Revolução Francesa

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Revolução Francesa: ela inventou nossos sonhos
“Os homens nascem livres e iguais em
direitos; as distinções sociais não
podem ser fundadas a não ser na
utilidade comum”.
Pela Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão, a Assembléia Constituinte
estabelece os direitos básicos dos franceses:
igualdade perante a lei e a obrigação do
Estado de defender os direitos “naturais” dos
cidadãos, como a liberdade e a propriedade.
A modernidade chega definitivamente à vida
social.
Desde a madrugada de 14 de julho de 1789, uma terça-feira,
pelo menos 8 mil parisienses irados estavam reunidos na
esplanada dos Inválidos. Eles queriam armas para enfrentar os
soldados que, acreditavam, o rei Luís XVI estava mandando de
Versalhes. O administrador não sabia o que fazer. A multidão,
então, arrombou os portões e se apoderou de 40 mil fuzis e
doze canhões. Mas e a pólvora para eles? Estava na formidável
fortaleza da Bastilha, transformada em depósito e prisão. Para
lá correram todos, em busca de munição. Quem teria, naquele
momento, pensado em se apoderar daquela fortaleza
inexpugnável?
Pois antes do anoitecer a fortaleza caiu e com ela veio abaixo
todo o Antigo Regime, representado na figura do rei e em sua
corte de aristocratas inúteis. A multidão que cercou a Bastilha
era muito maior que os 8 mil reunidos de madrugada na praça
dos Inválidos. Mas, conforme cuidadoso recenseamento feito
depois pela Assembléia Nacional, os "vencedores da Bastilha"
foram não mais que oitocentos, registrados e cadastrados, com
nome, endereço e profissão.
Em dois dias, construíram-se 50 mil
lanças para a milícia
“Quando um povo é obrigado a
obedecer e o faz, age acertadamente;
assim que pode sacudir esse jugo e o
faz,
age
melhor
ainda,
porque,
recuperando a liberdade pelo mesmo
direito por que lha arrebataram, ou tem
ele o direito de retoma-la ou não
tinham o direito de subtraí-la.”
Jean-Jacques Rousseau, filósofo francês,
1712-1778
Números
Em 1789, a população da França
alcança 25 milhões de habitantes,
sendo 20 milhões de camponeses. A
nobreza constitui 1,5% da população
total. Paris conta com 500 000
habitantes, dos quais 110 000 são
indigentes.
Assim, pode-se saber, com segurança, que entre eles
estavam alguns raros burgueses (três industriais, quatro
comerciantes, um cervejeiro), muitos pequenos produtores
independentes, artesãos, oficiais de corporação, militares em
profusão. Um terço, pelo menos, era de assalariados da manufatura e da construção. O mais jovem tinha 8 anos. Uma única
mulher, uma lavadeira, impedira com sua presença que a queda
da Bastilha entrasse para a História como uma aventura vivida
apenas pelos homens.
A multidão estava inquieta desde o dia 12, quando a
demissão do ministro das Finanças, Jacques Necker, foi recebida como prenúncio de que o pão se tornaria mais raro e
mais caro. Foi formada uma milícia cidadã para defender a
cidade, cujo objetivo era também defender os burgueses
proprietários contra os ataques do rei e contra as ameaças das
classes julgadas perigosas — os trabalhadores e os miseráveis.
De saída, a milícia alistou 48 mil voluntários. Como não havia
armas, ordenou-se a construção de lanças — e 50 mil ficaram
prontas em dois dias.
As reuniões sucediam-se, e havia sempre alguém propondo o
recurso à força. "As armas, às armas, cidadãos", era o que mais
se ouvia nos comícios. No Palais-Royal, espécie de território
livre onde tudo se podia dizer, Camila Desmoulins, orador gago
que empolgava como ninguém a multidão inquieta, tentava
ordenar o caos. Por sua sugestão, adotou-se o verde com
emblema. A multidão desfilou pelas ruas, praticamente engoliu
as tropas que tentaram detê-la. As barreiras que simbolizavam
a cobrança de impostos foram destruídas; suspeitos de serem
açambarcadores (entre estes o convento de Saint-Lazare)
foram atacados.
Assim, a multidão que na manhã do dia 14 correu para a
Bastilha não tinha quem a enfrentasse, a não ser a obstinação
do administrador da fortaleza, De Launay, que recusou todos os
apelos (inclusive de quatro comissões enviadas pela Prefeitura)
para que entregasse a munição. O primeiro disparo aconteceu
por volta de 13 horas. Os mais valentes romperam as correntes
da ponte levadiça, que caiu. O pátio da administração foi
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invadido, mas ali os revoltosos ficaram expostos.
“Nobres, vós sois o flagelo da
sociedade, como sois também o inimigo
da Pátria. Vossos exemplos e vossa
moral levaram os costumes a um grau
de corrupção nunca antes atingido.
Para satisfazer, não vossas paixões,
mas
vossas
fantasias,
vós
os
transgredistes ao ponto de vos permitir
comportamentos cujo preço é o
cadafalso.”
Panfleto anônimo, igual a milhares de
outros em circulação, acusando a nobreza de
corrupção, amoralidade, decadência.
Os sans-culottes são os
novos personagens
da cena política.
Sem os “culottes” e
os perfumes dos
nobres, eles são os
amigos
da
Revolução:
humildes artesãos,
empregados
pobres
do
“fauborg”, usam a
lança, o sabre e o
fuzil para livrar a
Revolução
dos
seus inimigos e
exigir
a
verdadeira
igualdade
entre
os cidadãos.
Números
No início da Revolução, a posse útil da
terra
na
França
estava
assim
distribuída: 45%, camponeses; 20%,
burguesia; 35%, nobreza e clero.
Porém, em razão dos direitos feudais, a
aristocracia
detém
a
propriedade
senhorial de 97% sobre todas as terras.
A Bastilha não era um inferno; a vida
dos presos era bem boa
Às 15:30h chegou um reforço providencial: o chefe da
lavanderia da rainha Maria Antonieta, um certo Hulin, reunira
36 granadeiros, 21 fuzileiros, 400 cidadãos armados e alguns
canhões e comandou o primeiro ataque organizado à fortaleza.
De Launay ainda pensou em atear fogo ao depósito de pólvora
e mandar tudo pelos ares. Foi impedido por seus próprios
soldados, que preferiram capitular e passar para o lado da
Revolução. Os invasores então entraram de uma vez, desarmaram os soldados, saquearam tudo, apoderaram-se da
pólvora e libertaram os prisioneiros. Estes eram apenas sete:
quatro falsários, dois loucos e um filho de família rica que
desonrara seu nome. Definitivamente, a Bastilha não era o
inferno criado pela imaginação popular, onde se jogavam os
inimigos do rei para morrer em meio a terríveis sofrimentos. Na
verdade, quem podia pagar contava ali com uma vida bem
razoável, com direito a boa comida, bebida e até criados.
Uma prévia do que viria a ser a violência revolucionária foi
encenada com o pobre De Launay. Na praça da Prefeitura ele
foi agredido, recebeu um golpe de baioneta, um tiro e teve a
cabeça cortada, porque a multidão queria vê-la. Contra todos os
prognósticos, o movimento começava a andar fora dos trilhos.
Apenas dois anos antes, em 1787, o pavio da mais clássica das
revoluções burguesas, a Revolução Francesa, fora aceso por
mãos nobres. Em outros tempos, tudo não passaria de um
levante palaciano; no final do século XVIII, porém, a rebelião
da nobreza foi o sinal esperado por outro protagonista
poderoso, a burguesia, para subir ao palco da História. O período inicial da Revolução Francesa, que vai de 1787 a 1791, é
a crônica desse esforço da burguesia para passar à frente dos
atores antigos.
As finanças reais estavam combalidas há muito tempo, mas
nos dez anos anteriores haviam chegado à beira da bancarrota
porque o governo francês empenhou-se em ajudar os Estados
Unidos na luta pela independência.
O governo estava falido. Então, pensou
em taxar clero e nobreza
O relatório financeiro de março de 1788 mostrava que as
despesas somavam 629 milhões de libras, mas a receita
alcançava apenas 503 milhões. Só os juros da dívida pública,
ampliada pela guerra, devoravam 318 milhões de libras. Mais
da metade dos gastos, que se agravavam ainda com a
necessidade de abastecer o luxo da nobreza, na corte, com
supérfluos de toda ordem. O governo precisava aumentar sua
receita, mas sabia que não era possível lançar nenhum novo
imposto sobre a massa da população, já exaurida. Pensou,
então, em acabar com os privilégios do clero e da nobreza, que
não pagavam nenhum imposto, embora fossem grandes proprietários. A França tinha então pouco mais de 25 milhões de
habitantes, dos quais 80 por cento eram camponeses. Os 20
por cento restantes amontoavam-se precariamente em
povoações que mal chegavam aos 2 mil habitantes.
