Aspectos da Teoria de Portfolio em Mercados Emergentes

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VI SEMEAD
PESQUISA QUANTITATIVA
FINANÇAS
Aspectos da Teoria de Portfolio em Mercados Emergentes: Uma Análise de Aproximações
para a Taxa Livre de Risco no Brasil
Héber Pessoa da Silveira
Mestrando em Administração
Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo.
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Lucas Ayres Barreira de Castro Barros
Doutorando em Administração
Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo.
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Rubens Famá
Professor Doutor do Departamento de Administração
Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo.
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1
Aspectos da Teoria de Portfolio em Mercados Emergentes: Uma Análise de Aproximações
para a Taxa Livre de Risco no Brasil
RESUMO
A taxa de retorno total de qualquer investimento em uma situação de equilíbrio é composta
por duas partes distintas, quais sejam: o prêmio pelo risco sistêmico (medido pelo beta do ativo) e
uma taxa pura de juros (ou taxa livre de risco), que seria o prêmio pela postergação do consumo.
Parte daí que um ativo livre de risco deve ter, por definição, um beta igual a zero. A estimação
desse coeficiente pode então ser utilizada como forma de se analisar qual ou quais taxas
existentes no mercado se mostram adequadas ao conceito teórico de livre de risco. O presente
trabalho estima os betas e analisa algumas características das séries temporais de taxas
comumente utilizadas como aproximações para a taxa livre de risco no mercado brasileiro e
americano, notadamente a estacionariedade das séries de Certificados de Depósito Interbancário
(CDI), C-Bonds, Caderneta de Poupança e dos Treasury Bonds (T-Bonds) americanos. Os
resultados da estimação dos betas sugerem a adequação das taxas do CDI, da caderneta de
poupança e dos T-Bonds como livres de risco, enquanto o C-Bond mostrou-se inadequado, pois
capta em seu retorno parte do risco sistêmico. A análise das séries temporais, por sua vez, sugere
que as séries de cotações (C-Bond e T-Bond) possuem uma e somente uma raiz unitária no
período analisado, ou seja, sua primeira diferença se mostra estacionária, o que permite a
estimação dos betas das séries pelos procedimentos comumente utilizados na análise estatística.
No caso das séries da caderneta de poupança e do CDI, que já estão na forma de taxas, a primeira
apresentou-se como estacionária, enquanto a taxa do CDI apresentou uma raiz unitária. A
conclusão dos testes aponta para a possibilidade de trabalho pelos métodos de análise usuais com
todas as taxas, a exceção do CDI, a qual demanda maior aprofundamento no tratamento
estatístico.
1. INTRODUÇÃO
Segundo Black (1996, p. 531), toda a estrutura de um mercado financeiro depende da
liquidez dos títulos nele transacionados, pois nos casos onde as transações não são freqüentes,
mecanismos como os fundos mútuos, os portfolios diversificados, os derivativos, e outros
mecanismos utilizados em mercados mais líquidos dificilmente poderão ser praticados em sua
plenitude. No caso de países emergentes, a exemplo do Brasil, essas disfunções dificultam
fortemente a observação de variáveis que possam servir de aproximação a conceitos teóricos.
Seja pela escassez de dados ou pelo excessivo ruído apresentado nas cotações, análises empíricas
em mercados emergentes freqüentemente demandam maior esforço no tratamento estatístico das
variáveis e na busca dessas aproximações.
Exemplo claro de problemas relacionados à escassez de variáveis adequadas em países
emergentes são comuns quando da aplicação no Brasil do Capital Asset Pricing Model (CAPM).
A fórmula final do modelo, representada em (1), possui duas variáveis não diretamente
observáveis, e que demandam aproximações para serem mensuradas:

E  Ri   R f   E  Rm   R f   2im

(1)
m
2
As aproximações mais comumente utilizadas para o retorno do portfolio de mercado ( Rm ) e
para a taxa livre de risco ( R f ) são, respectivamente, índices de bolsas de valores, a exemplo do
Ibovespa, e retornos de títulos públicos como o C-Bond, ou taxas como o CDI e a caderneta de
poupança. Problemas relacionados ao uso dessas aproximações são entretanto comuns, e lavam a
freqüentes erros de interpretação. Um exemplo de como aproximações inadequadas podem levar
a erros de interpretação dos dados foi fornecido por Roll e Ross (1994), os quais verificaram que,
caso a aproximação utilizada para a mensuração do portfolio de mercado não seja ex ante
eficiente, isto é, não se localize exatamente sobre a fronteira mas sim dentro da fronteira eficiente
de investimentos com risco, a regressão do beta como variável explicativa do retorno apresentará
um coeficiente de determinação r 2 próximo de zero. Vale observar também no estudo que a
existência mesmo de pequenas distâncias entre a carteira de mercado observada e a fronteira
eficiente é suficiente para destruir o efeito da correlação entre betas e retorno. Copeland, Koller e
Murrin (1995, p. 420-421), afirmam ser notadamente difícil em mercados emergentes a
observação não somente do portfolio de mercado, mas também de um título público cujo retorno
possa servir de aproximação para a taxa livre de risco.
