Leilão é o teste do novo modelo de energia No fim de setembro, ao comentar o lançamento de ações da CPFL Energia, que rendeu mais de R$ 800 milhões ao caixa da elétrica, o presidente da empresa, Wilson Ferreira Jr., admitiu aos analistas que, a partir do novo modelo, o setor elétrico pode passar por um processo de consolidação, no qual a empresa seria uma das potenciais consolidadoras. Aliás, capitalização no segmento deixou de ser uma palavra fora de moda, e o passo do maior investidor nacional na área deve ser acompanhado - uma das candidatas a lançamento de papéis é a Brasiliana, holding da AES no Brasil. Não são fatores isolados e seriam impensáveis dois anos atrás, quando os efeitos do racionamento eram mais visíveis, mas a melhora significativa do setor ainda não é condição suficiente para que um novo temor de crise na área esteja distante. O cenário do setor para 2005 e os anos seguintes começa a ser desenhado no próximo mês, quando o governo leiloará mais de 50 mil MW em energia que as elétricas ainda têm de sobra e não foram contratados por conta dos hábitos pósracionamento. Esse será o primeiro teste prático sob a regulação do novo modelo, em discussão desde a transição de governo, no fim de 2002. O primeiro termômetro é o preço que a energia ofertada no leilão de dezembro terá. O resultado terá influência na capacidade de investimento e só a partir dele poderemos começar a projetar investimentos para o setor em 2005; hoje ainda há incógnitas sobre a capacidade de atração de recursos, afirma o presidente da Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica – Cbiee –, Cláudio Sales. Preços muito baixos poderão reduzir o caixa das geradoras privadas e estatais, o que poderia ter conseqüências ruins para o superávit primário do governo federal, e desestimular novos investimentos. Encontrar um preço justo de remuneração, para os dois lados, será fundamental. Outra preocupação é como se dará a participação das geradoras privadas no leilão e o processo de formação de preços. O nó do problema é que a privatização das elétricas parou na metade e 80% das geradoras estão nas mãos do Estado. É preciso ter transparência total para que não haja dúvidas sobre o processo e que haja competição sadia e livre, alerta Sales. Ter a iniciativa privada é condição fundamental para assegurar o equilíbrio entre oferta e demanda. Estudo da Tendências Consultoria aponta que as necessidades anuais de expansão da área em distribuição, transmissão e geração estariam em R$ 20 bilhões, sendo que pouco mais da metade teria de vir do caixa das empresas privadas. A única coisa certa é que os investimentos em 2003 e neste ano não estão chegando ao necessário, principalmente na área de geração, diz Sales. Bem-sucedido, o leilão de energia existente pode dar um empurrão no ânimo dos investidores para o segundo e, mais importante, teste do modelo, a licitação de energia nova de 17 usinas que podem acrescentar 3 mil MW ao sistema do país a partir de 2009. Como demanda e oferta podem ficar mais próximas a partir de 2008, o preço dessa energia ganha atenção redobrada e especial. Será o sinal do preço para a energia futura, fundamental para os investidores, diz o vice-presidente da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia Elétrica, Eduardo Carlos Spalding. Nessa licitação, os empresários buscam uma solução para um dos pontos que estão em aberto, mesmo com a regulação do setor. Antes do novo modelo, as usinas eram leiloadas por um sistema de ofertas entre os interessados, que ganhavam se 1 oferecessem o maior ágio. Muitos pagaram altíssimos ágios por usinas que nem tinham licenças ambientais prévias. O novo modelo mudou isso. Agora as usinas de geração seguirão os moldes dos leilões de transmissão, o governo dará a concessão para quem oferecer a menor tarifa. O problema que preocupa os empresários é como compatibilizar os custos de quem pagou o ágio e de quem não pagou. Esse prêmio pago pelos participantes pode ser ressarcido nas tarifas, mas falta regular o limite e o prazo que ele pode ter dentro da conta de luz. Resolver essa pendência é fundamental para que os investidores que já fizeram aportes mantenham sua confiança, afirma Sales. Mesmo depois da licitação de nova energia, o sócio-diretor da Excelência Energética, José Said Brito, acredita ser difícil a vinda de novos players, que estariam esperando sinais de confiança do novo modelo ao longo do próximo ano. Para outros especialistas, nesse leilão, há uma tendência de formação de parcerias entre agentes privados e estatais, em moldes semelhantes aos observados na área de transmissão. Segundo um analista que não quis se identificar, o perfil dos participantes do leilão deve continuar semelhante ao visto antes de 2003, ou seja, grandes consumidores, empreiteiras e grandes grupos nacionais devem consolidar suas posições. Só passados os dois testes, o cenário de energia dos próximos anos pode ficar claro quanto à atração de investimentos e à entrada de novas usinas no horizonte. Muitas obras iniciadas ainda aguardam a definição dos leilões para serem terminadas, enquanto outras ainda na fase inicial estão à espera das licenças ambientais. Segundo especialistas, perto de 5 mil MW estão nessas condições. Os investidores querem sinais concretos para colocarem de pé os projetos, diz Sales. Por enquanto, há uma folga para se trabalhar, o setor opera com 8 mil MW de sobra de energia, o que dá segurança no abastecimento de três anos, e coloca pressão sobre o leilão de usinas de nova energia, cuja entrada no sistema se dará a partir de 2009. Se ainda sobram dúvidas, a boa notícia, que dá alento ao setor, é que o crescimento do consumo, que no segundo semestre tem crescido 6%, puxado principalmente pelas residências. Se a economia se mantiver no ritmo desse ano, crescendo 4%, a tendência pode ser mantida em 2005, o que ajudaria a engordar o caixa das elétricas, que já mostram sinais de melhoria em seu endividamento. Até setembro, sete empresas obtiveram R$ 1,6 bilhão no lançamento de debêntures, enquanto em 2002 apenas a Copel tinha se aventurado no mercado interno. Fonte CENTRO NACIONAL DE REFERÊNCIA DE PEQUENAS CENTRAIS. Leilão é o teste do novo modelo de energia. Disponível em: <http://www.cerpch.efei.br/noticias/ano_2004/novembro/03/3le.html>. Acesso em: 11 ago. 2005. 2