Paris, com 650 mil, era uma exceção — e uma das maiores
cidades do mundo. Todas as outras eram modestas, pelos
padrões modernos Lyon tinha 135 mil habitantes; Marselha, 90
mil; Bordéus, 84 mil; Nantes, 57 mil. Essa sociedade estava
dividida em estados, a forma feudal de estratificação social, em
que cada classe tinha seus estatutos, privilégios, obrigações e
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Brasil
É enforcado no Rio de Janeiro, a 21 de
abril de 1789, Joaquim José da Silva
Xavier, o Tiradentes. Único condenado
à morte entre os participantes da
Inconfidência Mineira, revolta contra a
dominação
portuguesa,
fortemente
influenciada pelas idéias francesas,
pelas “luzes” do século XVIII.
modo de vida definidos legalmente.
O Primeiro Estado era formado pelo clero, mais ou menos 1
por cento da população. Estava dividido em clero superior,
formado pelos bispos, arcebispos e cardeais, tinha vida
faustosa, como a nobreza, e possuía cerca de 20 por cento de
todas as terras do país. O baixo clero, ao contrário, embora
partilhasse dos privilégios do seu estado (por exemplo, não
pagar impostos), era formado por padres muitas vezes tão
pobres quanto seus paroquianos.
O Segundo Estado era formado pela nobreza, dividida em
nobreza de espada, tradicional e orgulhosa de linhagens que
remontavam muitas vezes à alta Idade Média, e nobreza
togada, formada por plebeus enriquecidos, que compraram
títulos de nobreza, e seus descendentes. Compreendia 2 por
cento da população, algo entre 250 e 400 mil pessoas.
Apropriava-se de um terço de todas as rendas do país e tinha o
monopólio dos mais altos cargos do Judiciário, da burocracia, do
clero e do Exército.
Os burgueses tinham dinheiro e sonhavam
conquistar o poder
Mais de 40 000 “Cahiers de
doléances”
foram
escritos
na
campanha eleitoral para os Estados
Gerais,
como
todo
tipo
de
reivindicações, como esta: “Que o
Terceiro Estado seja representado nos
Estados
Gerais
por
deputados
escolhidos por sua ordem”.
O Terceiro Estado compreendia, formalmente, todo o
restante da população, mas sua facção mais destacada era a
burguesia, uma classe economicamente poderosa. Apesar de
participar do poder, mediante a compra de cargos e títulos,
seus negócios eram tolhidos pela existência de aduanas internas e pedágios, que impediam e oneravam a circulação de
mercadorias dentro do país. Ressentia-se, ainda, da existência
de companhias comerciais monopolistas, controladas pelo
Estado, que dificultavam sua participação no comércio externo,
de um lado; e de outro havia as limitações corporativas à
liberdade de trabalho que impediam a livre contratação de
trabalhadores. As camadas inferiores do terceiro estado eram
formadas pela plebe das cidades, um conjunto de artesãos,
operários, pequenos comerciantes e pequenos empresários.
Eram os sans-culottes, que teriam, mais tarde, um papel
decisivo na Revolução, da qual seriam, segundo o historiador
inglês Eric Hobsbawn, "a principal força de choque". Ao seu lado
acumulava-se, principalmente em Paris, uma formidável e
explosiva massa de miseráveis.
Os camponeses formavam a classe mais numerosa e eram a
base da sociedade francesa. A pobreza, entre eles, era
generalizada, atingindo níveis dramáticos. O historiador
Georges Lefebvre calcula que 10 por cento deles mendigavam,
durante o ano todo, de propriedade em propriedade. Eram
oprimidos, ainda, por mais de trezentas obrigações feudais que
tolhiam completamente sua liberdade.
Na metade do século XVIII, reforçou-se o direito exclusivo da
nobreza aos altos cargos da administração e do Exército. A
restrição pareceu intolerável ao Terceiro Estado —e foi um erro
fatal cometido pelo rei Luís XVI.
A nobreza quis convocar os Estados Gerais.
Suicidou-se
Essa combinação de miséria popular e conflito entre os
privilégios aristocráticos e os interesses da burguesia tornou-se
explosiva quando combinada com a crise financeira da
monarquia. Em 1787, o rei tentou criar um imposto a ser pago
pela nobreza, que reagiu bravamente a esse ataque a seus
privilégios. Foi convocada uma Assembléia de Notáveis,
formado por representantes da aristocracia e do clero, os dois
primeiros estados que desfrutavam as mesmas prerrogativas, e
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“Primeiramente um cavalo deve ser
escovado dez vezes com a almofaça de
ferro e somente então podeis vós
limpá-lo com a escova macia. Terei de
escovar-vos com violência, e quem
sabe se chegarei jamais à escova
macia.”
De um proprietário de terras russo a seus
servos, em 1780.
ela decidiu que só a nação inteira, representada nos Estados
Gerais, poderia criar novos impostos.
O rei fez de tudo para revogar a decisão — prendeu
parlamentares, exilou outros tantos — em vão. A rebelião
cresceu e a nobreza ameaçada tornou-se porta-voz de uma
nação que já não tolerava o poder real absoluto. Em julho de
1788, isolado e pressionado de todos os lados, o governo
capitulou e aceitou convocar os Estados Gerais para 1º de maio
de 1789.
Para infelicidade de Luís XVI, os debates e a exigência de
mudanças já tinham ido tão longe que, inadvertida-mente, ele
próprio levou o movimento reformista a um novo andamento ao
convocar os Estados Gerais. Os deputados deviam ser eleitos
em assembléias distritais, em todas as regiões da França;
assim, a crise econômica, que desencadeou a crise política, passou a ser discutida por toda a nação em uma campanha
eleitoral cujo tom era a denúncia do absolutismo. Formou-se
então o Partido Nacional, uma frente contra a monarquia
absolutista, que desejava implantar na França um regime
monárquico à moda inglesa, regulado por uma Constituição.
Sua organização foi eficaz, e seu comitê central, a Sociedade
dos Trinta, reuniu-se desde outubro de 1788 em Paris,
congregando homens unidos pela mesma vontade de mudança,
como o abade Emmanuel-Joseph Sieyès; Georges-Jacques
Danton; marquês de La Fayette; François VI, duque de La
Rochefoucauld; Marie-Jean-Antoine-Nicolas de Caritat, marquês
de Condorcet; Jacques-Pierre Brissot de Waiville; Adrien-JeanFrançois Duport; e Honoré-Gabriel Rigueti, conde de Mirabeau.
Com a Assembléia Nacional, o poder começou
a trocar de mãos
Educação pública
O Marquês de Condorcet defende na
Assembléia seu projeto de “uma escola
universal, para meninos e meninas,
leiga e gratuita, capaz de respeitar a
liberdade individual e estimular os
talentos”.
No dia 5 de maio de 1789, em sessão solene com a presença
do rei, foram abertos os Estados Gerais. Na sala de cerimônias,
em Versalhes — o palácio que Luís XIV, o avô de Luís XVI,
também chamado Rei Sol, construíra fora de Paris —, o clero e
a nobreza ocuparam seus lugares, à direita e à esquerda do rei.
Para enfatizar a posição subalterna do Terceiro Estado, seus
representantes foram amontoados em banquetas, separados
das ordens privilegiadas por uma barreira. Luís XVI advertiu
contra o "desejo exagerado de inovação". Inutilmente; abria-se
ali o cenário do segundo ato do drama revolucionário.
Um novo tema logo somou-se ao debate: os critérios de
votação. Havia uma tendência clara de rejeição da forma
tradicional de votação, como a adotada até a última vez que os
Estados Gerais foram convocados, em 1614: um voto para cada
estado. A nobreza e o clero insistiam no critério antigo que
favorecia sua posição. O terceiro estado — que representava 95
por cento da nação — exigiu por sua vez o voto por cabeça, que
daria posição de destaque à massa da orquestra política.
Era o impasse: a nobreza e o clero queriam uma assembléia
com poderes limitados, enquanto a burguesia queria
transformá-la em Assembléia Nacional para escrever uma
Constituição e impor limites ao poder do rei. Assim, decidiu
tocar música própria e transformou os Estados Gerais em
Assembléia Nacional, em 15 de junho de 1789, para a qual
convocou solene-mente os deputados dos estados privilegiados.
