PERSONALISMO E EDUCAÇÃO UM ESTUDO SOBRE A PESSOA EM EMMANUEL MOUNIER Aleilza Oliveira dos Santos1 Maria Neusa Monteiro2 O presente trabalho teve como objetivo compreender o movimento filosófico Personalista empreendido pelo francês Emmanuel Mounier, o conceito central por ele desenvolvido - a Pessoa- bem como sua concepção de educação. Para tal intento, foi realizada uma pesquisa que nos permitiu mergulhar nos escritos de Mounier . Importante dizer que ao situarmos a concepção de educação Personalista, nós pontuamos uma Proposta metodológica de trabalho por nós construída, fruto de uma pesquisa desenvolvida na UFPA sobre o ensino de Filosofia no Ensino Médio. Face ao seu conceito central-a Pessoa – Mounier começa a vislumbrar o resgate da humanidade com a Instituição do Universo Pessoal, que traz mudanças significativas à vida humana. O próprio conceito de educação modifica-se, pois sua grande missão passa a ser a formação do homem como Pessoa. Palavras chaves: personalismo, Mounier, educação. Introdução Vivemos num mundo por demais conturbado. Dia após dia presenciamos a degradação do homem nas várias dimensões de sua existência. Em meio a essa desordem pensamos: quem afinal é o homem? Quem sou eu? Tais indagações levam-nos a lembrar da máxima socrática: “conhece-te a ti mesmo”!. O apelo socrático mostrava a necessidade do homem se comprometer com a transformação da sociedade de modo que fosse criada uma sociedade humana onde reine a justiça social, a valorização da vida pessoal e comunitária. De acordo com o pensamento personalista de Emmanuel Mounier, somos pessoas com características próprias, seres singulares mas ao mesmo tempo comunitários. Seres que são 1 Graduada em Pedagogia. Universidade Federal do Pará. Profª do Ensino Fundamental e Médio. [email protected] 1 capazes de amar, de dialogar e de viver em comunhão. Contudo, somos também capazes de protestar, de dizer não, de julgar, de ser livres. Como pessoas, não somos e nem podemos ser tratados como objetos manejáveis, com fim em si mesmos. Buscando refletir sobre o mundo desumano do qual fazemos parte, construímos o presente trabalho na tentativa de compreender a Filosofia Personalista de Mounier e sua proposta de uma sociedade nova, pautada na construção da Pessoa, através de um movimento personalizante sustentado por valores irredutíveis da vida humana. Importante dizer que Mounier destaca como um dos direitos fundamentais para a formação da pessoa a educação. É nessa perspectiva que há a necessidade de uma nova concepção do que seja o próprio processo educativo. Participamos de uma pesquisa realizada no período de agosto de 2002 à julho de 2003 enquanto integrantes do projeto “ a Filosofia no ensino Médio em Belém: ensino, pesquisa e extensão”3 desenvolvemos o Plano de Atividades intitulado “O ensino de filosofia no nível médio: uma Proposta de Trabalho a luz da Filosofia Personalista de Mounier”. Neste, tivemos a oportunidade de acompanhar uma turma de uma escola pública de Belém durante suas aulas de filosofia. Essa experiência nos oportunizou identificar alguns problemas que de alguma forma prejudicavam o processo ensino-aprendizagem da referida disciplina. Em face dos problemas detectados, buscamos constuir uma Proposta Metodológica para um novo ensino de Filosofia nessa escola. Para tal, nos baseamos na Filosofia Personalista de Emmanuel Mounier4. Por este fato, achamos oportuno apresentar nesse trabalho a síntese da referida proposta quando destacarmos a educação numa perspectiva Personalista Mounieriana. O Personalismo: Contextualização Nesta primeira parte do trabalho recorrer-se-á à Filosofia do século XX, buscando contextualizar o Personalismo, movimento filosófico contemporâneo, dando atenção especial ao desenvolvido na França e ao seu idealizador maior, Emmanuel Mounier. Recorrendo a Filosofia do século XX procuraremos apartir de agora contextualizar o movimento filosófico contemporâneo, dando especial atenção ao desenvolvido na França e ao seu idealizador maior Emmanuel Mounier. 2 Mestre em Filosofia. Profª de Filosofia da Educação, Metodologia do Ensino de Filosofia e Prática de Ensino de Filosofia da Universidade Federal do Pará, Centro de Educação, Departamento de Fundamentos da Educação, [email protected] 3 Coordenado pela Profa. Maria Neusa Monteiro, que também foi orientadora da pesquisa e do TCC. 4 O referido Plano de Trabalho deu origem ao Trabalho de Conclusão de Curso- TCC defendido recentemente. 