VI SEMEAD PESQUISA QUANTITATIVA FINANÇAS Aspectos da Teoria de Portfolio em Mercados Emergentes: Uma Análise de Aproximações para a Taxa Livre de Risco no Brasil Héber Pessoa da Silveira Mestrando em Administração Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo. Endereço: Avenida Brigadeiro Luis Antonio, 3249 apto. 103 Jardim Paulista Cep. 01.401-001São Paulo-SP. Fone: (11) 3885.1385 e-mail: [email protected] Lucas Ayres Barreira de Castro Barros Doutorando em Administração Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo. Endereço: Rua Florália, 103 Jardim Atibaia Cep 05451-130 São Paulo – SP. Fone: (11) 3871.2689 e-mail: [email protected] Rubens Famá Professor Doutor do Departamento de Administração Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo. Endereço: Rua Morás, 656 apto. 5 Vila Madalena Cep 05434-020 São Paulo - SP Fone: (11) 3814.8152 e-mail: [email protected] 1 Aspectos da Teoria de Portfolio em Mercados Emergentes: Uma Análise de Aproximações para a Taxa Livre de Risco no Brasil RESUMO A taxa de retorno total de qualquer investimento em uma situação de equilíbrio é composta por duas partes distintas, quais sejam: o prêmio pelo risco sistêmico (medido pelo beta do ativo) e uma taxa pura de juros (ou taxa livre de risco), que seria o prêmio pela postergação do consumo. Parte daí que um ativo livre de risco deve ter, por definição, um beta igual a zero. A estimação desse coeficiente pode então ser utilizada como forma de se analisar qual ou quais taxas existentes no mercado se mostram adequadas ao conceito teórico de livre de risco. O presente trabalho estima os betas e analisa algumas características das séries temporais de taxas comumente utilizadas como aproximações para a taxa livre de risco no mercado brasileiro e americano, notadamente a estacionariedade das séries de Certificados de Depósito Interbancário (CDI), C-Bonds, Caderneta de Poupança e dos Treasury Bonds (T-Bonds) americanos. Os resultados da estimação dos betas sugerem a adequação das taxas do CDI, da caderneta de poupança e dos T-Bonds como livres de risco, enquanto o C-Bond mostrou-se inadequado, pois capta em seu retorno parte do risco sistêmico. A análise das séries temporais, por sua vez, sugere que as séries de cotações (C-Bond e T-Bond) possuem uma e somente uma raiz unitária no período analisado, ou seja, sua primeira diferença se mostra estacionária, o que permite a estimação dos betas das séries pelos procedimentos comumente utilizados na análise estatística. No caso das séries da caderneta de poupança e do CDI, que já estão na forma de taxas, a primeira apresentou-se como estacionária, enquanto a taxa do CDI apresentou uma raiz unitária. A conclusão dos testes aponta para a possibilidade de trabalho pelos métodos de análise usuais com todas as taxas, a exceção do CDI, a qual demanda maior aprofundamento no tratamento estatístico. 1. INTRODUÇÃO Segundo Black (1996, p. 531), toda a estrutura de um mercado financeiro depende da liquidez dos títulos nele transacionados, pois nos casos onde as transações não são freqüentes, mecanismos como os fundos mútuos, os portfolios diversificados, os derivativos, e outros mecanismos utilizados em mercados mais líquidos dificilmente poderão ser praticados em sua plenitude. No caso de países emergentes, a exemplo do Brasil, essas disfunções dificultam fortemente a observação de variáveis que possam servir de aproximação a conceitos teóricos. Seja pela escassez de dados ou pelo excessivo ruído apresentado nas cotações, análises empíricas em mercados emergentes freqüentemente demandam maior esforço no tratamento estatístico das variáveis e na busca dessas aproximações. Exemplo claro de problemas relacionados à escassez de variáveis adequadas em países emergentes são comuns quando da aplicação no Brasil do Capital Asset Pricing Model (CAPM). A fórmula final do modelo, representada em (1), possui duas variáveis não diretamente observáveis, e que demandam aproximações para serem mensuradas: E Ri R f E Rm R f 2im (1) m 2 As aproximações mais comumente utilizadas para o retorno do portfolio de mercado ( Rm ) e para a taxa livre de risco ( R f ) são, respectivamente, índices de bolsas de valores, a exemplo do Ibovespa, e retornos de títulos públicos como o C-Bond, ou taxas como o CDI e a caderneta de poupança. Problemas relacionados ao uso dessas aproximações são entretanto comuns, e lavam a freqüentes erros de interpretação. Um exemplo de como aproximações inadequadas podem levar a erros de interpretação dos dados foi fornecido por Roll e Ross (1994), os quais verificaram que, caso a aproximação utilizada para a mensuração do portfolio de mercado não seja ex ante eficiente, isto é, não se localize exatamente sobre a fronteira mas sim dentro da fronteira eficiente de investimentos com risco, a regressão do beta como variável explicativa do retorno apresentará um coeficiente de determinação r 2 próximo de zero. Vale observar também no estudo que a existência mesmo de pequenas distâncias entre a carteira de mercado observada e a fronteira eficiente é suficiente para destruir o efeito da correlação entre betas e retorno. Copeland, Koller e Murrin (1995, p. 420-421), afirmam ser notadamente difícil em mercados emergentes a observação não somente do portfolio de mercado, mas também de um título público cujo retorno possa servir de aproximação para a taxa livre de risco. Erros decorrentes da utilização de aproximações inadequadas na determinação do portfolio de mercado e da taxa livre de risco podem ser reduzidos sempre que as aproximações utilizadas não possuam comportamento muito discrepante do esperado em termos teóricos. O presente analisa uma dessas variáveis, no caso a taxa livre de risco (risk free rate), para o mercado brasileiro. Algumas aproximações possíveis para essa taxa são analisadas, assim como a estrutura de suas séries temporais. Para a estimação do risco das taxas foram utilizados tanto o método usual de mínimos quadrados ordinários quanto métodos de regressão robusta. 2. REVISÃO DA LITERATURA No conceito teórico, um ativo livre de risco é aquele em que o investidor sabe exatamente o valor que receberá ao final do prazo de investimento. Não haver incerteza quanto ao valor a ser recebido pressupõe portanto um desvio padrão do retorno do ativo igual a zero e, conseqüentemente, um β igual a zero. Sharpe, Alexander e Bailey (1999) aprofundam a definição e afirmam que dadas as características do ativo livre de risco, o mesmo deve ter um retorno fixo e sem possibilidades de não pagamento (default) em seu vencimento. Além disso, o prazo de vencimento do ativo deve coincidir com o período em que o investidor deseja mantê-lo. Usando a taxa de um título público como aproximação para a taxa livre de risco, caso haja divergência entre o prazo de vencimento do título e o período em que o mesmo será mantido pelo investidor, este terá de (i) vender o título no mercado secundário (caso o período de manutenção do título seja menor que o prazo de vencimento do mesmo) ou (ii) reinvestir o valor recebido no vencimento do título (caso o prazo de vencimento seja inferior ao período que o investidor se mostra disposto a abrir mão do consumo). Ambos os casos apresentados possuem aspectos de risco. No primeiro caso há o risco de variação na taxa de juros, de modo que o investidor pode ter de vender o título a um preço menor que o esperado inicialmente. No segundo caso há o risco do investidor não conseguir reinvestir à mesma taxa do título original. Exemplos de títulos públicos utilizados nos Estados Unidos como aproximações para a taxa livre de risco são os títulos do tesouro (T-Bonds) com vencimento para 30 anos. No caso do Brasil, o título público mais fortemente transacionado é o Brazilian Capitalization Bond (CBond). Esse título é o mais freqüentemente transacionado entre todos os chamados Brady bonds no mundo e possui uma taxa fixada de rendimento quando de sua emissão. Alguns problemas entretanto podem surgir da utilização do retorno desse título como aproximação da taxa livre de 3 risco. O primeiro problema decorre do risco de default de tais títulos, o que é por definição contrário à mensuração de uma taxa livre de qualquer forma de risco. A diferença entre a taxa paga por estes títulos e as taxas pagas pelos T-Bonds é apontada inclusive como uma medida do risco país (Garcia e Didier, 2000). 