Era a rebelião aberta contra a autoridade real.
O círculo íntimo dos colaboradores do rei aconselhou-o a
tornar medidas de força, mas dividia-se quanto ao que fazer em
seguida. 0 ministro Jacques Necker, um reformista da corte,
recomendava algumas concessões para atrair a Assembléia
Nacional.
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A burguesia tomou o poder em Paris. E
os soldados aderiram
Composto por Rouget de Lisle em abril
de 1792, o hino dos marselheses
tornou-se rapidamente o hino da
Revolução.
No outro extremo, o irmão do rei, que seria rei ele próprio
com o nome de Carlos X, um "duro" apoiado pela rainha Maria
Antonieta, defendia pura e simplesmente o restabelecimento do
Antigo Regime. Temeroso de uma guerra civil de conseqüências
imprevisíveis, o governo tergiversou e, sem fechar oficialmente
a Assembléia, criou obstáculos para sua reunião. A sala das
sessões foi fechada a pretexto de reformas. Os parlamentares
refugiaram-se no salão do jogo de péia (uma espécie de
squash) e juraram manterem-se reunidos até darem uma Constituição à França. O repto estava lançado, e começava a surtir
efeito: 150 padres e três bispos uniram-se a eles.
Luís XVI tentou, por sua vez, restaurar sua autoridade e
cercado de tropas, cassou todas as prerrogativas da
Assembléia. Mas esta não se submeteu e, num clímax heróico,
Mirabeau recebeu o marquês de Brézé (enviado por Luís XVI
para impor sua vontade), deixando claro o ânimo de seus companheiros: "Se está aqui para nos fazer sair, deve pedir ordens
para usar a força, pois só deixaremos nossos postos pela força
das baionetas”.
A decisão da Assembléia de manter-se reunida até escrever
uma Constituição espelhava o ânimo da própria nação. Apenas
dois dias depois da bravata real, a burguesia parisiense erigiu
uma autoridade cidadã em Paris, tomando o poder municipal à
revelia do rei. Uma milícia burguesa foi formada (chamada mais
tarde de Guarda Nacional, sob o comando de La Fayette),
enquanto os soldados do rei desertavam de forma crescente,
unindo-se aos rebeldes e colocando-se ao serviço da
Assembléia Nacional. Em Versalhes, uma facção da nobreza
abandonou o rei e seus pares e uniu-se à Assembléia. No dia
27, o rei teve de ceder: por ordem sua, todos os estados
privilegiados juntaram-se à Assembléia que, agora, estava
completa e podia executar a peça que a França queria ouvir.
Em 7 de julho, a Assembléia se proclamou Constituinte.
A conspiração contra a liberdade, porém, prosseguia. Luís
XVI mandou cercar Paris e Versalhes com dez regimentos
comandados pelo marechal François-Marie de Broglie, um
brutamontes, capaz de massacrar sem remorsos à primeira
ordem.
O rei demitiu o ministério de Necker.
E tudo veio abaixo
A Constituição do Ano I
A primeira Constituição da República
avança no sentido da democratização
política (sufrágio universal masculino) e
de uma igualdade social mais efetiva,
estabelecendo o bem comum como
objetivo da sociedade e destinando os
recursos públicos, prioritariamente, ao
atendimento dos cidadãos mais pobres.
No dia 11 de julho, Necker e os ministros que o apoiavam
foram demitidos, e formou-se um governo de revanche, cuja
estrela era justamente de Broglie. Aceso o estopim, a explosão
tomou-se inevitável. A intransigência real ruiu junto com a
Bastilha assaltada pela plebe. Vencido, Luís XVI dispensou as
tropas, demitiu o ministério da revanche no dia 16 e chamou
Necker para reorganizar o governo. Depois foi para Paris,
acompanhado apenas por quatro pessoas e escoltado pela guarda militar burguesa de Versalhes. Na prefeitura, o rei não teve
saída a não ser receber, das mãos do prefeito, o distintivo
tricolor da Assembléia, símbolo de sua submissão à vontade do
povo em armas.
A queda da Bastilha foi o sinal para a revolução municipal na
França, que fez repetir em todo país o que acontecera em Paris:
as cidades instalaram novas autoridades, seguindo o modelo da
capital. Ao mesmo tempo, a insurreição camponesa acentuouse. O "Grande Medo", de julho e agosto de 1789, varreu na
prática os privilégios feudais que a Assembléia vacilava em
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O Diretório e a religião
“A religião romana será sempre inimiga
irreconciliável da República”. Era o que
diziam os “Diretores” a Bonaparte na
Itália, recomendando-lhe “destruir, se
possível, o centro de unidade da Igreja
romana”.
“Chegou a hora da igualdade passar a
foice por todas as cabeças. Portanto,
legisladores, vamos colocar o terror na
ordem do dia!”
Robespierre,
5/9/1793
em
discurso
à
Convenção,
Números
Nos onze meses de atividade da
ditadura jacobina, pelo menos 300 mil
pessoas foram levadas aos tribunais da
Revolução. Destas, 17 mil foram
guilhotinadas e 25 mil executadas
sumariamente, na grande maioria
rebeldes ligados à contra-revolução na
Vendéia e no vale do Rhône.
abolir. Combinada com a revolução municipal, a insurreição
camponesa teve um efeito arrasador. 0 historiador inglês Eric J.
Hobsbawm diz que "ao cabo de três semanas, desde 14 de
julho, a estrutura social do feudalismo francês e a máquina
estatal da monarquia francesa jaziam em pedaços".
Durante dois anos, de 1789 a 1791, a revolução foi
comandada pela ala mais moderada da burguesia, os girondinos. Seu domínio baseava-se, primeiro, no esforço para
conter a radicalização popular e, depois, na tentativa de
estabelecer uma compromisso com o rei e a aristocracia. Após a
queda da Bastilha, em algumas regiões, principalmente na
Alsácia, a burguesia cooperou sem reservas com a aristocracia
na repressão aos levantes camponeses.
Nasceu, enfim, a Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão
Quanto ao rei, depois de 14 de julho discutiu-se qual seria o
poder legislativo que a Constituição lhe reservaria. Depois de
muitos debates, a Assembléia Constituinte decidiu, em 11 de
setembro, dar ao monarca o direito de vetar pura e
simplesmente as leis votadas no Legislativo. Os direitos feudais
foram formalmente abolidos em 4 de agosto de 1789, mas só
no ano seguinte foi decretado o fim da nobreza hereditária.
O programa político e social da burguesia foi solenemente
registrado na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
redigida por La Fayette e adotada em 26 de agosto de 1789.
Finalmente, a burguesia impôs também um respeito irrestrito à
propriedade privada. Aprovou uma lei que proibia a formação
de sindicatos de trabalhadores e as greves. Restringiu
severamente a participação popular, ao fixar na Constituição de
setembro de 1791 as categorias de "cidadãos ativos" (os
proprietários), que tinham plenos direitos políticos, e os
"cidadãos passivos", sem direito de voto.
A secularização do Estado completou a obra da burguesia.
Parte fundamental da reforma política e administrativa, a
separação entre a Igreja e o Estado traçou uma linha precisa de
demarcação entre as jurisdições dessas duas instituições A
Igreja (e a religião em geral) ficou limitada à administração do
reino dos céus. O mundo dos homens, por seu lado, tornou-se
claramente atribuição dos próprios homens, de seus interesses
e conflitos. A fonte principal da soberania política desceu dos
céus para a terra, e a base do direito divino, que legitimava o
poder absoluto do rei, já não servia mais nem para garantir os
privilégios ao clero Em 2 de novembro de 1789 seus bens foram
colocados à venda, em março de 1790, o próprio clero regular
foi suprimido. sendo reorganizado em julho com a promulgação
da Constituição Civil do Clero. Com isso, a Igreja da França
tornou-se nacional, afastando-se do papa.
A Constituição adotada em 1791 consagrou o domínio da
burguesia moderada.
Os jacobinos radicalizaram e as cabeças
nobres começam a rolar
A nobreza fora derrotada em larga medida, mas o impasse
provocado pela insatisfação popular e peia conspiração contrarevolucionaria era visível. A multidão radicalizada liderada por
uma facção revoluciona-ria da burguesia — os jacobinos —
exigia a punição aos contra-revolucionários que agiam sob a
proteção do rei o fim da monarquia e a implantação da
república. Subiam ao comando do movimento os radicais
Maximilien-François-Marie-Isadore de Robespierre e GeorgesJacques Danton
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Brasil
Irrompe, na Bahia, um movimento de
revolta contra o domínio português. É a
Revolta
dos
alfaiates,
liberal,
republicana, ligada à maçonaria, que,
com apoio de negros e mulatos, pede
“liberdade”,
“igualdade”,
“trabalho
livre” etc.
