C13022 - Associação de Leitura do Brasil

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ADVÉRBIO EM –MENTE: MODALIZADORES SENTENCIAIS
Giseli Cavicchioli Prado - Letras – Universidade Estadual de Maringá – UEM
Resumo: Apresentaremos um recorte das conclusões de uma pesquisa realizada pela autora
em relação aos advérbios com terminação em –mente. Como é de conhecimento geral, a gramática da
Língua Portuguesa apresenta algumas incoerências e imprecisões, as quais vão desde a
heterogeneidade dos critérios adotados à falta de sistematização dos conceitos das classes de palavras.
Assim, com o intuito de contribuir, de alguma forma, para esclarecer os fatos da língua, analisaremos os
advérbios que funcionam como elemento modalizador do discurso, cuja possibilidade a teoria tradicional
não aborda. Pretendemos, também, estabelecer critérios sintático-semântico-pragmáticos que permitiram
identificar essas palavras no português e, ainda, propor uma classificação, distribuindo-os em
subclasses. Finalmente, como modelo para a análise desses elementos, utilizaremos os fundamentos
teóricos de Quirk et alii. Faz parte do corpus textos informativos da revista Veja e do jornal Folha de São
Paulo.
Introdução
Um dos maiores problemas incitados pelos profissionais envolvidos com a Língua Portuguesa
são as imprecisões da teoria gramatical tradicional, as quais vão desde a falta de sistematização dos
conceitos das classes de palavras à heterogeneidade dos critérios adotados. Assim, ao analisarmos uma
gramática, podemos perceber que há muitas deficiências na descrição de qualquer classe. A dos
advérbios, por exemplo, é definida como uma palavra invariável que modifica o verbo, o adjetivo e o
próprio advérbio, acrescentando-lhe uma circunstância. Por meio dessa definição, notamos a mistura dos
critérios morfológico, sintático, nocional e semântico, aliada à falta de sistematização de sua hierarquia
para deixar claro que distinção específica se deve à aplicação deste ou daquele critério. O problema
dessa diversidade e heterogeneidade de critérios é que, dependendo da utilização, os resultados
classificatórios são completamente diferentes. E é aqui que se encontra o grande problema do ensino da
Língua Portuguesa.
Dessa forma, essa classe nos chamou a atenção, porque foi procurando entender essas
imprecisões que nos descortinou as muitas possibilidades que esses elementos adverbiais oferecem,
manifestas em suas distintas funções e múltiplas significações. Isso ocorreu especialmente com o grupo
de advérbios com terminação em –mente, que são classificados, segundo a gramática tradicional, como
advérbios de modo e que, na verdade, constitui-se em uma das mais complexas unidades de nosso
idioma.
Considerando que o falante ao pronunciar o seu discurso está sempre avaliando, julgando,
procurando influir sobre o comportamento do seu interlocutor, e que os advérbios em –mente têm se
mostrado um grande recurso para produzir essa argumentatividade, decidimos pelo estudo dessa “classe
de palavras”.
Estabelecemos, então, como objetivo geral para nossa pesquisa, a análise dos advérbios em –
mente. Dentre todos esses advérbios, verificaremos os conhecidos como “advérbios de frase”, os quais
funcionam como elemento modalizador do discurso e que em nosso trabalho serão denominados por
“disjuntos”.
Desenvolvimento
Um dos pontos de discussão e divergência entre os estudiosos da Língua Portuguesa é, sem
dúvida, a falta de uma descrição adequada a alguns fatos lingüísticos por parte da gramática tradicional.
Essa inadequação acarreta sérios problemas ao ensino da língua, tanto para os professores quanto para
os alunos. Aos primeiros, sobra insatisfação por trabalharem com um material considerado ultrapassado,
com muitas lacunas e, principalmente, pela falta de outros estudos que possam complementar e/ou
substituir a velha gramática; aos segundos, resta o desinteresse pela aprendizagem da língua vernácula,
pois não há, em muitos casos, relação entre a teoria e a prática.