Erros decorrentes da utilização de aproximações inadequadas na determinação do portfolio
de mercado e da taxa livre de risco podem ser reduzidos sempre que as aproximações utilizadas
não possuam comportamento muito discrepante do esperado em termos teóricos. O presente
analisa uma dessas variáveis, no caso a taxa livre de risco (risk free rate), para o mercado
brasileiro. Algumas aproximações possíveis para essa taxa são analisadas, assim como a estrutura
de suas séries temporais. Para a estimação do risco das taxas foram utilizados tanto o método
usual de mínimos quadrados ordinários quanto métodos de regressão robusta.
2. REVISÃO DA LITERATURA
No conceito teórico, um ativo livre de risco é aquele em que o investidor sabe exatamente o
valor que receberá ao final do prazo de investimento. Não haver incerteza quanto ao valor a ser
recebido pressupõe portanto um desvio padrão do retorno do ativo igual a zero e,
conseqüentemente, um β igual a zero. Sharpe, Alexander e Bailey (1999) aprofundam a definição
e afirmam que dadas as características do ativo livre de risco, o mesmo deve ter um retorno fixo e
sem possibilidades de não pagamento (default) em seu vencimento. Além disso, o prazo de
vencimento do ativo deve coincidir com o período em que o investidor deseja mantê-lo. Usando a
taxa de um título público como aproximação para a taxa livre de risco, caso haja divergência
entre o prazo de vencimento do título e o período em que o mesmo será mantido pelo investidor,
este terá de (i) vender o título no mercado secundário (caso o período de manutenção do título
seja menor que o prazo de vencimento do mesmo) ou (ii) reinvestir o valor recebido no
vencimento do título (caso o prazo de vencimento seja inferior ao período que o investidor se
mostra disposto a abrir mão do consumo). Ambos os casos apresentados possuem aspectos de
risco. No primeiro caso há o risco de variação na taxa de juros, de modo que o investidor pode ter
de vender o título a um preço menor que o esperado inicialmente. No segundo caso há o risco do
investidor não conseguir reinvestir à mesma taxa do título original.
Exemplos de títulos públicos utilizados nos Estados Unidos como aproximações para a taxa
livre de risco são os títulos do tesouro (T-Bonds) com vencimento para 30 anos. No caso do
Brasil, o título público mais fortemente transacionado é o Brazilian Capitalization Bond (CBond). Esse título é o mais freqüentemente transacionado entre todos os chamados Brady bonds
no mundo e possui uma taxa fixada de rendimento quando de sua emissão. Alguns problemas
entretanto podem surgir da utilização do retorno desse título como aproximação da taxa livre de
3
risco. O primeiro problema decorre do risco de default de tais títulos, o que é por definição
contrário à mensuração de uma taxa livre de qualquer forma de risco. A diferença entre a taxa
paga por estes títulos e as taxas pagas pelos T-Bonds é apontada inclusive como uma medida do
risco país (Garcia e Didier, 2000).
3. METODOLOGIA DE TESTES E RESULTADOS
O primeiro passo da análise das taxas se deu pelo cálculo1 do  dos T-Bonds com o S&P
500 assim como o  dos C-Bonds com o Ibovespa. O método utilizado foi o de mínimos
quadrados ordinários. Abaixo são colocados os resultados observados, com o erro padrão dos
coeficientes entre parênteses:
T-Bond 30 anos x S&P 500
T-Bond = 0,0003738 + 0,05540 S&P500
(0,00032) (0,0306)
No caso da taxa norte americana, o coeficiente  não se mostra estatisticamente
significante (diferente de zero) a 5%, e o coeficiente de determinação r2 da regressão aproxima-se
de zero (0,002), demonstrando ser desprezível a correlação entre as variáveis. As conclusões da
regressão demonstram que, em termos de correlação com o mercado, o T-Bond americano se
mostra condizente com o conceito teórico de taxa livre de risco.
