DECISÃO: Trata-se de pedido de suspensão de tutela antecipada ajuizado pela União em face da decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que deu provimento parcial ao Agravo de Instrumento n.º 2008.04.00.041828-5, para manter em menor extensão a tutela antecipada concedida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Maringá/PR (Ação Civil Pública n.º 2008.70.03.0021377). Na origem, o Juízo da 1ª Vara Federal de Maringá/PR deferiu parcialmente o pedido de tutela antecipada (19.09.2008) que, após oposição de embargos declaratórios da União e do Estado do Paraná e seu parcial acolhimento (13.10.2008), determinou o seguinte: “[...] A União requer mais 60 (sessenta) dias de prazo para cumprimento da decisão antecipatória, sustentando a aquisição de medicamentos pelo Ministério da Saúde, via de regra, demanda entre 45 e 60 dias úteis para sua efetivação. Contudo, considerando que o Juízo já havia fixado prazo razoável para cumprimento da decisão antecipatória (30 dias); considerando, ainda, as dificuldades apontadas pela União, prorrogo o prazo para 45 (quarenta e cinco) dias correntes, contados da intimação desta decisão. [...] Ante o exposto, afasto as preliminares e defiro parcialmente o requerimento de antecipação de tutela para determinar à União que, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias (...) inclua em protocolo clínico o tratamento para Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica devendo os réus (União, Estado do Paraná, solidariamente), no mesmo prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, disponibilizar aos pacientes portadores de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), de acordo com expressa indicação e prescrição por médico do SUS, em atendimento no âmbito do SUS, os medicamentos Foraseg (Formoterol e Budesonida) e/ou Spiriva (Tiotropio)” (fl. 142). A reforma da União interpôs decisão. O agravo de Desembargador instrumento, Federal pleiteando Edgard a Antonio Lippmann Júnior, relator do recurso, deferiu parcialmente o efeito suspensivo (12.11.2008), nos seguintes termos: “tenho por manter a 1 decisão atacada, modificando-a, tão-somente, no que diz respeito aos favorecidos pela presente decisão, devendo os réus disponibilizar a todos os pacientes usuários do Sistema Único de Saúde, residentes nos municípios que integram esta Subseção Judiciária de Maringá/PR, que, no curso da ação, comprovarem a necessidade do uso do referido medicamento, por intermédio de receituário expedido por médico vinculado ao SUS” (fls. 227-228). A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao julgar o agravo de instrumento (11.02.2009), deu provimento parcial, confirmando a decisão de concessão parcial de efeito suspensivo (fls. 230-236). Contra essa decisão a União apresenta pedido de suspensão da tutela antecipada a esta Corte, alegando grave lesão à ordem e à economia públicas, violação do princípio da legalidade separação dos orçamentária Poderes, e a desrespeito possibilidade ao de princípio da ocorrência e da legalidade do efeito multiplicador. Alega, ainda, que a decisão impugnada teria determinado obrigação genérica de fornecimento de determinados medicamentos, sem qualquer especificação, o que ocasionaria grave lesão à ordem e à economia públicas (fls. 7-8). Em 28.04.2009, foi prolatada sentença na ação civil pública, mantendo a decisão liminar proferida, de acordo com o que especificado pelo TRF da 4ª Região no referido agravo de instrumento. Decido. A base normativa que fundamenta o instituto da suspensão (Leis n.os 12.016/2009, 8.437/1992, 9.494/1997 e art. 297 do RI2 STF) permite que a Presidência do Supremo Tribunal Federal, a fim de evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, suspenda a execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na origem for de índole constitucional. Assim, é a natureza constitucional da controvérsia que justifica a competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar o pedido jurisprudência julgados: de desta RCL-AgR no contracautela, Corte, 497/RS, conforme destacando-se Rel. Carlos a pacificada os seguintes Velloso, Plenário, maioria, DJ 6.4.2001; SS-AgR no 2.187/SC, Rel. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS no 2.465/SC, Rel. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004. No presente caso, reconheço que a controvérsia instaurada na ação em apreço evidencia a existência de matéria constitucional: alegação de ofensa aos arts. 2º, 6º, caput, 167, 196 e 198 da Constituição. Destaco que a suspensão da execução de ato judicial constitui somente medida quando excepcional, atendidos os a ser deferida, requisitos caso autorizadores a caso, (grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas). Nesse sentido, confira-se trecho de decisão proferida pela Ministra Ellen Gracie no julgamento da STA no 138/RN: “[...] os pedidos de contracautela formulados em situações como a que ensejou a antecipação da tutela ora impugnada devem ser analisados, caso a caso, de forma concreta, e não de forma abstrata e genérica, certo, ainda, que as decisões proferidas em pedido de suspensão se restringem ao caso específico analisado, não se estendendo os seus efeitos e as suas razões a outros casos, por se tratar de medida tópica, pontual” – (STA no 138/RN, Presidente Min. Ellen Gracie, DJ 19.9.2007). 3 Ressalte-se, não obstante, que, na análise do pedido de suspensão de decisão judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, conforme tem entendido a jurisprudência desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados: SS-AgR no 846/DF, Rel. Sepúlveda Pertence, DJ 8.11.1996 e SS-AgR no 1.272/RJ, Rel. Carlos Velloso, DJ 18.5.2001. O art. 9.494/1997, 4º da Lei no 8.437/1992, c/c art. autoriza o deferimento do pedido de 1º da Lei suspensão da execução da tutela antecipada concedida nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. A decisão liminar que a União busca suspender determinoulhe, em 45 dias a contar de 13.10.2008, a inclusão em protocolo clínico do (DPOC), bem tratamento como solidariamente, para Doença determinou o à Pulmonar União fornecimento e ao dos Obstrutiva Crônica Estado Paraná, do medicamentos Foraseg (Formoterol e Budesonida) e/ou Spiriva (Tiotropio) aos pacientes portadores de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), com fundamento na aplicação imediata do direito fundamental social à saúde e na jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª artigo 196 da Região. O direito à saúde é estabelecido pelo Constituição Federal como (1) “direito de todos” e (2) “dever do Estado”, (3) garantido mediante “políticas sociais e econômicas (4) que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos”, 4 (5) regido pelo princípio do “acesso universal e igualitário” (6) “às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”. A doutrina constitucional brasileira há muito se dedica à interpretação do artigo 196 da Constituição. Teses, muitas vezes antagônicas, proliferaram-se em todas as instâncias do Poder Judiciário e na seara acadêmica. Tais teses buscam definir se, como e em que medida o direito constitucional à saúde se traduz em um direito subjetivo público a prestações positivas do Estado, passível de garantia pela via judicial. O fato é que a judicialização do direito à saúde ganhou tamanha importância teórica e prática que envolve não apenas os operadores do Direito, mas também os gestores públicos, os profissionais da área de saúde e a sociedade civil como um todo. Se, fundamental por para um o lado, a exercício atuação do efetivo da Poder Judiciário cidadania e para é a realização do direito à saúde, por outro as decisões judiciais têm significado um forte ponto de tensão entre os elaboradores e os executores das políticas públicas, que se veem compelidos a garantir prestações de direitos sociais das mais diversas, muitas vezes contrastantes com a política estabelecida pelos governos para a área da saúde e além das possibilidades orçamentárias. Em 5 de março de 2009, convoquei Audiência Pública em razão dos diversos pedidos de suspensão de segurança, de suspensão de tutela antecipada e de suspensão de liminar em trâmite no âmbito desta Presidência, com vistas a suspender a execução de medidas cautelares que condenam a Fazenda Pública ao fornecimento das mais variadas prestações de saúde (fornecimento de medicamentos, suplementos alimentares, órteses e próteses; criação de vagas de UTIs e leitos hospitalares; contratação de servidores 5 de saúde; realização de cirurgias e exames; custeio de tratamento fora do domicílio, inclusive no exterior, entre outros). Após ouvir os depoimentos prestados pelos representantes dos diversos setores envolvidos, entendo ser necessário redimensionar a questão da judicialização do direito à saúde no Brasil. Isso porque, na maioria dos casos, a intervenção judicial não ocorre em razão de uma omissão absoluta em matéria de políticas públicas voltadas à proteção do direito à saúde, mas tendo