Barros, Geraldo S. de Camargo.”Os efeitos da política de juros altos sobre o agronegócio.”São Paulo:Valor Econômico,10 de maio de 2004 JEL:E. Os efeitos da política de juros altos sobre o agronegócio. Geraldo S. de Camargo Barros e Humberto F. Spolador Se na década de 1980, até a implementação do Plano Real, em 1994, o debate econômico se concentrava na estabilização monetária, a partir da segunda metade da década de 1990 e nos primeiros anos desta década, tem sido concentrado em duas questões, a saber: os juros altos e o crescimento econômico. Há um consenso entre os diversos setores produtivos da economia brasileira e uma concordância entre muitos economistas, de que as altas taxas de juros são, do ponto de vista macroeconômico, o principal entrave para que o país retome as taxas de crescimento da economia observada até a década de 1970. Nos anos de 2002 e 2003, biênio em que o âmbito macroeconômico foi marcado por turbulências, incertezas e crescimento muito baixo e, mesmo, negativo, foi muito destacado o desempenho da agropecuária que, ao contrário da economia em geral, obteve um crescimento muito expressivo. Pode-se, a priori, fazer uma suposição falsa de que a agricultura não está sendo afetada pelas restrições impostas pela conjuntura macroeconômica, devido aos elevados ganhos de produtividade do setor nos últimos anos. A figura 1 mostra que até 1999, porém, a taxa de crescimento do PIB do agronegócio foi pequena chegando a ser negativa de 1995 para 1996, e de 1996 para 1997. Entre 1994 e 1999, deve-se ressaltar, as dificuldades macroeconômicas foram bastante acentuadas para a agricultura, uma vez que o setor se defrontou com a redução dos preços internacionais, os juros altos, e a sobrevalorização cambial. A sobrevalorização cambial afeta negativamente a agricultura em dois aspectos: (1) reduz a competitividade dos produtos nacionais no mercado internacional; (2) reduz o preço doméstico dos produtos importados, ambos proporcionando uma redução da rentabilidade dos agricultores; essa situação se agrava pelas distorções tributárias sob as quais a agricultura está submetida. Com taxas de juros elevadas, o custo de tomada de crédito por parte dos agricultores se eleva sobremaneira, principalmente fora do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR). A taxa de juros cobrada pelo SNCR é bem inferior às taxas observadas no mercado financeiro (8,75% ao ano); porém, o volume de recursos oficiais para o crédito rural teve vigorosa redução, se comparada aos anos anteriores, na década de 1990. A figura 2 contém a evolução das relações entre o índice de recebidos pelos agricultores e os índices de preços pagos e o IGP-DI , a partir de 1994. A primeira relação chegou a cair até 20% em torno do ano 2000; a segunda chegou a 15%. A queda real dos preços agropecuários agravou o enfraquecimento financeiro dos produtores rurais. A recuperação de ambos os indicadores nos últimos dois anos explica boa parte do desempenho observado no agronegócio nesse período. A política monetária executada ao longo dos últimos anos, com a finalidade de garantir a estabilidade monetária, produziu uma taxa de juros nominal bastante elevada. A taxa de juros referencial da economia é a Selic, que representa a média dos juros pagos pelo governo aos bancos pelos empréstimos tomados. Em um trabalho realizado neste ano no Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Esalq/USP, considerando dados de 1974 a 2003, procurou-se estimar empiricamente os efeitos da política monetária sobre o desempenho do PIB da agropecuária. Os resultados mostram que uma política monetária mais restritiva, que eleve em 10% a taxa de juros, tem um efeito recessivo sobre a taxa de crescimento do PIB da agropecuária de cerca de 54%. Esse efeito se manifesta tanto pelo maior custo na obtenção de crédito para financiar a produção, como no custo de oportunidade dos investimentos no setor representado por maiores retornos financeiros alternativos em outras atividades. Além disso, juros altos reduzem o emprego e renda do país, contraindo o consumo doméstico de produtos agropecuários. Pode-se concluir, portanto, que as altas de juros são responsáveis por boa parte do desempenho irregular do agronegócio na década passada. Além disso, embora o setor agrícola venha, nos últimos dois anos, apresentando resultados muito superiores ao da economia em geral, em face de uma melhoria de sua lucratividade, um cenário macroeconômico mais favorável, que envolve uma taxa de juros mais baixa, será um fator adicional relevante para a expansão do agronegócio brasileiro.