No caso brasileiro entretanto o resultado da regressão foi dado por:
C-Bond x Ibovespa
C-Bond = 0,000187 + 0,327053 Ibov
(0,00029)
(0,0112)
O coeficiente  nesse caso se mostrou significante (estatística t de 29,081). O coeficiente
r da regressão, por sua vez, foi de 0,418, demonstrando haver correlação positiva entre as
variáveis, o que vai de encontro ao esperado em termos teóricos2. Dado que o C-Bond apresenta
correlação com o mercado e um  significante, a utilização do mesmo como aproximação da
taxa livre de risco mostra-se inadequado.
A mesma metodologia utilizada até aqui pode ser aplicada para duas outras possíveis
aproximações na taxa livre de risco do Brasil, que são o retorno do Certificado de Depósito
Interbancário (CDI) e o retorno da Caderneta de Poupança. No caso dos retornos da caderneta de
poupança, o ativo comporta-se de acordo com a definição teórica da taxa livre de risco no que diz
respeito à sua correlação com outros ativos existentes na economia. O resultado da regressão do
retorno da Caderneta de Poupança com o Ibovespa foi dado por:
2
Poupança x Ibovespa
Poup = 0,000315 + 0,000135 Ibov
1
Para os cálculos que se seguem foi utilizada a base de dados Economática, com as taxas de retorno diárias já
ajustadas para a inflação. O período analisado foi de jan 1997 a set 2001 totalizando 1203 observações.
2
Para se calcular o β através de aproximação pelo coeficiente B1 da regressão, o modelo deve apresentar aderência às
principais hipóteses de uma regressão OLS. O resultado do teste de Kolmogorov-Smirnov permitiu considerar que os
termos de erro da regressão se apresentam normalmente distribuídos ao nível de 5% de significância, enquanto a
estatística de Durbin-Watson (d = 1,996) para detecção de autocorrelação de primeira ordem demonstrou não haver
autocorrelação relevante nos resíduos. Para montagem do modelo de regressão alguns outliers foram identificados e
removidos utilizando-se a medida de Distância de Cook, pois a amostra inicial com todas as observações presentes
não permitia a suposição de normalidade dos resíduos da regressão. De um universo de 1203 observações 24 foram
removidas como outliers.
4
(0,000003) (0,0001)
O coeficiente  não se mostrou estatisticamente significante a 5%, e o coeficiente r2 da
regressão foi desprezível (0,001).
Outra possível aproximação para a taxa livre de risco no Brasil é o retorno do Certificado de
Depósito Interbancário (CDI). A mesma metodologia utilizada anteriormente quando aplicada ao
CDI fornece como resultado
CDI x Ibovespa
CDI = 0,000809 + 0,000671 Ibov
(0,00000) (0,00026)
Nesse caso o coeficiente  , apesar de estatisticamente significante a 5%, se mostra
desprezível em magnitude, assim como o coeficiente r2 da regressão (0,00592). De acordo com o
resultado da regressão, também o CDI se mostra, no Brasil, uma aproximação adequada em
termos teóricos para a taxa livre de risco.
Os resultados verificados até o momento sugerem a existência no Brasil de duas taxas livres
de risco distintas. Os testes realizados devem entretanto ser refinados de modo a se evitar vieses
na estimativa dos betas. Segundo Koutmos, 1998 apud Huang e Yang, 2000, é característica dos
retornos de ações em mercados emergentes a presença de autocorrelação positiva nas séries
históricas. Outras características são a existência de agrupamentos na volatilidade, que levam a
heteroscedasticidade, e medidas de curtose que, em conjunto, não permitem a suposição de
normalidade. Dado que o método de mínimos quadrados ordinários necessita para sua aplicação
das hipóteses de normalidade e independência dos retornos, os betas encontrados até aqui podem
sofrer de viés decorrente da estimação inadequada.
3.1. Estimação Robusta do Beta dos Ativos
Para a verificação estatística do comportamento das taxas no Brasil utilizou-se, além de
mínimos quadrados ordinários, um procedimento de estimação robusta dos modelos,
relacionando o CDI, a poupança e o C-Bond ao retorno do portfolio de mercado, dado pelos
retornos diários do índice Bovespa. O método de estimação por regressão robusta é sugerido para
o mercado brasileiro, dentre outros autores, por Mendes e Duarte, 1998, pois nesse mercado as
séries temporais apresentam valores extremos em quantidade substancial, capazes de exercer
influências indesejáveis sobre as estimativas obtidas com procedimentos usuais. Ademais, as
características dessas séries violam hipóteses fundamentais de um modelo de regressão linear
estimado por mínimos quadrados ordinários, apresentando forte heteroscedasticidade, correlações
seriais, que podem acontecer em ordens superiores a 1 e portanto que não são captadas pelo teste
de Durbin-Watson, e desvios de normalidade. Todas essas características são levadas em conta
nos modelos robustos, resultando em estimativas mais confiáveis para os betas.
