O Conceito de Massa-Energia em Relatividade Restrita

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Paulo Vargas Moniz
Lição 13
O Conceito de Massa-Energia em Relatividade Restrita
Estrutura Pedagógica
Apresentação:
Na sequência da lição anterior, o propósito desta é examinar as consequências dos
conceitos relativistas de massa e momento linear. Estabelecemos que a
conservação de momento linear em TRR requere outra lei de conservação
associada. Esta corresponde à soma das massas relativistas ser invariante. Mas uma
imterpretação mais fisica é aqui apresentada.
Da análise dos conceitos de trabalho e energia cinética, vamos estabelecer a noção
de massa-energia. Mais particularmente, na obtenção da célebre fórmula E  mc2 .
A lei de conservação adicional que introduzimos na lição 12 é pois a lei de
conservação da energia total, incluindo a energia de repouso. Subsequentemente,
estabelecer-se-à uma relação invariante envolvendo a energia total, massa
(repouso) e momento linear. Daí extrairemos mais conclusões de e sobre a
equivalência entre massa e energia. Nomeadamente através de argumentos
heuristicos e consequências ao nivel da força e aceleração.
Questões Centrais:
Duas linhas de análise guiam esta lição:

Se em TRR o modo como massa de corpo é determinado depende
(operacionalmente) do estado de movimento (do corpo e/ou observador), como
é que isto se reflecte nas expressões de trabalho efectuado?

Mais ainda, como será que tal poderá afectar os conceitos ou expressões de
energia cinética ou outra em TRR?
Estrutura da Lição:
Esta lição inicia-se com uma estrutura sequencial. Isto significa que após
introduzir determinados conceitos, ir-se-à extrair uma série de resultados, os quais
vão sendo interpretados.
Seguidamente adopta-se uma linha “clássica”. Aí apresentam-se e descrevem-se
vários outros tópicos de dinâmica relativista, envolvendo a noção de equivalência
de massa-energia em TRR.
134
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições
Sumário da lição:
Em mais detalhe iremos descrever:
 Como a energia cinética relativista é obtida da noção de trabalho realizado;
 Como a energia e a massa são conceitos equivalentes em TRR ( E  mc2 ), e
assim interpretar fisicamente o contexto da lei de conservação do momento
linear (Lição 12);
 A análise do limite não-relativista;
 Como a energia, massa e momento linear se relacionam quantitativamente
numa expressão invariante;
 Argumentos heuristicos em favor da noção de massa relativista e da expressão
E  mc2 ;


 dp  dv


 
ea 
 F  ma ! I.e., em TRR a e F podem não ter a
 Como F 
dt
dt

mesma direcção, i.e., F  ma não é genericamente válida em TRR.
Objectivos Didácticos:
No fim desta lição, os alunos deverão poder
 Saber determinar energia cinética relativista, a energia relativista total e a sua
relação com energia (massa) de repouso (E=m0c2);
 Determinar e interpretar a relevância da expressão (invariante entre RI) E2 –
p2c2=m0c2 no quadro da TRR;
 Entender como massa e energia são indestinguiveis ou equivalentes em TRR;
 Compreender alguns dos argumentos heuristicos da expressão E=mc2
 
 Porque F e a podem não ser colineares em TRR.
N
o domínio da mecânica Newtoniana a variação do módulo da velocidade de
particulas origina a variação da sua energia cinética. Mas no contexto da TRR o
135
Paulo Vargas Moniz
conceito de massa relativista não é um invariante, aumentando quando a velocidade de
corpo se aproxima de c (ou por outras palavras, ao termo de massa de repouso m0 é
associado uma função (V) – ver eq. (1.64), (1.65)).
Este facto está associado a várias alterações cruciais:

Permite a conservação das componentes espaciais px, py, pz do momento linear
invocando adicionalmente que a quantidade (Vi)m0i (i=A,B,C, … indexando as
particulas intervenientes) se conservasse em processos de interacção;