3. METODOLOGIA DE TESTES E RESULTADOS O primeiro passo da análise das taxas se deu pelo cálculo1 do dos T-Bonds com o S&P 500 assim como o dos C-Bonds com o Ibovespa. O método utilizado foi o de mínimos quadrados ordinários. Abaixo são colocados os resultados observados, com o erro padrão dos coeficientes entre parênteses: T-Bond 30 anos x S&P 500 T-Bond = 0,0003738 + 0,05540 S&P500 (0,00032) (0,0306) No caso da taxa norte americana, o coeficiente não se mostra estatisticamente significante (diferente de zero) a 5%, e o coeficiente de determinação r2 da regressão aproxima-se de zero (0,002), demonstrando ser desprezível a correlação entre as variáveis. As conclusões da regressão demonstram que, em termos de correlação com o mercado, o T-Bond americano se mostra condizente com o conceito teórico de taxa livre de risco. No caso brasileiro entretanto o resultado da regressão foi dado por: C-Bond x Ibovespa C-Bond = 0,000187 + 0,327053 Ibov (0,00029) (0,0112) O coeficiente nesse caso se mostrou significante (estatística t de 29,081). O coeficiente r da regressão, por sua vez, foi de 0,418, demonstrando haver correlação positiva entre as variáveis, o que vai de encontro ao esperado em termos teóricos2. Dado que o C-Bond apresenta correlação com o mercado e um significante, a utilização do mesmo como aproximação da taxa livre de risco mostra-se inadequado. A mesma metodologia utilizada até aqui pode ser aplicada para duas outras possíveis aproximações na taxa livre de risco do Brasil, que são o retorno do Certificado de Depósito Interbancário (CDI) e o retorno da Caderneta de Poupança. No caso dos retornos da caderneta de poupança, o ativo comporta-se de acordo com a definição teórica da taxa livre de risco no que diz respeito à sua correlação com outros ativos existentes na economia. O resultado da regressão do retorno da Caderneta de Poupança com o Ibovespa foi dado por: 2 Poupança x Ibovespa Poup = 0,000315 + 0,000135 Ibov 1 Para os cálculos que se seguem foi utilizada a base de dados Economática, com as taxas de retorno diárias já ajustadas para a inflação. O período analisado foi de jan 1997 a set 2001 totalizando 1203 observações. 2 Para se calcular o β através de aproximação pelo coeficiente B1 da regressão, o modelo deve apresentar aderência às principais hipóteses de uma regressão OLS. O resultado do teste de Kolmogorov-Smirnov permitiu considerar que os termos de erro da regressão se apresentam normalmente distribuídos ao nível de 5% de significância, enquanto a estatística de Durbin-Watson (d = 1,996) para detecção de autocorrelação de primeira ordem demonstrou não haver autocorrelação relevante nos resíduos. Para montagem do modelo de regressão alguns outliers foram identificados e removidos utilizando-se a medida de Distância de Cook, pois a amostra inicial com todas as observações presentes não permitia a suposição de normalidade dos resíduos da regressão. De um universo de 1203 observações 24 foram removidas como outliers. 4 (0,000003) (0,0001) O coeficiente não se mostrou estatisticamente significante a 5%, e o coeficiente r2 da regressão foi desprezível (0,001). Outra possível aproximação para a taxa livre de risco no Brasil é o retorno do Certificado de Depósito Interbancário (CDI). A mesma metodologia utilizada anteriormente quando aplicada ao CDI fornece como resultado CDI x Ibovespa CDI = 0,000809 + 0,000671 Ibov (0,00000) (0,00026) Nesse caso o coeficiente , apesar de estatisticamente significante a 5%, se mostra desprezível em magnitude, assim como o coeficiente r2 da regressão (0,00592). De acordo com o resultado da regressão, também o CDI se mostra, no Brasil, uma aproximação adequada em termos teóricos para a taxa livre de risco. Os resultados verificados até o momento sugerem a existência no Brasil de duas taxas livres de risco distintas. Os testes realizados devem entretanto ser refinados de modo a se evitar vieses na estimativa dos betas. Segundo Koutmos, 1998 apud Huang e Yang, 2000, é característica dos retornos de ações em mercados emergentes a presença de autocorrelação positiva nas séries históricas. Outras características são a existência de agrupamentos na volatilidade, que levam a heteroscedasticidade, e medidas de curtose que, em conjunto, não permitem a suposição de normalidade. Dado que o método de mínimos quadrados ordinários necessita para sua aplicação das hipóteses de normalidade e independência dos retornos, os betas encontrados até aqui podem sofrer de viés decorrente da estimação inadequada. 