A tabela 1 apresenta os níveis de significância observada para os testes de Jarque-Bera para
normalidade da série histórica, teste de White para a presença de heteroscedasticidade e teste
ARCH para presença de autocorrelação nas séries históricas do C-Bond, CDI e poupança.
Tabela 1 – Nível de significância observado em testes para normalidade, heteroscedasticidade e autocorrelação nas
séries históricas.
Teste
C-Bond
CDI
Poupança
Jarque-Bera
White Heteroscedasticity
0,000*
0,000*
0,000*
0,003*
0,000*
0,513
5
ARCH Test
0,000*
0,000*
0,000*
* - Hipótese nula rejeitada a 1%
Conforme pode ser verificado nos resultados, as três séries apresentaram-se não
normalmente distribuídas, o C-Bond e CDI apresentaram variância não constante ao longo do
tempo e todas as séries mostraram-se autocorrelacionadas. O teste de Durbin-Watson realizado
anteriormente para o C-Bond e que não permitiu a rejeição da hipótese de ausência de
autocorrelação deve ser analisado com cautela, visto que testa apenas para a existência de autocorrelação de primeira ordem. Nesse sentido, o teste ARCH mostra-se mais robusto e preciso,
pois verifica a existência de autocorrelação de ordens superiores. O teste de KolmogorovSmirnov anteriormente realizado apenas permitiu considerar a hipótese de normalidade após a
exclusão de outliers da amostra. Dadas as características verificadas nas séries históricas das
taxas de juros no Brasil, um método que depende de normalidade, homoscedasticidade ou
ausência de autocorrelação nas séries, a exemplo do método de mínimos quadrados ordinários, se
mostra pouco preciso e não confiável para a estimação do coeficiente  procurado.
Para se estimar o beta das taxas com maior precisão foram utilizados modelos de estimação
por regressão robusta conforme sugerido por Mendes e Duarte, 1998. Segundo Neter et al., 1996,
regressões robustas podem prover melhores ajustes e estimativas que o método de mínimos
quadrados ordinários ao diminuir a influência de observações extremas. O modelo utilizado aqui
foi o de mínimos quadrados reponderados iterativamente, utilizando a função de peso do tipo
bisquare. Esse modelo atribui pesos à observação de acordo com quão fora essa observação se
encontra do padrão dos dados, para isso baseando-se no resíduo da observação. Os pesos são
posteriormente utilizados para diminuir a influência da observação e revisados após cada iteração
até que um ajuste robusto seja encontrado (Neter et al., 1996).
3.1.1. Estimação Robusta – C-Bond
O modelo estimado para o C-Bond pelo método de mínimos quadrados reponderados
iterativamente foi:
C-Bond x Ibovespa
C-Bond = 0,0003 + 0,2723 Ibov
(0,0003) (0,0095)
A estatística t do coeficiente angular foi de 28,7297, mantendo-se a significância
praticamente inalterada em relação ao anteriormente estimado por mínimos quadrados ordinários.
A maior modificação se deu em relação à magnitude do estimador, que decresceu de modo
consistente com o esperado, pois as observações extremas, que levavam a uma superestimação do
coeficiente, receberam pesos menores no novo modelo de estimação.
A especificação do modelo de regressão robusta pode ser feita para diversas funções de
peso distintas (Du Mouchel e O´Brien, 1989). Na busca de um melhor estimador foram testadas
as funções de peso (i) andrews, (ii) bisquare, (iii) cauchy, (iv) fair, (v) huber, (vi) logistic, (vii)
talwar e (ix) welsch. Implementou-se sucessivamente cada uma destas versões, na ordem acima
colocada. Em seguida, reuniu-se em uma tabela as saídas de cada estimador mais importantes
para a pesquisa, quais sejam: os coeficientes beta estimados em cada caso, suas respectivas
estatísticas t e valores-p destas estatísticas. Os resultados (C-bond x Ibovespa) são mostrados
abaixo.
Tabela 2 – Coeficientes, estatística t e significância observada para diferentes funções de peso na regressão robusta.
