EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA GEOGRAFIA O OBJETO DA GEOGRAFIA O que é Geografia? Múltiplas definições: Geografia como estudo da superfície terrestre – vaga e usual. Descrição da terra (significado etimológico do termo). Descrição de todos os fenômenos manifestados na superfície do planeta (síntese de todas as ciências). Concepção originada das formulações de Kant: classes de ciências: ↗ Especulativas (razão) ↘ Empíricas (observação / sensações) Geografia – Síntese dos conhecimentos sobre a natureza. Estudo da paisagem – aspectos visíveis do real (tônica descritiva). Estudo da individualidade dos lugares – deveria abarcar todos os fenômenos que estão presentes numa dada área, tendo por meta compreender o caráter singular de cada porção do planeta. Essa perspectiva teria suas raízes em atores da Antiguidade Clássica: Heródoto ou Estrabão – estudos mostram os traços naturais e sociais das terras por onde andaram. Estudo da diferenciação de áreas – busca individualizar as áreas, tendo em vista comparálas com outras. Estudo do espaço – questão polêmica: o que é espaço? Estudo das relações entre o homem e o meio / sociedade e natureza. Disciplina de contato entre ciências naturais e humanas. O POSITIVISMO COMO FUNDAMENTO DA GEOGRAFIA TRADICIONAL O positivismo reduz a realidade ao mundo dos sentidos (aparência dos fenômenos) restringindose aos aspectos visíveis do real, mensurável e palpável, onde o cientista é um mero observador. A geografia é uma ciência empírica, pautada na observação – visão empobrecedora da realidade. No pensamento geográfico tradicional existe um profundo naturalismo, já que o homem vai aparecer como um elemento a mais da paisagem, como um dado do lugar, como mais um fenômeno da superfície da Terra. A geografia sempre procurou ser uma ciência natural dos fenômenos humanos (perspectiva naturalizante). ORIGENS E PRESSUPOSTOS DA GEOGRAFIA ATÉ O FINAL DO SÉCULO XVIII O conhecimento geográfico se encontrava disperso, sem um conteúdo unitário, contudo houve uma primeira valorização do temário geográfico, devido as correntes filosóficas da época que propunham explicações abrangentes do mundo e formulavam sistemas que buscam a compreensão de todos os fenômenos do real. O que se entende por geografia hoje não era apresentado com este rótulo. Não é possível falar de conhecimento geográfico, como algo padronizado, com um mínimo que seja de unicidade temática, e de continuidade nas formulações. É impossível falar dessa disciplina como um todo sistematizado e particularizado. Nélson Werneck Sodré denominou-o de “pré-história da Geografia”. INÍCIO DO SÉCULO XIX Ocorre a sistematização do conhecimento geográfico em função das condições históricas. A terra estava toda conhecida. A Europa articulava um espaço de relações econômicas mundializado, o desenvolvimento do comércio punha em contato os lugares mais distantes. O colonizador europeu detinha informações dos pontos mais variados da superfície terrestre. As representações do globo estavam desenvolvidas e difundidas pelo uso cada vez maior dos mapas, que se multiplicavam, sendo este o instrumento por excelência do geógrafo. Era necessário que a Terra toda fosse conhecida para que fosse pensada de forma unitária o seu estudo. O conhecimento da dimensão e da forma real dos continentes era a base para a idéia de conjunto terrestre, concepção basilar para a reflexão geográfica, condição que só pode realizar-se com as “Grandes Navegações” e as conseqüentes descobertas, efetuadas pelos Europeus, a partir do Quinhentismo. A constituição de um espaço mundial plenamente constituído em fins do século XIX, que tem por centro difusor a Europa, é elemento destacado do processo de transição do feudalismo para o capitalismo. Existia um repositório de informações sobre variados lugares da Terra, incidindo na formação de uma base empírica para a comparação em Geografia. O levantamento de realidades locais, em número elevado, aparece como fundamento de uma reflexão