2 A Revolução Francesa (1789) representa a ruptura dos resquícios do feudalismo que ainda perduravam, e que impediam a expansão do comércio e da indústria, abrindo assim caminhos para a definitiva implantação de um novo sistema econômico e político – o Capitalismo. A Revolução contribuiu para a ascensão da burguesia ao poder, ocasionando assim o fim do Antigo Regime Absoluto, e economicamente com os vestígios do feudalismo, substituindo-o por princípios e orientações favoráveis ao capitalismo. É porém no século XX que o sistema capitalista ganha impulso maior, havendo a necessidade de ampliação de mercados, o que gerou uma nova corrida colonial das potências pelo mundo, ocasionando assim a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), que desencadeou a exacerbação dos nacionalismos e alianças militares, trazendo consequências terríveis à humanidade: milhões de mortos e famintos. Acirraram-se os problemas econômicos e sociais . A miséria era extrema. A liberdade de ação e pensamento ficou limitada, e a manutenção da burguesia no poder ficou enfraquecida, sendo substituída pelos regimes totalitários, notadamente o Fascismo italiano e o Nazismo alemão. Em fins da década de 20, o sistema capitalista vivia uma profunda crise. Os E.U.A, grandes vencedores do conflito, viveram um caos sem precedentes com o crack da Bolsa de Valores de New York, visto que o país produzira em demasia mas as nações destruídas pela guerra não tinham condições de adquirir os produtos norte-americanos. Dessa forma, as ações das grandes empresas americanas sofreram quedas vertiginosas, o que levou muitas à falência. As que “sobreviveram” foram forçadas a reduzir os seus ritmos de produção, o que provocou demissões em massa, aumentando o nível do desemprego. A crise que se vislumbrava não era só econômica, mas também social e por que não dizer psicológica, visto que o homem, nesse contexto, tem seu valor medido não pelo seu interior, sua subjetividade mas pelo que ele produz no plano material concreto. Em 1939, o mundo lançou-se em uma nova grande guerra mundial (1939-1945), ocasionada novamente pela corrida imperialista das grandes potências que buscavam dominar o mundo. As consequências novamente foram desastrosas: empobrecimento de muitos países, mortes, sofrimento. O mundo passou desde então a viver em estado de tensão e sob a constante ameaça de uma terceira guerra mundial. É nesse mundo absurdo de desencantos, que põe em xeque os valores humanos mais essenciais que vários movimentos filosóficos vão surgindo, dando inicio a um novo momento de reflexões filosóficas denominado de Filosofia Contemporânea. Dentre esses movimentos, temos o Personalismo desenvolvido na França. O Personalismo como Movimento Filosófico 3 O termo Personalismo já havia sido utilizado por alguns filosófos. Mas na França dos anos 30 esse termo vem consolidar num contexto histórico específico, as reflexões de um grupo de filósofos, entre eles Emmanuel Mounier, que fundaram a Revista Esprit em 1932. O contexto histórico específico a que nos referimos teve sua gênese com a crise econômica de 1929, que iniciou-se com o Crack da Bolsa de Valores de Nova York, que ocasionou uma queda desastrosa na produção e no comércio. O índice de desemprego aumentou consideravelmente nesse período. A crise que estava se construindo completou-se com o crescimento dos regimes totalitários e com a deflagração da Segunda Guerra Mundial. A crise de 1929 deu início a um período que abalou não só a dimensão econômica mas toda a estrutura da sociedade. É diante desse dramático quadro de ‘desordem estabelecida’ em que se encontrava a humanidade e em face da ausência de lideranças lúcidas e socialmente comprometidas com o processo de transformação dessa situação que um grupo de jovens, liderados por Emmanuel Mounier, se reúnem, dispostos a propôr algo que efetivamente viesse a colaborar com as mudanças necessárias. Assim nascia o Movimento Filosófico Personalista francês Contemporâneo, que se lançava rumo a um novo projeto de vida e de civilização. Esse personalismo origina-se