Na primeira fase da Revolução Francesa, a velha ordem do
Ancien Régime foi fortemente abalada, e inauguram-se as
primeiras instituições da ordem burguesa. Havia, porém, muitas
forças e heranças do passado a serem destruídas. Essa tarefa
histórica de destruição escapou das mãos da burguesa funcionando até mesmo contra os interesses dela, a segunda fase ao
drama revolucionário, atingindo o auge no chamado Terror,
trouxe ao primeiro plano da cena atores muito mais radicais,
vindos das camadas mais baixas da sociedade Sem eles a Revolução naufragaria.
Desde abril de 1792, os regimes absolutistas e aristocráticos
da Europa Ocidental e Central se coligaram para derrotar a
Revolução. Reunidos na Declaração de Pillnitz, Áustria e Prússia
capitanearam a aliança contra-revolucionária. Luís XVI via a
guerra com simpatia porque sabia que os exércitos dos
absolutistas vinham em seu favor, e que era aparentemente
inevitável a derrota do exército francês, mal-equipado e
desorganizado. Essa derrota lhe permitiria reconquistar o
comando nacional. Os deputados favoráveis à guerra eram os
girondinos, que agiam contra o rei mas favoreciam os desejos
econômicos da grande burguesia mercantil.
Os generais faziam corpo mole e o inimigo
ameaçava as fronteiras
“A Revolução provavelmente teria
ocorrido sem os filósofos. Mas ele
provavelmente constituíram a diferença
entre um simples colapso de um velho
regime e a sua substituição rápida e
efetiva por um novo.”
Eric J.
inglês
Hobsbawm,
1917-,
historiador
Para estes grandes mercadores, os fornecimentos aos
exércitos eram sempre uma fonte considerável de lucro e ao
mesmo tempo era bom tentar derrotar a contra-revolução que
vinha de fora das fronteiras, para manter o fervor patriótico e o
comando político sobre a multidão ameaçadora. A previsível
derrota francesa se tez sentir logo nos primeiros combates, que
levaram os exércitos prussiano e austríaco a ameaçar
rapidamente as fronteiras nacionais. Instaurou-se uma
verdadeira crise. A pátria estava em perigo, e os deputados
mais radicais, como Robespierre, não vacilaram em denunciar a
traição do rei e a negligência dos generais e oficiais aristocratas. Ficava claro que as massas populares, cada vez mais
presentes no cenário político, precisavam ser mobilizadas para
a guerra.
As tensões sociais se aguçavam. A inflação, dificultando a
vida dos pobres, exigia planos radicais, como o proposto em
maio de 1792, de condenar à morte os açambarcadores e
especuladores de gêneros. Um fantasma passou a rondar a
tranqüilidade da burguesia: a proposta de uma "lei agrária" que
visava a dividir as propriedades.
A Gironda queria voluntários para a guerra, mas os
voluntários do povo parisiense, os sans-culottes, queriam que
os ricos pagassem mais impostos e taxas para o esforço bélico.
Queriam, também, sob a influência da Montanha, a execução de
um igualitarismo um tanto difuso, em que todos os que
desfrutassem de privilégios fossem identificados como "inimigos
do povo" e em seguida como "inimigos da pátria", e, nesse
turbilhão, fossem punidos por uma justiça revolucionária que
vinha das ruas ao som dos gritos dos militantes mais
inflamados.
O calor do mês de julho em Paris cresceu no dia 25, quando
chegou o ultimato do duque prussiano de Brunswick. A frente
das tropas absolutistas estrangeiras, ele ameaçava levar Paris à
"ruína total", caso Luís XVI e sua família fossem molestados, e
condenava à morte os cidadãos franceses que ousassem
defender a capital ou o país. Na agitação reinante, o ultimato foi
contraproducente: ao invés de medo, provocou uma arregimentação jamais vista de voluntários.
CLIO História – Textos e Documentos
Ao som da Marselhesa, toda a família real
foi aprisionada
Personagens
BABEUF, Gr. (1760-97) - Jacobino,
rador de Marat, defendeu a reforma
baseada na propriedade coletiva da
preso na Conspiração dos Iguais, em
foi julgado e executado em 1797.
admisocial
terra;
1796,
BARRAS (1755-1829) – Deputado na
Convenção, conspirou contra Robespierre;
como membro do Diretório, em 1796, teve
grande participação na ascensão militar e
política de Napoleão Bonaparte.
BONAPARTE (1769-1821) - Depois do jacobinismo inicial, enquadra-se na reação
thermidoriana: no comando do Exército da
Itália, faz carreira brilhante e rápida,
tornando-se o general-chave do 18 Brumário
de 1799.
BRISSOT (1754-93) - Um dos líderes
girondinos na Assembléia Legislativa e na
Convenção: partidário das ações de guerra;
executado no Terror. 1793.
CARNOT (1753-1823) – Deputado na
Assembléia Legislativa e na Convenção,
membro do Comitê de Salvação Pública,
abandona e conspira contra Robespierre,
atua no Diretório e participa da ascensão de
Bonaparte.
DANTON (1759-94) - Advogado, um dos
fundadores do Clube dos Cordellers,
participa da Comuna insurrecional de 1792 e
é eleito para a Convenção; "indulgente",
adversário de Robespierre, é executado em
1794.
DESMOULINS (1760-94) - Jornalista e
orador, do grupo cordelier, teve grande
participação no início da Revolução; crítico
do Terror de Robespierre, defendendo as
posições dos "indulgentes", é executado em'
1794.
FOUCHÉ
(1759-1820)
–
Jacobino,
convencional, chefe da repressão aos
realistas de Lyon, é preso em 1795 e
anistiado por influência de Barras; como
Ministro da Polícia, conspira para o 18 de
Brumário de 1799.
FOUQUIER-TINVILLE
(1746-95)
O
grande promotor público do Tribunal Revolucionário; após 69 Thermidor, é preso e executado em 1795.
HÉBERT (1757-94) - Jornalista, cordelier,
porta-voz dos "sans-culottes" no seu Père
Duchêsne, critica o Terror de Robespierre
por ser moderado; é executado em 1794,
junto com os Raivosos.
HOCHE (1768-1797) - Jovem e brilhante
O comando político dessa arregimentação passou para a
Comuna de Paris, organização representativa municipal da
cidade, fortemente influenciada pelos radicais. Dispostos 3
destruir os "traidores" da pátria, os membros da Comuna e seus
adeptos sans-culottes atacaram o palácio das Tulherias,
prendendo o rei e sua família, com o apoio discreto da Guarda
Nacional, na noite de 9 de agosto de 1792. A monarquia estava
destruída na prática, e o fervor revolucionário dos sans-culottes
parisienses misturou-se ao de um grupo de voluntários vindos
de Marselha e da Bretanha, tangidos peio cântico arrebatador
da Marselhesa, hino composto por Rouget de Lisle capaz de
galvanizar a multidão aos gritos de "Às armas, cidadãos".
A Marselhesa tornou-se o hino oficial da França: mas naquele
momento o seu cântico despertou o medo na grande burguesia
da Assembléia e em seus seguidores. Destruída a monarquia, e
enquanto não se processava uma nova direção política na Assembléia, a sans-culotterie e os "marselheses'' tomaram conta
do panorama parisiense. Na verdade, outros li-deres se
destacavam no cenário, mais ligados à pequena burguesia dos
artesanatos e pequenos negócios. Como Marat, o redator de 0
Amigo do Povo, que durante os três primeiros anos da
Revolução inflamou Paris com sua pregação de liberdade e
igualdade, e logo após as façanhas de 10 de agosto estimulou a
criação do Comitê de Vigilância da Comuna de Paris O Comitê
era assistido politicamente por Billaud-Varennes e Collot
d'Herbois, que se destacariam posteriormente como ativos
membros do poder jacobino radical.
Na manhã de 29 de agosto, começou a caça aos "inimigos da
Revolução", que se contavam aos milhares, pois a
arbitrariedade do poder revolucionário, diluída no meio da
multidão parisiense, não via limites para a escolha dos traidores
de momento: podiam ser tanto os agentes da aristocracia
quanto os clérigos desavisados, tanto os nobres renitentes e
contra-revolucionários quanto os cidadãos que não tomassem
posição clara a favor da Revolução.