Função
Coeficiente Angular
Estat. t
Valor-p
6
Andrews
Bisquare
Cauchy
Fair
Huber
Logistic
Talwar
Welsch
0.2718
0.2723
0.3093
0.3414
0.3235
0.3281
0.2622
0.2819
28.6849
28.7297
32.1440
33.9235
33.1717
33.3372
26.1794
29.7459
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
Pode-se verificar na tabela que os dados se mostram qualitativamente estáveis, com o
coeficiente significante a 1% independentemente da função peso utilizada.
3.1.2. Estimação Robusta – Poupança e CDI
A mesma metodologia empregada para o C-Bond foi utilizada para a estimação dos betas da
Caderneta de poupança e do CDI. Para a caderneta de poupança o resultado foi dado por:
Poupança x Ibovespa
Poup = 0,00029 + 0,00012 Ibov
(0,000003) (0,000098)
Dado que a caderneta de poupança no Brasil possui uma variância praticamente igual a
zero, os resultados encontrados pelo modelo de regressão robusta diferem muito pouco daqueles
encontrados por mínimos quadrados ordinários. O uso das diferentes funções de peso nesse caso
foram indiferentes, dado que os resultados mostraram-se qualitativamente estáveis, com os
coeficientes beta não significantes a 5% em nenhum dos casos. A magnitude das variações das
taxas ao longo do tempo nesse caso são desprezíveis, de modo que a utilização ou não de um
tratamento robusto para outliers possui pouca relevância na magnitude do beta estimado.
No caso do CDI verificou-se como resultado da estimação por mínimos quadrados
reponderados:
CDI x Ibovespa
CDI = 0,00070 + 0,00011 Ibov
(0,000003) (0,00011)
O coeficiente angular não se mostrou significante a 5%, na primeira estimação, entretanto,
ao se testar as diferentes funções de peso anteriormente citadas, os resultados não se mostraram
qualitativamente estáveis. Em alguns casos, o coeficiente angular mostra-se significativo. Há
boas razões, porém, para acreditar que os melhores resultados são aqueles que apontam para a
não significância do coeficiente, pois estes cuidam com maior precisão dos grandes outliers. Os
resultados dos estimadores para diferentes funções de peso são mostrados na tabela 3.
Tabela 3 – Coeficientes, estatística t e significância observada do C-Bond para diferentes funções de peso na
regressão robusta.
Função
Coeficiente Angular
Estat. t
Valor-p
Andrews
Bisquare
Cauchy
Fair
Huber
Logistic
Talwar
Welsch
0.0001
0.0001
0.0004*
0.0005*
0.0004*
0.0004*
0.0003**
0.0002
0.9556
0.9873
2.5886
2.8651
2.8533
2.8015
2.3143
1.4976
0.3395
0.3237
0.0097
0.0042
0.0044
0.0052
0.0208
0.1345
* - Estatisticamente significante a 1%
7
** - Estatisticamente significante a 5%
Segundo Mendes e Duarte, 1998, procedimentos robustos, como os aqui empregados,
conseguem lidar com uma grande proporção de pontos aberrantes e ainda assim fornecer
estimativas confiáveis para os coeficientes de regressão. Os resultados encontrados sugerem que
o uso do método de mínimos quadrados ordinários levou sistematicamente a coeficientes beta
superestimados para o C-Bond e CDI. Apesar das divergências entre modelos, os resultados
verificados confirmaram a existência no Brasil de duas taxas livres de risco distintas, o CDI e a
caderneta de poupança, enquanto o retorno do C-Bond não pode ser caracterizado como livre de
risco.
3.2. Testes de Estacionariedade
Para que os betas dos ativos possam ser estimados adequadamente pelos modelos de
regressão, tanto por mínimos quadrados ordinários quanto por métodos de regressão robusta, as
séries temporais devem ser covariância estacionárias, ou seja, devem possuir uma média e
variância finitas e o processo estocástico de onde se originam não deve variar ao longo do tempo.
A estacionariedade de todas as séries utilizadas foi analisada por meio de testes para detecção de
raízes unitárias. A metodologia de teste, que usa como exemplo cotações do C-Bond, segue
abaixo:
3.2.1. Testes DP – Dickey e Pantula
Para o teste supõe-se inicialmente a existência de 3 raízes unitárias na série. O modelo
inicial correspondeu a:
3cbondt     t   2cbondt 1   t
(1)
Porém, os termos deterministas, com coeficientes  e  mostraram-se insignificantes. Por
esta razão, o modelo foi re-estimado no formato
 3cbondt   2cbondt 1   t
(2)
Os resultados são reportados abaixo.
Modelo 1.1-a
Dependent Variable: D(CBOND,3)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 4 1204
Included observations: 1201 after adjusting endpoints
Variable
Coefficient
Std. Error
t-Statistic
Prob.