Segundo Carneiro (1989), após muitos seminários, simpósios, congressos que tratam do
assunto, chega-se a algumas conclusões que podem auxiliar lingüistas interessados em diminuir os
contratempos das aulas de português. Essas conclusões se referem:
à falta de sistematização coerente da gramática; à inconsistência ou
inadequação da descrição dos fatos gramaticais; ao caráter
predominantemente normativo que apresenta; à consideração da língua
como um bloco homogêneo; à ausência de fundamentação teórica e
metodológica. (Carneiro, 1989: 09)
Um problema referente à teoria gramatical, incitado por Perini (1991), diz respeito à dualidade
de doutrinas gramaticais dentro da chamada gramática tradicional. Segundo ele, há duas doutrinas: uma
é a definição propriamente dita dos fatos lingüísticos; a outra é a prática de identificação dos mesmos. A
dificuldade dos estudantes é de relacionar a definição com a prática. Essas contradições são, em geral,
toleradas, e mesmo ignoradas, por aqueles que trabalham com a gramática tradicional.
Paralelamente às críticas, há também uma preocupação em encontrar soluções e até propostas
de uma descrição gramatical alternativa, segundo Carneiro (1989). É importante ressaltar que nessas
tentativas de melhorar a descrição da Língua Portuguesa, persiste a intenção de preservar a teoria
tradicional naquilo que ela tem de positivo e adequado.
Autores como Perini, Jubran & Risso (apud Carneiro, 1989), em suas propostas de uma nova
gramática do português, enfatizam a necessidade de fazer uma descrição sistemática e livre de
incoerências em que o dialeto padrão seja considerado como uma das possíveis variedades de língua
em meio às variantes regionais, sociais e situacionais. Como conseqüência, esse estudo “tanto poderá
servir de base para uma documentação científica do idioma, quanto ser aplicada sobretudo em situações
de ensino, com objetivos prescritivos que desvirtuam sua natureza descritiva” (Carneiro, 1989:11).
Podemos perceber que de todas as classes de palavras determinadas pela gramática, a classe
dos advérbios é a que foi modelada de maneira mais insatisfatória. “Parece que se incluíram nas
gramáticas sob a rubrica ‘advérbios’, todas as palavras com as quais não se sabia o que fazer. A sua lista
não se fecha nunca e não se lhe dá uma definição integrante” (Pottier apud Biderman, 1978:217). Dessa
forma, as palavras que compõem essa classe tem natureza e funções muitos diversas, pois ao lado dos
advérbios modificadores que são os que modificam o verbo, há preposições adverbiais, conjunções
adverbiais e até pronomes adverbiais. Essas inadequações não são exclusivas da gramática da Língua
Portuguesa, mas o Italiano, o Francês, o Espanhol também encontram dificuldades para elaborar uma
definição coerente do advérbio.
Muitos autores têm se dedicado ao estudo da classe adverbial sob diferentes enfoques. Um
deles, Ilari (1990) faz sua abordagem por meio de um estudo dos critérios de classificação, pois para ele,
essa classe apresenta limites imprecisos referentes aos critérios tradicionais.
Em relação ao critério morfológico, o advérbio tem um caráter de palavra invariável e de
modificador tipicamente de não-substantivos (características de natureza morfossintática). Recorre-se
também a critérios puramente morfológicos agrupando-se a essa classe todas as palavras derivadas com
o sufixo –mente.
Já o critério sintático é importante para definir em que ambientes as palavras da língua podem
entrar sem prejuízo à gramaticalidade da sentença, por isso, o advérbio é considerado relacionado
sintaticamente ao verbo, ao adjetivo ou a outro advérbio.
Um outro critério é o nocional. Conforme a Gramática Tradicional, o substantivo designa os
seres, ao passo que o adjetivo expressa características. Dessa maneira, as relações sintáticas do
advérbio, correlacionados às semânticas, indicam uma modificação do sentido da palavra. Assim, o
advérbio é definido por Ilari (1990:68) como modificador da “idéia expressa pelo verbo” ou denotador das
“‘circunstâncias’ em que se dá o processo a que ele faz referência”. Conseqüentemente a essa definição,
a NGB distingue o advérbio dos termos essenciais e integrantes, sendo ele um termo acessório na
oração.