da constatação do fracasso do projeto de civilização ocidental, de inspiração capitalista. Emmanuel Mounier: o Filósofo Engajado A figura mais expressiva, sem dúvida, desse movimento foi Emmanuel Mounier (1905-1950). Esse filosófo francês de Grenoble fez de sua vida uma ardorosa presença na história na qual estava inserido. Essa participação na história foi tão intensa que influenciou sobremaneira seu próprio pensamento - o Personalismo. Seu Personalismo se explica historicamente, pela sua atuação pessoal diante do contexto sócio-político de seu tempo. Diante da ‘desordem estabelecida’ iniciada em 1929, Mounier pretendia na verdade testemunhar seu pensamento, provocando uma atitude em seus contemporâneos. O seu modo de filosofar unia-se a tomada de consciência de uma grande crise histórica pela qual passava a civilização Ocidental. Sua primeira tarefa era civilizadora, baseando-se em um novo humanismo. Mounier combatia pelo homem; esse homem dramático, que é corpo e espírito, que é eterno e temporal. Conforme Severino (1974, p. 8) sua luta 4 era a própria melodia de sua existência pois a estrutura da pessoa é, em verdade, mais parecida a um desenvolvimento musical do que a uma arquitetura, pois não pode figurar fora do tempo [...]. A pessoa que designa e descreve não é um ideal utópico com que sonhar se pode ou imaginar, mas era a própria pulsação que sentia dentro de si, da experiência pessoal, cheia de contradições e tensões internas. Tensões e contradições que, como se verá, nasciam da própria condição humana que vivia profundamente, sentindo-a pulsar em si. Tal foi a influência dos acontecimentos históricos e pessoais em seu pensamento que muitos acusavam o Personalismo de Mounier de não ser propriamente uma filosofia. No Personalismo de Mounier não encontramos aquela sistematização e técnica tão ao gosto dos intelectuais de sua época. Estava certo de que era preciso dar uma nova compreensão à noção de filosofia excluindo-se dela a exaustiva essencialidade de um rigor lógico – técnico típico de sua época. Mounier afirmava que: O Personalismo é uma filosofia. Não é apenas uma atitude. É uma filosofia, não é um sistema. Não foge à sistematização. Porquanto o pensamento necessita de ordem: conceitos, lógica, esquemas unificantes, não servem apenas para fixar e comunicar um pensamento que sem eles se diluiria em intuições opacas e solitárias; [...] Por que define estruturas, o Personalismo é uma filosofia e não apenas uma atitude. Mas sendo a existência de pessoas livres e criadoras a sua afirmação central, introduz no centro dessas estruturas um princípio de imprevisibilidade que afasta qualquer desejo de sistematização definitiva (1964, p.16-17). Mounier desenvolve um conceito central: o de PESSOA. Porém, ele mesmo admite a impossibilidade de definir a Pessoa, visto que “só se definem os objetos exteriores ao homem, que se podem encontrar ao alcance de nossa vista. Mas a pessoa não é um objeto. Antes, é exatamente aquilo que em cada homem não é passível de ser tratado como objeto” (Mounier, 1964, p.17-18). A partir de agora, começaremos a trilhar o mistério que envolve a Pessoa, o conceito referência de todo pensamento construído por esse filósofo. A Noção de Pessoa em Mounier Na Antiguidade, o sentido de Pessoa4 era ainda embrionário. Mas é com o Cristianismo que a noção decisiva de Pessoa se estabelece. É característico do Cristianismo de que a “pessoa Etimologicamente o termo Pessoa deriva do latim Persona, que significa “ máscara teatral, por extensão o próprio ator, e daí seu papel, as características de um indíviduo, a Personalidade” (Japiassu ; Marcondes, 1993,p.193). 