em vista uma necessária determinação judicial para o cumprimento de políticas já estabelecidas. Portanto, não se cogita do problema da interferência judicial em âmbitos de livre apreciação ou de ampla discricionariedade de outros Poderes quanto à formulação de políticas públicas. Esse dado pode ser importante para a construção de um critério ou parâmetro para a decisão em casos como este, no qual se discute, primordialmente, o problema da interferência do Poder Judiciário na esfera dos outros Poderes. O primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política estatal que abranja a prestação de saúde pleiteada pela parte. Ao deferir uma prestação de saúde incluída entre as políticas sociais e econômicas formuladas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o Judiciário não está criando política pública, mas apenas determinando o seu cumprimento. Nesses casos, a existência de um direito subjetivo público a determinada política pública de saúde parece ser evidente. Se a prestação de saúde pleiteada não estiver entre as políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, de uma 6 decisão administrativa de não fornecê-la ou de uma vedação legal a sua dispensação. O segundo dado a ser considerado é a existência de motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS. Há casos em que se ajuíza ação com o objetivo de garantir prestação de saúde que o SUS decidiu não custear por entender que inexistem evidências científicas suficientes para autorizar sua inclusão. Nessa distintas: adequado 1º) a hipótese, o SUS podem fornece determinado ocorrer, ainda, tratamento paciente; 2º) o duas situações alternativo, SUS não tem mas não nenhum tratamento específico para determinada patologia. A princípio, pode-se inferir que a obrigação do Estado, à luz do disposto no artigo 196 da Constituição, restringe-se ao fornecimento das políticas sociais e econômicas por ele formuladas para a promoção, proteção e recuperação da saúde. Isso porque o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da “Medicina com base em evidências”. Com isso, adotaram-se os “Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas”, que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e disponíveis o e tratamento as correspondente respectivas doses. com Assim, os um medicamentos medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente. Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que 7 repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente. Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, medida diferente ou da de a própria custeada pelo Administração, decidir SUS fornecida deve ser que a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. Inclusive, Audiência como ressaltado Pública, há pelo próprio necessidade de Ministro revisão da Saúde periódica na dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos. Assim, não se pode Terapêuticas afirmar do SUS que os Protocolos Clínicos são inquestionáveis, o que e Diretrizes permite sua contestação judicial. Situação diferente é a que envolve a inexistência de tratamento na rede pública. Nesses casos, é preciso diferenciar os tratamentos puramente experimentais dos novos tratamentos ainda não testados pelo Sistema de Saúde brasileiro. Os tratamentos experimentais (cuja eficácia ainda não foi cientificamente centros médicos comprovada) de ponta, são realizados por consubstanciando-se laboratórios em ou pesquisas clínicas. A participação nesses tratamentos rege-se pelas normas 8 que regulam a pesquisa médica e, portanto, o Estado não pode ser condenado a fornecê-los. Como esclarecido pelo Médico Paulo Hoff, Diretor Clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, na Audiência Pública realizada, essas drogas não podem ser compradas em nenhum país, porque nunca foram aprovadas ou avaliadas, e o acesso a elas deve ser disponibilizado apenas no âmbito de estudos clínicos ou programas de acesso expandido, não sendo possível obrigar o SUS a custeá-las. No entanto, é preciso que o laboratório que realiza a pesquisa continue a fornecer o tratamento aos pacientes que participaram do estudo clínico, mesmo após seu término. Quanto aos novos tratamentos (ainda não incorporados pelo SUS), é preciso que se tenha cuidado redobrado na apreciação da matéria. Como frisado pelos especialistas ouvidos na Audiência Pública, o conhecimento médico não é estanque, sua evolução é muito rápida e dificilmente acompanhável pela burocracia administrativa. Se, por um lado, a