A gramática mescla todos esses critérios na definição do advérbio. Ele é considerado, portanto,
“uma palavra invariável que modifica o verbo, o adjetivo e o próprio advérbio, acrescentando-lhe uma
circunstância” (Carneiro, 1989:13). Sobre essa definição, Franchi (apud Carneiro, 1989) e Ilari (1990)
concordam num ponto: além da mistura dos critérios, falta uma sistematização de sua hierarquia para
deixar claro que distinção específica se deve à aplicação deste ou daquele critério. Os autores lembram
que os estudiosos da língua não se dão conta da diversidade e heterogeneidade de critérios, deste
modo, não atentam de que a utilização de um ou outro conduz a resultados classificatórios
completamente diferentes.
A classe do advérbio, além de ser objeto de estudo de lingüistas de língua portuguesa, tem sido
objeto de lingüistas pertencentes às mais diversas teorias e idiomas, como inglês e espanhol. Os
progressos obtidos por esses estudiosos, contudo, ainda não se refletiram na sistematização gramatical,
porque as gramáticas continuam se repetindo tanto nas qualidades quanto nos defeitos, o que significa
repetir as mesmas incoerências e inadequações.
Um desses lingüistas, Quirk (apud Carneiro, 1989), fez um estudo muito revelador sobre os
advérbios em –mente. Primeiramente, ele destaca os elementos que considera constituintes da frase:
sujeito (S), verbo (V), objeto (O), complemento (C) e advérbio (A). O verbo é o elemento central,
normalmente obrigatório, em geral seguido pelo sujeito. Já o advérbio é um elemento periférico, ou seja,
na maioria das vezes opcional.
O autor elenca as características que determinam a centralidade do verbo: “sua posição é
normalmente medial mais do que inicial ou final; é normalmente obrigatório; em geral não pode ser
movido para uma posição diferente na frase; determina ou não a ocorrência de objeto ou complemento
na frase”. Faz o mesmo com advérbio que, ao contrário, é mais periférico: “ocorrem, mais
freqüentemente, em posição final; são comumente opcionais; desfrutam, geralmente, de certa
mobilidade; não determinam quais outros elementos ocorrem na frase” (Carneiro, 1989:71).
Ao tentar realizar uma descrição coerente de elementos tão díspares, Quirk define o advérbio
como um “spectrum of types”. Na ponta reúnem-se expressões de ocorrência obrigatória e na outra ponta
encontram-se aqueles intitulados advérbios de frase. Ele considera os advérbios como elemento
oracional por expressar categorias semânticas distintas; por desfrutar de uma certa liberdade posicional;
por desempenhar diferentes posições sintáticas; por estabelecer coesão textual.
Dessa forma, divide os advérbios em quatro grupos, classificados segundo o maior ou menor
grau de integração que apresentam à frase em que ocorrem. São os adjuntos, subjuntos, conjuntos e
disjuntos. Os adjuntos e os subjuntos caracterizam-se por determinar o verbo, ou o verbo e o objeto. Os
conjuntos estabelecem ligações entre duas unidades lingüísticas. Já os disjuntos expressam uma
avaliação do falante sobre a forma da comunicação ou sobre o seu sentido.
Os disjuntos são advérbios que expressam uma avaliação do que está sendo dito tanto em
relação à forma da comunicação, como ao seu conteúdo. Identificam-se com a autoridade do falante, ou
sua observação pessoal sobre a frase. Segundo Quirk (apud Carneiro, 1989), o disjunto é um elemento
adverbial cujo domínio se estende sobre a frase como um todo – portanto um advérbio sentencial – e que
revela avaliação do falante sobre seu enunciado. Um advérbio para ser disjunto deve, básica e
necessariamente, ser marcado por esses dois traços: a) ter a frase como escopo e b) traduzir julgamento
do falante.
Em (a) sintetizam-se os critérios sintático-semânticos definidos mediante a noção de escopo.
