Pochmann, Márcio. “O desemprego no governo Cardoso”. São Paulo: Folha de São Paulo, 02 de agosto de 2000. O desemprego no governo Cardoso MARCIO POCHMANN A última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio traz um conjunto de dados interessantes sobre a realidade do país. Especialmente em relação ao desemprego -tema de maior relevância para grande parte da população brasileira, segundo as pesquisas de opinião- há indicações inquestionáveis sobre a gravidade da crise do emprego nacional. Segundo o IBGE, 7,6 milhões de trabalhadores foram considerados desempregados em 1999, enquanto em 1995 eram 4,5 milhões. Nos últimos quatro anos, o volume do desemprego foi aumentado em 3,1 milhões de trabalhadores, fazendo com que a taxa nacional de desemprego oficial passasse de 6,1% para 9,6%. Para o mesmo período de tempo, a População Economicamente Ativa (PEA) cresceu 6,8%, o que implicou adicional de 5,2 milhões de pessoas no mercado de trabalho. A quantidade de postos de trabalho aumentou apenas 2,94%, representando a criação de 2 milhões de novas vagas. Em outras palavras, a cada três pessoas que ingressaram no mercado de trabalho nos últimos quatro anos, somente uma conseguiu encontrar algum posto de trabalho. Diante do contexto de escassez na quantidade de vagas abertas pela economia nacional, o volume de pessoas desempregadas aumentou 68,9%. Mas o desemprego poderia ter sido ainda maior se 352 mil pessoas não tivessem deixado de fazer parte da força de trabalho. A situação extremamente desfavorável do mercado de trabalho tem desestimulado as pessoas desempregadas a procurar trabalho, o que leva o IBGE a identificá-las, muitas vezes, como inativas. Do total de pessoas sem ocupação em 1999, 48% eram homens, enquanto 52% dos desempregados eram do sexo masculino em 1995. Pode-se concluir que, nos últimos quatro anos, o desemprego cresceu mais para o sexo feminino, apesar de 63% dos postos de trabalho abertos no Brasil serem ocupados pelas mulheres. A pesquisa do IBGE também permite constatar que, entre 1995 e 1999, a quantidade de brasileiros com escolaridade abaixo de três anos foi reduzida em 6,7%, enquanto o volume de pessoas com mais de 11 anos de escolaridade aumentou 32,8%. Apesar da nítida melhora no nível educacional da população, não houve, paralelamente, impacto sensível no nível ocupacional do país. Ao que parece, a população vem fazendo a sua parte. Isto é, apostando na educação. Lamentavelmente, a política macroeconômica do governo Cardoso não vem contribuindo. Por gerar um crescente excedente de mão-de-obra, influencia o maior acirramento do mercado de trabalho, o que leva ao rebaixamento dos salários dos ocupados. Em 1999, apesar de baixas taxas de inflação, o rendimento médio real do trabalhador foi 6,5% menor do que em 1995. Em contraposição, o Produto Interno Bruto (PIB) teve uma expansão de 11,8% no mesmo período de tempo. Considerando-se que o rendimento do trabalho decresceu, enquanto a renda nacional se expandiu, chegase à conclusão de que houve uma piora na distribuição funcional da renda. Ou seja, o que mais cresceu na renda nacional foi a participação das classes proprietárias (juros, lucros e aluguéis de imóveis). Não representa novidade saber que, em 1995, a participação do rendimento do trabalho na renda nacional era de 44% e, em 1999, estimava-se em apenas 40,7%. O que significa dizer que, nos últimos quatro anos, a parcela do trabalho na renda nacional foi diminuída em 7,5%, permitindo que a renda formada por juros, aluguéis e lucros passasse de 60% para quase 66%. Nesses termos, a situação brasileira é inversa à verificada nas economias desenvolvidas. A inversão da distribuição de renda requer uma sensível redução do desemprego no Brasil. Para isso, o modelo econômico conduzido pelo governo Cardoso precisa ser modificado, pois o seu curso tem-se apresentado solidário com o desemprego, bem como com a piora na distribuição funcional da renda. Até quando será possível sustentar isso? ------------------------------Marcio Pochmann, 38, economista, é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho) da Universidade Estadual de Campinas. E mail - [email protected]