3.1. Estimação Robusta do Beta dos Ativos Para a verificação estatística do comportamento das taxas no Brasil utilizou-se, além de mínimos quadrados ordinários, um procedimento de estimação robusta dos modelos, relacionando o CDI, a poupança e o C-Bond ao retorno do portfolio de mercado, dado pelos retornos diários do índice Bovespa. O método de estimação por regressão robusta é sugerido para o mercado brasileiro, dentre outros autores, por Mendes e Duarte, 1998, pois nesse mercado as séries temporais apresentam valores extremos em quantidade substancial, capazes de exercer influências indesejáveis sobre as estimativas obtidas com procedimentos usuais. Ademais, as características dessas séries violam hipóteses fundamentais de um modelo de regressão linear estimado por mínimos quadrados ordinários, apresentando forte heteroscedasticidade, correlações seriais, que podem acontecer em ordens superiores a 1 e portanto que não são captadas pelo teste de Durbin-Watson, e desvios de normalidade. Todas essas características são levadas em conta nos modelos robustos, resultando em estimativas mais confiáveis para os betas. A tabela 1 apresenta os níveis de significância observada para os testes de Jarque-Bera para normalidade da série histórica, teste de White para a presença de heteroscedasticidade e teste ARCH para presença de autocorrelação nas séries históricas do C-Bond, CDI e poupança. Tabela 1 – Nível de significância observado em testes para normalidade, heteroscedasticidade e autocorrelação nas séries históricas. Teste C-Bond CDI Poupança Jarque-Bera White Heteroscedasticity 0,000* 0,000* 0,000* 0,003* 0,000* 0,513 5 ARCH Test 0,000* 0,000* 0,000* * - Hipótese nula rejeitada a 1% Conforme pode ser verificado nos resultados, as três séries apresentaram-se não normalmente distribuídas, o C-Bond e CDI apresentaram variância não constante ao longo do tempo e todas as séries mostraram-se autocorrelacionadas. O teste de Durbin-Watson realizado anteriormente para o C-Bond e que não permitiu a rejeição da hipótese de ausência de autocorrelação deve ser analisado com cautela, visto que testa apenas para a existência de autocorrelação de primeira ordem. Nesse sentido, o teste ARCH mostra-se mais robusto e preciso, pois verifica a existência de autocorrelação de ordens superiores. O teste de KolmogorovSmirnov anteriormente realizado apenas permitiu considerar a hipótese de normalidade após a exclusão de outliers da amostra. Dadas as características verificadas nas séries históricas das taxas de juros no Brasil, um método que depende de normalidade, homoscedasticidade ou ausência de autocorrelação nas séries, a exemplo do método de mínimos quadrados ordinários, se mostra pouco preciso e não confiável para a estimação do coeficiente procurado. Para se estimar o beta das taxas com maior precisão foram utilizados modelos de estimação por regressão robusta conforme sugerido por Mendes e Duarte, 1998. Segundo Neter et al., 1996, regressões robustas podem prover melhores ajustes e estimativas que o método de mínimos quadrados ordinários ao diminuir a influência de observações extremas. O modelo utilizado aqui foi o de mínimos quadrados reponderados iterativamente, utilizando a função de peso do tipo bisquare. Esse modelo atribui pesos à observação de acordo com quão fora essa observação se encontra do padrão dos dados, para isso baseando-se no resíduo da observação. Os pesos são posteriormente utilizados para diminuir a influência da observação e revisados após cada iteração até que um ajuste robusto seja encontrado (Neter et al., 1996). 