elaboração dos Protocolos Clínicos e das Diretrizes Terapêuticas privilegia a melhor distribuição de recursos públicos e a segurança dos pacientes, por outro a aprovação de novas indicações terapêuticas pode ser muito lenta e, assim, acabar por excluir o acesso de pacientes do SUS a tratamento há muito prestado pela iniciativa privada. Parece certo que a inexistência de Protocolo Clínico no SUS não pode significar violação ao princípio da integralidade do sistema, nem justificar a diferença entre as opções acessíveis aos usuários da rede pública e as disponíveis aos usuários da rede privada. Nesses casos, a omissão administrativa no tratamento de determinada patologia poderá ser objeto de impugnação judicial, 9 tanto por ações individuais como coletivas. No entanto, é imprescindível que haja instrução processual, com ampla produção de provas, o que poderá configurar-se um obstáculo à concessão de medida cautelar. Portanto, independentemente da hipótese levada à consideração do Poder Judiciário, as premissas analisadas deixam clara a necessidade de instrução das demandas de saúde para que não ocorra a produção padronizada de iniciais, contestações e sentenças, peças processuais que, muitas vezes, não contemplam as especificidades do caso concreto examinado, impedindo que o julgador concilie a dimensão subjetiva (individual e coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde. Essas considerações já são suficientes para a análise do pedido. Preliminarmente, suspender a tutela destaco antecipada que do o presente juízo de pedido busca primeiro grau inicialmente concedida, em 19.09.2008, e que, após acolhimento de embargos declaratórios opostos pela União e pelo Estado do Paraná, foi reformada apenas para definir a extensão dos seus efeitos (13.10.2008). A referida liminar foi parcialmente mantida pelo TRF da 4ª Região, em decisão monocrática (12.11.2008) que reduziu a extensão dos seus efeitos, o que foi mantido também em acórdão daquela Corte (11.02.2009). Em 28.04.2009, foi prolatada sentença na ação civil pública, mantendo a decisão liminar proferida, de acordo com o que especificado pelo TRF da 4ª Região no referido agravo de instrumento. 10 Verifico, ainda, em consulta realizada no sítio do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, em 24.03.2010, aquele Tribunal, por unanimidade, negou provimento às apelações da União e do Estado do Paraná e à remessa oficial, mantendo integralmente a sentença acima referida. Desse modo, constata-se que as instâncias ordinárias já proferiram decisões de mérito sobre a questão debatida no processo principal, mantendo a condenação da União e do Estado do Paraná. Mesmo assim, a União busca suspender no presente pedido a antecipação de tutela que contém duas determinações bem claras, contra as quais há quase dois anos se insurge, sem êxito. A decisão impugnada consiste no deferimento de duas tutelas antecipadas que exigem providências no sentido de: (1) a União, especificamente, providenciar a inclusão em protocolo clínico do SUS de tratamento da DPOC em 45 dias contados a partir da decisão de 13.10.2008; (2) a União e o Estado do Paraná disponibilizar os medicamentos Foraseg (Formoterol e Budesonida) e/ou Spiriva (Tiotropio) aos pacientes portadores de DPOC residentes nos municípios que integram a Subseção Judiciária de Maringá/PR que, no curso da ação, comprovarem a sua necessidade, por intermédio de expressa indicação e prescrição em receituário expedido por médico vinculado ao SUS, em atendimento no âmbito do SUS. Ressalto que não consta na decisão impugnada a imposição de multa ou de outra sanção em caso de descumprimento do prazo estipulado. O violação do intervenção argumento princípio do central da judiciário apontado separação em casos de pela União Poderes, como o reside na na indevida presente, na 11 determinação genérica da decisão impugnada e na ausência de protocolo clínico para a DPOC. Em primeiro lugar, destaco que a alegação de violação à separação dos Poderes não justifica a inércia do Poder Executivo em cumprir seu dever constitucional de garantia do direito à saúde de todos (art. 196), legalmente estabelecido pelas normas que regem o Sistema Único de Saúde, e tecnicamente especificado pelas Portarias do Ministério da Saúde. A Constituição indica de forma clara os valores a serem priorizados, corroborada pelo disposto nas Leis Federais 8.080/90 e 8.142/90. Essas determinações devem ser seriamente consideradas por ocasião da formulação orçamentária, pois representam comandos vinculativos para o poder público. Quanto Judiciário, à destaco possibilidade a ementa da de decisão intervenção proferida do na Poder ADPF-MC 45/DF, relator Celso de Mello, DJ 29.4.2004: “EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁCTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ‘RESERVA DO POSSÍVEL’. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO ‘MÍNIMO EXISTENCIAL’. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO).” Nesse sentido é a lição de Christian Courtis e Victor Abramovich (ABRAMOVICH, Victor; COURTS, Christian, Los derechos sociales como derechos exigibles, Trotta, 2004, p. 251): 12 “Por ello, el Poder Judicial no tiene la tarea de diseñar políticas públicas, sino la de confrontar el diseño de políticas asumidas con los estándares jurídicos aplicables y – en caso de hallar divergencias – reenviar la cuestión a los poderes pertinentes para que ellos reaccionen ajustando su actividad en consecuencia. Cuando las normas constitucionales o legales fijen pautas para el diseño de políticas públicas y los poderes respectivos no hayan adoptado ninguna medida, corresponderá al Poder Judicial reprochar esa omisión y reenviarles la cuestión para que elaboren alguna medida. Esta dimensión de la actuación judicial puede ser conceptualizada como la participación en un <<diálogo>> entre los distintos poderes del Estado para la concreción del programa jurídicopolítico establecido por la constitución o por los pactos de derechos humanos.” (sem grifo no original) Quanto à alegação de decisão judicial que se pauta em determinações genéricas, é preciso destacar que, de fato, há casos que envolvem decisões judiciais que buscam garantir o direito à saúde, por meio do fornecimento de medicamentos e de outras medidas, mas que impõem determinações genéricas, sem delimitar, por exemplo, quais seriam os beneficiários daquela decisão, que tipo de tratamento, de medicamento ou de política deve se adotar, o que, em princípio, poderia acarretar grave lesão à ordem e à economia públicas. Essa é a alegação da União no presente pedido. Entretanto, ao considerar todos os elementos do presente caso, entendo que não assiste razão à requerente quanto à alegação de que a decisão impugnada seja genérica e indeterminada, a causar grave lesão à ordem e à economia públicas. Foi determinado à União e ao Estado do Paraná disponibilizar medicamentos certos e determinados, quais sejam: Foraseg (Formoterol e Budesonida) e/ou Spiriva (Tiotropio). Tais medicamentos estão registrados na ANVISA. Além disso, definiu-se que somente poderão ser fornecidos aos pacientes portadores de DPOC residentes nos municípios que integram a Subseção Judiciária de Maringá/PR. 13 Ademais, não se tratou de permitir o uso irrestrito e ilimitado do medicamento, mas de autorizar que, no curso da ação principal, os referidos medicamentos só sejam fornecidos aos pacientes que comprovarem a sua necessidade, por intermédio de expressa indicação e prescrição em receituário expedido por médico vinculado ao SUS, em atendimento no âmbito deste. Ora, a decisão judicial determina, assim, uma tutela que assistirá apenas aos que comprovarem junto ao SUS a necessidade do medicamento, de acordo com os parâmetros preestabelecidos. Essa determinação coincide, inclusive, com o pedido da União em sua contestação na ação principal, a saber: “Em caso de condenação da União, pugnou-se por: 1) constar expressamente na sentença que o fornecimento de medicamentos especiais somente será cabível quando receitado por médico integrante do SUS, em atendimento no âmbito do sistema, consoante precedentes jurisprudenciais apontados nesta peça processual; 2) restar afastada qualquer determinação de reembolso de despesas processuais e honorários advocatícios à parte autora [...]; 3) limitação dos efeitos da sentença (e da antecipação dos efeitos da tutela) à Subseção Judiciária de Maringá, nos termos do art. 16 da Lei n.º 7.347/85.” (fl. 130 – grifo nosso) Assim, ponto, com a vê-se própria que a tutela pretensão da antecipada União em coincide, seu neste pedido de contestação, o que afasta a constatação de grave lesão à ordem e à economia públicas. Além disso, ressalto que a Portaria n.º 3916, de 30 de outubro de 1998, dispõe sobre a Política Nacional de Medicamentos, estabelecendo diretrizes para a instituição de relação de medicamentos essenciais (RENAME), a regulamentação sanitária de medicamentos, a reorientação da assistência farmacêutica, a promoção da pesquisa e a produção de medicamentos, entre outras. 