FACULDADE DE TECNOLOGIA ESTÁCIO – UNIDADE BELO HORIZONTE CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM GASTRONOMIA COZINHA BRASILEIRA (NORTE, NORDESTE) 5º PERÍODO PROF. FERNANDO SABINO DA MANDIOCA À TAPIOCA. ATÉ EM CASA! Antes de mais nada, vamos combinar que goma seca, polvilho doce, amido de mandioca, fécula de mandioca, almidon de tapioca e tapioca starch são todos a mesma coisa. É o carboidrato presente na mandioca (aipim, macaxeira, cassava, yucca) com quase nada aderido a ele - sem glúten, baixíssimo teor de proteína e gordura, altamente calórico (quase como o açúcar, também carboidrato) e que faz maravilhas na cozinha, como beijus, brevidades, pães de queijo, tapiocas, pudins, molhos e tantas outras. Era a farinha mais usada por aqui antes da globalização do trigo. E o mais importante: fácil de fazer até na cozinha de casa – só por diletantismo, já que o polvilho é um produto tão barato. Veja, abaixo, o passo a passo: Lave bem e descasque a mandioca. Aqui, da branca e da amarela. Tanto faz, o amido será sempre branquinho. Corte a mandioca em pedaços e, com água suficiente para fazer o aparelho funcionar, vá triturando no liquidificador e passando por peneira fina. O melhor é usar o mínimo possível de água, já que o objetivo é aproveitar o sumo amarelo para fazer tucupi, e quanto mais concentrado, melhor. Mas, se não fizer questão disso, use quanta água for preciso, pois quanto mais aguada estiver a mistura, mas amido será extraído. Se quiser se exercitar um pouco mais, rale toda a _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 1 mandioca em vez de liquidificar – assim é o jeito clássico. Neste caso, junte água depois para enxaguar bem as fibras e extrair o amido. Depois que toda a mandioca já foi triturada, passe por pano de algodão tanto a fibra quando o líquido obtido da peneiragem, espremendo bem. Nem um pouco da fibra interessa para fazer o polvilho. Só o líquido leitoso – graças à presença do amido, que é superfino e passa pela trama do pano. Se preferir, já vá passando pelo pano na medida em que for triturando no liquidificador. Deixe o líquido obtido em repouso para que o amido sedimente. A fibra separada pode ser usada em pães, bolos, pudins. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 2 Para fazer bolo com a fibra: Junte à fibra bem espremida de 1,5 kg de mandioca, 3 ovos, 1 xícara de açúcar, 1 pitada de sal, 1 xícara de leite, 1/4 de xícara de manteiga, 1 colher (sopa) de fermento, cravo socado a gosto. É só misturar tudo e levar para assar numa assadeira retangular. Se quiser, polvilhe coco ou queijo ralado por cima. Depois de umas duas horas ou até menos, todo o amido estará sedimentado no fundo do recipiente. Para fazer polvilho azedo é só deixar a mistura fermentar de 15 a 20 dias antes de separar o líquido. Este polvilho terá mais sabor, acidulado. Escorra o líquido e reserve para fazer tucupi, se quiser. Coloque um pano limpo e seco sobre a goma (ou amido) para chupar a água excedente. Deixe cerca de 1 hora. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 3 Se for fazer tucupi, deixe o líquido fermentar de um dia para outro e afervente por 20 minutos com alfavaca, alho, sal e chicória-do-pará (coentro-do-norte, coentrão, coentro-do-pasto) ou coentro comum mesmo. Só para temperar. Guarde na geladeira e use no peixe, no pato ou no que quiser. A goma deve ser revirada para ficar em torões. Se começar a se juntar de novo, com aspecto derretido (líquido não-newtoniano é o nome disto), coloque de novo um pano seco na superfície. Passe os torrões por peneira – a farinha úmida obtida é que vai ao sol para secar e virar polvilho seco. Se quiser, conserve umas pedrinhas maiores para secar assim. Ficam bonitas e dissolvem do mesmo jeito quando precisar – basta passar por peneira na hora de usar. Se quiser, use os torrões passados por peneira para fazer tapioca (esta goma molhada pode ser guardada na geladeira por até 3 dias). É só peneirar direto sobre a frigideira. Eu prefiro sem sal, mas, se preferir, peneire, junte uma pitada de sal, misture bem e peneire de novo sobre a frigideira – mesmo que não seja antiaderente, desde que tenha superfície bem lisa, não precisa untar. Leve ao fogo e vire quando os grânulos estiverem todos grudados formando uma “panqueca”. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 4 Como a mistura não tem proteína, não vai acontecer aquela reação de Maillard que dá o dourado da crosta do pão ou faz a panqueca dourar. Aqui, se passar do ponto, queima mas não doura. O certo é assim, branquinha e flexível. Se deixar um pouquinho mais ou se fizer isto no forno, conseguirá beijus crocantes. Existem duas outras formas de fazer tapioca a partir do polvilho doce e ou goma seca: 1. Basta cobrir o polvilho doce com água (algo como 1 litro de água para meio quilo de amido) e deixar hidratar por 2 horas. Jogue a água fora, cubra com um pano– ou despeje a fécula molhada sobre ele – e espere mais 2 horas para que o pano enxugue o excesso de água. O resto é igual. 