3.1.1. Estimação Robusta – C-Bond O modelo estimado para o C-Bond pelo método de mínimos quadrados reponderados iterativamente foi: C-Bond x Ibovespa C-Bond = 0,0003 + 0,2723 Ibov (0,0003) (0,0095) A estatística t do coeficiente angular foi de 28,7297, mantendo-se a significância praticamente inalterada em relação ao anteriormente estimado por mínimos quadrados ordinários. A maior modificação se deu em relação à magnitude do estimador, que decresceu de modo consistente com o esperado, pois as observações extremas, que levavam a uma superestimação do coeficiente, receberam pesos menores no novo modelo de estimação. A especificação do modelo de regressão robusta pode ser feita para diversas funções de peso distintas (Du Mouchel e O´Brien, 1989). Na busca de um melhor estimador foram testadas as funções de peso (i) andrews, (ii) bisquare, (iii) cauchy, (iv) fair, (v) huber, (vi) logistic, (vii) talwar e (ix) welsch. Implementou-se sucessivamente cada uma destas versões, na ordem acima colocada. Em seguida, reuniu-se em uma tabela as saídas de cada estimador mais importantes para a pesquisa, quais sejam: os coeficientes beta estimados em cada caso, suas respectivas estatísticas t e valores-p destas estatísticas. Os resultados (C-bond x Ibovespa) são mostrados abaixo. Tabela 2 – Coeficientes, estatística t e significância observada para diferentes funções de peso na regressão robusta. Função Coeficiente Angular Estat. t Valor-p 6 Andrews Bisquare Cauchy Fair Huber Logistic Talwar Welsch 0.2718 0.2723 0.3093 0.3414 0.3235 0.3281 0.2622 0.2819 28.6849 28.7297 32.1440 33.9235 33.1717 33.3372 26.1794 29.7459 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 Pode-se verificar na tabela que os dados se mostram qualitativamente estáveis, com o coeficiente significante a 1% independentemente da função peso utilizada. 3.1.2. Estimação Robusta – Poupança e CDI A mesma metodologia empregada para o C-Bond foi utilizada para a estimação dos betas da Caderneta de poupança e do CDI. Para a caderneta de poupança o resultado foi dado por: Poupança x Ibovespa Poup = 0,00029 + 0,00012 Ibov (0,000003) (0,000098) Dado que a caderneta de poupança no Brasil possui uma variância praticamente igual a zero, os resultados encontrados pelo modelo de regressão robusta diferem muito pouco daqueles encontrados por mínimos quadrados ordinários. O uso das diferentes funções de peso nesse caso foram indiferentes, dado que os resultados mostraram-se qualitativamente estáveis, com os coeficientes beta não significantes a 5% em nenhum dos casos. A magnitude das variações das taxas ao longo do tempo nesse caso são desprezíveis, de modo que a utilização ou não de um tratamento robusto para outliers possui pouca relevância na magnitude do beta estimado. No caso do CDI verificou-se como resultado da estimação por mínimos quadrados reponderados: CDI x Ibovespa CDI = 0,00070 + 0,00011 Ibov (0,000003) (0,00011) O coeficiente angular não se mostrou significante a 5%, na primeira estimação, entretanto, ao se testar as diferentes funções de peso anteriormente citadas, os resultados não se mostraram qualitativamente estáveis. Em alguns casos, o coeficiente angular mostra-se significativo. Há boas razões, porém, para acreditar que os melhores resultados são aqueles que apontam para a não significância do coeficiente, pois estes cuidam com maior precisão dos grandes outliers. Os resultados dos estimadores para diferentes funções de peso são mostrados na tabela 3. Tabela 3 – Coeficientes, estatística t e significância observada do C-Bond para diferentes funções de peso na regressão robusta. Função Coeficiente Angular Estat. t Valor-p Andrews Bisquare Cauchy Fair Huber Logistic Talwar Welsch 0.0001 0.0001 0.0004* 0.0005* 0.0004* 0.0004* 0.0003** 0.0002 0.9556 0.9873 2.5886 2.8651 2.8533 2.8015 2.3143 1.4976 0.3395 0.3237 0.0097 0.0042 0.0044 0.0052 0.0208 0.1345 * - Estatisticamente significante a 1% 7 ** - Estatisticamente significante a 5% Segundo Mendes e Duarte, 1998, procedimentos robustos, como os aqui empregados, conseguem lidar com uma grande proporção de pontos aberrantes e ainda assim fornecer estimativas confiáveis para os coeficientes de regressão. Os resultados encontrados sugerem que o uso do método de mínimos quadrados ordinários levou sistematicamente a coeficientes beta superestimados para o C-Bond e CDI. Apesar das divergências entre modelos, os resultados verificados confirmaram a existência no Brasil de duas taxas livres de risco distintas, o CDI e a caderneta de poupança, enquanto o retorno do C-Bond não pode ser caracterizado como livre de risco. 