Mas também vai modificar radicalmente os conceitos de massa, energia e sua
interdependência. Em particular, vamos ver qual é o verdadeiro significado fisico
da lei de conservação adicional que é requerida para ter conservação do momento
linear. Nesse sentido, vamos ver como é possivel exprimir a variação da energia
cinética de particula em termos da variação da massa no quadro da expressão
(1.69).
A variação da energia cinética de particula,
 quando a sua velocidade passa de 0 a v,
iguala o trabalho W realizado pela força F para provocar a aceleração correspondente


à particula atingir velocidade v no deslocamento ds . I.e., tem-se

  d  mv  
dW  F  ds 
 ds
dt 
 
 dm  v  v  mdv  v
 
 dmv 2  mv  dv
Então, para a energia cinética Ek adquirida vem
 
2
 
Ek   dW   F  ds   dm v    mv  dv
(1.71)
No contexto da TRR, há que diferenciar a expressão
m
m0
1
v2
c2
de onde vem
dm   m0
 
v  dv
m  
 2
v  dv
2
 v  2 c  v2
1  2 c
 c 
(1.72)
pelo que se tem
136
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições
 v2
 dW   c 1  c 2
2
m

dm   v 2 dm  c 2  dm

m0 v  0!
i.e.,
Ek  W  mc2  m0c2
(1.73)




1
2
Ek  W  m0c
 1


v2
 1 2

c


(1.74)
ou
Alternativamente, se movimento se processa sómente no eixo dos xx com vi = 0
xf
xf
pf
pf
dp
dx
W   Fdx   dx   dp   vdp
dt
dt
xi
xi
pi
pi
e integrando por partes, vem
vf
p f v f  pi vi   pdv m0
0
vf
v 2f
1
v 2f
c

0
2
m0v
v2
1 2
c
dv
Assim
W


v 2f
2


m
c
1


1
0


c2
v 2f


1 2
c
m0v 2f
ou,




1
2
Ek  W  m0c
 1


v2
 1 2

c


como se esperaria.
A
energia cinética (1.74) é assim diferença de mc2 e m0c2 . O primeiro termo é
devido à dependência na velocidade do objecto através de m(v). O segundo
137
Paulo Vargas Moniz
termo, independente da velocidade do objecto, é a sua energia em repouso: m0c2. A
energia total relativista é a soma da energia cinética e da energia de repouso:
Etotal  m0 c 2  E k   m0 c 2  mc 2
(1.75)
Comentário: Da expressão (1.74) é possivel obter outra, a qual permite estabelecer um
método de verificação experimental da dinâmica relativista. Básicamente,
 m0 c 2
v2
E k  m0 c 
 2  1  
2
c
1 v2 c2
 E k  m0 c
2
m0 c 2



2
Dado que m0 (a massa em repouso de uma particula qualquer) e c são valores predeterminados, basta variar a energia cinática (por exemplo, com auxilio de uma variação de
energia potencial electrica) para levar a particula a uma velocidade cada vez mais elevada.
Se a TRR está correcta, a variação de v com Ek deve satisfazera a relação acima. No caso da
mecânica Newtoniana seria v c   2Ek m0 c 2 . A figura junta mostra o resultado
experimental (utilizando electrões cuja velocidade é escolhida e variada através do gradiente
de potencial electrico) que é concordante com a TRR.
2
A expressão relativista acima também mostra que Ek   quando v/c  1, i.e., a velocidade
do objecto se aproxima da velocidade da luz. A interpretação física de que c é velocidade
limite provem pois de que para acelerar corpo até v c. Isso implicaria transferir quantidade
infinita de energia, o que é impossivel. Daí que a velocidade de uma particula com massa m0
é sempre inferior a c se a vi for inferior a c.
Neste contexto, a noção de uma massa “dependente” da velocidade adquire uma perspectiva
interessante. De facto, o conceito de massa pode ser associado ao de inércia, a resistência de
um corpo a alterar o seu estado de movimento. Da expressão relativista acima vem que a
inércia de um corpo aumenta quando v aumenta. Nomeadamente, quando v c a adição
subsequente de energia não faz variar practicamente a velocidade, i.e., a inércia aumenta e
estado de movimento não se altera. O aumento de inércia será dado por m-m0=(-1)m0 ou seja
Ek/c2. Mais ainda, poderemos afirmar que qualquer energia  contribui com uma quantidade
/c2 para a massa ou inércia de um objecto material.
As expressões (1.73), (1.75) permitem
atribuir o verdadeiro significado fisico de
m0, como presente na equação de
conservação (1.69). Esta condição, que é
necessária a que as componentes espaciais
do momento linear se conservam e forma
com estas uma conservação conjunta de
observáveis, constitui a conservação da
energia total – basta multiplicar cada termo
em (1.69) por c2. Neste sentido, ao
considerarmos processos de interacção