D(CBOND(-1),2)
-1.541664
0.024266
-63.53213
0.0000
R-squared
Adjusted R-squared
S.E. of regression
Sum squared resid
Log likelihood
0.770832
0.770832
1.544408
2862.235
-2225.648
Mean dependent var
S.D. dependent var
Akaike info criterion
Schwarz criterion
Durbin-Watson stat
8.33E-09
3.226153
3.707990
3.712229
2.311630
O Modelo 1.1-a não é adequado para inferência, todavia, porque apresenta autocorrelação
acentuada, como atesta o correlograma mostrado abaixo até a defasagem de ordem 10 (o
correlograma foi originalmente construído para 36 defasagens), destacando-se os elevados
valores da estatística Q (AC é a função de autocorrelação, PAC é a função de autocorrelação
parcial, Q-Stat é o valor da estatística Q do teste de autocorrelação de Ljung-Box e Prob é o valor
de probabilidade a ela associada).
AC
PAC
Q-Stat
Prob
1 -0.156 -0.156 29.282
2 -0.295 -0.327 134.01
0.000
0.000
8
3
4
5
6
7
8
9
10
-0.037
-0.018
0.010
-0.083
0.002
0.054
0.067
0.050
-0.171
-0.191
-0.130
-0.233
-0.181
-0.164
-0.084
-0.019
135.64
136.03
136.15
144.52
144.53
148.08
153.56
156.63
0.000
0.000
0.000
0.000
0.000
0.000
0.000
0.000
O procedimento utilizado para corrigir o problema foi a inclusão seqüencial de defasagens
da variável dependente até que não restassem autocorrelações significativas. O processo inverso,
ou seja, a exclusão seqüencial de defasagens a partir de um modelo inicial com um número de
defasagens elevado, também foi utilizado como forma de confirmar a adequação da especificação
final. Dada a persistência e magnitude da autocorrelação verificada, foram necessárias 12
defasagens no modelo final (Modelo 1.1-b).
12
3cbondt   2 cbondt 1    i  3cbondt i   t
(3)
i 1
Modelo 1.1-b
Dependent Variable: D(CBOND,3)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 16 1204
Included observations: 1189 after adjusting endpoints
Variable
Coefficient
Std. Error
t-Statistic
Prob.
D(CBOND(-1),2)
D(CBOND(-1),3)
D(CBOND(-2),3)
D(CBOND(-3),3)
D(CBOND(-4),3)
D(CBOND(-5),3)
D(CBOND(-6),3)
D(CBOND(-7),3)
D(CBOND(-8),3)
D(CBOND(-9),3)
D(CBOND(-10),3)
D(CBOND(-11),3)
D(CBOND(-12),3)
-8.880095
6.881650
5.984228
5.093798
4.223566
3.395471
2.568804
1.839751
1.264849
0.839591
0.560570
0.287442
0.083970
0.503931
0.490875
0.467386
0.435954
0.396435
0.350752
0.301138
0.249838
0.199276
0.150419
0.105030
0.064566
0.029055
-17.62164
14.01916
12.80362
11.68425
10.65386
9.680547
8.530328
7.363764
6.347210
5.581667
5.337249
4.451945
2.890089
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0039
R-squared
Adjusted R-squared
S.E. of regression
Sum squared resid
Log likelihood
Durbin-Watson stat
0.842595
0.840989
1.291618
1961.894
-1984.842
2.015430
Mean dependent var
S.D. dependent var
Akaike info criterion
Schwarz criterion
F-statistic
Prob(F-statistic)
0.000530
3.239074
3.360542
3.416094
524.5996
0.000000
Uma análise do novo correlograma mostra que as autocorrelações tornaram-se não
significantes.
Para o modelo acima, os termos deterministas continuam insignificantes. O resultado
relevante, porém, é que a estatística ˆ associada ao coeficiente da estimativa de  , o primeiro do
modelo, é de -17,62, significativamente inferior aos valores críticos tabulados por Dickey e
Fuller, apud Enders (1995, p. 419) ou Davidson e MacKinnon (1993, p. 708), respectivamente de
-2,58 e -2,56 no nível de significância de 1% (resultados assintóticos, adequados ao tamanho da
9
amostra utilizada). Assim, pode-se rejeitar seguramente a hipótese nula de que  é igual a zero,
apontando para a inexistência de três raízes unitárias.