3.2. Testes de Estacionariedade Para que os betas dos ativos possam ser estimados adequadamente pelos modelos de regressão, tanto por mínimos quadrados ordinários quanto por métodos de regressão robusta, as séries temporais devem ser covariância estacionárias, ou seja, devem possuir uma média e variância finitas e o processo estocástico de onde se originam não deve variar ao longo do tempo. A estacionariedade de todas as séries utilizadas foi analisada por meio de testes para detecção de raízes unitárias. A metodologia de teste, que usa como exemplo cotações do C-Bond, segue abaixo: 3.2.1. Testes DP – Dickey e Pantula Para o teste supõe-se inicialmente a existência de 3 raízes unitárias na série. O modelo inicial correspondeu a: 3cbondt t 2cbondt 1 t (1) Porém, os termos deterministas, com coeficientes e mostraram-se insignificantes. Por esta razão, o modelo foi re-estimado no formato 3cbondt 2cbondt 1 t (2) Os resultados são reportados abaixo. Modelo 1.1-a Dependent Variable: D(CBOND,3) Method: Least Squares Sample(adjusted): 4 1204 Included observations: 1201 after adjusting endpoints Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. D(CBOND(-1),2) -1.541664 0.024266 -63.53213 0.0000 R-squared Adjusted R-squared S.E. of regression Sum squared resid Log likelihood 0.770832 0.770832 1.544408 2862.235 -2225.648 Mean dependent var S.D. dependent var Akaike info criterion Schwarz criterion Durbin-Watson stat 8.33E-09 3.226153 3.707990 3.712229 2.311630 O Modelo 1.1-a não é adequado para inferência, todavia, porque apresenta autocorrelação acentuada, como atesta o correlograma mostrado abaixo até a defasagem de ordem 10 (o correlograma foi originalmente construído para 36 defasagens), destacando-se os elevados valores da estatística Q (AC é a função de autocorrelação, PAC é a função de autocorrelação parcial, Q-Stat é o valor da estatística Q do teste de autocorrelação de Ljung-Box e Prob é o valor de probabilidade a ela associada). AC PAC Q-Stat Prob 1 -0.156 -0.156 29.282 2 -0.295 -0.327 134.01 0.000 0.000 8 3 4 5 6 7 8 9 10 -0.037 -0.018 0.010 -0.083 0.002 0.054 0.067 0.050 -0.171 -0.191 -0.130 -0.233 -0.181 -0.164 -0.084 -0.019 135.64 136.03 136.15 144.52 144.53 148.08 153.56 156.63 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 O procedimento utilizado para corrigir o problema foi a inclusão seqüencial de defasagens da variável dependente até que não restassem autocorrelações significativas. O processo inverso, ou seja, a exclusão seqüencial de defasagens a partir de um modelo inicial com um número de defasagens elevado, também foi utilizado como forma de confirmar a adequação da especificação final. Dada a persistência e magnitude da autocorrelação verificada, foram necessárias 12 defasagens no modelo final (Modelo 1.1-b). 12 3cbondt 2 cbondt 1 i 3cbondt i t (3) i 1 Modelo 1.1-b Dependent Variable: D(CBOND,3) Method: Least Squares Sample(adjusted): 16 1204 Included observations: 1189 after adjusting endpoints Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. D(CBOND(-1),2) D(CBOND(-1),3) D(CBOND(-2),3) D(CBOND(-3),3) D(CBOND(-4),3) D(CBOND(-5),3) D(CBOND(-6),3) D(CBOND(-7),3) D(CBOND(-8),3) D(CBOND(-9),3) D(CBOND(-10),3) D(CBOND(-11),3) D(CBOND(-12),3) -8.880095 6.881650 5.984228 5.093798 4.223566 3.395471 2.568804 1.839751 1.264849 0.839591 0.560570 0.287442 0.083970 0.503931 0.490875 0.467386 0.435954 0.396435 0.350752 0.301138 0.249838 0.199276 0.150419 0.105030 0.064566 0.029055 -17.62164 14.01916 12.80362 11.68425 10.65386 9.680547 8.530328 7.363764 6.347210 5.581667 5.337249 4.451945 2.890089 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0039 R-squared Adjusted R-squared S.E. of regression Sum squared resid Log likelihood Durbin-Watson stat 0.842595 0.840989 1.291618 1961.894 -1984.842 2.015430 Mean dependent var S.D. dependent var Akaike info