Pessimismo da vontade e otimismo da razão: um estudo sobre a teoria dos partidos e o Partido dos Trabalhadores Muitos são os trabalhos feitos no Brasil, em diversas áreas das ciências humanas, que utilizam o Partido dos Trabalhadores como objeto de análise. Revisitar este partido para realizar uma discussão original não nos parece tarefa fácil e tem difícil justificativa acadêmica. Felizmente, o trabalho que apresentamos aqui não se resume a uma pesquisa sobre a experiência partidária em questão. Esta é, acima de tudo, uma discussão sobre teoria dos partidos, que considera o resgate de alguns dos principais autores desta área científica, além do levantamento de sua referência em alguns importantes autores brasileiros que estudaram o PT. A partir disso, trataremos este partido como um todo repartido, fragmentado. A idéia é demonstrar também que o estudo da anatomia interna das agremiações partidárias é fundamental para sua compreensão. Mas o que é teoria? O que é partido? É possível enquadrar ou classificar o Partido dos Trabalhadores num modelo organizativo pré-concebido? São perguntas que para serem respondidas demandam uma pesquisa da produção acadêmica sobre este objeto da ciência política brasileira, e um balanço de suas principais contribuições. Neste capítulo inicial cabe a nossa dissertação apresentar sucintamente as referências dos conceitos que atribuímos aos nossos objetos de estudo. Posteriormente, cabe localizar a discussão teórica feita no Brasil sobre o tema que abordamos. Por fim, nos resta apontar as diretrizes deste trabalho, associando os conceitos a uma experiência histórica. Primeiramente, precisamos reconhecer que conceito de teoria e, consequentemente, que visão dentro da discussão de teoria dos partidos é aquela que nos apropriamos. A partir do conceito de práxis foi feita uma crítica à visão sobre a ciência e a teoria moderna, que revolucionou tais conceitos, sem extingui-los, dando novo significado a cada um deles. Da mesma maneira, que desta nova visão teórica surge o conceito de filosofia da práxis, desenvolvido por Antonio Gramsci, a partir dos Cadernos do Cárcere, que serve de alicerce fundamental a uma nova perspectiva para o debate sobre os partidos políticos. De uma nova visão sobre teoria que se fecunda nossa crítica à teoria geral dos partidos de Maurice Duverger, cujas bases filosóficas estão calcadas na lei de ferro das oligarquias de Robert Michels. O autor fundamental que critica e que, simultaneamente, serve de alternativa como referência na discussão teórica sobre partidos políticos é Umberto Cerroni. Seu trabalho se apropria da filosofia da práxis e a visão de Estado de Gramsci para reorientar o conceito de partido na modernidade, melhor dizendo, no capitalismo. Considerando duas vertentes antagônicas na discussão teórica da ferramenta partidária, destacamos um ponto de diálogo proporcionado por Giovanni Sartori em sua formulação sobre o partido visto de dentro, que também, em certa medida, aparece nas obras do autor sardo e comunista Antonio Gramsci. Sartori é um seguidor das ideias de Michels e Mosca, apontados por Cerroni como adeptos do ceticismo organizativo. Esta caracterização adjetiva essa vertente como oposta ao pensamento marxista. No entanto, ao considerar os partidos como unidades composta por “subunidades partidárias” (SARTORI, 1982, p. 93), Sartori converge com um aspecto da visão sobre partido de Gramsci, que afirmou que “os partidos orgânicos e fundamentais dividiam-se em frações” (COUTINHO, 2011, p. 302). Vamos abordar os limites desta comparação mais a frente. Mas este trabalho não tem seu objeto principal a discussão teórica sobre os partidos, nem é apenas mais um estudo sobre o PT. Democracia Socialista e Convergência Socialista podem ser confundidas em grande parte de sua história com o partido de sua filiação formal e legal, mas são propostas que não se resumem a isso. Mesmo assim, o partido fundado em 1980 oficialmente, liderado por Luís Inácio da Silva, é um dos cenários mais ricos das intervenções destes coletivos políticos. Cabe, por essa razão, um resgate das abordagens de Rachel Meneguello, Oswaldo Amaral, Eurelino Coelho e Lincoln Secco. Os dois primeiros autores citados adequam seus trabalhos a teoria geral dos partidos, do cientista político francês Maurice Duverger, enquanto que Coelho e Secco abordam o PT com variações do marxismo e, acima tudo, uma perspectiva histórica de análise. O resgate das obras sobre a experiência petista não foi ampla, mas a serviço do propósito de situar qual abordagem este trabalho optou, ao relacionar a teoria marxista com a teoria dos partidos políticos. Estudamos tendências de um partido de tendências, subunidades de uma unidade partidária, e frações de um partido orgânico. Sua complexidade também é sua compreensão plena. Suas contradições não estão numa direção definida, mas na intensidade de seus conflitos internos, que superam o aspecto organizativo, e alcançam a política, o programa. O partido nada mais é, para Sartori, no entanto, “um agregado de pessoas que formam uma constelação de grupos rivais” (SARTORI, 1982, p. 94). Convenciona afirmar que quando suas frações ou subunidades apontam para a identidade de facções, isso passa por grupos mais coesos internamente e sectários na disputa partidária, opondo-se ao formato de tendência. Considerando que “a natureza de um partido está na natureza de suas frações” (Idem, ibidem, p. 97), na perspectiva sartoriana dos partidos, mais do que a identidade de um modelo de partido com um sistema político, é preciso estudar a anatomia dos mesmos, para que seja completa a análise política. Neste sentido, encarar os partidos como uma variável independente reflete-se na importância de sua análise interna. Bibliografia das citações: COUTINHO, Carlos Nelson. O leitor de Gramsci: escritos escolhidos: 1916-1935. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. SARTORI, Giovanni. Partidos e sistemas partidários. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.