A Convenção derruba a monarquia e instala
o poder republicano
Presos em grande quantidade, uma vasta gama de suspeitos
lotava as prisões. Durante quatro dias, a partir de 2 de
setembro, grupos exaltados de revolucionários, na sua maioria
da sans-culotterie, invadiram as celas, com a aparente complacência do recém-nomeado ministro da Justiça, o jacobino
Danton. As primeiras vítimas dos chamados "massacres de
setembro" foram os padres: já na tarde do dia 2, 24 que estavam presos na abadia de Saint-Germain-des-Près foram
arrastados para a rua e abatidos a golpes de sabre. 0 ódio
anticlerical estendeu a violência ao convento do Carmo, onde
foram organizados julgamentos sumários, Foram mortas cerca
de 1 300 pessoas em quatro dias.
Esse “primeiro Terror” teve uma importante conseqüência
política. Destituindo o rei em 10 de agosto, a Assembléia havia
convocado eleições para um novo organismo político, a
Convenção republicana. Aterrorizados com o clima de
perseguições, os realistas e os adeptos da moderação
constitucional fugiram das urnas. Instalada em 20 de setembro
a Convenção resultante das eleições apresentou uma
esmagadora maioria de militantes da burguesia revolucionaria.
Estava instalada a República, e o fervor revolucionário levou
até a criar um novo calendário para ser aplicado no Ano 1 da
CLIO História – Textos e Documentos
general, pacificou a Vendéia e comandou o
Exército do Mosela; morreu no front como
fervoroso defensor da República, mas
descrente dos dirigentes políticos.
LA FAYETTE (1757-1834) - Herói da guerra
de independência dos EUA, defensor da monarquia constitucional, emigra após a prisão
do Rei e só volta à França e à vida política
com o Consulado.
MARAT (1743-93) - Médico, jornalista, publica O Amigo do Povo; eleito à Convenção
pelos "sans-culottes", defende a revolução
social e condena a guerra; é assassinado por
Charlotte Corday, em 1793.
MIRABEAU (1749-91) - Membro da nobreza
provincial, é eleito pelo Terceiro Estado para
os Estados Gerais; figura central da Constituinte,
defensor
da
Monarquia
constitucional.
NECKER (1732-04) - Banqueiro, ministro de
Luís XVI, muito popular por causa do seu
programa
de
reformas
econômicofinanceiros; retira-se da vida pública logo no
começo da Revolução.
ROBESPIERRE (1758-94) - Advogado,
deputado na Constituinte e depois eleito
para a Convenção; fundador do Clube dos
jacobinos, dominou o Comitê da Salvação
Pública e impôs o Terror, do qual acabou
vítima em 1794.
ROLAND, Madame (1754-93) - Seu salão,
em Paris, era um círculo das "luzes", onde se
liam e discutiam Rousseau, Voltaire e os
enciclopedistas; suas fortes ligações com os
Girondinos levaram-se à prisão e à morte,
em 1793.
ROUX (1752-94) - O "padre vermelho",
expulso do Clube dos Cordeliers, é acusado
por Robespierre de incitar o povo contra a
Convenção; preso, suicida-se, isolando e
enfraquecendo ainda mais os Raivosos.
SAINT-JUST (1767-94) - O mais jovem
convencional, teórico e partidário da política
do Terror de Robespierre no Comitê da
Salvação Pública, com ele foi preso e
guilhotinado no 9 do Thermidor de 1794.
SIEYÈS (1748-36) - Depois de publicar 0
que é o Terceiro Estado? foi eleito para a
Constituinte e para a Convenção; no
Diretório, conspirou para o golpe do 18
Brumário, sendo Cônsul por algum tempo.
VERGNIAUD (1753-93) - Advogado, deputado na Assembléia Legislativa e na
Convenção. foi um dos principais chefes
girondinos, defendendo o federalismo e o
poder constituído contra as Comunas; preso
e executado em 1793.
nova era. Os girondinos da grande burguesia tinham a bancada
majoritária da Convenção e pretendiam limitar o radicalismo
revolucionário emergente. Para isso os deputados da Gironda,
ricos, elegantes e de boa oratória, procuravam dirigir o ardor da
Revolução para a política externa.
Um sonho realizado: derrotar as tropas
prussianas da reação
Seu líder, Jacques-Pierre Brissot de Warville, repetia sem
parar que o novo regime não podia se limitar a França, e sim
levar sua mensagem a toda a humanidade. Influenciados pela
retórica brilhante de seu teórico, o advogado Pierre-Victurnien
Vergniaud, e inspirados por sua musa, Madame Jeanne-Marie
Roland de La Platiere, os deputados da Gironda fizeram aprovar
uma petição em dezembro de 1792. "A Convenção Nacional
declara, em nome da nação francesa, que outorgará
fraternidade e ajuda a quantos povos queiram recobrar sua
liberdade". Percebiam assim o caráter universalizante do
fenômeno revolucionário e ganharam com isso, para a França, a
adesão de burgueses e intelectuais ilustrados de inúmeros
países.
Essa política deu certo diante da ameaça externa: no dia
mesmo da instalação da Convenção, 20 de setembro, as tropas
francesas recem-recrutadas, fervorosamente revolucionarias,
viraram a situação militar Aos gritos de "Viva a Nação", derrotaram os prussianos na batalha de Vaimy. O gênio do grande
escrito' alemão Johann Wolfgang Goethe o fez perceber, sobre
essa batalha "Neste lugar e neste dia começa uma nova era na
História do mundo”.
Sucessivas vitórias levaram a expulsão das tropas
absolutistas ao território francês, e as torças revolucionárias
ocuparam os Países Baixos austríacos, os territórios da margem
esquerda do Reno bem como a Sardenha. Ocuparam também o
condado de Nice e a Sabóia, onde, espontaneamente, os
simpatizantes da Revolução estimularam a maioria dos
habitantes saboianos a pedir para serem anexados à França.
Entusiasmada, a Convenção estabeleceu a estratégia de levar o
território francês às suas "fronteiras naturais", até o Reno, os
Alpes e os Pirineus.
A reação não se fez esperar: a Inglaterra aliou-se aos
absolutistas, e formou-se no inicio de 1793 uma imensa
coalizão de forças anti-França: além dos ingleses, austríacos e
prussianos, também a Rússia, Portugal, Espanha e muitos
Estados ale-mães e italianos entraram na guerra.
Pela primeira vez todo um país mobilizou-se
para a guerra
A maioria girondina na Convenção percebeu a necessidade de
mobilizar o povo para a guerra. O recrutamento em 1793
atingiu níveis nunca vistos. Como diz o historiador Eric
Hobsbawm, "a jovem República francesa descobriu ou inventou
a guerra total: a total mobilização dos recursos de uma nação
através do recrutamento, do racionamento e de uma economia
de guerra rigidamente controlada, e da virtual abolição, em
casa e no exterior, da distinção entre soldados e civis". Ora, a
maioria do povo, os sans-culottes, se entusiasmava com a
pregação jacobina de que a mobilização total só daria
resultados se acompanhada da punição aos traidores,
aristocratas clérigos, privilegiados e suspeitos de vacilação
diante do inimigo, à testa dos quais se encontrava o rei.
Robespierre capitaneava a pregação pelo extermínio definitivo
dos inimigos internos: à frente da sans-culotterie exaltada,
CLIO História – Textos e Documentos
Glossário
Antigo Regime: ordem social e políticoinstitucional vigente até a Revolução,
monarquia absoluta, sociedade estamental e
direitos feudais.
Assembléia Legislativa (out. 91/agosto
92): substituiu a Assembléia Nacional
Constituinte de 1789; era o órgão do Poder
Legislativo na Constituição de 1791.
Assembléia Nacional Constituinte (jul.
89/set. 91): aprovou a primeira Constituição, de 1791: resultou da revolta dos
deputados do Terceiro Estado contra os
Estados Gerais.
"Assignat": bônus e depois papel-moeda
emitido peio Estado, com base nos bens do
clero,
nacionalizados;
sua
contínua
desvalorização levou-o à extinção em 1796.
Bastilha: velha fortaleza da monarquia,
odiada peia população parisiense por ser
usada como prisão e por ter sido sempre a
grande barreira entre o "faubourg St.
Antoine" e área central da cidade.
18 Brumário (9 de novembro): data do
golpe de Estado que, no final de 1799,
encerrou a Revolução; seu personagem
principal foi o general Napoleão Bonaparte,
que derrubou o Diretório e estabeleceu o
Consulado.