criterion Schwarz criterion F-statistic Prob(F-statistic) 0.000530 3.239074 3.360542 3.416094 524.5996 0.000000 Uma análise do novo correlograma mostra que as autocorrelações tornaram-se não significantes. Para o modelo acima, os termos deterministas continuam insignificantes. O resultado relevante, porém, é que a estatística ˆ associada ao coeficiente da estimativa de , o primeiro do modelo, é de -17,62, significativamente inferior aos valores críticos tabulados por Dickey e Fuller, apud Enders (1995, p. 419) ou Davidson e MacKinnon (1993, p. 708), respectivamente de -2,58 e -2,56 no nível de significância de 1% (resultados assintóticos, adequados ao tamanho da 9 amostra utilizada). Assim, pode-se rejeitar seguramente a hipótese nula de que é igual a zero, apontando para a inexistência de três raízes unitárias. O segundo passo do teste supõe a existência de 2 raízes unitárias e seu modelo inicial é: 3cbondt 1 2 cbondt 1 2 cbondt 1 t (4) Novamente, verifica-se forte autocorrelação a partir do correlograma com 36 defasagens dos resíduos do modelo. A correção do problema seguiu o mesmo critério utilizado anteriormente e resultou no modelo estendido mostrado abaixo, com 7 defasagens da variável dependente. 7 3cbondt 1 2 cbondt 1 2 cbondt 1 i 3cbondt i t (5) i 1 Modelo 1.2 Dependent Variable: D(CBOND,3) Method: Least Squares Sample(adjusted): 11 1204 Included observations: 1194 after adjusting endpoints Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. D(CBOND(-1),2) D(CBOND(-1)) D(CBOND(-1),3) D(CBOND(-2),3) D(CBOND(-3),3) D(CBOND(-4),3) D(CBOND(-5),3) D(CBOND(-6),3) D(CBOND(-7),3) -1.267160 -1.106185 0.314415 0.392179 0.408493 0.377662 0.323589 0.190698 0.061268 0.450892 0.097879 0.368602 0.292902 0.224903 0.164051 0.111023 0.066204 0.028987 -2.810339 -11.30155 0.852993 1.338944 1.816310 2.302101 2.914625 2.880462 2.113642 0.0050 0.0000 0.3938 0.1808 0.0696 0.0215 0.0036 0.0040 0.0348 R-squared Adjusted R-squared S.E. of regression Sum squared resid Log likelihood Durbin-Watson stat 0.849775 0.848761 1.257439 1873.666 -1963.214 2.008284 Mean dependent var S.D. dependent var Akaike info criterion Schwarz criterion F-statistic Prob(F-statistic) 2.50E-16 3.233370 3.303540 3.341870 837.8987 0.000000 Uma vez mais, elementos deterministas não se mostraram relevantes. As estatísticas ˆ associadas aos parâmetros estimados ˆ1 e ˆ2 do Modelo 1.2 são de -2,81 e -11,30. Estes valores são inferiores aos valores críticos -2,58 e -2,56 (nível de significância de 1%) mencionados no caso anterior, bem como aos valores críticos correspondentes aos níveis de 5% e 10% de significância. Desta forma, rejeita-se a hipótese nula de existência de 2 raízes unitárias na série. O último passo supõe a existência de 1 raiz unitária e seu modelo inicial é 3cbondt t 1 2cbondt 1 2 cbondt 1 3cbondt 1 t (6) O correlograma com 36 defasagens dos resíduos do modelo mostra a presença de autocorrelação. A correção do problema seguiu o mesmo critério utilizado anteriormente e resultou no modelo estendido mostrado abaixo, com 8 defasagens da variável dependente. 8 3cbondt t 1 2 cbondt 1 2 cbondt 1 3cbondt 1 i 3cbondt i t (7) i 1 os testes individuais ( ˆ e ˆ ) e conjuntos ( ̂ 2 e ̂ 3 ) de significância dos termos deterministas de (7) mostram que nenhum deles é estatisticamente diferente de zero nos níveis de significância de 10%, 5% e 1%. Abaixo são mostrados os resultados da estimação de (7) sem constante e tendência linear. 10 Modelo 1.3a Dependent Variable: D(CBOND,3) Method: Least Squares Sample(adjusted): 12 1204 Included observations: 1193 after adjusting endpoints Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. D(CBOND(-1),2) D(CBOND(-1)) CBOND(-1) D(CBOND(-1),3) D(CBOND(-2),3) D(CBOND(-3),3) D(CBOND(-4),3) D(CBOND(-5),3) D(CBOND(-6),3) D(CBOND(-7),3) D(CBOND(-8),3) -2.003529 -1.025289 -0.000216 0.965639 0.953488 0.879558 0.764203 0.627246 0.415005 0.210739 0.072545 0.537361 0.102868 0.000468 0.450353 0.368223 0.292735 0.224912 0.164199 0.111274 0.066344 0.029001 -3.728461 -9.967013 -0.461967 2.144183 2.589431 3.004628 3.397788 3.820044 3.729591 3.176480 2.501488 0.0002 0.0000 0.6442 0.0322 0.0097 0.0027 0.0007 