1 Anabolismo de Lipídios Síntese de Malonil-CoA A principal enzima responsável pela biossíntese de ácidos graxos é a ácido graxo sintase. Para a biossíntese dos ácidos graxos, é necessária a presença de duas moléculas: o acetil-CoA e o malonil-CoA. A acetil-CoA pode vir de diversas vias metabólicas como, por exemplo, a conversão do piruvato a acetil-CoA. O malonil-CoA, por sua vez, deve ser sintetizado a partir da acetil-CoA. A síntese de malonil-CoA a partir de acetil-CoA é sintetizada por uma enzima chamada de acetil-CoA carboxilase. Essa enzima vai acrescentar um carbono à molécula de acetil-CoA (2C) para a síntese do malonil-CoA (3C). A acetil-CoA carboxilase é uma enzima que possui várias funções. Ela tem uma porção carreadora de biotina, onde há uma lisina ligada à biotina. Essa biotina possui a função de retirar o CO2 do bicarbonato e transferir esse CO2 para a molécula de acetil-CoA. O processo é o seguinte: primeiramente a biotina encontra-se na porção da acetil-CoA carboxilase que possui a função de biotina-carboxilase. Nessa porção, a biotina se liga ao CO2 proveniente do bicarbonato. Depois, a biotina vai para a porção de transcarboxilase da enzima acetil-CoA carboxilase. Essa porção removerá o CO2 da biotina e o transferirá para o acetil-CoA, formando o malonil-CoA. A síntese de malonil-CoA, apesar de não fazer parte da reação de biossíntese de ácidos graxos propriamente dita, é essencial para a formação destes, visto que somente o acetil-CoA não é capaz de formar os ácidos graxos. Biossíntese de Ácidos Graxos A reação catalisada pela ácido graxo sintase, que dará origem aos ácidos graxos, também é uma repetição de quatro reações, assim como a degradação dos ácidos graxos. A ácido graxo sintase de bactérias e plantas é composta por sete polipeptídeos específicos, cada um com determinada função. Já a ácido graxo sintase de vertebrados possui um único polipeptídeo com sete atividades distintas: a atividade da enzima dependerá da porção que está funcionando. De forma resumida, o processo de síntese de lipídios se dá através da ligação do grupo malonil da malonil-CoA e do grupo acetil do acetil-CoA ao sítio ativo da ácido graxo sintase. A primeira reação é uma reação de condensação, em que será formada uma molécula de quatro carbonos a partir do malonil-CoA e do acetil-CoA e que vai eliminar uma molécula de CO2. A segunda reação vai reduzir essa molécula condensada de quatro carbonos, oxidando, para tal fim, a coenzima reduzida NADPH + H+. A terceira reação será a desidratação dessa molécula de quatro carbonos, acarretando em uma dupla ligação entre dois carbonos dessa molécula. Por fim, na quarta reação do processo, acontece a redução da dupla ligação dessa molécula de quatro carbonos, havendo, assim, a oxidação de mais uma molécula de NADPH + H+. Assim, a ordem das reações será: condensação, redução, desidratação e redução. Todo o processo se inicia com a ligação do acetil-CoA e do malonil-CoA na ácido graxo sintase. Essa enzima possui sete porções diferentes com diferentes funções: 1- ACP – porção carreadora de acil, onde se liga o grupamento malonil 2- AT – porção onde há a ligação da acetil-CoA, que fará a conversão dos dois carbonos da acetil-CoA para o malonil-CoA 3- KS – porção onde acontece a condensação dos grupos acil e malonil (βcetoacil-ACP sintase) 2 4- MT – porção onde ocorrerá a transferência do grupo malonil da CoA para a ACP (malonil-CoA-ACP transferase) 5- KR – porção onde acontecerá a primeira redução do processo (β-cetoacil-ACP redutase) 6- HD – porção onde acontecerá a desidratação (β-hidroxiacil-ACP desidratase) 7- ER – porção onde haverá a segunda redução do processo (Enoil-ACP redutase) As porções que realmente catalisam a síntese dos ácidos graxos são as porções KS, KR, HD e ER. As demais porções estão envolvidas na ligação do acetilCoA e do malonil-CoA à enzima como