"Cahiers de Doléances": cadernos onde os
eleitores de 1789 foram orientados a
registrar todas as suas reivindicações, a
serem apresentadas aos Estados Gerais por
seus representantes.
Cidadãos ativos: cidadãos com direito de
voto, porque podem pagar um imposto equivalente ao valor de três dias de trabalho.
(Constit. 1791)
Cidadãos passivos: cidadãos que não têm
direito de voto.
Comuna: na tradição medieval, é a municipalidade, o governo autônomo de uma
cidade.
Comuna
insurrecional:
organização
político-militar criada pela população de
Paris no começo da Revolução para
fortalecer e conduzir a participação popular
("sans-culottes") no processo revolucionário.
Constituição Civil do Clero: aprovada em
1790, reformula profundamente as relações
Igreja-Estado, liquidando os antigos privilégios do clero e tornando-o uma instância
da burocracia oficial.
incendiando a opinião com os panfletos de Marat e os discursos
de Saint-Just e Camille Desmoulins, contando com a adesão de
Danton, os jacobinos isolaram politicamente a Gironda e
levaram Luís XVI à guilhotina em 21 de janeiro de 1793.
Tendo a guilhotina como símbolo ameaçador e a mobilização
popular como base, os jacobinos dominaram a política francesa
de 1793 a 1794. Paris jamais viveu tal movimentação do povo
humilde, organizado em seu cotidiano e vivendo uma
vertiginosa sucessão de novos líderes, heróis e até mesmo
deuses, como a deusa Razão. Os girondinos praticamente
desapareceram de cena, acusados de traidores, 29 dos chefes
da Gironda, entre os quais Brissot e Vergniaud, foram
encarcerados em 2 de junho de 1793, e logo depois guilhotinados. Passava a reinar absoluto o poder jacobino. Entre
fevereiro e agosto, a Convenção decretou a mobilização de 300
mil homens para a guerra, culminando com o recruta-mento
obrigatório de todos os solteiros entre 18 e 25 anos Ao mesmo
tempo, até setembro, de 300 a 500 mil pessoas foram presas
como suspeitas. A estrutura política do regime era baseada em
"comitês" escolhidos pela Convenção
O assassinato de Marat incendeia corações.
Instala-se o Terror
O mais importante era o Comitê de Salvação Pública,
dominado por Danton e Robespierre, que, cuidava do exército e
da segurança do Estado. Nele destacou-se também o general
Nicolas-Marguerite Carnot logo depois ministro da Guerra, que
se revelou um grande organizador de um "exército de massa".
Com ele, em setembro de 1793, os ingleses foram derrotados
em Hondschoote e diminuíram a pressão no litoral Derrotando
os austríacos em Wattnigies, os republicanos fizeram recuar a
coalizão inimiga para leste
Ao mesmo tempo, a Queda dos girondinos levou a uma série
de levantes nas províncias francesas contra o governo
revolucionário, dos quais o mais notório foi a rebelião
camponesa da Vendéia. A pressão dos inimigos internos cresceu
mais ainda a partir de julho de 1793, quando uma jovem
provinciana adepta da Gironda, Charlotte Corday, assassinou
Marat.
A indignação popular com o crime contra "o amigo do povo"
aumentou ainda mais a mobilização dos sans-culottes, que
colaboravam diariamente com os julgamentos sumários de
"traidores". No ritmo incessante da guilhotina, o Terror chegou
a executar mais de 17 mil pessoas, se incluirmos as execuções
sumárias e as mortes na prisão, a cifra chega a mais de 35 mil
vitimas. O entusiasmo popular com os julgamentos e
execuções, a tranqüila assistência das senhoras "tricoteiras" aos
golpes fatais da guilhotina na Place de la Concorde têm uma
raiz mais profunda: pela primeira vez na História, as massas
populares tinham vez e presença no cenário político, Pela
primeira vez, mesmo contrariando os interesses da burguesia,
um governo se preocupava em taxar os ricos e tabelar os
preços.
Na vertigem dos fatos de 1793, Robespierre se tornara o
senhor absoluto do todo-poderoso Comitê de Salvação Pública.
Ele encarnara a imagem do igualitarismo radical da fase do
Terror, com as leis sociais ali produzidas.
Robespierre assume o comando com
delirante pregação radical
Mas era representante, acima de tudo, da pequena burguesia
parisiense, que aspirava também a um dia ser burguesa. Não
CLIO História – Textos e Documentos
Convenção (set. 92/out.95): assembléia de
deputados que dirige a República logo após
sua instituição. entre setembro de 1792 e
outubro de 95, eleita por sufrágio universal.
Comitê da Salvação Pública: criado em
abril de 1793, foi o órgão central do governo
revolucionário, durante o Terror.
"Cordeliers": fundado em 1790, tornou-se
um clube político muito próximo das posições dos "sans-culottes" e teve destacada
atuação nas jornadas revolucionárias de
1792 e 93.
Corvéia: um dos mais antigos direitos feudais, consistindo em um certo número de
dias de trabalho que os camponeses deviam
aos senhores.
Diretório: o órgão do Poder Executivo na
Constituição do Ano III, entre 1795 e 99.
Direitos naturais: direitos que os iluministas do século XVIII atribuíam à natureza
humana, portanto naturais e imprescritíveis;
entre
tais
direitos,
apontavam-se
a
liberdade, a igualdade e a propriedade.
Estados Gerais: a assembléia dos representantes das "ordens" no Antigo Regime;
com o Absolutismo, perdeu quase todo seu
poder.
Federação: expressão que identifica e
define a nova organização do país depois da
abolição do Antigo Regime, caracterizada
pela liberdade e soberania da Nação e
autonomia dos departamentos que a
compõem.
Federalistas: expressão usada para apontar e acusar os Girondinos que defendiam a
supremacia
da
Convenção,
enquanto
assembléia dos representantes eleitos em
todo país, sobre o poder crescente das
comunas, principalmente a Comuna de Paris.
"Feuillants": rompendo com os Jacobinos,
os monarquistas constitucionais, liderados
por La Fayette e Barnave, fundam novo
clube, que não resiste, porém, às jornadas
revolucionárias de 1792.
Girondinos: grupo de deputados convencionais, liderados por representantes da
região da Gironda, partidários da Revolução
e da República, mas com posições bem mais
moderadas
do
que
os
Jacobinos,
especialmente quanto ao papel das massas
populares no movimento revolucionário.
Governo revolucionário: a estrutura
montada entre 1792 e 94, no período da
revolução democrática, centrada no Comitê
da
Salvação
Pública,
no
Tribunal
Revolucionário e nos comitês revolucionários
das comunas.
Grande Terror: período de maior radicalização da política jacobina do Terror (10
de junho a 27 de julho de 1794).
podia portanto permitir que os ideais de "liberdade, igualdade e
fraternidade" chegassem, nas mãos dos sans-culottes mais
pobres, despossuídos, operários, a pôr em xeque a propriedade
privada. O aprofundamento do igualitarismo popular e
revolucionário chegava assim ao seu limite. Por isso mesmo, na
primavera de 1794, o jacobinismo reinante começou a se
distanciar do movimento popular: parte do exército
revolucionário foi licenciada, a Comuna de Paris depurada e 39
das seções parisienses, que exerciam a democracia direta dos
sans-culottes, foram dissolvidas. Ao mesmo tempo, reforçou-se
uma extrema centralização do comando político. Dentro dele,
instalou-se uma feroz disputa de liderança que o clima de
perseguições tornou mortal — e dela emergiu Robespierre como
líder absoluto, depois de mandar á guilhotina todos os seus
rivais.
Reinando solitário e absoluto, Robespierre resolveu em 10 de
junho levar ao extremo seu ímpeto punitivo. Apresentou um
decreto criando um novo Tribunal Revolucionário, em que não
havia nem testemunhas nem defensores, e que só podia decidir
pela absolvição ou pela morte A burguesia girondina
sobrevivente, até então na defensiva, reagiu Aliando-se aos
deputados do "pântano", facção burguesa que se mantinha
oportunisticamente na sombra, conspirou contra Robespierre,
aproveitando o clima reinante de insegurança em face da
guilhotina e o fato de que ele, exausto e com a saúde abalada,
ausentou-se durante algum tempo das seções. Em 26 de julho,
Robespierre discursava, tentando justificar mais uma lista de
"traidores", quando os adversários exigiram que ele fosse
preso, por atacar frontalmente a Convenção.