Do ponto de vista semântico, escopo pode ser entendido como conjunto de conteúdos semânticos sobre
os quais uma operação significativa atua. Do ponto de vista sintático, define-se a partir de sua
abrangência, dos elementos afetados em uma dada operação sintática, segundo Carneiro (1989). O
critério pragmático, também integrante do conceito do disjunto, manifesta-se em (b) na medida em que se
percebe uma indicação das intenções, sentimentos e atitudes do locutor com relação ao seu enunciado.
Como esses traços não são determinantes, há necessidade de elencar outros traços não
intuitivos que, com maior segurança, possam definir com precisão tais elementos: esses advérbios não
se encontram dentro do alcance da negação; podem aparecer inicialmente antes de orações negativas
separadas por vírgula (na escrita), ou por pausas (na fala); não ocorrem em orações interrogativas; não
podem ser o foco de uma oração clivada; podem aparecer em qualquer posição, mas a posição inicial –
quase sempre seguida de pausa – é privilegiada. As posições medial e final são também possíveis,
sempre que possível com a pausa mediando entre o advérbio e a oração; não impõem restrições
selecionais aos verbos da oração, pois não estão diretamente vinculados a eles, mas sim a oração como
um todo.
Classificação e Análise
Os advérbios em –mente que exercem a função de disjunto e integram a classe dos
modalizadores sentenciais, podendo ser preliminarmente divididos em dois grandes grupos: disjuntos de
forma e disjuntos de conteúdo.
Segundo Carneiro (1989), os disjuntos de forma expressam o comentário do falante sobre o
modo como a comunicação se realiza. Destacando não apenas o que é dito, mas sobretudo como é dito,
esses elementos envolvem uma observação implícita sobre a linguagem em si mesma.
Os advérbios que figuram o grupo do disjunto de conteúdo, por sua vez, manifestam uma
opinião do falante sobre o conteúdo dos mesmos. Este grupo subdivide-se em três: apreciativos,
asseverativos e concernência.
Os disjuntos apreciativos, como o próprio nome diz, traduzem uma apreciação do enunciador
sobre a mensagem que produz. Manifesta-se uma variação dos fatos, com matizes diversos da reação
emocional que provocam, sugerindo enquadramentos distintos; os de concernência delimitam o âmbito a
que concerne o fato enunciado, restringindo sua abrangência; já os asseverativos expressam uma
observação do falante sobre o valor da verdade do que é dito. Variam de acordo com uma escala
gradativa que vai desde a mais absoluta certeza do enunciador com relação aquilo que declara, até a
recusa de responsabilidade do juízo emitido. Distribuem-se em distintos agrupamentos, segundo o grau
de convicção que expressam.
No primeiro subgrupo, temos os disjuntos que expressam convicção do falante em relação ao
que afirma: logicamente, evidentemente, efetivamente, indubitavelmente, indiscutivelmente,
incontestavelmente, inquestionavelmente, realmente, verdadeiramente.
Os advérbios desse grupo admitem ser parafraseados por: (01) Tenho plena convicção de
que [SENTENÇA]
O texto escrito, ao contrário da fala, não é passageiro e fugaz, isso requer do enunciador
certeza e convicção sobre seu conteúdo. É através da segurança que transmite em seu texto que o faz
conquistar a cumplicidade do leitor. Os advérbios desse grupo atendem essa intenção. Percebemos
através dos exemplos que o enunciador assume inteira responsabilidade sobre seu enunciado:
(02) “... a assessoria do candidato divulgou uma nota
dizendo que, se o candidato gastasse 600 000 em avião, ficaria
cinco horas diárias no ar. ‘Isso, evidentemente, não aconteceu’,
escreveu o assessor de imprensa de Serra.” Veja 15/5/02 – 50
(03) “Por longo tempo fomos céticos a respeito de nós
mesmo e duvidamos se, realmente, o Messias político havia
chegado” FSP 1º/2/03 – A10
Nesses dois exemplos fica claro que o enunciado produzido pelo falante não admite dúvida
quanto ao seu valor de verdade.