entre particulas i=1,2,3 … devemos utilizar  piinicial   p jfinal de acordo com
i 1, 2 , 3,...
j ...
138
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições
expressões (1.64), (1.65) mas também
E
i 1, 2 , 3,...
inicial
i
  E jfinal , i.e., Ek1+m01c2 + Ek2 +
j ...
m02c2 + … = … , onde m01 representa a massa em repouso da particula i=1, e
similarmente para outras. Por outras palavras, a equação de conservação de energia
requer a presença da energia cinética mas também da energia de repouso, mesmo que
essa particula não tenha movimento num dado RI. Isto aponta pois que qualquer
particula com uma dada massa contribui com a sua energia cinética mas também com
a sua energia de repouso m0c2.
Do resultado (1.73)-(1.75) igualmente se podem extrair outras conclusões e resultados
fundamentais:
 Uma particula em repouso, com massa m0, tem energia m0c2 e em movimento,
com massa m, a sua energia é mc2, sendo a sua energia cinética dada por (1.74).
 A equação (1.75) representa a célebre equação de A. Einstein, a qual constitui o
principio de equivalencia entre massa e energia: toda a massa m equivalente a
energia E, dada por valor da massa com produto por quadrado de valor da
velocidade da luz no vácuo; Modernamente não pois há distinção fundamental
entre massa e energia. Há sim uma lei de conservação de massa-energia: num
sistema isolado a massa-energia é constante. A massa de um corpo é uma medida
da sua energia.
A equação (1.75) revoluciona o conceito Newtoniano onde a massa (em termos de
matéria) era conservada, não sendo criada nem destruida. No cenário da TRR, essa
massa pode não ser conservada, podendo transformar-se. Em particular, a massa
pode ser reduzida (e.g., via emissão de radiação ou energia) sendo esse decréscimo
dado por 1/c2 da energia libertada pelo corpo (no seu RI de repouso).
1
m v 2 se utilizarmos
2 0
a expansão em série de potências, como mencionado na lição anterior
 No caso não relativista, tem-se que com v<<c se obtem Ek 
 Em mecânica Newtoniana, o trabalho realizado por força em particula, faz variar
a sua velocidade mas mantendo invariante a massa dessa particula; Em mecânica
Relativista, o trabalho produz uma variação de massa de particula. Não há pois,
como dissemos, distinção absoluta entre conceitos de massa e energia.
 Interessantemente, das equações (1.65), (1.75) obtemos que pc/E =v/c e quando
v c, p E. Para v=c, E=pc a que corresponde o caso de propagação da luz
(fotões).
 O ponto essencial a mencionar é que a variação de energia (ou de massa
relativista) pelo estado de movimento de um objecto não tem necessáriamente que
ser correspondente a energia cinética. Pode ser associada a qualquer tipo de
energia. E se a energia de um corpo variar de E, a sua massa variará de E/c2.
Assim, se corpo emite radiação com energia E, a sua massa diminui de E/c2, mas o
mesmo tambem ocorre em reacções e interacções mecânicas, eléctricas, quimicas.
139
Paulo Vargas Moniz
Se uma mola elástica é comprimida, se uma bateria electrica é carregada, se um
corpo aquece, há troca de energia mecânica, térmica ou eléctrica, a que
corresponde uma variação de energia e claro de massa. Só que as energias trocadas
são pequenas quando comparadas com energia em repouso, pelo que variação de
energia em repouso é inobservavel. Em particular, note-se que a variação de massa
correspondente a emissão de energia é muito pequena devido ao factor c-2.
Mas o mesmo argumento pode ser utilizado para mostrar como a energia em
repouco é imensa. De facto, para m=1g, a energia em repouso é E=m0c2 = 1014J, e
que corresponde à produção de energia durante um dia total para uma central de
energia.
 Um teste importante à relação massa-energia é efectuado no quadro de reacções
nucleares. Analisaremos isso em detalhe na lição 15, mas neste ponto podemos
mencionar que no declinio radioactivo, quando se compara a massa do núcleo
atómico inicial e a dos produtos do declinio, há uma diferença de massa (!), a qual
corresponde a 1/c2 da energia libertada.
Básicamente, alguma massa ou quantidade de matéria inicial foi convertida em
energia, ao que também se poderá afirmar (mais correctamente) que uma forma de
energia (energia de repouso) é transformada em outra.
Um exemplo ainda mais radical é o desaparecimento de matéria e sua
transformação em energia, como analisaremos em detalhe na Lição 15.
I
gualmente muito importante (ver Lições 14 e 16) é notar que da equação (1.75)
podemos extrair uma relação fundamental e de profundas consequências para
interpretar o conteúdo fisico e matemático da Teoria da Relatividade. Assim, podemos
extrair que