14 A assistência farmacêutica (Resolução n.º 338/2004 do Conselho Nacional de Saúde), uma entre as várias prestações de saúde que compõem econômicas que o sistema visam a brasileiro, reduzir os abrange preços dos políticas medicamentos (programas como “Farmácia Popular”, “Medicamento Genérico” e “Uso Racional de Medicamentos”) e políticas sociais que garantam o fornecimento gratuito de medicamentos à população por meio de três programas básicos (“Medicamentos básicos”, “Medicamentos estratégicos” e “Medicamentos excepcionais”). O Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional, iniciado em 1982, é responsável por disponibilizar medicamentos – normalmente de custo elevado e de uso prolongado – para o tratamento de doenças específicas, que atingem um número limitado de pacientes,. O Programa é regulado pela Portaria n.º 152/GM2006, que define como critérios para o fornecimento a existência de registro do medicamento, a indicação terapêutica requerida e a definição de preço no órgão regulador. A Portaria n.º 1.869/GM, de 4 de setembro de 2008, que substitui a Portaria n.º 2.577/GM, de 27 de outubro de 2006, estabelece os procedimentos e os valores abrangidos pela política de medicamentos de dispensação excepcional do SUS. A instituiu Portaria a Política diretrizes para reabilitação e n.º 2.439/GM, Nacional promoção, cuidados de de Atenção prevenção, paliativos 8 a de dezembro de Oncológica, diagnóstico, serem 2005, traçando tratamento, implantados pelos órgãos do SUS. Registre-se que a Lei Federal n.º 6.360/76, ao dispor sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, determina em seu artigo 12 que “nenhum dos produtos de que trata esta Lei, 15 inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde”. Em consulta ao sítio da ANVISA, é possível verificar que o medicamento Foraseq – produzido pela empresa Novartis Biociências S.A – foi registrado sob o n.º 100680156, válido até 03/2011, e o medicamento Spiriva – produzido pela empresa Boehringer Ingelheim do Brasil Química e Farmacêutica Ltda. – foi registrado sob o n.º 103670137, válido até 06/2012, o que atesta sua segurança para o consumo. Reforça constatação de a que ausência pelo de grave menos os lesão à ordem componentes do pública a medicamento Foraseq – fumarato de formoterol diidratado e Budesonida – constam do anexo II, no Grupo 36, subgrupo 53 – antiasmáticos, da Portaria n.º 2.577/2006 do Ministério da Saúde, que elenca os componentes dos medicamentos de dispensação excepcional. Sendo alternativa a determinação da tutela antecipada – fornecimento do medicamento Foraseq ou do medicamento Spiriva – tem-se que, no mínimo quanto ao primeiro, o pedido da ação é simplesmente compelir o Sistema Único de Saúde a cumprir e fornecer os fármacos que já constam em seus registros formais. Não procede também a alegação da União de grave lesão à ordem e clínico à economia para a públicas, DPOC no quanto Ministério à da ausência Saúde de ou protocolo quanto à impossibilidade de ser condenada a inserir a DPOC em protocolo clínico e de diretrizes terapêuticas. Como já mencionado nesta decisão, é constante a necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de 16 elaboração de novos, o que torna imprópria a alegação de que tais protocolos sejam inquestionáveis, diante de sua tendente defasagem. Num juízo mínimo de delibação sobre o mérito da causa, verifica-se que há 2 (dois) anos a União e o Estado do Paraná litigam neste processo e não há notícia, nos autos, de que haja estudos ou propostas avançadas por esses entes relacionadas à inclusão da DPOC em protocolos clínicos. Pelo internet em Departamento Pneumologia contrário, 8.2.2010 de e Ações depreende-se que, de acordo Programáticas Fisiologia, a DPOC de da não notícia com o Sociedade está veiculada na Presidente do Brasileira prevista para de ser inserida em 2010 em protocolos clínicos do Ministério da Saúde, a saber: “Ministério da Saúde promete rever os atuais protocolos, investindo R$ 11,3 milhões nos próximos três anos na criação e implementação de novas diretrizes O Ministério da Saúde trabalhava na revisão dos 53 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas existentes e na elaboração de outros 33, até o fim do ano de 2009. Os documentos definem o oferecimento de tratamentos no SUS (Sistema Único de Saúde), estabelecendo uma conduta médica correta e padronizada para cada doença em todo o país. O desenvolvimento