um todo. A acetil-CoA vai se ligar na KS, a porção sintase que vai fazer a primeira condensação. O malonil-CoA, por sua vez, vai se ligar na porção ACP, responsável pelo seu transporte. A ligação da acetil-CoA na KS é catalisada por uma enzima chamada acetil-CoA transacetilase. A ligação do malonil-CoA na ACP é catalisada pela enzima malonil-CoA transferase. Depois que a acetil-CoA encontra-se ligada na KS e o malonil-CoA encontra-se ligado na ACP, a primeira reação da síntese de ácidos graxos (condensação) pode começar. Na condensação será eliminado o CO2 incorporado na produção do malonilCoA e serão condensados os dois carbonos do grupamento acetil com dois carbonos do grupamento malonil (após a perda do CO2), depois que o grupamento acetil for transportado do KS para o ACP. O produto estará ligado, portanto, à porção carreadora do grupo acil (ACP). Por que houve a reação inicial da acetil-CoA carboxilase incorporando CO2 na formação do malonil-CoA, se, já na primeira reação da ácido graxo sintase esse CO2 será eliminado? Isso acontece porque, para que haja o ataque do grupo malonil ao grupo acetil, a presença da carga negativa do oxigênio do CO2 é essencial, já que este oxigênio “puxará” os elétrons para si, enfraquecendo a ligação que deverá ser condensada. Assim, o CO2 do malonil-CoA funciona como uma espécie de ativador para que a condensação possa acontecer. Esse é o motivo pelo qual faz-se essencial a presença de um grupamento malonil, além do grupamento acetil, durante a síntese dos ácidos graxos. Depois da condensação, acontecerá a redução da molécula formada. Ao contrário das vias de degradação, nas vias de síntese a coenzima reduzida é a NADPH + H+, e não a NADH + H+. O NADPH + H+ utilizado na síntese das moléculas de ácidos graxos é proveniente, principalmente, da via das pentose-fosfato. Com a redução da molécula proveniente da condensação do acetil e do malonil, acontecerá, concomitantemente, a oxidação da coenzima reduzida NADPH + H+. A próxima reação é a desidratação. A desidratação, assim como todas as reações anteriores, continua acontecendo na proteína carreadora de acil (ACP). Antes da hidratação, tinha-se o β-hidroxibutiril-ACP. Depois da hidratação, forma-se o transΔ²-butenoil-ACP. A molécula fica no estado trans porque agora possui uma ligação dupla entre os carbonos. Na última reação, a dupla ligação do trans-Δ²-butenoil-ACP será reduzida graças à presença do NADPH + H+. Formar-se-á, então, o butiril-ACP. Esse butirilACP poderá, então, ser condensado a outras moléculas de acetil-CoA e malonil-CoA para que sua cadeia graxa fique maior. A cadeia graxa ficará maior conforme entre na ACP mais um malonil. Porém, para a entrada de mais um malonil, o sitio da porção ACP deve ser liberado. Dessa forma, o butiril-ACP deve ser transferido para o KS, tornando-se butiril-KS. Assim, o malonil entrará na porção ACP agora livre e o processo de condensação, redução, desidratação e redução acontecerá todo novamente. Depois de formado um hexilACP, este deve ser incorporado à porção KS novamente, para que o sítio ACP fique livre para a entrada de outro malonil-CoA. Assim acontecerá sucessivamente, até o 3 número de carbonos atingidos formar a molécula de ácido graxo esperada. A entrada de malonil-CoA acontece, no lugar do acetil-CoA, por causa do grupamento COO- que, conforme dito anteriormente, funciona como ativador da condensação posterior. Ressalta-se, também, a importância do malonil-CoA para a inibição da carnitinaaciltransferase-I, inibindo conseqüentemente a degradação dos ácidos graxos. Uma equação geral que representa a síntese de um ácido graxo de 16 carbonos, omitindo a síntese de malonil-CoA, seria: 8 ACETIL-COA + 7 ATP + 14 (NADPH + H+) → C15H32COOH + 8 COA + 7 ADP + 7 Pi + 14 NADPH + 7 H2O O uso de ATP é feito pela acetil-CoA carboxilase, que vai utilizar esse ATP para a síntese do