2
2
m2c 4
m c 4 m c 4v 2
E   m c  0 2  c 2  v 2 2 0 2  02
v
c v
c  v2
1 2
c




2 2
2
c v 
v 
2 2 2
2 2 2
  m0 c c 
 m0 c  c  2
 m02 c 4  m02 c 2 v 2
2 
2

c v 
v 

1 2 

c 

2 4
2 2
2
 m0 c  p c  E 0  p 2 c 2
2
2
2
0
4
2
(1.76)


Alternativamente, de p  mv e m  m0 1  v 2 c2 vem, após eliminar v, através de
p2=m2v2 e m2=m022, que m2-p2/c2=m02 e dai que E2=p2c2+m02c4.
Na expressão (1.76) inserem-se dois aspectos a mencionar:

Por um lado, estabelece-se uma relação directa envolvendo a energia total
relativista, a sua massa de repouso e o momento linear relativista. Relembrando
que a conservação das componentes espaciais do momento linear total requer a
140
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições
conservação da energia, esta expressão é de extrema relevancia em situações de
colisões relativistas.

Por outro lado, E e p representam a energia e momento linear da particula quando
possuindo velocidade v, tal como registado num RI S. Para outro RI S’ em
movimento relativo em relação a S, a particula tem velocidade v’, pelo que terá aí
uma energia relativista E ’2 = m02(v’)2c2 e momento linear p’. Mas E0= m0c2 é um
invariante entre RI. Assim em ambos os casos se terá, via (1.76) que
E 2  p2c2  E  2  p 2c2  E02
(1.77)
Assim, a equação (1.76), através da energia em repouso ser uma constante
independente do RI, uma relação invariante relativista, i.e., que é válida em qualquer
RI. Este ponto será explorado também na Lição 16. Podemos aqui mencionar que
relações invariantes entre quantidades usualmente indiciam a presença de relações de
simetria entre elas. Por exemplo, a norma, módulo ou magnitude de um vector é a
mesma em qualquer sistema de coordenadas, embora as suas componentes possam
variar de acordo com a escolha de eixos de coordenadas. Isto significa que a norma de
um vector é a mesma qualquer que seja a transformação de coordenadas utilizada para
passar a um referencial de coordenadas arbitrário.
N
o tocante à relação massa-energia, um aspecto importante é o caso do fotão.
Como já mencionámos, a radiação electromagnética é emitida na forma de
quanta de energia. Se a frequência é , a energia de cada fotão é E=h, onde
h=6.62510-34 Js é a constante de Planck.
Analisando as expressões (1.65) e (1.75) vem com u/c1 que o denominador tende
para zero. Mas se m00 (ou fôr zero), no limite de uc tanto p como E podem
permanecer finitos. I.e., m0 e uc e m0 1  u 2 c 2   k e p=kc, E=kc2. O que da
Fisica Quantica corresponderia a k=h/ c2 . Assim, fotão ou luz têm energia E=h e
momento linear p=h/c. O que é consistente com E=pc na equação (1.76) com m0=0 e
k=h/ c2 podendo ser interpretada como “massa” relativista do fotão.
1/ 2
referir aqui uma série de argumentos heuristicos que permitem conduzir
Éarelevante
relações fisicas como (1.64), (1.65) e (1.75). Em particular que m m(v) e E~mc .
2
Como referimos, a inéricia de um corpo, correspondente à sua massa, é associada com
a dificuldade de alterar estado de movimento desse corpo: mais matéria ou massa
significa mais inércia. Mas já vimos que c é a velocidade limite e que quando mais
elevada é a velocidade, mais dificil é acelerá-lo e aumentar a velocidade – a
aceleração é cada vez menor (ver Lição 5). I.e., inércia aumenta com a velocidade!
Daí que poderiamos antever que em TRR a quantidade de inércia num corpo depende
da quantidade de matéria (i.e., massa em repouso) e velocidade, que poderia ser
generalizada a uma massa total ou relativista.
141
Paulo Vargas Moniz
Igualmente, para acelerar um corpo emprega-se uma força, a qual produz trabalho.
Mas se a velocidade pouco varia, a que corresponderá todo o trabalho produzido? A
sugestão é que aumento de massa/inércia corresponde um aumento de energia do
corpo, em que energia e massa são equivalentes. Sejam então os seguintes exemplos:
 De facto, já referimos na Lição 3 que quando radiação é absorvida ou reflectida
numa superficie, uma pressão é exercida nessa superficie – é uma propriedade
clássica do electromagnetismo. O resultado essencial é que a pressão da radiação
R é igual à intensidade da radiação I dividida pelo valor da velocidade da luz, i.e.,
R=I/c;