5 5 é o ser humano racional e livre, definido por sua dimensão de sujeito moral e espiritual, plenamente consciente do bem e do mal, livre e responsável” (Japiassu; Marcondes, 1993, p.193). A noção de Pessoa ganha força nos anos 30 diante da grave crise econômica-política enfrentada pelo mundo de um modo geral no período pós - 1ª guerra. O filósofo francês Emmanuel Mounier e alguns amigos sensibilizados com esse contexto dramático vivenciado pelos homens iniciam um movimento filosófico que vinha propondo um novo projeto de civilização. O Personalismo de Mounier surge como um movimento que constata a chamada crise da civilização, que pôs em xeque não só o capitalismo, mas todos os padrões sociais, evidenciando também uma crise moral. A Pessoa é tomada como centro de reorientação dessa sociedade em crise . Eis que assim Mounier começa a elaborar uma Filosofia da Pessoa . É importante esclarecermos que não é nossa intenção nesse trabalho definir a Pessoa, visto que o próprio Emmanuel Mounier evidencia a impossibilidade de conceituá-la. Na verdade, para nosso autor a Pessoa “é uma atividade vivida de auto-criação, de comunicação e adesão, que em um ato, como movimento de personalização, alcançamos e conhecemos” (Mounier,1964, p. 20). A essa experiência, chamada Movimento de Personalização, todos os homens são chamados. Porém, ninguém a ele pode ser imposto ou condicionado. O homem, de acordo com Mounier, vai construindo-se Pessoa através da experiência pessoal. Para que essa conquista seja possível, Mounier (1964, apud Severino, 1974, p. 45) precisa-se estruturas de, que [...] não são elementos fixistas de um novo modo de se cristalizar uma imagem da condição humana, mas são como que notas de uma melodia que é a existência humana no nível de sua apreensão; são os temas orientadores e centrais que dirigem e ‘explicam’ os momentos de expressão fenomenal do agir humano. São as dimensões existenciais da pessoa, as dimensões referenciais do mistério do ser pessoal, os pontos de referência através dos quais dele se pode aproximar. Essas estruturas formam o que Mounier denomina Universo Pessoal, que em engloba: - A EXISTÊNCIA INCORPORADA: Através dessa estrutura, Mounier vem afirmando uma das máximas do Personalismo, que diz respeito ao fato de que o homem é integralmente corpo assim como é espírito. Essa indissolúvel união da alma (espírito) com a matéria (corpo) é o centro do pensamento cristão, um dos grandes influenciadores do Personalismo de Mounier. Percebemos com isso, que o Personalismo Mounieriano supera o dualismo pernicioso matéria x espírito. 6 3.2 A COMUNICAÇÃO: Para Mounier, é a comunicação a experiência fundamental da Pessoa. É na relação com o outro que a Pessoa vai se afirmando. Assim, o outro não limita, mas faz-na ser e crescer. Ela, deste modo, não existe senão para os outros, não se encontra senão nos outros. - A CONVERSÃO INTÍMA: Apesar da Pessoa ser desde suas origens movimento para os outros, um “ser-para”, é importante esclarecer que podemos entendê-la também, em um outro aspecto, como um ser que é subjetividade, vida ou dimensão interior, interioridade. Esse aspecto não é contrário ao movimento da comunicação, mas é-lhe complementar. Para constituir-se, a Pessoa tem a necessidade de descentrar-se para fora de si mesma, num contínuo movimento de recolhimento e ruptura. (Severino, 1974). - O AFRONTAMENTO: A Pessoa existe, e como tal tem a capacidade de projeta-se para fora de si, expondo-se, fazendo face ao mundo. Conforme Mounier Prósopon é a palavra grega que mais aproxima-se da noção de Pessoa. Tal palavra significa “aquele que olha de frente, que afronta” (MOUNIER, 1964, p.97). Numa palavra: a Pessoa existe. Mas para existir pessoalmente é necessário algumas vezes fazer rupturas, dizer não, protestar, desligar-se, visto que sem esse desligamento a vida pessoal torna-se-ía um peso de adesões, adaptações, conformismo e alienação. Essa negação e protesto devem abarcar segundo Severino (1974) todas as dimensões da vida. Sendo a Pessoa humana uma possibilidade de recusa, protesto e decisão, em seu movimento de personalização ela apresenta-se como um ato que afirma e que se afirma em sua existência. É a pessoa um chamado e uma capacidade de afrontar aos outros, as situações e os acontecimentos do mundo. - A LIBERDADE COM CONDIÇÕES: Para Mounier somente a Pessoa é livre mas não é a liberdade uma coisa, que se possa tocar como a um objeto nem surpreendê-la em flagrante delito. O homem não pode demonstrá-la como a um teorema. Conforme nosso filósofo “ a liberdade é afirmação da pessoa, vive-se, não se vê. ‘Não há’ no mundo objetivo senão coisas dadas e situações que se cumprem [...]” (MOUNIER, 1964, p. 110). É assim que não se apreenderá a liberdade num plano de observação objetiva. A liberdade só se dará numa experiência existencial de todo ser humano. - A EMINENTE DIGNIDADE: Com essa estrutura