malonil-CoA a partir da incorporação de CO2 no acetil-CoA. Como já dito, o NADPH + H+ é proveniente da via das pentose-fosfato, que se inicia na glicose6-fosfato. Ou seja, a presença da glicose é necessária para que ocorra a síntese de coenzimas reduzidas para a síntese de ácidos graxos. Assim, percebe-se que há uma grande interrelação metabólica entre as diferentes vias. O NADPH + H+ pode, também, vir da enzima málica, que vai transformar o malato em piruvato + CO 2 e vai, também, reduzir essa coenzima. O acetil-CoA, utilizado na síntese dos ácidos graxos, pode vir de diferentes fontes, como, por exemplo, da degradação do piruvato pela piruvato-desidrogenase, que vai formar acetil-CoA + CO2, ou pela degradação de aminoácidos cetogênicos. Porém, se o acetil-CoA tiver sido produzido dentro da mitocôndria, ele deve ser transportada até o citossol, visto que é no citossol que acontecem os processos de síntese dos ácidos graxos. O acetil-CoA não será capaz de sair da mitocôndria nessa forma. Ele precisará, primeiro, ser convertido a citrato. Dessa forma, para o acetil-CoA sair da mitocôndria, ele precisará ser condensado com o oxalacetato, na primeira reação do Ciclo de Krebs. Assim, o citrato é capaz de sair para o citossol. No citossol, a citrato-liase cliva o citrato, gerando acetil-CoA e oxalacetato. A partir de então, o acetil-CoA poderá ser utilizado na síntese de ácidos graxos. O excesso de citrato vai indicar que pode ocorrer síntese de ácidos graxos. Dessa forma ele não precisa necessariamente entrar no Ciclo de Krebs, mas sim gerar acetil-CoA para a síntese desses lipídios. A biossíntese de ácidos graxos insaturados é um pouco diferente da biossíntese descrita acima, que trata apenas dos ácidos graxos saturados. As insaturações, geralmente, são feitas em acil-CoA graxos. Ou seja, o ácido graxo é sintetizado normalmente e totalmente saturado e, depois da sua síntese, adiciona-se à sua cadeia uma coenzima A, ativando esse ácido graxo. Depois de ativado, o ácido graxo tem sua cadeia dessaturada pela enzima acil-CoA graxo dessaturase. As insaturações não precisam ser adicionadas aos ácidos graxos livres. Essas insaturações podem, também, ser feitas em ácidos graxos já anexados a moléculas de triglicerídeos, reação catalisada pela mesma enzima acil-CoA graxo dessaturase. A ácido graxo sintase interrompe seu funcionamento a partir de um número máximo de carbonos: 16. Dessa forma, para síntese de cadeias maiores, de 18 ou mais carbonos, entram em ação outras enzimas que vão fazer alocações de pequenas cadeias ao ácido palmítico (16C), formando ácidos graxos com cadeias maiores. As dessaturases (ou insaturases) humanas só conseguem adicionar insaturações em alguns carbonos específicos. As demais insaturações só conseguem ser feitas por enzimas de outros organismos, como plantas e procariontes. Por exemplo: nós só conseguimos sintetizar o oleato, que possui uma insaturação no carbono 9. Entretanto, não conseguimos sintetizar o linoleato, com uma insaturação no carbono 12. Dessa forma, o linoleato de que necessitamos deve vir exclusivamente da 4 alimentação. A capacidade de insaturar uma molécula está diretamente relacionada, portanto, ao formato do sítio ativo das enzimas insaturases. Regulação da Biossíntese de Ácidos Graxos a) REGULAÇÃO DA ACETIL-COA CARBOXILASE O citrato, conforme já dito, é uma molécula que vai sinalizar que há a necessidade de produção de ácidos graxos. Sendo assim, o citrato é um efetor alostérico positivo da acetil-CoA carboxilase. O citrato vem da condensação do acetilCoA com o oxaloacetato dentro da mitocôndria (Ciclo de Krebs) e, no citossol, ele deve ser quebrado pela citrato-liase para formar novamente acetil-CoA e oxaloacetato. A citrato-liase é uma enzima controlada pela cascata de reações iniciada pela insulina. A insulina estimula, portanto, a lise do citrato a acetil-CoA e