A força é dada por F=RA=IA/c=P/c, onde A é a área da superficie e P é a
potencia absorvida pela superficie;

Mas o impulso aplicado à superficie (se esta absorvesse a radiação com uma
intensidade constante num intervalo de tempo t) é Ft=Pt/c=E/c, sendo E a
energia total absorvida;

impulso é igual à variação de momento linear, pelo que momento linear
correspondente à radiação de energia E é o momento linear perdido quando a
radiação é absorvida, i.e., p=E/c;

Assim, tal implica que radiação transporte momento linear e possivelmente
“massa”. Se p=mv e v=c, vem que mc=E/c, i.e., E=mc2. Mais ainda, todas as
fontes de energia radiativa experimentam um recuo de forma a conservar
momento linear.
 O seguinte argumento foi formulado por A. Einstein para mostrar que energia
corresponde a massa. Básicamente apresenta um contexto mecânico à
transferência de energia via pressão radiativa. De inicio, sejam A e B dois
observadores com igual massa num mesmo barco num lago:

A lança objecto de massa m a B. A experimenta um impulso para a sua
rectaguarda e nessa direcção o barco mover-se-à;

B recebe o objecto, um impulso de sentido oposto ao anterior é aplicado a B e
pára o barco;

A e B trocam de posições mas como B tem com ele massa m (i.e., uma massa
total maior que a de A) isso implica que barco se vai mover para a posição
inicial.
 Seja então um cilindro de comprimento L onde se tem 2 blocos A e B:

A emite radiação para B. Aí A experimenta um recuo devido à pressão de
radiação e tubo recua para a direita (ver figura junta);
142
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições

Note-se que a radiação viaja de A para B enquanto o cilindro se move com
velocidade v uniformemente.

B absorve a radiação, experimenta impulso para a esquerda, oposto ao de
recuo, e sistema fica em repouso. No global, o cilindro moveu-se para a direita
com transmissão de energia de A para B.

Se A e B têm igual massa e trocarem de posições (sem recurso a forças
externas), sistema a estado equivalente ao inicial mas deslocado
espacialmente! O processo de emissão repetir-se-à em ciclo, com o cilindro
movendo-se uma distância arbitrária.
A situação atrás descrita viola a 1ª Lei de Newton: um sistema isolado alterou
o seu estado de movimento sem accção de forças externas. Mas claro que se
em vez de radiação, se trocasse uma massa então a situação era equivalente à
descrita no exemplo do barco e o cilindro teria retornado à posição espacial
inicial.
A resolução do problema é feita se fizermos corresponder à radiação trocada
tanto energia como o equivalente em massa. Aí, quando A e B trocam de lugar,
B tem mais massa e cilindro volta à posição inicial. E neste contexto, podemos
determinar uma relação entre massa e energia:

momento linear de radiação/energia é p=E/c pelo que a velocidade de
recuo é v=p/M=E/Mc onde M é a massa de A e B e cilindro, e o tempo de
percurso é pois t=L/c.

deslocamento do cilindro é então x=vt=LE/Mc2 e o percurso da radiação é
L.

