1) - GEEA

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BIOPIRATARIA
Por Marta Almeida, Isadora Pereira e Maurício dos Reis
Prof. Roberto Veloso
(Departamento de Zootecnia e Coordenador do
Núcleo de Estudos em Zootecnia da Conservação)
GEEA/UEMA - Na sua opinião o que o Brasil perde, em temos ambientais, com a
biopirataria?
Temos um número muito grande de invertebrados no Brasil, dos quais se
conhece muito pouco. Temos grande poder de inventariar e descrever novas espécies,
porém isso não é feito de forma satisfatória em relação à demanda de biodiversidade
que temos. Hoje temos no Maranhão um fluxo de animais, como uma espécie de
serpente chamada Bothrops atrox que é traficada e exportada para a indústria
farmacêutica da Índia e da China que tem interesse comercial em produzir novos
medicamentos com algumas substâncias presentes na serpente e com essa intenção estão
levando-as do Brasil. Este tipo de problema já se encontra em conhecimento de órgãos
como a Polícia Federal e a Agência Brasileira Inteligente, no entanto, pouco se sabe do
andamento das investigações, pois estas são sigilosas.
No caso da Amazônia temos diversos anfíbios que possuem substâncias com
função protetora para evitar a predação e essas substâncias são muito potentes, sendo
que algumas estão sendo utilizadas no combate à hipertensão, diabetes, portanto, esses
animais também estão incluídos na lista de animais traficados.
Com relação à flora também existem espécies que são biopiratiadas e várias
partes de plantas são utilizadas para fins farmacêuticos.
GEEA/UEMA - A produção científica é proporcional ao potencial da
biodiversidade do país?
Deveria ser. Se nós focalizássemos mais nossa atenção para a produção
científica com relação à biodiversidade brasileira teríamos descobertas importantíssimas
para o legado da nossa ciência. Não temos ainda pesquisadores suficientes e infraestrutura para o que temos disponíveis e o que é utilizado de forma empírica pelas
comunidades acabam muitas vezes nem chegando ao conhecimento da ciência ou as
informações que já se encontram na universidade atingem uma limitação no seu
desenvolvimento.
Por exemplo, temos o uso empírico de uma determinada planta, mas não se é
trabalhado seu princípio ativo, óleos essências, não se estuda sua farmacologia ou a
toxicologia dessa planta por não possuirmos pesquisadores ou por não termos recursos
suficientes para tal. E sendo assim, muitas empresas estrangeiras se aproveitam dessa
limitação e acabam levando as plantas para fazerem trabalhos fora do país, fazendo cair
ainda mais o prestigio científico do Brasil.
Então a perda se torna muito grande devido aos poucos recursos disponíveis
para a pesquisa científica no Brasil.
GEEA/UEMA - Como funciona o ciclo da biopirataria desde a captura dos
animais até seu comprador final? E quem mais lucra nesse processo?
As pessoas que compõem esse processo são muito bem articuladas. No caso da
biopirataria de fauna os compradores finais comunicam-se com os compradores
intermediários que são pessoas que já possuem um histórico de uso ou acesso a uma
determinada espécie e que já possuem toda a informação da espécie que deseja como
área de ocorrência, em qual época estão mais vulneráveis e etc, e estes por sua vez
compram as espécies de pessoas que habitam áreas rurais onde os animais ocorrem.
Essas pessoas que capturam os animais são geralmente humildes que necessitam de
dinheiro e que normalmente não questionam o destino do animal depois de capturado.
Existem ainda casos de capturas de serpentes em que a pessoa faz questão de
entregá-los para o tráfico devido ao fato de provocarem acidentes de carro em estradas,
vendo assim uma maneira de se livrar desses animais em sua região.
Pouco se conhece como esses animais saem do país, ou se há uma extração
desses animais na própria região, como no caso da jararaca (Bothrops sp.) que também é
um grande alvo da biopirataria aqui no Maranhão.
E quem mais lucra em todo o processo são os compradores finais, na maioria
estrangeiros, de indústrias farmacêuticas se caso tiverem sucesso com a fabricação dos
fármacos.
GEEA/UEMA - A maior parte dos animais silvestres é enviada ao exterior? Existe
algum trabalho conjunto com entidades e governos de outros países para combater
o tráfico de animais silvestres?
A maioria dos animais não é exportada. É bem evidente que os animais que
possuem um apelo comercial intensivo e que são utilizados também como animais de
estimação principalmente na Europa e Ásia já são reproduzidos em cativeiro em larga
escala, pois o conhecimento da biologia desses animais como reprodução, alimentação,
comportamento e etc, são bem mais aprofundados que os nossos, que não possuímos
um histórico de uso e criação desses animais.
A exemplo temos a arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus) e a arara
canindé (Ara ararauna) que são reproduzidas na Europa e que são comercializadas por
preços menores do que fossem contrabandeadas de outros países. Até porque o
transporte ilegal desses animais acarreta grandes riscos a quem comercializa podendo
acontecer o incidente de os animais não agüentarem os maus tratos do processo e virem
a morrer, ocasionando o fracasso da operação consequentemente com prejuízos aos que
traficam.
Por isso afirmo que a maior parte da fauna traficada nacionalmente é para
atender uma demanda de brasileiros.
Existem sim trabalhos junto ao governo estrangeiro como a Convenção
Internacional de Fauna e Flora ameaçada de extinção (CITES), onde a sede é na Europa,
sendo o Brasil um dos signatários desde o ano de 1975. Todos os países signatários
seguem um protocolo. A CITES somente combate o tráfico internacional não se
estendendo ao tráfico nacional, esse órgão possui anexos onde são listados os animais
em extinção.
GEEA/UEMA - O que você acha que falta, por parte, do governo e da sociedade
civil, no combate ao tráfico de animais silvestres?
O tráfico obviamente é uma atividade ilegal e a maioria da população sabe disso.
Porém temos um grande desafio de lutarmos contra a cultura do brasileiro advinda de
culturas passadas em aprisionar animais e conviver com eles. A nossa cultura é uma
mescla de indígenas, portugueses e negros africanos, onde os índios já mantinham os
animais em cativeiro chamando-os de xerimbabu. Já os portugueses adoravam a
coloração e o comportamento dos animais que encontraram quando aqui no Brasil e a
partir daí os aprisionavam para conviver em suas casas aqui e na Europa.
Esse legado cultural já se encontra enraizado no cotidiano do brasileiro
tornando-nos permissivos a isso. Muitos também não configuram como crime o
aprisionamento de animais, por pensarem que em um país onde existem tantas mazelas,
em que parte da população vive na miséria, o próprio governo deveria se preocupar com
os outros tipos de tráficos e não com o de animais silvestres.
Outro ponto importante a se pensar é que o tráfico de animais não é fator
determinante da maior ameaça da fauna, apesar de eu não ter dados estatísticos sobre
isso, é evidente que a maior ameaça é por parte da degradação e a fragmentação dos
habitats onde esses animais vivem.
Então se perde muito mais biodiversidade e elevamos o número de espécies
ameaçadas através do desmatamento do que do próprio tráfico.
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