2. Outra forma é juntar o polvilho doce com água suficiente apenas para umedecer – é um processo meio chatinho, porque se tiver água de menos os grânulos não grudam entre si e se tiver de mais vai virar aquele tal líquido não-newtoniano – sem pressão, ele derrete, escorre. Então, a _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 5 proporção é mais ou menos 500 ml de água para 1 quilo de fécula – amasse bem desmanchando os grumos, até formar uma farofa úmida. Faça um teste na frigideira. Se formou uma farofa seca e solta, junte mais água. Se pela peneira passarem cobrinhas em vez de bolinhas, precisa juntar mais polvilho. Tapiocas e suas variações e recheios merecem outro post - mais pra frente. Para terminar de fazer o polvilho doce, a farinha úmida peneirada deve ser espalhada sobre uma assadeira ou recipiente raso e deixada sob sol durante uns 3 dias (coberta com tule e recolhida à noite) ou até não restar mais umidade e ficar com jeitão de um pó fino e solto. Agora é só passar de novo por peneira mais fina e guardar em vidro tampado. Os grânulos maiores que também foram secos sob o sol são guardados separadamente - só por boniteza. RADIOGRAFIA DA MANDIOCA há muito ainda a aprender sobre nosso ingrediente nacional. Existem muitos derivados da mandioca e a confusão de nomes é geral. Temos uma legislação brasileira que tenta padronizar nomes e definir qualidades, mas as farinhas artesanais ganham nomes e formas de preparo diversos dependendo da região e da criatividade. O importante é reconhecer estes produtos e valorizar estas diferenças. Nem tudo é farinha do mesmo saco. PUBA OU MASSA DE MANDIOCA: Mandioca deixada em água corrente ou em tanques para pubar (amolecer) por cerca de 5 dias. Quando está mole, é triturada só ou com uma parte de mandioca fresca, lavada, prensada para tirar parte da goma e peneirada para reter as fibras e resíduos duros da mandioca (crueira). A massa fina obtida é vendida fresca para fazer mingau, cuscuz com coco ou bolo. Pode também ser seca e vendida como “farinha de carimã”. Depois de pubada, a mandioca da variedade branca ou da amarela pode ser triturada integralmente (com crueira) para se transformar em farinha d´água em suas muitas versões, com coco inclusive. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 6 Massa puba de Recife, do Mercado Municipal da Lapa FARINHA D’ÁGUA: Típica da região Norte, é feita com a mandioca puba triturada. Pode ser feita com mandiocas brancas ou amarelas – esta, mais comum. É usada para fazer pirões ou para acompanhar pratos com molho: moquecas, pato no tucupi, peixadas e cozidos. Ou na forma de misturas molhadas como chibé ou jacuba (basicamente mistura de água e farinha, que pode ser temperada com açúcar ou mel). Vai bem ainda no pirão ou numa sopa feita com carne e caldo. É usada como farinha de mesa na região Norte. Mas tem que engolir direto sem mastigar ou deixar na boca algum tempo para umedecer. A farinha d’água de Bragança (PA) é feita com mandioca amarela pubada, torrada com ou sem coco e embalada em paneiro de arumã. Boa como farinha para comer de merenda, para fazer pirão ou acompanhar pratos molhados. Farinha d’água de Bragança, considerada a melhor do Pará _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 7 FARINHA D’ÁGUA DE UARINI, tipo ovinha: Típica do Amazonas, feita no distrito de Uarini (a 3 dias de Manaus ou 2 horas de barco, de Tefé). Também conhecida simplesmente como farinha de Uarini. É um produto raro, o caviar das farinhas, custa caro (cerca de R$ 5,00 o quilo) se comparada às outras porque seu feitio é trabalhoso. É feita com a mandioca amarela pubada por 3 dias. Depois de espremida no tipiti (prensa de palha), passa por peneira para tirar a crueira (o resíduo duro) e então vai para a masseira para ser rolada com a mão até formar bolinhas e tamanhos variados. Há uma opção mais "moderna" que é passar a massa por uma engenhoca artesanal chamada de emboladeira – duas placas de madeira ou metal rolam uma sobre a outra com ma massa entre elas, formando bolinhas. Depois de secas em tacho, são peneiradas para separar por tamanho: ova ou ovinhas. Farinha de Uarini, do Mercado Municipal de Manaus GOMA: Geralmente quem faz farinha, não extraí polvilho e vice-versa. Mas há quem faça as duas coisas e neste caso, o produto resultante depois da extração do amido é uma farinha rica em fibras, mas pobre em amido. Dependendo do lugar, pode ser chamada de farinha seca (que em outros lugares é a nossa farinha comum, sem pubar) ou farinha de raspa. Para extrair a fécula (amido da mandioca, polvilho ou goma), a mandioca é ralada, lavada e prensada. O líquido obtido é deixado em repouso por cerca de 4 horas para o amido decantar. A água é jogada fora, restando no fundo o sedimento úmido. É a goma fresca. Desmanchado e deixado a secar este sedimento transforma-se em fécula seca, um talco fino que recebe o nome comercial de polvilho doce. Se a água é deixada com a goma sedimentada para fermentar por cerca de 10 dias, o polvilho resultante estará ácido. É o polvilho azedo. A goma fresca pode ser peneirada para fazer beijus crocantes ou tapiocas (as panquequinhas brancas e úmidas). Um ou outro dependendo da espessura ou do calor empregado. No Mercado da Lapa há também "goma seca do Norte" que nada mais é que o polvilho para nós, só que um pouco mais encaroçado. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 8 A goma fresca se apresenta assim, em torrões POLVILHO DOCE: É a goma desidratada até virar um talco bem fino. Quando hidratado e aquecido, dá bastante liga, portanto, é bom também para fazer beijus e tapiocas. Com líquido e aquecido, forma um mingau cremoso e transparente, com bastante liga. Pode ser usado para fazer pãezinhos, bolos, brevidades. Polvilho doce POLVILHO AZEDO: Como já disse acima, a água com o sumo da mandioca é deixada com a goma sedimentada para fermentar por cerca de 10 dias ou mais. O polvilho tirado daí estará bem ácido e confere sabor ácido agradável aos preparos, além de permitir maior expansão: pães de queijo e biscoitos de polvilho crocante, por exemplo. O mingau feito com ele é mais escuro, transparente, cremoso e macio (tem proporção maior de amilopectina, responsável pela maciez e transparência, em relação à amilose, cujo teor diminui com a acidez). _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 9 Polvilho azedo SAGU: É feito com a goma (polvilho, fécula) da mandioca, mas originalmente era feito com o amido de uma palmeira (sagueiro). Em outros países pode ser feito com o amido mais abundante no local, como de batata-doce, por exemplo. Na indústria, o amido é coagulado e boleado para bolar esferinhas de tamanho padronizado. Artesanalmente a massa era boleada com as mãos sobre pano estendido e depois seca. Sagu FARINHA DE TAPIOCA: Típica do Pará, são grânulos de amido coagulados na forma de sagus, e estourados em chapa quente como pipocas. A extrusão dá aos grânulos aspecto de isopor. Usada em pãezinhos, mingaus, cobrindo sobremesas ou como acompanhamento de polpa de açaí ou bacaba salgada ou doce. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 10 Farinha de tapioca TAPIOCA GRANULADA: Feita com o amido molhado que é coagulado em grânulos sobre chapa quente. É separada por peneira em grãos finos ou grossos. Tem aparência de sal grosso, meio translúcida e pode ser usada em cuscuz (umedecida com leite de coco doce), bolos ou mingaus. Tapioca granulada FARINHA DE MANDIOCA COMUM OU SECA (ou ainda farinha de mesa): Aquela que conhecemos como farinha comum e que vai à mesa para acompanhar pratos de carne ou peixe. É nosso pão brasileiro para acompanhar comidas de todo tipo, principalmente entre nordestinos. Pode ser usada para fazer farofas – crocantes, com manteiga, ou de água. Pela legislação brasileira, a farinha comercializada tem que ter no mínimo 75% de amido (a goma). Alguns tipos artesanais, no entanto, são mais polvilhadas, como as do Sul, finíssimas quase como trigo. No processo normal a mandioca é descascada, ralada, prensada e seca em grandes tachos. Se a polpa for lavada com água antes de ir à prensa para extrair o polvilho, que é levado com a água, a farinha sairá mais _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 11 fibrosa (rica em fibras insolúveis, o que não é nada mal pra quem quer ter regularidade intestinal), conhecida no Norte, esta sim, como farinha seca, considerada de categoria inferior. É boa para sopa, pois não a deixa muito viscosa. Farinha de mandioca FARINHA AMARELA DO PARÁ: Igual à de cima, só que feita com farinha amarela. Boa como farinha de mesa e para farofas. Com banana-da-terra e caranguejo, por exemplo. Algumas casas de farinha adicionam corante amarelo-tartrazina, que é proibido, e outras adicionam cúrcuma. Farinha amarela do Pará FARINHA BIJUSADA QUEBRADINHA: Típica da Bahia, é feita com goma molhada seca peneirada numa camada fina sobre chapa quente formando pequenos beijus disformes e crocantes. Na Bahia ela pode ser consumida no café (isto mesmo, dentro do café) ou no leite, com rapadura. É _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 12 bom também pra ir beliscando na hora da fome. Com coco ralado e açúcar, levada ao forno, faz um tipo de granola para ser comida pura ou acompanhando frutas. Aliás, melhor que qualquer granola. Farinha bijusada quebradinha REFERÊNCIAS RIGO, Neide. Da mandioca à tapioca e ao polvilho. Disponível em: <http://come- se.blogspot.com/2007/12/da-mandioca-tapioca-e-ao-polvilho.html>. Postado em 04 dez 2007. RIGO, Neide. Mais paladar brasileiro e radiografia da mandioca. Disponível em: <http://come- se.blogspot.com/2008/06/mais-paladar-brasileiro-e-radiografia.html>. Postado em 19 jun 2008. _________________________________________________________________________________________________ MANDIOCA 13