geográfica sólida que deveria ir além do simples conhecimento de novas terras, sendo necessário penetra-las e criar aí estabelecimentos constantes, enfim apropria-las. A Geografia da primeira metade do século XIX foi, fundamentalmente, a elaboração desse material. Outra fonte de sistematização geográfica pode ser detectada nos pensadores políticos do Iluminismo que foram os porta-vozes do novo regime político, os ideólogos das revoluções burguesas e os propositores da organização institucional. Temas próprios da Geografia – formas de poder e de organização do Estado. O temário geográfico vai obter o pleno reconhecimento de sua autoridade com o aparecimento das teorias do Evolucionismo que forneceram o patamar imediato da legitimação científica dessa disciplina e a Geografia teve uma base científica sólida para suas indagações no meio acadêmico da época. As teorias evolucionistas foram, em grande parte, responsável pela metodologia naturalista, que impregnou as propostas dos primeiros geógrafos e que passou, como herança, aos seus sucessores. A SISTEMATIZAÇÃO DA GEOGRAFIA: HUMBOLDT E RITTER Todo o eixo principal da elaboração geográfica no século XIX, estará sediada na Alemanha e é nesse país que aparecem os primeiros institutos e as primeiras cátedras dedicadas a esta disciplina; é de lá que vêm as primeiras teorias e as primeiras propostas metodológicas; enfim, é lá que se formam as primeiras correntes deste pensamento geográfico. Os autores que estabeleceram uma linha de continuidade nesta disciplina são os autores alemães Humboldt e Ritter, considerados os pais da geografia. Por que a Geografia surge na Alemanha? Porque a questão do domínio e organização do espaço era primordial para a apropriação do território e o conhecimento regional. As primeiras colocações, no sentido de uma Geografia sistematizada, vão ser a obra de Alexandre von Humboldt e Karl Ritter que compõe a base da Geografia Tradicional. Humboldt entendia a Geografia como a parte terrestre da ciência do cosmos,isto é, como uma ciência de síntese de todos os conhecimentos relativos à terra, propondo o uso da intuição a partir da observação sem privilegiar o homem, onde o geógrafo deveria contemplar a paisagem de uma forma quase estética(passiva). Ritter entendia que a Geografia deveria estudar os arranjos individuais de uma área delimitada e compará-los, tendo que compreender a predestinação dos lugares que seria a tarefa do conhecimento geográfico, onde o homem seria o principal elemento. Sua proposta é antropocêntrica e regional(individualidade), valorizando a relação homemnatureza, apesar do homem ainda ser sujeito da natureza e desse autor ainda reforçar a análise empírica. RATZEL E A ANTROPOGEOGRAFIA Um revigoramento do processo de sistematização da Geografia vai ocorrer com as formulações do alemão Friedrich Ratzel que definiu o objeto geográfico como o estudo da influência que as condições naturais exercem sobre a humanidade, privilegiando o elemento humano. A Geografia continua como ciência empírica, cujos procedimentos de análise seriam a observação e a descrição, mantendo a visão naturalista que levou à constituição da “Escola Determinista” de Geografia, ou doutrina do “Determinismo Geográfico” apesar de aceitar que existem algumas influências(físicas) que condicionam o homem. Sua doutrina era expansionista e imperialista, onde conquistar novos territórios era vital, porque espaço é sinônimo de poder. PAUL VIDAL DE LA BLACHE E A GEOGRAFIA HUMANA A Geografia foi colocada como disciplina em todas as séries do ensino básico da França, sendo criadas, nessa época, as cátedras e os institutos de Geografia, também com o intuito expansionista, apesar de vestir uma capa de neutralidade no discurso científico, ou seja, dizer que as questões políticas não deveriam ser discutidas e que o estudo de Geografia não deveria ter qualquer tipo de interesse ideológico. Defendeu o componente criativo(a liberdade) contido na ação humana, que não seria apenas uma resposta