O segundo passo do teste supõe a existência de 2 raízes unitárias e seu modelo inicial é:
3cbondt   1 2 cbondt 1   2 cbondt 1   t
(4)
Novamente, verifica-se forte autocorrelação a partir do correlograma com 36 defasagens
dos resíduos do modelo. A correção do problema seguiu o mesmo critério utilizado anteriormente
e resultou no modelo estendido mostrado abaixo, com 7 defasagens da variável dependente.
7
 3cbondt   1 2 cbondt 1   2 cbondt 1    i  3cbondt i   t
(5)
i 1
Modelo 1.2
Dependent Variable: D(CBOND,3)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 11 1204
Included observations: 1194 after adjusting endpoints
Variable
Coefficient
Std. Error
t-Statistic
Prob.
D(CBOND(-1),2)
D(CBOND(-1))
D(CBOND(-1),3)
D(CBOND(-2),3)
D(CBOND(-3),3)
D(CBOND(-4),3)
D(CBOND(-5),3)
D(CBOND(-6),3)
D(CBOND(-7),3)
-1.267160
-1.106185
0.314415
0.392179
0.408493
0.377662
0.323589
0.190698
0.061268
0.450892
0.097879
0.368602
0.292902
0.224903
0.164051
0.111023
0.066204
0.028987
-2.810339
-11.30155
0.852993
1.338944
1.816310
2.302101
2.914625
2.880462
2.113642
0.0050
0.0000
0.3938
0.1808
0.0696
0.0215
0.0036
0.0040
0.0348
R-squared
Adjusted R-squared
S.E. of regression
Sum squared resid
Log likelihood
Durbin-Watson stat
0.849775
0.848761
1.257439
1873.666
-1963.214
2.008284
Mean dependent var
S.D. dependent var
Akaike info criterion
Schwarz criterion
F-statistic
Prob(F-statistic)
2.50E-16
3.233370
3.303540
3.341870
837.8987
0.000000
Uma vez mais, elementos deterministas não se mostraram relevantes. As estatísticas ˆ
associadas aos parâmetros estimados ˆ1 e ˆ2 do Modelo 1.2 são de -2,81 e -11,30. Estes valores
são inferiores aos valores críticos -2,58 e -2,56 (nível de significância de 1%) mencionados no
caso anterior, bem como aos valores críticos correspondentes aos níveis de 5% e 10% de
significância. Desta forma, rejeita-se a hipótese nula de existência de 2 raízes unitárias na série.
O último passo supõe a existência de 1 raiz unitária e seu modelo inicial é
3cbondt     t   1 2cbondt 1   2 cbondt 1   3cbondt 1   t
(6)
O correlograma com 36 defasagens dos resíduos do modelo mostra a presença de
autocorrelação. A correção do problema seguiu o mesmo critério utilizado anteriormente e
resultou no modelo estendido mostrado abaixo, com 8 defasagens da variável dependente.
8
3cbondt     t   1 2 cbondt 1   2 cbondt 1   3cbondt 1    i  3cbondt i   t (7)
i 1
os testes individuais ( ˆ e ˆ ) e conjuntos ( ̂ 2 e ̂ 3 ) de significância dos termos
deterministas de (7) mostram que nenhum deles é estatisticamente diferente de zero nos níveis de
significância de 10%, 5% e 1%. Abaixo são mostrados os resultados da estimação de (7) sem
constante e tendência linear.
10
Modelo 1.3a
Dependent Variable: D(CBOND,3)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 12 1204
Included observations: 1193 after adjusting endpoints
Variable
Coefficient
Std. Error
t-Statistic
Prob.
D(CBOND(-1),2)
D(CBOND(-1))
CBOND(-1)
D(CBOND(-1),3)
D(CBOND(-2),3)
D(CBOND(-3),3)
D(CBOND(-4),3)
D(CBOND(-5),3)
D(CBOND(-6),3)
D(CBOND(-7),3)
D(CBOND(-8),3)
-2.003529
-1.025289
-0.000216
0.965639
0.953488
0.879558
0.764203
0.627246
0.415005
0.210739
0.072545
0.537361
0.102868
0.000468
0.450353
0.368223
0.292735
0.224912
0.164199
0.111274
0.066344
0.029001
-3.728461
-9.967013
-0.461967
2.144183
2.589431
3.004628
3.397788
3.820044
3.729591
3.176480
2.501488
0.0002
0.0000
0.6442
0.0322
0.0097
0.0027
0.0007
0.0001
0.0002
0.0015
0.0125
R-squared
Adjusted R-squared
S.E. of regression
Sum squared resid
Log likelihood
Durbin-Watson stat
0.850583
0.849318
1.255567
1863.363
-1958.780
1.991108
Mean dependent var
S.D. dependent var
Akaike info criterion
Schwarz criterion
F-statistic
Prob(F-statistic)
0.001055
3.234520
3.302230
3.349108
672.8721
0.000000
Verifica-se que o coeficiente de ˆ3 possui uma estatística ˆ de -0,46, inferior aos valores
críticos nos níveis de significância de 10%, 5% e 1%. Neste caso, não se pode rejeitar a hipótese
H 0 :  3  0 , indicando a possível presença de uma raiz unitária. Observe-se, ainda, que os
coeficientes de ˆ1 e ˆ2 são estatisticamente diferentes de zero no nível de 1% de significância.
