para o distribuidor. Considerando também que tal índice deverá cobrir a indexação à moeda estrangeira, quando aplicável, seria mais sensível definir índices caso a caso, com um único processo de aprovação a ser aplicado quando da definição do Valor Normativo para o primeiro ano, e com reajustes automáticos subsequentes baseados no índice definido para aquele contrato. 9. Com relação ao componente de indexação local K1, acreditamos que também deveria ser mais flexível para incorporar outros indexadores associados ao custo de financiamento, como é o caso da Unidade de Referência da TJLP (URTJLP). A ANEEL deveria permitir que a URTJLP seja utilizada como indexador caso o distribuidor possa comprovar a utilização de financiamentos do BNDES associados àquele fornecimento de energia. 10. No momento a Resolução indica que o valor normativo se refere ao ponto comum de referência do submercado onde se situa o concessionário. Seria importante esclarecer se isso significa que o custo de transmissão está incluso no Valor Normativo. Na visão do Dresdner Kleinwort Benson, seria mais apropriado permitir uma indexação separada do componente relativo ao suprimento propriamente dito e do componente de transmissão. 11. Segundo o artigo 2, parágrafo 2º, os Valores Normativos poderão ser revistos na ocorrência de mudanças estruturais relevantes na cadeia de produção de energia elétrica. Para que financiamentos de longo prazo sejam viabilizados e novos investidores sejam atraídos para o setor, deveria ser estabelecido um mecanismo que permita com clareza e objetividade a revisão de custos, estabelecendo metodologia e definindo que fatores de custo poderão ser considerados (ex. variação cambial, preço do gás, impostos, etc.). No caso, por exemplo, de Geradoras com obrigações semestrais de amortização e pagamento de juros em dólares, há um claro descasamento entre suas obrigações e a freqüência do reajuste de tarifas; seria importante definir para estes casos mecanismos que acionem a revisão da tarifa com freqüência inferior a um ano, se por exemplo, a desvalorização atingir 3% de variação (sem considerar inflação). Há também casos em que o custo do gás é reajustado com periodicidade inferior a um ano, nessa situação a metodologia também tem de ser definida e poderia funcionar na forma acima proposta. Por último, mas não menos importante, gostaríamos de parabenizar a ANEEL pela competência apresentada no desenvolvimento da regulação do setor e pelo espírito democrático com que vem administrando este processo. Atenciosamente, Graham P. Lofts Diretor Global Finance Rio de Janeiro Anexo 1: Sugestão de metodologia para cálculo do Valor Normativo A estrutura tarifária estabelecida para novas usinas de geração termelétrica em projetos envolvendo a iniciativa privada é tradicionalmente binomial, isto é, formada por duas partes, uma denominada de Tarifa de Capacidade e outra Tarifa de Energia (ou Variável): Tarifa de Capacidade: Essa tarifa é composta pelos seguintes componentes: Itens fixos de operação e manutenção; Juros e amortização da dívida contraída para financiar os investimentos; Remuneração do acionista pelo capital investido; Impostos devidos; No caso das termelétricas: Parte fixa do Combustível, que normalmente é contratada na modalidade “take-or-pay”, isto é, um valor mínimo contratado (normalmente em torno de 70%) tem que ser pago independentemente do seu consumo. Tarifa de Energia: Essa tarifa é normalmente composta por custos variáveis, a saber: Itens variáveis de operação e manutenção; No caso das termelétricas: Combustível. No caso das hidrelétricas uma única tarifa pode ser aplicada, considerando os custos acima, com exceção dos custos de combustíveis. Recomendamos que a metodologia adotada para o estabelecimento do Valor Normativo, assim como de seus fatores de ajuste (K), considere: Fatores K sensíveis à estrutura de capital do projeto, incluindo a composição do capital investido pelos acionistas; Composição dos custos de operação e manutenção; A especificidade de cada região no que diz respeito ao custo dos combustíveis e custo do aproveitamento hidrelétrico. Quanto à estrutura de capital, acreditamos que os valores a seguir são representações das estruturas possíveis, tendo em vista: atuação dos investidores privados estrangeiros em projetos de geração no país, e a restrição a financiamentos de longo prazo em moeda local, cuja disponibilidade se limita a financiamentos do BNDES e, possivelmente, da Eletrobrás. Capital Termelétricas/Gás 25 a 30% Hidrelétricas 25 a 30% Dívida Nacional Estrangeira 70 a 75% 20 a 25% 50 a 55% 70 a 75% 40 a 50% 25 a 35% Dada a atuação dos investidores privados estrangeiros em projetos de geração no país e a necessidade de financiamentos estrangeiros, acreditamos que a composição dos fatores K deva possuir uma maior flexibilidade para absorver maior participação estrangeira de capital, ao mesmo tempo estabelecendo limites para o repasse ao consumidor final, apresentando uma configuração próxima ao que se segue: Mín K1 Max K2 Max K3 Termelétricas/Gás 15% 0 a 55% 35% Hidrelétricas 40% 60% Os valores mínimos de K1 têm de ser flexíveis para situações onde o capital dos acionistas seja totalmente estrangeiro, sendo portando definidos em função dos financiamentos disponíveis em moeda local, bem como dos custos de operação locais. Considerando o que foi dito, e tendo em vista nossa experiência recente em projetos de geração, estimamos que os preços de projetos termelétricos variem de R$ 55 a 60/MWh, o que dependerá do custo do gás e da escala do projeto; enquanto os hidrelétricos se situariam em um intervalo de R$ 50 a 60/MWh, o que dependerá da escala e localização do projeto. Impor um Valor Normativo inferior poderia resultar na exclusão de certas usinas que possuem importância estratégica, geográfica ou sistêmica.