É preciso garantir a propriedade do rico
e a existência do pobre
Seus partidários ainda tentaram uma resistência a partir do
Hôtel de Ville, sede da Comuna de Paris. Foram rapidamente
vencidos, sem luta praticamente, e os vencedores encontraram
um Robespierre surpreso e com dificuldades de liderar seus
homens. Baleado no queixo, um disparo feito por ele mesmo, o
jacobino foi preso, humilhado e condenado à guilhotina Assim,
no dia 9 de Termidor (27 de julho de 1794), com sua morte
terminou a República jacobina.
A partir dessa data, ou do Termidor, até novembro de 1799,
a burguesia retomou o controle da Revolução, eliminado o
igualitarismo democrático. A base teórico-ideológica da reação
foi dada pelo deputado Boissy d'Anglas, em 23 de junho de
1795. Para ele, tratava-se então de "garantir enfim a
propriedade do rico, a existência do pobre, o usufruto do
homem industrioso e a segurança de todos". Tendo a
propriedade privada como fundamento da ordem social, ele
instava os deputados a se defenderem "com coragem dos princípios ilusórios de uma democracia absoluta é de uma igualdade
sem limites... Devemos ser governados pelos melhores.... ora,
não achareis semelhantes homens senão entre os que,
possuindo uma propriedade, estão apegados, ao pais que a
contém, às leis que a protegem, à tranqüilidade que a conserva,
e que devem a essa propriedade e à abastança que ela dá a
educação que os tornou adequados..."
Uma nova Constituição, em 1795 estabeleceu um poder
executivo composto de cinco membros, o Diretório, escolhido
por um legislativo formado pelo Conselho dos Anciãos. Na
direção da reação termidoriana, destacava-se o abade Sieyès,
que já tivera grande importância no inicio da Revolução
Sentindo a caminhada da política para a direita, os realistas e
aristocratas tentaram revertê-la completamente, voltando ao
CLIO História – Textos e Documentos
Jacobinos: clube político fundado em 1789,
reunindo os "patriotas" da burguesia e da
nobreza, que formam, logo depois, a Sociedade dos Amigos da Constituição; o progressivo radicalismo dos seus partidários leva à
cisão política, com a saída do grupo dos
"Feuillants".
"Iguais": grupo liderado por Babeuf, herdeiro das idéias de Marat, fortemente ligado
aos "sans-culottes", e que lutava por uma
igualdade social radical.
"Incroyables"
e
"Merveilheuses":
homens
e
mulheres
da
burguesia
conservadora, partidários do Thermidor, que
procuram mostrar, através de uma moda
extravagante e atitudes arrogantes, seu
reacionarismo político.
Lei do Máximo: lei de 29/9/1793 que fixa
limites para os preços e salários, aprovada
sob pressão popular pela Convenção.
"Lettres de cachet": instrumento pelo qual
o Rei, no Antigo Regime, podia mandar
prender
alguém,
sigilosamente,
sem
julgamento.
Montanheses: deputados jacobinos radicais, que ocupavam as cadeiras mais altas
da Convenção, e que defendiam a aliança
com a "sans-culotterie".
Notáveis: proprietários, homens de negócios, altos funcionários civis e militares,
membros do clero constitucional, enfim,
burgueses de prestígio, são os eleitores dos
deputados pela Constituição do Ano III; a
Constituição do Ano VIII, mesmo adotando
novamente o sufrágio universal, manteve,
na prática, os critérios da notabilidade na
composição das lisas eleitorais.
Pântano (ou Planície): a maioria dos deputados
da
Convenção,
centristas,
oportunistas, que apoiaram ora a Gironda,
ora os jacobinos, e participaram diretamente
da reação thermidoriana.
"Paz de Campoformio": tratado assinado
com a Áustria em outubro de 1797, pelo
qual os austríacos mantinham a região de
Veneza e reconheciam a ocupação francesa
da Lombardia e de toda a região da margem
esquerda do Reno, inclusive a Bélgica,
grande vitória político-militar-diplomática de
Napoleão Bonaparte.
Realistas: partidários do restabelecimento
pleno da monarquia absoluta e do Antigo
Regime, em geral membros da Aristocracia e
do Alto Clero.
"Sans-culottes": a população pobre dos
"faubourgs" de Paris e das outras grandes cidades; foram a grande força popular da Revolução.
Secções: entre maio de 1790 e final de
1795, Paris foi dividida em 48 secções, para
permitir à população realizar assembléias
Ancien Régime. Mas suas duas tentativas de golpe, em 1795 e
1797, foram abortadas. Não deixa de ser significativo que no
combate aos seus golpes tenha tido papel essencial um jovem
oficial, decisivo, dai em diante, na consolidação do poder
burguês: Napoleão Bonaparte.
E o poder militar foi chamado para pôr
ordem na confusão
Apos algumas vitórias de Napoleão na guerra na Itália, o
Diretório conseguiu uma paz provisória com as forças
absolutistas estrangeiras em Campoformio (outubro de 1797).
Mas a economia estava arruinada, e a eliminação dos decretos
jacobinos e do congelamento de preços levou a inflação a uma
verdadeira catástrofe monetária. Diante disso, os jacobinos
tentaram uma contra-ofensiva em 1798, ganhando as eleições
para o Conselho. Mas também já era tarde demais para o
movimento popular, cuja ala radical tinha sido destruída
durante a derrota da Conjura dos Iguais em 1796, revolta de
caráter igualitário e precursora do socialismo, liderada por
Gracchus Babeuf. Os jacobinos que ganharam a eleição de
1798, mais moderados, não tinham também qualquer
alternativa a propor para o estado calamitoso em que se
encontrava a França: crise econômica, portos e caminhos
destruídos,
serviço
público
desorganizado,
indústrias
arruinadas.
A burguesia do Diretório, e particularmente Sieyès e Roger
Ducos, chamaram o poder militar para pôr ordem na casa. E
não se tratava de um chefe militar qualquer. Forjado nas
dramáticas contradições da Revolução, marcado por uma
carreira meteórica no primeiro exército revolucionário de
massas da era moderna, o general Napoleão Bonaparte foi
escolhido para "salvar" a França Em 18 de Bromarei (9 de
novembro) de 1799, ele chefiou o golpe de Estado que encerrou
a Revolução, com a criação do regime do Consulado. E a partir
daí consolidou o poder e as instituições modernas da burguesia
do capitalismo.
R. Maranhão / J. C. Ruy
Revista Superinteressante
Fonte básica:
A Revolução Francesa. Albert Soboul. Difel, São Paulo
Uma nova felicidade
"A felicidade é uma idéia nova na Europa", afirmou em 1793
Louis-Antoine-Léon de Saint-Just, um dos líderes radicais da
Revolução Francesa. Não quer dizer que antes todos fossem
infelizes, mas simplesmente que surgira uma idéia nova de
felicidade, ligada ao bem comum — o homem seria feliz numa
sociedade justa. Em outro momento. Saint-Just disse que a
maneira antiga de fazer a guerra já não servia, porque convinha
aos reis: agora seria preciso inventar uma estratégia nova,
adequada a homens livres. A arte da guerra, para as
monarquias do século XVIII, consistia entre outras coisas em
evitar batalhas. 0 maior general do tempo foi o rei da Prússia,
Frederico, o Grande, que tendo exércitos pequenos fazia suas
tropas marcharem muito, a ponto de vencer o inimigo numa
jogada de xeque-mate, e não pela batalha frontal, um triunfo
da inteligência, da estratégia, e não da força bruta. Mas esse
tipo de guerra servia quando a luta armada se praticava entre
reis que eram primos, generais que eram parentes ou amigos, e
por isso mesmo podiam ser galantes no campo de batalha. Num
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locais e encaminhar suas reivindicações;
foram os comitês revolucionários dessas
secções que levaram à formação da Comuna
insurrecional.
Terror: período em que o governo revolucionário exerceu plenos poderes, entre o
final de 1792 e meados de 1794, instalando
a violência política contra todos os suspeitos
de serem contra-revolucionários.
9 de Thermidor (27/7/1794): marca a derrubada do governo revolucionário e a reação
da burguesia no sentido de dar novos rumos
ao processo revolucionário.
combate do começo do século, o general francês gritou ao
inimigo: "Senhores ingleses, atirem primeiro!", e assim lhes
deu, de presente, a primeira fila de seu exército.
As guerras da Revolução não foram assim cavalheirescas.