Em relação a posição, os representantes de subgrupo aparecem intercalados e separados por
vírgulas.
O advérbio “realmente” foi o que teve maior ocorrência, porém nessas ocorrências esse item
lexical manifestava seu caráter enfatizador em construções onde desempenhava um papel distinto
daquele que analisamos:
(04) “O contrato foi renegociado no fim do anos passado,
com dispensa de licitação e em bases realmente extraordinárias,
que deram novo alento à saúde financeira da empresa de
Fontenelle” Veja 20/3/02 – 40
(05) “Assim, empresários podem até ter contribuído com
Murad, julgando que estavam auxiliando nos gastos de Roseana,
mas isso só se materializaria no momento em que o dinheiro
realmente fosse usado na campanha eleitoral – o que não
aconteceu” Veja 20/3/02 – 47
(06) “Será que qualquer palavra é ofensiva demais, agora
que as partes começaram a dizer o que realmente pensam no
desentendimento entre EUA, por um lado, e França e Alemanha,
por outro, em torno do Iraque?” FSP 24/1/03 – A13
Nesses exemplos, muda o escopo do advérbio, que deixa de funcionar como modificador
sentencial, passando à enfatizador de constituintes de frase por ele precedidos: adjetivo (04), locução
verbal (05) e verbo (06). A incidência sintática do advérbio se dá diretamente sobre tais termos. Como já
dissemos, um marcador de pausa é, quase sempre, indispensável no caso do disjunto em posição
intercalada (ver exemplos 02 e 03), notamos que nos exemplos dados os advérbios não vem marcados
por vírgulas ou outra pausa qualquer, o que comprova nossa análise.
No segundo subgrupo, são os disjuntos que expressam relativa convicção do falante em
relação ao que enunciam: certamente, seguramente.
(07) “Certamente nossos amigos aprenderam as lições
do passado.” FSP 22/1/03 – A11
(08) “Certamente não aceitaremos ser o flanco esquerdo
de um governo direitista.” FSP 30/1/03 – A14
Esses advérbios são empregados pelo locutor quando este, não absolutamente convicto da
verdade da proposição, assume relativa responsabilidade sobre sua autoria. Arrisca uma avaliação a
respeito do dito, evitando ser taxativo. Um texto escrito com esses modalizadores demonstra uma grande
probabilidade de ser verdadeiro, sem contudo, ser uma afirmação incontestável.
Todos os enunciados foram registrados em posição inicial. Importante destacar que nenhum
exemplo estava marcado por pausas, mas como dissemos anteriormente, no momento da leitura, ou
seja, na oralidade, essas pausa se faz presente.
Essa expressão apareceu, também, incidindo sobre constituintes específicos, conferindo-lhes,
cumulativamente, um tom enfatizador, como se observa em:
(09) “... uma guerra dos EUA contra o Iraque, que
certamente tentará envolver Israel.” FSP 29/1/03 – A13
Esse grupo de disjunto de expressão de convicção relativizada pode ser parafraseado por: (10)
Eu acredito que [SENTENÇA]
O advérbio “seguramente” não figurou em nenhum de nossos exemplos. Sobre ele,
Barrenechea (1977:321) afirma que “seguramente no há aparecido nunca como ‘afirmación rotunda’ o
como ‘modo de actuar com seguridad’”. Dessa forma, esse advérbio é utilizado em enunciados que se
adianta a hipótese não confirmada de que algo ocorreu ou ocorrerá, com muita probabilidade, mas não
com segurança total. Assim, sua paráfrase seria “é quase seguro que ...” e não “é seguro que ...”.
Finalmente, no terceiro subgrupo, os disjuntos expressam dúvida e insegurança do falante
sobre seu enunciado: provavelmente, possivelmente, aparentemente, presumidamente.
Em nosso corpus, o advérbio “provavelmente” foi o que mais teve ocorrência, ao passo que
“presumidamente” não teve nenhuma.