Mounier destaca que a Pessoa não se fecha em si mesma. Ela ultrapassa a si própria, num movimento em direção ao Ser, à Pessoa Suprema 7 que é Deus. É assim que o movimento que forma a Pessoa indica necessariamente uma transcendência. - O COMPROMISSO: Para Mounier, é o compromisso sinônimo de ação e engajamento. É a ação uma exigência imprescindível do homem, que está inserido num universo que só é humano à medida que vai personalizando-se. Conforme Severino (1974, p. 105) o “ agir para a pessoa não será apenas exercitar-se mas igualmente sair de si mesma para dar-se consistência e ao mundo”. É a ação a condição essencial para a própria existência humana. Por mais difícil que seja, é o Movimento de Personalização imprescindível à vida humana e tal Movimento só é possível na perspectiva mounieriana se estiver alicerçada nas sete estruturas que aqui procuramos desenvolver. Importante aqui evidenciar que Mounier expressa em sua última obra “O Personalismo” (1964) alguns dos direitos fundamentais que são imprescindíveis à existência pessoal. Entre esses direitos ele destaca a educação. Passemos a partir de agora a compreender como nosso filósofo concebe esse direito e sua importância na formação da Pessoa. A Educação na Perspectiva Personalista de Mounier De acordo com o exposto anteriormente, podemos perceber que o homem vai tornando-se pessoa num contínuo e necessário Movimento de Personalização. Segundo Mounier, a formação da pessoa deve ter início desde a infância (o despertar da Pessoa). É em vista dessa formação, que os Personalistas atribuem grande importância às instituições educativas. Importante destacar que Emmanuel Mounier possuía uma visão bem específica acerca da educação. Para ele a educação “[...] não tem por função principal o fazer cidadãos conscientes, bons patriotas, ou pequenos facistas, pequenos comunistas, pequenos mundanos. A sua missão é a de despertar pessoas capazes de viver e de assumirem posições como pessoas” (Mounier, 1967, p. 133, grifo do autor). A concepção de educação traduzida por nosso filósofo evidencia uma profunda modificação pedagógica de escola. Mounier (1964, p. 135) destaca que a escola “[...] tem por função ensinar a viver, e não acumular conhecimentos exactos ou processos eficientes. E é próprio de um mundo de pessoas que a vida não se ensine mediante uma instrução impessoal distribuída em verdades codificáveis [...]”. É nessa perspectiva, que a educação de inspiração personalista deve ser concebida como um projeto pedagógico voltado para a formação da 8 pessoa, em vista de sua libertação de todas as amarras despersonalizantes. Assim, o educando deve ser estimulado, via mediação e testemunho do professor, a ser alguém ativo, investigador e sujeito do processo educativo. Ao docente, compete iniciar o aluno no caminho da descoberta, motivando-o à curiosidade saudável e criadora, confiando-lhe gradualmente responsabilidades.Buscando redimensionar o ambiente escolar em meio ao espírito personalista de educação, é importante criar na escola um ambiente comunitário de participação e de cooperação entre os sujeitos que dele fazem parte. Para tal, necessário faz-se que o diálogo e o respeito mobilizem as atividades na escola. Importante também que os docentes não tenham uma visão restrita dos alunos, visto que esses são integralmente corpo e espírito, subjetivos e objetivos. Com essa compreensão bem mais ampla é possível a diversificação de atividades que possibilitem o desenvolvimento integral do educando. A concepção de Educação evidenciada por Mounier traduz mudanças significativas na escola, onde a passividade, o silêncio e o imobilismo passam a não ter mais vez. Educação é comunicação. Essa comunicação é diálogo. Não há diálogo numa educação sem liberdade. Enfatiza-se que na perspectiva mounieriana, o processo educativo está para além de esforços que visem a instrução individual dos sujeitos, mas traduz-se num trabalho paciente de pais, mestres e do próprio Estado de promover verdadeiramente o despertar da Pessoa, orientando-a a saber dirigir sua vida por si própria, de modo responsável, evidenciando sua transcendência perante outros seres. Para o Personalismo a educação deve ser a expressão da vida. Apresentamos a síntese da Proposta Metodológica de