Quando invadiu a França em 1792, para restaurar o poder absoluto do rei, o duque de Brunswick ameaçou não deixar pedra
sobre pedra em Paris, se tocassem num fio de cabelo de Luís
XVI. Os "soldados descalços" que defendiam a República sabiam
que sua guerra não era galante como a dos nobres, mas que
arriscavam a própria pele: se o inimigo vencesse não teria
piedade para com eles. Isto dava à guerra um enorme ímpeto
popular. As guerras revolucionárias foram românticas, nesse
sentido, feitas por gente que acreditava numa causa e se
entusiasmava por ela.
E preciso lembrar que a Revolução, e depois o Império, se
inspirou muito na Antigüidade Clássica, especialmente em
Roma e Esparta, que eram os dois grandes exemplos históricos
de um regime mais voltado para a causa pública do que para o
egoísmo individual. Basta citar David, pintor que foi deputado à
Convenção, votou pela execução de Luis XVI, foi amigo de
Robespierre e Napoleão: no seu quadro Brutus, de 1789, vemos
o governante romano, melancólico, exibindo uma dor profunda.
Ele acaba de ordenar a execução dos próprios filhos, que
traíram Roma querendo restaurar a monarquia. No fundo da
tela, as mulheres choram. Mas Brutus também sofre, só que sabe que a causa da pátria está acima dos sentimentos individuais
É essa a grande lição que Roma dá aos revolucionários: o bem
comum é mais importante que as vantagens pessoais, é belo e
digno lutar e morrer pela pátria. Por causa dessas referências à
Antigüidade, o filósofo alemão Karl Marx até afirmou, no
Dezoito Brumário de Luis Bonaparte, que a Revolução Francesa
criou uma sociedade inteiramente nova pensando que estava
restaurando a República romana
Marx exagerou. Os revolucionários admiravam muito Roma,
mas a maioria deles sabia, como Saint-Just, que o mundo havia
mudado. Esta, aliás, é a grande diferença entre a Revolução
Francesa e as duas revoluções inglesas do século XVII. O que
Marx diz vale para estas últimas: os ingleses, em 1640 e em
1688, mudaram sua sociedade pensando que defendiam contra
reis "inovadores" a velha e justa ordem de coisas. "Inovações",
no inglês da época, era termo pejorativo, que se relacionava
com governantes católicos ou que se supunham tais, e católico,
naquele tempo e lugar, significava absolutista como Luis XVI,
supersticioso e repressor como a Inquisição. Os protestantes
que executaram Carlos I em 1649, e depuseram seu filho Jaime
II em 1688, inspiravam-se muito na Bíblia, especialmente no
Velho Testamento. Um pregador dos anos 1640, Arise Evans,
chegou à conclusão, lendo a Bíblia, de que devia ser derrubado
o presidente do Parlamento, porque se chamava Lenthall, e
Sansão havia derrubado o umbral (em inglês, lintel) do templo
dos idólatras filisteus. E Cromwell, um dos líderes mais
tolerantes da Revolução, se isolou meditando, espera de uma
inspiração divina para decidir se o rei Carlos devia ou não ser
julgado e condenado por traição ao povo inglês.
Nada disso ocorreu na Revolução da França — diferente de
todas as que houve antes. Ela foi leiga; pode ter tido seus
ídolos proclamou uma religião (a do Ser Supremo), mas o
pensamento que nela triunfou foi o do século das luzes: crítico
em face da superstição, e mesmo da religião, defendendo a
tolerância a todos os cultos e também aos ateus. Foi a primeira
revolução que se orgulhou de ser nova, querendo mudar o
mundo. Lutou pela causa ia Humanidade e não mais pela
liberdade de um povo só (como inglesa, que defendia os direito
do inglês nato a sua liberdade). Por isso, pela primeira vez na
História, uma revolução política e social foi exportada — as
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guerras revolucionárias não foram, pelo menos de começo,
imperialistas, mas libertadoras. Cada pais em que entraram os
exércitos franceses vitoriosos ganhou, de presente, a liberdade,
a República. A felicidade, com efeito, tornou-se uma idéia nova
na Europa.
O Iluminismo como inspiração
Ainda se podiam ouvir os ecos da batalha e a balbúrdia
alegre da multidão que tomou a Bastilha, quando, no mesmo 14
de julho de 1789, a Assembléia decidiu que os franceses
deveriam preparar uma declaração que assegurasse os seus
direitos. Elaborada e votada em 26 de agosto, a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão foi uma manifestação positiva,
no campo jurídico, de homens livres que afirmavam englobar
todos os súditos de um Estado, sem exceções. Legislando pela
primeira vez que "os homens nascem iguais", a Declaração
evidencia seu caráter ativo, que não decorre de alguma
concessão de poderes humanos ou celestiais, ao afirmar no
preâmbulo: "Os representantes do povo francês (...) resolveram
expor, em uma declaração solene, os direitos naturais,
inalienáveis e sagrados do homem".
A Declaração de 1789 é mais abrangente do que qualquer
texto anterior, pois tem uma intenção de universalidade que
permitiu ao historiador francês Jules Michelet defini-la como "o
credo da idade nova". Conceituando a liberdade como o direito
de fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem, ela se estende
com clareza, pela primeira vez na História, sobre o direito de
manifestação: "Todo cidadão pode falar, escrever e imprimir livremente, respondendo pelo abuso dessa liberdade, nos termos
da lei". No quadro da recusa da Revolução Francesa em admitir
o poder da Igreja, dá essa definição perene: "Ninguém pode ser
perseguido por suas opiniões, mesmo as religiosas". A
Declaração de 1789 expressa nitidamente seu vínculo com a
burguesia revolucionária que a engendrou. Fica claro ali o
direito "inviolável e sagrado'' da propriedade.
A Declaração é fruto de uma elaboração filosófica e ideológica
do século XVIII, o Iluminismo, que marcou fundo a evolução do
conhecimento humano e forneceu os fundamentos para todo o
processo revolucionário ocidental. Nos séculos XV e XVII, com a
Renascença, a Europa Ocidental produzira pensadores que se
opunham aos dogmas estáticos da Igreja Católica de então. A
ciência e a observação empírica em Galileu, a lógica e a dúvida
em Descartes, a dessacralização da política em Maquiavel, entre
muitos outros inovadores, tendiam a derrotar a fé como forma
dominante de conhecimento. O século XVII se encerra com o
legado científico de lsaac Newton, que exclui o sobrenatural do
reino deste mundo, e com o pensamento político de John Locke,
que iguala todos os homens pelo direito à vida, à liberdade e a
propriedade.
Mas é no início do século XVIII que a França apresenta ao
mundo Voltaire, literato, crítico da ciência e, como os
iluministas, filósofo. Os iluministas chamavam a si próprios
filósofos e Voltaire foi o primeiro deles, batalhando com audácia
e extrema ironia contra a obscuridade dos dogmas e da religião,
a favor das luzes da Razão. Seu livro Cartas filosóficas, publicado em 1734 na França, o levaria preso à Bastilha (que
freqüentou várias vezes), e faria, como suas inúmeras outras
obras, sua fama de maior dos iluministas, aquele que levaria
também seus conhecimentos aos poderosos da Europa.
Na trilha de Voltaire, os filósofos Diderot e D'Alembert
resolveram, em 1747, fazer uma enciclopédia ou Dicionário
racional das ciências, das artes e dos ofícios, a conhecida
Enciclopédia, que nos seus dezessete volumes publicados até
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1772 tinha a pretensão de abarcar todo o conhecimento humano científico e racional. Naturalmente, convidaram Voltaire
para seu principal colaborador; importante também foi
Montesquieu, defendendo que todo país deveria ser governado
por leis escritas, e não por homens, e que tais leis deveriam,
numa Constituição, equilibrar os poderes Executivo, Legislativo
e Judiciário.
A Enciclopédia tornou-se o aglutinador e principal veículo dos
pensadores que se afinaram com a "filosofia das luzes", ou seja,
com a idéia de que a Razão (a partir daí escrita com R
maiúsculo) se liberta da religião, dos preconceitos e obstáculos
ao desenvolvimento intelectual. Condorcet e Condillac
escreveram ali sobre Filosofia; Quesnay e Turgot sobre
Economia; Holbach, sobre Química. Mas escreveu também na
Enciclopédia Jean-Jacques Rousseau, que marcaria época com
seu O contrato social, em que propôs a democracia e o sufrágio
universal, como forma de eliminar a indesejável e histórica
desigualdade entre os homens.
Os filósofos iluministas forneceram a substância teórica e
ideológica para a revolução burguesa. Mas, ao dar
universalidade a seus pensamentos, avançaram, como a
Declaração que se baseou neles, muito além dos interesses
burgueses, marcando a História contemporânea com sua
modernidade.
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