Mas para que o centro de massa do sistema se mantenha na mesma
posição, que inicialmente estava, e.g., na origem, então
(xM+Lm)/(M+m)=0 requer que xM+Lm=0. I.e., E=mc2.
143
Paulo Vargas Moniz
 Outro exemplo particularmente interessante é o seguinte. Suponhamos uma
colisão inelástica entre 2 particulas A e B, com igual massa e que no RI de centro
de massa, S, se dirigem uma contra a outra, cada uma com velocidade de
magnitude u. Após a colisão, A e B formam uma particula composta, com massa
M, e estando em repouso no RI de centro de massa. Assumamos então que
momento linear se conserva mas também a inércia ou massa total na forma de
m=m(u). Assim, temos que

No RI de centro de massa M(0)=2m(u). Mas no RI de repouso de A (onde a
particula está em repouso antes da colisão), S’, tem-se que M(u)=m(0)+m(v) e
M(u)u=m(v)v, onde v é a velocidade de B neste RI.

Note-se que o RI S’ tem velocidade u relativamente a S, pelo que
v  2u 1  u 2 c 2 .

Mas das expressões anteriores da conservação de momento e inérica total
podemos
extrair
que
e
dai
que
M (u)  m(0) 1  u v
M (u) M (0)  m(0) 2m(u) 1  u v.

Assumindo que a variação de inércia ou massa total com a velocidade é
universal,
i.e.,
M(u)/M(0)=m(u)/m(0)
tal
implica
que
m(u )
1

.
(m(u) m(0)) 2  1 2 1  u v e daí obtemos que
2
m ( 0)
1 u 2
c
A
terminar, é relevante analisar
então as consequências
da eq. (1.70). Em




mecânica Newtoniana, F  dp dt reduz-se a F  ma no caso de massa
 

144
A Teoria da Relatividade Restrita em 20 Lições
 
constante e
F // a (colinearidade). Mas em dinâmica relativista temos que
considerar ao invès que


dv  dm
  dm
F m v
 ma  v
dt
dt
dt
Nesse sentido, obtemos de (1.75)
dm 1 dE 1 d
1 d
1  
 2
 2  Ek  m0c2   2  Ek   2 F  dv
dt c dt c dt
c dt
c
e assim



 
v
 dv 1    dm F
 
a
 F  v
F
 v

dt m 
dt  m  m0c2
(1.78)


O ultimo termo implica que a pode não ter a mesma direcção de F . I.e., há

componentes da aceleração determinadas por v ! A este propósito relembre-se os
comentários na Lição 5 acerca da aceleração já não ser um invariante em TRR.
 
Só obtemos colinearidade ( F // a ) quando:
 
 


(i) Fv  F  v  0  F  ma , e tem-se a relação familiar mas m=m0mT, com a
massa relativista m designada como massa transversal mT. Um exemplo físico é o
caso de particula com massa m e carga eléctrica q localizada num campo magnético


   
(independente do tempo) B uniforme onde F  qv  B, a  F m . Note-se que
 
como Fv , magnitude de velocidade é constante, assim como (v) pelo que força
magnética apenas muda a direcção da velocidade.


(ii) F colinear com v , como no caso de particula com carga q acelerada desde o



repouso até v num campo electrico uniforme E , tal que F  qE , o que implica
3

 
2
a  F 1   2  m0  F m/ / , com definição de massa longitudinal m // . Para obter
  
 
 
a expressão note-se que com F // v  F  v  Fv e F , v e a são colineares, pelo
que
3




 
F
v
F  v2  F  v2  2

( F  v )  1  2  
1  2 
m  m0c2
m
c  m0 
c 
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Paulo Vargas Moniz
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