Trabalho para uma escola pública em Belém no período da realização do um projeto de pesquisa desenvolvido na UFPA sobre o ensino de Filosofia no ensino Médio. Essa Proposta foi construída tomando por base a Filosofia Personalista de Mounier. Proposta Metodológica de Trabalho em Sala de Aula a Luz da Filosofia Personalista de Mounier : a Possibilidade para uma nova Educação Buscamos construir uma Proposta Metodológica de trabalho para o empreendimento de um novo ensino de Filosofia. Para tal, elaboramos um Plano de Curso. Situamos aqui os seus procedimentos metodológicos, parte talvez que demonstre com operacionalização de nossa proposta. Procedimentos metodológicos mais clareza a 9 Numa perspectiva Personalista há necessidade do cultivo de novos hábitos, ou melhor, novas atitudes durante as aulas da referida disciplina. Buscando e acreditando na possibilidade de um novo ensino de Filosofia sugerimos que nestas sejam estimuladas: - aulas mais dinâmicas, em que os alunos participem mais ativamente; - compreensão da importância da Filosofia tanto para alunos quanto professores; - Trabalhos em Grupo (Seminários, questionários, dramatizações, etc...) ou outros que possam contribuir com os educandos, especialmente os que demonstram dificuldade de expressão; - Possibilidade de espaços de convivência onde alunos e professores possam expôr suas dificuldades e progressão no ensino e aprendizado da Filosofia; - Avaliações constantes da disciplina, tanto pelo professor da turma como os alunos; - Possibilidade das aulas serem realizadas em outros espaços, havendo aqui a extrema necessidade do professor expôr claramente os objetivos para as aulas da disciplina; - Busca ( por mais difícil que seja ) do estabelecimento de uma relação amigável e respeitosa entre alunos e professor e alunos-alunos; democratizar as relações em sala de aula; - Busca de soluções coletivas para os problemas gerados em sala de aula; - Busca da responsabilidade coletiva; verdadeiras comunidades de pessoas coletivas; - Auto – avaliação e avaliação; reflexão (radical e rigorosa) - Estimular a solidariedade, a cooperação e a confiançanos educandos; Com certeza, sendo uma Proposta, ela deve ser flexível, dada as condições concretas da realidade na qual vai ser desenvolvida. Pensamos, entretanto, que ela seja relevante e possa contribuir de algum modo com a formação da pessoa na perspectiva mounieriana. Considerações Finais Mounier, ao propôr o Personalismo, evidencia uma filosofia concretamente encarnada, direcionada para o reestabelecimento da humanidade, de um mundo mais humano. Em vista disso, face ao seu conceito central - a Pessoa -ele começa a vislumbrar esse resgate, com a instituição do Universo Pessoal, que em todas as dimensões da existência humana vai influenciar. Como Pessoa, o homem começa a se vêr e a ser visto de modo completamente diferenciado de como o percebem no mundo por demais degradante em que estamos 10 envolvidos. Para o personalismo, assumir a condição de pessoa, é se comprometer, engajar-se na luta comunitária. Nessa perspectiva, somos seres únicos, plenos, corpo-alma, objetividade-subjetividade. Seres de comunicação (interior e exterior) mas também de conversão íntima, projeto de nós próprios. Além disso afrontamos, nos posicionando frente aos embates sofridos. Assumimos a liberdade, buscada e conquistada constantemente. Somos seres de valores morais e religiosos, que muitas vezes nos fazem sofrer. Somos seres de ação, que nos condiciona à própria existência. A própria concepção de educação modifica-se nesse contexto, visto que sua missão é antes de mais nada contribuir com a formação da Pessoa. Essa condição nos possibilita almejar transformações significativas diante de tão desalentadora situação em que vivemos. Assim, o Personalismo empreendido por Emmanuel Mounier vem para oferecer subsídio especial à construção de uma sociedade melhor, a fim de que livres de todas as entranhas despersonalizantes possamos todos crescer em humanidade. Que nós possamos repudiar todas as forças alienantes, para que de fato vivamos plenamente como homens – pessoas. Referências Bibliográficas ANDREOLA, Balduíno Antônio. Dimensões pedagógicas do pensamento de Emmanuel Mounier. 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