0.0001 0.0002 0.0015 0.0125 R-squared Adjusted R-squared S.E. of regression Sum squared resid Log likelihood Durbin-Watson stat 0.850583 0.849318 1.255567 1863.363 -1958.780 1.991108 Mean dependent var S.D. dependent var Akaike info criterion Schwarz criterion F-statistic Prob(F-statistic) 0.001055 3.234520 3.302230 3.349108 672.8721 0.000000 Verifica-se que o coeficiente de ˆ3 possui uma estatística ˆ de -0,46, inferior aos valores críticos nos níveis de significância de 10%, 5% e 1%. Neste caso, não se pode rejeitar a hipótese H 0 : 3 0 , indicando a possível presença de uma raiz unitária. Observe-se, ainda, que os coeficientes de ˆ1 e ˆ2 são estatisticamente diferentes de zero no nível de 1% de significância. Em conclusão, pode-se afirmar com segurança que a série não possui 3 raízes unitárias e também não possui 2 raízes unitárias, mas pode possuir uma raiz unitária, caracterizando-se como integrada de ordem 1 ou cbondt I 1 . Testes similares aplicados, e que corroboraram as evidências do teste de Dickey e Pantula foram os testes ADF de Dickey e Fuller, o teste de Phillips e Perron e por fim o teste KPSS de Kwiatkowski, Phillips, Schmidt e Shin, que inverte o procedimento dos testes anteriores, considerando como hipótese nula a não existência de uma raiz unitária na série. Os testes de Dickey e Pantula (DP) permitiram concluir que a série analisada, composta pelas cotações diárias do C-Bond entre 02/01/1997 e 28/12/2001, não possui duas ou mais raízes unitárias. Não obstante, os testes DP e todos os demais sugerem a existência de uma raiz unitária na série. Nenhum resultado contradiz esta conclusão, independentemente das diferentes especificações utilizadas. Assim, pode-se afirmar que Cbondt é, uma série integrada de ordem 1. Procedimentos similares foram aplicados em todas as séries. As séries de cotação mostraram-se integradas de ordem 1, ou seja, sua primeira diferença (que foi utilizada para cálculo dos betas) é estacionária. No caso das taxas (poupança e CDI), a primeira mostrou-se estacionária, enquanto o CDI não permitiu a rejeição da hipótese de existência de uma raiz unitária. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 11 Este artigo procurou introduzir a discussão acerca da adequação do uso de algumas aproximações para a determinação da taxa livre de risco no Brasil. A existência na economia de uma taxa pura de juros é um dos preceitos básicos para a aplicação do modelo CAPM de precificação de ativos, e a mesma deve ser passível de observação através de ativos que possuam características aproximadas ao proposto teoricamente. A utilização de aproximações inadequadas pode levar a erros de interpretação e de resultados, de modo que a minimização de tais erros deve ser buscada através da observação de variáveis adequadas. Na análise das possíveis aproximações da taxa livre de risco no Brasil, o título C-Bond mostrou-se inadequado, visto possuir correlação estatisticamente significante com outros ativos presentes na economia. Parte do risco sistêmico está captado no retorno do ativo, descaracterizando-o portanto como livre de risco. Os retornos da Caderneta de Poupança, assim como os do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), entretanto mostraram-se condizentes com a conceituação teórica de uma taxa pura de juros, com correlação insignificante com o mercado e desvio padrão de retornos também desprezíveis. A conclusão acerca da inadequação de uma das aproximações e da adequação das demais suscita entretanto uma nova questão que é à existência na economia brasileira de duas taxas com características similares em termos de risco mas com retornos médios muito diferentes mesmo no longo prazo. Essa aparente disfunção de mercado abre um campo vasto de possibilidades de estudo, visto que contrasta com alguns preceitos fundamentais da moderna teoria de finanças. 5. BIBLIOGRAFIA BLACK, Fisher. Noise. The Journal of Finance. v. 41, n. 3, July,1986. COPELAND, T, KOLLER, T, MURRIN, J. Valuation: Measuring and Managing the Value of Companies. McKinsey & Company Inc, 1995. DU MOUCHEL, W.H., O'BRIEN, F.L. 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