Em conclusão, pode-se afirmar com segurança que a série não possui 3 raízes unitárias e
também não possui 2 raízes unitárias, mas pode possuir uma raiz unitária, caracterizando-se como
integrada de ordem 1 ou cbondt I 1 .
Testes similares aplicados, e que corroboraram as evidências do teste de Dickey e Pantula
foram os testes ADF de Dickey e Fuller, o teste de Phillips e Perron e por fim o teste KPSS de
Kwiatkowski, Phillips, Schmidt e Shin, que inverte o procedimento dos testes anteriores,
considerando como hipótese nula a não existência de uma raiz unitária na série. Os testes de
Dickey e Pantula (DP) permitiram concluir que a série analisada, composta pelas cotações diárias
do C-Bond entre 02/01/1997 e 28/12/2001, não possui duas ou mais raízes unitárias. Não
obstante, os testes DP e todos os demais sugerem a existência de uma raiz unitária na série.
Nenhum resultado contradiz esta conclusão, independentemente das diferentes especificações
utilizadas. Assim, pode-se afirmar que Cbondt é, uma série integrada de ordem 1.
Procedimentos similares foram aplicados em todas as séries. As séries de cotação
mostraram-se integradas de ordem 1, ou seja, sua primeira diferença (que foi utilizada para
cálculo dos betas) é estacionária. No caso das taxas (poupança e CDI), a primeira mostrou-se
estacionária, enquanto o CDI não permitiu a rejeição da hipótese de existência de uma raiz
unitária.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
11
Este artigo procurou introduzir a discussão acerca da adequação do uso de algumas
aproximações para a determinação da taxa livre de risco no Brasil. A existência na economia de
uma taxa pura de juros é um dos preceitos básicos para a aplicação do modelo CAPM de
precificação de ativos, e a mesma deve ser passível de observação através de ativos que possuam
características aproximadas ao proposto teoricamente. A utilização de aproximações inadequadas
pode levar a erros de interpretação e de resultados, de modo que a minimização de tais erros deve
ser buscada através da observação de variáveis adequadas.
Na análise das possíveis aproximações da taxa livre de risco no Brasil, o título C-Bond
mostrou-se inadequado, visto possuir correlação estatisticamente significante com outros ativos
presentes na economia. Parte do risco sistêmico está captado no retorno do ativo,
descaracterizando-o portanto como livre de risco. Os retornos da Caderneta de Poupança, assim
como os do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), entretanto mostraram-se condizentes
com a conceituação teórica de uma taxa pura de juros, com correlação insignificante com o
mercado e desvio padrão de retornos também desprezíveis.
A conclusão acerca da inadequação de uma das aproximações e da adequação das demais
suscita entretanto uma nova questão que é à existência na economia brasileira de duas taxas com
características similares em termos de risco mas com retornos médios muito diferentes mesmo no
longo prazo. Essa aparente disfunção de mercado abre um campo vasto de possibilidades de
estudo, visto que contrasta com alguns preceitos fundamentais da moderna teoria de finanças.
5. BIBLIOGRAFIA
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COPELAND, T, KOLLER, T, MURRIN, J. Valuation: Measuring and Managing the Value of
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York: Oxford University Press, 1993.
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unit root. Econometrica, v. 49, n. 4, p. 1057-1072, July 1981.
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Opportunity to Invest It. New York. Kelley & Millman. 1954.
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KOUTMOS, Gregory. Asymmetries in the conditional mean and conditional variance: evidence
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MENDES, B. V. M, DUARTE, A. M. - Modelos Estatísticos Aplicados ao Mercado Financeiro
Brasileiro. 13º SINAPE. ABE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTATÍSTICA, 1998.
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Applied Linear Statistical Models. McGraw-Hill, 1996.
ROLL, R. ROSS, S. On the cross sectional relation between expected returns and betas. The
Journal of Finance. v. 49, n. 1, Mars, 1994.
12
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