às imposições do meio. Essa foi a contribuição mais importante para o desenvolvimento do pensamento geográfico. Vidal de La Blache definiu o objeto da Geografia como a relação homem-natureza na perspectiva da paisagem, colocando o homem como um ser ativo, que sofre a influência do meio porém atua sobre ele, transformando-o, portanto, a natureza passou a ser vista como possibilidades para a ação humana, daí o nome de Possibilismo dado a esta corrente que se tornou majoritária no pensamento geográfico. O fundamento positivista aproxima as concepções de Ratzel e de La Blache, além da carga naturalista, já que apenas a relação homem-natureza é vista e não as relações entre os homens. ALÉM DO DETERMINISMO E DO POSSIBILISMO: A PROPOSTA DE HARTSHORNE Outra grande corrente do pensamento geográfico é a Geografia Racionalista, devido sua menor carga empirista, em relação às anteriores, estando vinculada aos nomes de Alfred Hettner e Richard Hartshorne. Hettner vai propor a Geografia como a ciência que estuda “a diferenciação de áreas” visando explicar “por quê” e “em que” diferem as porções da superfície terrestre, apreendido ao nível do censo comum. Essa diferença advém da forma de inter-relação dos fenômenos aí existentes. Hartshorne vai dizer que a Geografia seria um estudo das inter-relações entre os fenômenos heterogêneos estudados por outras ciências e sua complexidade, apresentando-as numa visão sintética, entendo o objeto da Geografia como um “ponto de vista”, onde esta deveria estudar a “variação de áreas”. O MOVIMENTO DE RENOVAÇÃO DA GEOGRAFIA Manifesta-se em meados da década de 50 e se desenvolvem aceleradamente nos anos posteriores. A partir de 1970, a Geografia Tradicional está definitivamente enterrada, suas manifestações, dessa data em diante, vão soar como sobrevivência, resquícios de um passado já superado. Instala-se, de forma sólida, um tempo de críticas e de propostas no âmbito dessa disciplina. Os geógrafos vão abrir-se para novas discussões e buscar caminhos metodológicos até então não trilhados e horizontes futuros, introduzindo um pensamento crítico. O processo histórico levou a Geografia a esse movimento (modo de produção capitalista, revolução tecnológica, realidade complexa – urbanização, quadro agrário, indústrias, globalização...), que não possui uma unicidade, representando uma dispersão. A GEOGRAFIA PRAGMÁTICA Efetua crítica apenas à insuficiência da análise tradicional e ataca, principalmente, o caráter não prático da Geografia Tradicional. Os autores pragmáticos buscam uma “renovação metodológica”, novas técnicas e uma nova linguagem, criando uma tecnologia geográfica que dê conta das novas tarefas postas pelo planejamento. Possuem o mesmo conteúdo de classe que se torna “inquestionável”, ou seja, o mesmo cunho ideológico, sendo apenas a continuidade da Geografia Tradicional, baseada no positivismo (observação direta) como uma nova roupagem: a Geografia pragmática, baseada no neopositivismo (empirismo mais abstrato – estatística). Existe um empobrecimento do grau de concretude do pensamento geográfico. A GEOGRAFIA CRÍTICA Esta denominação advém de uma postura crítica radical, por uma transformação da realidade social, pensando o seu saber como uma arma desse processo e dotado de um conteúdo político que pode, através da análise geográfica, ser um instrumento libertador do homem, já que desmistificam a pseudo “objetividade” da ciência geográfica e seu caráter ideológico. Esta é a via revolucionária de renovação do pensamento geográfico, que agrupa aqueles autores imbuídos de uma perspectiva transformadora, que negam a ordem estabelecida, que vêem seu trabalho como instrumento de denúncia e como arma de combate, apesar de manter a tônica descritiva e empirista, assim, limitava-se a um estudo das aparências, sem possibilidade de indagar a respeito da essência dos problemas. BIBLIOGRAFIA: MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia: Pequena História Crítica. 13 ed. São Paulo. Hucitec, 1994.