do projeto ainda está em andamento, mas já levanta uma preocupação da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), que alerta para a não inclusão da DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica) nesta lista. “A DPOC é uma doença relacionada a elevados índices de hospitalização, incapacitação e morte prematura. A ausência de tratamento na Atenção Básica gera uma massa de pacientes em estado grave que poderiam ter suas doenças atenuadas e controladas. E o custo do tratamento nos estágios avançados é muitas vezes maior que nos estágios precoces”, afirma o dr. Alcindo Cerci Neto. Cerca de 7 milhões de brasileiros são portadores da DPOC, classificada como a 6ª causa de óbito no mundo e a 5ª no Brasil. O estudo PLATINO – Projeto Latinoamericano de Investigação em Obstrução Pulmonar (2005) revela que 87,5% dos casos em São Paulo não haviam sido diagnosticados antes da pesquisa e 83% destes não haviam recebido tratamento. 17 Atualmente, alguns estados têm programas para tratamento da DPOC, mas, segundo o dr. Alcindo, estão, em sua maior parte, restritos a capitais e serviços de referência reduzidos em número e que, portanto, ainda mantêm a maioria de doentes sem tratamento.” (Disponível em: http://www.revistavigor.com.br/2010/02/08/tratamento-depacientes-de-dpoc-ainda-nao-esta-disponivel-no-sus/. Acesso em: 26.03.2010) Além disso, verifica-se que desde 26.06.2007, por exemplo, o Estado de São Paulo aprovou protocolo para tratamento de DPOC, com atendimento pelo SUS daquele Estado (cfe. Resolução SS n.º 278, de 26 de julho de 2007). Nesse sentido, há inclusive possibilidade de isenção de observância do rodízio municipal de veículos na capital para portadores de DPOC (cfe. informação contido no sítio http://www.dpoc.org.br/). Também se infere do Portal do Governo do Espírito Santo notícia institucional de 05.05.2009, que informa o lançamento do protocolo clínico para doença pulmonar obstrutiva crônica e diretrizes terapêuticas para o tratamento de asma grave de difícil controle naquele Estado. Ademais, Distrito Federal (Disponível consta o em no inteiro sítio teor do da Secretaria Protocolo de Saúde Clínico da do DPOC www.saude.df.gov.br/sites/100/163/00006510.pdf. Acesso em: 25.03.2010). Verifica-se, ainda, notícia de que o Estado de Minas Gerais irá tratamento lançar no mês farmacológico de março de da DPOC 2010 o protocolo (Disponível para em: http://www.isaude.net/pt-BR/noticia/3749/saude-publica/mg-esperaimplantar-protocolo-de-tratamento-farmacologico-da-dpoc-em-2010. Acesso em: 26.03.2010). 18 Assim, vê-se que há várias iniciativas, concretizadas desde 2007, de diversos entes da federação que integram o Sistema Único de Saúde e reconhecem a relevância científica da DPOC e a necessidade de seu tratamento. A omissão da União em estabelecer uma diretriz geral nesse sentido, bem como do próprio Estado do Paraná, conflitam com a exigência de observância do princípio da integralidade do sistema, que, em última instância, não deve gerar distinções de tratamento acessíveis aos usuários da rede pública de um Estado em detrimento de outros. Nesses casos, como já antes dito, a omissão patologia ações poderá administrativa ser individuais objeto como de no tratamento impugnação coletivas, em de determinada judicial, que tanto haja por instrução processual, com ampla produção de provas. Além disso, a ausência de imposição expressa de qualquer sanção pelo descumprimento de prazo de cumprimento da decisão afasta qualquer alegação de grave lesão nesse contexto. Portanto, não é possível vislumbrar grave ofensa à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas a ensejar a adoção da medida excepcional de suspensão de tutela antecipada. Acrescente-se, ainda, que, em 17.03.2010, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, negou provimento a nove agravos regimentais interpostos contra decisões da Presidência desta Corte, para manter determinações judiciais que ordenavam ao Poder Público fornecer remédios de alto custo ou tratamentos não oferecidos pelo portadores de Sistema doenças único graves, de em Saúde situações (SUS) a pacientes semelhantes a dos presentes autos, o que reforça o posicionamento ora adotado. (STAAgR 175 - apenso STA-AgR 178; SS-AgR 3724; SS-AgR 2944; SL-AgR 47; STA-AgR 278; SS-AgR 2361; SS-AgR 3345; SS-AgR 3355, Tribunal Pleno, de minha Relatoria). 19 Ante o exposto, indefiro o pedido de suspensão. Publique-se. Brasília, 7 de abril de 2010. Ministro GILMAR MENDES Presidente 20