(11) “Aparentemente, Murad não fez nada para impedir
que Tostes integrasse o conselho da Sudam ...”. Veja 17/4/02 – 39
(12) “E, possivelmente, aceitariam um convite de Sharon
para voltar ao governo”. FSP 26/1/03 – A13
(13) “A decisão final será tomada, provavelmente, por
Powell e Bush”. FSP 31/1/03 – A14
Como podemos perceber nesses exemplos, as frases construídas com esses elementos
traduzem uma recusa de responsabilidade do locutor em relação ao juízo emitido. Essas formas
adverbiais orientam o discurso no sentido da hesitação e insegurança da afirmação nele contida. Dessa
maneira, retiram do texto o tom dogmático do falante, pois este ao escolher algum desses advérbios para
integrar sua mensagem, objetiva claramente atenuar a afirmativa.
Das 15 orações desse subgrupo, somente em 3 os advérbios em –mente aparecem em posição
inicial; o restante estão em posição medial, sempre marcados por pausa. Não há nenhum exemplo com o
disjunto no final da oração. Os advérbios “possivelmente” e “provavelmente” sempre estiveram
acompanhados de verbos no presente ou no futuro seja do presente ou do pretérito. Já com
“aparentemente”, os verbos estavam no pretérito.
A paráfrase adequada para os modalizadores sentenciais desse subgrupo pode ser: (14) Eu
não tenho certeza mas é [ADJETIVO] que [SENTENÇA]
Concluindo a análise dos disjuntos asseverativos, destacamos a prevalência exibida pelo
terceiro subgrupo com 15 ocorrências, sobrepondo-se ao primeiro com 03 e ao segundo com 04 casos. A
incidência desse advérbios é justificável na medida em que o locutor, às vezes, preocupado com a
responsabilidade sobre aquilo que afirma, não se engaja totalmente com o conteúdo veiculado;
cauteloso, constrói um asserção fraca, atenuada, procurando resguardar sua posição. Todos os textos do
nosso corpus, tem a política como contexto o que dificulta para o locutor afirmar com total certeza os
fatos que ocorrem no Brasil e no mundo.
Considerações Finais
Após a realização da análise, podemos inferir que as formulações de Quirk (apud Carneiro,
1989) alia os avanços da Lingüística à descrição gramatical das unidades da língua inglesa. Dessa
forma, o tratamento dispensado aos elementos intitulados advérbios parece recobrir todas as
possibilidades de ocorrência dessa classe, que estão distribuídos em quatro grandes grupos rotulados de
adjuntos, subjuntos, conjuntos e disjuntos.
De um modo geral, constatamos que as gramáticas normativas estabelecem que a ação do
advérbio recai sobre o verbo, o adjetivo e o próprio advérbio, mas notamos pelos exemplos encontrados
que não é bem assim, pois tal classe tem muito mais valor do que parece. Podemos verificar através dos
disjuntos que esses elementos podem alterar significativamente toda uma frase. A natureza sentencial e
a força modalizadora a eles subjacentes são atestadas em cada subgrupo que compõe essas
expressões.
Esperamos, futuramente, que as escolas e os autores de livros didáticos atentem para as
pesquisas lingüísticas, que procuram explicar alguns fatos da Língua Portuguesa, ainda incoerentes em
nossas gramáticas. Elementos como os disjuntos, que fazem parte do acervo lexical dos falantes,
utilizados em sua atividade comunicativa, não podem ser ignorados pelos gramáticos e professores.
Referências
BIDERMAN, M. T. C. Teoria Lingüística: lingüística quantitativa e computacional. Rio de Janeiro: Livros
Técnicos e Científicos, 1978.
CARNEIRO, I. C. Um recorte dos advérbios em –mente: contribuição para o estudo dos modalizadores
sentencias no português. Tese de Mestrado. Assis, 1989.
ILARI, R. Considerações sobre a posição dos advérbios. IN: CASTILHO, A. (org.). Gramática do
português falado. Vol. I: A ordem. Campinas, SP: Ed. da UNICAMP/FAPESP, 1990.
PERINI, M. A. Para uma nova gramática do português. 5ªed. São Paulo: Ática, 1991.
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