oxaloacetato. O palmitoil-CoA, produto da ácido graxo sintase, inibe a acetil-CoA carboxilase. Isso acontece porque, se há bastante produto, torna-se desnecessária a produção de mais malonil para síntese de ainda mais produto. O glucagon e a epinefrina vão inibir a síntese de ácidos graxos. A cascata desencadeada pelo glucagon e pela epinefrina vão causar a fosforilação da acetil-CoA carboxilase, que vai ser, assim, inativada. Dessa forma não haverá síntese de malonilCoA e, portanto, não haverá síntese de ácidos graxos. Algumas moléculas não agem somente alostericamente nas enzimas da biossíntese dos ácidos graxos. Existem, portanto, certos sinais que estimulam ou inibem a síntese da enzima acetil-CoA carboxilase, controlando também, dessa forma, a biossíntese de ácidos graxos. b) REGULAÇÃO DA ÁCIDO GRAXO SINTASE A ácido graxo sintase também pode ser regulada. Açúcares fosforilados, como a glicose-6-fosfato, ativam a ácido graxo sintase. Dessa forma, dietas ricas em carboidratos vão, também, aumentar a taxa corporal de gordura. Biossíntese de Triglicerídeos Os ácidos graxos são armazenados na molécula de triglicerídeo. A síntese do triglicerídeo se inicia com a formação de uma molécula de glicerol-3-fosfato. O glicerol3-fosfato pode vir da fosforilação do glicerol pela glicerol-quinase, ou pode vir da redução da di-hidróxi-cetona-fosfato (subproduto da glicólise e gliconeogênese) a glicerol-3-fosfato através da ação da glicerol-3-fosfato-desidrogenase. O glicerol-3fosfato tem duas posições disponíveis para receber dois ácidos graxos. Porém, para a entrada do ácido graxo na molécula de glicerol-3-fosfato, ele precisa estar ativado na forma de acil-CoA graxo, sintetizados a partir da acil-CoA sintetase. A acil-CoA transferase transfere os dois acil-CoA, então, para a molécula de glicerol-3-fosfato. A molécula formada recebe o nome de ácido fosfatídico. O ácido fosfatídico pode ser convertido em triglicerídeo ou em fosfolipídios de membrana. Para se transformar em triglicerídeo, o ácido fosfatídico deve sofrer a ação da ácido fosfatídico fosfatase, que vai remover o fosfato, formando o diacilglicerol. O diacilglicerol pode receber mais uma cadeia graxa (acil) em sua estrutura. A acil-CoA transferase vai transferir, então, mais uma cadeia acil para o diacilglicerol formando, finalmente o triglicerídeo ou triacilglicerol. Caso o ácido fosfatídico receba uma cabeça polar ligada ao seu fosfato, ele formará um glicerofosfolipídio, que poderá realizar funções nas membranas biológicas. A insulina estimula a biossíntese de triglicerídeos através da estimulação da citrato-liase e conseqüente estímulo da formação de ácidos graxos. Uma maior formação de ácidos graxos estimula, conseqüentemente, a biossíntese de triglicerídeos. O glucagon vai inibir a síntese de ácidos graxos e vai estimular a degradação dos triglicerídeos. 5 Ciclo-oxigenase e Eicosanóides A ciclo-oxigenase (COx) é muito estudada e é alvo de diversos medicamentos, como a aspirina. Essa enzima é responsável pela síntese das prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanos (eicosanóides). Esse grupo de moléculas sintetizados pela COx estão envolvidos em respostas alérgicas, inflamatórias, dor e coagulação sangüínea. A COx tem como substrato o ácido araquidônico. Esse ácido araquidônico, geralmente, encontra-se na estrutura de fosfolipídios de membrana. Quando os fosfolipídios são degradados pela fosfolipase A2, formam o ácido araquidônico. Os medicamentos que inibem a COx possuem um grupamento que se liga à serina presente no sítio ativo dessa enzima, causando a inativação desta. Dessa forma, esses medicamentos são utilizados como antiinflamatórios, analgésicos e anticoagulantes. (A PARTE DE SÍNTESE DE ESFINGOLIPÍDIOS E SÍNTESE DE COLESTEROL FOI DADA EM AULA, MAS NÃO FOI COLOCADA NO RESUMO, VISTO QUE, SEGUNDO A PROFESSORA, NÃO CAIRÁ NA PROVA)